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OFICINA 2 - EPIDEMIOLOGIA DOS PROBLEMAS DE SAÚDE MENTAL 1. DEFINIR EPIDEMIOLOGIA E FATORES DE RISCO DOS TRANSTORNOS MENTAIS. (DEPRESSÃO, ANSIEDADE, SUICÍDIO, BURNOUT, TOC, TRANSTORNO BIPOLAR E ESQUIZOFRENIA) DEPRESSÃO Segundo o relatório Mundial de Saúde da OMS (organização Mundial da Saúde), em 2020, a depressão seria a segunda doença que causaria maior ônus entre todas as doenças, perdendo apenas para a doença isquêmica cardíaca Dados publicados pela OMS, em 2017, revelam cerca de 332 milhões de casos de depressão no mundo, enquanto no Brasil, são registrados cerca de 12 milhões de casos, sendo considerada a maior taxa de depressão da América Latina. Ademais, a doença afeta mais mulheres do que homens e pode estar presente em diferentes faixas etárias (infância e adolescência, vida adulta e idosos). O percentual de brasileiros que declara ter recebido diagnóstico de depressão por profissional de saúde mental subiu 34,2% em seis anos, mostram dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A PNS (Pesquisa Nacional de Saúde) 2019 aponta que 10,2% (16,3 milhões) das pessoas com mais de 18 anos sofrem da doença. Quando o levantamento anterior foi realizado, em 2013, eram 7,6% (11,2 milhões) — um adicional de 5,1 milhões de casos no período. As regiões urbanas registram a maior prevalência de casos de depressão (10,7%), enquanto nas áreas rurais o índice é de 7,6%. Estados do Sul e Sudeste têm 15,2% e 11,5%, respectivamente, de adultos com diagnóstico confirmado de depressão, segundo a pesquisa. Em seguida aparecem, Centro-Oeste (10,4%), Nordeste (6,9%) e Norte (5%). Quando analisados os dados por sexo, as mulheres são as que mais sofrem de depressão: 14,7%, versus 5,1% entre os homens. Os idosos entre 60 e 64 anos representam a faixa etária com maior incidência: 13,2%. Sexo Uma observação quase universal, independentemente de país ou cultura, é a prevalência duas vezes maior de transtorno depressivo maior em mulheres do que em homens. Idade A idade média de início para transtorno depressivo maior é em torno dos 40 anos, com 50% de todos os pacientes tendo início entre os 20 e os 50 anos. Esse transtorno também pode iniciar na infância ou na velhice. Dados epidemiológicos recentes revelam que a incidência de transtorno depressivo maior pode estar aumentando entre pessoas com menos de 20 anos. É possível que isso esteja relacionado ao aumento do uso de álcool e do abuso de drogas nessa faixa etária. Estado civil O transtorno depressivo maior ocorre mais frequentemente em pessoas sem relacionamentos interpessoais íntimos e naquelas que são divorciadas ou separadas Não foi encontrada correlação entre condição socioeconômica e transtorno depressivo maior. A depressão é mais comum em áreas rurais do que em áreas urbanas. A prevalência de transtorno do humor não difere entre as raças. FONTE: Folha de São Paulo (https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2 022/07/brasil-vive-2a-pandemia-na-saude-mental- com-multidao-de-deprimidos-e-ansiosos.shtml) FATORES DE RISCO Histórico familiar; Transtornos psiquiátricos correlatos; Estresse crônico; Ansiedade crônica; Disfunções hormonais; Dependência de álcool e drogas ilícitas; Traumas psicológicos; Doenças cardiovasculares, endocrinológicas, neurológicas, neoplasias entre outras; Conflitos conjugais; Mudança brusca de condições financeiras e desemprego. Os fatores de risco relacionados com a depressão entre estudantes de Medicina: Estresse A frequência de atividades de lazer A satisfação com o desempenho acadêmico e Falta de apoio emocional no ambiente ANSIEDADE Os transtornos de ansiedade constituem um dos grupos mais comuns de doenças psiquiátricas. O Estudo Americano de Comorbidade (National Comorbidity Study) relatou que 1 em cada 4 pessoas satisfaz o critério diagnóstico de pelo menos um transtorno de ansiedade e que há uma taxa de prevalência em 12 meses de 17,7%. As mulheres (com prevalência durante a vida de 30,5%) têm mais probabilidade de ter um transtorno de ansiedade do que os homens (prevalência durante a vida de 19,2%). Por fim, sua prevalência diminui com o status socioeconômico mais alto. Uma pesquisa feita pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) nos meses de maio, junho e julho de 2021, revela que 80% da população brasileira tornou-se mais ansiosa na pandemia do novo coronavírus. “Percentual, que é de 30% em alguns países, chega a 80% no Brasil” disse à Agência Brasil a professora da UFRGS Adriane Ribeiro Rosa, coordenadora da pesquisa. Acesso