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1 SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINO-AMERICANO DE TEOLOGIA FACULDADE ADVENTISTA DA AMAZÔNIA FABIANO SANTOS DE ARAÚJO FABIANO SILVA A DOUTRINA DA PREDESTINAÇÃO EM ROMANOS 8.29-30 BENEVIDES 2019 2 SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINO-AMERICANO DE TEOLOGIA FACULDADE ADVENTISTA DA AMAZÔNIA FABIANO SANTOS DE ARAÚJO FABIANO SILVA A DOUTRINA DA PREDESTINAÇÃO EM ROMANOS 8.29-30 Artigo submetido ao Seminário Latino- Americano de Teologia como parte dos requisitos necessários para a classe de TCC II da Faculdade Adventista da Amazônia, sob a orientação do Prof. Josafá da Silva Oliveira. BENEVIDES 2019 3 A DOUTRINA DA PREDESTINAÇÃO EM ROMANOS 8.29-30 1 Fabiano Santos de Araújo e Fabiano Da Silva 2 RESUMO A proposta dessa pesquisa é investigar qual tipo de predestinação o apóstolo Paulo está se referindo em Romanos 8:29-30. O estudo é de natureza exegética e bibliográfica, utilizando o método gramático-histórico para fundamentar o estudo. Essa doutrina tem sido um tema bastante controverso no meio cristão, sendo motivo de debate nos círculos teológicos e nas mais variadas igrejas. Questões como a ação de Deus na salvação ou condenação das pessoas e o livre-arbítrio do ser humano, tem servido de combustível para acirrar os debates. No entanto, ao examinar o texto bíblico, seu contexto e o significado dos termos relacionados ao assunto, podemos chegar à conclusão que Paulo, ao falar sobre a predestinação, estava afirmando que todos indiscriminadamente que aceitarem a Jesus Cristo, mediante a justificação pela fé e estão dispostos a manter a perseverança até seu breve retorno, serão finalmente salvos. Palavras-chave: Predestinação. Livre-Arbítrio. Eleição. Salvação. ABSTRACT The purpose of this research is to investigate what kind of predestination the apostle Paul is referring to in Romans 8:29-30. The study is exegetical and bibliographical in nature, using the historical-grammatical method to support the study. This doctrine has been a very controversial topic amongst Christians, being a subject of debate in theological circles and in the various churches. Issues such as God's action in the salvation or condemnation of people and the free will of man have fueled the debate. However, by examining the biblical text, its context, and the meaning of the terms related to the subject, we may come to the conclusion that Paul, in speaking of predestination, was asserting that all who indiscriminately accept Jesus Christ by justification through faith and willing to maintain perseverance until His soon return, will finally be saved. Keywords: Predestination. Free will. Election. Salvation. 1 INTRODUÇÃO O assunto desse artigo surge como resposta para uma pequena pesquisa realizada em maio de 2019 com cerca de 60 pessoas de uma comunidade de cristãos da Igreja Adventista do Sétimo dia, situada em Ananindeua no estado do Pará, onde foram propostos três temas - Discipulado, Mordomia e Predestinação - para pesquisa e produção de artigos sobre os quais 1 Artigo apresentado à disciplina TCC II para obtenção de nota final pela Faculdade Adventista da Amazônia, Professor da Disciplina: Weverton de Paula Castro. 2 Graduandos em Teologia Pastoral pela Faculdade Adventista da Amazônia. E-mail: fabianoaraujo.page@gmail.com, fabiano.silva@gmail.com mailto:fabianoaraujo.page@gmail.com 4 os membros da igreja tinham pouco ou nenhum conhecimento. Dos conteúdos propostos acima, o assunto sobre a predestinação foi o escolhido, pois tratava-se da temática sobre a qual as pessoas tinham mais dúvidas ou até nenhuma base de conhecimento. A presente pesquisa justifica-se pelo fato do tema, sobre a Predestinação, tratar-se de um assunto que envolve a questão do livre arbítrio, a salvação do ser humano e a ação de Deus nesse processo. Dessa forma, torna-se um assunto de importante estudo e elucidação, para que tais informações alcancem o maior número de pessoas sobre o que de fato Paulo declara sobre a predestinação em Romanos 8:29-30, Quando diz: Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou (Rm 8:29-30). Mediante o exposto, qual a intenção do apostolo ao escrever esse texto, ao usar a expressão “predestinou”, ele está confirmando o pensamento calvinista de um plano delineado por Deus para a salvação ou condenação dos seres humanos, independente de suas escolhas ou ações ou as pessoas têm a opção de escolher seu próprio destino pelo livre-arbítrio concedido por Deus? Poderia um ser humano, criatura de Deus, rebelar-se de tal forma que não siga o plano de dEle? Essas são questões bastante relevantes, pois têm a ver com a salvação ou condenação do indivíduo. Portanto, o objetivo principal dessa pesquisa é investigar a doutrina da Predestinação conforme está escrito em Romanos 8:29-30. Tendo como objetivos específicos, expor um breve debate sobre o assunto no meio cristão, fazer a exegese do texto em questão, bem como estudar a teologia paulina sobre a predestinação. Dessa forma, pretende-se uma compreensão melhor sobre o tema e de sua aplicação na atualidade. 