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1 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi Sistemas orgânicos integrados OBJETIVOS: 1. Estudar as infecções congênitas (TORCHS) 2. Compreender o mecanismo do aborto 3. Recordar os principais teratógenos (drogas ilícitas e lícitas) (sem medicamentos) Infecções congênitas Manifestações inespecíficas: SNC, olhos, pele e vísceras. É quando uma doença é transmitida da mãe para o bebê durante a gravidez, via intrauterina ou via transplacentária, causando ou não consequências para a criança após o nascimento. Toxoplasmose A toxoplasmose é uma doença congênita infecciosa causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, que infecta os seres humanos por meio da ingestão de oócitos ou de cistos. Resulta da transferência transplacentária do protozoário para o concepto decorrente de infecção primária da mãe durante a gestação ou por reagudização de infecção prévia em mães imunodeprimidas. Estes são encontrados nas fezes de gato, na água, em frutas ou verduras contaminadas, em carne crua ou malcozida ou durante jardinagem em solos contaminados. Cerca de um terço da população mundial é infectada por esse parasita. Entretanto, por ser na maioria das vezes assintomática, a prevalência não é bem conhecida, variando em função de fatores sociais, econômicos, culturais e climáticos em diferentes regiões. A severidade da doença fetal depende da idade do feto no momento da transmissão, sendo mais grave a apresentação durante os primeiros dois trimestres da gestação. A gravidade da doença no neonato é inversamente proporcional à idade gestacional; no primeiro trimestre da gestação, a taxa de transmissão é de 17% com repercussões graves, como óbito fetal ou neonatal; no segundo trimestre, o risco sobe para 25%, e o Recém-Nascido (RN) pode apresentar manifestações subclínicas. No terceiro trimestre, o risco chega a 65%, com manifestações subclínicas – repercussões leves – e, mais raramente, um quadro de parasitemia. Quadro clínico A maioria das crianças acometidas é assintomática ao nascimento e os efeitos da doença podem levar meses ou anos para se manifestarem. Os sintomas, quando presentes, são inespecíficos, podendo simular qualquer outra infecção, tornando fundamental o diagnóstico sorológico. A tríade clássica de sinais é composta por coriorretinite, hidrocefalia e calcificações cerebrais. Outros quadros clínicos são: • Natimortalidade e morte neonatal, 5% dos casos; • Formas subclínicas, 70%; • Formas leves, 20% – o paciente é aparentemente normal, com algum sintoma semanas ou meses; • Algumas vezes aparecem calcificações cerebrais e coriorretinite, sem comprometimento do Sistema Nervoso Central (SNC). Formas graves manifestam-se como: • Neurológica (encefalítica): coriorretinite, alteração do líquido cerebrospinal (LCE), anemia, convulsões, calcificações cerebrais, hidrocefalia, microcefalia; • Generalizada (formas neurológica e visceral): icterícia, hepatoesplenomegalia, linfadenopatia, febre, alterações liquóricas, coriorretinite, anemia, petéquias, eosinofilia, trombocitopenia, surdez neurossensorial. Suas sequelas incluem alterações da acuidade visual – a grande maioria das crianças não tratadas terão lesões oculares ao longo da vida –, convulsões e retardo mental. Quadros graves de toxoplasmose congênita apresentam a tétrade de Sabin: hidro ou microcefalia, retinocoroidite bilateral macular ou perimacular, calcificações cerebrais intraparenquimatosas grosseiras e retardo mental. Problema 23 S13 P1+ P2 2 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi Diagnóstico: O diagnóstico pode ser feito por meio de métodos sorológicos, entre eles o ELISA, com captura de IgA para o diagnóstico de infecções recentes, pois seus anticorpos desaparecem de circulação mais rapidamente do que os da classe IgM, e reação em cadeia da polimerase no líquido amniótico. Solicitar na primeira consulta de pré- natal. Se der negativo, o exame deve ser repetido trimestralmente. Outras avaliações devem ser realizadas, como a oftalmológica, a neurológica e a auditiva, e outros exames, como ultrassonografia (USG) transfontanela, hemograma completo e análise do LCE para avaliar o comprometimento do paciente. Prevenção Sua prevenção