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Ensinar Historia - Genero

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Dulceli de Lourdes Tonet Estacheski e Jaqueline Ap. M. Zarbato 
 
 
ENSINAR HISTÓRIA: 
GÊNERO E EDUCAÇÃO 
 
 
 
2 
 
 
Reitor 
Mario Sérgio Alves Carneiro 
 
Chefe de Gabinete 
Bruno Redondo 
 
 
 
Direção 
Pró-reitora de Extensão e Cultura 
Cláudia Gonçalves de Lima 
 
 
Produção 
Obra produzida e vinculada pelo Projeto Orientalismo, 
Proj. Extens. UERJ Reg. 6078, coordenado pelo Prof. 
André Bueno [História] em associação com as Edições 
Especiais Sobre Ontens. 
 
Edições Especiais Sobre Ontens 
Comissão Editorial & Científica 
Dulceli Tonet Estacheski [UFMS] 
Everton Crema [UNESPAR] 
Carla Fernanda da Silva [UFPR] 
Carlos Eduardo Costa Campos [UFMS] 
Gustavo Durão [UFPI] 
José Maria Neto [UPE] 
Leandro Hecko [UFMS] 
Luis Filipe Bantim [Universidade de Vassouras] 
Maytê R. Vieira [UFPR] 
Nathália Junqueira [UFMS] 
Rodrigo Otávio dos Santos [UNINTER] 
Thiago Zardini [Saberes] 
 
Rede 
www.revistasobreontens.blogspot.com 
 
Organização do Volume 
 
Ficha Catalográfica 
 
Estacheski, Dulceli de L. T.; Zarbato, Jaqueline A. M. (org.) 
Ensinar História: Gênero e Educação. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Proj. Ori./Ed. 
Esp. Sobre Ontens/UERJ, 2022. 
ISBN: 978-65-00-52645-5 264p. 
 
Ensino de História; Educação; Estudos de Gênero; Sexualidades 
 
 
 
