Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Apg 7 – Doença Arterial Coronariana Objetivos: 1- Compreender a fisiopatologia da D.A.C e a relação com IAM; 2- Associar as manifestações clínicas, exames de diagnóstico, tratamento e fatores de risco da D.A.C; 2.1 – Diferenciar angina estável e instável (Clinicamente e exames); 2.2-Compreender as alterações supra e infra desnivelamento no ECG de IAM; 3- Compreender a farmacodinâmica dos fármacos no contexto da D.A.C; 4- Entender os biomarcadores no diagnostico de IAM/DAC. 5- Identificar as características da dor precordial. O termo doença arterial coronariana (DAC) descreve a cardiopatia causada pelo comprometimento do fluxo sanguíneo coronariano. Na maior parte dos casos, a DAC é causada pela aterosclerose, que não somente afeta as artérias coronárias como também as artérias em outras áreas do corpo. As doenças das artérias coronárias podem causar isquemia do miocárdio e angina, infarto do miocárdio ou ataque cardíaco, arritmias cardíacas, defeitos na condução, insuficiência cardíaca e morte súbita. FATORES DE RISCO: Os principais fatores de risco para a DAC incluem tabagismo, pressão arterial alta, elevação dos níveis séricos de colesterol total e de colesterol de lipoproteína de baixa densidade (LDL), baixos níveis séricos de colesterol de lipoproteína de alta densidade (HDL), diabetes, idade avançada, obesidade abdominal e inatividade física. Os indivíduos com diabetes e síndrome metabólica apresentam um risco particularmente alto de desenvolvimento de DCV, apresentando significativa morbidade decorrente da doença. A aterosclerose é a causa mais comum de DAC; é lenta e progressiva, e pode ter início durante a juventude. A aterosclerose pode afetar uma ou todas as três artérias coronárias epicárdicas principais e suas ramificações. Lesões clinicamente significativas podem estar localizadas em qualquer ponto nesses vasos, mas tendem a predominar nos primeiros centímetros da artéria coronária descendente anterior esquerda e circunflexa esquerda, ou por toda a artéria coronária direita. Em alguns casos, as ramificações secundárias principais também estão envolvidas. A DAC geralmente é dividida em dois tipos de distúrbios: A síndrome coronariana aguda representa um espectro de cardiopatias isquêmicas agudas que variam desde a AI até o infarto do miocárdio resultante de ruptura de placa aterosclerótica. A cardiopatia isquêmica crônica é caracterizada por episódios recidivantes e transitórios de isquemia do miocárdio e angina instável, que resultam do estreitamento do lúmen de uma artéria coronária em consequência de aterosclerose e/ou vasospasmo. Placa estável versus instável. Existem dois tipos de lesões ateroscleróticas: 1.Placa fixa ou estável, que obstrui o fluxo sanguíneo 2.Placa instável/vulnerável ou placa de alto risco, que pode romper e causar adesão plaquetária e formação de trombos. Em geral, a placa fixa ou estável está implicada na angina estável, e há envolvimento da placa instável na AI e no infarto do miocárdio. Na maior parte dos casos, a isquemia miocárdica de base da AI, do infarto agudo do miocárdio, do acidente vascular encefálico e, em muitos casos, da morte súbita cardíaca (MSC), é precipitada por alterações abruptas na placa seguidas de trombose. As principais determinantes da vulnerabilidade da placa à ruptura incluem a dimensão do centro rico em lipídios, a estabilidade e a espessura da sua cápsula fibrosa, a presença de inflamação e a ausência de células musculares lisas. As placas com uma cápsula fibrosa fina sobreposta a um grande centro lipídico apresentam alto risco de ruptura. Embora a ruptura da placa possa ocorrer espontaneamente, com frequência ela é ocasionada por fatores hemodinâmicos, como as características do fluxo sanguíneo e a tensão do vaso. Por exemplo, acredita-se que um aumento súbito da atividade simpática, com aumento na pressão arterial, frequência cardíaca, força da contração cardíaca e fluxo sanguíneo coronariano, aumenta o risco de ruptura da placa. De fato, muitas pessoas com infarto do miocárdio relatam um evento acionador, mais frequentemente de estresse emocional ou atividade física. A ruptura da placa também apresenta variação ao longo do dia, ocorrendo com mais frequência durante a primeira hora após o acordar; isso sugere que fatores fisiológicos, como elevações no tônus das artérias coronárias e na pressão arterial, podem promover a ruptura da placa aterosclerótica e a subsequente deposição de plaquetas. Foi proposto que o sistema nervoso simpático é ativado ao acordar, resultando em alterações na agregação plaquetária e na atividade trombolítica que tendem a favorecer a trombose. Trombose e oclusão dos vasos. A trombose local que ocorre após a ruptura da placa resulta de uma interação complexa entre o centro lipídico, as células musculares lisas, os macrófagos e o colágeno. O centro lipídico proporciona um estímulo para a agregação plaquetária e a formação de trombos. Tanto as células musculares lisas quanto as células espumosas no centro lipídico contribuem para a expressão do fator tecidual nas placas instáveis. Uma vez exposto ao sangue, o fator tecidual inicia a via da coagulação extrínseca, resultando na geração local de trombina e na deposição de fibrina. As plaquetas desempenham um papel importante na relação da ruptura da placa com a DAC aguda. Como parte da resposta à ruptura da placa, as plaquetas se aderem ao endotélio e liberam substâncias (i. e., adenosina difosfato [ADP], tromboxano A2 e trombina) que promovem ainda mais agregação plaquetária e formação de trombos. A membrana das plaquetas, cujos receptores glicoproteicos se ligam ao fibrinogênio e unem as plaquetas, contribui para a formação de trombos. A adesão e a agregação plaquetárias ocorrem em diversas etapas. Primeiramente, a liberação de ADP, tromboxano A2 e trombina inicia o processo de agregação. Em segundo lugar, há ativação dos receptores glicoproteicos IIb/IIIa sobre a superfície plaquetária. Em terceiro, o fibrinogênio se liga aos receptores glicoproteicos ativados, formando pontes entre as plaquetas adjacentes. Existem dois tipos de trombos que são formados como resultado da ruptura da placa – trombos brancos (que contêm plaquetas) e trombos vermelhos (contendo fibrina). Os trombos associados à AI foram caracterizados como branco-acinzentados e presumivelmente são ricos em plaquetas. Os trombos vermelhos, que se desenvolvem com a oclusão dos vasos no infarto do miocárdio, são ricos em fibrina e hemácias sobrepostas ao componente plaquetário e obstruem completamente o fluxo sanguíneo. SINDROME CORONARIANA AGUDA A SCA inclui a AI, o infarto do miocárdio sem elevação do segmento (sem onda Q) e o infarto do miocárdio com elevação do segmento ST (com onda