disponível em: (https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/202 0-10/pesquisa-revela-aumento-da-ansiedade-entre- brasileiros-na-pandemia) Há estudos que apontam uma prevalência geral de transtornos de ansiedade em cerca de 27%. Dentre eles, o TAG apresenta uma prevalência em 12 meses que varia de 0,4 a 3,6% entre países, e uma prevalência ao longo da vida na casa dos 9%. FATORES DE RISCO Quando se analisa os fatores de risco, observa-se maior prevalência do Transtorno de Ansiedade Generalizada em determinados grupos, como mulheres, pessoas com mais idade, indivíduos com menor quantidade de anos de estudo, pessoas de baixa renda, fumantes, etilistas e aqueles que apresentam comorbidades crônicas. SUICÍDIO O suicídio é um importante problema de saúde pública, com impactos na sociedade como um todo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que no mundo, mais de 700 mil pessoas morrem por suicídio anualmente, sendo a quarta maior causa de mortes de jovens de 15 a 29 anos de idade. Entre 2010 e 2019, ocorreram no Brasil 112.230 mortes por suicídio, com um aumento de 43% no número anual de mortes, de 9.454 em 2010, para 13.523 em 2019. A taxa nacional em 2019 foi de 6,6 por 100 mil habitantes. Destacam-se as Regiões Sul e Centro-Oeste, com as maiores taxas de suicídio entre as regiões brasileiras (Figura 1). Homens apresentaram um risco 3,8 vezes maior de morte por suicídio que mulheres. Comparando os anos de 2010 e 2019, verificou-se um aumento de 29% nas taxas de suicídios de mulheres, e 26% das taxas entre homens (Figura 2) A diferença entre os sexos configura um fator marcante no risco de suicídio, uma vez que, globalmente, homens apresentam um maior risco de morte por suicídio em relação às mulheres. Não obstante, mulheres apresentam maiores prevalências de ideação e tentativas de suicídio. Essas diferenças têm sido associadas à maior agressividade e uma maior intenção de morrer entre homens, levando ao emprego de métodos mais letais, maior acesso a armas de fogo e outros objetos letais, e maior suscetibilidade aos impactos de instabilidades econômicas entre homens. Mulheres tentam mais, porém homens morrem mais. Isso porque os homens usam de formas mais letais (como arma de fogo), enquanto que mulheres tentam de formas que as pessoas em sua volta não percebam (como abuso de medicamentos) Ao analisar a distribuição do risco de morte por suicídio segundo faixa etária entre as regiões brasileiras, em 2019, observou-se que as Regiões Sul, Norte e Centro-Oeste apresentaram as maiores taxas de mortalidade de adolescentes de 15 a 19 anos (Figura 4). Chama a atenção o acelerado aumento das taxas de suicídio de adolescentes e jovens no Brasil. Nesse sentido, o suicídio configura a quarta maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos de idade. Há uma conjunção de fatores relacionados ao comportamento suicida na juventude. Alguns fatores que se destacam são os sentimentos de tristeza, desesperança e a depressão, ansiedade, baixa autoestima, experiências adversas pregressas, como abusos físicos e sexuais pelos paisou outras pessoas próximas, falta de amigos e suporte de parentes, exposição à violência e discriminação no ambiente escolar e o uso de substâncias psicoativas. Analisando a mortalidade por suicídio entre os estados brasileiros, observou-se que todos os estados da Região Sul do País apresentaram taxas de suicídio superiores à média nacional. Destacam-se os estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, com as maiores taxas de suicídio do país, respectivamente 11,8 e 11,0 por 100 mil habitantes (Figura 5). As evidências têm demonstrado ainda maiores riscos de suicídio entre grupos em situação de maior vulnerabilidade, como migrantes e refugiados, população LGBT e povos indígenas. Nesse ponto, destaca-se a Região Norte, onde se concentra a maior proporção da população indígena do País. Um estudo em Roraima demonstrou um risco de suicídio 74% maior entre indígenas, comparados a não indígenas. FATORES DE RISCO Família de origem disfuncional Histórico de suicídio na família Transtornos psicológicos Instabilidade econômica Experiências de violência física/sexual Vivência em comunidades violentas e Condições de trabalho insalubres Comportamentos de risco, como o uso de drogas e sexo desprotegido também podem ser considerados fatores de risco. BURNOUT Como a síndrome não exige notificação compulsória, o Ministério da Saúde não consegue contabilizar com precisão o número de brasileiros que são afetados por ela. Mas, uma pesquisa realizada