durante a gestação consiste em evitar o contato com animais infectados, principalmente gatos, não consumir carnes cruas ou malcozidas, lavar bem as mãos antes das refeições, lavar bem as frutas e as verduras, evitar jardinagem e repetir a sorologia a cada trimestre. Sífilis congênita Ocorre em qualquer fase da gestação e qualquer estágio da sífilis materna, sendo o agente etiológico uma bactéria Gram negativa, o Treponema pallidum. Quanto mais tarde na gestação e mais precoce a sífilis, maior o risco de infecção fetal. A transmissão é feita pela disseminação hematogênica do Treponema pallidum da gestante para o feto. A transmissão da sífilis não ocorre por meio do leite materno. Durante o aleitamento materno, é possível que aconteça a transmissão se há lesão mamária por sífilis, mas essa é uma situação rara. Cabe lembrar que a transmissão vertical do T. pallidum ocorre principalmente intraútero, mas também é possível a contaminação do concepto durante passagem pelo canal de parto, caso existam lesões ativas. Em gestantes com sífilis precoce não tratada, estima-se perda fetal em 40% de aborto espontâneo ou natimorto. A notificação de sífilis adquirida, sífilis em gestante e sífilis congênita é obrigatória. Taxa de transmissão vertical da sífilis: • Fases primária e secundária da doença materna: de 70 a 100%; • Fases terciária e latente tardia: 30%. Prevenção e controle • Triagem diagnóstica antes da gravidez em mulheres em idade reprodutiva e em seu parceiro; • Assistência pré-natal adequada, com VDRL no primeiro trimestre e em torno da vigésima oitava semana da gestação; • Tratamento de acordo com a fase da doença. Manifestações clínicas As manifestações clínicas são divididas em dois grupos: sífilis congênita precoce e a tardia. Sífilis congênita precoce A sífilis congênita é classificada como precoce, nos primeiros dois anos de vida. Mais de 50% das crianças afetadas são assintomáticas ao nascimento, com sintomas surgindo ao redor dos 3 meses. As manifestações clínicas e alterações laboratoriais: Alterações cutaneomucosas – De 15 a 60% • Pênfigo palmoplantar; • Exantema maculopapular; • Coriza; • Condiloma plano; 3 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi • Placas na mucosa oral; • Fissuras nos lábios, nas narinas e no ânus; • Alterações ectodérmicas – perda de cílios e cabelos, esfoliação das unhas Alterações viscerais – Laboratoriais • Hepatomegalia – 75% a 100%; • Esplenomegalia; • Hepatite; • Síndromes nefrítica e/ou nefrótica; • Paralisia das cordas vocais; • Pneumonia intersticial; • Meningite, convulsões; • Hidrocefalia progressiva; • Uveíte, coriorretinite “em sal e pimenta”; • Rinite serossanguinolenta; • Anemia – hemolítica e Coombs negativo; • Trombocitopenia, púrpura; • Leucopenia – leucocitose com reação leucemoide; • CIVD. Alterações osteoarticulares • Osteocondrite (pseudoparalisia de Parrot: é causada pela recusa da criança em movimentar a extremidade e relaciona-se com as alterações ósseas e eventuais fraturas associadas.) e periostite (diáfise dos ossos longos). Sífilis congênita tardia Manifestações Clínicas evidentes depois dos dois anos de vida. Cerca de 40% das crianças não tratadas apresentam sequelas de doença sistêmica precoce nas fases pré-escolar e escolar. As principais características são gomas do véu palatino (ulcerações e perfuração), rágades (cicatrizes periorificiais), hidrocefalia, ceratite intersticial, surdez neurológica (lesão do VIII par), dentes de Hutchinson (incisivos centrais superiores), molar “de amora” (primeiro molar inferior), nariz“em sela”, encurtamento da maxila; articulações de Clutton, tíbias “em lâmina de sabre”, bossa frontal e fronte olímpica. Diagnóstico Devemos iniciar investigação de sífilis congênita em todos os RNs de mães com sífilis e evidência clínica e, ou laboratorial, e em todas as crianças com menos de 13 anos com suspeita clínica e, ou epidemiológica de sífilis congênita. Se a mãe foi considerada com tratamento adequado para sífilis, inicialmente será solicitado somente o VDRL. Se o tratamento foi inadequado, deve-se realizar a notificação para sífilis congênita e, além do VDRL, solicitar o hemograma completo, glicemia e radiografia de ossos longos e coletar o liquor (solicitar celularidade, glicorraquia, proteinorraquia e VDRL). 