Q). Em pessoas sem elevação do segmento ST ao ECG, a oclusão coronariana trombótica não é total ou é intermitente, enquanto aquelas com elevação do segmento ST normalmente apresentam oclusão coronariana completa à angiografia; por fim, muitas apresentam infarto do miocárdio com onda Q. Alterações ao eletrocardiograma: As alterações clássicas ao ECG que ocorrem com a SCA envolvem inversão da onda T, elevação do segmento ST e desenvolvimento de uma onda Q anormal. As alterações que ocorrem podem não estar presentes imediatamente após o início dos sintomas e variam consideravelmente, dependendo da duração do evento isquêmico (agudo versus progressivo), da sua extensão (subendocárdico versus transmural) e da sua localização (anterior versus septal versus inferoposterior). Como essas alterações em geral ocorrem ao longo do tempo e são observadas nas derivações do ECG que mostram a área do miocárdio envolvida, é indicadoo monitoramento contínuo e sequencial do ECG de 12 derivações. A fase de repolarização do potencial de ação (onda T e segmento ST ao ECG) normalmente é a primeira a apresentar envolvimento durante a isquemia e a lesão do endocárdio. Na medida em que a área envolvida se torna isquêmica, a repolarização do miocárdio sofre alteração, causando mudanças na onda T. Isso comumente é representado pela inversão da onda T, embora possa ocorrer uma elevação hiperaguda da onda T como o sinal mais precoce do infarto. As alterações no segmento ST ocorrem com a lesão isquêmica do miocárdio e, dependendo das derivações envolvidas, podem indicar a lesão de interesse. Na situação normal, o segmento ST do ECG é quase isoelétrico (i. e., achatado ao longo da linha basal), uma vez que todas as células miocárdicas hígidas alcançam o mesmo potencial durante a repolarização inicial. A isquemia aguda grave reduz o potencial de repouso da membrana e abrevia a duração do potencial de ação na área isquêmica. Tais alterações criam uma diferença de voltagem entre as áreas normais e isquêmicas do miocárdio, a qual leva à denominada corrente de lesão entre essas regiões. As correntes de lesão são as correntes representadas ao ECG de superfície como um desvio do segmento ST. Quando a lesão aguda é transmural, todo o vetor ST está desviado na direção do epicárdio exterior, resultando em elevação do segmento ST.16 No infarto com onda Q, ocorre o desenvolvimento de ondas Q anormais e perda da onda R, uma vez que não ocorre a condução da corrente de despolarização a partir do tecido necrótico. Quando a lesão está confinada primariamente ao subendocárdio, todo o segmento ST está desviado na direção da camada ventricular interna, resultando em uma depressão geral do segmento ST e não na sua elevação. Supradesnivelamento de ST O supradesnivelamento do segmento ST em relação a linha de base é um dos primeiros sinais de infarto agudo do miocárdio e está geralmente associado com a oclusão aguda e completa de uma artéria coronária (Figura 15). Além disso, a presença de bloqueio completo de ramo esquerdo (BRE) novo ou supostamente novo equivale à supradesnivelamento de ST, sendo um indicio de IAM. Esse supradesnível do segmento ST deve ser persistente e estar presente em, pelo menos, duas derivações contíguas. A presença de elevação do segmento ST confirma o diagnóstico de IAMcsST, não necessitando de outros exames complementares. Infradesnivelamento de ST O infradesnivelamento de ST pode ser transitório (na angina), com alteração dinâmica desse segmento, ou persistente (no infarto sem elevação do ST). BIOMARCADORES SÉRICOS Embora os biomarcadores cardíacos auxiliem os clínicos no diagnóstico de AI/IMSEST em aproximadamente um terço das pessoas, a espera pelos resultados adiaria o tratamento do IMSEST com reperfusão. A interpretação do ECG de 12 derivações deve dar início ao tratamento com reperfusão, por ser esta uma terapia sensível ao tempo. Os biomarcadores séricos de SCA incluem a troponina I (TnI) e a troponina T (TnT) específicas cardíacas, e a creatinoquinase MB (CK-MB). Na medida em que as células do miocárdio se tornam necróticas, seu conteúdo intracelular começa a se difundir pelo interstício adjacente e, em seguida, pelo sangue. A velocidade na qual as enzimas passam a ser observadas no sangue depende da sua localização intracelular, do seu peso molecular e do fluxo sanguíneo local. Por exemplo, elas podem surgir antes do momento previsto em pessoas submetidas à terapia de reperfusão com sucesso. As análises de troponina apresentam uma alta especificidade para o tecido miocárdico e se tornaram os exames com biomarcadores primários para o diagnóstico do infarto do miocárdio. O complexo de troponina, que é parte do filamento de actina, é composto por três subunidades (i. e., troponina C [TnC], TnT e TnI), que regulam o processo contrátil da actina e miosina mediado pelo cálcio no músculo estriado. A TnI e a TnT, que estão presentes no músculo cardíaco, começam a aumentar dentro de 3 h após o início do infarto do miocárdio e podem permanecer elevadas por 7 a 10 dias. Isso é especialmente vantajoso no diagnóstico tardio do infarto do miocárdio. A creatinoquinase é uma enzima intracelular encontrada nas células musculares. Existem três isoenzimas da CK, com a isoenzima MB sendo altamente específica para a lesão do tecido miocárdico. Os níveis séricos de CK-MB excedem as variações normais dentro de 4 a 8 h após a lesão do miocárdio e declinam ao valor normal dentro de 2 a 3 dias. Quando comparamos a troponina e a CK-MB, o nível de troponina identifica a necrose nos músculos cardíacos mais precocemente do que a CK-MB. Os clínicos que examinam os biomarcadores cardíacos devem enfocar os níveis de troponina, em vez dos níveis de CK- MB, para estabelecer o diagnóstico e determinar o sucesso da reperfusão. ANGINA INSTÁVEL/INFARTO DO MIOCÁRDIO SEM ELEVAÇÃO DO SEGMENTO ST A AI/IMSEST é considerada uma síndrome clínica isquêmica miocárdica, que varia desde a angina estável até o infarto do miocárdio. Tipicamente, a AI e o IMSEST diferem quanto à isquemia ser grave o bastante para causar uma lesão miocárdica significativa, a ponto de liberar quantidades detectáveis de marcadores séricos cardíacos. Considera-se que as pessoas sem evidências de marcadores séricos de lesão do miocárdio apresentam AI, enquanto o diagnóstico de IMSEST é indicado pela detecção de um marcador sérico de lesão miocárdica. A fisiopatologia da AI/IMSEST pode ser dividida em cinco fases: 1.Desenvolvimento de uma placa instável que rompe, ou erosão da placa com trombose não oclusiva sobreposta 2.Obstrução, como espasmo, constrição, disfunção ou estímulo adrenérgico 3.Estreitamento grave do lúmen coronariano 4.Inflamação 5.Qualquer condição fisiológica que cause isquemia relacionada à diminuição do suprimento de oxigênio, como febre ou hipotensão. A inflamação pode desempenhar um papel importante na instabilidade da placa, com as células inflamatórias liberando citocinas que tornam a cápsula fibrosa mais fina e mais vulnerável à ruptura ou à erosão. A dor associada à AI/IMSEST apresenta uma evolução persistente e grave, sendo definida pela presença de no mínimo uma de três características: 1.Ocorre em repouso (ou com esforço mínimo), normalmente com duração superior a 20 min (se não interrompida com nitroglicerina) 2.