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1 CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL- PRINCÍPIOS NORTEADORES 1 Sumário NOSSA HISTÓRIA .......................................................................................... 2 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 3 O QUE É UM CAPS? ...................................................................................... 8 O CAPS E A REDE BÁSICA DE SAÚDE ...................................................... 14 ACOLHIMENTO ............................................................................................ 17 VÍNCULOS ORGANIZACIONAIS .................................................................. 22 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 25 REFERÊNCIAS ............................................................................................. 27 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós- Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 INTRODUÇÃO A história de isolamento e da falta de assistência a pessoas com transtorno mental foi deflagrada pelo Movimento Nacional da Luta Antimanicomial no Brasil, em que se explorou a discussão sobre as precárias condições de trabalho que eram oferecidas aos profissionais e os maus-tratos aos pacientes das instituições psiquiátricas. Ainda, aliado ao contexto em que se rediscutia o papel do Estado na saúde, as Conferências de Saúde apontavam a necessidade da democratização da saúde. A Constituição Federal de 1988 preconiza que a saúde é universal, instituindo os parâmetros para o Sistema Único de Saúde (SUS). Com isso, implementou-se um novo modelo de cuidado em saúde mental, aliado as ideias da reforma sanitária e de redemocratização da saúde, sob os princípios de um atendimento universal, integral, descentralizado e que esteja sob controle social, de modo como está desenhado pela Constituição Federal e pelo SUS. No ano de 1989, ocorreu a primeira experiência de desinstitucionalização no Brasil, fruto das articulações dos movimentos sociais relacionados à temática. A partir disso, surgiu um dos aparatos legais federais mais significativos, o Projeto de Lei nº 3.657/89, que dispunha sobre a progressiva extinção das instituições manicomiais e sua substituição por outros dispositivos assistenciais, bem como sobre a regulamentação da internação psiquiátrica compulsória. Entretanto, em decorrência da demora na aprovação, durante a década de 1990, diversos estados brasileiros regulamentaram as suas próprias Reformas Psiquiátricas dentro de seus limites jurisprudenciais, como é o caso do Rio Grande do Sul. Neste sentido, o estado gaúcho foi uns dos pioneiros no país com a Lei Estadual 9.716 de 7 de agosto de 1992, que determinou a substituição progressiva dos leitos em hospitais psiquiátricos por redes de atenção integral em saúde mental, legitimando a política da reforma psiquiátrica. Durante o período de 1990 a 2003, observou-se o amadurecimento e a consolidação dos processos que compõem atualmente o cenário da reforma psiquiátrica brasileira. Nesses anos, financiaram-se ações em saúde mental, visando à criação de uma rede extra hospitalar composta pelos serviços substitutivos. Simultaneamente, também foram instituídas regras mais rígidas para o 4 funcionamento dos hospitais psiquiátricos, públicos e privados. Todas essas articulações culminaram na assinatura da Lei Federal nº 10.216, dispondo sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais em 6 de abril de 2001. Atualmente, a Política Nacional de Saúde Mental está pautada na redução progressiva dos leitos psiquiátricos e da ampliação e do fortalecimento da rede de serviços substitutivos, composta em especial pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Neste sentido, outras propostas criadas contemplam a inclusão das ações de saúde mental junto à atenção primária e a atenção integral aos usuários de substâncias psicoativas. Porém, os CAPS têm emergido como a principal estratégia para transformação do modelo asilar de assistência à saúde mental e para a garantia de direitos aos usuários, já que tem se constituído na rede como "serviço que se diferencia das estruturas tradicionais e que se orienta pela ampliação do espaço de participação social do sujeito que sofre, pela democratização das ações, pela não segregação do adoecimento psíquico e pela valorização da subjetividade, com base das ações multiprofissionais" (Tavares & Sousa, 2009, p.254). Sendo assim, o CAPS é considerado um local de referência e de tratamento a pessoas que sofrem com transtornos mentais severos e persistentes, os quais justificam a permanência do paciente em um lugar de atendimento intensivo, comunitário, personalizado e promotor de saúde (Brasil, 2004). Onocko-Campos e Furtado (2006) ressaltam que os CAPS se configuram como serviços comunitários, ambulatoriais e regionalizados, em que assumem o papel de articulador de uma rede de saúde, aproximando questões relativas à saúde coletiva e a saúde mental, constituindo um campo interdisciplinar de saberes e práticas. Ainda apontam que, com as características de um atendimento que deve romper com o modelo de atenção manicomial, é importante que se constitua um serviço alinhado aos princípios do SUS, promovendo uma clinica ampliada, centrada no sujeito, buscando garantir o acesso, o que acaba por caracterizar os CAPS como serviços de saúde particularmente complexos. Frente esta complexidade, os CAPS são classificados em CAPS I, CAPS II e CAPS III (definidos por ordem crescente de porte/complexidade e abrangência 5 populacional), os quais cumprem a mesma função no atendimento à população. Além destes, há, ainda, os CAPS Infantil (CAPSi) e os CAPS Álcool e Drogas (CAPSad), os quais se destinam, respectivamente, ao atendimento de crianças e adolescentes e de pacientes com transtornos decorrentes do uso e dependência de substâncias psicoativas (Brasil, Portaria n.