2 BREVE DEBATE SOBRE PRESTINAÇÃO NA HISTÓRIA DO CRISTIANISMO O assunto em questão envolve um grande e antigo debate em torno da ação de Deus sobre o destino das pessoas e como elas respondem a essa ação, sendo inclusive um tema que tem divido opiniões em diversas denominações protestantes desde Calvino no século XVI até tempos modernos. Em relação à doutrina da predestinação na história do cristianismo, é importante destacar que esse não era um assunto de discussão aprofundado até à época de Agostinho, algumas referências sobre o tema são encontradas pelos primeiros pais da igreja, mas demonstram que eles não tinham chegado a um consenso sobre a predestinação e de forma geral chegaram ao que Berkhof menciona como “a presciência de Deus com referência 5 aos atos humanos, baseada na qual Ele determina o seu destino futuro”. (BERKHOF, 2012, p. 102). Canale declara que de “acordo com a tradição cristã, a predestinação significa que Deus causa o destino das pessoas e de todos os eventos da história por sua própria vontade e seu poder irresistível”, esse pensamento, segundo ele, “por meio da forte influência dos reformadores se tornou um elemento básico da teologia cristã” (CANALE, 2005, p.136). Sobre a história dessa doutrina, Berkhof ressalta que: A maioria dos reformadores defendeu a mais estrita doutrina da predestinação. De acordo com ele, esta afirmação é verdadeira mesmo quanto a Melanchton, considerado por muitos como um dos primeiros sistemático da história. Sobre Lutero, o autor assegura que ele aceitava a doutrina da predestinação, se bem que a convicção de que Deus queria que todos os homens fossem salvos o levou a enfraquecer um tanto a doutrina da predestinação nos últimos tempos da sua existência. Essa doutrina foi desaparecendo gradativamente da teologia luterana, que agora a considera total ou parcialmente como condicional. Já Calvino sustentou firmemente a doutrina agostiniana da predestinação dupla e absoluta. (BERKHOF, 2012, p. 104) Sobre a importância e influência dessa doutrina no período pós-reforma, Pinheiro em sua tese de mestrado declara: No Israel “eleito”, na Genebra de Calvino, na Escócia de John Knox, na Nova Inglaterra dos Puritanos, ou em quaisquer lugaresnos quais a predestinação se fez presente, trouxe essa característica de pertença e/ou o sentimento de se estar no “Centro do Mundo”. Revoluções foram nutridas, reis destronados, nações reformadas, conflitos e sínodos reunidos, transformações políticas, ideológicas, religiosas, econômicas e sociais acontecidas pelo poder dessa doutrina (PINHEIRO, 2017. p. 145). Para Weber a doutrina da predestinação trouxe uma influência “tanto na conduta quanto na concepção de vida, ainda quando sua vigência como dogma já estivesse em declínio: sim, ela não era senão a forma mais extrema da exclusividade da confiança em Deus” (WEBER, 1904/1905, p. 68). Na época de Calvino o debate em torno da predestinação se tornou mais acirrado principalmente diante da oposição dos arminianos, eles tinham pontos totalmente diferentes da compreensão da doutrina, Cairns ressalta que os ensinos de Jacobus Arminius começaram a divergir das doutrinas reformadas, principalmente com a formulação dos cinco pontos contra o calvinismo 3 . O arminianismo teve como base uma declaração teológica assinada por 3 Os cinco pontos do arminianismo foram apresentados ao Parlamento Holandês, e um Sínodo Nacional da igreja foi convocado para se reunir em Dort em 1618, a fim de examinar o ensinamento de Arminius à luz das Escrituras: 1. Livre arbítrio, ou capacidade humana; 2. Eleição condicional; 3. Redenção universal, ou expiação geral; 4. A obra do Espírito Santo na regeneração limitada pela vontade humana; 5. Cair da graça (CAIRNS, 2008, p. 292). 6 45 ministros e apresentado ao estado holandês. O chamado Sínodo de Dort que ocorreu entre os anos 1618 e 1619 ( CAIRNS, 2008, p. 292). Cairns resume o debate ressaltando que tanto Armínio quanto Calvino ensinavam que o homem por ter herdado o pecado de Adão, estava sob a ira de Deus. Sobre essa questão Armínio “cria que o homem era capaz de procurar a salvação antes mesmo de Deus lhe conceder a graça fundamental que habilita sua vontade para cooperar com Deus”. Calvino, por sua vez, assegurava que “a vontade do homem fora tão corrompida pela queda que a salvação era uma questão exclusiva da graça divina” (Apud, CAIRNS, 2008. p. 293). Sobre a eleição, Armínio acreditava que o processo de salvar alguns e condenar outros tinha seu fundamento na presciência de Deus e a eleição era condicional, enquanto Calvino aceitava a eleição incondicional feita por um Deus soberano, tanto para a graça como para a condenação. (Ibidem, 2008. p. 293). Sobre a forma como Calvino formulou sua doutrina Gonzales faz a seguinte divisão: A doutrina de Calvino sobre a predestinação pode ser resumida em três termos: (a) absoluta: não é condicionada por quaisquer circunstâncias finitas, mas repousa exclusivamente na vontade imutável de Deus; (b) particular: por aplicar-se a indivíduos e não a grupos de pessoas; Cristo não morreu por todos indiscriminadamente, mas somente pelos eleitos;(c) dupla: Deus em sua misericórdia ordenou alguns indivíduos para a vida eterna e em sua justiça ordenou outros para a condenação eterna (GONZALEZ, 1997. p. 107). A ideia formulada acima e basicamente aceita pela maioria das igrejas reformadas, primeiramente, era que Deus como Soberano, tem todo o direito de escolher quem será salvo ou perdido. Um segundo ponto é que a morte de Cristo não ocorreu por todos, mas unicamente pelos escolhidos ou eleitos. Finalmente a ideia de que Deus de antemão reservou alguns para vida eterna e outros infelizmente para a condenação eterna. 