pela International Stress Management Association (Isma- BR) em 2018 calcula-se que 32% dos trabalhadores no país padecem dela, seriam mais de 33 milhões de cidadãos. Em um ranking de oito países, os brasileiros ganham de chineses e americanos, só ficando atrás dos japoneses, com 70% da população atingida. Policiais, professores, jornalistas, médicos e enfermeiros estão entre as profissões mais afetadas pela pane física e mental. A Síndrome de Burnout foi oficializada recentemente pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma síndrome crônica. Enquanto um “fenômeno ligado ao trabalho”, a OMS incluiu o Burnout na nova Classificação Internacional de Doenças (CID-11), que entrou em vigor em 1º de janeiro de 2022. FATORES DE RISCO Sobrecarga de trabalho, Estresse, Esgotamento físico, Depressão e Interação social comprometida TRANSTORNO OBSESSIVO COMPULSIVO (TOC) É um transtorno que pode ser confundido com a esquizofrenia e é relativamente comum (2 a 4%). Possui incidência semelhante em ambos os sexos e geralmente tem seu início na infância. Muitas vezes subdiagnosticadas: não procura atendimento médico e os familiares acabam se acostumando; Possui uma evolução crônica, apenas 20% tem remissão total. Existem períodos de atenuação, mas não há cura. Em torno de 90% das pessoas acometidas por essa doença possuem comorbidades – quase regra no TOC, sobretudo comorbidade psiquiátricas, principalmente depressão; As taxas de TOC são bastante consistentes, com uma prevalência vitalícia na população em geral estimada em 2 a 3%. Alguns pesquisadores avaliaram que o transtorno é encontrado em até 10% dos pacientes ambulatoriais de clínicas psiquiátricas. Esses números fazem do TOC o quarto diagnóstico psiquiátrico mais comum depois da fobia, de transtornos relacionados a substâncias e do transtorno depressivo maior. Entre adultos, homens e mulheres são igualmente afetados, mas, entre adolescentes, os meninos costumam ser mais afetados do que as garotas. A idade média de início é por volta dos 20 anos, apesar de os homens apresentarem uma idade um pouco menor de início (média de 19 anos, aproximadamente) do que as mulheres (média de 22 anos, aproximadamente). Em geral, os sintomas de cerca de dois terços das pessoas afetadas têm início antes dos 25 anos, e os sintomas de menos de 15% têm início após os 35 anos. O início do transtorno pode ocorrer na adolescência e na infância, em alguns casos até aos 2 anos de idade. Pessoas solteiras costumam ser mais afetadas por TOC do que as casadas, apesar de esse achado provavelmente refletir a dificuldade de pessoas com o transtorno de manter um relacionamento. O TOC ocorre com menor frequência entre negros do que entre brancos, mas é possível que o acesso à assistência médica, e não diferenças de prevalência, explique essa variação. FATORES DE RISCO Os principais fatores capazes de aumentar o risco de uma pessoa desenvolver o transtorno obsessivo- compulsiva incluem histórico familiar, como ter algum membro próximo da família com diagnóstico positivo de TOC ou outras doenças psiquiátricas, e acontecimentos traumáticos e estressantes que tenham ocorrido na vida da pessoa, como a morte de um ente querido ou um acidente grave. TRANSTORNO BIPOLAR Em um estudo brasileiro, foi feita a reanálise dos dados do Estudo de Área de Captação Epidemiológica, e a prevalência, ao longo da vida, de subgrupos TAB, incluindo presença de hipomania subsindrômica e sintomas maníacos, foi de 8,3%. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o TAB é a sexta causa de incapacidade e a terceira entre as doenças mentais, após depressão unipolar e esquizofrenia, que cursam com maior carga. A carga da doença é causada pelas comorbidades psiquiátricas e físicas e pela baixa adesão ao tratamento. Os custos da doença são decorrentes, principalmente, dos custos indiretos da doença. A incapacidade funcional ocasionada pelo TAB é comparável à de muitas doenças crônicas. Como, em geral, os portadores do transtorno têm rotinas desregradas e a doença é detectada tardiamente, muitas vezes também há problemas cardiovasculares envolvidos, como colesterol e triglicérides, diabetes tipo 2, abuso de álcool e drogas (de 40% a 60% dos casos) e até suicídios (de 5% e 15% do total). Em 30% a 70% dos casos de bipolaridade, ainda há algum outro distúrbio psiquiátrico relacionado, como fobias, síndrome do pânico, transtorno obsessivo- compulsivo (TOC), transtorno de personalidade e transtorno do deficit de atenção e hiperatividade (TDAH). A incidência anual de doença bipolar é geralmente