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Sr. João, 52 anos, viúvo, com história de etilismo há cerca de 30 anos. Seu histórico de abuso de álcool é conhecido entre seus familiares, e os mesmos relatam que aumentou sua ingestão diária para oito doses de aguardente desde a viuvez precoce, há 10 anos. Tinha história de hipertensão primária e fazia uso irregular de Enalapril (5mg 12/12h). Além disso, tabagista há 40 anos, fumando em média 20 cigarros/dia. Foi levado ao pronto socorro por sua filha que relata que o achou em seu domicílio desacordado no chão com sinais de hematêmese volumosa. Além disso, informa que, há cerca de um mês, havia notado que seu pai estava com importante fraqueza, inchaços em suas pernas e barriga bastante aumentada. Sr. João ingressou ao serviço médicos com seus sinais vitais bastante comprometidos, apresentando-se taquicárdico (FC = 110 bpm), PA (80x50 mmHg) e FR = 28 irpm e com saturação de 89% ao ar ambiente. Ao exame físico, o paciente estava torporoso, ictérico (+/4+), descorado (2+/4+), tramas vasculares ingurgitadas em região cervical e tronco, eritema palmar, extremidades frias, flapping presente. O exame abdominal evidenciou abdome com importante distensão com piparote positivo, distendido e circulação colateral em cabeça de medusa. Foi prontamente intubado e feita prova de volume com Ringer Lactato e colhidas amostras de sangue para exames complementares. Exames laboratoriais iniciais mostraram: Hemoglobina 6,5g/dL (VR: 14-18g/dL) Hematócrito 21% (VR: entre 40 e 50%) Leucócitos 3680 mm3 (VR: 4.000-10.000mm3) Plaquetas 98.000 μl (VR: 150.000-450.000μl) Fosfatase Alcalina 190 (VR: 40 a 129 U/L) GGT 356 U/L (VR: 12-73 U/L em homens) Creatinina 1,3 mg/dL (VR: 0,7 a 1,3 mg/dL) Ureia 68 mg/dl (VR: 16 - 40 mg/dL) BT 2,1 mg/dL (VR: 0,20 a 1,00 mg/dL) Na 132 mEq/L (VR: 135-145 mEq/L) BD 1,0 mg/dL (VR: até 0,3 mg/dL) K 3,6 mEq/L (VR: 3,5-5,5 mEq/L) BI 1,1 mg/dL (VR: até 0,8 mg/dL) TGO 189 U/L (VR: até 37 U/L em homens) INR 1,6 (VR: 0,9 e 1,1) TGP 176 U/L (VR: até 41 U/L em homens) Albumina 3,0 g/dL (VR: 3,5-5,2 g/dL) Após paracentese diagnóstica, o líquido ascítico apresentava-se como transudato, sem suspeita de peritonite bacteriana espontânea. Por conta do quadro, havia indicação de transfusão sanguínea, e o paciente recebeu duas unidades de concentrado de hemácias. O quadro se agravou com redução do débito urinário e perfusão periférica piorada, sendo necessárias drogas vasoativas. Apesar de todos os esforços, o paciente começou a apresentar hematêmese maciça, piora da hipotensão e necessidade de aumentar a titulação de drogas vasoativas para estabilizar o quadro. No hospital, não havia serviço de endoscopia ou balão de Sengstaken Blackmore para controlar a situação. Os exames laboratoriais foram novamente realizados e mostraram provas de coagulação preocupantes: (TP = 42 seg (VR: 10 a 14 segundos), TTPa= 55 seg (VR: 25 a 45 segundos), INR = 2,5, Fibrinogênio normal, plaquetas 32.000 (VR:150.000 – 450.000/mm3)). Foi dado o diagnóstico de coagulação intravascular disseminada (CIVD) e realizada nova reposição com concentrado de hemácias, além de plasma fresco congelado. O estado agravou-se, apesar de todas as medidas terapêuticas, com evolução para óbito 24 horas depois. O sangramento ativo foi considerado como determinante para o óbito. OBJETIVOS 1. Relembrar a cirrose; 2. Correlacionar a fisiopatologia com as complicações hemorrágicas da cirrose; 3. Entender o manejo da HDA. 4. Compreender a CIVD. DEFINIÇÃO “Doença resultante de lesões que ocasionaram uma desorganização da arquitetura lobular do fígado, por fibrose ou nódulos regenerativos. ETIOLOGIAS