º 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002). O atendimento dos usuários está baseado em um projeto terapêutico singular e individualizado, ou seja, um planejamento do processo terapêutico em que o indivíduo e sua família estão envolvidos para a superação de suas dificuldades em razão a sua condição de saúde mental. Com este, será definido se o usuário terá atendimentos intensivos – ou seja, diários-, semi-intensivo – aproximadamente três vezes por semana –, ou não intensivo, com periodicidade semanal de atendimento (Brasil, 2004). Com esta organização do serviço, é esperado que se promova a saúde mental, dando atenção às demandas das relações diárias como sofrimento às singularidades deste tipo de cuidado, estando articuladas comas redes de saúde, redes sociais do território assim como as redes de outros setores. Leão e Barros (2008) apresentam que, em pesquisa acerca das representações de funcionários de um CAPS sobre as práticas de inclusão social realizadas pelos serviços substitutivos em saúde mental, os participantes mencionaram a intersetorialidade como base para o desenvolvimento de práticas de inclusão social. A intersetorialidade foi compreendida como aspecto fundamental à construção da rede de cuidados e de atenção na saúde mental, principalmente no que diz respeito à inclusão social dos pacientes e à articulação entre os diferentes locais onde eles são atendidos. A noção de intersetorialidade parte de um entendimento de saúde que considera as pessoas em sua totalidade, no sentido de demonstrar que ações resolutivas necessitam de parcerias entre diversos setores, como Educação, Trabalho, Habitação, Segurança. A partir disso, pode-se perceber que se trata de uma estratégia complexa que busca superar a fragmentação das diversas políticas e das diferentes áreas em que são executadas. O grande desafio é a articulação dos diversos setores na busca por soluções de problemas no cotidiano da gestão, através de decisões compartilhadas entre as instituições e os setores governamentais que produzam um impacto positivo sobre a saúde da população. Assim, torna-se impossível dissociar o conceito de intersetorialidade ao de rede, uma vez que a 6 prática requer articulações, vinculações, ações complementares, relações horizontais entre parceiros e interdependência de serviços para garantir a integralidade das ações (Brasil, 2009a). No Sistema Único de Saúde (SUS), o termo "rede" é frequentemente utilizado ao se definir um grupo de serviços semelhantes; por exemplo, utiliza-se rede de saúde mental para definir uma rede de serviços homogêneos a qual trata da atenção em saúde mental. Contudo, é a rede transversal – produzida pelos entrelaçamentos entre os atores, os serviços, os movimentos e a política em determinado território – que aparece como uma novidade no âmbito da saúde, como uma estratégia capaz de promover "múltiplas respostas para o enfrentamento da produção saúde-doença" (Brasil, 2009b, p.7). As redes de atenção à saúde podem ser conceituadas como "organizações poliárquicas de conjuntos de serviços de saúde, vinculados entre si por uma missão única, por objetivos comuns e por uma ação cooperativa e interdependente, que permitem ofertar uma atenção contínua e integral a determinada população" (Mendes, 2010, p.2300). O autor esquematizou os elementos constitutivos da rede, sendo estes: a população, a estrutura operacional e o modelo de atenção à saúde. Destaca- se aqui a estrutura operacional, a qual está relacionada aos "nós" da rede, ou seja, os serviços que estruturam a rede e a sua comunicação, tendo em vista a necessidade de fluxos e contrafluxos eficientes para abarcar a complexidade de uma população em um determinado território. Para o Ministério da Saúde (Brasil, 2009b), quatro elementos podem ser classificados como "nós" da rede. São eles: (1) o elemento "sujeitos e subjetividades", ou seja, as relações humanas, vínculos afetivos e tecnologias relacionais que viabilizam formas de comunicação essenciais à produção de redes de atenção em saúde; (2) a "equipe de trabalho", necessidade da rede de construir uma gestão com um compartilhamento do cuidado e com um pacto de compromissos e de responsabilidades entre os diferentes profissionais envolvidos; (3) os "serviços e a rede de atenção", elementos interdependentes e essenciais à rede de saúde, justificados pela necessidade de diferentes serviços de saúde que tornem efetiva a atenção integral dos sujeitos; (4) e as "redes e territórios", consequência da localização de serviços de saúde sobre o acesso, a equidade, a qualidade dos serviços e sobre o próprio território (Brasil, 2009b). 7 Assim, a rede é um conceito fundamental para a compreensão do papel do CAPS, já que este se torna um dispositivo estratégico para o cuidado com a Saúde Mental fora do hospital, articulado com a rede básica de saúde e com o território, em contato com comunidade do usuário (Brasil, 2004). Perante este parâmetro, o processo terapêutico se pauta no resgate das potencialidades e na reinserção social no território, promovendo a inserção do usuário em espaços comunitários, rejeitando a exclusão social e a marginalização, seja real ou simbólica. Neste sentido, compreende-se o território como "espaço geográfico habitado, instituído de significados, afeto, o espaço de laços sociais e de garantia de qualidade de vida, de manutenção econômica e de exercício político dos cidadãos" (Nunes, Jucá & Valentim, 2007, p.2380). Ainda, é importante considerar que este território é composto por pessoas, suas histórias e suas relações sociais, caracterizando uma comunidade com diversos componentes que comumente a compõe, como associações, corporativas, organizações setoriais e sociais. Costa-Rosa, Luizio e Yasui (2001) apontam que o conceito de território, aliado ao princípio da integralidade, reforçam as atribuições dos serviços de saúde que devem promover um atendimento em extensão e em profundidade, intersetorialmente e interdisciplinarmente, superando o modelo de atenção à saúde estratificada. No que diz respeito à saúde mental, pode-se apontar que os CAPS devem buscar trocas sociais por meio de ações com toda a rede, objetivando o enfrentamento do estigma e a produção de autonomia dos sujeitos através de ações integradas. Desta forma, percebe-se que a mudança de paradigma na atenção em saúde mental implica não só em práticas relacionadas estritamente à saúde, mas também em debates sobre o sistema de saúde como um todo, por meio de relações interdisciplinares e intersetoriais que articulem os diversos aspectos envolvidos no cuidado e na atenção em saúde mental. 