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Bioquímica Clínica Análise Das Proteínas e Hepatograma DESCRIÇÃO Principais aminoacidopatias. Proteínas plasmáticas, de fase aguda e do metabolismo do ferro. Hepatograma. PROPÓSITO Conhecer as características dos aminoácidos, das proteínas e enzimas hepáticas é fundamental para compreender os distúrbios/patologias que envolvem esses elementos, permitindo determinar de forma acurada os exames laboratoriais e o fornecimento de diagnósticos mais precisos. OBJETIVOS Módulo 1 Descrever os distúrbios no metabolismo de aminoácidos e os padrões de eletroforese de proteínas plasmáticas em diferentes patologias Módulo 2 Descrever o metabolismo do ferro, suas deficiências e o diagnóstico laboratorial Módulo 3 Relacionar as patologias hepáticas com as alterações no hepatograma INTRODUÇÃO Quando estudamos a fisiologia humana, dividimos o organismo em várias partes para facilitar a análise, mas os sistemas estão todos integrados, não é verdade? Portanto, aqui, você estudará a Análise de proteína e hepatograma dividida em três módulos: um sobre aminoácidos e proteínas; outro sobre metabolismo do ferro; e o último sobre o fígado. À primeira vista, os assuntos podem parecer estranhos entre si, mas, acredite, não são. Veremos as alterações genéticas pontuais que afetam vias metabólicas de aminoácidos, causando distúrbios ligados a funções hepáticas e alterando o perfil proteico no plasma sanguíneo. Logo, pequenas mudanças geram alterações que impactam todo o organismo. O fígado é o órgão que produz a maior parte das proteínas plasmáticas e de fase aguda. Entre elas, estão aquelas que participam do metabolismo do ferro. O bom funcionamento desse órgão complexo e vital para a manutenção da vida pode ser avaliado com a ajuda de exames laboratoriais que envolvem essas e outras substâncias, permitindo auxiliar diagnósticos e acompanhar patologias associadas. Para isso, você precisará, primeiro, entender cada parte desse todo. Vamos lá! MÓDULO 1 Descrever os distúrbios no metabolismo de aminoácidos e os padrões de eletroforese de proteínas plasmáticas em diferentes patologias DISTÚRBIOS DO METABOLISMO DE AMINOÁCIDOS Cadeia de aminoácidos ou biomoléculas chamadas proteínas. As proteínas são as moléculas orgânicas mais abundantes no corpo humano e desempenham funções vitais para o organismo, como catálise de reações químicas, transporte, contração muscular, sinalização intracelular, controle da expressão gênica e funções estruturais. Elas são formadas a partir da união de aminoácidos por meio de ligação peptídica: ligação covalente entre o radical amino (-NH2) de um aminoácido e o ácido carboxílico (-COOH) de outro. Estrutura molecular e a formação de ligação peptídica entre eles. Os distúrbios do metabolismo de aminoácidos, também chamados de aminoacidopatias, são, em sua maioria, hereditários. Transmitidos de forma autossômica recessiva, ou seja, cada um dos pais transmite uma cópia do gene defeituoso. O defeito afeta a atividade de determinadas enzimas, causando acumulação de substratos que, em alguns casos, podem ser tóxicos e gerar danos a tecidos e/ou órgãos. Em outros, pode levar à diminuição da produção de produtos importantes do metabolismo, como veremos mais adiante. Os quadros clínicos, portanto, resultam de defeitos na decomposição (metabolismo/ação enzimática) dos aminoácidos, acarretando maiores concentrações nos líquidos biológicos, como sangue, urina, líquor e outros. Algumas aminoacidopatias se apresentam como defeitos no transporte de aminoácidos nos túbulos renais. Nesses casos, esses distúrbios renais são chamados de distúrbios renais de aminoácidos, com o aumento de aminoácidos sendo detectados apenas na urina. PRINCIPAIS AMINOACIDOPATIAS Fenilcetonúria (PKU) Este é um dos distúrbios do metabolismo de aminoácidos mais conhecidos. A criança nasce com quantidades insuficientes da enzima fenilalanina hidroxilase, responsável pela catálise da fenilalanina em tirosina, levando ao acúmulo de fenilalanina, fenilpiruvato e fenilactato no plasma e na urina. Se o defeito não for detectado de forma rápida e o bebê submetido a uma dieta especial, pode desenvolver retardo mental, já que a fenilalanina é tóxica para o cérebro. Vale ressaltar que existem três tipos de PKU, de acordo com a atividade da enzima hidroxilase. Veja a seguir alguns tipos de fenilcetonúria. Fenilcetonúria clássica A atividade da enzima praticamente não existe (inferior a 1%). Nesses casos, os níveis plasmáticos de fenilalanina são superiores a 20 mg/dL. Fenilcetonúria leve A atividade da enzima é de 1 a 3% e os níveis plasmáticos de fenilalanina estão entre 10 mg/dL e 20 mg/dL. Hiperfenilalaninemia transitória ou permanente A atividade enzimática é superior a 3% e os níveis de fenilalanina ficam entre 4 mg/dL e 10 mg/dL. Este quadro é benigno e não apresenta sintomatologia. Qual teste poderia ajudar a diagnosticar doenças metabólicas, genéticas e infecciosas? Saiba mais Doença de Hartnup Este é outro defeito inato e envolve o transporte de aminoácidos nos túbulos renais e no intestino. Neste caso, os aminoácidos neutros não são devidamente reabsorvidos e são encontrados em grandes quantidades na urina. Também é comum ter quantidades aumentadas de indóis na urina. Os indóis são metabólitos resultantes da decomposição bacteriana do triptofano, quando esse aminoácido não é absorvido no intestino. O quadro clínico da doença, como o desenvolvimento de dermatite e ataxia cerebelar, parece ser consequência da falha em absorver o triptofano no intestino e também de reabsorvê-lo nos túbulos renais. Isso leva à deficiência de nicotinamida: vitamina essencial do complexo B, sendo uma forma da vitamina B3. Doença da urina de xarope de bordo (DXB) Também conhecida como leucinose, a DXB é uma doença inata que afeta o metabolismo dos aminoácidos leucina, isoleucina e valina. O distúrbio é caracterizado pela deficiência de atividade do complexo enzimático alfacetoácido-desidrogenase, levando ao acúmulo dos subprodutos desses aminoácidos. Isso causa alterações neurológicas, como convulsões e deficiência intelectual, e produz um odor característico na urina – que também pode se apresentar em outros líquidos corporais. Você sabia O xarope de bordo, em inglês maple syrup, é pouco conhecido no Brasil, mas utilizado nos Estados Unidos e no Canadá como condimento para as panquecas. Ele apresenta cheiro adocicado que lembra açúcar queimado ou caramelo, mesmo cheiro observado na urina dos pacientes com DXB. A presença da DXB é detectada pelo aumento dos aminoácidos no sangue em exames de triagem neonatal ampliada (que não é fornecida pelo SUS), utilizando a espectrometria de massa em tandem. O diagnóstico é confirmado por exame genético, conforme discutiremos a seguir. Cistinúria e cistinose A cistinúria é um exemplo de distúrbio inato que afeta o transporte de aminoácidos nos túbulos renais. O defeito leva à menor reabsorção de cistina, o que aumenta a sua concentração na urina. A cistina é resultado da oxidação do aminoácido cisteína e, por ser mais estável, é a maneira que prevalece tanto no sangue quanto na urina. O excesso de cistina forma cálculos de cistina, devido à sua baixa solubilidade na urina ácida. Os cristais terminam por se depositarem nos rins, na bexiga, na pelve renal e/ou nos ureteres. Isso pode levar à insuficiência renal ou à infecção do trato urinário, já que os cristais podem criar um ambiente propício ao acúmulo de bactérias. Veja a seguir as três formas clínicas de cistinose. Cistinose infantil É a forma mais comum e mais agressiva. Também chamada de cistinose nefropática. Cistinose de aparecimento tardio Também denominada cistinose juvenil ou intermediária. É mais branda do que a infantil. Na imagem, há cálculos de cistina encontrados na urina. Cistinose benigna Chamada também de cistinose não nefropática. É a forma mais branda,costuma acometer os adultos afetando apenas os olhos. É importante não confundir cistinúria com cistinose. Na cistinose, há comprometimento do transporte de cistina dos lisossomos para o citoplasma, resultando no seu acúmulo no interior dos lisossomos. Ou seja, na cistinose, a cistina se acumula nas células e em diferentes tecidos, e não é excretada em excesso na urina como na cistinúria. Homocistinúria clássica Esta é outra doença hereditária recessiva autossômica. Neste caso, o metabolismo afetado é do aminoácido homocisteína, resultante da metabolização do aminoácido metionina proveniente da alimentação. O distúrbio é causado pela ausência da enzima cistationina β-sintase, levando ao acúmulo de homocisteína e metionina. O quadro clínico pode apresentar distúrbios de visão, deficiência intelectual e anomalias esqueléticas. O diagnóstico laboratorial se baseia em exames de sangue e urina para dosar os níveis dos aminoácidos envolvidos. É possível utilizar o teste do pezinho para o diagnóstico precoce. Tirosinemia Esta doença hereditária é resultante de uma mutação que afeta enzimas que metabolizam o aminoácido tirosina. A metabolização da tirosina acontece em cinco etapas e o distúrbio pode afetar três das enzimas que participam desta transformação, são elas: Tirosinemia tipo I Resultado da deficiência da enzima fumarilacetoacetato hidrolase, com acúmulo de fumarilacetoacetato. Apresenta a clínica mais agressiva, podendo, em sua forma crônica, levar à insuficiência hepática, crise neurológica e até hepatocarcinoma. Tirosinemia tipo II Resultado da deficiência da enzima tirosina aminotransferase e da não formação do ácido 4- hidroxifenilpiruvato. Essa forma não está associada a danos hepáticos e sua clínica costuma acometer olhos, pele e Sistema Nervoso Central. Tirosinemia tipo III A deficiência da enzima 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase, que gera um acúmulo de tirosina e do ácido 