Hepatites virais C, B e Delta Agentes Álcool, drogas (isoniazida, A-metildopa, vit A e metotrexato) Autoimunes Hepatite autoimune, colangite biliar primária e colangite esclerosante primária Metabólicas NASH (esteato-hepatite não alcoólica), hemocromatose, Wilson, deficiência de A-1-Antitripsina e tirosinemia Distúrbios vasculares IC direta e síndrome de Budd-Chiari Doenças hepatobiliares Cirrose biliar secundária, atresia de VB, ductopenia do adulto, colestase intra-hepática familiar progressiva e criptogênica EPIDEMIOLOGIA - A cirrose é uma das principais causas de morte no mundo; - Em números, a principal causa é abuso de álcool, seguida de hepatites B e C; - Aumento da doença hepática gordurosa não alcoólica; - Mais homens acima dos 45 anos e mulheres sem idade prévia; - Aumento da doença pelo crescimento do uso abusivo do álcool. FATORES DE RISCO ● Doença hepática alcoólica: ★ Etilismo. ★ Mais de 1 década de etilismo pesado; ★ Quantidade variável para cada pessoa; ★ Geral → > de 80g de etanol para homens e > 60g de etanol para mulheres, por dia. ● Esteato hepatite não alcoólica: - Associação com diabetes, obesidade e excesso de colesterol no sangue (hiperlipidemia) ● Hepatite B e C: ○ Transfusão sanguínea. ● Doenças autoimunes (hepatite autoimune ou cirrose biliar primária) ● Medicações e toxinas. ● Homens acima de 55 anos e mulheres jovens e de meia idade; ● História familiar; ● Antecedentes de Hepatite, uso de drogas endovenosas ou icterícia; FISIOPATOLOGIA BASES ANATÔMICAS E FISIOLÓGICAS DO FÍGADO ● A veia porta é formada pela junção da veia mesentérica superior e veia esplênica. ● Funções do fígado (manter a homeostase): ■ Síntese de proteínas; ■ Destoxificação e excreção de produtos de eliminação; ● Grande reserva funcional e alta capacidade de regeneração. FISIOPATOGENIA ● Na presença de fatores inflamatórios, como espécies reativas de oxigênio, fatores de crescimento e citocinas, as células estreladas podem ser ativadas e transformadas de miofibroblastos que produzem MEC, sobretudo colágenos tipo I e III, mas também proteoglicanos sulfatados e glicoproteínas. ○ Acredita-se que as células de Kupffer ativadas (tipo de macrófago do fígado), hepatocitos lesionados e células endoteliais sinusoidais produzem os fatores ativadores das células estreladas. ○ As células estreladas possuem capacidade de se auto estimular com citocinas e quimiocinas produzidas por ela, como o fator de transformação do crescimento B (TGF-b). ● Com a deposição de colágeno no espaço de Disse, ocorre perda de fenestrações dos sinusóides, levando ao espessamento da membrana basal e surgimento de alta pressão sinusoidal. ● Com o aumento da pressão intra-sinusoidal, ocorre o desenvolvimento de shunts vasculares entre a veia porta hepática e a veia hepática, assim como artéria hepática com a veia porta. ○ Gera uma pressão anormal dentro do fígado e contribui para disfunção hepática e hipertensão portal. ● Mas quando ocorre um remodelamento significativo e progressivo, o fígado perde sua capacidade regenerativa, levando a um quadro irreversível. ● Os hepatócitos normais são substituídos por nódulos parenquimatosos derivados de hepatócitos sobreviventes e de novos hepatócitos gerados, além de septos fibrosos ao redor dos nódulos. ● O sangue que circula nos sinusóides não conseguem entrar em contato com os hepatócitos e ter seus componentes metabolizados. ● Macroscopicamente o fígado cirrótico possui um aspecto nodular e endurecido, estando atrofiado em casos avançados. ● Resumindo, a cirrose é um processo resultante da deposição de matriz extracelular, morte dos hepatócitos e reorganização vascular