É grave e descrita como uma dor inequívoca de início recente (i. e., dentro de 1 mês) 3.É mais grave, prolongada ou frequente do que a apresentada anteriormente. É importante estratificar o risco das pessoas que apresentam IA/IMSEST, porque o resultado pode variar de excelente (com pouca alteração no tratamento) a IMSEST (que requer tratamento agressivo) ou morte. A AI/IMSEST é classificada de acordo com a gravidade, com base no histórico clínico, no padrão do ECG e em biomarcadores séricos. A AI/IMSEST é classificada como: 1.Classe I (angina grave de início recente) 2.Classe II (angina em repouso no último mês, mas não nas últimas 48 h) 3.Classe III (angina em repouso nas últimas 48 h). O padrão do ECG na IA/IMSEST revela depressão do segmento ST (ou elevação transitória no segmento ST) e alterações na onda T. O grau de desvio do segmento ST demonstrou ser uma medida importante da isquemia e do prognóstico. INFARTO DO MIOCÁRDIO COM ELEVAÇÃO DO SEGMENTO ST O IMEST agudo, também conhecido como ataque cardíaco, é caracterizado pela morte isquêmica do tecido miocárdico associada à doença aterosclerótica das artérias coronárias. A área do infarto é determinada pela artéria coronária afetada e pela distribuição do fluxo sanguíneo. Aproximadamente 30 a 40% dos infartos afetam a artéria coronáriadireita, 40 a 50% afetam a artéria descendente anterior esquerda, e os 15 a 20% remanescentes afetam a artéria circunflexa esquerda. FISIOPATOLOGIA A extensão do infarto depende da localização e da extensão da oclusão, da quantidade de tecido cardíaco irrigado pelo vaso, da duração da oclusão, das necessidades metabólicas do tecido afetado, da extensão da circulação colateral, e de outros fatores, como frequência cardíaca, pressão arterial e ritmo cardíaco. O infarto pode envolver o endocárdio, miocárdio, epicárdio ou uma combinação desses. Os infartos transmurais envolvem toda a espessura da parede ventricular e são mais comuns com a obstrução de uma única artéria. Os infartos subendocárdicos envolvem desde o terço interno até metade da parede ventricular e ocorrem com mais frequência na presença de artérias com estreitamentos graves, mas que ainda estão pérvias. A maior parte dos infartos é transmural, envolvendo a parede livre do VE e o septo interventricular. A principal consequência bioquímica do infarto do miocárdio é a conversão do metabolismo aeróbico em anaeróbico, com uma produção de energia inadequada para manter a função miocárdica normal. Como resultado, ocorre uma perda acentuada da função contrátil dentro de 60 s após o seu início. O desenvolvimento das alterações na estrutura da célula (i. e., depleção de glicogênio e edema mitocondrial) ocorre em alguns minutos. Se o fluxo sanguíneo for restaurado, essas alterações iniciais são reversíveis. Embora as alterações teciduais macroscópicas não sejam evidentes algumas horas após o início do infarto do miocárdio, a área isquêmica deixa de funcionar em questão de minutos, e a lesão celular irreversível ocorre em aproximadamente 40 min. A morte (necrose) celular miocárdica irreversível ocorre 20 a 40 min depois da isquemia grave. A lesão microvascular ocorre em cerca de 1 h após a lesão celular irreversível. Se o infarto for suficientemente grande, deprime a função ventricular esquerda geral e, em seguida, ocorre a insuficiência do bombeamento. Diversas alterações estruturais dinâmicas mantêm a função cardíaca em pessoas com IMEST. Tanto as áreas infartadas quanto as não infartadas do ventrículo passam por alterações progressivas na dimensão, no formato e na espessura, incluindo adelgaçamento inicial da parede, cicatrização, hipertrofia e dilatação, coletivamente denominados remodelamento ventricular. Enquanto o músculo não funcional na área infartada se torna fino e dilatado, o músculo na área não infartada adjacente sofre espessamento resultante de hipertrofia adaptativa, de modo a poder assumir o trabalho do músculo na zona infartada. Contudo, o efeito adaptativo do remodelamento pode ser eliminado com a formação de um aneurisma ou a depressão da função miocárdica, causando um comprometimento ainda maior da função ventricular. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O IMEST pode ocorrer como um evento de início abrupto ou como progressão da AI/IMSEST. O início do IMEST em geral é abrupto. A dor é o sintoma significativo, tipicamente grave e esmagadora, com frequência descrita como constritiva, sufocante ou “como se algo estivesse sobre o peito”. Usualmente, a dor é subesternal e irradia para o braço esquerdo, pescoço ou mandíbula, embora possa ser relatada em outras áreas do tórax. Diferente da dor da angina, a dor associada ao IMEST é mais prolongada e não é aliviada com repouso ou nitroglicerina, mas quase sempre requer narcóticos. Algumas pessoas podem descrevê-la não como “dor” e sim como “desconforto”. É comum as mulheres apresentarem desconforto torácico do tipo isquêmico atípico, enquanto os idosos podem se queixar mais frequentemente de falta de ar do que de dor torácica. É comum haver queixas gastrintestinais com o IMEST. Uma sensação de desconforto epigástrico pode estar presente, e podem ocorrer náuseas e vômito. Acredita-se que esses sintomas estejam relacionados à gravidade da dor e à estimulação vagal. O desconforto epigástrico pode ser confundido com indigestão, e a pessoa pode buscar alívio com antiácidos ou outros remédios caseiros, o que apenas adia o atendimento médico. Queixas de fadiga e fraqueza, especialmente em braços e pernas, são comuns. A dor e o estímulo simpático se combinam e ocasionam taquicardia, ansiedade, inquietação e sensação de morte iminente. Pode haver tosse produtiva, com expectoração espumosa e rosada. A pele com frequência está pálida, fria e úmida. O comprometimento da função do miocárdio pode levar à hipotensão e ao choque. A morte súbita por IMEST ocorre dentro de 1 h após o início dos sintomas e, em geral, é atribuída a arritmias fatais que podem ocorrer sem evidências de infarto. A hospitalização precoce após o início dos sintomas aumenta significativamente as chances de evitar a morte súbita, graças à imediata disponibilidade de recursos adequados para a reanimação em caso de arritmia ventricular. TRATAMENTO DA SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Como, com frequência, é difícil obter o diagnóstico específico de IMEST no momento da admissão no sistema de atendimento de saúde, o tratamento imediato para AI/IMSEST e IMEST é essencialmente o mesmo. O prognóstico do IMEST está fortemente relacionado à ocorrência de duas complicações gerais – arritmias e complicações mecânicas (insuficiência no bombeamento). A maioria das mortes por IMEST ocorre em consequência do súbito desenvolvimento de arritmias ventriculares. Portanto, os principais elementos no tratamento de pacientes com IMEST incluem: •Reconhecimento dos sintomas e busca imediata por atendimento médico •Mobilização imediata de uma equipe médica de emergência com capacidade para realizar procedimentos de reanimação, incluindo desfibrilação •Rápido transporte para um hospital equipado para o tratamento de arritmias e fornecimento de suporte vital avançado cardíaco •Rápida implementação de terapia de reperfusão, dentro de 60 a 90 min. As pessoas que apresentam sinais e sintomas de IMEST com frequência adiam a busca pelo tratamento, apesar das atuais informações públicas a respeito dos benefícios do tratamento precoce. Entre os que adiam a busca pelo tratamento no hospital, incluem-se idosos, mulheres, afrodescendentes, pessoas de condição socioeconômica desfavorável, pessoas com histórico de angina e/ou diabetes, e pessoas que consultam um familiar. Os objetivos do tratamento da SCA no pronto- socorro incluem a identificação de candidatos à terapia de reperfusão. O histórico e o exame físico devem ser realizados de modo completo, porém com eficiência, para não adiar a terapia de reperfusão. Devem ser averiguados os episódios anteriores de DCV, incluindo SCA, cirurgia de bypass coronariano ou ICP. A avaliação da queixa principal do paciente, tipicamente a dor torácica, além dos outros sintomas associados, é essencial para a diferenciar a SCA de outros diagnósticos. Qualquer um que compareça ao pronto- socorro com sintomas de SCA deve ser submetido a uma rápida investigação, incluindo um ECG de 12 derivações. As alterações típicas ao ECG podem não estar presentes imediatamente após o início dos sintomas, com exceção das arritmias. Traçados de ECG diagnósticos (i. e., elevação do segmento ST, prolongamento da onda Q e inversão da onda T) podem ser de difícil identificação em pessoas com IMEST que apresentam dor torácica. Portanto, devem ser obtidos traçados de ECG seriados. Algumas dificuldades adicionais incluem as contrações ventriculares prematuras, que são arritmias comuns após o infarto do miocárdio. A ocorrência de outras arritmias e defeitos da condução depende das áreas do coração e das vias de condução envolvidas no infarto. Um novo bloqueio de ramo, em particular um bloqueiode ramo esquerdo, também serve de critério para IMEST e indica a necessidade de uma rápida reperfusão. Os regimes de tratamento comumente indicados incluem a administração de oxigênio, ácido acetilsalicílico (AAS), nitratos, analgésicos, terapias antiplaquetária e anticoagulante, bem como agentes de bloqueio beta-adrenérgicos (betabloqueadores). Pacientes com evidências de infarto ao ECG devem receber terapia de reperfusão imediata com um agente trombolítico ou ICP, dentro de 60 a 90 min.20 A importância do controle insulínico intensivo para manter a glicemia normal (80 a 110 mg/dℓ) em pessoas criticamente enfermas é apoiada por diversos estudos. As atuais diretrizes do ACC/AHA recomendam a manutenção de um controle glicêmico restrito durante o IMEST. O alívio da dor é um objetivo importante no tratamento do IMEST, alcançado com uma combinação de oxigênio, nitratos, analgésicos (p. ex., morfina) e agentes bloqueadores beta- adrenérgicos. A administração de oxigênio aumenta tanto o conteúdo de oxigênio no ar inspirado quanto a saturação de oxigênio da hemoglobina. Os níveis de oxigênio arterial podem sofrer queda significativa após um IMEST, e a administração de oxigênio auxilia na manutenção do conteúdo de oxigênio no sangue que perfunde a circulação coronariana. Em pessoas com insuficiência cardíaca grave por IMEST, pode ser necessária a ventilação com pressão positiva contínua ou intubação endotraqueal e suporte com ventilação mecânica. A nitroglicerina é administrada por seu efeito vasodilatador e pela capacidade de aliviar a dor coronariana. Os efeitos vasodilatadores do medicamento diminuem o retorno venoso (i. e., reduzem a pré-carga) e a pressão arterial (i. e., reduzem a pós-carga), diminuindo, assim, o consumo de oxigênio. A nitroglicerina também pode limitar a dimensão do infarto e é mais eficaz se administrada dentro de 4 h após o início dos sintomas. Em geral, é inicialmente administrada por via sublingual, mas depois se avalia a necessidade de infusão intravenosa. O uso de nitroglicerina intravenosa pode ser indicado para o tratamento da dor isquêmica contínua, o controle da hipertensão ou o tratamento da congestão pulmonar. A nitroglicerina não deve ser administrada para pessoas com hipotensão grave ou que receberam um inibidor de fosfodiesterase para disfunção erétil nas últimas 24 h. Ainda que diversos agentes analgésicos tenham sido utilizados para o tratamento da dor do IMEST, a morfina normalmente é o medicamento de escolha, sendo indicada para a dor torácica que não é aliviada com oxigênio e nitratos. A redução da ansiedade que acompanha a administração de morfina contribui para uma diminuição na inquietação e na atividade do sistema nervoso autônomo, com subsequente diminuição nas demandas metabólicas do coração. A morfina é comumente administrada por via intravenosa (IV), devido à ação de início rápido. A via IV também evita a taxa de absorção variável dos sítios subcutâneos ou intramusculares que, com frequência, não são perfundidos adequadamente em decorrência da diminuição do débito cardíaco que ocorre após o infarto. Os medicamentos bloqueadores beta- adrenérgicos atuam como antagonistas que bloqueiam as funções do sistema nervoso simpático mediadas pelos betarreceptores e, portanto, diminuem a demanda de oxigênio do miocárdio por diminuírem a frequência cardíaca, a contratilidade cardíaca e a pressão arterial sistêmica. O prolongamento da diástole causado pela frequência cardíaca mais lenta pode intensificar a perfusão do miocárdio, e em especial do subendocárdio. Os betabloqueadores também alteram os potenciais de repouso da membrana do miocárdio e podem diminuir as arritmias ventriculares de risco à vida. Como a atividade do sistema nervoso simpático aumenta as demandas metabólicas do miocárdio, em geral os betabloqueadores orais ou intravenosos são administrados nas primeiras horas após o início do IMEST. No entanto, esses medicamentos não devem ser administrados no IMEST decorrentes do consumo de