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Antijuridicidade e Causas de Exclusão

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Conceito
1. Não é suficiente que o comportamento seja típico, isto é, que a conduta encontre correspondência num modelo legal, adequando-se o fato à norma penal incriminadora. É preciso que seja ilícito para que sobre ele incida a reprovação do ordenamento jurídico.
2. Em face disso, surge o crime como fato típico e antijurídico.
Caráter objetivo da antijuridicidade
Antijuridicidade subjetiva
1. De acordo com essa teoria, o ordenamento jurídico é composto de ordens e proibições, constituindo fato ilícito a desobediência a tais normas. Essas ordens e proibições são dirigidas à vontade das pessoas imputáveis.
Antijuridicidade objetiva
1. Segundo essa forma de conceituação, a ilicitude corresponde à qualidade que possui o fato de contrariar uma norma.
2. A antijuridicidade deve ser determinada objetivamente, independente da culpa ou da imputabilidade do sujeito. Ela existe por si só. Em face disso, o inimputável pode realizar condutas ilícitas, embora não culpáveis. Isso ocorre porque a ilicitude, no dizer de Bettiol, resolve-se num juízo acerca da lesividade do comportamento.
3. Adotamos o critério objetivo. A ilicitude resolve-se na lesão de um bem penalmente protegido, independentemente da culpabilidade do sujeito.
Causas de exclusão da antijuridicidade
1. A antijuridicidade, segundo requisito do crime, pode ser afastada por determinadas causas, denominadas “causas de exclusão da antijuridicidade” ou “justificativas”. Quando isso ocorre, o fato permanece típico, mas não há crime: excluindo-se a ilicitude, e sendo ela requisito do crime, fica excluído o próprio delito.
2. São causas de exclusão da antijuridicidade, previstas no art. 23 do CP: 
· estado de necessidade; 
· legítima defesa;
· estrito cumprimento de dever legal; 
· exercício regular de direito.
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: 
I - em estado de necessidade; 
II - em legítima defesa; 
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. 
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo. 
Requisitos objetivos e subjetivos da justificação
1. Para a doutrina clássica, as excludentes da ilicitude têm caráter objetivo. Sua incidência requer apenas a satisfação de seus requisitos de ordem objetiva (legais).
2. Segundo passamos a entender, nos termos do finalismo, a conduta, para justificar a exclusão da ilicitude, deve revestir-se dos requisitos objetivos e subjetivos da descriminante. Assim, não é suficiente que o fato apresente os dados objetivos da causa excludente da antijuridicidade. É necessário que o sujeito conheça a situação justificante. Exs.: “Se, por exemplo, dão-se objetivamente os pressupostos do estado de necessidade de um aborto, porém o autor não os conhece ou não persegue o fim de salvação, o fato será um aborto contrário ao direito por falta dos elementos subjetivos de justificação”.
3. As causas de exclusão da ilicitude possuem um elemento subjetivo (teoria dos elementos subjetivos de justificação): é necessário que o sujeito conheça a situação de fato justificante. Caso contrário, se inexistente esse elemento subjetivo, não incide a causa descriminante, subsistindo a ilicitude e, em consequência, o crime.
4. Assim, por exemplo, na legítima defesa ou no estado de necessidade (justificante) o autor deve conhecer os elementos objetivos de justificação (agressão atual ou perigo atual) e ter “vontade de defesa ou de salvamento. Se faltar um ou outro elemento subjetivo de justificação, o autor não fica justificado, apesar dos elementos objetivos de justificação”.
5. Assim, na legítima defesa o sujeito deve conhecer a agressão e ter a intenção de defender-se, sendo indiferente que essa finalidade de defesa seja acompanhada por um sentimento de ódio ou vingança.
6. A ausência do elemento objetivo ou subjetivo no fato praticado leva à ilicitude da conduta. Essa incongruência, ensina Zaffaroni, pode operar-se de duas maneiras: 
· o sujeito satisfaz a tipicidade objetiva permissiva, mas não satisfaz a parte subjetiva (falta a intenção de defender-se, p. ex.). O sujeito responde por crime consumado.