e hepatocitária. ● Pressão na veia cava acima de 10 mmhg - sinais de hipertensão portal; ➢ Alguns estudos concordam do papel do sistema de estresse oxidativo hepático e da redução na produção do óxido nítrico, potente agente vasodilatador, na circulação porto-esplênica. ➢ Necroinflamação e fibrose; QUADRO CLÍNICO ❖ Pode ser assintomática ou ter sintomas inespecíficos; ➢ Geralmente os sintomas estão associados a complicações como hipertensão portal, insuficiência hepática e a causa base que originou a cirrose. ❖ Pode surgir: ➢ Anorexia; ➢ Perda de peso; ➢ Fraqueza; ➢ Icterícia; ➢ Ascite; ➢ Circulação colateral ➢ Edema de membros inferiores; ➢ Diminuição da pressão arterial; ➢ Telangiectasias➢ Ginecomastia; ➢ Atrofia testicular nos homens; ➢ Eritema palmar; ➢ Perda da libido e disfunção erétil. ➢ Baqueteamento digital; ➢ Osteoartropatia hipertrófica; ➢ Distrofia ungueal; ➢ Flapping; ➢ Hálito hepático (adocicado). CLASSIFICAÇÃO COMPENSADA Fase inicial da doença. Geralmente o paciente encontra-se assintomático ou apresentar sintomas inespecíficos como fadiga, perda de peso, fraqueza e anorexia. DESCOMPENSA DA Paciente pode apresentar icterícia, prurido, ascite, edema de membros inferiores, diarreia, sangramento gastrintestinal (hematêmese, hematoquezia, melena), confusão mental, entre outros. ❖ Hipertensão portal➜ ascite, edema, hiperesplenomegalia, hemorroida e varizes esofágicas. ❖ Insuficiência hepática ➜ icterícia, encefalopatia hepática, coagulopatia, hipoalbuminemia, desnutrição e até síndromes hepatorrenal e hepatopulmonar. ➢ Descompensada pode ter hipoalbuminemia e imunodepressão. ❖ Etilismo➜ neuropatías periféricas, contraturas de Dupuytren (atrofia da fascia palmar). ❖ Doença de Wilson ➜ distúrbios neurológicos por envolvimento dos gânglios da base, distúrbios do movimento, tremores, rigidez e coreia, anéis de Kayser-Fleisher que ocorrem por deposição de cobre na membrana de Descemet do olho. ❖ Hemocromatose ➜ pigmentação das áreas da pele expostas ao sol, coloração cinza metálica, além de artropatia das pequenas articulações das mãos. GRAVIDADE ★ Compensada: ○ Sintomas menos graves e frequentemente vagos; ★ Descompensada: ○ Resulta da incapacidade do fígado de sintetizar proteínas, fatores de coagulação e outras substâncias. COMPLICAÇÕES HEMORRÁGICAS “Doença resultante de lesões que ocasionaram uma desorganização da arquitetura lobular do fígado, por fibrose ou nódulos regenerativos. O fígado é o principal local de síntese de todos os fatores de coagulação (com exceção do fator von Willebrand), do plasminogênio e dos inibidores de protease antitrombina III e proteína C e S. O fígado é também o principal local de degradação de fatores de coagulação ativados. Na cirrose, ocorre redução da síntese de fatores pró-coagulantes e anticoagulantes e diminuição da depuração de fatores de coagulação ativados. Concomitantemente, observa-se plaquetopenia, secundária na maioria das vezes ao hiperesplenismo, e disfunção plaquetária de origem multifatorial. As alterações mais frequentes de coagulação são os distúrbios de hemostasia secundários à deficiência dos fatores de coagulação, demonstrados em laboratório por alargamento do INR e do tempo de protrombina e por alterações quantitativas e qualitativas das plaquetas. No entanto, também pode ocorrer fenômenos tromboembólicos e coagulação intravascular disseminada. A cirrose pode ser interpretada como um estádio avançado de fibrose no fígado que é acompanhado pela distorção do sistema vascular hepático com consequente compromisso das trocas entre os sinusóides hepáticos e o parênquima hepático adjacente. Os sinusóides hepáticos são