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Júlia Figueirêdo – DESORDENS NUTRICIONAIS E METABÓLICAS HIPERPROLACTINEMIA: A hiperprolactinemia, caracterizada pela produção exagerada de prolactina (PRL), é um dos distúrbios hormonais mais frequentes, manifestando-se principalmente sob a forma de alterações menstruais, infertilidade, queda da libido e galactorreia. A incidência desse quadro é 5x maior em mulheres, porém há tendência à redução dessa diferença com o avanço da idade. Para compreender as origens de tal distúrbio, é necessário avaliar os mecanismos fisiológicos associados à regulação da prolactina, processo que se inicia nos lactotrofos, células situadas na adenoipófise. A PRL é liberada de modo pulsátil, respeitando o ciclo circadiano, com concentrações maiores durante a noite, sendo assim dependente do sono. Observa-se, entretanto, que o controle da secreção hipotalâmico, desempenhado pela emissão de dopamina na circulação porta-hipofisária. Esse neurotransmissor apresenta importante atividade inibitória sobre a prolactina. Outros possíveis supressores de PRL são a histamina, a calcitonina, o peptídeo natriurético arterial, a endotelina-1 e o TGF-1. A estimulação da produção de prolactina, por sua vez, é mediada pela presença de estrogênios, TRH, serotonina, adrenalina e oxitocina Ao penetrar a circulação sistêmica, a PRL se direciona principalmente para a mama, onde se liga a receptores específicos, auxiliando, durante a gestação, o desenvolvimento adequado do tecido mamário. Durante a gravidez, os níveis elevados de estrogênio e progesterona inibem a lactogênese, porém a queda abrupta desses hormônios no pós-parto possibilita o início da lactação. Ação da prolactina sobre o tecido mamário Outro importante efeito da PRL é a inibição da secreção de GnRH, o que implica em diminuição de gonadotrofinas (FSH e LH), e, consequentemente, hipogonadismo. A maior concentração de prolactina atua, indiretamente, na promoção da síntese dopaminérgica, criando assim uma alça de feedback negativo para o controle da homeostase A sucção do bebê causa um reflexo neural que dita a liberação do hormônio liberador de prolactina pelo hipotálamo, agindo diretamente sobre os lactotrofos Júlia Figueirêdo – DESORDENS NUTRICIONAIS E METABÓLICAS Existem ainda evidências de que a prolactina atua sobre o tecido adiposo e o pâncreas, promovendo a maturação de células-β e o aumento da secreção de insulina. Ação fisiológica da prolactina (azul) e alterações observadas na hiperprolactinemia (vermelho) ETIOLOGIA: As principais causas de hiperprolactinemia podem ser divididas em cinco categorias, a saber: Causas fisiológicas: são representadas predominantemente pela gravidez e lactação, porém a prática de exercícios físicos, relações sexuais e a exposição ao estresse também podem elevar a PRL; Causas farmacológicas: são as etiologias não-fisiológicas mais comuns, tendo como “responsáveis” as medicações que atuam sobre o sistema dopaminérgico, como neuolépticos, metildopa, morfina e antipsicóticos; Principais fármacos associados à hiperprolactinemia Distúrbios patológicos: o Tumores e afecções hipotalâmico- hipofisárias: os prolactinomas são adenomas hipofisários funcionantes comumente encontrados em mulheres de 20 a 40 anos, sendo divididos em micro (< 10 mm) e macroprolactinomas (≥ 10 mm); o Doenças sistêmicas: a hiperprolactinemia pode ser um sinal associado a quadros como SOP, hipotireoidismo, cirrose e DRC; o Alterações neurogênicas: lesões ou patologias do cordão medular podem causar elevação reflexa da PRL por ativação de vias aferentes; Macroprolactinemia: situação na qual o aumento de prolactina leva à presença de PRL de alto peso molecular, que apresentam bioatividade reduzida e, portanto, menos sintomas. Caso todas as etiologias supracitadas tenham sido excluídas por exames laboratoriais e de imagem, a condição passa a ser considerada hiperprolactinemia idiopática, em sua maioria com PRL ≤ 100 ng/ml. QUADRO CLÍNICO: As manifestações clínicas da hiperprolactinemia se iniciam, em mulheres pré-menopausa, sobre a forma de distúrbios menstruais, como oligo ou amenorreia. Pacientes que fazem uso de contraceptivos orais podem ter sintomas mascarados, tornando-se evidentes após sua suspensão (“amenorreia pós-contracepção”). No período pós-menopausa, o único sinal significativo pode ser o desaparecimento dos fogachos, ao passo que meninas tendem a cursar com amenorreia primária ou retardo da puberdade Júlia Figueirêdo – DESORDENS NUTRICIONAIS E METABÓLICAS A galactorreia é encontrada em até 80% dos casos, porém esse não é um sinal patognomônico, uma vez que também pode ser observada na presença de níveis hormonais normais. Queixas associadas à vida sexual, como perda da libido e dispareunia (por deficiência de estrogênio), são frequentemente relatados, assim como alterações do metabolismo ósseo (osteopenia). Sintomas característicos da hiperprolactinemia em mulheres e homens Uma vez que o aumento de PRL também pode ser causada por tumores que comprimem estruturas encefálicas, pode ser recomendada a investigação de hiperprolactinemia em pacientes com cefaleia e alterações visuais. Macroadenoma com grande efeito compressivo DIAGNÓSTICO: A investigação diagnóstica