4-hidroxifenilpiruvato, tem pouca incidência e geralmente só acomete o Sistema Nervoso Central. Em todos os tipos de tirosinemia, a análise laboratorial característica é aminoacidemia acentuada e altas concentrações de tirosina, fenilalanina e metionina no sangue. Contudo, o achado relevante é a presença de succinilacetona na urina (ou no líquido amniótico, no caso de pré- natal). No caso de suspeita de tirosinemia do tipo III, também é possível realizar testes de função hepática (que estudaremos a seguir). Para confirmação de diagnóstico, podem ser realizados testes genéticos. Alcaptonúria Também conhecida como acidúria homogentísica, a alcaptonúria é outra doença hereditária autossômica recessiva. Neste caso, o defeito leva à deficiência da enzima ácido homogentísico oxidase que, por sua vez, leva ao acúmulo do ácido homogentísico ̶ um composto intermediário da via de degradação dos aminoácidos fenilalanina e tirosina, no sangue, na urina e nos tecidos. O ácido homogentísico se oxida e polimeriza em contato com o ar, formando a alcaptona (por isso, o nome alcaptonúria), um pigmento negro que dá cor à urina dos afetados pela doença. O pigmento também pode se depositar em órgãos e tecidos, o que é chamado de ocronose. Os sinais clínicos mais comum são: artropatia ocronótica, ocronose cardiovascular, cutânea e ocular, e obstrução do trato geniturinário por cálculos ocronóticos. O diagnóstico se baseia na coloração da urina e detecção do ácido homogentísico no plasma e na urina. Análise clínica das aminoacidopatias As aminoacidopatias podem ter seu diagnóstico a partir da análise das concentrações de aminoácidos no plasma e/ou na urina. No caso das aminoacidopatias hereditárias, a amostra mais relevante é o plasma, que fornece uma visão geral da via metabólica. Como a excreção dos aminoácidos é muito variável, a urina não se apresenta como uma boa amostra para análise. Entretanto, ela é a melhor escolha para análise das aminoacidopatias renais, porque, nesses quadros, o metabolismo dos aminoácidos está normal, mas a reabsorção nos túbulos renais está comprometida. As anormalidades aparecerão na urina. TESTE DETECTA PATOLOGIA Cianetonitroprussiato Grupamentos sulfidrila Cistinúria e homocistinúria Nitrosonaftol Metabólitos da tirosina Tirosinemia Cloreto férrico Cetoácidos Fenilcetonúria Concomitante a estes testes, utiliza-se cromatografia semiquantitativa no sangue e na urina Quadro: Testes urinários para investigação de aminoacidopatias. Elaborado por Kathleen Gonçalves. Nenhum dos testes nesse quadro é específico. Contudo, resultados positivos podem direcionar para a realização de exames mais acurados. Quando apontam que determinado aminoácido está em concentrações maiores do que o normal, é indicado o uso de técnicas quantitativas, como a cromatografia de troca iônica, rotineiramente usada na análise de aminoácidos. Em casos agudos, devido ao tempo de análise, ela tem sido substituída pela espectrometria de massa em tandem, técnica bastante sensível e rápida, que permite diagnóstico de amplo espectro de doenças metabólicas em uma única corrida analítica, como a PKU e outras hiperfenilalaninemias; DXB; homocistinúria; tirosinemias do tipo I, II e III; alcaptonúria e outras aminoacidopatias. As amostras são de sangue, coletadas em papel filtro. A cromatografia líquida (HPLC), que usa amostras de plasma heparinizado ou urina, também é bastante precisa e permite quantificar diversos aminoácidos ao mesmo tempo. Para dosagem de succinilacetona na urina (tirosinemia do tipo I), é comum usar cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massa. Para confirmação de distúrbios inatos do metabolismo de aminoácidos em indivíduos já nascidos, o sequenciamento completo do gene de interesse costuma ser o teste de escolha, realizado a partir de amostra de sangue total. No caso dos exames pré-natal, essa confirmação dos distúrbios inatos do metabolismo poderia ser das seguintes formas: Procedimento para realização da Amniocentese. Amniocentese – Procedimento invasivo para obter líquido amniótico a partir da 15ª semana de gestação. Alguns exames utilizam diretamente o líquido amniótico, mas a maioria dos testes depende da cultura celular inicial. Representação da vilosidade coriônica. Amostras de vilosidade coriônica – Procedimento invasivo para obter o tecido-alvo realizado entre a 10ª e a 12ª semanas de gestação. A vantagem sobre a amniocentese é o menor tempo para coleta; contudo, o risco de perda fetal é mais elevado. Estrutura de DNA. Análise pré-natal de DNA – Realizada no caso em que os pais são afetados pela doença ou são portadores conhecidos da mutação. ALBINISMO E O METABOLISMO DA TIROSINA A especialista Kathleen da Silva Gonçalves fala sobre a fisiopatologia do albinismo e seu diagnóstico clínico e laboratorial. PROTEÍNAS PLASMÁTICAS Os níveis plasmáticos das proteínas têm grande relevância na avaliação do estado nutricional dos indivíduos e no diagnóstico de doenças sistêmicas, tanto agudas como crônicas. A dosagem isolada de proteínas plasmáticas totais não permite uma avaliação precisa, pois o aumento dos níveis de determinada fração pode, por exemplo, ser compensado pela diminuição dos níveis de outra fração de proteínas (veremos mais adiante o que representam essas frações). Entretanto, há casos em que alterações nos valores totais podem indicar determinados quadros clínicos como, por exemplo: Quando há diminuição acentuada dos níveis proteicos, característica de estados de desnutrição grave, doenças hepáticas e renais. Quando há aumento acentuado, característico de certas doenças infecciosas ou alguns tipos de câncer, como o mieloma múltiplo. Já foram identificados mais de cem tipos de proteínas no plasma sanguíneo, estudados a partir de sangue coletado sem anticoagulante separando-se o soro. Elas podem ser avaliadas como proteínas totais pelos métodos bioquímicos (turbimetria, floculação, química seca), imunológicos ou por ultracentrifugação. Porém,quando se quer avaliar componentes específicos, utiliza-se a técnica de eletroforese padrão de proteínas plasmáticas, que permite o fracionamento dessas moléculas em cinco frações: albumina, alfa-1 globulina, alfa-2 globulina, betaglobulina e gamaglobulina, conforme a figura a seguir. Padrão eletroforético normal das frações de proteínas plasmáticas no soro. Para se fazer uma análise clínica correta a partir das alterações apresentadas no resultado da eletroforese, é indispensável conhecer os valores normais apresentados na tabela a seguir. Proteínas* % g/dL Totais 100 6,0 a 8,0 Albumina 50,0 a 63,0 3,2 a 5,5 Alfa-1 2,5 a 5,7 0,2 a 0,4 Alfa-2 5,8 a 13,0 0,5 a 0,9 Beta 8,5 a 14,7 0,6 a 1,1 Gama 11,8 a 20,2 0,7 a 1,5 * Os valores relativos e absolutos apresentam pequenas variações dependendo dos diferentes reagentes bioquímicos e tipos de eletroforese usados. Tabela: Intervalos normais das concentrações totais e frações de proteínas plasmáticas no soro. Extraída de NAOUM, P. C., 2010, p.291. A eletroforese, juntamente com a dosagem de proteínas totais, oferece um quadro bem completo para a análise de determinadas patologias e pode ser utilizada também para o acompanhamento da evolução clínica dos pacientes. Análise laboratorial de proteínas plasmáticas O fígado é o local onde a maioria das proteínas plasmáticas é produzida e, por esse motivo, a análise das proteínas séricas é fundamental para avaliação da função desse órgão. Não se preocupe, nosso foco agora serão as proteínas plasmáticas, e a função hepática abordaremos no último módulo. Os métodos laboratoriais para o estudo das proteínas circulantes podem ser quantitativos, semiquantitativos ou qualitativos. Os utilizados mais frequentemente são: Determinação da concentração de proteínas totais Determinação da relação albumina/globulinas Separação por eletroforese das proteínas séricas Qual a diferença entre análise qualitativa e análise quantitativa? Análise qualitativa Os elementos a serem detectados são identificados a partir da coloração, odor, ponto de fusão, ponto de ebulição e solubilidade. Ex.: No caso da eletroforese, a análise qualitativa é feita pela comparação dos tempos de migração dos padrões utilizados com os tempos de migração das proteínas do soro. Análise quantitativa É realizada por densitometria, que calcula a porcentagem da área de cada fração. Eletroforese de proteínas no soro Grande parte das patologias que envolvem proteínas do plasma afeta não apenas uma, mas um grupo de componentes proteicos. É por isso que a análise dos padrões eletroforéticos é bastante comum nos diagnósticos médicos. A eletroforese de proteínas, apesar de ser um método semiquantitativo, permite a dosagem da concentração total das proteínas em amostras de soro de pacientes. Durante o exame laboratorial, podemos usar duas metodologias de eletroforese: a eletroforese convencional ou a capilar, que são: Eletroforese convencional As proteínas migram em um meio poroso, que pode ser de acetato de celulose, gel de agarose ou gel de poliacrilamida. A separação acontece com a formação de bandas (frações) de proteínas. É um método manual em sistema aberto, ou seja, o meio em que as proteínas migram é manipulado. Eletroforese capilar As proteínas migram por um tubo capilar e são separadas por tamanho e pelas propriedades físico-químicas. É um sistema fechado e pode ser manual ou automatizado. Na eletroforese convencional, obtêm-se cinco frações, já na eletroforese capilar, que possui alta capacidade de resolução, é possível verificar seis frações, pela subdivisão da fração beta em beta-1 e beta-2. Outra vantagem da eletroforese capilar é que o processo pode ser automatizado e, assim, os resultados são mais rapidamente liberados. (A) Gráfico da separação eletroforética de proteínas do soro. (B) Frações proteicas separadas em gel por eletroforese. Em ambos, vemos o padrão normal