revestidos por endotélio fenestrado que repousam sobre o espaço de Disse, que contêm as células estreladas hepáticas, algumas células mononucleares e os hepatócitos que executam a maior parte das funções hepáticas. Na cirrose, o espaço de Disse é preenchido por fibrose e as fenestrações endoteliais anuladas. As principais consequências clínicas da cirrose são devidas à perda da função dos hepatócitos e a uma resistência vascular intra-hepática aumentada (hipertensão portal que condiciona vasodilatação esplâncnica e vasoconstrição). A hipertensão portal é uma complicação grave e frequente da doença hepática crónica e está presente em mais de 60% dos pacientes. As suas manifestações clínicas como hemorragia, ascite, peritonite bacteriana espontânea, síndrome hepatorrenal, síndrome hepatopulmonar e encefalopatia hepática, representam importantes causas de morbilidade e mortalidade no doente cirrótico. O fígado desempenha um papel fulcral no sistema hemostático. Indivíduos saudáveis, presumivelmente possuem quantidades adequadas de plaquetas, fatores de coagulação e proteínas reguladoras para alcançar a formação ideal de coágulo quando necessário, assim como a sua limitação a locais de dano vascular e posterior dissolução. Por outro lado, o perfil hemostático de um doente com cirrose hepática geralmente inclui trombocitopenia, defeitos de função das plaquetas, síntese diminuída de fatores pró-coagulantes e anticoagulantes, aumento dos níveis plasmáticos FVIII e FvW e hiperfibrinólise. A capacidade de reserva hemostática normal para controlar eventos hemorrágicos e trombóticos está alterada, com uma probabilidade de hemorragia ou trombose dependente do indivíduo e do fator precipitante. As comorbilidades associadas à cirrose hepática tais como as alterações hemodinâmicas por redução do fluxo sanguíneo portal, hipertensão portal, infecções bacterianas e doença renal contribuem para o desequilíbrio homeostático no paciente com doença hepática, tal como é evidenciado pela ocorrência de hemorragias e complicações trombóticas numa proporção significativa de pacientes. Mecanismos que aumentam a susceptibilidade a eventos hemorrágicos no doente cirrótico Os doentes cirróticos apresentam um risco aumentado de hemorragia durante procedimentos diagnósticos e terapêuticos. Por exemplo, numa cirurgia abdominal têm um risco acrescido de morbilidade e mortalidade por hemorragia, representando esta, 60% de todas as mortes por este procedimento. Além disso, a hemorragia intraperitoneal é a principal complicação da biópsia hepática, em 0,4-0,5% destes procedimentos e em 0,01-0,1% é fatal. Vários fatores permitem predizer o risco de hemorragia, incluindo a gravidade da cirrose (classificação de Child-Pugh e o Score MELD). Anormalidades do Número e Função das Plaquetas A doença hepática crónica é caracterizada por um grau variável de trombocitopenia e trombocitopenia que promovem aumento da susceptibilidade a hemorragia devido ao processo deficitário de hemostase primária que inclui a adesão, agregação e ativação plaquetária. Mecanismos intra e extra plaquetários, incluindo vários defeitos de transdução de sinal, defeitos de armazenamento, e defeitos relacionados com a membrana por aumento da lipoproteína de alta densidade (HDL), foram considerados para explicar a disfunção plaquetária. As plaquetas do cirrótico exibem uma reduzida sinalização transmembrana e uma incapacidade progressiva para serem ativadas em resposta a estímulos apropriados. Muitas razões são responsáveis por este mecanismo: 1) o defeito no armazenamento de plaquetas, sendo que as concentrações de grânulos densos de moléculas de sinalização