considerada inferior a 1%, mas ela é difícil de estimar, porque formas mais leves desse transtorno muitas vezes passam despercebidas Sexo O transtorno bipolar I tem uma prevalência igual entre homens e mulheres. Episódios maníacos são mais comuns em homens, e episódios depressivos são mais comuns em mulheres. Quando episódios maníacos ocorrem em mulheres, elas têm mais probabilidade do que os homens de apresentar um quadro misto (p. ex., mania e depressão). As mulheres também têm uma taxa mais alta de ciclagem rápida, definida como quatro ou mais episódios maníacos no período de um ano. Idade A idade de início do transtorno bipolar I é mais precoce, variando da infância (a partir dos 5 ou 6 anos) aos 50 anos, ou até mais, em casos raros, com idade média de 30 anos. Estado civil O transtorno bipolar I é mais comum em pessoas divorciadas e solteiras do que entre as casadas, mas essa diferença pode refletir o início precoce e a discórdia conjugal resultante característica do transtorno. Fatores socioeconômicos e culturais Uma incidência mais alta do que a média de transtorno bipolar I é encontrada entre os grupos socioeconômicos mais altos; entretanto, ele é mais comum em pessoas que não têm curso superior do que naquelas com diploma universitário, o que também pode refletir a idade de início relativamente precoce para o transtorno. FATORES DE RISCO Histórico familiar da doença; Estresse intenso; Uso e abuso de drogas recreativas e/ou álcool; Mudanças de vida e experiências traumáticas; Ter entre 15 e 25 anos, uma vez que homens e mulheres possuem as mesmas chances dedesenvolver a doença. ESQUIZOFRENIA Pesquisas recentes mostram que a esquizofrenia afeta 1% da população mundial e ocorre na mesma proporção em homens e mulheres, mas pode ter um início mais precoce e pior evolução no sexo masculino. Pessoas com esquizofrenia são mais propensas a morrer mais jovens do que a população em geral. Sua frequência na população em geral é da ordem de 1 para cada 100 pessoas. No Brasil, estima- se que há cerca de 1,6 milhão de esquizofrênicos. São muito frequentes condições médicas concomitantes, como obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares. Dentre os esquizofrénicos, há uma prevalência aumentada de tabagismo e uso de substâncias. A esquizofrenia é igualmente prevalente em homens e mulheres. Ambos os sexos diferem, no entanto, quanto ao início e ao curso da doença. O início é mais precoce entre homens. Mais da metade dos pacientes com esquizofrenia do sexo masculino, e apenas um terço dos pacientes do sexo feminino, têm sua primeira internação em hospital psiquiátrico antes dos 25 anos de idade. As idades de pico do início são entre 10 e 25 anos para os homens e entre 25 e 35 anos para as mulheres. O início da esquizofrenia antes dos 10 anos ou após os 60 anos é extremamente raro. Alguns estudos indicaram que os homens têm maior probabilidade de sofrer sintomas negativos do que as mulheres, e que estas têm maior probabilidade de ter melhor funcionamento social antes do início da doença. Em geral, o resultado para os pacientes do sexo feminino é melhor do que para os do sexo masculino. Quando o início ocorre após os 45 anos, o transtorno é caracterizado como esquizofrenia de início tardio. FATORES DE RISCO Os pesquisadores acreditam que vários fatores genéticos e ambientais contribuem para a causa, e os estressores da vida podem desempenhar um papel no início dos sintomas e no seu curso. Como vários fatores podem contribuir, os cientistas ainda não podem ser específicos sobre a causa exata em cada caso individual. Embora a causa precisa da esquizofrenia não seja conhecida, certos fatores parecem aumentar o risco de desenvolver ou desencadear a esquizofrenia, incluindo: Ter uma história familiar de esquizofrenia Algumas complicações na gravidez e no parto, como desnutrição ou exposição a toxinas ou vírus que podem afetar o desenvolvimento do cérebro Tomar drogas que alteram a mente (psicoativas ou psicotrópicas) durante a adolescência e a idade adulta jovem 3. ELUCIDAR A IMPORTÂNCIA DA APS NA PREVENÇÃO, TRATAMENTO E APOIO NOS PACIENTES COM TRANSTORNOS MENTAIS; De acordo com a Portaria de Consolidação nº 3 de 2017, fica instituída, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a Equipe Multiprofissional Especializada em Saúde Mental. Essas Equipes têm por objetivo prestar atenção multiprofissional em saúde mental, respondendo à necessidade de atendimento especializado, integrando-se aos demais serviços das redes de atenção à saúde, amparada nos comandos da Lei federal nº 