3 EXEGESE DE ROMANOS 8:29-30 3.1 DELIMITAÇÃO DA PERICOPE A pericope do texto em questão, vai de Rm 5:1 a 8:39, nessa seção da epistola, Paulo aborda assuntos doutrinários e trata sobre o tema da justificação pela fé, que é o tema central de sua epístola. Depois discorre sobre assuntos como a diferença entre Adão e Cristo, a lei e a graça e aspectos relacionados à herança, também discorre sobre o chamado e a predestinação para seus filhos que foram adotados mediante o sacrifício de Cristo. 3.2 TRADUÇÃO DO TEXTO Em relação a variantes textuais, o texto de Romanos 8:29-30 não apresenta varições importantes que dificultem ou alterem drasticamente o significado do texto 7 Texto Grego 29ὅτι οὓς προέγνω καὶ προώρισεν συμμόρφους τῆς εἰκόνος τοῦ Υἱοῦ αὐτοῦ εἰς τὸ εἶναι αὐτὸν πρωτότοκον ἐν πολλοῖς ἀδελφοῖς 30 οὓς δὲ προώρισεν τούτους καὶ ἐκάλεσεν καὶ οὓς ἐκάλεσεν τούτους καὶ ἐδικαίωσεν οὓς δὲ ἐδικαίωσεν τούτους καὶ ἐδόξασεν Tradução Pessoal 29- Aqueles que Deus conheceu, Ele também predestinou, conforme a imagem de seu filho, para ser o primogênito de muitos irmãos. 30- Aqueles a quem Ele predestinou, estes também chamou e a quem Ele chamou, estes também justificou, e a quem justificou, a estes também glorificou. Versão Revista Almeida e Atualizada 29- Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. 30- E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou. 3.3 CONTEXTO HISTÓRICO DE ROMANOS A carta de Paulo aos Romanos tem sido considerada como uma das grandes influenciadoras da teologia cristã. Tanto que para Murray, “Romanos é uma exposição e uma defesa do evangelho da graça” (MURRAY, 2003, p. 12). John Stott a considera “uma espécie de manifesto cristão” (STOTT, 2003, p. 13). Já F. F. Bruce chama Romanos de “o evangelho segundo Paulo” (BRUCE, 2001, p. 20). Para Guilherme Orr, Romanos “é o maior livro já escrito” (ORR, 1976, p. 26). Segundo Molina, Romanos “tem vital importância para a compreensão da teologia do Novo Testamento” e para ressaltar sua ideia ele cita Phillip Schaff, que diz: Romanos é a produção mais extraordinária do homem mais extraordinário. Ela é o seu coração. Ela contém sua teologia, tanto teórica quanto prática, por meio da qual ele viveu e morreu. Ela confere a exposição mais clara e abrangente das doutrinas sobre o pecado e a graça, além da melhor solução possível para o domínio universal do pecado e da morte na redenção universal por meio do segundo Adão (SCHAFF, 2002, p. 766, Apud MOLINA, 2018, p. 15). A epístola aos Romanos foi escrita provavelmente entre os anos 57-58, na cidade de Corinto, um pouco antes de Paulo retornar para Assíria, durante sua terceira viagem missionária. Molina ressalta ainda que nesse período, “os ensinamentos de Cristo não eram reproduzidos apenas de forma oral, eram também disseminados por meio de textos e cartas https://biblehub.com/greek/3754.htm https://biblehub.com/greek/3739.htm https://biblehub.com/greek/4267.htm https://biblehub.com/greek/2532.htm https://biblehub.com/greek/4309.htm https://biblehub.com/greek/4832.htm https://biblehub.com/greek/3588.htm https://biblehub.com/greek/1504.htm https://biblehub.com/greek/3588.htm https://biblehub.com/greek/5207.htm https://biblehub.com/greek/846.htm https://biblehub.com/greek/1519.htm https://biblehub.com/greek/3588.htm https://biblehub.com/greek/3588.htm https://biblehub.com/greek/1510.htm https://biblehub.com/greek/846.htm https://biblehub.com/greek/4416.htm https://biblehub.com/greek/1722.htm https://biblehub.com/greek/4183.htm https://biblehub.com/greek/80.htm https://biblehub.com/greek/3739.htm https://biblehub.com/greek/1161.htm https://biblehub.com/greek/4309.htm https://biblehub.com/greek/3778.htm https://biblehub.com/greek/2532.htm https://biblehub.com/greek/2564.htm https://biblehub.com/greek/2564.htm https://biblehub.com/greek/2532.htm https://biblehub.com/greek/3739.htm https://biblehub.com/greek/2564.htm https://biblehub.com/greek/3778.htm https://biblehub.com/greek/2532.htm https://biblehub.com/greek/1344.htm https://biblehub.com/greek/3739.htm https://biblehub.com/greek/1161.htm https://biblehub.com/greek/1344.htmhttps://biblehub.com/greek/3778.htm https://biblehub.com/greek/2532.htm 8 escritas por seus seguidores, dessa forma sua mensagem tinha mais condições de ser preservada para o futuro” (MOLINA, 2018, p.16). Sobre o propósito de Paulo ao escrever Romanos, o CBA escreve: Na hora de escrever a carta, Paulo estava prestes a voltar para a Palestina, levando uma contribuição das igrejas na Macedônia e da Acaia. A oferta seria entregue aos cristãos pobres em Jerusalém (Rm 15:25, 26; cf. At 19:21; 20:3; 24:17; ICo 16:1-5; 2Co 8:1-4; 9:1, 2). Depois de concluir essa missão, ele pretendia visitar Roma e, de lá, viajar para a Espanha (At 19:21; Rm 15:24, 28). Até então, ele não tinha sido capaz de visitar a igreja cristã na capital do império romano, embora, muitas vezes, tivesse desejado fazê-lo (Rm 1:13; 15:22). Naquele tempo, ele cria que havia terminado seu trabalho missionário na Ásia e na Grécia (Rm 15:19, 23), e estava ansioso por avançar ao oeste, a fim de fortalecer o trabalho na Itália e introduzir o cristianismo na Espanha (ver AA, 373). A fim de alcançar esse último propósito, Paulo desejava conseguir o apoio e a