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Geovana Sanches, TXXIV DIABETES MELLITUS TIPO 2 O diabetes mellitus tipo 2 é responsável por 90 a 95% de todos os casos de diabetes. Ele surge habitualmente após os 40 anos de idade e a maioria dos pacientes acometidos (cerca de 80%) são obesos. Em decorrência do aumento da obesidade entre adultos jovens, adolescentes e crianças, a incidência de DM2 nessa população vem aumentando. Aproximadamente 70 a 90% dos pacientes com DM2 têm também a síndrome metabólica, caracterizada por um aglomerado de fatores que implicam em risco cardiovascular elevado, tais quais: dislipidemia, obesidade abdominal, resistência insulínica, tolerância alterada à glicose (ou diabetes) e hipertensão arterial sistêmica. Vale ressaltar que o aumento da circunferência abdominal por si só já é um fator de risco aumentado para eventos cardiovasculares. A síndrome hiperosmolar hiperglicêmica é a complicação aguda clássica do DM2 e se caracteriza por glicemias muito elevadas, habitualmente maiores que 600mg/dL. Implica em elevada mortalidade. PATOGÊNESE Os principais mecanismos fisiopatológicos que levam à hiperglicemia no DM2 são: • Resistência periférica à ação insulínica nos adipócitos e músculo esquelético o Por isso, pacientes que fazem exercício físico apresentam benefícios sobre a doença • Secreção deficiente de insulina pelo pâncreas o Ocorre a longo prazo ou em casos de diabetes cronicamente descompensado. • Aumenta da produção hepática de glicose, resultando da resistência insulínica no fígado o O fígado recebe sinal indicando falta de glicose das demais células do organismo, o que constitui um estímulo para a gliconeogênese. Além desses mecanismos, outros desempenham importante papel na patogênese do DM2, tais quais: • Adipóctios: lipólise acelerada • TGI: deficiência ou resistência incretínica • Células α pancreáticas: aumento na produção e secreção de glucagon (hiper- glucagonemia). o O glucagon age em oposição à insulina, piorando o quadro de resistência insulínica. o Isso ocorre, pois a glicose não está entrando nas células, de forma que o organismo entende que há falta de açúcar no sangue. • Rim: reabsorção aumentada de glicose pelos túbulos renais • Cérebro: disfunção de neurotransmissores à resistência à insulina Coletivamente, todos esses componentes compreendem o que foi chamado por DeFronzo de “octeto ominoso ou nefasto”. PROGRESSÃO O diabetes mellitus tipo 2 tem uma progressão lenta e é antecipado por alterações no metabolismo da glicose. É importante verificar que, ainda antes do diabetes instalado, as manifestações macrovasculares e microvasculares já podem estar presentes. FATORES DE RISCO Os fatores de risco para o desenvolvimento do diabetes mellitus podem ser divididos em não controláveis e controláveis, sendo que os últimos podem ser excluídos. Os principais fatores são: • Obesidade • História familiar de diabetes (pais e irmãos) Geovana Sanches, TXXIV • Raça/Etnia (negros, hispânicos, índios Pima e indivíduos oriundos de ilhas do pacífico apresentam maior probabilidade no desenvolvimento da doença) • Idade (a partir dos 45 anos) • Diagnóstico prévio de intolerância à glicose • Hipertensão asterial sistêmica • Dislipidemia o HDL-c < 35 mg/dL e/ou o Triglicerídeos > 250 mg/dL • Histórico de diabetes mellitus gestacional ou macrossomia fetal • Tabagismo • Sedentarismo o O estilo de vida sedentário reduz o gasto de calorias e promove ganho de peso, aumentando as chances de desenvolver DM. o A atividade física regular, não só auxilia na manutenção do peso, como também aumenta a sensibilidade dos tecidos à insulina, ajudando a controlar os níveis de glicose no sangue. • Alimentação o A dieta ocidental, baseada no consumo excessivo de carne vermelha, processados, calorias, doces e refrigerantes está associada a maior risco para o desenvolvimento de DM2. Circunferência abdominal Sexo Ideal Risco aumentado Risco muito aumentado Mulher < 80 cm 80 – 88 cm > 88 cm Homem < 94 cm 94 – 102 cm > 102 cm O Risco de DM2 é cerca de duas vezes maior com a obesidade abdominal (androide) do que com a obesidade que predomina em coxas e quadril (ginecoide). OUTROS TIPOS DE DIABETES Há outros tipos de diabetes que cursam com quadros parecidos à DM2, porém devem ser diferenciados deste. Diabetes latente do adulto (LADA) Trata-se de uma forma de diabetes autoimune em que a velocidade de destruição das células ß pancreáticas é mais