 
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Sumário 
APRESENTAÇÃO: GÊNERO, EDUCAÇÃO E ENSINO DE HISTÓRIA por Dulceli de Lourdes Tonet 
Estacheski e Jaqueline Aparecida Martins Zarbato ....................................................................... 6 
HISTÓRIA DAS MULHERES E ENSINO DE HISTÓRIA NO BRASIL por Ana Maria Lucia do 
Nascimento ................................................................................................................................. 10 
REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS PARA UMA EDUCAÇÃO LIBERTADORA: A PERSPECTIVA 
INTERSECCIONAL EM ENSINANDO A TRANSGREDIR, DE BELL HOOKS por Ana Paula Oliveira 
Lima ............................................................................................................................................. 19 
ENSINO DE HISTÓRIA E HOMOSSEXUALIDADE: UMA EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE SEXUAL 
E DE GÊNERO por Antonio Xavier M. Neto e Jefferson G. Silva Espinoza ................................... 27 
ENSINO DE HISTÓRIA E DECOLONIALIDADE: CONTRIBUIÇÕES DA INTERCULTURALIDADE E DA 
INTERSECCIONALIDADE NOS ESTUDOS DE GÊNERO por Caroline Machado Costa e Giovanna 
Santana ........................................................................................................................................ 34 
ENSINO DE HISTÓRIA E GÊNERO: ANÁLISE POR MEIO DA TRAGÉDIA GREGA por Darcylene 
Pereira Domingues ...................................................................................................................... 42 
RELATO DE EXPERIÊNCIA – PROJETO DIREITO DAS MULHERES: UMA TRAJETÓRIA DE LUTAS por 
Edivaldo Rafael de Souza............................................................................................................. 50 
O SALTO ALTO NO PODER: AUMENTO DA PARTICIPAÇÃO FEMININA NA POLÍTICA COMO 
REFLEXO DAS AÇÃOS AFIRMATIVAS DE GÊNERO NO BRASIL NA CAMARA DOS DEPUTADOS por 
Everlly Silva Bezerra de Lima ....................................................................................................... 58 
QUEERBAITING: ESTRATÉGIAS MIDIÁTICAS E REPRESENTATIVIDADE LGBTQIA+ EM SÉRIES 
TELEVISIVAS por Fernanda dos Anjos da Nóbrega ...................................................................... 66 
PEREGRINAÇÕES DE UMA PÁTRIA: FLORA TRISTA E A FIGURA FEMININA NA SOCIEDADE 
PERUANA (1838) por Gabrielle Legnaghi de Almeida ................................................................. 72 
MULHERES APRESENTAM MULHERES: EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA EM DIÁLOGO COM OS 
ESTUDOS DE GÊNERO por Georgiane G. Heil Vázquez e Angela Ribeiro Ferreira ...................... 78 
MANIFESTAÇÕES DO ÚTERO: CONCEPÇÕES MÉDICAS ACERCA DA MENSTRUAÇÃO E 
ANOMALIAS NO SÉCULO XVIII EM ERÁRIO MINERAL (1735) DE LUÍS GOMES FERREIRA por 
Gessica de Brito Bueno e Christian F. M. dos Santos .................................................................. 85 
A REPRESENTAÇÃO DAS MULHERES NEGRAS EM MUSEUS AFRO-BRASILEIROS por Heidi Ester 
Oliveira Barbosa .......................................................................................................................... 93 
A SITUAÇÃO FEMININA NO INÍCIO DO MEDIEVO: A REGRA PARA AS VIRGENS DE CESÁRIO DE 
ARLES (c. 470-542) E SUA UTILIZAÇÃO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES por Luciano José 
Vianna e Ianca Ferreira Soares .................................................................................................. 101 
A HAGIOGRAFIA DE SANTA BÁRBARA EM SALA: REFLETINDO QUESTÕES DE GÊNERO PARA O 
CONHECIMENTO HISTÓRICO NO AMBIENTE ESCOLAR por Jacqueline Ferreira Dias e Marcos de 
Araújo Oliveira ........................................................................................................................... 108 
4 
 