cooperação dos cristãos de Roma. Assim, na expectativa de sua visita, ele escreveu esta carta, descrevendo-lhes em termos claros e fortes os grandes princípios do evangelho (Rm 1:15; 2:16; ver p. 91-93). (CBA, Vol. 6, 2007, p.509). Referindo-se à forma da escrita e sua tradução, Barclay declara que “é especialmente difícil”. Ele diz ter usado várias versões da carta, mas, para dar o claro significado, “se viu obrigado não poucas vezes a recorrer à paráfrase mais que à tradução” (BARCLAY, 1956, p.3). Pedro em sua segunda epístola afirma que por conta dos escritos de Paulo serem difíceis de entender, muitos os deturpam e por conta disso, buscam a sua própria destruição (II Pedro 3:16). Molina afirma: Mesmo que existam acadêmicos que sugerem que ela foi escrita em latim, não existe nenhuma comprovação sólida para se chegar a essa conclusão, pois mesmo que muitas obras da literatura cristã foram escritas em latim, principalmente após a publicação da Vulgata Latina por Jerônimo no século IV d.C., um estudo aprofundado do texto de Romanos no grego, indica um estilo e gramática com procedência do primeiro século de nossa era, dessa forma, não existe nenhuma evidência interna que comprove que o latim tenha sido o idioma original de qualquer carta paulina (Ibidem, 2018, p.17). Quanto à autoria, a carta aos romanos tem pouco ou quase nenhum questionamento (CBA, 2007, Vol.6, p. 509). E Tércio mencionado em Rm 16:22, parece ter sido um auxiliar literário de Paulo (Rm 1:1). Sobre essa questão Pohl escreve: Ele escreveu, i. é, ditou essa carta a Tércio (Rm 16.22) imediatamente antes de sua própria partida para Jerusalém (15.25). Ocorre que de acordo com Rm 16.23, Paulo se encontrava em Corinto na casa de seu anfitrião Gaio. Essa última permanência em Corinto antes de sua viagem a Jerusalém durou, conforme At 20.2,3, três meses e coincidiu com o inverno de 55-56. Essa fixação da data de redação é compartilhada pela pesquisa em geral com somente pequenas divergências. (POHL, 1999, p.10). A cidade de Corinto é provavelmente o local em que a carta aos Romanos foi escrita, fato que deve ter ocorrido no final da terceira viagem missionária de Paulo, no período de três 9 meses em que esteve na cidade de Corinto, a data dessa visita a essa cidade, ocorreu entre 57 e 58 d.C. é provável que ele estava hospedado na casa de Gaio, a quem havia batizado (1 Cor 1:14), na parte final da carta, Paulo faz uma recomendação a Febe ( Rm 16:1), uma diaconisa da cidade portuária de Cencreia, situada a 10 km de Corinto, que possivelmente foi a portadora da carta para a capital Roma (CBA, 2014, p. 509). A igreja em Roma não parece ter sido fundada por algum apóstolo, pois segundo é constatado historicamente, essa comunidade de cristãos já existia muito antes de Paulo ter ido visitá-la pela primeira vez. Sobre essa questão Barclay diz que “quando Paulo escreveu à Igreja de Roma estava escrevendo a uma igreja com a qual não teve parte em sua fundação, e com a qual não teve nenhum contato pessoal” (BARCLAY, 1956, p.9). Segundo Barclay, mesmo com a expulsão dos judeus por Claudio em 52 d.C. (Ibidem, 1952, p. 19), Roma tinha uma colônia bem numerosa de judeus, pois com a morte de Claudio, muitos deles tinham retornado a Roma. Como o número de gentios convertidos aumentou bastante, os problemas relacionados à lei e a circuncisão, criou oposição entre os cristãos romanos e os judeus cristãos, o que em parte pode explicar o conteúdo da carta de Paulo sobre a funcionalidade da lei e seu relacionamento com a justificação pela fé (Bíblia de Estudos Andrews, 2015, p. 1455). Nesse período Roma passava por um período de relativa paz e prosperidade sob o governo de Nero (54-68 d.C.), no entanto, de acordo com Molina a situação rapidamente mudou por conta das atrocidades e cruel imoralidade da ultima parte de seu reinado, com o incêndio da capital, que historicamente é atribuído a Nero, mas que foi colocado sob à responsabilidade dos Judeus, ocorreu a segunda expulsão e uma acirrada perseguição à igreja naquele tempo. (MOLINA, 2018, p. 16). Esse era o contexto no qual a igreja de Roma se encontrava quando Paulo envia sua epístola, uma igreja que o apostolo tinha muita vontade de conhecer pessoalmente e de poder fortalecer a doutrina e a fé desse grupo de cristãos da capital romana. 4 ANÁLISE LITERÁRIA DE ROMANOS 4.1 GÊNERO DO TEXTO O Escrito de Paulo é do gênero epistolar, sobre essa questão, Vielhauer diz que Romanos “não é um tratado em forma de epistola, mas uma epistola em forma de tratado” (Vielhauer, 2005, p.87). Em relação ao gênero da carta, Kummell afirma: De fato, Romanos está elaborada como um longo discurso que, no entanto, se veste da forma epistolar contemporânea, cujo Pré-escrito (remetente, destinatário e saudação) e Conclusão, próprios de uma correspondência, são facilmente 10 perceptíveis (cf.1.1-7;15.14-16.25). Romanos, portanto, é deverasmente uma Epístola, isto é, uma carta. Contudo, seu caráter de carta particular se mescla com características e tônicas bastante tratadícias, de modo que a epístola de Paulo aos Romanos é, do ponto de vista do gênero literário, um escrito verdadeiramente híbrido (misto), como o são as outras obras do apóstolo (KUMMELL, 2003, p. 318). 4.2 ESBOÇO DA CARTA AOS ROMANOS (BARCLAY,1956, p. 14). Introdução (Rm: 1:1-17). Identificação de Paulo (Rm: 1:1-7). Desejo de Paulo de visitar Roma (Rm: 1:8-15). Resumo Geral 1. Todos pecaram (Rm: 1:18 e Rm: 3:20). 