8 O QUE É UM CAPS? Como já vimos, um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) ou Núcleo de Atenção Psicossocial é um serviço de saúde aberto e comunitário do Sistema Único de Saúde (SUS). Ele é um lugar de referência e tratamento para pessoas que sofrem com transtornos mentais, psicoses, neuroses graves e demais quadros, cuja severidade e/ou persistência justifiquem sua permanência num dispositivo de cuidado intensivo, comunitário, personalizado e promotor de vida. O objetivo dos CAPS é oferecer atendimento à população de sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. É um serviço de atendimento de saúde mental criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos. Os CAPS visam: prestar atendimento em regime de atenção diária; gerenciar os projetos terapêuticos oferecendo cuidado clínico eficiente e personalizado; promover a inserção social dos usuários através de ações intersetoriais que envolvam educação, trabalho, esporte, cultura e lazer, montando estratégias conjuntas de enfrentamento dos problemas. Os CAPS também têm a responsabilidade de organizar a rede de serviços de saúde mental de seu território; dar suporte e supervisionar a atenção à saúde mental na rede básica, PSF (Programa de Saúde da Família), PACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde); 9 regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental de sua área; coordenar junto com o gestor local as atividades de supervisão de unidades hospitalares psiquiátricas que atuem no seu território; manter atualizada a listagem dos pacientes de sua região que utilizam medicamentos para a saúde mental. Os CAPS devem contar com espaço próprio e adequadamente preparado para atender à suademanda específica, sendo capazes de oferecer um ambiente continente e estruturado. Deverão contar, no mínimo, com os seguintes recursos físicos: consultórios para atividades individuais (consultas, entrevistas, terapias); salas para atividades grupais; espaço de convivência; oficinas; refeitório (o CAPS deve ter capacidade para oferecer refeições de acordo com o tempo de permanência de cada paciente na unidade); sanitários; área externa para oficinas, recreação e esportes. As práticas realizadas nos CAPS se caracterizam por ocorrerem em ambiente aberto, acolhedor e inserido na cidade, no bairro. Os projetos desses serviços, muitas vezes, ultrapassam a própria estrutura física, em busca da rede de suporte social, 10 potencializadora de suas ações, preocupando-se com o sujeito e sua singularidade, sua história, sua cultura e sua vida quotidiana. As pessoas atendidas nos CAPS são aquelas que apresentam intenso sofrimento psíquico, que lhes impossibilita de viver e realizar seus projetos de vida. São, preferencialmente, pessoas com transtornos mentais severos e/ou persistentes, ou seja, pessoas com grave comprometimento psíquico, incluindo os transtornos relacionados às substâncias psicoativas (álcool e outras drogas) e também crianças e adolescentes com transtornos mentais. Os usuários dos CAPS podem ter tido uma longa história de internações psiquiátricas, podem nunca ter sido internados ou podem já ter sido atendidos em outros serviços de saúde (ambulatório, hospital-dia, consultórios etc.). O importante é que essas pessoas saibam que podem ser atendidas e saibam o que são e o que fazem os CAPS. Todo o trabalho desenvolvido no CAPS deverá ser realizado em um “meio terapêutico”, isto é, tanto as sessões individuais ou grupais como a convivência no serviço têm finalidade terapêutica. Isso é obtido através da construção permanente de um ambiente facilitador, estruturado e acolhedor, abrangendo várias modalidades de tratamento. Como dissemos anteriormente, ao iniciar o acompanhamento no CAPS se traça um projeto terapêutico com o usuário e, em geral, o profissional que o acolheu no serviço passará a ser uma referência para ele. Esse profissional poderá seguir sendo o que chamamos de Terapeuta de Referência (TR), mas não necessariamente, pois é preciso levar em conta que o vínculo que o usuário estabelece com o terapeuta é fundamental em seu processo de tratamento. O Terapeuta de Referência (TR) terá sob sua responsabilidade monitorar junto com o usuário o seu projeto terapêutico, (re)definindo, por exemplo, as atividades e a frequência de participação no serviço. O TR também é responsável pelo contato com a família e pela avaliação periódica das metas traçadas no projeto terapêutico, dialogando com o usuário e com a equipe técnica dos CAPS. Cada usuário de CAPS deve ter um projeto terapêutico individual, isto é, um conjunto de atendimentos que respeite a sua particularidade, que personalize o atendimento de cada pessoa na unidade e fora dela e proponha atividades durante a permanência diária no serviço, segundo suas necessidades. A depender do projeto 11 terapêutico do usuário do serviço, o CAPS poderá oferecer, conforme as determinações da Portaria GM 336/02: Atendimento Intensivo: trata-se de atendimento diário, oferecido quando a pessoa se encontra com grave sofrimento psíquico, em situação de crise ou dificuldades intensas no convívio social e familiar, precisando de atenção contínua. Esse atendimento pode ser domiciliar, se necessário; Atendimento Semi-Intensivo: nessa modalidade