4 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi Rubéola congênita infecção fetal por via transplacentária durante a viremia materna, diminuindo a sua taxa de transmissão quanto mais avançada a gestação. Quadro clínico Cerca de 70% têm manifestação ao nascer. Os RNs podem apresentar desde um quadro assintomático até SRC: catarata, cegueira, surdez neurossensorial, microcefalia, retardo mental e malformações cardíacas, persistência do canal arterial, estenose da artéria pulmonar e defeitos de septos atrial e ventricular. A principal característica da rubéola congênita é a sua cronicidade, e as manifestações existentes podem progredir ou novas alterações aparecer ao longo da vida. O paciente com rubéola congênita pode apresentar como manifestações tardias: dificuldade de aprendizagem, distúrbios de comportamento e autismo. A perda auditiva é a manifestação tardia mais comum e ocorre em 80% dos casos. Diagnostico É obtido por testes sorológicos maternos ou fetais com aumento da titulação ou soroconversão, além de isolamento viral no sangue, urina ou LCE e reação em cadeia da polimerase no sangue ou nas secreções da orofaringe. A suspeita clínica deve ser feita em todo RN cuja mãe teve rubéola na gestação, suspeita ou confirmada, e para aqueles com restrição de crescimento intrauterino associada a qualquer estigma da rubéola congênita. A pesquisa de anticorpos IgM e IgG deve ser realizada o mais brevemente possível partir da suspeita clínica. Profilaxia Compreende vacinação para rubéola em mulheres em período fértil; não pode ser aplicada a mulheres grávidas. Após a vacinação o ideal é que se espere um mês antes de tentar engravidar. Além disso, gestantes devem ser afastadas de pacientes com suspeita de rubéola. A criança com rubéola congênita deve ficar isolada durante a fase aguda, e os familiares devem ser esclarecidos sobre a 5 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi possibilidade de eliminação do vírus até um ano depois do nascimento. Ressaltando que essa medida não é necessária caso as culturas de nasofaringe e urina sejam repetidamente negativas – pelo menos dois resultados, com intervalo de um mês – após três meses de vida. Citomegalovírus Trata-se da infecção congênita mais comum, vírus da família do Herpes. Das infecções, 90% são assintomáticos e cerca de 10% desenvolvem complicações como perda da audição, coriorretinite, atrofia óptica, microcefalia e distúrbios da fala e da aprendizagem. O maior risco para o feto ocorre durante a primeira metade da gestação, podendo a infecção materna ser assintomática. Estima-se que cerca de 0,5 a 2,2% dos neonatos sejam infectados pelo citomegalovírus (CMV) no período do nascimento e cerca de 10% sejam sintomáticos ao nascimento. Alguns destes podem ter sintomas extremamente graves, podendo evoluir para óbito, geralmente por coagulação intravascular disseminada (CIVD), falência de múltiplos órgãos e infecção bacteriana secundária. Nos adultos, pode causar a síndrome mononucleose-like. Transmissão • Vertical (Intraparto, secreção cervicovaginal, transplacentária); • Pós-natal (aleitamento materno); • Congênita, a mais importante, pois pode resultar em infecção congênita e sequela neurológica. Nos casos em que a primoinfecção materna é durante a gravidez, o risco fetal será maior. Fatores de risco: Mae adolescentes, atividade sexual com múltiplos parceiros, multiparidade, baixa condições socioeconômica. Quadro clínico 90% das crianças são assintomáticas, enquanto os 10% restantes apresentam a doença de forma grave. Grave: hepatomegalia, esplenomegalia, icterícia, petéquias e púrpura (a trombocitopenia pode persistir por meses a anos), microcefalia (perímetro cefálico abaixo do percentil 50), calcificações cerebrais (periventriculares) e hidrocefalia, defeitos oculares, coriorrentinite, microftalmia e catarata, retardo do crescimento intrauterino, prematuridade, pneumonites, defeitos dentários, perda auditiva neurossensorial (alterações mais comum causadas pelo CMV, que envolve 60% das crianças sintomáticas e 5% das assintomáticas). Coriorretinite apresenta-se com áreas de necrose retiniana branco-amareladas extensas. Há graus variáveis de hemorragias e