AS LEIS DOS FRANCOS SÁLIOS (SÉCULO VI): DIVERSIDADE SOCIAL FEMININA NA FORMAÇÃO 
DOCENTE EM HISTÓRIA por Luciano José Vianna e Jefferson David Fonseca Alves ................. 117 
UM OLHAR SOBRE AS NARRATIVAS HISTORIOGRÁFICAS DA MULHER MEDIEVAL NA 
LITERATURA INFANTIL E O CONTEXTO ESCOLAR por Joelândia Nunes Ulisses de Oliveira ...... 124 
A REPRESENTAÇÃO FEMININA NO LIVRO O DECAMERÃO (1348-1353) DE GIOVANI BOCCACCIO 
(1313-1375)por José Carlos da Silva Ferreira ............................................................................ 133 
O OLHAR FEMININO NOBRE NO TRATADO DO AMOR CORTÊS (C.1186) DE ANDRÉ CAPELÃO 
(1150-1220) por Juliana Caroline de Souza Araújo ................................................................... 140 
VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BBB 20: UM REFLEXO DA SOCIEDADE por Ketherine Acosta 
dos Santos e Felipe Lucas Fagundes.......................................................................................... 146 
MEMÓRIAS E MULHERES NEGRAS E EDUCAÇÃO por Leila Carla Antunes Novaes e Jaqueline Ap. 
M. Zarbato ................................................................................................................................. 154 
REFLEXÕES SOBRE ENSINO DE HISTÓRIA MEDIEVAL PÓS BNCC: COMO A MULHER É VISTA NA 
BASE E NOS LIVROS DIDÁTICOS? por Lorene Rose Ribeiro dos Santos..................................... 160 
GÊNERO E ENSINO DE HISTÓRIA: NECESSIDADES E CONTEXTOS por Lorenna Rochinski ........ 166 
CIRCULANDO AS AULAS DE HISTÓRIA: O CÍRCULO DE DIÁLOGO NA EDUCAÇÃO DE GÊNERO por 
Luciane Corrêa........................................................................................................................... 173 
DITADURA, FEMINILIDADES E MASCULINIDADES EM FAZENDA MODELO DE CHICO BUARQUE 
por Marcos Antonio Leite Junior ............................................................................................... 182 
CARTOGRAFIA DAS PRODUÇÕES SOBRE POPULAÇÃO LGBTQIAPN+ EM HISTÓRIA NO BRASIL 
(1987-2018) por Mariana B. de Souza e Georgiane G. Heil Vázquez ........................................ 189 
TRAJETÓRIAS DE VIDA E DE LUTA DE MULHERES DO ASSENTAMENTO BELA MANHÃ por 
Mariani Xisto de Souza .............................................................................................................. 198 
CORPO TORTURADO. VIOLÊNCIA E OPRESSÃO INQUISITORIAL CONTRA FILIPA NUNES (1597) 
por Marize Helena de Campos .................................................................................................. 207 
MÃOS FEMININAS QUE ALIMENTAM : UM ESTUDO SOBRE A IMPORTÂNCIA DAS MULHERES NA 
ALIMENTAÇÃO NATIVA DA AMÉRICA PORTUGUESA DO SÉCULO XVI por Nathália Moro e 
Anelisa Mota Gregoleti ............................................................................................................. 215 
GÊNERO E MASCULINIDADES NA SALA DE AULA: O ENSINO DE HISTÓRIA ATRAVÉS DAS 
PERFORMANCES DOS HOMENS PÚBLICOS NO MARANHÃO REPUBLICANO por Pâmela Queres 
Bezerra e Jakson dos Santos Ribeiro .........................................................................................
222 
DOS TRAJES DE CRIOULA AOS SÍMBOLOS DAS MULHERES NEGRAS: APRENDIZAGEM HISTÓRICA 
E MEMÓRIA (1990 - 2019) por Renata Teodoro Pereira........................................................... 230 
TROTULA DI RUGGIERO (1050-1097) E O ENSINO MEDICINAL: O ZELO DA MÉDICA DE SALERNO 
PARA O CONTEXTO FEMININO MEDIEVAL por Rita de Cássia Rodrigues ................................. 236 
GÊNERO E DECOLONIALIDADE DO SABER: NOTAS PARA OUTRAS PRÁTICAS EM HISTÓRIA por 
Silvia Ayabe ............................................................................................................................... 243 
5 
 
HQ “O CONTO DA AIA” E SUA POTENCIALIDADE NO ENSINO DE HISTÓRIA por Tayane Ferreira 
de Almeida ................................................................................................................................ 251 
RELATO DE EXPERIÊNCIA PEDAGÓGICA: PALESTRA EDUCATIVA SOBRE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL 
E SUAS NUANCES por Wagner Pereira de Souza....................................................................... 259 
 
 
6 
 
 
APRESENTAÇÃO: 
GÊNERO, EDUCAÇÃO E ENSINO DE HISTÓRIA 
Dulceli de Lourdes Tonet Estacheski e Jaqueline 
Aparecida Martins Zarbato 
 
 
O Simpósio Eletrônico Internacional de Ensino de História foi idealizado como 
um espaço democrático de socialização de pesquisas históricas, educacionais 
e de relatos de experiências de ensino. Ao longo de suas oito edições esse 
objetivo foi alcançado e foram recebidos, avaliados, selecionados e publicados 
textos de pesquisadores/as, de docentes da educação básica e universitária e 
de estudantes de graduação e pós-graduação. Ricos debates aconteceram 
durante os eventos, aproximando autores/as e leitores/as, estimulando novas 
pesquisas, novas publicações, novas práticas de ensino e novos relatos de 
experiências. 
 