10.216 de 2001. A assistência será organizada a partir da APS, que identificará a necessidade de referenciamento à equipe especializada, podendo-se utilizar a ferramenta da estratificação de risco, para embasar a avaliação de casos a serem referenciados levando-se em consideração as especificidades e individualidades de cada caso. A APS como ordenadora das ações e serviços disponibilizados na rede deve coordenar o cuidado, prestando o atendimento ao usuário e fazendo o seguimento compartilhado com a RAPS, elaborando, acompanhando e criando projetos terapêuticos singulares, bem como acompanhando e organizando o fluxos dos usuários entre os pontos de atenção da RAS, assim como as outras estruturas das redes de saúde e intersetoriais, públicas, comunitárias e sociais. Não existe modelo único para a saúde mental na APS. Todos os envolvidos devem ser considerados na organização do serviço (usuários, familiares, profissionais da APS, profissionais de saúde mental e gestores). Nas situações estratificadas como de baixo risco, como as que apresentam sintomas leves a moderados de depressão, ansiedade e somatização, os sintomas tendem a se sobrepor, além de compartilharem os mesmos fatores de risco e padrões de evolução. Recomenda-se iniciar com cuidados de baixa intensidade (atividade física em grupo, panfletos de autoajuda, grupos de apoio), passando por grupos psicoeducacionais e de apoio que explorem questões como autoestima ou resiliência, evoluindo para o uso de terapia medicamentosa com supervisão especializada e psicoterapia em grupo ou individual, caso necessário. Atendimentos individuais, ou consultas compartilhadas em saúde mental, também podem ocorrer quando identificada a necessidade pela APS, e juntamente com os NASF, nos municípios que possuem tais equipes. Nas situações estratificadas como de médio a alto risco, a APS desempenha papel importante no diagnóstico precoce, no início rápido do tratamento com intervenções rápidas e efetivas na crise, na manutenção do tratamento farmacológico e nos programas de reabilitação psicossocial para os quadros psicóticos crônicos estáveis. Os atendimentos em domicílio e os vínculos com as famílias facilitam estas intervenções. Conforme for a rede municipal, as equipes de APS devem contar com capacitação, supervisão e apoio matricial de profissionais do Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF), e dos pontos de atenção secundária, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e das equipes multiprofissionais especializadas em saúde mental. O usuário sempre continuará vinculado a APS de referência, onde o cuidado compartilhado tem se mostrado mais eficaz. Salienta-se, ainda, a necessidade de prover o cuidado para as comorbidades clínicas frequentes, não se limitando apenas ao fornecimento de medicação. Nos problemas de saúde mental que se manifestam na infância e/ou na adolescência, a APS exerce importante função de proteção da vida, respeito à dignidade, à liberdade e à convivência familiar, social e cultural. Os profissionais devem estar atentos para reconhecer os principais fatores de risco da saúde infanto juvenis, tais como: o contato precoce com substâncias químicas, álcool e suas complicações, as doenças sexualmente transmissíveis e a gravidez precoce. As ações vão desde a detecção dos sinais e sintomas precoces das comorbidades mais frequentes, intervenções iniciais para estabilização e, se possível, reversão dos problemas; tendo como principal apoiador os profissionais especializados dos CAPS e/ou dos NASFs e/ou equipes multiprofissionais de atenção especializada em saúde mental. Dependência de álcool e outras drogas. O álcool é a droga de abuso com maior prevalência em usuários atendidos na APS. A identificação do padrão de consumo da bebida alcoólica e de outras drogas possibilita reconhecer sinais e sintomas de seu uso abusivo. Mediante isto, os cuidados e ações propostas incluem intervenções no sentido de mostrar claramente as consequências clínicas, psicológicas e sociais do uso contínuo de álcool e de outras drogas, discutir o risco envolvido, assim como encaminhar os usuários para serviços especializados, quando necessário. Podem ser programados na APS atendimentos em grupos ou encaminhamento para grupos de ajuda mútua e a promoção de ações intersetoriais, visando a redução de danos, bem como a manutenção da abstinência e prevenção de recaídas. 