lenta que no DM1. Manifesta-se comumente entre os 30 e 50 anos de idade, mas pode ocorrer mais cedo ou mais tarde. Os pacientes com LADA habitualmente são diagnosticados como diabetes mellitus tipo 2, dos quais se diferenciam pela presença de um ou mais auto-anticorpos contra as células beta – antiGAD65 (mais prevalente) e ICA – e pelos níveis do peptídeo C. Comparados aos casos de DM2, os pacientes com LADA tendem a ser mais jovens, tem IMC mais baixo, menor prevalência de componentes da síndrome metabólica e necessidade mais precoce de insulinoterapia. Os critérios diagnósticos do LADA incluem: • Idade no diagnóstico entre 25 e 65 anos; • Ausência de cetoacidose diabética (CAD) ou hiperglicemia acentuada sintomática no diagnóstico ou imediatamente após, sem necessidade de insulina por pelo menos 6 a 12 meses (diferenciando-se do DM1); • Existência de autoanticorpos, em especial anti-GAD (diferenciando-se do DM2). DM secundário a endocrinopatias Vários hormônios (GH, cortisol, glucagon, catecolaminas etc) antagonizam a ação da insulina nos tecidos periféricos e no fígado. Assim, doenças que cursem com produção excessiva desses hormônios (acromegalia, síndrome de cushing, glucagonoma, feocromocitona, etc) podem cursar com diabetes em 20 a 50% dos casos. DM induzido por fármaco Medicamentos que inibem a secreção de insulina (tiazídicos, diazóxido, fenitoína, etc) podem causar ou precipitar DM, sobretudo em pacientes com resistência insulínica, assim como os que antagonizam a ação periférica da insulina ou induzam resistência insulínica (glicocorticoides, acido nicotínico, inibidores de protease, etc). Hiperglicemia tem sido também relacionada com o uso de antipsicóticos atípicos, sobretudo olonzapina e clozapina. Ela tem sido atribuída a piora de resistência à insulina, devido a ganho de peso e hiperprolactinemia. Existem evidências de que a terapia com estatina confere um pequeno aumento do risco de desenvolvimento de diabetes, e que esse risco seria ligeiramente maior no tratamento com doses intensivas de estatinas do que com doses moderadas. Após cessar o uso das medicações, normalmente o paciente retorna ao seu estado fisiológico, não permanecendo com o DM. Geovana Sanches, TXXIV DM gestacional O DMG representa a principal complicação metabólica da gravidez e é observado em 1 a 18% das gestantes, dependendo da população estudada e do critério diagnóstico utilizado. É definido como a intolerância à glicose, de qualquer grau, diagnosticada pela primeira vez durante a gravidez, e que pode ou não persistir após o parto. A gravidez é um estado diabetogênico caracterizado pela produção placentária de hormônios com efeito hiperglicemiante, particularmente a somatomamotrofina coriônica humana (HCG, antes denominada lactogênio placentário), resistência insulínica e degradação da insulina por enzimas placentárias. Todos esses mecanismos são para a proteção ao feto, caso a mulher não se alimente. Para fazer frente a essa situação, o pâncreas precisa elevar o nível de secreção de insulina em 1,5 a 2 vezes e, quando isso não ocorre, o DMG tende a se manifestar. Normalmente, o quadro é revertido após o parto, tendo em vista que é excluída a situação de resistência insulínica e cessa a produção dos hormônios placentários. Todavia, o quadro tende a recorrerem gravidezes subsequente. As situações de DMG estão sujeitas à complicações obstétricas, como polidrâmnio (aumento do líquido amniótico), toxemia gravídica, ruptura prematura das membranas amnióticas, além da maior frequência de partos cesáreas. Macrossomia (RN com peso > 4kg) é a anormalidade fetal mais característica, sendo observada em até 30% dos casos e pode predispor a traumatismos obstétricos e distócia de ombro, caso o parto seja por via transvaginal. O aumento da morbidade e mortalidade perinatais também ocorre. Porém, como o DMG se manifesta geralmente a partir da 24ª semana de gestação, não implica em risco aumento para teratogênese, diferentemente do que ocorre quando há hiperglicemia no período de embriogênese fetal. Para a mulher, culmina com risco aumento para o desenvolvimento de DM2, dislipidemia e hipertensão. DIAGNÓSTICO Os sintomas clássicos do DM, ou seja, poliúria, polidipsia, polifagia e perda ponderal, são bem mais característicos do DM1, no qual estão presentes em quase 100% dos casos. É importante ressaltar que obesidade não descarta DM1. Nos casos de DM2, cerca de 50% dos pacientes desconhecem