vasculite com um aspecto chamado “pizza com ketchup”. Alteração mais comum: perda auditiva Diagnostico Pesquisa do vírus em secreções urina, salina, secreções respiratórias, sangue e fragmentos de órgãos com isolamento nas primeiras duas e três semanas indicam infecção congênita. Herpes simples Na infecção durante a gestação geralmente ocorrem sinais graves no feto levando ao óbito fetal. Usualmente o quadro clínico no RN ocorre por infecção genital materna, e é mais comum sua transmissão durante o trabalho de parto ou pós-natal, chegando a 50% no parto vaginal. As mulheres com primo-infecção geralmente são assintomáticas, enquanto aquelas com infecção recidivante têm a transmissão intraparto diminuída para uma taxa de 3 a 5% pela presença de anticorpos preexistentes. O Herpes-Vírus Simples-1 (HSV-1) infecta a pele e a mucosa acima da cintura, e o Herpes-Vírus Simples-2 (HSV-2) infecta a genitália materna e o neonato – transmissão perinatal. Quadro clínico O período de incubação da infecção varia entre dois e 20 dias, com média de 16 dias, portanto os RNs que apresentam lesões ao nascimento provavelmente foram infectados antes do nascimento. As manifestações clínicas se apresentam em três categorias: • Mucocutânea: infecção de pele, olho e boca, de cinco a seis dias após o parto; • Neurológica: infecção do SNC, de oito a 12 dias após o parto; 6 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi • Disseminadas: infecção disseminada sem acometimento do SNC, de cinco a seis dias após o parto. Apresenta-se com alterações cerebrais que incluem microcefalia, hidrocefalia e meningoencefalite; na região ocular, conjuntivite, ceratite, coriorretinite e cegueira. Outras sequelas incluem anencefalia, microcefalia, pneumonite, hepatomegalia, anemia hemolítica, espasticidade e retardo mental. Na pele, as lesões podem se apresentar na forma de vesículas agrupadas. A meningoencefalite herpética ocorre geralmente entre a segunda e a terceira semana de vida e é caracterizada por instabilidade térmica, letargia, má aceitação alimentar, irritabilidade, tremores, convulsões e fontanela anterior ampla. Pode ou não ser acompanhada das lesões vesiculares nos olhos, pele e boca. Diagnóstico Por meio de cultura e exame citológico das lesões e liquor. Sorologia realiza o teste de imunofluorescência para anticorpos IgG e IgM, além do ELISA. HIV A transmissão vertical é a forma predominante de na aquisição de HIV por essa população. A transmissão pode ocorrer durante todo o pré-natal, parto ou pela amamentação. O maior risco ocorre no momento do parto, pela exposição da pele e mucosa do concepto ao sangue e secreções maternas, além da transfusão materno fetal. Diagnostico Como a transmissão costuma ser periparto, as crianças são assintomáticas ao nascimento. Deve ser realizadaintervenção profilática de acordo com a sorologia e carga viral materna, e seguimento sorológico do lactente. Aborto Abortamento é a interrupção da gravidez até a 20ª-22ª semana e com produto da concepção pesando menos que 500g. Aborto é o produto da concepção eliminado no abortamento. Fatores de risco: • Idade materna • Abortos prévios • Tabagismo • Álcool, cocaína; • Anti-inflamatorios não esteroides; • Peso; • Tireoideopatias; Etiologias Fetais e maternas Cromossomopatias autossômicas ------- aneuploidias (defeitos na gametogênese) Incompetência istmocervical Trombofilias --- síndrome do anticorpo antifosfolipídeo Quadro clínico • Sangramento • Dor abdominal • Dor lombar, náuseas, vômitos e mal estar Formas clínicas: Ameaça ao aborto O sangramento genital é de pequena a moderada intensidade, podendo existir dores, tipo cólicas, geralmente pouco intensas. O colo uterino (orifício interno) encontra-se fechado, o volume uterino é compatível com o esperado para a idade gestacional e não existem sinais de infecção. O exame de ultrassom mostra-se normal, podendo encontrar pequena área de descolamento ovular. Não existe indicação de internação hospitalar, a mulher deve ser orientada para ficar em repouso, utilizar analgésico se apresentar dor, evitar relações sexuais durante a perda sangüínea, e retornar ao atendimento de pré-natal. Nos casos em que não ocorre regressão das alterações ou se surgir febre, dor pélvica localizada ou sangramento com odor fétido, deve a mulher retornar ao serviço de saúde para nova avaliação. Abortamento completo Geralmente, ocorre em gestações com menos de oito semanas. A perda sanguínea e as dores diminuem ou cessam após a expulsão do material ovular. O colo uterino (orifício interno) pode estar aberto e o tamanho uterino mostra-se menor que o esperado para a idade gestacional. No exame de ultrassom, encontra-se cavidade uterina vazia ou com imagens sugestivas de coágulos. 