pró-trombóticas (por exemplo, fator plaquetário 4, serotonina e beta-tromboglobulina) são anormalmente baixos; 2) as plaquetas dos cirróticos secretam níveis desproporcionalmente elevados de ATP extracelular, e este excesso antagoniza a ativação induzida pelo receptor ADP de P2Y12 e insensibiliza P2Y1 resultando em menores níveis de cálcio ionizado intraplaquetário; 3) há uma acumulação intra plaquetária de mensageiros inibitórios, acentuando a limitação da atividade de fosfolipase, resultando em concentrações mais baixas de fosfato de inositol e de cálcio. O resultado final é que as plaquetas produzem menos tromboxano (TxA2) e serotonina em resposta a uma serie de estímulos – ADP, trombina, colágeno, e epinefrina – o grau de agregação plaquetária é significativamente menor em cirrose em relação a indivíduos saudáveis. O aumento da produção de dois importantes inibidores plaquetários derivados do endotélio, o óxido nítrico e a prostaciclina, podem contribuir para uma ativação plaquetária defeituosa, in vivo. No geral, a trombocitopenia é multifatorial e parece influenciar a coagulação sanguínea, limitando a produção de trombina, o que por sua vez aumenta a susceptibilidade à hemorragia. A trombocitopenia é definida como qualquer diminuição na contagem de plaquetas abaixo de 140x109 /L. É um achado comum nacirrose e pode ser relatado em 76% dos pacientes cirróticos. A trombocitopenia moderada (50-75x109 /L) é observada em aproximadamente 13% dos pacientes. Já a forma grave é definida como uma contagem de plaquetas inferior a 50x109 /L e ocorre em 1% destes doentes. Esta última pode adiar ou interferir com o diagnóstico e a terapêutica, incluindo procedimentos como a biópsia hepática, terapia antiviral e indicação médica para cirurgia eletiva. Existem várias teorias sobre a gênese da trombocitopenia em doentes com cirrose hepática. A hemorragia é uma complicação frequente, secundária à hipertensão portal e a defeitos hemostáticos inerentes, sendo o trato gastrointestinal, o local com maior risco hemorrágico. A hemorragia por varizes gastroesofágicas é um problema essencialmente relacionado com a gravidade da hipertensão portal, com uma taxa de mortalidade associada de 20 a 30%, sobretudo se as plaquetas se situam entre os 68- 160x109. Nos doentes com hemorragia ativa no momento da endoscopia, com cirrose avançada (CTP classe C ou MELD> 20), e ainda quando ocorre falência de órgãos extra-hepática ou com elevado gradiente de pressão venosa ( > 20 mmHg), a mortalidade é maior. Além disso, a hipertensão portal condiciona a esplenomegalia, com consequente sequestro de plaquetas. Alguns estudos propõem a relação diâmetro do baço/contagem de plaquetas como um indicador não invasivo de hipertensão portal e da presença de varizes gastroesofágicas; a sensibilidade diagnóstica deste rácio para varizes gastroesofágicas foi de 86%, com um valor preditivo negativo de 87%. Contudo, a normalização da pressão portal com desvio portossistêmico transjugular (TIPS) não demonstrou um benefício consistente no número de plaquetas. Outras manifestações hemorrágicas podem estar presentes nestes doentes, incluindo hematomas, púrpura, epistaxe, hemorragia gengival e menorragia. Também a insuficiência renal frequentemente complica as doenças hepáticas, podendo agravar as alterações hemostáticas. A uremia está associada a uma perturbação da interação plaqueta/parede do vaso sanguíneo, mediada por múltiplos mecanismos, incluindo anormalidades intrínsecas das plaquetas, aumento da produção de óxido nítrico e anemia. Algumas carências alimentares que estes pacientes apresentam, nomeadamente de vitamina B12, ácido