das frações. Podemos utilizar diferentes métodos. O quadro a seguir faz um resumo desses métodos: Método Aplicação Resolução Acetato de celulose Rotina laboratorial Boa Gel de agarose Rotina laboratorial Boa Gel de poliacrilamida Pesquisa Excelente Isoeletrofocalização Screening (triagem de alterações enzimáticas) e pesquisa Excelente Capilar eletro-osmótica Rotina laboratorial Excelente Quadro: Sensibilidade e aplicação dos principais métodos eletroforéticos. Extraído de NAOUM, P. C., 2010, p. 6. PROTEÍNAS DAS FRAÇÕES ELETROFORÉTICAS Albumina É a proteína mais abundante no plasma (60% do total proteico). É produzida no fígado e suas principais funções são a manutenção da pressão osmótica no plasma e o transporte de diversas substâncias endógenas e exógenas, como os ácidos graxos e fármacos. Por ser uma molécula de tamanho bem reduzido, é comum ser excretada pela urina quando há danos aos glomérulos renais. A diminuição acentuada de sua concentração, chamada de hipoalbuminemia, é indicativa de quadros clínicos caracterizados por: 1. Síntese reduzida, como nas hepatopatias; 2. Aumento do seu catabolismo, como em neoplasias malignas, insuficiência cardíaca congestiva, doenças inflamatórias e infecciosas crônicas; 3. Perda acentuada, como em síndrome nefrótica, enteropatias e queimaduras graves. A albumina atua na manutenção da pressão oncótica, sua baixa concentração gera o edema. Alfa-1 globulina Embora essa fração seja formada por várias proteínas, 90% dela é composta de alfa-1 antitripsina. A porção restante é composta por alfa-1 glicoproteína ácida, alfafetoproteína e algumas proteínas carreadoras. A alfa-1 antitripsina é um inibidor de proteases e seus níveis geralmente estão aumentados quando há processos inflamatórios, infecciosos e imunes. Essa proteína é codificada por dois alelos codominantes denominados M e Z. A homozigose ZZ acarreta redução drástica ou, até, a ausência da proteína e está relacionada ao surgimento de enfisema panlobular grave ou cirrose hepática na infância. Nesses casos, a eletroforese de proteínas plasmáticas possibilita o diagnóstico, pois a fração alfa-1 praticamente desaparece, mas o diagnóstico deve ser confirmado por técnicas imunoenzimáticas. Entretanto, os casos de heterozigose para a deficiência de alfa-1 antitripsina não podem ser detectados pela eletroforese. A proteína alfa-1 glicoproteína ácida (AAGP), também chamada de orosomucoide, é outra proteína de fase aguda encontrada nessa fração. Ela faz parte do grupo das mucoproteínas e é sintetizada nos hepatócitos. O exame de mucoproteínas no sangue é utilizado para monitoramento de processos inflamatórios. No entanto, este ensaio não apresenta boa reprodutibilidade por sofrer interferência de fatores como temperatura e tempo de estocagem. Por isso, ele é substituído pela dosagem da AAGP, que é a principal constituinte destas glicoproteínas. A amostra é de sangue e o método, em geral, é a imunoturbidimetria. Veja a seguir o que seus níveis podem indicar. Níveis aumentados Níveis aumentados Artrite reumatoide; Lúpus eritematoso disseminado; Neoplasias; Infarto do miocárdio; Outros casos com quadros inflamatórios e traumas. Níveis reduzidos Níveis reduzidos Hepatopatias graves; Enteropatias com perda proteica; Desnutrição. Alfa-2 globulina É composta por proteínas como haptoglobina, alfa-2 macroglobulina, ceruloplasmina, eritropoetina, colinesterase e outras, mas a maior parte corresponde à haptoglobina e alfa-2 macroglobulina. Sua concentração aumenta frente a infecções, quadros inflamatórios e processos imunológicos, pois, assim como a fração alfa-1, é uma proteína de fase aguda. A alfa-2 macroglobulina é um inibidor de proteases produzido pelo fígado, por isso sua diminuição é observada em quadros de hepatopatias crônicas. Já a elevação de seus níveis é característica da síndrome de deficiência imunológica adquirida (AIDS). Na síndrome nefrótica, sua concentração cresce de forma significativa (cercade 10 vezes). Como é uma das maiores proteínas globulínicas, seus níveis séricos podem ficar iguais, ou até maiores, do que os da albumina. A haptoglobina é um marcador bastante sensível de hemólise intravascular. Por esse motivo, em síndromes hemolíticas, como alguns tipos de anemias, seus níveis se encontram notadamente diminuídos. Apresenta-se com concentrações aumentadas em processos inflamatórios agudos. Betaglobulina Composta por um grupo bem heterogêneo de proteínas. As mais importantes do ponto de vista clínico são a transferrina e o complemento C3. A transferrina tem como função primordial o transporte do ferro no plasma sanguíneo. Assim, a elevação dos seus níveis séricos é um bom indicador de carência de ferro, como acontece na anemia por deficiência de ferro (anemia ferropriva). Concentrações diminuídas são observadas em hepatopatias crônicas, uma característica comum nas proteínas sintetizadas no fígado. Voltaremos a falar da transferrina no próximo módulo. O complemento C3 é um componente do sistema complemento e atua como mediador em diversas reações que envolvem o sistema imunológico. Também é considerado uma proteína de fase aguda e, portanto, a elevação de seus níveis plasmáticos é um importante marcador da presença de processos infecciosos. Saiba mais É possível separar as frações em beta-1 e beta-2 globulinas ao acrescentarmos 100 mg de cálcio em um litro do tampão utilizado na eletroforese. Gamaglobulina É composta por todas as classes de imunoglobulinas (Igs): IgA, IgD, IgE, IgG e IgM, que podem ser encontradas no plasma sanguíneo e nos líquidos orgânicos. Cada uma dessas imunoglobulinas tem concentrações e funções diferentes em nosso organismo, conforme observado no quadro a seguir. A maioria dos anticorpos no plasma é do tipo IgA, IgG e IgM. Tipos Concentração plasmática Características e principais funções IgA 10 a 15% Imunoglobulinas presentes nas secreções das mucosas, líquidos intestinais e lágrimas. Sua principal função é antimicrobiana. IgD < 1% A função da IgD circulante é desconhecida. IgE < 0,5% Medeia reações alérgicas e de hipersensibilidade. IgG 70 a 75% Ativação do complemento, neutralização de toxinas e combate às infecções. A IgG1 é a subclasse predominante, constituindo 65% da IgG total. A IgG de origem materna proporciona imunidade passiva ao recém- nascido e é transportada pela placenta. IgM 5 a 10% Primeiro anticorpo que aparece na resposta a um antígeno. Pode ser produzida pelo feto e não atravessa a placenta. Quadro: Características das imunoglobulinas plasmáticas. Elaborado por Kathleen Gonçalves. Na corrida eletroforética das gamaglobulinas, apenas a IgG apresenta migração por toda a banda da fração gama. Além disso, por ter a maior concentração entre as globulinas, as alterações nessa zona acabam por refletir o que acontece com essa imunoglobulina. A IgA é a que aparece mais próxima do polo negativo (anodo) e pode se localizar na área de encontro da fração gama com a beta. A IgM é menos anódica e migra na zona eletroforética da betaglobulina, quando estimulada (nos casos de infecções agudas). É possível detectá-la na região entre a IgA e a IgG. Existem situações clínicas em que a delimitação entre as zonas beta e gama não aparece, essa fusão geralmente ocorre em soro e plasma de pacientes com cirrose hepática. A seguir veja a representação do comportamento eletroforético das imunoglobulinas. Relação das imunoglobulinas com o padrão eletroforético das proteínas séricas. É comum investigar e suspeitar da presença de processos inflamatórios a partir da concentração plasmática das imunoglobulinas. Esse valor é determinado relação albumina/proteínas totais. A diferença entre as duas concentrações informa o valor aproximado da fração de globulinas totais. Como a maior parte das globulinas totais é composta de imunoglobulinas, esse valor é indicativo da presença ou não de processo inflamatório de maneira inespecífica. Vamos agora conhecer os principais padrões eletroforéticos da fração gama: PICO POLICLONAL Quando as imunoglobulinas são produzidas por diferentes plasmócitos, chamamos a banda de policlonal. Anticorpos policlonais formam um conjunto de imunoglobulinas que, apesar de secretadas em resposta a um antígeno específico, reconhecem epítopos (é a menor parte de um antígeno capaz de induzir uma resposta imunológica) diferentes. O pico policlonal (aumento policlonal) é chamado de gamopatia policlonal. O padrão eletroforético revela uma curva de base larga, pois, nesse caso, ocorre elevação da produção de todas as classes de imunoglobulinas. Esse padrão é característico de processos inflamatórios, imunes ou infecciosos como a tuberculose, sarcoidose, artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico e outras patologias. PICO MONOCLONAL Quando há aumento de anticorpos produzidos por um único clone plasmocitário, ou seja, quando são produzidas imunoglobulinas idênticas entre si, temos um pico monoclonal, característico de gamopatias monoclonais. O gráfico eletroforético apresenta uma curva gama de base estreita, pois o crescimento representa um único anticorpo e geralmente apresenta um pico na fração gama. No entanto, como vimos, a IgA tem uma migração característica e, caso seja a proteína que está aumentada, o pico pode se apresentar na fração beta. Podemos considerar o mesmo raciocínio para a elevação de IgM monoclonal. Sendo assim, quando ocorre crescimento na fração gama, não é possível determinar, com certeza, se a fração monoclonal é IgA, IgG ou IgM. Portanto, é necessário realizar dosagens imunológicas específicas para essas imunoglobulinas ou ensaios de imunoeletroforese com determinados antissoros. As doenças associadas a esse perfil eletroforético são: mieloma múltiplo (MM), macroglobulinemia, leucemia linfocítica crônica e linfoma. HIPOGAMAGLOBULINEMIA Também chamada de agamaglobulinemia, caracteriza a