7 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi A conduta nesse caso é de observação, com atenção ao sangramento e/ou à infecção uterina. Quando persiste o sangramento, ou a mulher deseja interromper a perda sanguínea, deve ser realizada aspiração manual intrauterina (AMIU) e, na falta dessa, a curetagem uterina. Abortamento inevitável/incompleto O sangramento é maior que na ameaça de abortamento, que diminui com a saída de coágulos ou de restos ovulares, as dores costumam ser de maior intensidade que na ameaça e o orifício cervical interno encontra-se aberto. O exame de ultrassom confirma a hipótese diagnóstica, embora não seja imprescindível. Em gestações com menos de 12 semanas, pelo tamanho uterino, indica-se a aspiração manual intrauterina (AMIU), por ser mais segura e permitir o esvaziamento mais rápido. Quando não for possível empregar essa técnica, realiza-se a curetagem uterina. Em úteros compatíveis com gestação superior a 12 semanas, emprega-se o misoprostol na dose de 200mcg de 12 em 12 horas, via vaginal, em ciclos de 48 horas de tratamento, com três a cinco dias de intervalo, podendo ser associado à indução com ocitocina. Após a expulsão, estando o útero compatível com gestação com menos de 12 semanas, faz-se a AMIU ou realiza-se a curetagem uterina. Também é importante avaliar a perda sanguínea e, se extremamente necessário, far-se-á transfusão sanguínea. Abortamento retido Em geral, o abortamento retido cursa com regressão dos sintomas e sinais da gestação, o colo uterino encontra-se fechado e não há perda sanguínea. O exame de ultrassom revela ausência de sinais de vitalidade ou a presença de saco gestacional sem embrião (ovo anembrionado). Pode ocorrer o abortamento retido sem os sinais de ameaça. Pode ser tratado utilizando-se o misoprostol ou, quando o tamanho uterino corresponder à gestação com menos de 12 semanas, pode-se empregar a técnica de AMIU. Abortamento infectado Com muita frequência, está associado a manipulações da cavidade uterina pelo uso de técnicas inadequadas e inseguras. Estas infecções são polimicrobianas e provocadas, geralmente, por bactérias da flora vaginal. São casos graves e devem ser tratados, independentemente da vitalidade do feto. As manifestações clínicas mais frequentes são: elevação da temperatura, sangramento genital com odor fétido acompanhado de dores abdominais ou eliminação de pus através do colo uterino. Na manipulação dos órgãos pélvicos, pelo toque vaginal, a mulher pode referir bastante dor, e deve-se sempre pensar na possibilidade de perfuração uterina. Os seguintes exames podem ser necessários para melhor avaliação da mulher, bem como para seu seguimento: hemograma com contagem de plaquetas; urina tipo I; coagulograma; hemocultura; cultura da secreção vaginal e do material endometrial, também para anaeróbios; raios-x do abdome; ultrassonografia pélvica ou de abdome total; e tomografia, principalmente para definir coleções intracavitárias. No tratamento, é fundamental o restabelecimento das condições vitais com soluções parenterais ou com sangue, principalmente se a hemoglobina for inferior a 8g%. Iniciar antibioticoterapia, junto com as medidas de suporte, dando preferência aos quimioterápicos de largo espectro. Pode ser utilizado um anaerobicida (metronidazol 500mg-1g, IV, a cada 6 horas, por 7-10 dias, ou clindamicina 600-900mg, IV, a cada 6-8 horas, por 7-10 dias), associado com um aminoglicosídeo (gentamicina 1,5mg/Kg, dose IV ou IM, a cada 8 horas, por 7-10 dias, ou amicacina 15mg/Kg/dia, IV ou IM, a cada 6-8 horas, por 7-10 dias). O esvaziamento uterino, naqueles úteros com tamanho compatível com gestação de até 12 semanas, deve ser realizado, preferencialmente, por aspiração manual intrauterina (AMIU), por