· o sujeito satisfaz a finalidade justificante, mas estão ausentes as elementares objetivas do tipo permissivo. Ocorre uma descriminante putativa (erro de proibição).
Nota: Nos dois casos, ausentes as elementares do tipo permissivo, a conduta torna-se antijurídica.
7. O requisito subjetivo é previsto no estado de necessidade, em que o fato é praticado pelo sujeito “para salvar de perigo atual” “direito próprio ou alheio” (CP, art. 24) [grifo nosso].
8. O concurso de motivos, ensina Heitor Costa Júnior, não exclui a descriminante.
Causas supralegais de exclusão da antijuridicidade 
1. No tocante às normas penais incriminadoras, vige o princípio de reserva legal: não há crime sem lei que o defina. Essa proibição, porém, não se estende às normas penais não incriminadoras (permissivas e supletivas). Assim, a lacuna de previsão legislativa pode ser suprida pelos processos de autointegração da lei penal.
2. Existem condutas consideradas justas pela consciência social que não se encontram acobertadas pelas causas de exclusão da antijuridicidade. É o caso do professor que impõe ao aluno uma punição não prevista no regulamento escolar e aceita pelas denominadas “normas de cultura”. Suponha-se que tal punição constitua um fato típico. Apreciada a enunciação do art. 23, percebe-se que a conduta não se enquadra em nenhum de seus incisos. O professor deve ser punido? Se a consciência social presta seu assentimento ao comportamento do mestre em face de nele não haver ilicitude, a necessidade de conservação do interesse comum faz com que o fato típico não se revista de antijuridicidade penal.
3. O art. 23, III, última parte, do CP determina não haver crime quando o fato é praticado no exercício regular de direito. A expressão “direito” deve ser entendida em sentido amplo, compreendendo todo o ordenamento jurídico. O juiz pode apreciar todos os dispositivos extrapenais e concluir pela presença de um fato típico permitido pelo Direito.
Excesso nas justificativas
1. Há excesso nas causas de exclusão da antijuridicidade quando o sujeito, encontrando-se inicialmente em estado de necessidade, legítima defesa etc., ultrapassa os limites da justificativa. O excesso pode ser: 
· doloso ou consciente; 
· não intencional ou inconsciente.
2. No excesso doloso o sujeito tem consciência, após ter agido licitamente, da desnecessidade de sua conduta. Ele pressupõe tenha o agente, numa primeira fase, agido acobertado por uma descriminante. Numa segunda, consciente de que, por exemplo, a agressão injusta ou a situação de perigo já cessou, continua agindo, neste caso, ilicitamente. O excesso intencional leva o sujeito a responder pelo fato praticado durante ele a título de dolo (CP, art. 23, parágrafo único). 
3. Excesso não intencional (não doloso) é o derivado de erro, em que o autor, em face da falsa percepção da realidade motivada pelas circunstâncias da situação concreta ou pelos requisitos normativos da causa de justificação, não tem consciência da desnecessidade da continuidade da conduta. Na primeira fase ele age licitamente; na segunda, por causa do erro, passa a conduzir-se ilicitamente.
4. Adotada pelo CP a teoria limitada da culpabilidade, é necessário distinguir: 
· Se o excesso não intencional deriva de erro sobre os pressupostos fáticos da causa de justificação, cuida-se de erro de tipo (CP, art. 20, § 1º). Se escusável, ficam afastados dolo e culpa, aplicando-se o disposto no § 1º, 1ª parte; se inescusável, surge o excesso culposo, respondendo o sujeito por delito culposo, nos termos do art. 23, parágrafo único, parte final, c/c o art. 20, § 1º, 2ª parte.
· Se, entretanto, o excesso não intencional deriva de erro sobre os limites normativos da causa de justificação, trata-se de erro de proibição (CP, art. 21). Se escusável, há exclusão da culpabilidade, aplicando-se o art. 21, caput, 2ª parte; se inescusável, não há exclusão daculpabilidade, respondendo o sujeito por crime doloso, com a pena diminuída de um sexto a um terço (art. 21, caput, parte final).
Referências:
JESUS, Damásio de. Direito Penal: Parte geral – arts. 1 ao 120 do CP. Vol 1. Atualizador: André Estefam. 37 ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

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