Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
2017 Políticas sociais da saúde e Previdência social Prof.ª Ana Cláudia Moser Prof.ª Joelma Crista Sandri Bonetti Prof.ª Neusa Mendonça Franzmann Copyright © UNIASSELVI 2017 Elaboração: Prof.ª Ana Cláudia Moser Prof.ª Joelma Crista Sandri Bonetti Prof.ª Neusa Mendonça Franzmann Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 344.032 M899pMoser, Ana Cláudia Políticas sociais da saúde e previdência social / Ana Cláudia Moser; Joelma Crista Sandri Bonetti; Neusa Mendonça Franzmann. Indaial : UNIASSELVI, 2017. 206 p. : il. ISBN 978-85-515-0106-1 1.Previdência Social. I. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. III aPresentação Caro acadêmico! Estamos iniciando mais uma disciplina. Neste livro de Políticas Sociais da Saúde e Previdência Social abordaremos a temática de uma maneira mais pedagógica, buscando a correlação com pontos históricos, o que facilitará a identificação dos períodos e da trajetória da Política de Saúde. Outro ponto importante é compreender que a Política da Previdência Social é resultado da política de saúde, é uma ramificação da proteção social da saúde. A Política de saúde é uma política social, pois está voltada para a reprodução dos indivíduos e dos problemas da coletividade, é um direito inerente à condição de cidadania, é uma necessidade básica. A saúde é uma questão de cidadania, pois está atrelada diretamente aos dilemas históricos e conceituais dos sistemas de proteção social: • Modelo de Proteção Social, Residual. • Modelo de Proteção Social de Seguro Social. • Modelo de Proteção Social de Previdência Social. A Política de saúde, em um primeiro período histórico, era considerada como uma competência na área privada, sendo que as ações eram desempenhadas por setores privados totalmente autônomos, isolados e competitivos entre si. Somente tempos depois é que se iniciou a intervenção do estado e o início da dimensão pública com novas ideias voltados à interação e à cooperação entre as partes. Nesse sentido, a cidadania pressupõe um modelo que oferece respostas às transformações socioeconômicas e políticas ocorridas desde o advento da Revolução Industrial, que remete aos ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Esse reconhecimento de cidadania, segundo Giovanella (2014) é parte fundamental do capitalismo à medida que entende que a classe social está fundamentada na desigualdade econômica e a cidadania garante os mesmos direitos e deveres a todos. Para compreender todo esse processo histórico da saúde, estamos propondo caminharmos juntos pelas seguintes unidades: Na primeira unidade será apresentada a correlação da política de saúde com os pressupostos históricos que antecedem a ideia de seguridade social e focaremos na lógica do modelo residual. IV Na segunda unidade vamos expor, de maneira simples e clara, a questão das mudanças ocorridas com os modelos de saúde, referenciando o modelo de seguro social e apresentando o modelo de previdência social. A terceira unidade será baseada no modelo de previdência social e os desafios propostos pelo Sistema Único de Saúde – SUS com a Lei nº 8080/90. Ao final deste livro didático, você será capaz de identificar que o Estado e a cidadania são interfaces da mesma moeda, uma não existe sem a outra. De um lado, o Estado funda seu poder nos indivíduos constituídos como cidadãos e que devem ser tratados conforme a lei, da mesma maneira, ressaltando que são eles que garantem e asseguram a legitimidade do exercício do poder político, pois a democracia e a competição eleitoral igualam e entrelaçam esse arranjo político, pois, mesmo distintos, ambos apresentam interesses no poder político. Prof.ª Ana Cláudia Moser Prof.ª Joelma Crista Sandri Bonetti Prof.ª Neusa Mendonça Franzmann V Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA VI VII UNIDADE 1 – O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL ........................................ 1 TÓPICO 1 – AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL ............................ 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 NOÇÕES SOBRE O CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL ................................................. 3 3 SAÚDE E SEGURIDADE SOCIAL ................................................................................................... 6 4 PREVIDÊNCIA E SEGURIDADE SOCIAL .................................................................................... 9 5 MODELOS DE PROTEÇÃO SOCIAL .............................................................................................. 12 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 15 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 16 TÓPICO 2 – OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL ............................................................. 19 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 19 2 A SAÚDE DO “DESCOBRIMENTO” AO SÉCULO XVIII: PERÍODO COLONIAL, A SAÚDE E AS ARTES DA CURA .................................................................................................... 19 2.1 AS PRIMEIRAS INICIATIVAS DAS ORDENS RELIGIOSAS PARA OS CUIDADOS DE SAÚDE NO BRASIL ................................................................................................................. 21 2.2 DESAFIOS DA SAÚDE NO BRASIL COLÔNIA ........................................................................ 22 3 PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XIX: AS INFLUÊNCIAS DA CHEGADA DA CORTE PORTUGUESA NOS CUIDADOS DE SAÚDE .............................................................. 25 3.1 INDEPENDÊNCIA, EPIDEMIAS E A CRISE SANITÁRIA ...................................................... 26 3.2 A RESPOSTA DO IMPÉRIO ÀS EPIDEMIAS: A REFORMA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE 26 4 SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX: CRISE SANITÁRIA E O RETORNO A CENTRALIZAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE ..............................................................................29 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 34 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 35 TÓPICO 3 – A ERA DA LUTA PELOS DIREITOS ........................................................................... 37 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 37 2 A PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX ....................................................................................... 37 3 O FINAL DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX .................................................................. 50 3.1 GOVERNO PROVISÓRIO – 1930-1934 ......................................................................................... 50 3.2 GOVERNO CONSTITUCIONAL – 1934 – 1937 .......................................................................... 53 3.3 ESTADO NOVO – 1937 – 1945 ....................................................................................................... 54 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 60 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 66 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 67 UNIDADE 2 – O CONTEXTO HISTÓRICO E SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO DE SEGURO SOCIAL ..................... 69 TÓPICO 1 – O CONTEXTO DA SEGURIDADE SOCIAL EM PARALELO À POLÍTICA DE SAÚDE .................................................................................................... 71 sumário VIII 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 71 2 O CONTEXTO HISTÓRICO DA SEGURIDADE SOCIAL ......................................................... 71 2.1 O CONTEXTO HISTÓRICO DA SEGURIDADE SOCIAL NO BRASIL ................................ 72 2.1.1 A década de 1930........................................................................................................................... 76 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 82 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 93 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 94 TÓPICO 2 – O PROCESSO DE SAÚDE NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX .............. 95 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 95 2 DO RESGATE À CONQUISTA EFETIVA ...................................................................................... 96 3 NOVA CONSTITUIÇÃO FEDERAL EM 1946 ................................................................................ 97 4 DO SANITARISMO À MUNICIPALIZAÇÃO ............................................................................... 98 5 A NECESSIDADE DA CRIAÇÃO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE ........................................... 100 6 A DISSEMINAÇÃO DA MALÁRIA E AS AÇÕES GOVERNAMENTAIS ............................. 102 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 106 7 OUTRAS DOENÇAS .......................................................................................................................... 113 8 OUTRAS CONSIDERAÇÕES ............................................................................................................ 114 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 115 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 116 TÓPICO 3 – DO REGIME MILITAR AOS DIREITOS SOCIAIS .................................................. 