apresentar menores taxas de complicações, reduzida necessidade de dilatação cervical e promover a aspiração do material infectado. Na realização desse procedimento, atentar para o fato de que a perda do vácuo pode significar perfuração uterina prévia. Na impossibilidade do uso da AMIU, pode-se empregar a curetagem uterina; em ambas, o esvaziamento uterino deve ser feito sob infusão de ocitocina. Nos casos mais graves, acompanhados de peritonite e que demoram a dar resposta satisfatória, deve-se proceder a laparotomia exploradora e, se necessário, realizar retirada de órgãos pélvicos. A persistência de febre após os cuidados iniciais pode traduzir abscessos pélvicos ou tromboflebite. Nesse caso, indicasse a utilização da heparina. Abortamento habitual Caracteriza-se pela perda espontânea e consecutiva de três ou mais gestações antes da 22ª semana. É primário quando a mulher jamais conseguiu levar a termo qualquer gestação, e secundário quando houve uma gravidez a 8 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi termo. Estas mulheres devem ser encaminhadas para tratamento especializado, em que seja possível identificar as causas e realizar tratamentos específicos. Abortamento eletivo previsto em lei Nos casos em que exista indicação de interrupção da gestação, obedecida a legislação vigente, por solicitação da mulher ou de seu representante, deve ser oferecida à mulher a opção de escolha da técnica a ser empregada: abortamento farmacológico, procedimentos aspirativos (AMIU ou elétrica) ou dilatação e curetagem. Tal escolha deverá ocorrer depois de adequados esclarecimentos das vantagens e desvantagens de cada método, suas taxas de complicações e efeitos adversos. Para mais informações sobre abortamento eletivo nos casos de violência sexual, consultar a Norma Técnica Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes. Esvaziamento uterino Abortamento farmacológico É a utilização de fármacos para indução do abortamento ou abreviação do abortamento em curso. Toda mulher grávidaque solicita interrupção da gestação e cumpre com as condições estabelecidas pela lei pode optar pela interrupção farmacológica da gravidez, tanto no primeiro, como no segundo semestre da gestação. No Brasil, tem-se disponível o misoprostol e a ocitocina. Abortamento cirúrgico ASPIRAÇÃO MANUAL INTRAUTERINA (AMIU) Procedimento que utiliza cânulas de Karman, com diâmetros variáveis, de 4 a 12mm, acopladas a seringa com vácuo, promovendo a retirada dos restos ovulares por meio da raspagem da cavidade uterina e por aspiração. Pode ser utilizada em gestações com menos de 12 semanas, em função do tamanho uterino, pois há necessidade de o colo uterino ser justo à cânula para que o vácuo seja transferido da seringa para a cavidade uterina. Nos casos de abortamento infectado, a AMIU é a técnica de eleição, embora cuidados redobrados devam ser adotados, pelo risco de perfuração uterina. Nos casos de interrupção da gravidez previstos na legislação vigente do País, com menos de 12 semanas, pode-se empregar essa técnica. A aspiração manual intrauterina (AMIU) é o procedimento de escolha para tratamento do abortamento, sendo recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO). CURETAGEM UTERINA Estando o colo uterino aberto, ou dilatado previamente pelos dilatadores de Denistonn ou velas de Hegar, introduz- se a cureta e promove-se raspagem da cavidade uterina, extraindo-se o material desprendido pelo instrumental. Por ter diâmetro variável e ser de material rígido (aço), pode provocar acidentes, tal como perfuração do útero. Trata-se de procedimento antigo muito difundido no Brasil. Nos casos de o colo uterino estar fechado ou pouco dilatado, pode-se promover sua abertura por meio da dilatação cervical, embora esse procedimento não esteja isento de riscos. Nas gestações superiores a 12 semanas, deve-se promover a indução farmacológica com misoprostol. Então, após a expulsão fetal, faz-se a curetagem uterina. Principais teratógenos Os danos reprodutivos na espécie humana podem ser agrupados em quatro classes principais: (1) morte do concepto; (2) malformações; (3) restrição de crescimento fetal (RCF); e (4) deficiências funcionais, incluindo aqui a deficiência intelectual. Esses danos podem tanto