ter a doença por serem assintomáticos ou oligossintomáticos. Em geral, é mais comum que apresentam sintomas inespecíficos, como tonturas, dificuldade visual, astenia e/ou cãibras. Vulvovaginite de repetição (especialmente candidíase) e disfunção erétil também podem ser sintomas iniciais. O DM2 apresenta grande associação com a obesidade, sendo que aproximadamente 80% dos pacientes diagnosticados apresentam excesso de peso. Critérios laboratoriais Para a confirmação do diagnóstico de diabetes mellitus, são realizados exames laboratoriais como glicemia de jejum (GJ), hemoglobina glicada (HbA1c) e teste oral de tolerância à glicose (TOTG). Além disso, é possível realizar o diagnóstico em pacientes com glicemia ao acaso > 200 mg/dL com sinais e sintomas clássicos de hiperglicemia ou crise hiperglicêmica, mas sempre é recomendado realizar os exames confirmatórios. Glicemia de jejum Para realizar o GJ, o paciente deve-se manter sem alimentação por 8 a 12 horas. Esse exame representa o meio mais prático para avaliar o status glicêmico e dois valores superiores ou iguais a 126 mg/dL, obtidos em dias diferentes, são suficientes para estabelecer o diagnóstico de diabetes. Consideram-se normais valores até 99 mg/dL. Níveis entre 100 e 125 mg/dL caracterizam glicemia de jejum alterada (IFG). Nessa situação, os pacientes devem ser submetidos a um teste de tolerância à glicose (TOTG). A hiperglicemia inequívoca, caracterizada por GJ maior que 250 a 300 mg/dL, com descompensação metabólica aguda ou sintomas óbvios de DM torna desnecessária a repetição do exame em um outro dia para confirmação do diagnóstico. Teste de tolerância a glicose Para realizar o exame, coleta-se amostra de sangue para a dosagem da glicemia de jejum e posteriormente, administram-se 75 g de glicose Geovana Sanches, TXXIV anidra dissolvidas em 250 a 300 ml de água. Após 2 horas, obtém-se nova amostra para medir a glicemia. O exame deve ser realizado pela manhã, após 8 a 14 horas de jejum e, pelo menos, 3 dias de dieta sem restrição de carboidratos (ingestão superior a 150 g/dia). O resultado da glicemia após 2h deve ser assim interpretado: Resultado Interpretação < 140 mg/dL Normal 140 – 199 mg/dL Tolerância diminuída à glicose ≥ 200 mg/dL Diabetes Como o TOTG tem baixa reprodutibilidade, sua indicação está limitada a algumas situações específicas, sobretudo para o diagnóstico do diabetes gestacional e em pacientes com glicemia de jejum alterada, porém não alta o suficiente para a confirmação do diagnostico. Hemoglobina glicada A hemoglobina glicada ou glicosilada (HbA1c ou A1C), também conhecida como glicohemoglobina (GHb), representa de 4 a 6% da hemoglobina total. É um produto da reação não enzimática entre glicose sanguínea e o grupo aminoterminal de um resíduo de valina na cadeia ß da Hb; é irreversível e com intensidade diretamente proporcional à glicemia – quanto maior a concentração de glicose plasmática e maior o período de contato, maior será a porcentagem da HbA1c. Resultado Interpretação ≤ 5,6 Normal 5,7 – 6,4 Pré-Diabetes ≥ 6,5 Diabetes Os valores da HbA1c refletem a média das glicemias durante os últimos 2 a 3 meses, que é o tempo de sobrevida das hemácias, seguindo a estimativa: • 50% da HbA1c é formada no mês que precede o exame; • 25%, no mês anterior a esse; • E os 25% restantes, no terceiro ou quarto mês antes do exame. A HbA1c é considerada o padrão-ouro na avaliação do controle glicêmico, devendo ser realizada a cada 3 ou 4 meses. Para pacientes diabéticos, a ADA recomenda como meta uma HbA1c < 7%, uma vez que valores acima desse patamar implicam elevação progressiva no risco para as complicações micro e macrovasculares. O primeiro gráfico apresenta a relação entre os níveis de HbA1 e o risco relativo de complicações microvasculares observadas; o segundo, o risco relativo de morte por doença cardiovascular, doença arterial coronariana e por todas as causas de acordo com os níveis de HbA1c. Na interpretação dos resultados da HbA1c, deve-se considerar inúmeros fatores, tais como o método laboratorial, sendo o padrão outro o HPLC (cromatografia líquida de alta eficiência). Podemos encontrar valores inapropriadamente baixos em situações que encurtam a sobrevida das hemácias, como anemia hemolítica, e estados hemorrágicos; valores inapropriadamente altos são vistos nas situações que aumentam a sobrevida das hemácias, como esplenectomia ou anemia por carência de ferro, vitamina