de atendimento, o usuário pode ser atendido até 12 dias no mês. Essa modalidade é oferecida quando o sofrimento e a desestruturação psíquica da pessoa diminuíram, melhorando as possibilidades de relacionamento, mas a pessoa ainda necessita de atenção direta da equipe para se estruturar e recuperar sua autonomia. Esse atendimento pode ser domiciliar, se necessário; Atendimento Não-Intensivo: oferecido quando a pessoa não precisa de suporte contínuo da equipe para viver em seu território e realizar suas atividades na família e/ou no trabalho, podendo ser atendido até três dias no mês. Esse atendimento também pode ser domiciliar. Cada CAPS, por sua vez, deve ter um projeto terapêutico do serviço, que leve em consideração as diferentes contribuições técnicas dos profissionais dos CAPS, as iniciativas de familiares e usuários e o território onde se situa, com sua identidade, sua cultura local e regional. Como já apresentamos anteriormente, os CAPS podem oferecer diferentes tipos de atividades terapêuticas. Esses recursos vão além do uso de consultas e de medicamentos, e caracterizam o que vem sendo denominado clínica ampliada. Essa ideia de clínica vem sendo (re)construída nas práticas de atenção psicossocial, 12 provocando mudanças nas formas tradicionais de compreensão e de tratamento dos transtornos mentais. O processo de construção dos serviços de atenção psicossocial também tem revelado outras realidades, isto é, as teorias e os modelos prontos de atendimento vão se tornando insuficientes frente às demandas das relações diárias com o sofrimento e a singularidade desse tipo de atenção. É preciso criar, observar, escutar, estar atento à complexidade da vida das pessoas, que é maior que a doença ou o transtorno. Para tanto, é necessário que, ao definir atividades, como estratégias terapêuticas nos CAPS, se repensem os conceitos, as práticas e as relações que podem promover saúde entre as pessoas: técnicos, usuários, familiares e comunidade. Todos precisam estar envolvidos nessa estratégia, questionando e avaliando permanentemente os rumos da clínica e do serviço. Os CAPS devem oferecer acolhimento diurno e, quando possível e necessário, noturno. Devem ter um ambiente terapêutico e acolhedor, que possa incluir pessoas em situação de crise, muito desestruturadas e que não consigam, naquele momento, acompanhar as atividades organizadas da unidade. O sucesso do acolhimento da crise é essencial para o cumprimento dos objetivos de um CAPS, que é de atender aos transtornos psíquicos graves e evitar as internações. Os CAPS oferecem diversos tipos de atividades terapêuticas, por exemplo: psicoterapia individual ou em grupo, oficinas terapêuticas, atividades comunitárias, atividades artísticas, orientação e acompanhamento do uso de medicação, atendimento domiciliar e aos familiares. Algumas dessas atividades são feitas em grupo, outras são individuais, outras destinadas às famílias, outras são comunitárias. Quando uma pessoa é atendida em um CAPS, ela tem acesso a vários recursos terapêuticos: Atendimento individual: prescrição de medicamentos, psicoterapia, orientação; Atendimento em grupo: oficinas terapêuticas, oficinas expressivas, oficinas geradoras de renda, oficinas de alfabetização, oficinas culturais, grupos terapêuticos, atividades esportivas, atividades de suporte social, grupos de leitura e debate, grupos de confecção de jornal; 13 Atendimento para a família: atendimento nuclear e a grupo de familiares, atendimento individualizado a familiares, visitas domiciliares, atividades de ensino, atividades de lazer com familiares; Atividades comunitárias: atividades desenvolvidas em conjunto com associações de bairro e outras instituições existentes na comunidade, que têm como objetivo as trocas sociais, a integração do serviço e do usuário com a família, a comunidade e a sociedade em geral. Essas atividades podem ser: festas comunitárias, caminhadas com grupos da comunidade, participação em eventos e grupos dos centros comunitários; Assembleias ou Reuniões de Organização do Serviço: a Assembleia é um instrumento importante para o efetivo funcionamento dos CAPS como umlugar de convivência. É uma atividade, preferencialmente semanal, que reúne técnicos, usuários, familiares e outros convidados, que juntos discutem, avaliam e propõem encaminhamentos para o serviço. Discutem-se os problemas e sugestões sobre a convivência, as atividades e a organização do CAPS, ajudando a melhorar o atendimento oferecido. Estar em tratamento no CAPS não significa que o usuário tem que ficar a maior parte do tempo dentro do CAPS. As atividades podem ser desenvolvidas fora do serviço, como parte de uma estratégia terapêutica de reabilitação psicossocial, que poderá iniciar-se ou ser articulada pelo CAPS, mas que se realizará na comunidade, no trabalho e na vida social. Dessa forma, o CAPS pode articular cuidado clínico e programas de reabilitação psicossocial. Assim, os projetos terapêuticos devem incluir a construção de trabalhos de inserção social, respeitando as possibilidades individuais e os princípios de cidadania que minimizem o estigma e promovam o protagonismo de 14 cada usuário frente à sua vida. Como vimos, muitas coisas podem ser feitas num CAPS, desde que tenham sentido para promover as melhores oportunidades de trocas afetivas, simbólicas, materiais, capazes de favorecer vínculos e interação humana. Demos somente alguns exemplos, mas com certeza existem muitas práticas sendo realizadas nos CAPS que poderiam ser descritas aqui. O CAPS E A REDE BÁSICA DE SAÚDE Rede e território são dois conceitos fundamentais para o entendimento do papel estratégico dos CAPS e isso se aplica também à sua relação com a rede básica de saúde. A Reforma Psiquiátrica consiste no progressivo deslocamento do centro do cuidado para fora do hospital, em direção à comunidade, e os CAPS são os dispositivos estratégicos desse movimento. Entretanto, é a rede básica de