ter causa genética como ambiental e, muitas vezes, uma combinação dessas duas (etiologia multifatorial). Estima-se que cerca de 15% de todas as gestações reconhecidas terminem em aborto e que 3 a 5% de todos os recém-nascidos vivos apresentem algum defeito congênito Álcool Quadro clínico O efeito potencial mais significativo da exposição pré-natal ao álcool ocorre sobre o desenvolvimento do sistema nervoso central (SNC). A síndrome alcoólica fetal (SAF) caracteriza-se por deficiência intelectual, microcefalia, coordenação motora pobre, hipotonia, hiperatividade, dismorfias faciais (entre elas, nariz pequeno e antevertido, micrognatia, fissuras palpebrais pequenas, microftalmia, filtro nasal hipoplásico, lábios superiores finos) e restrição de crescimento fetal e pós-natal. Eventualmente, pode associar-se também a outras patologias em diversos órgãos. Risco O risco de ocorrência da síndrome completa está estabelecido para consumidoras crônicas de álcool (4 ou 9 Gabi Vieira 02/22 MEDFipGbi mais drinques/dia). Entretanto, é importante considerar que a SAF é o polo mais grave do espectro dos efeitos relacionados ao consumo de álcool na gestação e nem sempre a síndrome se apresenta completa, podendo ter como sequela do consumo apenas deficiência intelectual e/ou microcefalia e alterações neurocomportamentais, como déficits em controle de impulsos e hiperatividade. Para esses efeitos menos pronunciados, mas igualmente graves, como é o caso do déficit intelectual, doses inferiores e em períodos do segundo e do terceiro trimestres de gravidez podem ser suficientes.6 Não existe um limiar seguro para o consumo de álcool. Sabe-se que o consumo esporádico durante a gestação pode estar associado ao aumento do risco de anomalias congênitas e que esse risco é diretamente proporcional à dose. Conduta Prospectiva – Não usar álcool durante toda a gravidez. Se a mulher for dependente, encaminhá-la para um centro de tratamento; Retrospectiva – Tranquilizar medos e ansiedades em mulheres que beberam eventualmente ou em quantidades pequenas, aconselhando-as a se absterem de bebidas alcoólicas durante a gestação. Realizar ultrassonografia (US) para controle. Cocaína e crack A cocaína é um potente vasoconstritor utilizado de forma recreativa por inalação ou injeção intravenosa, e o crack é um subproduto da cocaína, podendo ser obtido por meio do aquecimento do cloridrato de cocaína, com adição de bicarbonato de sódio, amônia e água. Ambos apresentam fácil dependência, e o uso na gestação vem aumentando progressivamente nos últimos anos. Diversos desfechos negativos são atribuídos ao uso dessas substâncias durante toda a gestação e podem resultar de mecanismos patogênicos de disrupção vascular, ou seja, anomalias geradas por distúrbios no fluxo sanguíneo normal do embrião-feto, indução de estresse oxidativo e efeitos pró-apoptóticos no SNC. Entre as anomalias associadas, estão atresias intestinais e defeitos de redução de membros. Outros efeitos importantes são descolamento prematuro de placenta (DPP), microcefalia e deficiência mental, além de RCF e alterações neurocomportamentais quando o uso é prolongado ao segundo e ao terceiro trimestres. Risco O risco depende da via de administração e do período de gravidez, estando o maior risco no uso durante o segundo e o terceiro trimestres de gravidez. Existem evidências de que, quando uma mulher usa cocaína por via nasal e apenas “socialmente” e interrompe o uso no primeiro trimestre, não existe risco significativo de dano neurocomportamental. No outro extremo, estão as mulheres que usaram cocaína ou crack durante toda a gestação: o risco de disrupção vascular e DPP são muito maiores, e mais ainda se a droga tiver sido utilizada por via injetável. O uso materno de cocaína nos dois últimos trimestres também aumenta significativamente a chance de prematuridade, de RCF e de complicações neurocomportamentais. Conduta Tranquilizar as mães que usaram a droga por via nasal no primeiro trimestre e desestimular o uso no decorrer da gestação. Em casos de mulheres com uso via injetável e dificuldade de interromper o uso, encaminhá-las para o centro de tratamento especializado. Realizar US para controle.
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