fólico e ferro, também contribuem para a trombocitopenia. A supressão medular, como a do contexto do alcoolismo, constituiu outra causa. A presença de autoanticorpos dirigidos contra antígenos da superfície das plaquetas, aumentam a remoção plaquetária pelo baço. O aumento dos níveis de IgG ligados às plaquetas, sugerem a presença de auto-anticorpos reativos em pacientes com doença hepática crónica. O principal regulador da produção de plaquetas é a trombopoietina (TPO), sintetizada no fígado. A síntese desta hormona aumenta com a inflamação e a interleucina 6 (IL-6). O fígado de pacientes cirróticos, especialmente na doença avançada, apresenta baixa expressão de mRNA-TPO e pode ser responsável por uma produção deficiente de trombopoietina hepática. Distúrbios da coagulação A coagulopatia é universal nos pacientes com cirrose. Globalmente, a trombocitopenia, traduzida por um número reduzido de plaquetas funcionais tal como ocorre na cirrose, parece influenciar bastante a coagulação sanguínea, limitando a produção de trombina, a protease essencial da coagulação. Alguns autores relatam uma relação entre a gravidade da hemorragia e o grau de coagulopatia. A cirrose hepática é caracterizada por uma síntese diminuída de todos os fatores da coagulação (V, VII, IX, X, XI e protrombina). Em virtude da diminuição da massa hepática, dos distúrbios de armazenamento, das alterações dos ácidos biliares ou da colestase, frequentemente estes doentes apresentam diminuição da absorção da Vit K, logo os fatores de coagulação que dela dependem (protrombina, VII, IX e X), apresentam-se reduzidos. A disfibrinogenemia é uma anormalidade relativamente frequente nos pacientes com doenças hepáticas, devido à polimerização da fibrina. Em doentes com doença estável os níveis de fibrinogênio estão normais, mas os níveis diminuem na cirrose descompensada. A fibrinólise A lise do coágulo formado durante a coagulação (fibrinólise) pode igualmente ser alterada, por diminuição dos níveis de alfa 2-antiplasmina, FXIII, e TAFI, ou por níveis elevados de t-PA. Estes componentes atuam no sentido da degradação da fibrina, ocorrendo hiperfibrinólise que leva ao aumento da susceptibilidade à hemorragia: por interferência na formação de coágulos e promoção prematura da sua dissolução, aumento do consumo de fatores de coagulação e ainda por diminuição da agregação plaquetária que ocorre pela degradação de receptores de fibrinogénio nas plaquetas. A fibrinólise sistêmica pode ser detectada em 30 a 46% dos pacientes com doença hepática crônica, cuja gravidade é paralela ao grau de disfunção hepática. No entanto, a hiperfibrinólise clinicamente evidente é menos comum e tem sido estimada em 5 a 10% dos pacientes com cirrose descompensada. Em diversas situações clínicas, a hiperfibrinólise pode desempenhar um papel importante, na ruptura de varizes gastroesofágicas, pode definir-se como o principal marcador preditivo do primeiro episódio de hemorragia digestiva alta. Mecanismos que aumentam a susceptibilidade a Trombose no doente cirrótico Paradoxalmente, hoje em dia há um crescente reconhecimento de várias complicações trombóticas que podem ocorrer em pacientes com doença hepática crónica. Embora a hipercoagulabilidade possa explicar a ocorrência de trombose, de acordo com a tríade de Virchow, também as alterações hemodinâmicas e a lesão vascular podem constituir fatores contributivos. Existem situações clínicas nas quais o equilíbrio pró-coagulante e anticoagulante é perturbado na cirrose, tais como a administração de fatores de crescimento plaquetário. Os pacientes com cirrose estão expostos a muitos fatores de risco para