redução dos níveis de gamaglobulinas e é indicativo da presença de variante da cadeia leve do mieloma múltiplo, presente em cerca de 20% dos casos de MM. Normalmente, o pico monoclonal é visto na eletroforese a partir de amostras de urina, pois as cadeias leves das imunoglobulinas são pequenas o suficiente para extravasarem os túbulos renais. Essas proteínas são chamadas de proteínas Bence Jones. Além do mieloma múltiplo, outras causas levam à hipogamaglobulinemia, são elas: Outras causas da deficiência ou ausência de imunoglobulinas. Saiba mais Nas gamopatias monoclonais, as imunoglobulinas secretadas pelas células podem ser intactas ou fragmentos delas. Nos referimos às duas como paraproteínas, proteínas monoclonais ou proteínas M. É possível que elas sejam de qualquer classe de anticorpos e o aumento revela na eletroforese uma única banda estreita. As proteínas de Bence Jones que vimos são exemplos delas, encontradas no mieloma múltiplo, macroglobulinemia de Waldenström e em doenças de cadeia pesada. Entretanto, pode-se achar paraproteínas também em pacientes sem patologia associada, em que são referenciadas como paraproteínas benignas ou gamopatia monoclonal de significância incerta. Os testes para identificação específica das imunoglobulinas são realizados principalmente com amostras de sangue. A imunoeletroforese é a mais conhecida, mas, hoje, existem métodos mais rápidos e sensíveis como: Imunoturbidimetria Eletroquimioluminescência Radioimunoensaio Elisa Na eletroforese, quando se detecta a presença de paraproteínas, deve-se realizar a técnica de imunofixação para quantificá-las. Esse método também é utilizado quando se identifica aumento de IgD, para determinar se ele é monoclonal ou policlonal. No caso da IgE, a quantificação total não é útil como método de triagem para diagnóstico de doença alérgica. Inclusive, níveis séricos normais de IgE não descartam a possibilidade deste quadro clínico. Os testes para quadros alérgicos são, em grande parte, testes de sensibilizaçãoalérgica ou pesquisa de IgE específica contra determinados alergênicos. Proteína C-reativa e sua relevância na fase aguda Como mencionado, as proteínas de fase aguda são marcadores plasmáticos bem característicos dos processos infecciosos. Além disso, encontram-se alteradas na presença de crescimento tumorais e após cirurgias ou traumas. Assim, a dosagem dessas proteínas serve para monitorar o curso da doença nos indivíduos acometidos. No quadro a seguir, temos descritas as principais funções dessas proteínas. Função Exemplos Mediar Atua como mediadores inflamatórios: a proteína C-reativa (PCR) ativa o complemento. O fibrinogênio e os componentes da coagulação geram coágulos e matrizes de fibrina ajudando na reparação dos tecidos. Inibir Inibe a atividade de proteases. α1-antitripsina e α1-antiquimotripsina inibem as ações de enzimas liberadas por leucócitos durante a fagocitose. A inibidora da esterase C1 inibe parte do sistema complemento. Eliminar Inibe ou elimina substâncias nocivas produzidas durante o processo inflamatório: a haptoglobina forma um complexo com a hemoglobina livre para que possa ser depurado pelo fígado; a PCR pode opsonizar DNA e detritos celulares de membrana. Regular Modula a resposta imune: a alfa-1 glicoproteína ácida é expressa nas membranas de linfócitos. Reparar Controla e estabelece os elementos do tecido conjuntivo: a α1-antitripsina e α1- antiquimotripsina são depositadas de maneira sequencial na superfície das fibras elásticas recém-formadas; a alfa-1 glicoproteína ácida promove o crescimento de fibroblastos. Quadro: Funções das proteínas de fase aguda. Extraído de MARSHALL, W. J.; LAPSLEY, M.; DAY, A. P.; AYLING, R. M., 2016, p. 851- 852, adaptado por Kathleen Gonçalves. No quadro inflamatório agudo, geralmente as imunoglobulinas se apresentam no limite da normalidade e suas frações só crescem à medida que o processo se torna crônico. Uma das proteínas mais sensíveis e precoces de quadros agudos é a proteína C-reativa (PCR). Essa proteína é sintetizada pelo fígado e encontrada no plasma e, em condições normais, com concentrações inferiores a 1 mg/dL. Em resposta a um estímulo inflamatório, seus níveis aumentam rapidamente (em 6 horas já é possível detectar), podendo chegar a mil vezes os valores basais. Os testes quantitativos utilizados para medir os valores de PCR não têm sensibilidade para detectar a proteína no soro de indivíduos saudáveis, o que é necessário para o monitoramento de quadros inflamatórios crônicos. Para esses casos, são aplicadas técnicas de alta sensibilidade, hs-PCR (high sensitivity-PCR). Já se encontram disponíveis no mercado a metodologia ELISA e métodos automatizados de turbidimetria e nefelometria. Saiba mais Níveis de PCR estão associados ao maior risco de doença arterial periférica, infarto do miocárdio, AVC e morte súbita cardiovascular. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. O esquema abaixo representa, de forma simplificada, as etapas do metabolismo do aminoácido tirosina. Representação das etapas do metabolismo do aminoácido tirosina. Sabendo que: • Na tirosinemia do tipo I, ocorre acúmulo de fumarilacetoacetato; • Na tirosinemia do tipo II, não há formação de ácido 4-hidroxifenilpiruvato; • Na tirosinemia do tipo III, ocorre acúmulo de tirosina e ácido 4-hidroxifenilpiruvato; • Na alcaptonúria, ocorre acúmulo de ácido homogentísico. Determine quais são as enzimas 1, 2, 3 e 4 do esquema, respectivamente: Ácido homogentísico oxidase, fumarilacetoacetato hidrolase, tirosina aminotransferase e 4- hidroxifenilpiruvato dioxigenase. Tirosina aminotransferase, 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase, fumarilacetoacetato hidrolase e ácido homogentísico oxidase. Tirosina aminotransferase, 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase, ácido homogentísico oxidase e fumarilacetoacetato hidrolase. Fumarilacetoacetato hidrolase, 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase, ácido homogentísico oxidase e tirosina aminotransferase. Fumarilacetoacetato hidrolase, ácido homogentísico oxidase, 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase e 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase. Comentário Parabéns! A alternativa "C" está correta. Nas aminoacidopatias, temos acumulação de substratos. O acúmulo de fumarilacetoacetato ocorre porque a fumarilacetoacetato hidrolase (4) não está presente ou ativa. A deficiência de formação do ácido 4-hidroxifenilpiruvato se dá pela ausência ou falta de atividade da enzima tirosina aminotransferase (1). O acúmulo de tirosina e ácido 4-hidroxifenilpiruvato é gerado pela falta ou não atividade da enzima 4-hidroxifenilpiruvato dioxigenase (2). O acúmulo de ácido homogentísico acontece pela ausência ou falta de atividade da enzima ácido homogentísico oxidase (3). 2. Os gráficos abaixo representam padrões eletroforéticos de diferentes amostras de proteínas plasmáticas totais. Gráfico: Padrões eletroforéticos de diferentes amostras de proteínas plasmáticas totais Gráfico: Padrões eletroforéticos de diferentes amostras de proteínas plasmáticas totais Gráfico: Padrões eletroforéticos de diferentes amostras de proteínas plasmáticas totais Gráfico: Padrões eletroforéticos de diferentes amostras de proteínas plasmáticas totais Comparando com o padrão normal, classifique as alterações observadas nos gráficos A, B e C, respectivamente. Pico de paraproteínas, hipogamaglobulinemia e deficiência de alfa-1 antitripsina. Pico monoclonal, aumento de alfa-1 antitripsina e pico policlonal. Gamopatia policlonal, gamopatia monoclonal e agamaglobulinemia. Gamopatia monoclonal, gamopatia policlonal e agamaglobulinemia. Pico monoclonal, pico de paraproteínas e hipogamaglobulinemia. Comentário Parabéns! A alternativa "D" está correta. No gráfico A, temos aumento expressivo da fração gama, com um pico de base estreita, sugerindo um pico ou gamopatia monoclonal, sendo possível também suspeitar de um pico de paraproteínas. No B, outro crescimento expressivo da fração gama, mas com base larga, sugerindo um pico ou gamopatia policlonal. No C, a banda gama quase desaparece, característico de hipogamaglobulinemia ou agamaglobulinemia. Avalie este módulo: MÓDULO 2 Descrever o metabolismo do ferro, suas deficiências e o diagnóstico laboratorial IMPORTÂNCIA DO FERRO O ferro é um elemento essencial para o corpo humano, pois desempenha papel de relevância em diversos processos metabólicos. Ele é o íon central do grupo heme, um componente não proteico tanto da hemoglobina como da mioglobina, fundamental no transporte de oxigênio para os tecidos. Estrutura do heme com o íon Fe2+ no centro. Como componente dos citocromos na membrana mitocondrial, é peça-chave na transferência de elétrons e geração de energia. Já o ferro não heme participa, ainda, da síntese do DNA, tendo em vista que a função da ribonucleotídeo-redutase depende da presença do ferro. METABOLISMO DO FERRO O ferro encontrado no organismo é originário de duas fontes principais: alimentação e reciclagem dos glóbulos vermelhos senescentes. Uma dieta balanceada provê, aproximadamente, de 15 a 20 mg de ferro ao dia, mas apenas 5 a 10% são absorvidos. Isso é distribuído para os tecidos ligados a proteínas de armazenamento, como a ferritina (solúvel) e a hemossiderina (insolúvel). O conteúdo total de ferro no corpo de adultos sem patologias é entre 3 e 4 g. Para formação de novas hemácias, é necessário cerca de 30 mg de ferro ao dia. Contudo, diariamente, o corpo perde, aproximadamente, 1 mg de ferro e essa perda precisa ser reposta pela alimentação. As mulheres têm perda extra de 0,5 mg de ferro devido ao período menstrual ou gravidez. Crianças e adolescentes também requerem quantidade maior. As concentrações normais de ferro no soro variam entre 10 e 40 μmol/L. Atenção No organismo, o ferro pode existir