117 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 117 2 O CONTEXTO DA SAÚDE DURANTE O REGIME MILITAR ................................................ 117 3 RECONHENDO AS AÇÕES DE SAÚDE NA DÉCADA DE 70 .................................................. 119 4 O PODER DA MOBILIZAÇÃO POPULAR .................................................................................... 125 5 A VACINA E SEU PROCESSO HISTÓRICO ................................................................................ 127 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 131 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 133 UNIDADE 3 – A TRAJETÓRIA E OS DESAFIOS DO MODELO DE SAÚDE E PREVIDÊNCIA .......................................................................................................... 135 TÓPCIO 1 – COMPREENDENDO O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS.............................. 137 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 137 2 A POLÍTICA DE SAÚDE BRASILEIRA E A ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) ....................................................................................... 138 3 RELEMBRANDO A CONSTRUÇÃO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE ....................................... 139 3.1 CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O ACESSO UNIVERSAL À SAÚDE .......................................... 142 3.2 NEOLIBERALISMO E AS MUDANÇAS DE RUMO DA POLÍTICA DE SAÚDE ................ 144 4 O MODELO DE SAÚDE PÚBLICA BRASILEIRA ........................................................................ 148 5 ORGANIZAÇÃO DO SUS: PRINCÍPIOS E DIRETRIZES .......................................................... 149 6 INSTÂNCIAS DE DECISÃO DO SUS: CARACTERÍSTICAS INSTITUCIONAIS ............... 156 7 AMPLIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE: CONFERÊNCIAS E CONSELHOS DE SAÚDE ............................................................................................................... 162 8 A DESCENTRALIZAÇÃO NO ÂMBITO DO SUS ....................................................................... 164 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 169 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 170 TÓPICO 2 – O SISTEMA PREVIDENCIÁRIO .................................................................................. 173 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 173 2 RELEMBRANDO A CONSTRUÇÃO DA NOÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL ................. 173 IX 3 O SISTEMA PREVIDENCIÁRIO NO BRASIL ............................................................................177 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................185 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................186 TÓPICO 3 – OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS NA POLÍTICADE SAÚDE E PREVIDÊNCIA ............................................................................................................189 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................189 2 DESAFIOS DA SEGURIDADE SOCIAL .......................................................................................189 3 ANÁLISE DO MODELO SAÚDE PÚBLICA: AVANÇOS E DESAFIOS ................................192 4 A PREVIDÊNCIA NO CONTEXTO DO NEOLIBERALISMO .................................................194 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................195 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................200 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................201 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................203 X 1 UNIDADE 1 O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade, você será capaz de: • identificar o processo de saúde nos primórdios. • compreender o início do processo e a conquista dos direitos sociais na saúde. • reconhecer a saúde como um direito socialmente conquistado pela coleti- vidade. Esta unidade está organizada em três tópicos. Em cada um deles você encontrará diversas atividades que o ajudarão na compreensão das informações apresentadas. TÓPICO 1 – AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL TÓPICO 2 – OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL TÓPICO 3 – A ERA DA LUTA DOS DIREITOS 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL 1 INTRODUÇÃO Prezado acadêmico! As discussões no campo das políticas públicas fazem parte do cotidiano de trabalho e estudos do Assistente Social, bem como pode ser observado o protagonismo dos profissionais da área nas lutas pela garantia do acesso aos direitos sociais, com ênfase para os direitos inerentes a Seguridade Social (MAURIEL, 2010). Partindo desse pressuposto você será convidado a acompanhar o resgate de discussões fundamentais para a compreensão das Políticas Sociais de Saúde e Previdência e que dão conta do universo das noções de seguridade social, saúde e previdência social. 2 NOÇÕES SOBRE O CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL No universo que compreende as reflexões acerca das noções de Seguridade Social é fundamental destacar o impacto das contradições do sistema capitalista sobre as políticas sociais configurando o desenrolar da história brasileira que acaba por excluir de parte da população o acesso aos direitos sociais e à proteção social. Tendo esse cenário como pano de fundo a Seguridade Social figurou como caminho ideal para o combate à pobreza e, ao mesmo tempo, observou-se o chamado desmonte da Seguridade Social (MAURIEL, 2010). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 4 QUADRO 1 – QUADRO COMPARATIVO ENTRE AS PERSPECTIVAS DA ASSISTÊNCIA SOCIAL FONTE: Brasil (2016) Para que possamos qualificar a atuação do assistente social nas mais diversas situações que envolvem desde a luta pela garantia do acesso aos direitos sociais até a intervenção prática no cotidiano de trabalho nas áreas da saúde e previdência, se faz necessário resgatar conceitos que nos permitam compreender as dimensões da seguridade social, assim como os elementos dos serviços e políticas de saúde e previdência no Brasil. ASSISTENCIALISTA DIREITO SOCIOASSISTEN-CIAL Concebida como aju- da, benesse e favor. Concebida como DIREITO SO- CIAL. Sujeito de ajuda. Sujeito de direitos. Ênfase na ajuda huma- nitária aos mais pobres e necessitados. Ênfase ao atendimento às necessi- dades sociais da população. Responsabilidade da igreja e de “pessoas de bem”. Responsabilidade estatal (gestão e financiamento), com participação da sociedade civil (controle social). Incentivo à criação de instituições de carida- de públicas e privadas. Incentivo à criação de equipamen- tos estatais (Cras e Creas) e ao fortalecimento da rede socioassis- tencial. Ênfase em ações de natureza filantrópi- ca, com apoio estatal por meio de isenções fiscais. Ênfase em ações de natureza pública (estatal e não estatal), com financiamento público (por Esta- dos, Distrito Federal e Munícipios) e comando único em cada esfera de governo. Ações planejadas e coordenadas pelas primeiras-damas. Responsabilidade do Estado, em cada esfera de governo, pela formulação das políticas e pelo controle das ações. Decisões em gabinete. Incentivo a criação e ao fortaleci- mento de espaços de participação e de deliberação (conselhos, confe- rências e fóruns). Práticas clientelistas. Práticas que visam à autonomia dos sujeitos. Incentivo ao trabalho voluntário. Garantia de profissionais quali- ficados para materialização dos serviços e sua qualidade. TÓPICO 1 | AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL 5 A noção de seguridade social remete à articulação de políticas públicas e estratégias de ação buscando a superarão de situações de risco e vulnerabilidade social. Em termos gerais, a Seguridade Social pode ser definida como o conjunto de políticas e ações articuladas com o objetivo de amparar o indivíduo e/ou seu grupo familiar ante os eventos decorrentes de morte, doença, invalidez, idade, desemprego e incapacidade econômica em geral. Como não poderia deixar de ser, o caráter genérico da definição comporta um sem-número de variantes no campo prático, dependendo de fatores políticos, econômico-sociais, históricos e culturais que influenciaram a evolução de cada sistema em particular (OLIVEIRA, 1992, p. 3). É importante ressaltar, mesmo diante da diversidade do conceito apresentada acima, a seguridade social contempla três campos: Previdência social, Saúde e Assistência social. FONTE: Brasil (2016) FIGURA 1 – GUARDA-CHUVA DA SEGURIDADE SOCIAL "A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social" (Brasil, 198, art. 194) "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (Brasil, 1988, art. 196). "A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva , que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas" (LOAS/1993, art. 1°). A CF/1988 no art. 201 destaca: "A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II - proteção à maternidade, especialmente à gestante; III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; V - pensão por morte do segurado , homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes". UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 6 FIGURA 2 – DIVERSOS ELEMENTOS QUE COMPÕEM A NOÇÃO DE SAÚDE FONTE: Disponível em: <https://blog.gerardotrindade.com. br/2017/04/05/0704-dia-mundial-da-saude/>.Acesso em: 4 maio 2017. Como consequência desse movimento para um entendimento amplo e diverso da noção de saúde foi determinado o campo da saúde: • a biologia humana, que compreende a herança genética e os processos biológicos inerentes à vida, incluindo os fatores de envelhecimento; • o meio ambiente, que inclui o solo, a água, o ar, a moradia, o local de trabalho; • o estilo de vida, do qual resultam decisões que afetam a saúde: fumar ou deixar de fumar, beber ou não, praticar ou não exercícios; • a organização da assistência à saúde. A assistência média, os serviços ambulatoriais e hospitalares e os medicamentos são as primeiras coisas em que muitas pessoas pensam quando se fala de saúde. 