eventos tromboembólicos, incluindo as neoplasias, a idade avançada, os procedimentos cirúrgicos, a hospitalização prolongada e a inatividade. MANEJO DA HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA Geralmente, o exame físico é capaz de fornecer todas as informações necessárias sobre a perda de sangue. Nessa etapa, é importante lembrar de que a hemorragia provoca respostas orgânicas diferentes em idosos, atletas, crianças e indivíduos com doenças crônicas. Quanto ao tipo, os quadros hemorrágicos podem ser arteriais, venosos ou capilares. Nas artérias, o sangue é liberado em um jato pulsátil, com coloração vermelho viva. Os rompimentos venosos, por sua vez, provocam um vazamento mais lento, de tom mais escuro, em que o sangue escorre pela ferida. Os vazamentos capilares são mais superficiais, caracterizando-se pela cor intermediária e pelo gotejamento lento. Em relação à localização, as hemorragias podem ser externas ou internas. As primeiras são facilmente identificáveis, e as internas representam um desafio maior. Pacientes nessa situação costumam apresentar palidez, fadiga, pulso rápido e fraco, sede, queda de pressão, respiração acelerada, náuseas ou vômitos com sangue, desmaios e confusão mental. Existe ainda uma terceira classificação, referente às hemorragias internas que se exteriorizam. Nesses casos, o sangue é encontrado nas fezes, na urina, no útero, na tosse ou no nariz. Com base nos sinais clínicos mencionados, o Guia de Suporte Avançado de Vida no Trauma (Advanced Trauma Life Suport – ATLS) do Colégio Americano de Cirurgiões descreve quatro classes de hemorragia, que estimam o nível da perda sanguínea: >> CLASSE I: perda de menos de 15% do volume total de sangue e sinais vitais normais. Pacientes saudáveis não necessitam de transfusão. >> CLASSE II: perda entre 15% e 30% do volume sanguíneo. Há taquicardia, taquipneia e pressão de pulso diminuída. Algumas pessoas se estabilizam com soluções cristalóides, outras precisam de transfusão. >> CLASSE III: perda de 31% a40% do sangue, com queda da pressão arterial e alteração do estado mental. Frequência cardíaca e respiratória se elevam. É necessário administrar concentrado de hemácias e demais produtos sanguíneos. >> CLASSE IV: perda de mais de 40% do volume sanguíneo, resultando em depressão significativa da pressão arterial e do estado mental. Há taquicardia de mais de 140 bpm e redução expressiva da diurese. É preciso realizar transfusão e procedimento cirúrgico imediato. EDA pelo menos 3h do último sangramento Dose de ataque de IBP (omeprazol) Suspeita de hepatopatia (rocefin) para prevenção de PBE Vasoconstrictor esplâncnico ● Usar bromoprida (antiemético) para hematêmese? - procinético, risco maior Pacientes hepatopatas por alcoolismo - repor tiamina para prevenção de síndrome de wernicke korsakoff*** Prevenção de crises de abstinência - diazepam (gabaérgico, simula o álcool) e risperidona para agitação.. O octreotide é um análogo da somatostatina que inibe a secreção de alguns hormônios hipofisários e gastrointestinais, aumentando a resistência arteriolar esplâncnica, diminuindo o fluxo gastrointestinal e, por consequência, o fluxo linfático. - Controle emergencial para cessar o sangramento e proteger contra o ressangramento causado por varizes gastroesofágicas em pacientes com cirrose. Octreotida deve ser usado em associação com tratamento específico, como a escleroterapia endoscópica. Lactulose para prevenção e tto de encefalopatia hepática. Ordem da prescrição na enfermaria - Cuidados gerais - Sintomáticos - tratamento - cuidados gerais para monitorização. CIVD Síndrome adquirida secundária a outras