4. ABORDAR OS DESAFIOS PARA OS CUIDADOS EM SAÚDE MENTAL NO BRASIL; Há vários desafios para a saúde mental, que vão desde a dificuldade de acesso à informação até os problemas assistenciais. Muitas pessoas não sabem quais são as doenças mentais e os seus sintomas. Com isso, não são capazes de perceber que estão com um problemapotencialmente grave, caso não seja tratado adequadamente. As doenças mentais são condições extremamente complexas, portanto, podem exigir o acompanhamento por vários profissionais de saúde, como psicólogos, enfermeiros terapeutas ocupacionais, nutricionistas, fonoaudiólogos, farmacêuticos, entre outros. Isso não significa que todas as pessoas diagnosticadas com algum transtorno psíquico deverão se consultar com todos esses especialistas. Na verdade, o tratamento deve ser individualizado para cada pessoa dentro de uma perspectiva de atenção integral à saúde. Os desafios são grandes, em especial em relação à assistência que ainda é deficitária. Problema que compromete a reabilitação do paciente, em especial em instituições públicas. A falta de uma política séria e programas eficientes são os maiores desafios a serem ultrapassados. Aliado a isso, o preconceito ainda é outro grande entrave. Muitas pessoas simplesmente são chamadas de loucas e afastadas do convívio social. Por outro lado, a pessoa doente se sente envergonhada ou tem medo de buscar ajuda psiquiátrica. Desinformação, falta de programas educativos preventivos e falta de conhecimento sobre a realidade do problema completam o quadro. O Ministério da Saúde reconhece o agravamento da situação, em especial, pelo aumento no número de doenças psicossomáticas e suicídios. Praticamente 20% dos brasileiros têm, teve ou terá algum distúrbio emocional, como ansiedade, depressão ou síndrome do pânico. Por outro lado, o declínio no número de leitos para internação só vem caindo nos últimos anos. Em 1980 eram 120 mil e hoje em dia, não passam de 12 mil em todo país. No trabalho o problema é grande, agravado por jornadas de trabalho exaustivas, cobranças incabíveis e metas inalcançáveis. O primeiro desafio aqui listado diz respeito ao fortalecimento da capacidade da atenção primária para exercer seu protagonismo no cuidado em relação à saúde mental, tanto em termos técnicos, quanto institucionais. Pode-se dizer que a responsabilidade sanitária específica da APS é realizada no cuidado efetivo e eficaz relativo aos quadros de alta prevalência, como os transtornos depressivos–ansiosos e os problemas referentes ao uso nocivo de álcool. Para tanto, são fundamentais a devida capacitação dos profissionais, a garantia de acesso à medicação básica e o desenvolvimento de intervenções terapêuticas não-medicamentosas. A disponibilização do Manual de Intervenções do Programa para Reduzir as Lacunas em Saúde Mental 2.0 de 2016 é uma das alternativas existentes para superar tais limitações. Nesse contexto, a necessidade de integração da ESF com os outros dispositivos e instâncias do sistema de saúde é indispensável, para superar ações isoladas e construir redes de cuidado. No que diz respeito ao avanço da cobertura dos CAPS, é possível observar que o ritmo de abertura de novos serviços fora de mais de 120 novas unidades por ano até 2017, a partir do que se registra queda, não chegando hoje sequer a 100 novos CAPS anuais. Em 2016, a Emenda Constitucional estabeleceu um teto, a ser mantido por 20 anos, que inibe o crescimento de gastos com saúde. Ao mesmo tempo, ocorreu reajuste substancial nos valores pagos em diárias nos hospitais psiquiátricos, em claro detrimento dos serviços comunitários. Pode-se entender, assim, que o limite imposto pelo contexto de restrição orçamentária, concomitante à reorientação da política de saúde mental, privilegiando investimentos em hospitais psiquiátricos, constitui uma autêntica ameaça à expansão da cobertura de serviços de base territorial. E estes, como é amplamente demonstrado em todo o mundo, são decisivos para a qualidade da assistência, para o enfrentamento dos casos mais graves e para a ampliação do alcance dos cuidados em saúde mental, devido a sua maior capilaridade no tecido social e articulação com a atenção primária e outros setores das políticas públicas. 