Os estudos de gênero e as experiências escolares e universitárias que os têm 
como temática tiveram sempre um lugar reservado nos simpósios e as edições 
anteriores resultaram em algumas publicações específicas sobre o tema: 
Aprendizagens históricas: gênero e etnicidades (2018), Aprendendo História: 
Gênero (2019), Ensino de História e estudos de gênero (2020) e Caminhos da 
Aprendizagem Histórica: Relações de Gênero e Sexualidade (2021). Todas 
disponibilizadas gratuitamente nas Edições Especiais da Revista Eletrônica 
Sobre Ontens (disponível em: http://revistasobreontens.blogspot.com/ 
p/livros.html) para que mais pessoas possam ter acesso aos resultados de 
pesquisas, aos relatos de experiências, para que possam crescer em 
conhecimento e inspirar-se para novas práticas. 
 
Durante a organização desta oitava edição do simpósio dialogamos sobre 
quais temáticas deveriam ser mantidas para as mesas de debates que seriam 
propostas e de forma unânime definimos a manutenção de um espaço 
específico para os estudos de gênero em suas relações com a educação e o 
ensino de História. Tal decisão parte da consideração de que é imprescindível 
dar continuidade às reflexões, pois, embora o avanço nas pesquisas dos 
estudos de gênero, nas mais diversas áreas do conhecimento, seja notório, 
ainda observamos que há falta de conhecimento, concepções equivocadas e 
pré-conceitos sendo divulgados em muitos espaços da nossa sociedade. Essa 
realidade influi em práticas sociais discriminatórias, violentas (e aqui pensamos 
nas diferentes formas de violência, física, moral, psicológica, sexual, etc.), que 
causam sofrimento para muitas pessoas. 
 
7 
 
Como pesquisadoras da área e como professoras de História, atuantes na 
formação docente, entendemos que devemos aproveitar todos os espaços para 
promover a produção e a socialização de conhecimentos, para estimular 
transformações sociais que contribuam para a construção de um mundo mais 
justo, mais digno para todas as pessoas. Com isso em mente, selecionamos os 
textos encaminhados para o 8º Simpósio Eletrônico Internacional de Ensino de 
História para a Mesa Gênero, Educação e Ensino de História que foram foco de 
importantes debates e que estão agora reunidos nessa publicação. 
 
Ao todo são 34 textos de pesquisadores/as que apresentam resultados de seus 
mais recentes estudos na área; de docentes da educação básica e de 
universidades que socializam diversas experiências de ensino e provocam 
reflexões teórico metodológicas para as abordagens do tema nas escolas e em 
outros espaços de formação; e de estudantes que estão iniciando suas 
trajetórias na pesquisa dos estudos de gênero. 
 
Entre as pesquisadoras dos estudos de gênero, destacamos o texto de 
Georgiane Garabely Heil Vázquez e Angela Ribeiro Ferreira que apresentam 
os resultados de um Projeto de Extensão Universitária desenvolvido na 
Universidade Estadual de Ponta Grossa, no Paraná, ‘Mulheres apresentam 
Mulheres’, ressaltando a relevância de ações que valorizam a produção e as 
narrativas de mulheres no meio universitário e também o texto de Marize 
Helena de Campos, professora da Universidade Federal do Maranhão que 
apresenta os resultados de uma pesquisa que teve como fonte um processo 
inquisitorial de 1597 que nos leva a refletir sobre vivências de mulheres durante 
a vigilância do Tribunal do Santo Ofício em Lisboa. O primeiro exemplo destaca 
a extensão universitária e pode estimular ações semelhantes em outros 
espaços e o segundo apresenta um tema de pesquisa em meio à vastidão de 
possibilidades que os estudos de gênero permitem. 
 