em dois estados estáveis oxidados: ferro ferroso solúvel (Fe2+) e ferro férrico insolúvel (Fe3+). Metabolismodo ferro: ingestão, absorção, armazenamento e excreção. A quantidade de ferro que será absorvida é regulada pela necessidade do organismo, e a velocidade desse processo é regulada por diversos fatores fisiológicos, descritos a seguir. Fator fisiológico Regulação Estoques de ferro A absorção do ferro é inversamente proporcional aos estoques, ou seja, eleva a absorção quando os estoques diminuem. Velocidade da eritropoiese Aumento da produção de hemácias leva à mais absorção, mesmo com estoques de ferro adequados ou elevados. Conteúdo da dieta O ácido ascórbico e os açúcares facilitam a absorção. Nas dietas ricas em alimentos com taninos, fitatos e fosfatos, que compõem complexos insolúveis com o ferro, a absorção é inibida. Estado químico do ferro O ferro é mais bem absorvido na forma ferrosa (Fe2+) do que a forma férrica (Fe3+). O ferro heme, proveniente das carnes e derivados, pode ser absorvido com a molécula intacta. Quadro: Fatores fisiológicos que regulam a absorção do ferro. Elaborado por Kathleen Gonçalves. ≈≈ Quando há aumento da demanda por ferro, cresce também a expressão de proteínas relacionadas à sua absorção. Proteínas envolvidas com a absorção do ferro. A transferrina é uma proteína produzida no fígado, responsável pelo transporte plasmático do ferro em sua forma Fe3+. Cada transferrina carreia dois íons de ferro férrico e esse complexo (ferro-ferritina) pode se ligar a receptores específicos na membrana de diversos tipos celulares. Em condições normais, a transferrina existente no plasma é capaz de transportar até 12 mg de ferro. Contudo, dificilmente, essa capacidade é utilizada em sua plenitude. O ferro circula livre, podendo causar graves danos celulares, em distúrbios em que há sobrecarga de ferro e o total dessa proteína encontra-se saturado ou próximo de sua saturação máxima. A ferritina, principal proteína de armazenamento do ferro, é encontrada, principalmente, nas células do retículo endotelial de órgãos como fígado, baço e medula óssea e nos músculos. Além de ser estocada na ferritina, a forma férrica (Fe3+) também pode ser encontrada na hemossiderina, que é a forma degradada da ferritina, e ser corada com ferrocianeto de potássio na presença de ácido clorídrico. Corte histológico mostrando a presença de hemossiderina (marrom) em macrófagos alveolares. A homeostase do ferro é controlada pelas proteínas reguladoras de ferro que atuam na inibição ou indução da transcrição genética (regulação intracelular) e pela regulação sistêmica, que requer uma comunicação entre os locais de absorção, de utilização e de estoque. Esse papel é desempenhado pela hepcidina, um hormônio circulante sintetizado no fígado, que atua como regulador negativo do metabolismo do ferro. Sua expressão é induzida, quando há sobrecarga de ferro e em quadros de infecção e inflamação, e diminuída, em situações de deficiência de ferro. Regulação da hepcidina e sua ação no metabolismo do ferro. O METABOLISMO DO FERRO A especialista Kathleen da Silva Gonçalves fala sobre a absorção, o transporte e a regulação do ferro no organismo humano. DISTÚRBIOS DO METABOLISMO DO FERRO De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a deficiência de ferro é a alteração hematológica mais comum com uma prevalência de 20 a 30% na população mundial e pode levar ao desenvolvimento de diversas doenças. A anemia é o quadro mais característico, quando os níveis de ferro estão abaixo dos valores de referência. Quando seus níveis estão aumentados, também há quadros clínicos que precisam de atenção. Sendo assim, é de grande importância realizar o monitoramento e controle dos níveis desse metal. Distúrbios relacionados a baixos níveis de ferro A anemia é definida como a diminuição da concentração total de hemoglobina no sangue, ficando em níveis abaixo das necessidades fisiológicas de um indivíduo saudável (mulheres e crianças < 11 g/dL e adultos < 12 g/dL). A anemia pode ser classificada, de acordo com o tamanho dos eritrócitos, em: microcítica, normocítica e macrocítica. Os sintomas são vagos, mas refletem a fraca distribuição de oxigênio no organismo, podendo ser acompanhados de cansaço, dor de cabeça, falta de ar, entre outros. A anemia ferropriva é causada, principalmente, pela deficiência de ferro, mas também pode ocorrer devido a outros fatores, como: Causas e características dos eritrócitos na anemia ferropriva. A anemia hipocrômica microcítica e a ausência de coloração de ferro em biópsia de medula óssea são os melhores índices diagnósticos de deficiência de ferro estabelecidos. Além da anemia, existem outros quadros clínicos acompanhados da diminuição dos níveis de ferro, entre eles estão: Inflamação aguda (respiratória e abcessos) Inflamações crônicas Doenças malignas Infarto do miocárdio Hemorragia aguda Doação de sangue recente Ciclo menstrual Distúrbios relacionados ao excesso de ferro É possível ocorrer por doenças genéticas ou de forma adquirida. A sobrecarga pode ser resultado de transfusões sanguíneas realizadas de maneira crônica, como acontece com alguns pacientes com anemia falciforme, ou ser resultado de hematopoiese deficiente, comum na insuficiência renal. Doenças como hemocromatose, que veremos no próximo tópico, também levam à elevação dos níveis de ferro, bem como casos de intoxicação por ferro. Os mecanismos de excreção do ferro são incipientes – descamação das células intestinais e epidermais, menstruação e perda de sangue oculto nas fezes. Por isso, às vezes, terapias de reposição do ferro levam ao aumento acima dos níveis de referência. Em situações de sobrecarga de ferro, a concentração de ferritina no soro também pode ir para níveis acima dos valores de referência. Hemocromatose Doença hereditária do metabolismo do ferro relativamente comum, dependendo da mutação genética associada. É caracterizada pelo crescimento da absorção intestinal de ferro, em torno de 2 a 3 vezes acima do normal, levando à deposição de ferro em diversos tecidos, o que, por sua vez, tende a causar disfunção em diferentes órgãos. Hemocromatose no tecido hepático. Os grânulos alaranjados são depósitos de hemossiderina no citoplasma dos hepatócitos. Normalmente, a mutação mais comum acontece no gene que codifica a proteína HFE e leva à substituição de um aminoácido cisteína por uma tirosina, resultando na redução da síntese de hepcidina, um regulador negativo do metabolismo do ferro. A hepcidina se liga à ferroportina na membrana das células intestinais, induzindo sua internalização e degradação. Isso impede que ela exporte o ferro para o plasma, ficando retido no interior das células. Esse ferro é, enfim, excretado com a descamação das células intestinais. Logo, a redução dos níveis de hepcidina está associada ao aumento dos níveis de ferro sérico e à desregulação do seu metabolismo. Quais as várias faces da hemocromatose? Clique no botão para ver as informações. Saiba mais Existem quatro tipos de mutações, em genes diferentes, que levam ao desenvolvimento desta doença: Tipo 1: As mutações do gene HFE estão entre as causas de maior prevalência da doença, mas varia de acordo com os grupos étnicos e raramente apresenta sintomas antes dos 20 anos. A mutação C282Y é a mais comum. Tipo 2: Hemocromatose juvenil. É rara e as mutações afetam os genes HJV (tipo 2A) e HAMP (tipo 2B). Tipo 3: Ocorre devido a mutações no gene TRF2, que codifica o receptor de transferrina. Tipo 4: Também chamada de doença por ferroportina, já que as mutações afetam o gene SLC40A1 que codifica aferroportina-1. Os sintomas da hemocromatose costumam aparecer na meia-idade, com quadro clínico característico, que inclui fadiga crônica e, em casos mais intensos, pigmentação da pele (fenótipo bronzeado), diabetes, cardiomiopatia e cirrose. Com o aumento da concentração de ferro sérico, a saturação da transferrina chega próxima a 100%. Por esse motivo,é o exame com alta especificidade para esta doença. Os níveis de ferritina também se encontram elevados. No entanto, a genotipagem é o método capaz de diagnosticar, com alta sensibilidade, a hemocromatose hereditária. Outros distúrbios com sobrecarga de ferro Existem outros distúrbios que acompanham o crescimento dos níveis de ferro sérico. Vejamos a seguir: Clique nas informações a seguir. Aceruloplasminemia Acúmulo excessivo de hemossiderina nos tecidos. Os principais órgãos afetados são pulmões e rins. Neles, os depósitos resultam de hemorragia nos tecidos seguida da ruptura dos eritrócitos, causando liberação de ferro. Nos rins, a hemólise pode ser intravascular e o ferro se acumula no tecido renal à medida que o sangue é filtrado. Hemossiderose Consequência de mutações no gene da proteína ceruloplasmina. Essa proteína atua na regulação do estado iônico do ferro, oxidando o Fe+2 em Fe+3. Assim, permite a incorporação do íon à transferrina. Sem poder se ligar a ela, há acúmulo de ferro sérico. Atransferrinemia Distúrbio raro e congênito em que há deficit de transferrina, que aumenta o ferro sérico livre, e o desenvolvimento de quadros graves devido ao estresse oxidativo. Transporte de substâncias na corrente sanguínea. ANÁLISE LABORATORIAL DO FERRO Para o estabelecimento do diagnóstico de patologias associadas ao metabolismo do ferro, o hemograma é uma ferramenta essencial. Além dele, temos estes testes: ferro sérico, saturação da transferrina, receptor solúvel da transferrina, capacidade plasmática total de ligação ao ferro e hepcidina. Veja a seguir cada um desses parâmetros avaliados laboratorialmente. Parâmetros do hemograma Você estudará este assunto com mais profundidade em outro momento, mas vamos conhecer os valores de referência dos parâmetros que devem ser avaliados nos casos de deficiência de ferro. Índice/Medida Parâmetro avaliado Valores Volume