2. Justificação apenas pela fé (Rm: 3.21 e Rm: 5:21). 3. Praticando Justiça na vida Cristã (Rm: 6:1 e Rm: 8:39) 4. Deus e Israel (Rm: 9:1 e Rm: 11:36). 5. Aplicações práticas 6. A situação de Paulo (Rm: 15:14-33). 7. Recomendações pessoais (Rm: 16:1-24). 8. Bênção (Rm: 16:25-27). Barclay sugere ainda um resumo da epístola em quatro divisões: (1) Capítulos 1-8, que tratam do problema da justiça. (2) Capítulos 9-11, que tratam o problema dos judeus, o povo escolhido. (3) Capítulos 12-15, que tratam questões práticas da vida diária. (4) Capítulo 16, que é uma carta de apresentação para Febe, e uma lista final de saudações pessoais. 4.3 RELAÇÕES DO TEXTO COM O CONTEXTO IMEDIATO E AMPLO. Sobre a importância do capitulo 8 de Romanos para a compreensão da salvação em Cristo Jesus, Lopes diz que “Ninguém nos pode acusar porque é Deus quem nos justifica (8.33). Ninguém nos pode condenar, pois Cristo morreu, ressuscitou, está à destra de Deus e intercede por nós (8.34). O resultado disso é nenhuma condenação” (LOPES, 2010, p. 279). Dessa forma, pode-se dizer que na divindade não existe condenação, a disposição divina é para salvar a todos, a condenação dependedas escolhas de cada um. O capitulo 8 foi escrito por Paulo em resposta ao capitulo anterior, onde o apostolo fala das dificuldades da vida do cristão. Por isso nesse capitulo, ele substitui a condenação 11 pela liberdade e vitória garantida por meio de Jesus Cristo (Lição da Escola Sabatina, 2017, p. 107). No capitulo 7, vemos Paulo advertindo que viver sem Cristo é uma experiência miserável, pois a pessoa vive escrava do pecado e se torna incapaz de praticar as escolhas certas, já em Romanos 8, ele assegura que com Cristo o homem pode ser liberto do pecado e tem liberdade para fazer as melhores escolhas, mesmo que a carne milite contra o espírito (Ibidem, 2017, p. 107). Nesse sentindo, Paulo está dizendo que a vida de um predestinado, está totalmente condicionada à forma como ele reage diante das investidas da carne, sendo que a vitória está relacionada com a comunhão diária do individuo com o Espírito Santo, pois justamente Ele, segundo Paulo “nos assiste em nossas fraquezas” (Rm.8:26). Por isso, os predestinados necessitam ter uma vida de comunhão com Cristo, não existe a questão de uma vez salvo, salvo para sempre como prega a doutrina da predestinação em relação aos salvos. O CBA declara: A confiança expressa no v. 28 é justificada e confirmada por uma explicação sobre a forma como é desenvolvido o propósito de Deus para aqueles que O amam. Esse propósito inclui todas as fases do processo de salvação (v. 29, 30). Assim, os que aceitam o chamado de Deus e se submetem a Seu propósito têm a certeza de que Ele vai completar por eles cada etapa em Seu plano de salvá-los. As aflições nada mais são do que o meio pelo qual eles devem chegar a “ser [...] conformes à imagem de Seu Filho”. (CBA, Vol.6, 2007, p.631) A mensagem de Paulo em Romanos 8:29-30 deixa claro que Cristo tornou possível a vitória sobre os pecados somente para aqueles que creem nEle, assim os requisitos da Lei, não servem como uma forma de obtenção de salvação, mas como o resultado dela, dessa forma a obediência à lei, jamais foi ou será um meio de salvação, Por isso em Romanos 8, Paulo traz uma mensagem única sobre justificação pela fé em Cristo Jesus. O contexto amplo da carta aos Romanos apresenta vários versos que se relacionam com o texto, confirmando o conteúdo e ensino de Paulo em Rm 8:29-30. Em toda a carta é possível relacionar a vida dos predestinados com a fundamentação doutrinária de Paulo sobre justificação pela fé, contrariando totalmente a ideia de predestinação dupla do ensino calvinista ou da participação ativa do ser humano no processo de salvação do ensino arminiano, pois se alguém já está predestinado à salvação ou condenação, ou pode fazer qualquer coisa que ajude a Deus nesse processo, qual a razão de fazer uso da fé e viver em santo procedimento, pois segundo o apostolo, todos que creem são justificados pela fé, mediante Jesus Cristo e Deus não faz distinção entre judeus ou gentios (Rm. 3:22-26). 12 Nesse sentindo, no primeiro capitulo de Romanos já podemos encontrar Paulo a falar sobre o contexto de predestinação bíblica. Dessa forma, já na saudação da carta, ele diz que foi chamado por meio do apostolado do amor, para a obediência na fé (Rm 1:5) e em seguida, nos versos 6 e 7 declara que os cristãos de Roma foram chamados para serem de Jesus Cristo e para serem santos. Nos versos seguintes, quando Paulo fala sobre a depravação do ser humano, afirma que isso ocorre não por que estavam predestinados, mas é devido às próprias escolhas dos indivíduos (v.21-23). No capitulo 2:1-16, vemos Paulo advertindo seus leitores que Deus é imparcial na condenação de justos e injustos, dessa forma, não é Deus quem determina quem será salvo ou condenação, essa ação parte do individuo, pois segundo Paulo, “Cada um receberá a retribuição segundo a sua forma de proceder” (v. 6). Nesse viés, seria contraditório o apostolo tratar da predestinação no capitulo 8, sob o ponto de vista da divindade determinando a salvação ou condenação do ser humano, sendo que no inicio da carta ele relata a imparcialidade dEles nesse processo. No cap 3, vemos Paulo respondendo