Outras pesquisadoras que desenvolvem suas pesquisas de doutorado na 
Universidade Federal de Santa Catarina, na Universidade Federal de Pelotas, 
na Universidade Estadual de Maringá e pesquisas de mestrado profissional ou 
acadêmico na Universidade Federal Rural do Pernambuco, na Universidade 
Federal de Brasília, na Universidade de Pernambuco, na Universidade 
Estadual de Ponta Grossa/PR, na Universidade Federal da Grande Dourados, 
na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e na Universidade Federal de 
Pernambuco, tem aqui seus textos publicados. Fizemos questão de destacar 
todas essas instituições, pois isso demonstra a abrangência do evento que 
reúne pessoas de diferentes regiões brasileiras. 
 
Consideramos relevante destacar também que nas diferentes edições do 
evento nós contamos com docentes da graduação em História de diferentes 
instituições, como a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, a 
Universidade Estadual do Maranhão, da Universidade de Pernambuco e da 
Universidade Estadual de Maringá, que orientam seus/suas bolsistas de 
Programas de Iniciação Científica a publicarem seus artigos no evento. Essa 
8 
 
prática, que se efetivou também nessa edição, é um estímulo para eles/as e 
outros/as estudantes que iniciam suas trajetórias acadêmicas. 
 
Profissionais recém-formados/as em cursos de História e de outras áreas do 
conhecimento, aproveitam para publicizar aqui as pesquisas que 
desenvolveram em seus Trabalhos Finais de Conclusão de Curso e docentes 
da educação básica contribuem muito relatando suas profícuas experiências 
em sala de aula, nas escolas em que atuam. 
 
As narrativas são diversas e as temáticas também. Temos reflexões teórico 
metodológicas para aqueles/as que desejarem aprofundar seus estudos; temos 
capítulos com conteúdos específicos que podem colaborar na pesquisa e no 
ensino de diferentes temas e temos as narrativas sobre práticas desenvolvidas 
em escolas e universidades que revelam possibilidades múltiplas de ações. 
 
Desejamos uma ótima leitura a todas/os e que ela inspire novas reflexões, 
novas pesquisas e novas práticas sociais! 
 
 
9 
 
TEXTOS 
 
 
 
10 
 
 
HISTÓRIA DAS MULHERES E ENSINO DE HISTÓRIA 
NO BRASIL 
Ana Maria Lucia do Nascimento 
 
 
A História das Mulheres de Perrot a Priore 
 
A antiga forma de construir a historiografia, costumeiramente chamada de 
positivista, dava holofote a personagens, em geral, masculinos. Esses homens 
foram os heróis que se responsabilizaram por construir grandes sociedades, 
destruir inimigos e alavancar nações. São referências
e, por isso, foram 
homenageados em monumentos. Pertencer a esta grande narrativa significava, 
e ainda significa, prestígio. Elizabeth Fox Genovese (1987) chama isto de 
“história de governantes e de batalhas”. Nessa construção da história não 
existia espaço para as mulheres, mas não só elas: “também não havia lugar 
para quem não ocupava cargos no Estado ou não dirigia guerras, não 
importando se fossem homens ou mulheres” (PEDRO, 2005, p. 80). Esses 
teóricos eram contrários à louca visão romântica. 
 
De fato, para os historiadores de “visão romântica”, a grande cisão da História 
acontece justamente a partir das críticas que a Escola dos Annales 
proporcionou nos anos 30. Entretanto, “o que interessa primordialmente a Marc 
Bloch e Lucien Febvre, e mais ainda a Ernest Labrousse e Fernand Braudel, 
seus sucessores, são os planos econômico e social” (PERROT, 1995, p. 15). 
De acordo com Perrot, só a partir dos anos 70, a terceira geração da revista se 
mostrou mais receptiva quanto à presença da dimensão sexuada no interior da 
evolução histórico-temporal, ainda que espontaneamente não demonstre tal 
interesse. Diante dessas duas maneiras clássicas de ver e produzir a 
historiografia, Chartier levanta a questão da crise na História. 
 