5. ENTENDER O IMPACTO DO SOFRIMENTO MENTAL NA CARGA GLOBAL DE DOENÇA E SUA RELAÇÃO COM A MORTALIDADE PRECOCE; Para estimar o impacto das doenças crônicas e incapacitantes na saúde pública, como é o caso das doenças mentais e comportamentais, para além da prevalência e mortalidade recorre-se a aos indicadores, como o DALY ( Diseability Adjusted Life Years) e o YLD ( Years of Life lived with Diseability), que integram também a incapacidade associada às doenças em estudo e através do seu conjunto é construído um indicador global, designado por Carga Global de Doença (Global Burden of Disease - GBD). Os DALYs, anos de vida ajustados à incapacidade, correspondem ao somatório dos anos de vida saudável perdidos devido a uma doença, ou conjunto de doenças. De acordo com a OMS, em 1990 as doenças mentais e comportamentais terão originado cerca de 10,5 por cento do total de DALYs perdidos devido a todas as doenças e lesões, estimando que em 2000 aquele valor teria sido de 12,3 por cento e que em 2020 atingirá 15 por cento do total de DALYs. A OMS estimou ainda que, em 2000, o número de anos vivido com incapacidade (YLD) associada às doenças mentais e comportamentais terá sido de 31 por centro do total de YLD provocados por todas as causas. A depressão unipolar é a perturbação neuropsiquiátrica que origina uma maior proporção de DALYs, particularmente no sexo feminino. A OMS indica que as perturbações depressivas unipolares representam um encargo enorme para a sociedade, sendo classificadas como a quarta entidade nosológica que maior carga de doença origina, sendo responsável por 4,3 por cento do total de DALYS e a principal causa de YLDs, representando 11,9 por cento do total YLDs na população em geral. No grupo etário dos 15 aos 44 anos a depressão foi a segunda maior causa de carga de doença, originando 8,6 por cento de DALYS perdidos. Estima-se ainda que, caso se mantenham até 2030 as tendências de evolução demográfica e epidemiológica a carga de doença associada à depressão aumentará para 6,2 por cento do total de DALYs tornando-se a primeira maior causa de carga de doença. O abuso do álcool encontra-se no 18º lugar do ranking entre as causas de maior proporção de DALYs perdidos na população total e no 5º lugar do ranking da população masculina do grupo etário de 15 aos 44 anos. Estima-se que o álcool seja responsável por 1,5 por cento de todas as mortes e 3,5 por cento do total de DALYs. Essa carga de doença inclui não só perturbações físicas, como a cirrose, mas também lesões e acidentes rodoviários e de trabalho imputáveis ao álcool. A esquizofrenia figura no 8º lugar do ranking entre as causas de maior proporção de DALYs perdidos no grupo etário dos 15 aos 44 anos devido ao elevado grau de incapacidade que provoca, a qual muitas vezes é permanente. Estima-se que a esquizofrenia reduza em média 10 anos no tempo de vida do doente. DEPRESSÃO Os resultados sugerem que o transtorno depressivo afeta todas as dimensões da qualidade de vida, mesmo quando controlado com outras variáveis como a idade. Segundo o Epidemiological Catchment Area (ECA), sujeitos com depressão maior ou subssindrômica apresentam níveis maiores de tensão em atividades domésticas, assim como irritabilidade social, estresse financeiro, limitações no funcionamento ocupacional, pior status de saúde e mais dias perdidos de trabalho do que sujeitos sem sintomas. Em relação a outras condições médicas crônicas, a depressão pode acarretar maiores prejuízos na qualidade de vida e no funcionamento social, com um comprometimento que pode ser considerado 23 vezes maior do que aquele causado por outras doenças físicas TOC Este estudo verificou que indivíduos com TOC apresentaram médias inferiores em todos os domínios da qualidade de vida, corroborando com os dadosda OMS que mencionam este transtorno como um dos mais incapacitantes. Diversos estudos também mostram menores médias de qualidade de vida no TOC quando comparados à população em geral. Os impactos negativos deste transtorno trazem diversos prejuízos na vida dos sujeitos, afetando diversas áreas, como, por exemplo, a capacidade de trabalhar e desempenhar atividades diárias, de se relacionar com outras pessoas e de desfrutar das atividades de lazer. A partir disso, os indivíduos relatam tais prejuízos, demonstrando a piora em sua qualidade de vida. TRANSTORNO BIPOLAR Os pacientes com TB têm escore significativamente mais baixo, quando comparados com a população geral. Além disso, os sintomas depressivos parecem ser o determinante primário de qualidade de vida no TB, embora outros fatores possam estar associados à depressão e à qualidade de vida reduzida no TAB. Tal achado também foi encontrado por autores que verificaram que os sintomas depressivos eram mais frequentes que os maníacos e causaram maior distúrbio de funcionamento social, familiar e ocupacional. O impacto do TB no funcionamento social, ocupacional e familiar também foi examinado em nosso meio, em trabalho realizado por Moreno e Andrade, no qual foi possível observar que o número de separações, divórcios, problemas acadêmicos e ocupacionais, acidentes e outras doenças clínicas são mais comuns entre os indivíduos acometidos da doença. 