Corpuscular Médio (VCM) Tamanho médio das hemácias < 80 fl indicam microcitose Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média (CHCM) Quantidade de hemoglobina nas hemácias Valores de referência: 31 a 36 g/dL. Valores baixos indicam hemácias hipocrômicas Determinação do número de hemácias hipocrômicas (possível com certos analisadores automáticos) Número de hemácias > 6% indicam deficiência de ferro RDW (do inglês Red Cell Distribution Width) Heterogeneidade das hemácias em relação ao tamanho > 14,5% indicam deficiência de ferro, mas precisa ser avaliado junto com o VCM Quadro: Índices hematimétricos em quadros de deficiência de ferro. Elaborado por Kathleen Gonçalves. Ferro e ferritina séricos Como os valores de referência para o ferro no soro apresentam grande variação, a medida da sua concentração tem valor limitado, pois as baixas concentrações plasmáticas podem ser observadas em diversos quadros clínicos. Seu valor é mais preditivo em casos de sobrecarga e envenenamento agudo por ferro. Já a ferritina é um parâmetro bastante sensível da deficiência de ferro, se não estiver acompanhado de nenhuma outra alteração clínica. Como a porcentagem de ferro associado à ferritina sérica está em equilíbrio com os depósitos do ferro ligados à ferritina nos tecidos, sua concentração no sangue reflete as reservas no organismo. Vamos conhecer os valores de referência para o ferro e a ferritina? Grupos Ferro sérico Ferritina sérica Homens 70 a 180 μg/dL 70 a 435 ng/mL Mulheres 60 a 180 μg/dL 10 a 160 ng/mL Recém-nascidos 95 a 225 μg/dL 25 a 200 ng/mL Tabela: Valores de referência de ferro e ferritina séricos. Elaborada por Kathleen Gonçalves. Atenção Como a ferritina é uma proteína plasmática de fase aguda, caso haja quadros inflamatórios coexistentes com deficiência de ferro, seus níveis podem se apresentar falsamente normais. Clínicas que acompanham o aumento dos níveis de ferritina. Transferrina e sua capacidade de ligação ao ferro sérico A concentração de transferrina sérica pode ser medida direta ou indiretamente pela capacidade total de ligação de ferro, conhecida pela sigla TIBC. No plasma, em condições normais, a transferrina está cerca de 30% saturada com Fe2+: Quando essa saturação diminui (< 16%), podemos suspeitar de quadros de deficiência de ferro. Quando a saturação aumenta (> 55% em homens e > 50% em mulheres), desconfiamos de quadros de sobrecarga de ferro. A TIBC é uma medida da concentração máxima de saturação da transferrina. Como apenas 1/3 dos sítios ligadores de ferro está ocupado, a proteína tem capacidade reserva para ligação com mais íons. Assim, a TIBC está elevada nas deficiências de ferro e diminuída nos quadros inflamatórios, doenças malignas e desordens relacionadas à sobrecarga de ferro. Outro parâmetro relacionado às reservas de ferro é a porcentagem de saturação da transferrina, útil na diferenciação das causas de anemia por carência nutricional ou por outros motivos, como aplasia de medula. O resultado laboratorial clássico em anemia ferropriva é encontrar a ferritina e o ferro séricos reduzidos, a saturação de transferrina baixa e a TIBC aumentada. Os valores de referência da TIBC vão de 300 a 360 μg/dL. No quadro a seguir, vemos a correlação entre o ferro e o TIBC em diferentes situações. Condição Ferro sérico TIBC Deficiência de ferro ↓ ↑ Infecções crônicas ↓ ↓ Malignidades ↓ ↓ Menstruações ↓ ↓ Envenenamento por Fe ↑ ↓ Anemia hemolítica Variável Variável Hemocromatose ↑ N, ↓ Infarto do miocárdio ↓ N Gravidez tardia ↓ ↑ Anticoncepcionais orais N, ↑ ↑ Hepatite por vírus ↑ ↑ Nefrose ↓ ↓ Kwashiorkor ↓ ↓ Talassemia ↑ ↓ ↓ = diminuição; ↑ = aumento; N = normal. Quadro: Ferro sérico e TIBC em várias condições. Extraído de MOTTA, V. T., 2009, p. 8, adaptado por Kathleen Gonçalves. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. (Adaptado COVEST – COPSET – 2019 – Universidade Federal de Pernambuco – Biomédico) De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a deficiência de ferro é responsável por 75% de todos os casos de anemia. As causas são inúmeras, o que envolve um complexo entendimento para um bom diagnóstico. Sobre a regulação da homeostase do ferro, analise as alternativas a seguir: I. A regulação sistêmica é realizada pela hepcidina. II. A regulação intracelular depende da hepcidina. III. Hepcidina, um hormônio circulante sintetizado no fígado, atua como regulador negativo do metabolismo do ferro. É correto o que se afirma em: I II III I e II I e III Comentário Parabéns! A alternativa "E" está correta. A homeostase do ferro é controlada, intracelularmente, pelas proteínas reguladoras de ferro, que atuam na inibição ou indução da transcrição genética. Já a regulação sistêmica é realizada pela hepcidina, molécula produzida pelo fígado que se liga à ferroportina, atuando como regulador negativo do metabolismo do ferro e causando sua degradação. 2. A.M., sexo masculino, 53 anos, durante a consulta queixou-se de fadiga e dores articulares, principalmente nos dedos, cotovelos e tornozelos, e, ainda, hiperpigmentação no rosto, pescoço e nas mãos. A partir desse quadro, o médico suspeitou de um possível distúrbio no metabolismo do ferro e solicitou que o paciente realizasse alguns exames. Assinale a alternativa com o exame que NÃO precisa ser solicitado: Índice de saturação de transferrina Haptoglobina sérica Ferritina sérica Teste genético Ferro sérico Comentário Parabéns! A alternativa "B" está correta. Os sintomas de A.M., somados à sua faixa etária e ausência de outros sintomas, trazem a suspeita de um distúrbio de sobrecarga de ferro. Para avaliá-lo, os principais exames são a dosagem de ferro sérico, o índice de saturação da transferrina e a ferritina sérica. Para confirmar ou descartar hemocromatose hereditária, o teste genético é indicado. Como a haptoglobina está envolvida na depuração da hemoglobina após hemólise, seu teste é solicitado quando há suspeita de anemias. Avalie este módulo: MÓDULO3 Relacionar as patologias hepáticas com as alterações no hepatograma FÍGADO O fígado é o órgão mais volumoso do corpo humano, anatomicamente dividido em quatro lobos: direito, esquerdo, caudado e quadrado. Recebe suprimento sanguíneo proveniente de dois grandes vasos: veia porta e artéria hepática, ramificação da aorta, que entrega sangue oxigenado proveniente do sistema digestório, rico em nutrientes. Cerca de 80% da massa celular do fígado é formada pelos hepatócitos que se agrupam compondo placas chamadas de lóbulos hepáticos. A unidade funcional do fígado é representada pelos ácinos. Estes não são estruturas anatômicas definidas e foram arbitrariamente divididos em três zonas (1, 2 e 3) que correspondem à sequência em que o sangue se desloca. Os hepatócitos da zona 1 são irrigados com o sangue mais oxigenado. Os hepatócitos da zona 3 recebem um sangue com menos oxigênio e nutrientes. Esquema histológico do lóbulo e das zonas funcionais dos ácinos hepáticos. O fígado realiza múltiplas funções. Portanto, a preocupação com a saúde desse órgão é crucial para a homeostase de todo o organismo. Veja essas funções a seguir. Metabolismo Tem papel fundamental no metabolismo dos nutrientes provenientes da alimentação, principalmente dos carboidratos, lipídeos e proteínas. Síntese Com exceção das globulinas, a maioria das proteínas plasmáticas de fase aguda é produzida no fígado. Ele auxilia na manutenção da pressão oncótica ao produzir albumina. Armazenamento Armazena glicose na forma de glicogênio (estoque de energia), ferro, vitaminas lipossolúveis A, D, E e K, vitamina B12, ácido fólico e diversas outras substâncias. Desintoxicação O conjunto de enzimas que participam dessa atividade é chamado de sistema microssomal hepático, que converte compostos nocivos ou pouco solúveis em substâncias que possam ser excretadas pelos rins. Excreção É responsável pela excreção de toxinas e produtos finais do metabolismo. Também secreta a bile, uma substância com composição bastante diversa, entre elas ácidos e sais biliares. ENTENDENDO MAIS O FÍGADO A especialista Kathleen da Silva Gonçalves fala sobre a anatomia, a histologia e a fisiologia hepática. SUBSTÂNCIAS PRODUZIDAS PELO FÍGADO Bile Uma secreção gastrointestinal responsável por excretar diversos solutos que não são expelidos pelos rins e ainda secretar substâncias fundamentais para o processo digestivo e para a absorção de lipídios. Inicialmente, é sintetizada pelos hepatócitos que secretam, nos canalículos biliares, um fluido com osmolaridade similar ao plasma, contendo sais biliares, colesterol, fosfolipídios, pigmentos biliares e outras substâncias. Na passagem pelos dutos biliares, suas células epiteliais (os colangiócitos) secretam nesse concentrado um fluido rico em bicarbonato, induzido por hormônios, principalmente a secretina. No intervalo entre as refeições, parte da bile é direcionada para a vesícula biliar, órgão responsável pelo seu armazenamento. Nela ocorre a remoção de sais e água dessa bile (hepática), formando o que chamamos de bile vesicular. Sais biliares O fígado é o principal local de síntese do colesterol endógeno e o único local onde ele é convertido em ácidos biliares que serão excretados. O ácido cólico e o quenodesoxicólico são os ácidos biliares primários. A maior parte desses ácidos biliares, ao chegar no intestino, é reabsorvida no íleo e retorna pela veia porta ao fígado (circulação êntero-hepática), onde é novamente conjugada e excretada. Os ácidos primários, que seguem pelo íleo em direção ao intestino grosso, sofrem a ação da enzima 7α-hidroxilase de bactérias presentes no intestino e são convertidos em ácidos biliares secundários: ácidos desoxicólicos e litocólicos, excretados por meio das fezes. Atenção A principal função dos sais biliares é solubilizar o colesterol contido na bile, bem como produtos da digestão dos lipídeos provenientes da alimentação. Veja a seguir o metabolismo dos ácidos biliares. Excreção e circulação êntero-hepática dos ácidos biliares. Bilirrubina e urobilinogênio Os eritrócitos senescentes são retidos e destruídos pelos macrófagos do retículo endotelial e vários componentes celulares são liberados nesse processo. Veja o que ocorre no plasma: 1. O ferro se liga à transferrina. 