3 SAÚDE E SEGURIDADE SOCIAL Assim como a noção de seguridade social, o conceito de saúde é também amplo e controverso. Ao longo da história é possível identificar uma diversidade significativa de concepções para saúde que variam no tempo e no espaço e representam culturas e visões de mundo diferentes. A tentativa de criar uma concepção de saúde universalmente utilizada se inicia após o fim da Primeira Guerra Mundial, porém só obtém sucesso após o fim da Segunda Guerra Mundial. A determinação das noções de saúde visava contemplar o sistema de bem-estar social implantado nas políticas públicas de países europeus nesse período. Visando unificar esse entendimento a Organização Mundial da Saúde (OMS), desdobramento da Organização Mundial da Saúde (ONU), passa a reconhecer o direito à saúde e a obrigatoriedade por parte do Estado na promoção e proteção à saúde. E saúde passa a ser conceituada como “o estado mais amplo de bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência da enfermidade” (SCLIAR, 2007, p. 37). Buscando assim um entendimento de saúde como “o direito a uma vida plena, sem privações” (SCLIAR, 2007, p. 37). TÓPICO 1 | AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL 7 No entanto, esse é apenas um componente do campo da saúde, e não necessariamente o mais importante. Às vezes, é mais benéfico para a saúde ter água potável e alimentos saudáveis do que dispor de medicamentos. É melhor evitar o fumo do que submeter-se a radiografias do pulmão todos os anos. É claro que essas coisas não são excludentes, mas a escassez de recursos na área de saúde obriga, muitas vezes, a selecionar prioridades (SCLIAR, 2007, p. 37). O conceito de saúde remete às relações amplas e que vão além da dicotomia doente/saudável. Por saúde entende-se além dos fatores biológicos que levam à doença, pois compreende-se nesse universo questões como o meio ambiente que influencia a qualidade de vida, o estilo de vida escolhido pelo indivíduo ou condicionado a ele e também à assistência à saúde. Vemos aqui a relevância da compreensão ampla da saúde e de suas correlações com outros elementos da proteção social e da necessidade de criar conexões com outras políticas públicas. A amplitude da noção de saúde recebeu críticas de natureza técnica, pois seria algo inatingível e não poderia ter uso nos serviços de saúde, e de natureza política, pois essa concepção abriria espaço para o excesso de intervenção do Estado na vida do cidadão. Contudo, quando se aguarda uma posição no sentido de restringir o conceito por parte da OMS, a situação foi inversa. Na ocasião da Conferência Internacional de Assistência Primária à Saúde em 1978, a OMS deu atenção a temáticas abrangentes: A Conferência enfatizou as enormes desigualdades na situação da saúde entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos; destacou a responsabilidade governamental na provisão da saúde e a importância da participação de pessoas e comunidades no planejamento e implementação dos cuidados à saúde. Trata-se de uma estratégia que se baseia nos seguintes pontos: 1) as ações de saúde devem ser práticas, exequíveis e socialmente aceitáveis; 2) devem estar ao alcance de todos, pessoas e famílias - portanto disponíveis em locais acessíveis à comunidade; 3) a comunidade deve participar ativamente na implantação e na atuação do sistema de saúde; 4) o custo dos serviços deve ser compatível com a situação econômica da região e do país. Estruturados dessa forma, os serviços que prestam os cuidados primários de saúde representam a porta de entrada para o sistema de saúde, do qual são, verdadeiramente, a base (SCLIAR, 2007, p. 38). Como compreender a saúde apenas como a ausência da doença? O posicionamento da OMS permitiu a disseminação e a defesa de um ideal amplo de saúde que compreende elementos variados da vida do indivíduo e, especialmente, o acesso universal – independente das condições econômicas-sociais – a condições de vida dignas e ao atendimento através dos serviços de saúde. Destacamos aqui outro aspecto reafirmado pela conferência: a necessidade de um sistema nacional de saúde integrado ao processo de desenvolvimento social e econômico de cada nação. Afinal, a saúde é causa e consequência do processo de desenvolvimento econômico e social: UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 8 Os cuidados primários de saúde, adaptados às condições econômicas. socioculturais e políticas de uma região deveriam incluir pelo menos: educação em saúde, nutrição adequada, saneamento básico, cuidados materno-infantis, planejamento familiar, imunizações, prevenção e controle de doenças endêmicas e de outros frequentes agravos à saúde, provisão de medicamentos essenciais. Deveria haver uma integração entre o setor de saúde e os demais, como agricultura e indústria (SCLIAR, 2007, p. 39). A saúde passa a ser compreendida como fenômeno abrangente, pois envolve diversos aspectos da vida do indivíduo e de seu contexto econômico e social. Além disso, reforça-se o papel do Estado diante da necessidade de superar as desigualdades no acesso às condições mínimas de saúde. A Constituição Federal de 1988 foi um marco para a conceituação do direito à saúde no Brasil. O texto elevou à saúde ao patamar de direito subjetivo público, o que significa que o sujeito é detentor do direito e o Estado, por sua vez, é obrigado a garantir o acesso a esse direito. Vale lembrar que o sujeito também possui responsabilidade sobre sua saúde, no sentido de preservar a saúde individual e coletiva. Nos dias de hoje fica a cargo do Estado a responsabilidade de garantir ao cidadão e a coletividade o acesso à saúde (SANTOS, 2010). Nesse sentido, o conceito de saúde leva em consideração seus determinantes e condicionantes. Deve-se atentar para as condições de alimentação, moradia, saneamento, meio ambiente, renda, trabalho, educação, transporte, entre outros. Em outras palavras entende-se que a saúde e o acesso aos serviços públicos de saúde devem compreender as dinâmicas que envolvem o bem-estar individual e coletivo, bem como os fatores que influenciam ou determinam o adoecimento de indivíduos ou grupos sociais. A noção de saúde não é restrita a estar saudável ou adoecer, essa noção está estreitamente relacionada a todos os aspectos da vida do indivíduo (SANTOS, 2010). Compreender essas relações é fundamental para pensar o sistema de saúde, pois mesmo diante da igualdade do caráter preventivo e curativo ainda existem desafios sociais para considerarmos (SANTOS, 2010). Basta um olhar mais atento para percebermos que as pessoas que sofrem com maior intensidade a doença e seus agravantes são aquelas que se encontram em situação de vulnerabilidade social. Essa realidade permanece mesmo quando o serviço de saúde é capaz de atender as suas demandas de saúde, porque o sistema não consegue transformar sua situação de vulnerabilidade. Cabe aqui destacar a fala de Santos (2010) ao colocar em evidência a necessidade de compreender e superar as desigualdades sociais Daí se pode afirmar que, sem a noção das desigualdades sociais, a erradicação da pobreza e a melhoria do modo de vida, o setor de saúde será o estuário de todas as mazelas das más políticas sociais e econômicas.E, sem essa garantia de mudança dos fatores condicionantes e determinantes, não se garantirá o direito à saúde em sua abrangência constitucional (SANTOS, 2010). TÓPICO 1 | AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL 9 4 PREVIDÊNCIA E SEGURIDADE SOCIAL As políticas sociais surgem num contexto de expansão do modelo liberal. Nesse modelo, o objetivo é reduzir a intervenção do Estado na vida das pessoas, inclusive no que diz respeito à questão social, pois a crença está na capacidade do mercado se autorregular e dar conta dos problemas sociais. Porém, a experiência histórica mostrou a incapacidade do mercado de superar as desigualdades históricas constituídas ao longo da história, assim como de resolver os problemas que a própria expansão do capitalismo liberal gerava. Tal fato exigiu a intervenção do Estado para atender aos grupos que, por algum motivo, se encontravam excluídos socialmente. Essa intervenção se deu pela forma da proteção social descrita no início desse tópico (TEIXEIRA, 1985). As ações governamentais desse período ficaram conhecidas como assistência social: As políticas sociais que tiveram origem neste contexto são conhecidas sob a designação de Assistência Social e incluíam