a objeções, tendo em vista que alguns judaizantes estavam lançando doutrinas que iam contra os ensinos do apostolo sobre justificação pela fé, nesse trecho, ele deixa claro que ninguém possui vantagem (predestinação) sobre o outro em relação ao pecado, pois todos são culpados diante de Deus, por isso “não há justo, nem um sequer” (Rm 3:9,10). Algo interessante a se notar no ensino da justificação pela fé em Romanos, é que Paulo na maioria das vezes faz questão de destacar o desejo de Deus de salvar “todos” os seres humanos, ele destaca: “A justiça de Deus, mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem; porque não há distinção” (Rm 3:22). Ora, se não existe distinção da parte divina entre justos ou injustos, logo não há razão para Deus predeterminar quem será salvo ou condenado, pois isso parte da escolha e ação do indivíduo. Nos capítulos seguintes, vemos Paulo discorrer sobre o exemplo de Abraão e como ele e sua descendência receberam a promessa não pelas obras ou pela lei, mas mediante a justificação pela fé (Rm 4:13-14), dessa forma, confirma que a salvação é mediante a fé em Cristo Jesus. No capitulo 6 Paulo discorre sobre a liberdade em Cristo por meio da graça, pois todos que aceitaram o chamado, devem viver em obediência (v.16), ele ressalta ainda que no futuro ocorrerá o juízo de Deus, e a sentença ocorrerá de acordo com as escolhas dos seres humanos, assim fica evidente que as pessoas podem fazer uso do livre-arbítrio concedido por Deus (v.22,23). 13 Buscando confirmação do desejo divino de salvar toda a raça humana fora da carta aos Romanos é possível identificar que o ensino do apostolo está de acordo com a doutrina bíblica de predestinação. Jesus o maior e melhor modelo quando o assunto é salvação, declarou em João 3:16 “ Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito, para que todo o que nEle crer não pereça, mas tenha a vida eterna”, o termo grego usado aqui é κόσμος, ou seja, Deus deseja salvar o mundo todo, não apenas uma parte dele. Pode-se encontrar base para a predestinação bíblica em vários outros textos, por exemplo, (At 4:28; 1 Co 2:7; Ef 1:5, 11; 2 Tm 1:9). Sobre o conceito de predestinação na bíblia, Canale diz: A Escritura reporta-se ao projeto divino para a salvação da humanidade com palavras tais como "propósito” (prothesis, “um plano traçado com antecedência" [Rm 8:28; 9:11; Ef 1:11; 3:11; 2Tm 1:9]), “mistério" (Ef 3:9) e "sabedoria de Deus em mistério” (ICo 2:7). A palavra “predestinação", que ocorre na Bíblia como o verbo proõrizõ; (“decidir de antemão"), também é empregada pelos escritores bíblicos para se referir à decisão prévia e eterna de Deus com respeito ao plano da salvação (At 4:28; Rm 8:29, 30; ICo 2:7; Ef 1:5, 11). (Tratado de Teologia Adventista, 2011, p. 130). Diante do exposto, pode-se concluir que a predestinação no contexto bíblico, não encontra apoio na ideia de que a divindade determina a salvação ou condenação eterna das pessoas, segundo Canale a própria escritura nega a idéia de que Deus predetermina o destino das pessoas, sobre isso ele faz a seguinte declaração: Em primeiro lugar, Paulo estabelece claramente a diferença entre presciência e predestinação (Ro 8:29). Os dois conceitos, portanto, não devem ser confundidos. Em segundo lugar, de acordo com a Escritura, a salvação dos seres humanos envolve não apenas o plano de predestinação divina e as obras de salvação, mas também a espontânea resposta ao chamado e sugestão do Espírito Santo (Ibidem, 2011, p. 130,131). Nesse sentido, a bíblia demonstra que a questão do livre-arbítrio está inserida no contexto de salvação exposto pelo apostolo Paulo em Rm 8:29-30, bem como em toda a carta,cujo tema principal é a justificação pela fé em Cristo Jesus, assim como em toda a escritura, que evidencia um Deus que sempre está em busca dos perdidos com o desejo de que sejam salvos, pois o trabalho da divindade é sempre para “que nenhum pereça, senão que todos cheguem aos arrependimento” (II Pd. 3:9.b). 4.4 SIGNIFICADO E USO DOS TERMOS RELACIONADOS. 4.4.1 “PROORIZO” RM 8:29 A palavra προοριζω (proorizo), o verbo está no particípio passivo aoristo, sendo traduzida como "predestinar" aparece seis vezes no Novo Testamento grego: Atos 4:28; Romanos 8: 29-30; 1 Coríntios 2:7; Efésios 1: 5, 11 é a combinação de duas palavras: pro , 14 "antes" e Orizo "definitivamente mostrar" e comunica a ideia de limitar o avanço ou o estado de antecedência. As seis referências estabelecem diferentes facetas do plano divino de redenção e de seu desenvolvimento. (BERKHOF, 2012, p. 106). Sobre a forma como a palavra “predestinação” é empregada em casos distintos, Berkhof faz a seguinte declaração: A Palavra "predestinação" nem sempre é utilizada no mesmo sentido. Ás vezes é empregada simplesmente como sinônimo da palavra geral "decreto". Noutros casos, serve para designar o propósito de Deus com respeito a todas as Suas criaturas morais. Mais frequentemente, porém, denota "o conselho de Deus concernente aos homens decaídos, incluindo a eleição soberana de uns e a justa reprovação dos restantes" (BERKHOF, 2012, p. 103). Para Berkhof, o termo “predestinado” encontrado em Rm 8:29,30; At:4.28; 1 Co:2.7; Ef:1.5,11, “significa marcar de antemão, estabelecer limites para alguém ou limitar alguém de antemão”. Ainda sobre o significado e uso do termo ele diz: A palavra portuguesa