cocaína, sob pena de acentuar o espasmo coronariano, apesar das controvérsias a respeito do uso dos agentes beta-adrenérgicos na condição da SCA. Outras contraindicações relativas dos betabloqueadores incluem bradicardia sintomática, hipotensão, insuficiência ventricular esquerda moderada a grave, choque e bloqueio cardíaco de segundo ou terceiro grau. As plaquetas desempenham um papel importante na resposta trombótica à ruptura da placa aterosclerótica; portanto, a inibição da agregação plaquetária é um aspecto importante no tratamento precoce da AI/IMSEST e do IMEST. O AAS é o agente antiplaquetário preferido para a prevenção da agregação plaquetária em pessoas com SCA. Acredita-se que o AAS, ao inibir a síntese da prostaglandina tromboxano A2, promove reperfusão e reduz a probabilidade de uma nova trombose. As ações do AAS estão relacionadas à presença do grupo acetila, que provoca a acetilação irreversível da enzima plaquetária ciclo-oxigenase, necessária para a síntese do tromboxano A2. Como a ação é irreversível, o efeito do AAS sobre a função plaquetária tem duração equivalente ao tempo de vida da plaqueta – aproximadamente, 8 a 10 dias. Para pacientes que não podem tomar AAS devido à hipersensibilidade ou à intolerância gastrintestinal, pode ser prescrito clopidogrel. O clopidogrel é um derivado da tienopiridina, que reduz a agregação plaquetária ao inibir a via do ADP nas plaquetas. Contrariamente ao AAS, não tem efeitos sobre a síntese de prostaglandinas. Resultados de diversos estudos conduziram às recomendações por parte da AHA para o uso de clopidogrel aliado ao AAS em pessoas com AI/IMSEST, bem como no preparo pré-procedimental e na terapia a longo prazo de pacientes submetidos à ICP. Agentes antitrombínicos também são utilizados no tratamento de pessoas com SCA. A terapia anticoagulante, cujo alvo é a via da coagulação e a formação do coágulo de fibrina, envolve o uso de heparina não fracionada e de baixo peso molecular. A justificativa para o uso da terapia antitrombínica em pessoas com IMEST é a prevenção de trombose venosa profunda (TVP), embolia pulmonar e embolia cerebral. Os inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) são utilizados com frequência nas fases inicial e de convalescência do IMEST, demonstrando benefício em termos da diminuição da taxa de mortalidade. Os inibidores da ECA aumentam o débito cardíaco e o volume sistólico, enquanto diminuem a resistência vascular sistêmica e a pressão de oclusão da artéria pulmonar (POAP). A consequência dessa ação é a minimização da disfunção do VE e da incidência de MSC. O maior benefício ocorre em casos de pacientes com infartos anteriores, insuficiência cardíaca e taquicardia. Em geral, a administração dos inibidores da ECA tem início nas primeiras 24 h, após a conclusão da terapia fibrinolítica. A terapia com inibidores da ECA normalmente é iniciada com a administração oral de uma dose baixa, que é aumentada progressivamente até a dose total. Embora o uso de inibidores da ECA como terapia a curto prazo para pessoas com IA/IMSEST aparentemente não promova benefícios, o uso a longo prazo é útil para prevenir episódios isquêmicos recidivantes. Estratégias de reperfusão. O termo reperfusão se refere ao restabelecimento do fluxo sanguíneo por meio do uso de agentes farmacológicos (terapia fibrinolítica), ICP ou cirurgia de bypass arterial coronariano (CBAC). Todas as pessoas que sofrem IMEST devem ser avaliadas quanto à terapia de reperfusão, assim que possível, ao serem admitidas no sistema de atendimento de saúde. O tempo decorrido desde o início dos sintomas, o risco de IMEST, os possíveis riscos associados à terapia fibrinolítica eo tempo necessário para o transporte até um laboratório especializado em ICP devem ser considerados. A reperfusão precoce (dentro de 15 a 20 min) após o início da oclusão pode prevenir a necrose e melhorar a perfusão miocárdica na zona do infarto. A reperfusão após um intervalo mais longo pode salvar algumas células miocárdicas que teriam morrido em consequência de períodos mais longos de isquemia. Também pode prevenir a lesão microvascular que ocorre durante um período mais longo. Ainda que, por fim, uma grande parte do miocárdio viável seja recuperada no momento do restabelecimento do fluxo ou da reperfusão, as anormalidades críticas na função bioquímica podem persistir, causando comprometimento da função ventricular. A área de recuperação do coração costuma ser denominada miocárdio hibernante. Como há perda da função do miocárdio antes da morte celular, o miocárdio hibernante pode não conseguir manter a vida, de modo que pacientes com grandes áreas de miocárdio disfuncional podem necessitar de suporte vital até a recuperação funcional das regiões afetadas. Terapia fibrinolítica Os medicamentos fibrinolíticos dissolvem os coágulos sanguíneos e plaquetários, sendo utilizados para reduzir a mortalidade, limitar a dimensão do infarto, promover a cicatrização do infarto e o remodelamento do miocárdio, e reduzir o potencial de arritmias potencialmente fatais. Esses agentes interagem com o plasminogênio para dar origem à plasmina, que lisa os coágulos de fibrina e digere os fatores V e VIII da coagulação, a protrombina e o fibrinogênio. Os agentes fibrinolíticos incluem a estreptoquinase, alteplase, reteplase e tenecteplase-tPA. Os melhores resultados são obtidos com a instituição do tratamento dentro de 30 min após o início dos sintomas. Subsequentemente, a magnitude do benefício declina, mas algum efeito benéfico ainda pode ser alcançado até 12 h após o aparecimento da dor. O paciente deve ser um candidato de baixo risco para complicações causadas por sangramento e não pode ter história de hemorragia intracraniana ou traumatismo significativo nos últimos 3 meses. A complicação primária da terapia fibrinolítica é a hemorragia intracraniana, que normalmente ocorre nas primeiras 24 h do tratamento. Intervenção coronariana percutânea A ICP é indicada como um procedimento invasivo precoce para pessoas com AI/IMSEST sem nenhuma comorbidade séria e com lesões suscetíveis à ICP. A ICP inclui angioplastia coronariana transluminal percutânea (ACTP), inserção de stent, aterectomia e trombectomia. O objetivo da ICP é realizar o procedimento dentro de 90 min após o primeiro contato clínico com a pessoa (o “intervalo porta- balão”).20 A ACTP com balão envolve a dilatação com um balão inflável de uma placa aterosclerótica causadora de estenose. O procedimento é semelhante à cateterização cardíaca para angiografia coronariana, no sentido em que o cateter de dilatação com balão de lúmen duplo é introduzido pela via percutânea na artéria femoral ou braquial e avançado, guiado por fluoroscopia, até a área de estenose do vaso coronariano afetado. Nesse ponto, é