o reconhecimento de uma necessidade, e alguma proposta de aliviá-la. Caracterizam-se por assumir que esta situação de necessidade decorre de um problema de caráter do necessitado, razão pela qual a assistência é provida em condições que tentam parcialmente compensar falhas passadas e prevenir contra falhas futuras. O Seguro Social tem como característica destinar-se a cobertura da população assalariada com a qual se estabelece uma relação jurídica do tipo contratual: os benefícios são em regra, proporcionais à contribuição efetuada, não guardando relação imediata com as necessidades do beneficiário. A participação tende a ser compulsória e, embora restrita a uma parcela da população, é uma relação de direito social estabelecida com base em um contrato. Trata-se, neste caso, da cidadania regulada pela condição de exercício de uma ocupação oficialmente reconhecida, o que lhe garante a assinatura da carteira de trabalho (TEIXEIRA, 1985, p. 401-402). Prezado acadêmico! Fica evidente um paradoxo na relação entre saúde e seguridade ao passo que vislumbramos dois cenários controversos. De um lado, o direito à saúde é reconhecido internacionalmente e, em nosso país, é reconhecido como direito do cidadão e dever do Estado. De outro nos deparamos com os contornos da questão social e seus desafios para a superação das desigualdades sociais. Mais uma vez em sua formação evidencia-se a relevância do protagonismo do profissional do serviço social na luta pelo acesso e garantia dos direitos sociais, assim como na atuação em campo na área de políticas públicas visando a qualificação da oferta de serviços e atendimentos a população. UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 10 Podemos sinalizar pontos positivos e desafios em relação ao seguro social, por um lado se trata de uma política que traz questões como a equidade, justiça social e redistribuição de renda para seus beneficiários e, por outro lado, não é capaz de cessar a desigualdade do sistema produtivo na medida em que exclui de sua proteção aqueles que se encontram à margem do mercado de trabalho formal, seja ele rural ou urbano (TEIXEIRA, 1985). Destacamos ainda a necessidade de compreensão da Previdência Social como parte dos direitos fundamentais sociais. Na Constituição Federal de 1988, a previdência social está incluída no artigo 6º juntamente com os direitos à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à proteção à maternidade e à infância e à assistência aos desamparados. Bem como sinaliza sua inclusão no sistema de seguridade social (NOLASCO, 2012). Cabe lembrar que a diferença entre a política de assistência social, a política de saúde e a previdência social está na forma de financiamento. Enquanto as políticas de assistência e saúde são políticas não contributivas, a previdência é uma política contributiva. Na descrição da sequência histórica a seguir elaborada por Nolasco (2012) podemos observar a evolução histórica da previdência social no Brasil: • Constituição de 1824: remete a esse documento o entendimento da garantia dos direitos aos conhecidos como “socorros públicos”. Apesar da garantia à previdência fazer parte da Constituição, na prática as pessoas não tinham acesso a esse direito e também não tinham condições de cobrar o cumprimento da lei. Mesmo diante da falta de efetividade podemos considerar um avanço o reconhecimento legal da necessidade e relevância da previdência. • Constituição de 1891: esse texto contempla dois dispositivos relativos à previdência: a prestação de socorro aos estados em calamidade pública e a aposentadoria por invalidez dos funcionários públicos. Vale ressaltar que essas aposentadorias não exigiam contribuição. Contudo, seguia-se sem a efetivação das atribuições previstas em lei. • Constituição de 1934: passa a ser previsto o sistema tripartite que conhecemos hoje. A partir desse momento, a Constituição previa que o trabalhador, o empregador e o Estado deveriam contribuir no financiamento da Previdência. Característica considerada um progresso no que se refere à Previdência. • Constituição de 1937: instituiu seguros para acidentes de trabalho: seguro de vida, invalidez e velhice. Salvo esses seguros, pode-se afirmar que não houve outras inovações nesse texto no que diz respeito ao seguro social, como era chamada a Previdência Social nesse contexto. No entanto, o período foi marcado por ações do plano infraconstitucional como, por exemplo, a criação do Departamento Nacional de Previdência Social pouco antes de promulgação da Constituição de 1946. • Constituição de 1946: não houve mudanças em relação ao texto presente na Constituição de 1937. Entretanto, nesse contexto o termo seguro social cai em desuso e, em termos constitucionais, é substituído por Previdência Social. No TÓPICO 1 | AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL 11 plano infraconstitucional destaca-se a edição da Lei Orgânica da Previdência Social (Lei nº 3.807/1960) que institui avanços como o auxílio-reclusão, o auxílio- natalidade e o auxílio-funeral. • Constituição de 1967: a instituição do seguro desemprego e do salário família foram as inovações significativas dessa Constituição. No plano infraconstitucional destacam-se o seguro de acidentes de trabalho, a inclusão do trabalhador rural na previdência, a criação do Programa de Integração Social (PIS), a criação do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP), a criação do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRÓ-RURAL), inclusão dos empregados domésticos, criação do Ministério da Previdência e Assistência Social, criação do Processamento de Dados da Previdência Social (DATAPREV), a Consolidação das Leis da Previdência Social, criação do Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SINPAS) e a nova Consolidação das Leis da Previdência Social. • Constituição de 1988: o retorno do Estado democrático de direito marca a discussão a respeito da eficácia dos direitos fundamentais de segunda dimensão, incluindo o direito à Previdência. Esses direitos passam a ser garantidos mesmo diante de emendas constitucionais, porém a nossa de universalidade de cobertura e atendimento os coloca numa posição distante do que, de fato, é alcançado pela realidade. Enquanto o sistema de Saúde e Assistência é garantido a todos por não ser contributivo, a exigência de contribuição por parte da Previdência torna ainda mais distante a universalidade do atendimento. UNI Evolução Histórica da Previdência Social no mundo 4.1 Inglaterra O primeiro documento legislativo de grande importância na Inglaterra, no que diz respeito à Previdência Social, foi o “Poor Relief Act”, de 1601, o qual regulamentoua instituição de auxílios e socorros públicos aos necessitados. Tal documento criou uma contribuição obrigatória arrecada da sociedade pelo Estado. Outro documento também de grande importância para a história da Previdência Social inglesa foi o “Workmen’s Compensation Act”, de 1897, que criou o seguro obrigatório contra acidentes de trabalho. Tal documento criou, para o empregador, uma responsabilidade civil de cunho objetiva, ou seja, independente de culpa. Ademais, em 1908 adveio o “Old Age Pensions Act”, o qual teve o condão de conceder pensões aos maiores de 70 anos, independente de custeio. Por fim, cabe mencionar o “National Insurance Act”, de 1911, o qual criou um sistema compulsório de contribuições sociais, as quais ficavam a cargo do empregador, do empregado e do Estado. 4.2 México Foi a Constituição mexicana de 1917, considerada como a primeira Constituição social do mundo, que incluiu em seu texto, de maneira até então pioneira, a Previdência Social propriamente dita não se devendo deixar de salientar, entretanto, o caráter programático de todas as normas que previam direitos sociais (o que incluem as normas relativas à Previdência Social). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 12 Normas programáticas, como se sabe, são aquelas que estabelecem diretrizes para o Estado sem, contudo, imprimir caráter imperativo. Contudo, não há que se negar a importância de se elevar ao status constitucional normas de direitos sociais. 4.3 Alemanha Foi na Alemanha que teve origem o primeiro ordenamento legal que tratou sobre a Previdência Social. Tal ordenamento foi editado pelo então chanceler Otto von Bismarck em 1883, tendo, inicialmente, instituído o seguro-doença e, em um momento posterior, incluído outros benefícios, tais como o seguro contra acidente de trabalho, em 1884, e o seguro- invalidez e o seguro velhice, ambos em 1889. O objetivo dos chamados seguros sociais de Bismarck foi o de, precipuamente, impedir movimentos socialistas fortalecidos com a crise industrial, atenuando a tensão existente nas classes de trabalhadores, criando para o segurado um direito subjetivo público ao seguro social. Conforme já mencionado, o primeiro seguro social instituiu o seguro-doença, o qual era custeado por contribuições dos empregados, dos empregadores e do Estado. Logo após, foi instituído o seguro contra acidentes de trabalho, o qual era custeado pelos empresários. Por fim, foi instituído o seguro contra invalidez e velhice, o qual, assim como no seguro doença, era custeado pelos empregados, pelos empregadores e pelo Estado. Ademais, importante salientar que os seguros sociais tornaram obrigatória a filiação às sociedades seguradoras ou entidades de socorros mútuos dos trabalhadores que recebessem até dois mil marcos por ano. Após a fase dos seguros sociais, em 1935, com o advento da Constituição de Weimar, foi determinado que o Estado, caso não pudesse proporcionar aos cidadãos alemães oportunidades de trabalho produtivo, seria responsável por lhes garantir a subsistência. 