B12 ou folato. Altas doses de vitamina C e E levam a resultados falsamente diminuídos por inibir a glicação da hemoglobina. Por outro lado, DRC, uremia, hipertrigliceridemia, alcoolismo crônico, e uso crônico de salicilato e opiáceos, por interferência na metodologia, resultam em valores falsamente elevados. A quantificação da HbA1c não deve ser feita em pacientes com hemoglobinopatias, principalmente as formas homozigotas. Nessas Geovana Sanches, TXXIV condições, é mais recomendável avaliar o controle do DM pela frutosamina. Frutosamina A frutosamina é uma proteína glicada constituída principalmente de albumina, que reflete o controle glicêmico nos últimos 7 a 14 dias, já que a meia-vida da albumina é de 14 a 20 dias. A determinação da frutosamina não deve ser considerada equivalente à da A1C, embora haja boa correlação entre esses dois parâmetros. Esse exame não é utilizado para o diagnóstico, mas pode ser um método alternativo para avaliar o controle glicêmico dos pacientes que tenham condições que alterem os valores da HbA1c (como hemoglobinopatias) ou quando se queira avaliar mudanças a curto prazo no controle glicêmico (como durante a gravidez). O papel da frutosamina como fator preditivo para o desenvolvimento de complicações do diabetes ainda não foi determinado. Resumidamente... Diagnóstico de DMG Para o diagnóstico do diabetes mellitus gestacional são realizados a glicemia em jejum e o teste de tolerância oral à glicose. Os critérios são diferentes da população geral: • Glicemia de Jejum < 92 mg/dL Normal > 92 mg/dL DMG o Para valores entre 92 e 125 mg/dL também é recomendado realizar o TOTG. o Caso a paciente apresente GC > 125 mg/dL durante o primeiro trimestre da gravidez, trata-se de um DM2 não diagnosticado anteriormente. • Teste de tolerância oral à glicose: confirma o diagnóstico caso sejam encontrados algum dos critérios abaixo ≥ 92 mg/dL no jejum ≥ 180 mg/dL na 1ª hora ≥ 153 mg/dL na 2ª hora o O teste é preconizado para todas as gestantes que não apresentaram critérios para o diagnóstico de DMG ou DM anterior o Deve ser realizado entre 24 e 28 semanas de gestação. Resumidamente, os potenciais critérios para diagnósticode diabetes gestacional são: • TOTG alterado • GJ ≥ 92 mg/dL em duas ocasiões • HbA1c ≥ 6,5% em duas ocasiões • GJ ≥ 92 mg/dL e HbA1c ≥ 6,5% Caso qualquer um desses critérios seja constatado, podemos confirmar o quadro de DMG. TRIAGEM As indicações para pesquisa do diabetes em indivíduos assintomáticos incluem: • Todo indivíduo com 45 anos ou mais o Caso a glicemia for normal, repeti- la a cada 3 anos ou mais frequentemente se houver fator de risco para diabetes • Indivíduos com idade < 45 anos com IMC ≥ 25 kg/m2 e fatores de risco adicionais para diabetes: o Sedentarismo o Histórico familiar de diabetes (parentes de 1º grau) o História de macrossomia fetal ou diagnóstico de DMG o Hipertensão § PA ≥ 140/90 mmHg o Dislipidemia § HDLc < 35 mg/dL § Triglicerídeos ≥ 250 mg/dL) o Diagnóstico prévio de intolerância à glicose § Em jejum ou ao TOTG o Síndrome dos ovários policísticos o Esteatose hepática e outras condições clínicas associadas à resistência insulínica (p. ex. acantose nigricans) TRATAMENTO O principal objetivo do tratamento para diabetes mellitus é reduzir as complicações secundárias a ele. Não visamos, necessariamente, a volta da glicemia aos níveis normais para não diabéticos. Geovana Sanches, TXXIV Entre 80 e 90% dos indivíduos com DM2 apresentam a síndrome metabólica, com obesidade, dislipidemia, intolerância à glicose ou hiperglicemia e hipertensão, aumentando assim o risco de doenças cardiovasculares. Os pacientes com DM2 tem, em média, uma expectativa de vida reduzida em 5 a 10 anos se diagnosticados entre os 40 e 60 nos, e apresentam mortalidade de 2 a 3 vezes maior do que a população geral. Cerca de 50% dos pacientes vem a óbito por doença arterial coronariana e 75%, por problemas cardiovasculares. As complicações microvasculares também levam a graves consequências, estando entre as principais causas de cegueira, insuficiência renal em estágio terminal e amputações no mundo. Segundo o estudo DISCOVER (dados brasileiros), um em cada 5 pacientes as apresentam. • Retinopatia o Investigar ao diagnóstico de DM o A cada 1 a 2 anos sem alterações o Fundoscopia realizada por oftalmologista • Neuropatia periférica o Investigar ao diagnóstico de DM2 o Anualmente o Sensibilidade térmica ou dolorosa o Sensibilidade