2. As globinas são degradadas em seus aminoácidos que serão reutilizados. 3. A protoporfirina IX (grupamento heme sem o ferro) é transformada em biliverdina que, por sua vez, é reduzida à bilirrubina, um dos pigmentos biliares. A bilirrubina produzida no retículo endotelial é conhecida como bilirrubina não conjugada ou bilirrubina indireta. É insolúvel em água e transportada no plasma ligado à albumina. Dentro dos hepatócitos, a bilirrubina sofre ação enzimática e é conjugada com ácido UDP-glicurônico, formando o monoglicuronídeo e o diglicuronídeo da bilirrubina. Essas formas são chamadas de bilirrubina conjugada ou bilirrubina direta, sendo agora solúveis em água e excretadas dos hepatócitos como bile. Na bile, 25% da bilirrubina está conjugada com monoglicuronídeos e 75% conjugada com diglicuronídeos, havendo ainda traços de bilirrubina não conjugada. Se o trato biliar estiver bloqueado por algum motivo (como, por exemplo, a existência de cálculos biliares), a bilirrubina não será excretada. A bilirrubina conjugada também é encontrada em pequenas quantidades no plasma e na urina. Por ser pouco absorvida no intestino, ela segue pelo trato digestório e chega ao íleo e intestino grosso. A forma conjugada diglicuronídeo é hidrolisada pela enzima β-glicuronidase dos hepatócitos, das células do epitélio e de bactérias intestinais, formando bilirrubina livre. No intestino, a bilirrubina livre é reduzida a urobilinogênios. Cerca de 20% deles são reabsorvidos para o fígado pela circulação êntero-hepática. Grande parte do que foi reabsorvido é excretada na bile e uma pequena parte chega ao plasma e aparece na urina (entre 1 e 4 mg por dia). Resumo do metabolismo da bilirrubina. Processos patológicos que induzem à maior formação e excreção de bilirrubina, como na icterícia hemolítica, levam ao aumento das concentrações de urobilinogênios na urina e nas fezes. Hiperbilirrubinemia Clique na Imagem para visualizar o conteúdo. Fenótipo característico de icterícia: pele e esclera amarelados. A bilirrubina no plasma está geralmente abaixo de 21 μmol/L. Concentrações acima podem apresentar alguma significância clínica. Porém, acima de 50 μmol/L, a hiperbilirrubinemia é detectada pelo quadro de icterícia, caracterizada pela coloração amarela da pele, da esclera e de membranas mucosas. A dosagem de bilirrubina plasmática pode oferecer uma avaliação do nível de severidade da icterícia. Como é detectada a hiperbilirrubinemia? Diversas patologias acompanham as alterações na produção, na captação, no armazenamento e na excreção da bilirrubina, que tanto pode ser a conjugada quanto a não conjugada. Existem três condições mais comuns que levam a quadros de hiperbilirrubinemia: Hemólise Obstrução do sistema biliar Dano hepatocelular No caso de elevação de bilirrubina por hemólise intravascular, a bilirrubina é predominantemente não conjugada. Esse tipo de hiperbilirrubinemia, associado à função imatura do fígado, é muito comum em bebês e deve ser acompanhado cuidadosamente sob o risco de acometimento de lesão neurológica cerebral irreversível, conhecida como síndrome de Kernicterus. Já a bilirrubina conjugada não causa essa síndrome, pois não é lipossolúvel e, portanto, não é capaz de atravessar a barreira hematoencefálica. Como já aprendemos, é possível que os cálculos biliares bloqueiem os dutos biliares, completamente ou parcialmente. Quando a obstrução é completa, as concentrações de bilirrubina e fosfatase alcalina aumentarão e, neste caso, os níveis de urobilinogênio na urina serão muito baixos ou ausentes; enquanto as fezes estarão pálidas. Quando a obstruçãoé parcial, a concentração de bilirrubina sérica tende a ficar dentro dos valores de referência e a concentração de fosfatase alcalina provavelmente estará alta. Saiba mais Os canalículos biliares podem ser obstruídos em quadros como cirrose, câncer hepático ou por infecção, levando ao aumento da concentração de bilirrubina conjugada no plasma. Nem sempre a obstrução é consequência de problemas na árvore biliar, como ocorre nas hepatites virais ou devido à intoxicação por drogas, por exemplo. Nesses casos, além da bilirrubina e da fosfatase alcalina, outras enzimas, como as aminotransferases, também estarão com seus níveis elevados. O quadro mostra o diagnóstico diferencial da hiperbilirrubinemia. Hemólise Obstrução das vias biliares Dano Hepatocelular Concentração variável de bilirrubina sérica Bilirrubina muito elevada AST e ALT aumentadas Ausência de bilirrubina na urina Bilirrubina na urina Bilirrubina aumentada tardiamente Reticulocitose Fosfatase alcalina com níveis acima dos valores de referência (geralmente) Bilirrubina na urina Hemoglobina ↓ AST, ALT, LDH um pouco aumentadas Fosfatase alcalina aumentada tardiamente Haptoglobina ↓ ↑ LDH (possivelmente) LDH = lactato desidrogenase; AST = aspartato aminotransferase; ALT = alanina aminotransferase. Quadro: Diagnóstico laboratorial diferencial de hiperbilirrubinemia. Extraído de GAW, A.; MURPHY, M. J.; SRIVASTAVA, R.; COWAN, R.A.; O’REILLY, D. St. J., 2015, p. 187, adaptado por Kathleen Gonçalves. Como é realizada a determinação laboratorial da bilirrubina? Os valores de bilirrubina total no plasma não são utilizados para estabelecer nenhum diagnóstico. Na verdade, a concentração de sais biliares no soro é um índice mais sensível para avaliar o transporte hepático. Contudo, alterações dos níveis de bilirrubina plasmática podem ter significado prognóstico para a evolução de doenças como a cirrose biliar primária. Também é importante no monitoramento de icterícia neonatal; na avaliação da resposta ao pós-operatório de desobstrução das vias biliares; e para confirmar suspeita de hiperbilirrubinemia, que não é clinicamente aparente. A amostra utilizada para exames laboratoriais é o soro obtido em jejum e isento de hemólise e lipemia. O método mais comum é o colorimétrico. No quadro a seguir, veja os exames para a dosagem de bilirrubina. Exame Quantificação Características Valores de referência Reação de Van den Bergh em solução aquosa (colorimétrico) Bilirrubina conjugada* Mono e diglicuronídios são solúveis em água Adultos e crianças acima de 1 ano: 0,2 a 1,0 mg/dL Método colorimétrico ̶ reação com álcool Bilirrubina não conjugada* Bilirrubina não conjugada não é solúvel em água Adultos e crianças acima de 1 ano: 0,2 a 1,0 mg/dL Espectrofotometria direta Bilirrubina total Só para amostras de recém-nascidos (soro sem lipocromos) Entre 2 e 14 mg/dL, depende do tempo de vida Teste enzimático da bilirrubina oxidase Bilirrubina total A enzima oxida bilirrubina à biliverdina (incolor) Adultos: entre 0,3 e 1,2 mg/dL Recém-nascidos (dependendo do tempo de vida): 1,4 a 12,0 mg/dL Prematuros (dependendo do tempo de vida): até 16,0 mg/dL *A bilirrubina total é a soma das duas frações. Quadro: Exames para dosagem de bilirrubina. Elaborado por Kathleen Gonçalves. HEPATOGRAMA Os exames que compõem o hepatograma também costumam ser chamados de testes (ou provas ou exames) de função hepática. No entanto, esse nome é considerado inadequado, já que os resultados, como veremos a seguir, não fornecem uma análise quantitativa da capacidade do fígado de realizar suas funções. Situações clínicas que demandam a realização de um hepatograma. Na avaliação de uma possível doença hepática, é essencial realizar um exame físico do paciente em conjunto com uma anamnese acurada com o objetivo de identificar a existência de fatores de risco. Quando o exame físico e o histórico são insuficientes para definir um diagnóstico, os exames laboratoriais e de imagem complementam a avaliação. Atenção Algumas das substâncias dosadas no hepatograma podem estar com valores fora da referência em pessoas com distúrbios não relacionados ao fígado. Lembre-se de que os testes auxiliam no estabelecimento de doença hepática, mas não fornecem diagnóstico! Os testes de função hepática medem, no sangue, os níveis de determinadas enzimas e proteínas produzidas no fígado. Uma dessas substâncias é a bilirrubina, que já estudamos. A seguir, serão apresentadas outras substâncias dosadas em um hepatograma. Enzimas hepáticas As enzimas dosadas nos testes de função hepática, geralmente, têm pouca ou nenhuma função fisiológica conhecida no plasma sanguíneo. Contudo, a alteração dos seus níveis séricos é utilizada como um indicador importante de dano hepático. Aminotransferases (AST e ALT) As enzimas aspartato aminotransferase (AST) e alanina aminotransferase (ALT) são aminotransferases amplamente usadas como indicadores de dano hepático. São consideradas marcadores sensíveis, mas não específicos, de: 1. Dano hepático agudo, causado por hepatites de qualquer tipo. 2. Lesões por toxicidade, como na ingestão excessiva de drogas. 3. Hipóxia grave. 