da hiperprolactinemia deve ser indicada a todo paciente com sintomas sugestivos, assim como a portadores de macroadenomas, mesmo naqueles sem queixas relacionadas. Na presença de sinais e sintomas neurológicos, por sua vez, a pesquisa deve se direcionar à detecção de macroprolactinomas. A avaliação laboratorial é iniciada com a dosagem de βHCG, TSH, enzimas hepáticas (AST/ALT) e a realização de provas de função renal, para que sejam afastadas causas fisiológicas e sistêmicas, como gravidez, hipotireoidismo, DRC e doença hepática. A seguir, a confirmação da hiperprolactinemia é obtida a partir da dosagem de PRL por quimioluminescência. Os valores de referência são maiores em mulheres, porém seu limite superior não costuma ultrapassar 25 ng/ml. Valores de até 100 ng/ml associam- se ao uso de medicamentos, microprolactinomas e a apresentações idiopáticas, ao passo que resultados > 250 ng/ml se devem à presença de prolactinoma. Para verificar a macroprolactinemia, é necessário realizar o teste de precipitação, baseado na insolubilidade de imunoglobulinas após exposição a polietilenoglicol. Quanto mais formações de baixo peso molecular, menor será a A dosagem de prolactina pode ser feita em qualquer período do dia, porém recomenda-se evitar estresse excessivo no momento da punção venosa Júlia Figueirêdo – DESORDENS NUTRICIONAIS E METABÓLICAS recuperação, atestando assim o diagnóstico. É importante atentar-se à ocorrência do efeito gancho, no qual distúrbios de hipersecreção podem se mostrar com níveis falsamente normais de PRL. Para evita-lo, basta solicitar que a dosagem do hormônio seja feita em soro diluído, evidenciando a presença de macroprolactinomas. Com a confirmação da alteração hormonal, o próximo passo consiste na realização de exames de imagem para avaliação de possíveis tumores, sendo a ressonância magnética o método mais sensível para esse processo. Em caso de impossibilidade ou contraindicações, a tomografia de crânio pode ser usada, ainda que com resultados menos efetivos. Identificação de microprolactinoma (área hipodensa) próximo ao quiasma óptico em ressonância magnética Fluxograma de investigação diagnóstica da hiperprolactinemia TRATAMENTO: O maior objetivo terapêutico para pacientes com hiperprolactinemia idiopática ou microprolactinomas é o manejo dossintomas, ao passo que em indivíduos com macroprolactinomas, também deve ser priorizada a redução do tamanho do tumor. Nesse sentido, os agonistas dopaminérgicos representam a primeira linha de tratamento, agindo tanto sobre a normalização de PRL sérica e na restauração funcional ovariana, quanto na redução tumoral significativa. As medicações mais utilizadas são: Carbegolina: por ser um agonista específico de receptores D2, é considerada a medicação de primeira escolha para a maior parte dos pacientes. Resultados normais de exames de imagme não excluem a possibilidade de microprolactinomas, pois eles podem ser imperceptíveis quando muito pequenos Júlia Figueirêdo – DESORDENS NUTRICIONAIS E METABÓLICAS Em decorrência de sua longa meia-vida, pode ser administrada semanalmente, em dose inicial de 0,5 mg VO, podendo ser aumentada a cada 4 semanas, se necessário. A dose máxima é de 4,5 mg/semana, porém a média é de 1 a 2 mg. Mesilato de bromocriptina: o uso desse medicamento é reservado a mulheres com desejo de engravidar, pois há mais experiência com sua aplicação durante a gestação. A dose inicial é de 1,25 mg/dia por VO, após o jantar ou antes de dormir, aumentando para 1,25 mg 2x/dia após uma semana. É possível fazer incrementos de 1,5 mg a cada 3 a 7 dias de forma a atingir resultados terapêuticos, com máximo de 20 mg/dia. Os efeitos adversos mais comuns associados a ambas as drogas são hipotensão postural, cefaleia, tontura, náuseas e vômitos. Observa-se, no entanto, que a cabergolina apresenta menor incidência desses eventos, que também são mais brandos, resolvidos com ajuste de dose. O esquema terapêutico para prolactinoma é contínuo, devendo ser mantido por ao menos 2 anos. Com a suspensão dos medicamentos, pode haver recidiva da hiperprolactinemia, decorrente de novas formações tumorais. Recomendações de tratamento farmacológico da hiperprolactinemia Em face a ausência de resposta terapêutica ao manejo farmacológico ou comprometimento visual persistente, a retirada parcial da massa tumoral por cirurgia transesfenoidal pode ser recomendada. Outras indicações para o tratamento cirúrgico são o comprometimento neurológico, intolerância aos agonistas dopaminérgicos e a detecção de fístula liquórica. Representação da abordagem transesfenoidal para ressecção de tumores hipofisários A radioterapia é reservada a indivíduos com prolactinomas agressivos e que não Pacientes com apresentações refratárias podem necessitar de altas doses semanais de agonistas dopaminérgicos, aumentando o risco de valvulopatias e alterações psiquiátricas relacionadas aos fármacos Júlia Figueirêdo – DESORDENS NUTRICIONAIS E METABÓLICAS tenham regredido com as estratégias anteriores, porém apresenta baixa efetividade e grande risco de efeitos adversos a longo prazo, o que limita seu uso. Algoritmo para investigação e manejo do paciente com hiperprolactinemia
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