vibratória o Pesquisar neuropatia autonômica na presença de outras complicações microvasculares • Nefropatia diabética o Investigar ao diagnóstico de DM o TFG e EUA É importante, ainda, a avaliação do pé diabético anualmente, verificando se o paciente apresentou perda sensorial ou ulceração prévia. • Anamnese: dor, queimação, dormência, claudicação • Inspeção da pele e deformidades o Em todas as consultas • Avaliação neurológica o Teste do monofilamento + o Sensibilidade dolorosa ou térmica ou vibratória • Avaliação vascular o Pulsos nas pernas e pés o Índice tornozelo-braquial A maioria das complicações são causadas pelo dano aos pequenos vasos e estreitamento dos grandes vasos (aterosclerose) associados à hiperglicemia crônica. O controle glicêmico intensivo pode ajudar a evitar tais complicações. Muitos são os agentes orais e injetáveis aprovados para o tratamento do diabetes mellitus, mas não se observam grandes mudanças no número de pacientes com HbA1c < 7%. METAS DO TRATAMENTO O objetivo principal do tratamento do DM2 é diminuir ao máximo as complicações micro e macrovasculares. Isso pode ser conseguido por meio de um rígido controle de glicemia, hemoglobina glicada, lipídeos e pressão arterial, confome demonstrado em diversos estudos. O ideal é que essa abordagem seja instituída tão logo possível, tendo em vista que quanto mais precoce o tratamento, menor a chance de o paciente sofrer complicações. A ADA (American Diabetes Association) recomenda redução da HbA1c para menos de 7% na maioria dos pacientes, com o objetivo de reduzir a incidência de doença microvascular. É recomendado, ainda, que a glicemia de jejum seja mantida < 130 mg/dL e glicemia pós-prandial < 180 mg/dL. A AACE (Associação Americana de Endocrinologistas Clínicos), a IDF e a SBD Geovana Sanches, TXXIV (Sociedade Brasileira de Diabetes) estipulam como meta valores de HbA1c < 6,5%. O controle glicêmico, dos lipídeos e da PA também são essenciais para uma efetiva redução na morbimortalidade. Apesar da proporção de pacientes bem controlados estar aumentando, ainda é muito baixa. Dados do NHANES, oriundos de americanos adultos com DM, mostraram que, entre 2007 e 2010, 52,5% dos pacientes atingiram HbA1c < 7%; 51,1% PA < 130/80 mmHg; 56,2% LDLc < 100 mg/dL; ao passo que somente 18,8% obtiveram adequado controle dos três parâmetros. Em um estudo multicêntrico brasileiro, verificou-se que apenas 0,2% dos pacientes apresentam o controle adequado de todos eles. BASE FISIOPATOGÊNICA PARA O TRATAMENTO DE DM As alterações metabólicas do DM incluem diminuição da sensibilidade à insulina no músculo, excessiva produção hepática de glicose (por resistência insulínica no fígado) e declínio progressivo da função das células ß pancreáticas. Na sua gênese, participam fatores genéticos e ambientais, como sedentarismo e obesidade. A resistência insulínica (RI) é encontrada em cerca de 85 a 90% dos casos de DM. Enquanto as células ß são capazes de aumentar a secreção de insulina o suficiente para compensar a RI, a tolerância a glicose permanece normal. No entanto, com o tempo, essas células começam a falhar, o que é inicialmente verificado por aumento apenas da glicose pós-prandial; posteriormente, a glicemia de jejum começa a aumentar, levando ao surgimento do DM2 manifesto. As incretinas são hormônios produzidos por células do intestino delgado em resposta à ingestão de nutrientes, sendo os principais o GLP1 (peptídeo semelhante ao glucagon 1) e o GIP (polipeptídeo insulinotrópico glicose dependente). Eles são responsáveis por cerca de 90% do “efeito incretínico” (estímulo intestinal à produção de insulina). Em indivíduos normais, os níveis desses hormônios são baixos em jejum e aumentam rapidamente após a alimentação. Conforme demonstrado no UKPDS, a deterioração das células ß é uma característica do diabetes mellitus tipo 2, independentemente do tratamento utilizado. Assim, os pacientes de longa data podem cursar com insulino-dependência. Há um atraso significativo na otimização do tratamento do DM2, sendo que o ideal seria que, em 1 a 3 meses, obtivéssemos HbA1c abaixo de 7%. É essencial agir em vários pontos da fisiopatologia da doença para controlar o DM e evitar as complicações. OPÇÕES DE TRATAMENTO As opções de tratamento para o DM2 incluem modificações no estilo de vida, como dieta, atividade física, perda de peso e cessação do tabagismo. Sem essas alterações, o tratamento da doença se torna muito