saúde o lugar privilegiado de construção de uma nova lógica de atendimento e de relação com os transtornos mentais. A rede básica de saúde se constitui pelos centros ou unidades de saúde locais e/ou regionais, pelo Programa de Saúde da Família e de Agentes Comunitários de Saúde, que atuam na comunidade de sua área de abrangência. Esses profissionais e equipes são pessoas que estão próximas e que possuem a responsabilidade pela atenção à saúde da população daquele território. Os CAPS devem buscar uma integração permanente com as equipes da rede básica de saúde em seu território, pois têm um papel fundamental no acompanhamento, na capacitação e no apoio para o trabalho dessas equipes com as pessoas com transtornos mentais. Que significa esta integração? O CAPS precisa: a) conhecer e interagir com as equipes de atenção básica de seu território; b) estabelecer iniciativas conjuntas de levantamento de dados relevantes sobre os principais problemas e necessidades de saúde mental no território; 15 c) realizar apoio matricial às equipes da atenção básica, isto é, fornecer-lhes orientação e supervisão, atender conjuntamente situações mais complexas, realizar visitas domiciliares acompanhadas das equipes da atenção básica, atender casos complexos por solicitação da atenção básica; d) realizar atividades de educação permanente (capacitação, supervisão) sobre saúde mental, em cooperação com as equipes da atenção básica. Este “apoio matricial” é completamente diferente da lógica do encaminhamento ou da referência e contra referência no sentido estrito, porque significa a responsabilidade compartilhada dos casos. Quando o território for constituído por uma grande população de abrangência, é importante que o CAPS discuta com o gestor local a possibilidade de acrescentar a seu corpo funcional uma ou mais equipes de saúde mental, destinadas a realizar essas atividades de apoio à rede básica. Essas atividades não devem assumir características de uma “especialização”, devem estar integradas completamente ao funcionamento geral do CAPS. As atuais diretrizes orientam que, onde houver cobertura do Programa de Saúde da Família, deverá haver uma equipe de apoio matricial em saúde mental para no mínimo seis e no máximo nove equipes de PSF. Os profissionais que trabalham nos CAPS possuem diversas formações e integram uma equipe multiprofissional. É um grupo de diferentes técnicos de nível superior e de nível médio. Os profissionais de nível superior são: enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, pedagogos, professores de educação física ou outros necessários para as atividades oferecidas nos CAPS. 16 Os profissionais de nível médio podem ser: técnicos e/ou auxiliares de enfermagem, técnicos administrativos, educadores e artesãos. Os CAPS contam ainda com equipes de limpeza e de cozinha. Todos os CAPS devem obedecer à exigência da diversidade profissional e cada tipo de CAPS (CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPSi e CAPSad) tem suas próprias características quanto aos tipos e à quantidade de profissionais. As equipes técnicas devem organizar-se para acolher os usuários, desenvolver os projetos terapêuticos, trabalhar nas atividades de reabilitação psicossocial, compartilhar do espaço de convivência do serviço e poder equacionar problemas inesperados e outras questões que porventura demandem providências imediatas, durante todo o período de funcionamento da unidade. 17 O papel da equipe técnica é fundamental para a organização, desenvolvimento e manutenção do ambiente terapêutico. A duração da permanência dos usuários no atendimento dos CAPS depende de muitas variáveis, desde o comprometimento psíquico do usuário até o projeto terapêutico traçado, e a rede de apoio familiar e social que se pode estabelecer. O importante é saber que o CAPS não deve ser um lugar que desenvolve a dependência do usuário ao seu tratamento por toda a vida. O processo de reconstrução dos laços sociais, familiares e comunitários, que vão possibilitar a autonomia, deve ser cuidadosamente preparado e ocorrer de forma gradativa. Para isso, é importante lembrar que o CAPS precisa estar inserido em uma rede articulada de serviços e organizações que se propõem a oferecer um continuum de cuidados. É importante ressaltar que os vínculos terapêuticos estabelecidos pelos usuários com os profissionais e com o serviço, durante a permanência no CAPS, podem ser parcialmente mantidos em esquema flexível, o que pode facilitar a trajetória com mais segurança em direção à comunidade, ao seu território reconstruído e ressignificado. ACOLHIMENTO O Acolhimento pode ser compreendido como: uma postura que pressupõe atitude por parte do trabalhador de receber, escutar e tratar humanizadamente o usuário e suas demandas; técnica que instrumentaliza procedimentos e ações organizadas que facilitam o atendimento na escuta, na análise, na discriminação do risco e na oferta acordada de soluções ou alternativas aos problemas demandados; (re)orientador dos processos de trabalho que pontua problemas e oferece respostas a questões referentes à organização dos serviços de saúde. No âmbito da Saúde Pública, o Acolhimento é considerado um dispositivo que contribui para a efetivação do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo percebido como ferramenta de intervenção na qualificação da escuta e na construção de vínculo, além de garantir, nos serviços de saúde, acesso com responsabilização e resolutividade. Nesse sentido, o Acolhimento propõe a inversão do modelo de atenção à saúde, 18 organizando os serviços de saúde de forma usuário-centrado, por meio de alguns princípios: atender todas as pessoas que procuram os serviços de saúde, garantindo a universalidade do acesso; reorganizar os processos de trabalho; e qualificar a relação entre trabalhador-usuário, que deve acontecer por parâmetros humanitários de solidariedade e cidadania. Os princípios ligados aos conceitos