condições clínicas graves que promovem resposta inflamatória exacerbada, capaz de ativar o sistema de coagulação sanguínea, com ativação e consumo dos fatores de coagulação,e consequente trombose de pequenos e médios vasos (por deposição de fibrina), podendo ocasionar disfunção orgânica e sangramentos. Mecanismos envolvidos na formação de fibrina na CIVD: 1. Ativação da resposta inflamatória; 2. Aumento da geração de trombina; 3. Supressão das vias naturais de anticoagulação; 4. Fibrinólise comprometida. ETIOPATOGENIA ❖ Complicações obstétricas: ➢ O tecido placentário expõe o fator tecidual para a circulação materna. ❖ Infecções: ➢ Endotoxinas provocam geração ou exposição do fator tecidual em células fagocíticas, endoteliais ou teciduais; ➢ Principalmente por Gram-negativos. ❖ Choque: ➢ Lesão tecidual isquêmica ou exposição do fator tecidual. ❖ Câncer: ➢ Principalmente adenocarcinomas do pâncreas secretoras de mucina, adenocarcinomas de próstata e leucemia promielocítica aguda. ❖ Lesão tecidual grave por traumas, queimaduras, úlcera por geladura e ferimentos por arma de fogo; ❖ Complicações pós cirurgia de próstata; ❖ Hemólise intravascular profunda; Desequilíbrio entre a formação intravascular de fibrina e sua remoção. O início é o Fator Tissular (TF) dependente, expresso em células endoteliais e mononucleares durante o processo inflamatório instalado. Sob ação dos mediadores químicos e proteína C reativa, o FT é expresso durante a resposta inflamatória. Essas células ativadas liberam citocinas pró-inflamatórias, induzindo a coagulação. Há um feedback positivo entre coagulação e resposta inflamatória. Há uma disfunção dos anticoagulantes naturais, que auxiliam na deposição de fibrina e trombose, mas também há o consumo e consequente depleção dos fatores de coagulação e plaquetas, o que frequentemente resulta em hemorragias. Assim, há a ocorrência simultânea de trombose e sangramento. QUADRO CLÍNICO Depende da causa e da condição ser aguda ou crônica. DIAGNÓSTICO Não existe um teste laboratorial único (ou combinação de testes) que seja suficientemente específico ou sensível para permitir o diagnóstico definitivo de CIVD. Geralmente, o diagnóstico é feito considerando a doença de base e uma combinação de testes laboratoriais. Os testes realizados em série são mais úteis para o diagnóstico de CIVD do que um exame laboratorial realizado isoladamente. Em 2001, o Subcomitê de Coagulação Intravascular Disseminada da Sociedade Internacional de Hemostasia e Trombose propôs um sistema de algoritmo para o diagnóstico de CIVD, empregando testes laboratoriais simples que podem ser realizados em quase todas as unidades de emergência. TRATAMENTO - Suporte hemodinâmico e/ou ventilatório; - Hidratação agressiva para reação hemolítica; - Transfusão de concentrado de hemácias devido ao sangramento; - Transfusão de plaquetas para corrigir a trombocitopenia (no caso da queda rápida na contagem de plaquetas ou de plaquetas < 10.000 a 20.000/microL); - Plasma fresco congelado para aumentar os níveis dos fatores de coagulação e anticoagulantes naturais (antitrombina, proteínas C, S e Z); - Crioprecipitado para substituir o fibrinogênio (e o fator VIII) se o nível de fibrinogênio estiver caindo rapidamente ou for < 100 mg/dL (< 2,9 micromol/L). - A heparina é útil no tratamento da CIVD de desenvolvimento lento com trombose venosa ou embolia pulmonar; - Não há indicação de anticoagulação profilática em pacientes com CIVD aguda ou crônica. - Agentes antifibrinolíticos, como ácido tranexâmico, ácido epsilon-aminocapróico ou aprotinina são contraindicados.
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