mais difícil. Associado as MEV, pode ser necessário incluir medicamentos com diferentes mecanismos hipoglicêmicos, podendo ser antidiabéticos orais (biguanidas, sulfoniurérias, inibidores de DPP4, glinidas, glitazonas, inibidores da alfa-glicosidase, Geovana Sanches, TXXIV inibidores do cotransportador de sódio e glicose, análogos de GLP-1) ou insulinas. A individualização das metas glicêmicas é importante pois os pacientes estão em diferentes situações. Um idoso de 90 anos com HbA1c a 7,5%, por exemplo, é considerado controlado, enquanto um paciente com 45 anos com a mesma glicada pode reduzi-la a níveis melhores. AGENTES ANTIDIABÉTICOS ORAIS (ADO) Biguanidas O representante da classe das biguanidas é a Metformina, cujo nome comercial é Glifage®. Ela não possui efeito direto sobre as células ß, de forma que não causa hipoglicemia. Mecanismos de ação • Inibição da gliconeogênese: responsável por 75% de sua ação anti-hiperglicêmica • Melhora da sensibilidade periférica à insulina, reduzindoa insulinemia • Redução do turnover de glicose no leito esplâncnico. • Em nível celular, aumenta a atividade da tirosina quinase do receptor de insulina, estimulando a translocação do GLUT4 e a atividade da glicogênio sintase. • Inibe as vias de sinalização hepática do glucagon • Aumenta os níveis séricos de GLP1, estimulando a secreção de insulina e inibindo a de glucagon. Posologia A metformina é apresentada em comprimidos de 500mg, 800mg ou 1g. Ela deve ser sempre administrada com alimentos, uma vez que eles retardam a absorção do medicamento e reduzem os efeitos colaterais gastrointestinais. A dose máxima é de 2.500 mg/dia (em duas a três tomadas). Entretanto, não se costuma observar benefícios adicionais quando se usam doses maiores que dois mil mg ao dia. A formulação de liberação estendida (Glifage XR®) é preferível, já que é administrada em tomada única diária e é mais bem tolerada. Há disponibilidade de comprimidos de 500mg, 750mg e 1g e, nesse caso, a dose máxima é de 2000 mg/dia (em quatro tomadas). Esse medicamento é excretado intacto na urina. Em pacientes com insuficiência renal, a excreção é prejudicada e, por isso, faz-se necessário o ajuste das doses nessa condição. Prescrição A metformina é um bom medicamento, tendo em vista sua potência. A priori, deve ser iniciada juntamente com as mudanças no estilo de vida em todos os pacientes com DM2. Como monoterapia, reduz a GJ em 20 a 30%, a glicemia pós-prandial em 30 a 40% e a HbA1c em 1 a 2% (valor absoluto). Efeitos colaterais Sintomas gastrointestinais, como aumento no número de evacuações diárias, diarreia e náuseas, ocorrem em até 20% dos pacientes e são mais comuns quando o fármaco é ingerido em jejum ou quando iniciado em doses acima de 850mg/dia. Em geral, eles são transitórios, mas em cerca de 5% dos pacientes se faz necessária a interrupção do tratamento. Com a formulação de liberação controlada estendida, a frequência dos sintomas sobre o trato gastrointestinal é aproximadamente 50% menor. A acidose láctica constitui o efeito colateral mais temível da metformina, por implicar em alta mortalidade (42 a 47%). Todavia, é bastante rara, com incidência estimada de 3 a 9 casos a cada 100.000 pacientes por ano. Torna-se mais comum para pacientes em sepse ou após uso de contraste. Outro efeito importante é a redução na absorção de cianocobalamina (vitamina B12) no íleo distal, a qual é importante para manter íntegra a memória recente. O uso crônico da medicação pode levar à deficiências dessa vitamina e, mais raramente, neuropatia e anemia megaloblástica. Sendo assim, é preconizado que os níveis de B12 sejam medidos pelo menos 1 vez ao ano nos pacientes em terapia. Geovana Sanches, TXXIV Contra-indicações Costuma-se não recomendar o uso de metformina quando há condições que impliquem maior risco para o surgimento de acidose láctica: • Disfunção renal o Nos EUA, recomenda-se evitar o uso da metformina com creatinina sérica ≥ 1,4 mg/dL em mulheres e ≥ 1,5 mg/dL em homens • Cirrose hepática • Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) • Insuficiência cardíaca descompensada • Fase aguda da doença miocárdica isquêmica • Sepse • Pacientes alcoolistas • Histórico de acidose láctica Durante a gravidez é mais recomendado o uso de insulina. Entretanto, na prática, é administrado a metformina. Vantagens • Extensa experiência • Sem ganho de peso • Sem hipoglicemia • Possivelmente, redução sobre eventos