de Acolhimento podem serreferenciais de ação, inclusive para a produção de saúde no campo da saúde mental. Desse modo, conforme sinaliza pesquisa realizada no CAPS de Pelotas (RS), o Acolhimento produziu, de fato, efeitos positivos no cotidiano do serviço, apresentando-se como um organizador dos processos de trabalho, ao provocar mudanças no modelo de atenção à saúde. Desse modo, “a equipe de acolhimento” desse CAPS garantiu o acesso universal e resolutivo à população, utilizando uma tecnologia assistencial voltada para a escuta, a humanização do atendimento, o trabalho interdisciplinar e o encaminhamento das intervenções terapêuticas. Ainda, outro estudo aponta alguns aspectos positivos do Acolhimento, entre eles: a priorização dos casos, a ampliação do acesso, a humanização do atendimento, o trabalho em equipe e o estreitamento do vínculo entre usuário e equipe. Em todos os níveis da assistência, o acolhimento, certamente, é a dimensão primeira. Do porteiro ao motorista, do auxiliar administrativo ao funcionário da limpeza, da equipe técnica, enfim, de todos que participam do processo de trabalho em um serviço de saúde, acolher é o primeiro e indispensável passo para um atendimento correto e bem-sucedido. O Acolhimento busca a intervenção de toda a equipe multiprofissional, que se encarrega da escuta e resolução do problema do usuário. A proposta é realizar uma mudança no fluxo de entrada, de forma a não mais ocorrer de forma unidirecional (quando se agenda para o médico todos os pacientes que chegam). Toda a equipe participa da assistência direta ao usuário. O fazer em saúde, seja nas relações interpessoais (dos profissionais com os usuários e dos profissionais entre si), ou no diagnóstico e terapêutica, passa ser o resultado da complementação dos saberes e práticas específicos e comuns das diversas categorias, assim como da interpenetração crítica desses diversos saberes e práticas. 19 A escuta do usuário, o diagnóstico e a prescrição, a realização de procedimentos, o ministrar de cuidados, não mais se dariam em operações isoladas e desarticuladas, mas como resultado da integração das atividades e da parceria de todas as categorias. Portanto, o médico estaria na supervisão e na retaguarda, interagindo com os demais profissionais. O Acolhimento consiste ainda em uma etapa do processo de trabalho, ou seja, o momento de recepção dos usuários e as possibilidades de resposta. Tais constatações levam à reflexão de que o acolhimento precisa ser considerado um instrumento de trabalho que incorpore as relações humanas, apropriado por todos os profissionais em saúde, em todos os setores, em cada seqüência de atos e modos que compõem o processo de trabalho, não se limitando ao ato de receber. Leite et al (1999) afirmam que, para humanizar a relação serviço x profissional de saúde x usuário, não basta considerar a questão da responsabilidade, do respeito, pressupostos para a realização da assistência. É necessário ultrapassar essa visão afetuosa da atenção e discutir o modo como os trabalhadores se relacionam com seu principal objeto de trabalho – a vida e o sofrimento de indivíduos e da coletividade. Em um estudo realizado por Coimbra (2003), foi observado que o acolhimento agiliza os atendimento, ele acaba com as chamadas “filas de espera”, as consultas para os profissionais são marcadas o mais breve possível, mesma que muitas vezes ultrapasse o número de atendimento estipulados para o dia. Dessa maneira, a autora concluiu que esse cuidado faz com que o usuário não perca o vínculo que começou a ser construído. Nesse mesmo estudo, a autora observou que o acolhimento foi a primeira etapa de uma séria de intervenções, que possibilitaram os usuários a entender a sua doença, e a voltar a ter qualidade de vida. O acolhimento foi implementado em 1995 na rede pública municipal de Belo Horizonte, tendo como objetivos norteadores a construção de processos efetivos de acolhimento dos usuários na recepção dos serviços de saúde. O início da implementação deu-se ao final de 1995, com 6 Centros de Saúde participantes. No ano de 1996 ampliou-se para 67, sendo apenas 7 CS em 1997, totalizando até julho de 1997, 74 CS implantados. Chama a atenção que mesmo sem grande impulso institucional, o acolhimento aos adultos foi desencadeado pela própria rede básica, 20 forçando as áreas técnicas a repensarem estratégias, formularem protocolos e treinamentos, afim de responder à demanda da rede. O acolhimento é um sistema que se mostra dependente de toda a equipe do centro de saúde. Malta et al (2000) elaboraram um questionário para realizar um trabalho, cujo objetivo foi descrever alguns dos dispositivos do Planejamento que foram implantados na Secretaria Municipal de Saúde em Belo Horizonte (1994- 1996), visando a mudança do processo de trabalho nas unidades básicas de saúde. Foi observado em um dos questionários que da composição da equipe do Acolhimento desde a recepção ao usuário participaram categorias profissionais diferenciadas. Os auxiliares e enfermeiras participaram de forma preponderante, 95,58 e 87,78% respectivamente. Os médicos em cerca de 34% das equipes, tendo sido discutido mais o seu papel na retaguarda, apoiando as equipes com o conhecimento específico. A participação de outros profissionais nas equipes (assistentes sociais, psicólogos e outros) foi em torno de 46,67%. Esses números devem ser avaliados enquanto integração processual da equipe, em trabalho multiprofissional. Na prática, a reivindicação da enfermagem quanto à necessidade de ampliar a participação dos demais profissionais especialmente dos médicos na recepção e retaguarda ao usuário, sempre foi constante no processo. De acordo com dados dos Centros de Saúde de Belo Horizonte, em julho de 2007 em uma pesquisa realizada por Malta et al (2000), a Saúde Mental implantou o acolhimento em 35,6% dos Centros de Saúde ou em todos aqueles onde existia a equipe de Saúde Mental. Por sua proximidade com famílias e comunidades, as equipes da atenção básica são um recurso estratégico para o enfrentamento de agravos vinculados ao uso abusivo de álcool, drogas e diversas formas de sofrimento psíquico. Existe um componente de sofrimento subjetivo associado a toda e qualquer doença, às vezes atuando como entrave à adesão a práticas preventivas ou de vida mais saudáveis. Poderíamos dizer que todo problema de saúde é também – e sempre – mental, e que toda saúde mental é também – e sempre – produção de saúde. (BRASIL, 2003) Dessa maneira, é imprescindível uma relação estreita da atenção básica com a saúde mental. 