acionado para expandir o lúmen da artéria coronária, distendendo e lacerando a placa aterosclerótica e, em menor medida, distribuindo a placa ao longo do seu eixo longitudinal. Esse procedimento com frequência é utilizado com a inserção de stents. As complicações agudas da ACTP incluem trombose e dissecção do vaso; as complicações em mais longo prazo envolvem uma nova estenose do vaso dilatado. Foi demonstrado que o uso de stents coronarianos melhora os resultados a curto e longo prazos, em comparação à ACTP isoladamente. Os pacientes submetidos aos procedimentos com stent são tratados com medicamentos antiplaquetários e anticoagulantes para prevenir a trombose, que é um risco importante do procedimento. Os stents com rede de fios autoexpansíveis metálicos expostos inicialmente utilizados apresentavam taxas de trombose altas e foram em grande parte substituídos pelos stents expansíveis com balão. A braquirradioterapia era utilizada para prevenir a incidência de uma nova estenose dos stents, por meio do uso de radioterapia arterial intracoronariana localizada. Os desfechos atribuídos ao procedimento foram a inibição da proliferação celular e da formação de lesões vasculares, e a prevenção do remodelamento arterial constritivo. A necessidade de radioterapia é uma limitação desse procedimento, o qual se mostrou menos eficaz do que os stents com eluição de medicamentos. Os stents metálicos expostos são utilizados em 20 a 30% das pessoas que necessitam de ICP. Os stents com eluição de medicamentos (com sirolimo, paclitaxel, zotarolimo e everolimo) também estão sendo utilizados para suprimir a proliferação local da neoíntima, a qual ocasiona reestenose da artéria coronária. Estudos clínicos recentes observaram que o uso prolongado de AAS e clopidogrel, por até 1 ano, é recomendado para prevenir a reestenose. A aterectomia (i. e., secção da placa aterosclerótica com uma lâmina circular de alta velocidade, a partir do interior do vaso) é uma técnica mecânica de remoção de tecido aterosclerótico durante a angioplastia. Laser e dispositivos de angioplastia também são utilizados. Contudo, graças à disponibilização dos stents, esses procedimentos atualmente são utilizados com menos frequência. A trombectomia (remoção do trombo) envolve o uso de um dispositivo acoplado a um cateter especial que fratura o trombo em pequenos fragmentos e, em seguida, os puxa para o interior da ponta do cateter, de modo a poderem ser impulsionados em direção proximal e removidos. Cirurgia de bypass arterial coronariano - A CBAC é uma das cirurgias mais comumente realizadas no mundo, proporcionando alívio da angina, melhora da tolerância aos exercícios e prolongamento da vida. O procedimento envolve a revascularização do miocárdio afetado. Isso é feito por meio da inserção de um enxerto de veia safena entre a aorta e a artéria coronária afetada, distalmente ao ponto de oclusão; ou, alternativamente, usando a artéria mamária para promover a revascularização da artéria descendente anterior esquerda ou de suas ramificações (Figura 27.9). Normalmente, são realizadas até cinco anastomoses distais. A CBAC de emergência ou urgência, como uma estratégia de reperfusão, é indicada em situações como no insucesso da ICP com dor persistente ou instabilidade hemodinâmica, ou para pessoas que não são candidatas à ICP ou à terapia fibrinolítica.19,21 Ao considerar a CBAC como uma opção de tratamento, o risco de mortalidade hospitalar e outras complicações deve ser levado em consideração. Idade avançada, função ventricular esquerda inadequada, e urgência na realização da cirurgia aumentam o risco de mortalidade precoce. Complicações sérias, como acidente vascular encefálico, mediastinite e disfunção renal, também aumentam a mortalidade e a morbidade associadas à CBAC. O uso de antibióticos no pré-operatório e a administração perioperatória de betabloqueadores ajudam a reduzir a incidência de infecções pós-operatórias e fibrilação atrial. CARDIOPATIA ISQUÊMICA CRÔNICA A isquemia do miocárdio ocorre quando a capacidade das artérias coronárias de suprir sangue é inadequada para atender às demandas metabólicas do coração. As limitações no fluxo sanguíneo coronariano resultam mais comumente de aterosclerose, mas o vasospasmo pode atuar como um fator iniciador ou contribuinte. Existem diversos tipos importantes de DAC isquêmica crônica: angina estável crônica, isquemia do miocárdio silenciosa, angina variante ou vasospástica, dor torácica com angiografia coronariana normal e miocardiopatia isquêmica. Angina estável. A angina estável crônica estáassociada a uma obstrução coronariana fixa que produz disparidade entre o fluxo sanguíneo coronariano e as demandas metabólicas do miocárdio. A angina estável é a manifestação inicial da cardiopatia isquêmica em aproximadamente metade das pessoas com DAC.23 Ainda que a maior parte das pessoas com angina estável apresente cardiopatia aterosclerótica, a angina não se desenvolve em uma quantidade considerável de pessoas com aterosclerose coronariana avançada. Isso provavelmente se deve ao estilo de vida sedentário, ao desenvolvimento de uma circulação colateral adequada, ou à incapacidade dessas pessoas de perceber a dor. Em muitos casos, o infarto do miocárdio ocorre sem histórico de angina. A angina de peito normalmente é precipitada por situações que aumentam as demandas de trabalho cardíaco, como mediante esforço físico, exposição ao frio e estresse emocional. A dor tipicamente é descrita como uma sensação de aperto, esmagamento ou sufocamento; costuma ser estável, aumentando em intensidade somente no início e no final do ataque. A dor da angina em geral está localizada na área precordial ou subesternal do tórax e, semelhantemente à dor do infarto do miocárdio, pode irradiar até o ombro esquerdo, mandíbula, braço ou outras áreas do tórax. Em algumas pessoas, a dor no braço ou no ombro pode ser confundida com artrite; em outras, a dor epigástrica é confundida com indigestão. A angina normalmente é categorizada conforme a ocorrência (durante o exercício ou em repouso), o aparecimento, início recente ou o aumento da gravidade. A angina estável crônica tipicamente é provocada por esforço ou estresse emocional, e aliviada após alguns minutos, mediante repouso ou uso de nitroglicerina. Um adiamento em mais de 5 a 10 min antes de o alívio ser obtido sugere que os sintomas não são decorrentes de isquemia ou resultam de isquemia grave. A angina durante o repouso, de início recente ou que aumenta em intensidade ou duração indica um risco aumentado de infarto do miocárdio e deve ser imediatamente avaliada com base nos critérios relativos à SCA. Isquemia do miocárdio silenciosa. Ocorre na ausência de dor do tipo angina e parece ser causada pelos mesmos fatores responsáveis