horizonte é derivada dessa palavra grega. O destino, ou horizonte, do cristão foi estabelecido por Deus desde a eternidade: tornar-se semelhante ao seu Filho. Note como os termos predestinou, chamou, justificou e, especialmente, glorificou em Rm 8.29,30 estão todos no tempo passado. Isso se dá porque Deus, de Sua perspectiva eterna, vê o processo da salvação com já tendo sido completado. (Ibidem, 2012, p. 103) Sobre Rm 8:29, Moody declara: “Paulo aqui está pensando em um grupo composto de indivíduos certamente, mas, não obstante, um grupo de indivíduos que constituem um todo incorporado. Isto é idêntico ao procedimento do apóstolo em Ef.1:4, onde ele diz : Como também nos (plural) elegeu nEle (isto é, em Cristo). Cristo é o Eleito ou Escolhido (veja Lc. 9:35; 23:35; I Pe. 2:4, 6); e os crentes - aqueles que pertencem a Deus - são eleitos ou escolhidos nEle (isto é, em Cristo)”. (MOODY, 1983 p. 72). 4.4.2 “GINOSKEIN”, ”PROGINOSKEIN” E “PROGNOSES. As expressões acima, segundo Berkhof estão relacionadas com o termo hebraico “yada”, e podem significar simplesmente “conhecer” ou “tomar conhecimento” de alguém ou de alguma coisa, como também pode ter o sentido de “tomar conhecimento de alguém com profundo amor”, dessa forma, pode expressar a ideia de eleição. Essas expressões segundo ele, “tem como seu ingrediente básico o conhecimento”. (BERKHOF, 2012, p.103). Sobre o papel dos eleitos, Berkhof diz: Este grupo de indivíduos são dantes conhecidos, no sentido de que tem um lugar distinto no plano ou propósito de Deus (Rm. 8:29). Eles têm um papel a executar no plano divino. Quando o verso declara: “Aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho” (v. 29). A decisão de Deus aqui, é que aqueles que compõem este grupo sejam semelhantes a Seu Filho em forma e aparência. (Ibidem, 2012, p.106). 15 5 ANÁLISE TEOLOGICA DE ROMANOS 8:29-30. Como já visto anteriormente o termo “Predestinou” do gr. Proorizõ, que significa “separar de antemão”, sendo traduzida como “predeterminar” (At 4:28) e “preordenar” (lCo 2:7), de acordo com Berkhof “sempre são utilizadas para se referir à predestinação absoluta, dessa forma, está relacionado aos que são predestinados para certo fim” (BERKHOF, 2012, p. 103). Para fundamentar a ideia de predestinação bíblica, Geisler declara: Da mesma forma que Deus pre-determinou, desde a eternidade, que daria a sua vida pelos nossos pecados (At 2.23), Ele também predestinou os que seriam conforme a imagem de Cristo]. Como declarou Paulo: “Porque os que dantes conheceu, também os predestinou para serem conformes a imagem de seu Filho” (Rm 8.29). (GEISLER, 2003, p. 196). Sobre o contexto de salvação na doutrina da predestinação, o Comentário Bíblico Adventista traz a seguinte declaração: A salvação da família humana sempre foi à finalidade de Deus. Ele “deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (lTm 2:4), “não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” (2Pe3:9). "Tão certo como Eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho e viva” (Ez 33:11). O próprio Cristo disse: “Vinde a Mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei” (Mt 11:28). “Quem quiser receba de graça a água da vida” (Ap 22:17). “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o Seu Filho unigênito, para que todo o que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (jo 3:16). (CBA, 2013, Vol.6, p. 633). O desejo da Divindade é que todos recebam a salvação, mas por conta do livre- arbítrio, o ser humano pode infelizmente rejeitar o convite Divino. A salvação não pode ser imposta, dessa forma, a liberdade humana não está isenta na predestinação, por isso não é possível encontrar qualquer base bíblica em Paulo ou em qualquer outro escritor Bíblico que sugira que Deus predestinou uns para a salvação e outros para a condenação, independentemente de sua ação ou atitude (CBA, 2013, Vol 6, 632). Em Romanos 8:29, Paulo declara que somos escolhidos em Cristo, ou seja, Ele é o padrão, por isso somo justificados em Cristo pela fé. Sobre essa questão Moody Diz: Paulo aqui está pensando em um grupo – composto de indivíduos certamente – mas, não obstante, um grupo de indivíduos que constituem um todo incorporado. Isto é idêntico ao procedimento do apóstolo em Ef.1:4, onde ele diz : Como também nos (plural) elegeu nEle (isto é, em Cristo). Cristo é o Eleito ou Escolhido (veja Lc. 9:35; 23:35; I Pe. 2:4, 6); e os crentes - aqueles que pertencem a Deus - são eleitos ou escolhidos nEle (isto é, em Cristo). (MOODY, 1983, p 72). Sobre o objetivo do apóstolo em Rm 8:29, Moody assegura que parece ser prático, já que Paulo tenta confortar o aflito povo de Deus, mostrando que a salvação está nas mãos divinas e em processo de ser executada segundo o propósito eterno e imutável do Céu. 16 Contudo, isso não exclui o ser humano em relação à aceitação desse destino assegurado por Deus, por isso o ser humano é dotado do livre-arbítrio, dessa forma, pode responder positiva ou negativamente ao chamado divino. (Ibidem, 1983, p. 71). Sobre Rm 8:29-30, Bruce ressalta que: A expressão “Aos que conheceu de antemão” “tem a mesma conotação da graça motivadora da eleição encontrada no verbo “conhecer” no Antigo Testamento, pois quando Deus toma conhecimento das pessoas de maneira especial, faz recair nelas sua escolha, como constam em algumas passagens como Amós 