cardiovasculares (UKPDS) • Baixo custo Sulfoniureias • Gliclazida MR • Glimepirida • Glibenclamida • Glipizida • Clorpropamida Mecanismo de ação As sulfas promovem fechamento dos canais de potássio por meio da subunidade Kir nas membranas plasmáticas das células ß pancreáticas, por meio de despolarização. Isso resulta na entrada de cálcio nessas células, estimulando a secreção dos grânulos de insulina. Não há, portanto, aumento na produção de insulina, apenas da secreção (secretagogos). Vantagens • Extensa experiência • Redução no risco microvascular (UKPDS) • Baixo custo Desvantagens • Hipoglicemia: é o principal efeito colateral das sulfoniureias o Especialmente Glibenclamida • Ganho de peso: ocorre principalmente nas sulfas mais antigas Gliclazida A gliclazida é a sulfa mais segura, pois não atua no coração e no músculo liso. Deve-se dar preferência à formulação com liberação modificada (Diamicron MR® - cp 30 e 60 mg), que lhe confere ação prolongada (cerca de 24 hras) e menor risco de hipoglicemia. A dose varia entre 30 a 120 mg/dia, em uma única tomada. Apresenta maior seletividade pelos receptores de sulfoniureias nas células ß (SUR 1), devido à ausência do anel benzamida em sua estrutura, não atuando sobre o SUR2a (localizado no cardiomiócito) e no SUR2b (músculo liso). A excreção é predominantemente renal (80%). As principais contraindicações são insuficiência renal, insuficiência hepática, gestação e amamentação. Meglitinidas (glinidas) • Repaglinida • Nateglinida Mecanismo de ação As glinidas fecham os canais de K+ das membranas plasmáticas das células, aumentando a secreção de insulina (secretagogos). Elas são utilizadas principalmente para diminuir a glicemia pós-prandial, mas atualmente não é uma classe muito usada na prática clínica. Vantagens • Diminuição das excursões glicêmicas pós- prandiais • Baixo risco de hipoglicemia Desvantagens • Hipoglicemia • Ganho de peso • Necessidade de administração antes de cada refeição Tiazolidinedionas (glitazonas) A pioglitazona é a única representante dessa classe. Ela ativa o fator de transcrição nuclear PPAR-y, aumentando a sensibilidade à insulina (redução da resistência insulínica); não Geovana Sanches, TXXIV promove secreção de insulina e, portanto, não induz hipoglicemia. É uma boa opção terapêutica para utilizar em conjunto à análogos de GLP1. Foi um dos primeiros medicamentos para reduzir o risco de progressão da pré-diabetes para a doença manifesta. Um estudo demonstrou que a pioglitazona diminuiu em 72% o risco de progressão para o DM2 em pacientes com pré- diabetes (IGT ou glicemia de jejum alterada). Além disso, para pacientes com NASH (esteato-hepatite não alcoólica), houve relatos de melhora de esteatose, necroinflamação e fibrose hepática. Em conjunto à vitamina E, tem sido considerada a terapia de escolha para NASH, embora essa indicação não conste na bula desses fármacos. Vantagens • Não induzem hipoglicemia • Durabilidade do efeito hipoglicêmico • Aumento do HDL-c • Diminuição dos TG • Diminuição dos eventos cardiovasculares (ProACTIVE) Desvantagens • Edema • Ganho de peso o Principalmente decorrente do edema • Aumento do risco para ICC e fraturas ósseas o Contra-indicação para pacientes que já apresentam ICC • Aumento do risco para câncer de bexiga (?) o Muito controverso Inibidores da α-glicosidase • Acarbose • Miglitol • Voglibose Mecanismo de ação Inibem a α-glicosidase intestinal levando a menor absorção de carboidratos. Vantagens • Não induzem hipoglicemia • Diminuição das excursões glicêmicas pós- prandiais Desvantagens • Redução discreta e limitada da HbA1c • Efeitos gastrintestinais o Flatulência e diarreia • São pouco utilizados na prática clínica Inibidores da DPP-4 • Vildagliptina (Galvus®) • Sitagliptina (Januvia®) • Linagliptina (Trayenta®) • Saxagliptina (Onglyza®) • Alogliptina (Nesina®) Mecanismo de ação Inibem a atividade da DPP-4, responsável por quebrar a GLP-1. Assim, há maior tempo de ação do GLP-1, aumentando os níveis pós- prandiais das incretinas (GLP-1 e GIP). Com isso, há: • Aumento da secreção de insulina (glicose dependente) • Redução da secreção de glucagon (glicose- dependente) Vantagens • Não induzem hipoglicemia • Bem tolerados • Diminuição das excursões glicêmicas pós- prandiais Desvantagens • Segurançaa longo prazo ainda não estabelecida • Diminuição modesta da HbA1c • Urticária/angioedema • Pancreatite (??) Geovana Sanches, TXXIV • Aumento do risco de