21 No que diz respeito ao acolhimento em saúde mental, existem duas maneiras do paciente ser acolhido. Uma das opções é procurar um serviço específico de Saúde Mental, como um CAPS ou CERSAM; a outra opção seria chegar em outro tipo de serviço de Saúde, como unidades básicas, centros de saúde ou hospitais gerais. O acolhimento na unidade de Saúde Mental dar-se-á de acordo com os verdadeiros princípios do acolhimento já citados. No entanto, quando se trata de pacientes que chegam a unidades básicas de saúde alguns usuários de Saúde Mental podem ser tido como pessoas difíceis de lhe dar pelos profissionais de saúde que trabalham naquele local. É nesse momento que o trabalhador de saúde tem de desenvolver uma maneira de lidar com essas pessoas, sejam elas portadoras de sofrimento mental ou não. Um pouco de tolerância e um pouco de firmeza costumam resolver essas situações. O que não é correto é encaminhar estas pessoas para a Saúde Mental meramente como forma de passar o problema adiante. Considerando que o paciente não se encontra em um estado grave, o profissional de saúde que recebeu o paciente na unidade básica deve escutá-lo e tentar avaliar o motivo real da chegada desse paciente nessa unidade. A partir de uma conversa inicial, de um melhorentendimento entre paciente e profissional, este deverá prosseguir o caso de uma maneira um pouco mais fundamentada. É inaceitável nessa situação o trabalhador não ouvi-lo, e tampouco deixar de realizar atitudes que poderiam ser benéficas para o paciente naquele momento. O fato de que o usuário ou seu familiar chegue ao serviço solicitando atendimento na Saúde Mental não significa que essa seja a melhor opção para ele. Quando alguém traz uma queixa de “depressão”, ou mostra uma receita de medicação psiquiátrica, isto não quer dizer necessariamente que se trate de um portador de sofrimento mental: afinal, muitas pessoas que estão atravessando um momento difícil de suas vidas são equivocadamente diagnosticadas assim. Portanto, não só o acolhimento, mas também o acompanhamento dessas pessoas muitas vezes podem ser feito pelas equipes dos Programas de Saúde da Família. Em um estudo realizado por Caçapava (2008), foi observado que existem alguns conflitos entre a unidade básica de saúde e os centros especializados de saúde mental, no sentido de não ocorrer a articulação e interação necessária entre 22 ambos os sistemas, impossibilitando reuniões técnicas proveitosas e dificuldades no trabalho em grupo. Outra dificuldade encontrada pelos profissionais da Unidade Básica, relatada por Caçapava (2008), refere-se a grande demanda de usuários com sofrimento psíquico que chegam à UBS e o número de vagas insuficientes para atendê-los de maneira acolhedora, o que traz um sentimento de angústia e impotência a esses profissionais. De maneira geral, não convém deixar o acolhimento dos portadores de sofrimento mental apenas a cargo da equipe de Saúde Mental, separando-o do acolhimento dos outros usuários. Contudo, deve-se ressaltar que: a qualquer momento, o técnico de Saúde Mental pode e deve ser chamado para ajudar a esclarecer uma dúvida, definir um encaminhamento, participar de uma avaliação. VÍNCULOS ORGANIZACIONAIS Segundo Siqueira e Gomide Júnior, as relações de trabalho preconizam uma disposição por parte do empregado e do empregador em estabelecer vínculos, além de poder indicar o comportamento desse funcionário frente à organização. Conforme definem Kramer e Faria, vínculo é uma estrutura na qual estão incluídos um indivíduo, um objeto e uma relação particular entre eles - do indivíduo ante o objeto e vice-versa -, ambos cumprindo determinada função. Com o intuito de facilitar a compreensão das relações de trabalho em equipes de saúde, é pertinente contextualizar o conceito de vínculo organizacional que, segundo pressupostos psicossociais, abarca a satisfação e o envolvimento com o trabalho, e o comprometimento com a organização, incluindo neste construto as percepções de justiça, suporte e reciprocidade organizacional. Partindo da interpretação individual dos funcionários acerca da instituição à qual estão vinculados, Robbins aponta que esta percepção baseia-se no modo como esse sujeito apreende as relações do seu contexto, e não necessariamente significa 23 a realidade em si. Já a justiça organizacional, que se caracteriza como um requisito básico para a compreensão das trocas, seja econômica ou social, que ocorrem nas relações entre os trabalhadores e suas organizações, não foi objeto de estudo nesta pesquisa. A percepção de suporte organizacional significa o quanto o funcionário acredita que a instituição oferece um apoio em relação às políticas de gestão de pessoas. Esta percepção configura-se como crenças globais acerca de o quanto o empregador cuida do bem-estar e valoriza as contribuições de seus empregados. A percepção de reciprocidade organizacional, por sua vez, está relacionada a uma troca de benefícios, que se configura como retribuição moral de favores. Se, em um momento, o empregado presta favores em benefício da instituição, pressupõe-se que, posteriormente, a instituição deverá agir em prol desse funcionário. Assim, tendo este sido doador para a organização no passado, a norma de reciprocidade permitiria ao empregado acreditar que, no futuro, a