pela angina, incluindo o comprometimento do fluxo sanguíneo consequente aos efeitos da aterosclerose coronariana ou do vasospasmo coronariano. A isquemia do miocárdio silenciosa afeta três populações – pessoas assintomáticas sem outras evidências de DAC, pessoas que sofreram um infarto do miocárdio e continuam a apresentar episódios de isquemia silenciosa, e pessoas com angina que também apresentam episódios de isquemia silenciosa.23 O motivo dos episódios de isquemia não está claro. Tais episódios podem ser mais breves e envolver uma parte menor do tecido miocárdico do que a afetada pelos episódios que causam dor. Outra explicação é que as pessoas com angina silenciosa apresentam defeitos no limiar da dor ou em sua transmissão, ou neuropatia autônoma com denervação sensorial. Existem evidências de aumento na incidência de isquemia do miocárdio silenciosa em portadores de diabetes melito, provavelmente como resultado de neuropatia autônoma, uma complicação comum do diabetes. O IMEST silencioso abrange uma proporção significativa de todos os IMEST em idosos. Angina variante (vasospástica). A angina variante também é conhecida como angina vasospástica ou de Prinzmetal. Suas causas não são completamente compreendidas, mas uma combinação de processos patológicos pode ser a responsável. Foi sugerido que possivelmente seja resultante de disfunção endotelial, respostas de hiperatividade do sistema nervoso simpático, defeitos na utilização do cálcio pelo músculo liso vascular ou alteração na produção de óxido nítrico.18,23 Em algumas pessoas, está associada à hipercontratilidade do músculo liso vascular e a cefaleias do tipo enxaqueca, ou ainda ao fenômeno de Raynaud. Ao contrário da angina estável, que ocorre com esforço ou estresse, a angina variante normalmente se manifesta durante o repouso ou com exercícios mínimos, e quase sempre no período noturno (entre 0 e 8 h). É comum haver arritmias quando a dor é grave, e a maior parte das pessoas tem consciência de sua presença durante a crise. As alterações no ECG registradas durante uma crise são significativas, e as anormalidades incluem elevação ou depressão do segmento ST, onda T em picos, inversão da onda U e distúrbios do ritmo. Indivíduos com angina variante que apresentam arritmias sérias durante episódios de dor espontânea têm risco aumentado de morte súbita. Dor torácica com angiografia coronariana normal. A dor torácica exercício-induzida com angiografia coronariana normal é comumente descrita como síndrome cardíaca X. Esse distúrbio não deve ser confundido com a síndrome metabólica, anteriormente denominada síndrome X. A causa da dor torácica não está estabelecida, mas acredita- se que reflita um problema na microvasculatura e/ou um aumento na percepção da dor cardíaca. Para esse distúrbio, foi sugerida a denominação alternativa angina microvascular. Miocardiopatia isquêmica. Descreve a DAC que resulta em disfunção do miocárdio. Pode se manifestar como sintomas de cardiomiopatia sem histórico conhecido de DAC em pessoas que sofreram vários episódios de IM ou apresentam obstrução arterial. É importante reconhecer a diferença entre miocardiopatia isquêmica e miocardiopatia dilatada (MCD), posto que a primeira, se diagnosticada, pode ser revertida. A miocardiopatia isquêmica causada por vários episódios de IM tem prognóstico desfavorável, dada a existência de uma lesão maior do que as observadas em pessoas com lesões ocluídas e reversíveis. Diagnóstico. O diagnóstico da angina é baseado em um histórico detalhado sobre a dor, na presença de fatores de risco, em exames invasivos ou não, e em dados laboratoriais. As causas não coronarianas de dor torácica, como refluxo esofágico ou distúrbios musculoesqueléticos, devem ser afastadas. Os exames não invasivos para casos de angina estável crônica incluem ECG, ecocardiograma, teste ergométrico, análises de imagens nucleares, TC e possivelmente a RM cardíaca. Como o ECG em repouso muitas vezes é normal, o teste ergométrico é utilizado com frequência na avaliação de pacientes com angina. A isquemia assintomática em repouso é detectada pela precipitação da dor torácica típica, ou por alterações do segmento ST ao ECG. Ainda que os exames não invasivos sejam de grande valia para o diagnóstico da angina estável crônica, o diagnostico definitivo requer cateterização cardíaca e arteriografia coronariana. Os níveis de marcadores bioquímicos séricos para infarto do miocárdio são normais em portadores de angina estável crônica. Anormalidades metabólicas como hipercolesterolemia e outras dislipidemias, intolerância a carboidratos e resistência à insulina são detectadas com frequência. Tratamento Pacientes com angina estável crônica necessitam de uma avaliação abrangente e individualizada, alterações no estilo de vida e tratamento. Os objetivos do tratamento são direcionados à redução dos sintomas e à prevenção do infarto do miocárdio, por meio da adoção de estratégias não farmacológicas, farmacoterapia e intervenções coronarianas. A ICP alivia os sintomas naqueles com angina estável crônica, mas não prolonga o tempo de vida. A CBAC normalmente é indicada para os casos em que uma doença afeta dois ou três vasos. O alvo dos métodos não farmacológicos é o controle dos sintomas, além da introdução de modificações no estilo de vida que minimizem os fatores de risco de doença coronariana, incluindo cessação do tabagismo, redução do estresse, um programa de exercícios regulares, limitação da ingestãoalimentar de colesterol e gorduras saturadas, redução do peso na presença de obesidade e medidas para evitar a vasoconstrição induzida pela exposição ao frio. O objetivo do tratamento farmacológico da angina é o alívio da isquemia e dos sintomas, a prevenção do infarto do miocárdio e da morte, e a melhora da qualidade de vida. Os agentes farmacológicos utilizados na angina estável crônica incluem AAS ou clopidogrel, betabloqueadores (em pessoas sem contraindicações) ou antagonistas de cálcio (quando houver contraindicação para betabloqueadores), e inibidores da ECA (naqueles que também apresentam diabetes ou disfunção sistólica ventricular esquerda; ver a discussão anterior, na seção sobre síndrome coronariana aguda). Para os casos de DAC estabelecida, incluindo angina estável crônica, recomenda-se o uso de agentes hipolipemiantes ou estatinas, mesmo na presença de elevações leves a moderadas de LDL colesterol. Os nitratos, tanto os de ação de curta duração quanto os de ação prolongada, são os vasodilatadores utilizados no tratamento da angina estável crônica e da isquemia do miocárdio silenciosa.23 Os nitratos exercem seu efeito principalmente por meio da diminuição no retorno venoso para o coração, com resultante diminuição no volume intraventricular, e a pressão arterial