4.4 Estados Unidos Um dos marcos mais importantes da evolução da Previdência Social nos Estados Unidos se deu com o “New Deal”, plano do governo Roosevelt pautado na doutrina do “Welfare State” (Estado do bem-estar social). Tal marco foi o “Social Security Act”, de 14 de agosto de 1935, o qual tinha com o escopo diminuir de maneira considerável os problemas sociais acarretados pela crise econômica de 1929. O referido documento, além de estimular o consumo, previa também o auxílio aos idosos, além de ter instituído o auxílio-desemprego para os trabalhadores que, temporariamente, ficassem desempregados. FONTE: NOLASCO, Lincoln. Evolução histórica da previdência social no Brasil e no mundo. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, nº 98, mar 2012. Disponível em: <http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11335&revista_caderno=20>. Acesso em: 5 maio 2017. 5 MODELOS DE PROTEÇÃO SOCIAL Na sociedade capitalista, o sistema de proteção social ou seguridade social, foi construído como exigência histórica e é resultante da relação capital x trabalho, em que se destaca a concentração de renda e profunda desigualdade social. Num primeiro momento denominado de Modelo Residual, nenhum trabalhador ou dependente tinha qualquer cobertura de saúde. Essa construção mostra a intrínseca relação entre a política econômica e a correlação de forças existentes em cada momento histórico. TÓPICO 1 | AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE SEGURIDADE SOCIAL 13 O significado da política social não pode ser apanhado nem exclusivamente pela sua inserção objetiva no mundo do capital, nem apenas pela luta de interesses de sujeitos que se movem na definição de tal ou qual política, mas historicamente, na relação desses processos na totalidade (BEHRING, 2003 p. 56). Nessa mesma linha, Mota (1995) nos esclarece que a seguridade social está relacionada com a reprodução da força de trabalho e com os processos de exclusão e precarização do trabalho. A origem do seguro social foi um modelo que atendia apenas à necessidade dos trabalhadores vinculados, (que tinham uma contribuição prévia) seguiam uma legislação que obrigava os patrões a “protegerem” os trabalhadores em casos de acidentes trabalhistas e manter a renda em situação de risco. Somente após a Constituição de 1988 é que surge o modelo de Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência Social (Art. 194) aos cidadãos independentes de sua vinculação ou pagamento. Esse seguro previa a proteção às vulnerabilidades relacionadas ao trabalho, como doenças, acidentes, morte, idade avançada, maternidade e desemprego, envolvendo trabalhadores e dependentes. Seguridade social, na visão de Mota (1995), é um processo histórico, com base nos seguintes objetivos (Art. 194, I a VII): universalidade de cobertura e do atendimento; uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; irredutibilidade do valor real dos benefícios; seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; equidade na forma de participação no custeio; caráter democrático e descentralizado da administração mediante gestão quadripartite e a diversidade da base de financiamento. Com a Constituição de 1988, pode-se destacar alguns avanços significativos, porém a concretização dos direitos constitucionais ainda é fragilizada, pois seus objetivos mesmo bem delimitados estão sendo parcialmente atendidos. Para entender melhor a diferença dos três modelos de Proteção Social na Saúde, analise o quadro a seguir: UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 14 Esse quadro nos mostra claramente a diferença dos três modelos: o primeiro residual, ou alguns autores chamam de Assistência Social, refere-se à negativa de proteção. O segundo referia-se ao Seguro Social só tinha cobertura o trabalhador no exercício de suas funções com prévia contribuição. E o terceiro o modelo de Seguridade Social que prevê a proteção à saúde sem prévia contribuição e estende a todos os cidadãos brasileiros. QUADRO 2 – TRÊS MODELOS DE PROTEÇÃO SOCIAL NA SAÚDE FONTE: Fleury (1994) Traços / Modalidade Assistência Seguro Seguridade Denominações Ideologia Princípio Efeito Status Finanças Atuarial Cobertura Benefício Acesso Administração Organização Referência Cidadania "Residual" Liberal Caridade Discriminação Desqualificação Doações Fundos Focalização Bens e Serviços Prova de meios Filantrópica Local "Leis dos Pobres" Invertida "Meritocrático" Corporativa Solidariedade Manutenção Privilégio % Salário Acumulação Ocupacional Proporção do Salário Filiação Corporativa Fragmentada Bismark Regulada "Institucional" Social- Democrata Justiça RedistribuiçãoDireito Orçamento Repartição Universal Mínimo vital Necessidade Pública Central Beveridge Universal 15 Neste tópico vimos que: • A seguridade social se refere às formas de articular políticas públicas e estratégias que visam a superação das situações de risco e vulnerabilidade social. • A seguridade social compreende as políticas de Previdência social, Saúde e Assistência social. • O direito à saúde é reconhecido pela OMS e pela ONU como dever do Estado no sentido de promoção e proteção à saúde. • A noção de saúde compreende, além dos fatores biológicos, questões como o meio ambiente, o estilo de vida e o acesso à assistência de saúde. • O grande desafio das políticas sociais em nosso país diz respeito à necessidade de superar a visão assistencialista e compreender o cidadão como sujeito de direitos, ou seja, atuar na perspectiva socioassistencial. • As políticas de Saúde e Previdência passaram por três modelos ao longo do seu processo de consolidação institucional: o modelo residual – ou de Assistência social; o modelo de Seguro social; e o modelo de Seguridade social. RESUMO DO TÓPICO 1 16 1 As políticas de Saúde e Previdência conformaram diferentes modelos ao longo do seu desenvolvimento e consolidação institucional influenciadas pelas dinâmicas políticas, econômicas e sociais vigentes. Podemos dividir esse processo em três modelos: residual, seguro social e seguridade social. Considerando esses modelos associe os itens a seguir: I - Residual. II - Seguro Social. III - Seguridade Social. ( ) Modelo ligado à noção de caridade. ( ) Modelo ligado à noção de sujeito de direito. ( ) Modelo ligado à filantropia. ( ) Modelo ligado ao registro de trabalho formal. Agora assinale a alternativa representa a sequência correta: a) I – III – I – II. b) I – I – III – II. c) II – I – II – III. d) III – II – I – II. 2 Ao tratarmos a questão da política de previdência o modelo de Seguro Social nos mostra dois cenários opostos, pois de um lado representa avanços em direção à conquista de direitos, mas por outro exclui parte da população do acesso à saúde e previdência social. Sobre esse modelo assinale a alternativa correta: a) Os avanços se concentraram na justiça social e na redistribuição de renda e os desafios na desigualdade do sistema produtivo. b) Os desafios eram decorrentes da ampla adesão aos ideais do liberalismo e da mínima intervenção estatal na economia. c) Os avanços se deram através do desenvolvimento da caridade e filantropia e a superação das desigualdades sociais. d) Os avanços estavam ligados à sindicalização e os desafios ao fracasso das campanhas de vacinação da população. 3 A Previdência social sofreu grandes transformações ao longo da história de nosso país que podem ser observados na forma como esse elemento da seguridade social é tratado nas Constituições Federais. Considerando esse processo assinale com V para as afirmações verdadeiras e com F para as falsas: AUTOATIVIDADE 17 ( ) Os direitos entendidos como “socorros públicos” são característicos da Constituição de 1988. ( ) A prestação de socorro em calamidades públicas e a aposentadoria por invalidez são previstos no texto de 1967. ( ) O sistema tripartite como conhecemos hoje foi previsto na Constituição de 1934. ( ) A partir da década de 40 o termo seguro social cai em desuso, substituído por Previdência Social. Agora assinale a alternativa que apresenta a sequência correta: a) F – V – F – V. b) V – V – F – F. c) F – F – V – F. d) V – F – V – V. 18 19 TÓPICO 2 OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO A colonização portuguesa do território brasileiro teve grande impacto sobre a formação da sociedade brasileira da forma como conhecemos hoje. Desde a chegada dos primeiros grupos colonizadores é possível perceber o caráter explorador do modelo de colonização adotado pela Coroa portuguesa em relação aos povos e ao território que hoje entendemos como brasileiro. Esse processo possui desdobramentos que são fundamentais para a compreensão do modelo de seguridade existente atualmente em nossa sociedade. Por este motivo, prezado acadêmico, propomos aqui um retorno na história para compreendermos como as noções saúde e seguridade foram se transformando e se consolidando ao logo do tempo. Caracterizamos os primórdios da saúde no Brasil como o período entre o “descobrimento” ou o início da colonização portuguesa, passando pelo período Colonial, os desdobramentos da vinda da Corte portuguesa, o período da Independência, o Brasil Império chegando até meados do século XIX nas primeiras décadas da República. Destacam-se algumas características da saúde nesse contexto histórico e social, como as formas alternativas de oferecer cuidados à saúde, chamadas de artes da cura, e destinadas à população mais pobre; as iniciativas assistencialistas de cuidados médicos, especialmente as Santas Casas e as primeiras iniciativas governamentais na tentativa de superar os desafios que as epidemias representavam para a saúde pública. 