3:2 e Oséias 13:5 (BRUCE, 2007, p.144). A perspectiva bíblica para a predestinação segundo Bruce, é que “o pré-conhecimento e a preordenação pertencem ao conselho de Deus, enquanto a vocação e a justificação acontecem na experiência de seus seguidores, que ao viverem de acordo com o chamado receberão à glória reservada somente para quem aceitar viver pela fé” (Ibidem, 2007, p.45). Para Champlim, em relação à salvação, a predestinação sempre atua positivamente, dessa forma não tem nada a ver com a reprovação de quem pelo livre-arbítrio escolheu andar fora da fé, nesse viés ele declara:Não existe predestinação para a reprovação, portanto. Em outras palavras, apesar de que Deus predestina para a vida, para a transformação segundo a imagem de Cristo e para a santidade, isso não quer dizer que, por outro lado, ele predestine alguns para a condenação, conforme alguns teólogos calvinistas mais radicais tem imaginado. Podemos notar que ate mesmo no nono capitulo da epistola aos Romanos, o trecho bíblico mais forte sobre a predestinação, podemos ler, no décimo quinto versículo: “Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia, e compadecer- me-ei de quem me aprouver ter compaixão”, o que mostra que a determinação divina sempre visa ao lado positivo, servindo como agente de misericórdia, ao invés de visar ao lado negativo, como agente de condenação e juízo. Assim, pois, o Senhor Deus tolerou os vasos de ira, mas preparou os vasos de misericórdia (CHAMPLIN, 1998, p. 726). Nesse sentido, é importante ressaltar que a ação divina na perspectiva paulina sempre foi em favor da salvação dos seres humanos, pois Paulo certamente não entraria em contradição com os ensinos de Cristo, que ao falar sobre sua missão, declara: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo. 3:16). Nesse verso fica evidente a intenção divina de salvar o “mundo” e “todo aquele que crê”, por conta disso, a salvação é oferecida a qualquer um que mediante a justificação pela fé em Cristo aceitar o chamado de Deus. CONCLUSÃO A pesquisa em questão teve como objetivo principal identificar qual tipo de predestinação o apostolo Paulo estava se referindo em Rm 8:29-30. Para entender melhor a doutrina, um breve debate foi exposto sobre o assunto, também uma exegese do texto foi realizada, dessa forma foi possível alcançar um melhor entendimento do contexto histórico da 17 igreja em Roma, o significado dos principais termos usados por Paulo no texto, bem como sua relação com o contexto imediato e amplo da carta e da bíblia. Em virtude do que foi exposto na pesquisa e da importância do tema para a compreensão do processo de salvação, da ação da divindade na predestinação e a resposta humana. É importante ressaltar que quando Paulo discorreu sobre a predestinação em Rm.8:29-30, ele se dirigia a um grupo misto de Cristãos judeus e gentios em Roma, portanto, certamente ele estava buscando um elo unificador entre eles e não algo que os tornasse ainda mais exclusivistas. Em toda a carta, a tese de Paulo está baseada na justificação pela fé em Cristo, por isso, para ele, nada que alguém pudesse fazer, serviria para torna-lo justificado ou escolhido por Deus. Nesse viés, qualquer um, sendo judeu ou gentio podia aceitar o chamado de Deus para ser conforme a imagem de Cristo (Rm.8:29). O desejo do apostolo nesse texto, é ajudar a igreja em Roma a caminhar em direção à santificação pelo Espírito Santo, pois esse era justamente o instrumento que os faria vencer o velho homem com sua natureza carnal. Por isso, quando Paulo fala de predestinação, ele não está se referindo aos que estão em melhor condição na sociedade, que tem posses ou uma excelente formação acadêmica, nem está decretando que os pobres e marginalizados estão desfavorecidos diante de Deus. Muito pelo contrário, ele está se referindo aqueles que independente do status quo, estão dispostos a crer em Jesus Cristo, pois a base da eleição é a fé não no que o homem pode fazer, mas no que Cristo já realizou pelo pecador. Mediante isso, o grande propósito da predestinação em Rm.8:29-30 é a criação de uma raça que possa manifestar a glória de seu Deus, por isso, Deus fez um chamado especial, justificando por meio de Cristo, mediante a fé, aqueles que aceitaram o chamado. Dessa forma, todos que aceitarem o chamado de Deus poderão experimentar a glorificação que se encontra no futuro próximo (Rm 8:30). Segundo Lopes, “Aqueles a quem Deus escolheu e por quem Cristo morreu são eficazmente chamados para a salvação, mediante a fé na verdade e a santificação do Espírito” (LOPES, 2010, p.9). Por isso, quando Paulo se refere à predestinação em Rm 8:29,30, ele está dizendo que o chamado dos salvos, está baseado no sólido alicerce da eleição do Pai, mediante a morte de Jesus e da transformação operada pelo Espírito Santo a cada dia, assim toda a divindade está envolvida no processo de salvação do crente. Fica então evidente que os predestinados foram chamados para serem conforme a imagem de Cristo, mediante a fé e a santificação proporcionada pelo viver no Espírito. Sendo o destino final deles, a glorificação que aguarda todos aqueles que permanecerem firmes na promessa de salvação eterna. 18 19 REFERÊNCIAS ARMÍNIO, Jacó. As obras de Armínio. Volumes: 1, 2, 3. Rio de Janeiro: CPAD, 2015. BEZERRIL, Moisés C. 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