6. COMPREENDER O IMPACTO DA PANDEMIA NO DESENVOLVIMENTO E AGRAVO DO SOFRIMENTO MENTAL Há alguns fatores que predispõem a doenças mentais, como: • Menos contato social com outras pessoas; • Falta de uma rede de apoio; • Pouca exposição ao sol; • Sedentarismo; • Má alimentação; • Desemprego; • Preocupações relacionadas a dificuldades financeiras; • Medo de adoecer ou de perder entes queridos, entre outros. • Falta de acesso a serviços de aconselhamento; • Queda nos atendimentos presenciais; De certa forma, a pandemia acaba trazendo vários deles à tona. O distanciamento social é um cuidado muito importante para a prevenção da Covid-19, mas traz alguns “efeitos adversos”. Ele faz com que não vejamos nossas famílias e amigos frequentemente, reduzindo nosso contato com nossa rede de apoios. As suas consequências financeiras desencadeiam preocupações e dificuldades de acessar os bens mais essenciais para a saúde, como a alimentação. Além disso, muitas pessoas param de se exercitar e de tomar alguns minutos de sol todos os dias. Nesse sentido, alguns grupos estão ainda mais vulneráveis a doenças psíquicas. Crianças: A infância é a fase em que o contato social é mais importante. Uma das necessidades básicas das crianças é a interação com amigos e com o mundo para o desenvolvimento pleno. As brincadeiras ajudam os jovens a extravasar a energia e a lidar com os próprios desafios. A suspensão das aulas e a redução de contato com seus pares etários fazem com que as crianças fiquem mais predispostas à depressão e à ansiedade. Idosos: Os idosos são o grupo que mais recebeu atenção durante toda a pandemia. A todo o momento, eles são expostos a informações sobre os riscos de consequências graves caso adoeçam de Covid-19. Isso faz com que eles se preocupem excessivamente, predispondo-os a transtornos do humor. Além disso, o distanciamento pode desencadear um afastamento da rede de suporte que eles têm. Organizações de saúde avaliam que a pandemia de covid-19 teve um impacto devastador na saúde mundial. Dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) apontam que os efeitos foram ainda maiores na saúde mental, bem-estar e na interrupção de serviços. Estima-se que em 2030 os transtornos mentais podem custar US$ 16 trilhões à economia global. O documento “Strengthening mental health responses to COVID-19 in the Americas: A health policy analysis and recommendations”, publicado na revista The Lancet Regional Health – Américas aponta que países da América se esforçam para entender os reflexos da pandemia na população. Quatro em cada dez brasileiros tiveram algum problema de ansiedade. No Peru os sintomas de depressão cresceram cinco vezes e a ansiedade quadruplicou. Desemprego, pobreza, insegurança alimentar, foram os problemas que mais agravam a saúde mental e física das pessoas. Outro dado importante que o estudo traz foi o aumento da violência doméstica. Três vezes mais que a média mundial. Além disso, pessoas contaminadas pelo coronavírus também foram impactadas por transtornos mentais ou neurológicos. Os resultados de uma pesquisa feita também demonstraram os efeitos na saúde mental da amostra pela exposição e tipo de informação acessada a respeito da pandemia. Assim sendo, os participantes que relataram estarem mais frequentemente expostos a informações sobre mortos e infectados possuem mais chances de risco de apresentarem transtornos mentais menores. Ainda, no cenário de uma pandemia, o gerenciamento político da crise tem efeitos socioeconômicos negativos na população local, aumentando o desemprego e a insegurança financeira. Assim, se as preocupações com a saúde física e com o risco de morte são as mais suscetíveis de acontecer nesse contexto, a diminuição da renda familiar também é um fator que aflige e parece impactar negativamente na saúde mental da população. Outros estudos, conforme referido anteriormente, também apontam para uma relação entre recessão econômica do país e prejuízos na saúde mental das pessoas especialmente para aquelas diretamente afetadas. Considerando que a saúde física e mental de uma população recebe influência do contexto socioeconômico, mercado de trabalho, assistência social e políticas públicas, é possível considerar que mudanças nessas dimensões reflitam nos indicadores de bem-estar da mesma, especialmente quando já há uma prevalência anterior de transtornos mentais.
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