2 A SAÚDE DO “DESCOBRIMENTO” AO SÉCULO XVIII: PERÍODO COLONIAL, A SAÚDE E AS ARTES DA CURA Os relatos históricos da chegada dos portugueses no território brasileiro possuem marcantes características idealizadoras com menções à beleza das paisagens, diversidade alimentar, águas limpas, clima ameno e um povo saudável. Contudo, o encantamento com o paraíso tropical brasileiro foi logo substituído por uma visão de inferno onde poucas eram as chances de sobrevivência para colonizadores e escravos (BERTOLLI FILHO, 2011). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 20 Ao longo do período colonial as questões relacionadas à saúde não estavam restritas aos cuidados médicos. O acesso à medicina era de exclusividade dos setores dominantes da sociedade. Nesse longo período, a medicina erudita era exercida por um pequeno grupo de médicos, cirurgiões e boticários, de formação europeia. Membros da elite, estes agentes da medicina oficial se radicavam somente nas maiores cidades, voltando-se para o atendimento das camadas mais altas da população (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 279). Observamos na descrição acima as características da saúde para as camadas privilegiadas da sociedade: a medicina era exercida por um grupo pequeno de médicos, cirurgiões ou boticários de classe alta formados na Europa, concentrados geograficamente nas maiores cidades do país e com atendimento voltado para a elite. FIGURA 3 – OBRA DE JEAN BAPTISTE DEBRET INTITULADA BOTICA FONTE: Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/ pessoa18749/debret>. Acesso em: 11 mar. 2017. De outro lado, a relação das camadas populares com a saúde possuía outras características: […] a prática da medicina estava distante dos mais pobres e, principalmente, dos escravos, que se utilizavam da solidariedade comunal, de curandeiros diversos e dos cuidados oferecidos por ordens religiosas, como os existentes nos hospitais da Santa Casa da Misericórdia que, desde o início do período colonial, foram fundados em algumas regiões mais populosas do país (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 279). Os contatos com os cuidados médicos nos padrões da medicina tradicional constituíam uma realidade fora do alcance para os mais pobres e, ainda mais distante, para os escravos. No contexto social da época era considerado mais produtivo substituir um escravo doente a oferecer o tratamento médico necessário. TÓPICO 2 | OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL 21 Outra situação comum era o uso dos escravos para testes com tratamentos médicos. FIGURA 4 – OBRA DE JEAN BAPTISTE DEBRET INTITULADA O CIRURGIÃO NEGRO FONTE: Disponível em: <http://cruzandomundo.com.br/dicas/atividades/ o-rio-de-janeiro-de-debret-no-centro-cultural-dos-correios/>. Acesso em: 11 mar. 2017. O contexto social do Brasil Colônia ameaçava o projeto de colonização e de exploração econômica dos portugueses. Na tentativa de resolveresse impasse foram criados no século XVI os cargos de físico-mor e cirurgião-mor. O objetivo desses profissionais eram zelar pela saúde da população que vivia no país, porém esses cargos passaram longos períodos de tempo sem ocupação (BERTOLLI FILHO, 2011). 2.1 AS PRIMEIRAS INICIATIVAS DAS ORDENS RELIGIOSAS PARA OS CUIDADOS DE SAÚDE NO BRASIL Os cuidados de saúde ficavam a cargo da solidariedade entre as pessoas da comunidade, vários tipos de curandeiros e de iniciativas de ordens religiosas como a Santa Casa da Misericórdia. Fica evidente a diferenciação entre as classes sociais no que diz respeito ao acesso à saúde no Brasil Colônia (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 22 FIGURA 5 – TERCEIRO PRÉDIO DA SANTA DA CASA DE MISERICÓRDIA DE SANTOS (SP). A PRIMEIRA A OBTER PRIVILÉGIOS NO PAÍS EM 1551 FONTE: Disponível em: <https://santosturismo.wordpress.com/2013/08/31/ a-santa-casa-da-misericordia-de-santos-sinopse-historica/>. Acesso em: 11 mar. 2017. UNI Para conhecer mais sobre a história das Santas Casas de Misericórdia no Brasil e compreender seu papel para a história da saúde no país leia o artigo “O modelo luso de assistência e a dinâmica das Santas Casas de Misericórdia na América portuguesa”, de Renato Júnio Franco. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-218620140001 00005>. Acesso em: 11 mar. 2017. 2.2 DESAFIOS DA SAÚDE NO BRASIL COLÔNIA No século XVIII, as notícias das péssimas condições de saúde em terras brasileiras já haviam se espalhado: “os conflitos com os indígenas, as dificuldades materiais da vida na região e sobretudo as múltiplas e frequentes enfermidades eram os principais obstáculos para o estabelecimento dos colonizadores” (BERTOLLI FILHO, 2011, p. 5). O ambiente e os modos de trabalho característicos desse período histórico influenciaram de forma significativa os problemas de saúde. As camadas sociais mais baixas, formadas por indígenas, escravos e outros colonos, sofriam com […] parasitas intestinais, doenças determinadas pela carência de nutrientes e doenças transmissíveis também relacionadas ao enfraquecimento, como a tuberculose, que se acredita ter chegado ao país antes dos colonizadores. Além desses males, a varíola foi TÓPICO 2 | OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL 23 uma doença epidêmica que tirou a vida dos brasileiros no início da colonização. A partir de meados do século XIX a ela se juntariam diversas doenças transmissíveis, como a febre amarela, a sífilis e a malária, que muitas vezes atacavam as cidades em fortes epidemias (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 280). As principais doenças que acometiam a população nos mostram as condições precárias de vida e trabalho enfrentadas pelas classes mais baixas da sociedade brasileira. Sem acesso a níveis recomendáveis de saneamento básico e de assistência médica as epidemias se tornavam constantes e doenças que poderiam ser curadas acabavam apresentando sérias consequências, inclusive levando à morte. FIGURA 6 – DOENÇAS COMUNS NO PERÍODO COLONIAL E AS NAVEGAÇÕES FONTE: Disponível em: <http://www.editoracontexto.com.br/blog/doencas-e-curas-habitos- insalubres-tornaram-brasil-colonia-grande-foco-de-epidemias/>. Acesso em: 12 mar. 2017. Em caso de fome extrema, ratos que corriam pela embarcação eram cozidos em água do mar > 1 tonelada de sardinhas salgadas MARES NUNCA D'ANTES NAVEGADOS As dificuldades para viajar nos séculos 16 e 17 fazia com que poucos viessem ao Brasil Fungos, bactérias e parasitas de todo tipo se espalhavam pelas embarcações. Desde varíola, tuberculose até difteria, todo tipo de doença dominava os barcos Dos 160 marujos que embarcaram com Vasco da Gama para as Índias, 120 morreram no caminho. Os corpos eram jogados no mar As necessidades fisiológicas eram feitas nas bordas dos navios Ninguém tomava banho nem trocava de roupa, o que propiciava o surgimento de pragas de piolhos e pulgas Animais vivos acompanhavam a viagem, oferecendo carne e leite Eram estocados em um porão úmido cerca de: > 50 toneladas de biscoito > 50 mil litros de vinho > 100 mil litros de água > 10 toneladas de carne UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 24 UNI Ao longo do tempo criou-se uma verdadeira “guerra biológica”: tanto na América do Sul como na América do Norte os colonizadores que queriam se apossar das terras indígenas espalhavam, nas trilhas destes, roupas de pessoas que tinham varíola. Os índios ingenuamente as vestiam, contraíam a doença e morriam como moscas. No Brasil, a primeira epidemia de varíola ocorreu já em 1563. Outras doenças vindas do Velho Mundo foram sendo introduzidas: malária, febre amarela, tuberculose, peste bubônica. Logo toda a população da colônia estava sujeita a elas. Os escravos negros, por causa das péssimas condições de vida e de nutrição; os brancos, porque não dispunham de vacinas ou de tratamentos eficazes. A isto se acrescentou outro fator: o surgimento das cidades, que tinham precárias condições de higiene e saneamento. Por outro lado, a assistência à saúde era muito deficiente. Os físicos, como eram chamados os médicos, eram em geral formados em Portugal. A primeira escola de medicina, em Salvador, só surgiu com a chegada da Família Real em 1808. O número de físicos era pequeno; a maior parte da população consultava curandeiros. A assistência hospitalar estava a cargo das Santas Casas, estabelecimentos de caridade que proporcionavam abrigo e amparo religioso aos moribundos, mas que não dispunham de recursos terapêuticos eficazes. Com relação à saúde pública organizada, pouco se fazia. Existia um físico-mor, que, através de assistentes, fiscalizava a prática médica e a venda de