também diminui. A diminuição da pressão intraventricular e do volume intraventricular está associada à diminuição da tensão da parede e da demanda de oxigênio do miocárdio. Embora não sejam vasodilatadores, os medicamentos betabloqueadores são extremamente úteis no tratamento da angina associada ao esforço. Os benefícios dos agentes betabloqueadores decorrem primariamente de seus efeitos hemodinâmicos – diminuição da frequência cardíaca, da pressão arterial e da contratilidade miocárdica – que minimizam as demandas de oxigênio do miocárdio em repouso e durante o exercício. Os medicamentos bloqueadores de canais de cálcio, também denominados antagonistas de cálcio, bloqueiam os canais de cálcio tipo L (ativados e inativados) nos músculos cardíaco e liso. Seus efeitos terapêuticos resultam da dilatação das artérias coronárias e periféricas, bem como da diminuição do metabolismo miocárdico associado à diminuição da contratilidade do miocárdio. Pessoas com angina variante normalmente respondem ao tratamento com antagonistas de cálcio. FARMACODINÂMICA Quatro tipos de fa ́rmacos, usados sozinhos ou em combinação, são comumente usados para tratar pacientes com angina estável: β- bloqueadores, bloqueadores dos canais de cálcio, nitratos orgânicos e a ranolazina, que e ́ um bloqueador dos canais de sódio. Esses fármacos ajudam a equilibrar o suprimento de oxigênio cardíaco e a demanda, afetando a pressão arterial, o retorno venoso, a frequência e a contratilidade cardi ́acas. BLOQUEADORES B-ADRENÉRGICOS Os bloqueadores β-adrenérgicos diminuem a demanda de oxigênio do mio- cárdio, bloqueando os receptores β1 e resultando em diminuição da frequên- cia, da contratilidade e do débito cardíacos e da pressão arterial. Esses fármacos reduzem a demanda de oxige ̂nio pelo miocárdio durante o exercício e no repouso. Assim, reduzem a frequência e a gravidade dos ataques de angina. Os β- bloqueadores podem ser usados para aumentar a duração e a tolerância do exercício em pacientes com angina induzida por esforço. Os β-bloqueadores são recomendados como tratamento antianginoso inicial em todos os pacien- tes, a menos que haja contraindicação. (Nota: a exceção a essa regra é a an- gina vasoespástica, na qual os β-bloqueadores são ineficazes e podem até mesmo agravar os sintomas.) Os β- bloqueadores diminuem o risco de morte e IM em pacientes que tiveram um IM prévio e também reduz a mortalidade em pacientes com hipertensão e insuficiência cardíaca com frac ̧ão de ejeção reduzida. Fármacos com atividade simpaticomime ́tica intrínseca (ASI), como o pindolol, devem ser evitados em pacientes com angina e naqueles que ti- veram um IM. O propranolol é o protótipo dessa classe de compostos, mas não e ́ cardiosseletivo (ver Cap. 7). Por isso, outros β-bloqueadores, como metoprolol e atenolol, são preferidos. (Nota: todos os β-bloqueadores são não seletivos em doses altas e podem inibir receptores β2.) Os β-bloqueadores devem ser evitados em pacientes com bradicardia grave; contudo, podem ser usados em pacientes com diabetes, doença vascular perife ́rica e doença pulmonar obstrutiva crônica enquanto forem monitorados atentamente. Os β-bloqueadores não seletivos devem ser evitados em pacientes com asma. (Nota: é importante não interromper abruptamente o uso do β-bloqueador. A dosagem deve ser reduzida gradualmente por 2 a 3 semanas para evitar angina de rebote, IM e hipertensão.) BLOQUEADORES DOS CANAIS DE CÁLCIO O cálcio é essencial para a contração muscular. Na isquemia, o influxo de cálcio aumenta devido à despolarização da membrana provocada pela hipó- xia. Isso, por sua vez, promove a atividade de várias enzimas que consomem trifosfato de adenosina (ATP), esgotando, assim, os estoques de energia e agravando a isquemia. Os bloqueadores dos canais de cálcio protegem o tecido inibindo a entrada de cálcio nas células cardíacas e musculares lisas dos leitos arteriais coronarianos e sistêmicos. Portanto, todos os bloqueado- res dos canais de cálcio são vasodilatadores arteriolares que causam dimi- nuição do tônus dos músculos lisos e da resistência vascular. Esses fárma- cos afetam primariamente a resistência de músculos lisos arteriolares coronarianos e perife ́ricos. No tratamento da angina causada por esforço, os bloqueadores dos canais de cálcio diminuem o consumo de oxigênio pelo miocárdio, reduzindo a resistência vascular e diminuindo, assim, a pós-car- ga. Sua eficácia na angina vasoespástica deve-se ao relaxamento das arté- rias coronárias. (Nota: o verapamil afeta principalmente o miocárdio, e o anlodipino exerce efeito maior nos mu ́sculos lisos nos vasos perife ́ricos. O diltiazem apresenta ação intermediária.) Todos os bloqueadores dos canais de cálcio baixam a pressão arterial. NITRATOS ORGÂNICOS Esses compostos causam redução na demanda mioca ́rdica de oxigênio, se- guida por alívio dos sintomas. Eles são eficazes nas anginas estável, instá- vel e variante. Os nitratos orgânicos relaxam o músculo liso vascular por sua con- versão intracelular em íons nitrito, e, então, a óxido nítrico, que ati- va a guanilatociclase e aumenta o monofosfato cíclico de guanosina (GMPc). O GMPc aumentado leva à desfosforilac ̧ão das cadeias leves de miosina, resultando em relaxamento do músculo liso vascular. Nitratos como a nitroglicerina causam dilatação das veias gran- des, o que reduz a pré-carga (retorno venoso ao coração) e, assim, eduz o trabalho do coração. Acredita-se ser esse o principal meca- nismo de ação no tratamento da angina. Os nitratos tambe ́m dilatam os vasos coronarianos, proporcionando aumento na oferta de sangue para o músculo cardíaco. BLOQUEADORES DOS CANAIS DE SÓDIO A ranolazina inibe a última fase da corrente de sódio (INa tardia), melhorando a equação de oferta e demanda de oxige ̂nio. A inibic ̧ão da INa tardia reduz a sobrecarga intracelular de sódio e cálcio, melhorando, assim, a disfunc ̧ão diastólica. A ranolazina tem propriedades antianginosa e antiarrítmica. Ela é indicada para o tratamento da angina crônica e pode ser usada sozinha ou em associação com outros tratamentos tradicionais. Mais frequentemente é usada em pacientes em que falharam outros tratamentos antianginosos. A ranolazina é extensamente biotransformadano fígado, principalmente pela fami ́lia CYP3A e também pela CYP2D6. Também é substrato da glicopro- teína P. Como tal, a ranolazina é sujeita a numerosas interações. Além disso, a ranolazina pode prolongar o intervalo QT e deve ser evitada com outros fa ́rmacos que causam prolongamento desse intervalo. Referências: Whalen, Karen, et al. Farmacologia Ilustrada. Disponível em: Minha Biblioteca, (6ª edição). Grupo A, 2016. Norris, Tommie L. Porth - Fisiopatologia. Disponível em: Minha Biblioteca, (10ª edição). Grupo GEN, 2021.
Compartilhar