4. Insuficiência cardíaca etc. Atenção As aminotransferases também são conhecidas como transaminases. Você pode encontrar a AST sendo chamada de Transaminase Glutâmica Oxalacética (TGO) e a ALT, de Transaminase Glutâmica Pirúvica (TGP). A ALT é encontrada em grandes concentrações especificamente no citoplasma dos hepatócitos. Já a AST pode ser encontrada no citoplasma e nas mitocôndrias de outros órgãos, além do fígado, como: músculos esquelético e cardíaco, rins, pâncreas e nos eritrócitos. Assim, é fácil perceber que a ALT é um marcador mais específico de dano no fígado que a AST. Contudo, quando há lesão hepática, ocorre elevação dos níveis de ambas aminotransferases, e costuma ser na mesma proporção. A exceção é quando há dano hepático gerado por ingestão alcóolica, pois o álcool tem efeito inibidor sobre a síntese de ALT. Neste caso, a elevação dos níveis de AST é bem maior do que a de ALT (AST/ALT > 2). Atenção Caso haja uma lesão somente no fígado, os níveis de ALT subirão mais rapidamente do que os de AST. No quadro a seguir, vemos a inter-relação entre essas enzimas. ↑ até 5x limite superior normal ↑ até 5x limite superior normal – predominando ALT ↑ até 5x limite superior normal – predominando AST ↑ maior que 15x limite superior normal Hemólise Hepatite B e C crônicas Dano hepático relacionado com álcool Hepatites virais agudas Miopatias Hepatite virais agudas Esteatose Medicamentos/toxinas Tireoide Esteatose Cirrose extra-hepática Hepatite isquêmica Exercício físico Hemocromatose Hepatites autoimunes Medicamentos Doença de Wilson Hepatites autoimunes Obstrução dos ductos biliares Deficiência de alfa-1 antitripsina Síndrome de Budd- Chiari Doença de Wilson Ligadura da artéria hepática ↑aumento Quadro: Etiologia do aumento dos níveis séricos de ALT e AST. Extraído de BARCELOS, L. F.; AQUINO, J. L., 2018, p. 145, adaptado por Kathleen Gonçalves. Fosfatase alcalina A fosfatase alcalina (FA) não é específica do fígado. É possível encontrá-la nos ossos, no intestino delgado, na placenta, nos rins e outras partes. Seus níveis séricos dependem da idade e do sexo, sendo normalmente mais altos em idosos, crianças e gestantes. No fígado, a FA é encontrada, principalmente, nas células que revestem os canalículos biliares e seus níveis costumam elevar em resposta à obstrução das vias biliares, tanto intra como extra- hepática. No entanto, esse aumento não é específico de obstrução biliar, já que outros tipos de lesão hepática podem induzir o crescimento dos níveis dessa enzima, com ou sem colestase. O aumento de três vezes nos níveis de fosfatase alcalina, contudo, é um forte indicador de doenças hepáticas colestáticas,infiltrativas (como neoplasias) e em doenças ósseas com grande turnover. A maior parte da FA detectada no plasma é originária do fígado e dos ossos e, para identificar sua origem, é possível separá-las por eletroforese. Quando o aumento de FA está associado à elevação de outra enzima, a gama-glutamiltranspeptidase (GGT), temos um forte indício de obstrução biliar. No entanto, o aumento de FA acompanhado de níveis normais de GGT sugere doenças ósseas. Gama-glutamiltranspeptidase (GGT) A GGT é uma enzima sintetizada em diversos tecidos. No fígado, ela é sintetizada difusamente por todo o órgão, diferentemente da FA que é, em grande parte, produzida nas células dos canalículos biliares. O aumento dos níveis plasmáticos é um índice sensível para doença hepática, mas não é específico. Sua atividade é elevada pelo uso de álcool e algumas drogas, mesmo sem doença hepática associada. A partir deste quadro, conseguimos comparar as concentrações de FA e GGT nas doenças hepáticas. Hepatopatias Fosfatase alcalina Gama-Glutamiltranspeptidase Doenças colestáticas Aumentados Aumentados Cirrose biliar primária Aumentados (15 a 20x LSN) Aumentados Hepatite viral aguda Aumentados (> 5x LSN) Aumentados (<10x LSN) Tumores hepáticos De normais até > 10x LSN De normais até > 10x LSN Cirrose hepática De normais até > 10x LSN De normais até > 15x LSN Hepatite crônica Normais De normais até 3x LSN Hepatite alcóolica Normais ou pouco aumentados Muito aumentados LSN = Limite superior normal (dos valores de referência) Quadro: Comportamento dos níveis de FA e GGT em hepatopatias. Extraído de BARCELOS, L. F.; AQUINO, J. L., 2018, p. 146, adaptado por Kathleen Gonçalves. Proteínas plasmáticas Como o fígado está envolvido com a síntese, liberação e depuração de muitas proteínas plasmáticas, não é de se estranhar que, em distúrbios que afetem esse órgão, as concentrações dessas proteínas possam estar modificadas. É possível que as alterações dos níveis de determinadas proteínas, como, por exemplo, a albumina e os fatores de coagulação, indiquem problemas na função hepática; enquanto outras, como a alfa-1 antitripsina e a ceruloplasmina (que estudamos no módulo anterior), podem ser usadas no diagnóstico de hepatopatias específicas. A albumina, como sabemos, é produzida exclusivamente pelo fígado. Sua meia-vida é longa e, por isso, não é um bom indicador para a severidade de hepatopatias agudas, pois níveis reduzidos demoram para ser detectados no plasma. Portanto, a hipoalbuminemia é mais comum em doenças crônicas como a cirrose. É preciso avaliar, contudo, a ingestão inadequada de proteínas e ingestão excessiva de álcool como possíveis causas de redução da síntese de albumina. Veja outros fatores que podem contribuir para hipoalbuminemia: Perda renal, devido à síndrome nefrótica; Perda por enteropatia perdedora de proteínas ou através da pele, devido a queimaduras. Por esses motivos, as concentrações plasmáticas de albumina não devem ser utilizadas como um indicador isolado da função de síntese do fígado. Perfil eletroforético característico de hepatopatia crônica. A alfafetoproteína é uma proteína produzida pelo fígado nos fetos. É o equivalente fetal da albumina. Sua síntese cessa logo após o nascimento. Em adultos normais, sua concentração plasmática é muito pequena, mas, nos casos de carcinoma hepatocelular, seus níveis aumentam cerca de 80 a 90% e ela se torna detectável no plasma. Também é utilizada como marcador de tumores de células germinativas. Tempo de protrombina O fígado tem uma função central na hemostasia, pois sintetiza grande parte dos fatores e das proteínas envolvidos na coagulação e no sistema fibrinolítico. Um exemplo é a protrombina, uma proteína produzida pelo fígado, que, quando ativada, promove a conversão de fibrinogênio em fibrina. A síntese de fatores de coagulação é dependente de vitamina K, lipossolúvel, obtida pelos alimentos e que tem sua absorção dependente da ação dos sais biliares. É possível que a produção dos fatores de coagulação seja afetada pelo mau funcionamento do fígado ou pela falta deste composto. A cirrose biliar primária e a colangite esclerosante primária são distúrbios relacionados à obstrução das vias biliares, que podem ser a causa da deficiência de vitamina K, levando à diminuição da síntese dos fatores de coagulação. Como a protrombina tem uma meia-vida curta, ela funciona como um indicador precoce da redução da síntese hepática. Além disso, o teste do tempo de protrombina é um método simples e barato para avaliar essa função do fígado. Os valores de referência de tempo de protrombina estão entre 10 e 14 segundos. DOENÇAS HEPÁTICAS Existem muitas doenças que afetam o fígado, podendo ser agudas ou crônicas. A diferença entre esses distúrbios é a gravidade e a velocidade com que deterioram o órgão. Principais causas de dano hepático agudo e seus possíveis desfechos. Veremos agora os quadros clínicos mais relevantes, começando pelos agudos até chegarmos nas complicações crônicas. Intoxicação As intoxicações hepáticas mais comuns envolvem doses excessivas de drogas ilícitas, álcool e de alguns medicamentos, como o paracetamol. Em pequenas quantidades, esses compostos são naturalmente metabolizados e excretados pelo fígado. Entretanto, em altas concentrações, a quantidade de metabólitos tóxicos resultantes leva ao comprometimento das funções dos hepatócitos e à intensa liberação de enzimas na circulação sanguínea. A capacidade do fígado de reagir ao dano resultante da intoxicação é reduzida quando associada a outras circunstâncias, como ingestão alcóolica, desnutrição ou doença crônica preexistente. Existem casos de intoxicações, chamadas de endógenas, que são acompanhadas de acúmulo de substâncias tóxicas produzidas pelo próprio organismo. Outra possibilidade de intoxicação é aquela que afeta indivíduos suscetíveis a certas substâncias, como o valproato de sódio e o halotano. Infecções no fígado Hepatite é um termo utilizado para qualquer processo inflamatório que acometa o fígado, levando à degeneração e necrose do tecido hepático e que resulta na diminuição da sua função. É possível que este quadro seja causado por microrganismos infecciosos, medicamentos, toxinas e outros. No caso dos microrganismos, tanto bactérias como vírus podem gerar hepatite. Porém, os casos mais comuns são de hepatites virais. Estudaremos as de maior prevalência a seguir. Clique nas barras para ver as informações. HEPATITE A Causada pelo vírus da família Picornaviridae, que se multiplica nos hepatócitos e é excretado para o sistema digestório pela bile. Por isso, suas partículas costumam ser encontradas nas fezes de infectados com a doença aguda. HEPATITE B Transmitida por um vírus mais complexo que leva ao acometimento de uma doença mais prolongada e séria do que a hepatite A. O vírus infecta e se replica em grande quantidade nos hepatócitos, de onde é liberado para a circulação sanguínea periférica. Laboratorialmente, é detectado por diferentes antígenos, como mostra o esquema a seguir. Os determinantes antigênicos que podem ser testados laboratorialmente para VHB. HEPATITE C Apresenta-se como doença crônica, podendo evoluir para cirrose após 10 anos de infecção. Em torno de 20% dos pacientes desenvolvem carcinoma hepatocelular. No caso de hepatites, os testes padrão de função hepática são utilizados para: Sugerir a existência da doença; Avaliar sua gravidade; Acompanhar sua progressão; Verificar a resposta do paciente à terapia implementada; Verificar se as hepatites são ou não virais (realizado por testes sorológicos, exames de imagem ou avaliação histológica). Quais os testes utilizados nos casos de hepatite aguda? Clique no botão para ver as informações. Saiba mais Nos quadros de hepatite aguda, os testes geralmente apresentam os seguintes resultados no plasma: Grande elevação dos níveis das aminotransferases
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