medicamentos, feita nas boticas, que aplicavam ainda sanguessugas, que serviam para extrair o “excesso” de sangue ou o sangue “envenenado”. As boticas eram também ponto de encontro para conversas e para o jogo de gamão. FONTE: SCLIAR, Moacyr. O Brasil e suas epidemias. Revista Carta Capital. Disponível em: <https:// www.cartacapital.com.br/cultura/o-brasil-e-suas-epidemias>. Acesso em: 12 mar. 2017. E quanto ao poder público? Já afirmamos que não havia instituições ou políticas voltadas exclusivamente para a saúde. O que não significa que não havia tipo de cuidado médico na época. Como já mostramos anteriormente, as classes mais altas recebiam atendimento de profissionais com formação acadêmica, enquanto as classes mais baixas recebiam tratamento de outros agentes baseados em terapias alternativas. As iniciativas dos poderes públicos estavam restritas ao processo de regulamentação das artes de curar. As licenças eram expedidas pelos tribunais portugueses para físicos cirurgiões – que conhecemos hoje como médicos ou cirurgiões, para boticários – equivalentes aos atuais farmacêuticos e para outros agentes sem formação acadêmica – como aqueles conhecidos como sagradores, aplicadores de ventosas, parteiras, entre outras. As licenças eram emitidas para a realização de funções específicas em uma localidade com tempo determinado (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). O número de médicos com formação era pequeno em relação à população que necessitava de atendimento, além disso, não havia instituições públicas ou políticas governamentais destinadas à saúde. As dificuldades sanitárias e os diversos agentes de cura revelam o baixo alcance da medicina tradicional na vida da população brasileira (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). TÓPICO 2 | OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL 25 FIGURA 7 – LINHA DO TEMPO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL (1500-1700) • D. Manoel baixa o Regimento de Físico-Mor e Cirurgião-Mor do Reino, e instituindo os Comissário-Delegados nas Províncias, inclusive no Brasil. • Em Portugal, os almocéis eram encarregados da saúde do povo, com o papel de verificar os gêneros alimentícios e destrutir os que estavamem más condições. Ao Brasil-Colônia eram extensivas a legislação e as práticas vigentes em Portugal. • No reinado de D. João V, foi reiterada, ao então Vice-Rei do Brasil, Conde de Galvães, determinação relativa às atribuições dos Comissários-Delegados, que instruia sobre a obrigatoriedade de aceitar a Delegação de Físico-Mor. • Por lei da Rainha D. Maria I, foi reformada a organização estabelecida, sendo instituída a Junta do Protomedicato, formada por sete deputados, com atribuições semelhantes às do Físico-Mor. A fiscalização foi enfatizada. 1521 1550 1744 1782 FONTE: Disponível em: <http://www.funasa.gov.br/site/museu-da-funasa/cronologia- historica-da-saude-publica/>. Acesso em: 20 abr. 2017. 3 PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XIX: AS INFLUÊNCIAS DA CHEGADA DA CORTE PORTUGUESA NOS CUIDADOS DE SAÚDE A chegada da Corte portuguesa ao Brasil levou a transformações na sociedade da época. As cidades que receberam a família real portuguesa e sua corte foram preparadas para garantir as condições ideias de vida da nobreza. Com a saúde não foi diferente, as primeiras iniciativas de saúde pública foram criadas nesse contexto. Em 1808, com a chegada da Corte portuguesa ao Rio de Janeiro, foram criadas as primeiras instâncias de saúde pública em terras brasileiras: a Fisicatura-mor e Provedoria-mor de Saúde. Cabe à primeira fiscalizar o exercício da medicina, mas suas responsabilidades de limitaram, quase exclusivamente, nas artes da cura e, principalmente, nas aplicações de multas aos que exerciam o cargo sem a habilitação legal. A Provedoria- mor de Saúde, também dirigida pelo físico-mor, tinha como objetivo garantir a salubridade da Corte, atuando na fiscalização dos navios para impedir a chegada de novas doenças em nossas cidades costeiras (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 280). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 26 As instituições de saúde estavam restritas a Fisicatura-mor e a Provedoria- mor e suas ações de fiscalização do exercício de atividades ligadas à medicina. Como já afirmado anteriormente o acesso a essas atividades estava restrito às elites. Dessa forma, a população buscava outras formas de cura que eram consideradas ilegais pelo governo. Tal conjuntura demonstra o caráter restrito do acesso à saúde no Brasil Colônia. 3.1 INDEPENDÊNCIA, EPIDEMIAS E A CRISE SANITÁRIA A Independência do Brasil levou a novas configurações no que se refere ao atendimento médico e aos cuidados com a saúde. Ao cortar laços com a Coroa portuguesa, as responsabilidades ligadas aos cuidados com a saúde e a regulamentação da medicina deixaram de ser atribuídas à Portugal (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). Entre as mudanças desse período destacamos a extinção da Fisicatura- mor em 1828. Após essa medida as questões relativas à saúde passaram para a alçada dos municípios que existiam em território brasileiro. As ações tomaram forma descentralizada, pois cada município agia de acordo com seus interesses e necessidades particulares. Tais interesses e necessidades estavam ligadas às classes dominantes, conforme a estrutura social da época (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). Outra característica desse período histórico que merece destaque é a institucionalização das primeiras faculdades e agremiações médicas: a Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro (1829), transformada em Academia Imperial de Medicina (1831) e cursos médicos cirúrgicos na Bahia e no Rio de Janeiro se transformaram em faculdades de Medicina e passaram a expedir diplomas de médicos, farmacêuticos e parteiras (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). Contudo, é relevante compreender que a expansão de instituições de ensino da medicina não representou um avanço nos cuidados de saúde da população. As práticas alternativas de cura seguiam como a única alternativa para grande parte da população, apesar de consideradas impróprias pelos médicos (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). 3.2 A RESPOSTA DO IMPÉRIO ÀS EPIDEMIAS: A REFORMA NOS SERVIÇOS DE SAÚDE O panorama de saúde descrito acima, marcado por epidemias e mortes levou à necessidade de mudanças no modelo de atenção à saúde. Para superar o cenário de crise sanitária o caminho seguido pelo governo imperial foi uma reforma nos serviços de saúde. A primeira mudança ocorreu com a Junta Vacínica da Corte transformada no ano de 1846 em Instituto Vacínico do Império, a partir desse momento, além de oferecer a vacinação contra a varíola, passou a fiscalizar as atividades que envolviam formas de vacinação por parte dos municípios (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). TÓPICO 2 | OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL 27 Outra mudança foi a criação, entre 1849 e 1851, da Junta Central de Higiene Pública. Essa instituição passou a gerir as ações da: “polícia sanitária, vacinação antivariólica e fiscalização do exercício da medicina, efetuadas pelas provedorias de saúde criadas nas províncias" (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 281). Também atuava na fiscalização sanitária dos portos marítimos e fluviais em todo o Brasil. UNI Polícia Sanitária Ainda no século XVII, sob a égide do mercantilismo, os documentos oficiais dos Estados alemães utilizavam o termo “polícia” para designar vários ramos do campo da administração pública, ficando a administração da saúde com a designação de “polícia médica”. Esta expressão por muito tempo acompanhou os procedimentos determinados pelas legislações voltadas para a saúde, assim como as ações específicas postas em prática pelos diversos Estados nesse campo. No século XVIII, com o advento da medicina social, a polícia médica passa a se caracterizar, de uma forma mais geral, a política dos Estados em relação à saúde, se conformando com a política sanitária. No século XIX com o desenvolvimento das práticas higienistas direcionadas à melhoria das condições ambientais como forma de prevenção de doenças, a polícia médica tornou-se um extenso corpo de legislação que regulamentava os diversos aspectos concernentes à limpeza e aeração do ambiente urbano. Com esse objetivo, voltava-se para a fiscalização das habitações, dos cemitérios, dos portos e das embarcações, da comercialização de alimentos, dos ambientes de trabalho e até da higiene pessoal. FONTE: ESCOREL, Sarah; TEIXEIRA, Luiz Antônio. História das políticas de Saúde no Brasil de 1822 a 1963: do império ao desenvolvimentismo populista. In: GIOVANELLA, Ligia (Org.). Políticas e Sistemas de Saúde no Brasil. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2012. Mesmo diante da necessidade de mudanças e reformas nos serviços de saúde a atuação do Estado não era suficiente e suas atividades esparsas: "[…] a atuação do Estado na assistência médica se restringia à internação de doentes graves em lazaretos e enfermarias improvisadas, em tempos de epidemias, e à internação de loucos no Hospício de Pedro II, criado em 1841 pelo poder imperial” (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 281). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 28 O antigo presídio era destino de leprosos e portadores de doenças contagiosas. A centralização das atividades de saúde passou a ser instituída em meados do século XIX. Nesse formato, o poder central atuava na normatização dos serviços de saúde e aos poderes locais ficou atribuída a função de alocação recursos e execução das funções. O município da Corte foi o único a receber recursos de forma regular, os demais não chegaram a receber recursos mesmo em situações de epidemias (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). Prezado acadêmico! Diante do cenário apresentado até esse momento podemos observar que foram poucos os avanços no sentido de melhorar, de fato, a qualidade do acesso aos cuidados de saúde no período imperial. Tampouco o governo foi capaz de consolidar uma política de saúde pública para atender às demandas da população, especialmente os mais pobres. Era comum nesse período que a população buscasse alternativas de assistência médica: os mais ricos se dirigiam à Europa ou às primeirasclínicas particulares criadas na região serrana do Rio de Janeiro, enquanto os mais pobres eram atendidos pelos curandeiros negros. Um dos motivos dessa busca por alternativas era o medo da população em relação aos serviços de saúde oferecidos nessa época: [...] os doentes tinham muito medo de ser internados nos raros hospitais públicos e nas Santas Casas. Em suas enfermarias misturavam-se pacientes de todos os tipos, sendo comum dois ou mais dividirem o mesmo leito. É claro que tal “tratamento”, somado a falta de higiene dos hospitais, fazia com que as famílias evitassem internar seus parentes, pois a morte era o destino certo da maioria dos pacientes pobres (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 10). FIGURA 8 – RUÍNAS DO LAZARETO LOCALIZADO NA PRAIA PRETA EM ILHA GRANDE (RJ FONTE: Disponível em: <http://mw2.google.com/mw-panoramio/ photos/medium/76231104.jpg>. Acesso em: 25 mar. 2017. TÓPICO 2 | OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL 29 FIGURA 9 – LINHA DO TEMPO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL (1800-1840) FONTE: Cronologia Histórica da Saúde Pública. Funasa. Disponível em: <http://www.funasa.gov. br/site/museu-da-funasa/cronologia-historica-da-saude-publica/>. Acesso em: 20 abr. 2017. 4 SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX: CRISE SANITÁRIA E O RETORNO A CENTRALIZAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE As ações direcionadas aos cuidados com a saúde no contexto pós- independência eram restritas a atividades pontuais como podemos observar na figura a seguir: • Criação da primeira organização nacional de saúde pública no Brasil. Em 27 de fevereiro foi criado o cargo de Provedor-Mor de Saúde da Corte e do Estado do Brasil, embrião do Serviço de Saúde dos Portos, com delegados nos estados.1808 • Após a Independência foi promulgada, em 30 de agosto, a lei da Municipalização dos Serviços de Saúde que conferiu as Juntas Municipais, então criadas, as funções exercidas anteriormente pelo Físico-Mor, Cirurgião- Mor e seus Delegados. No mesmo ano ocorreu a criação da Inspeção de Saúde Pública do Porto do Rio de Janeiro, subordinada ao Senado da Câmara, sendo e 1833, duplicado o número de integrantes. 1828 • Ficou estabelecida a imunização compulsória das crianças contra a varíola. • Obedecendo o mesmo critério da luta contra as epidemias, foi organizado o Instituto Vacínico do Império. Mandou executar o regulamento do Instituto Vacínico do Império (Decreto nº 464, de 17/8/1846). 1837 1846 Desse modo a fase imperial brasileira ficou marcada pelos graves problemas de saúde coletiva. Podemos destacar as iniciativas do governo descritas nesse tópico como tentativas de superar essa situação, porém sem sucesso. Até mesmo os incentivos à pesquisa científica, vindos de Dom Pedro II, não foram capazes de transformar a realidade da saúde pública no país. De tal modo que era comum nessa época recomendar que viajantes evitassem o Brasil como destino (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 30 FIGURA 10 – CUIDADOS DE SAÚDE NO BRASIL NO FIM DO SÉCULO XIX Vacinação antivariólica em períodos de epidemia. Controle da entrada de escravos doentes nas cidades. Expulsão das áreas urbanas de acometidos por doenças contagiosas, principalmente leprosos Medidas de purificação do ambiente - cremação de ervas e destruição do lixo. Fonte: Adaptado de Escorel e Teixeira (2012) No período histórico marcado pelo fim do período regência em meados do século XIX, a autonomia dos municípios em relação aos cuidados com a saúde diminuiu e, ao mesmo tempo, tomou forma no país uma crise sanitária: A degradação do quadro sanitário no país em muito se deveu ao recrudescimento de epidemias, principalmente as de febre amarela. A doença aparecera de forma epidêmica em Pernambuco e na Bahia no final do século XVII. Não há notícias de outras epidemias no período colonial. Em 1849, a febre amarela voltaria a atacar a Bahia, de onde se alastrou para outras regiões litorâneas, chegando ao Rio de Janeiro ainda no mesmo ano. A partir de então, a doença visitaria constantemente a cidade, transformando-se num pesadelo para a população e para os governantes, pelo grande número de mortes que causava e, também, pelo estigma que gerava em relação à capital do Império. Tal qual a febre amarela, a varíola também passou a atingir mais fortemente a capital do Império na segunda metade do século XIX […] (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 281). Observe, prezado acadêmico, que a crise sanitária se deve à expansão das epidemias, fato comum no período colonial, constituindo um desafio do Império. Além do número de mortes causadas por doenças como a febre amarela e a varíola, era preciso superar o estigma que se formou a respeito da capital do Império. Outra característica marcante desse momento histórico são as transformações sociais ocasionadas pela dinamização da economia agroexportadora nacional. Nesse contexto consolida-se a política do “café com leite” responsável por alternar no poder lideranças paulistas e mineiras e pelo crescimento e modernização da economia brasileira (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). TÓPICO 2 | OS PRIMÓRDIOS DA SAÚDE NO BRASIL 31 Contudo, vale ressaltar que o crescimento e a modernização da econômica não chegaram com as mesmas proporções aos serviços de saúde. A maior inovação das ações de saúde na República se deu por conta da vacinação obrigatória contra a varíola e a criação da lista de doenças de notificação compulsória (febre amarela, cólera, peste, difteria, escarlatina e sarampo). Outra iniciativa desse período foi a ampliação do poder da Inspetoria Geral de Higiene em relação aos estados, especialmente no que concernia à fiscalização dos portos (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). A tentativa de centralizar os serviços de saúde se reverteu com a Constituição de 1891 que transferiu a responsabilidade por esses serviços aos municípios: Na organização federativa republicana, passou a vigorar o modelo que imputava aos governos estaduais e municipais os cuidados com a saúde da população. Para o governo central, ficava a responsabilidade sobre a vigilância sanitária dos portos e pelos serviços de saúde do Distrito Federal (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012, p. 285). A Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP), criada em 1896, representou um formato diferente na concepção de saúde pública e mais uma vez essas ações foram centralizadas na capital e nos portos. Como atribuições da diretoria destacam-se a fiscalização dos portos e do exercício da medicina e farmácia, além dos estudos sobre doenças infecciosas e organização de estatísticas demográfica-sanitárias. Outra iniciativa nesse sentido foi a criação em 1900 do Instituto Soroterápito Federal para evitar a disseminação da peste bubônica. Posteriormente, o Instituto passou a ser denominado Instituto Oswaldo Cruz e começou a produzir vacinas e soros para doenças epidêmicas (ESCOREL; TEIXEIRA, 2012). UNI Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Promover a saúde e o desenvolvimento social, gerar e difundir conhecimento científico e tecnológico, ser um agente da cidadania. Estes são os conceitos que pautam a atuação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde, a mais destacada instituição de ciência e tecnologia em saúde da América Latina. Para conhecer os projetos desenvolvidos pela fundação acesse a página oficial: FONTE: Disponível em: <https://portal.fiocruz.br/pt-br/content/funda%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 20 abr. 2017. UNIDADE 1 | O CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL DA POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL COM ENFOQUE NO MODELO RESIDUAL 32 As mudanças nos serviços de saúde do governo republicano levaram a reorganização dos serviços sanitários através da descentralização, porém esse movimento não significou uma melhoria na oferta ou no acesso aos serviços de saúde para a maior parte da população. As constantes epidemias entre 1890 e 1900 levaram o governo a incentivar a ocupação de cargos importantes na administração pública por médicos higienistas.
Compartilhar