internamento por ICC o Saxagliptina • Alto custo Desfecho cardiovascular Em grande parte, essa classe é neutra em desfechos cardiovasculares (AVC não fatal, IAM não fatal e ECV fatal). Agonistas de GLP-1 O GLP-1 é um hormônio liberado pelas células L enteroendócrinas localizadas no íleo e no cólon. • Exanatida • Liraglutida • Exanatida LAR • Dulaglutida • Semaglutida (Ozempic®) o Alta potência na perda ponderal Mecanismo de ação Ativam os receptores de GLP-1, promovendo: • Secreção de insulina glicose-dependente • Aumento da sensibilidade à insulina • Inibição da secreção de glucagon • Diminuição da produção hepática de glicose (?) • Retardo do esvaziamento gástrico • Aumento da saciedade • Diminuição do apetite Estudos em animais demonstraram que o GLP1 aumenta a massa de células ß, estimulando sua neogênese e sua proliferação, bem como inibindo a apoptose. Vantagens • Não induzem hipoglicemia • Diminuição das excursões glicêmicas pós- prandiais • Diminuição efetiva sobre a HbA1c (1%) • Diminuição do peso • Melhoram perfil lipídico e diminuem PCRas • Efeitos protetores cardiovasculares (?) o Sobretudo IAM e AVC o Mecanismos aterosclerócitos • Potencial para melhora da função/massa das células ß (?) Desvantagens • Efeitos colaterais gastrintestinais o Náuseas, vômitos e diarreia são comuns o Reações no local da aplicação – é muito raro • Pancreatite (?) o Não foi comprovado • Hiperplasia de células com carcinoma medular de tireoide em animais (LGT) • Medicamento injetável o Victoza® o Saxenda® o Após aplicação parenteral, é rapidamente degradado pela DPP4 • Muito alto custo Glifozinas (ISGLT-2) • Dapaglifozina (Forxiga®) • Canagliflozina (Invokan®) • Empaglifozina (Jardiance®) Mecanismo de ação Inibidores do cotransportador 2 de sódio e glicose (SGLT-2). Promovem redução da glicemia de forma independente da insulina, por bloqueio da reabsorção renal de glicose no túbulo proximal. Em condições fisiológicas, 90% da glicose do filtrado seria reabsorvida no túbulo contorcido proximal pelo SGLT2. Com o bloqueio, há aumento da excreção renal de glicose, gerando glicosúria. Vantagens • Não induz hipoglicemia (age sobre o rim e não aumenta a secreção de insulina) • Diminuição do peso (apenas para indivíduos com DM) e da PA • Diminuição da mortalidade cardiovascular (empaglifozina) o Pela primeira vez, encontrou-se um medicamento que diminuía a chance de os pacientes diabéticos morrerem por doenças CV. o Há proteção contra IC e internações • Diminuição na chance de DRC Geovana Sanches, TXXIV Desvantagens • Diminuição modesta da HbA1c • Aumento do risco para ITU inferior e infecções genitais fúngicas devido a liberação da glicose na urina • Alto custo ESCOLHA DA MEDICAÇÃO A recomendação da EASD e da ADA é que a metformina, na ausência de contraindicações, seja iniciada juntamente com as mudanças de estilo de vida. Na contraindicação de metformina, sendo a principal a insuficiência renal, podem ser usados um sulfaniureia, um inibidor de DPP4, um inibidor de SGLT2, pioglitazona; um dos análogos do GLP1 pode ser usado quando a perda de peso mais rápida for um aspecto prioritário. Para os casos de pré-diabetes, tecnicamente não é necessário a adição de medicação, mas na prática já iniciamos a metformina com glicadas acima de 6%, tendo em vista que foi demonstrada prevenção da evolução à DM nesses casos. • Mudança do estilo de vida= 30% • Metformina= cerca de 30% • GLP-1= redução maior que 70% Para os pacientes com HbA1c = 7, inicia-se monoterapia com metformina, análogo de GLP1 ou inibidor de SGLT2. Para glicadas de até 7.5, podemos ainda utilizar monoterapia. Todavia, caso esse paciente já apresente albuminúria ou evento cardiovascular prévio, é preferível utilizar um análogo de GLP1 ou inibidor de SGLT2. Para os pacientes com HbA1c ≥ 7,5 ao diagnóstico, costumamos utilizar a combinação de duas medicações como tratamento inicial, podendo ser a metformina associado a outra classe. Escolha da medição em pacientes com DCV estabelecida, IC ou DRC • Uso de metformia a não ser que contra- indicada ou não tolerada • Se a HbA1c não for o target o Continua metformina o Adiciona iSGLT2 ou análogo de GLP- 1 com benefício cardiovascular comprovado • Se a HbA1c for o target o Se tiver dupla ou múltipla terapia e não estiver usando iSGLT2 ou análogo de GLP-1, considerar trocar um dos agentes com benefício cardiovascular comprovado.
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