organização devedora retribuiria seus gestos sociais de ajuda quando ocorressem situações problemáticas em sua vida pessoal e/ou profissional. Portanto, a forma como o profissional percebe as relações dentro do seu contexto de trabalho e como interpreta a disponibilidade da instituição em retribuir suas atitudes em favor desta, tende a afetar o seu nível de comprometimento com o trabalho e com a organização. Deste modo, em relação ao conceito de comprometimento, embora não haja uma concordância universal entre os diversos estudos no que concerne à sua natureza, foi considerada nesta pesquisa a sua definição multidimensional. Assim, foram considerados os três componentes propostos por Allen e Meyer: afetivo, calculativo ou instrumental e normativo. O comprometimento afetivo refere-se a uma identificação com o trabalho, cujo foco está no desejo de permanecer vinculado, contribuindo com a organização. A dimensão calculativa diz respeito a trocas econômicas, ou seja, a uma avaliação acerca das perdas e ganhos, entre investimentos e danos associados a um possível rompimento com a instituição. O comprometimento normativo, por sua vez, refere-se a uma espécie de obrigação moral, uma retribuição de favores, relacionado a trocas sociais. 24 Vale ressaltar que, no que concerne ao ambiente de trabalho, essas três dimensões podem estar associadas, já que pode haver mais de uma razão para o sujeito se sentir comprometido com a organização. Em outras palavras, estas três variáveis podem aparecer simultaneamente, constituindo um sentido singular de comprometimento para cada funcionário. Em relação à satisfação, o conceito foi considerado de modo multidimensional, incluindo os componentes afetivos que o integram. Assim, a satisfação no trabalho é entendida como uma produção subjetiva, elaborada a partir da avaliação do trabalhador em relação ao ambiente de trabalho, sendo atravessada por elementos intrínsecos e extrínsecos ao cotidiano do trabalho. Em outras palavras, o trabalhador tende a se sentir satisfeito quando suas necessidades estão sendo supridas pela organização a partir do desempenho de sua função. O conceito de envolvimento utilizado nesta pesquisa pode ser definido como o grau de identificação psicológica da pessoa com seu trabalho e a importância deste para a autoimagem. Logo, a partir desta relação com a função desempenhada, alguns fatores podem funcionar como antecedentes do envolvimento, como características de personalidade, identificação com a tarefa, ou ainda, diálogo e participação nas decisões. Considerando que o conceito de vínculo organizacional, segundo Kramer e Faria, denota a ligação do indivíduo com a organização e o envolvimento com seus projetos e objetivos, assim como o comprometimento com seus problemas, políticas, desempenhos e resultados, parte-se do suposto de que indivíduos envolvidos, satisfeitos e comprometidos tendem a se sentir vinculados à instituição e ao trabalho. 25 CONSIDERAÇÕES FINAIS Grande proposta que toda essa revolução/evolução - no que diz respeito à história da saúde mental - se deu através de muitas lutas e desafios com vários nomes de relevância social envolvidos e fazendo a diferença para conseguir a adaptação dos pacientes em lugares que realmente sejam propícios para lhes promover um melhor tratamento e mantê-los em constante vínculo familiar. Dessa forma nasceu o CAPS. Com a criação dos CAPS no Brasil, e com suas sucessivas adaptações, foi desenvolvido um ambiente onde um os portadores de doenças mentais pudessem ser ajudados corretamente, sem serem desassociados da sociedade, possibilitando que o mesmo permaneça ao lado de sua família durante o tratamento. Desse modo, podemos dizer que a reforma psiquiátrica construiu ao longode um período, onde não se imaginava que era possível, um novo paradigma de instituição para pessoas com transtornos mentais graves ou não, e, dessa forma, também veio proporcionando grande avanço à população em geral com a forma de olhar para tais indivíduos, onde durante séculos foram jogados à margem da sociedade. Entende-se que o objetivo maior se encontra onde os Centros de Atenção Psicossociais são imprescindíveis à vida de sofredores de problemas mentais, de forma que visam interagir com o paciente reabilitando-o para a vida social, reintegrando-o ao meio, proporcionando tratamento adequado - uma vez que os dispositivos fornecem atividades diversas como estratégia aleatória para a reabilitação psicossocial do indivíduo, articulada nos Centros, mas desenvolvidas na comunidade e em sua vida, sendo que existe cinco tipos diferentes de Centros para melhor cuidar do necessitado. No CAPS são vistos diversos tipos de tratamentos, de acordo com a necessidade de cada paciente, como o atendimento intensivo, semi-intensivo e não intensivo, e também o atendimento individual, familiar, comunitário e etc., onde proporcionam maior controle e cuidado com os mesmos. Assim retomamos que a participação dos profissionais em conjunto com as práticas de reinserção social do CAPS pode tornar-se uma ferramenta adicional à vida adequada e digna merecida por tais indivíduos, e que também existe a necessidade de maiores investimentos aos Centros de Atenção Psicossociais, de modo estrutural, medicamentos e materiais. 26 Todavia, nota-se ainda a necessidade de novos estudos onde possa estar concedendo melhorias e maior difusão em sentido especial à quem ainda não sabe do que se trata o CAPS. 27 REFERÊNCIAS Almeida Filho, N. d. (2005). Transdisciplinaridade e o paradigma pós-disciplinar na saúde. Saúde e Sociedade, 14(3), 30-50. Berlink, M. T., Magtaz, A. C., & Teixeira, M. (2008). A reforma psiquiátrica brasileira: perspectivas e problemas. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 11(1), 21-27. Böing, E., & Crepaldi, M.A. (2010). O psicologo na atenção básica: uma incursão pelas políticas públicas de saúde brasileiras. 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