A “crise da história” seria o resultado da quebra com as tradições “historicistas” 
e “positivistas”, que acreditava ser uma ciência imparcial e objetiva, sendo 
gerada por um choque epistemológico. Para além das questões de novos 
conceitos, o autor também estabelece as bases da História cultural, essa, 
todavia seria uma ferramenta de análise da realidade social, ou seja, de uma 
realidade que é dada a ler. A partir de então, a História se constitui mais uma 
vez como um discurso que produz enunciados científicos (CHARTIER, 2009, p. 
16). Desde essa renovação, novos sujeitos, temas e conceitos foram inseridos. 
 
Para Pesavento, o termo História Cultural é também chamado de Nova História 
Cultural, justamente, por pensar a cultura como um conjunto de significados 
partilhados e construídos pelos homens para explicar o mundo. Com isso o que 
era antes visto como cultura, ou seja, criações ligadas apenas a elite, ou para a 
11 
 
elite, ou como fruto dela, agora assume outro espírito que, através dessas 
reformulações, quebraram com alguns dos paradigmas já pré-estabelecidos. A 
autora em sua análise estabelece que a antropologia cultural foi importante 
para o debate sobre a dimensão simbólica e para a análise das dimensões 
sociais (PESAVENTO, 2012, p. 30). 
 
Acrescenta-se ainda a preocupação com o estabelecimento de conceitos que 
até anteriormente não eram levados em consideração como o de 
representação, somados aos conceitos de poder simbólico, imaginário, 
mentalidade, narrativa, ficção e sensibilidade, consolidando a proposta central 
desta nova vertente (PESAVENTO, 2012, p. 45). 
 
Para os historiadores que se dispuseram a introduzir novos sujeitos como 
construtores da história, seguindo a tradição da historiografia dos Annales, 
formaram uma gama de estudos que, concentrados na Europa, tinham como 
objetivo estudar as massas operárias e sua forma de trabalho. Thompson 
(2001, p. 20), aponta como esse “campo”, qual seja, a História vista de baixo, 
surge na Inglaterra com o intuito de construir uma base de informações acerca 
da história dos sindicatos, dos operários e do trabalho. Para Perrot (1995, 
p.16), mulheres como Simone de Beauvoir juntamente com Andrée Michel e 
Christine Delphy, foram as pioneiras na discussão sobre o feminino dentro da 
classe operária. 
 
A própria pesquisadora francesa Michelle Perrot é um dos expoentes da 
História das mulheres na Europa. Em muitos dos seus escritos Michele aborda 
o porquê se escrever uma história que insira o feminino. Percebemos também 
como o corpo, a alma, a religião, a cultura e o acesso ao saber são pontos de 
análise da autora. Para ela, existia uma forte lacuna no que tange ao trabalho 
feminino tanto no campo, quanto na cidade. Além das várias categorias que 
essas personagens comuns preenchiam (PERROT, 2007, p. 20). Ao partir das 
questões das ausências, ela salienta que a história era excludente, como se 
existisse uma linha oficial onde elas não se encaixavam. 
 
Acerca do fator da exclusão, a autora norte americana Gerda Lerner (2019, p. 
28), aponta que existiu dois polos na construção historiográfica: história versus 
História - “história”, o passado registrado com a inicial minúscula e “História” o 
passado registrado com inicial maiúscula. A diferença pode ser enfatizada da 
seguinte forma, para a “História”, até o passado mais recente, os historiadores 
eram homens, e o que registraram era o que o homem havia feito, vivenciado e 
considerado significativo. Chamaram de História e consideraram universal. 
Cabendo aos referentes femininos continuarem dentro da “história”, mesmo 
sendo peças centrais, e não marginais, para a criação da sociedade e a 
construção da civilização. 
 
Porém, embora as mulheres tenham sido subjugadas, é um erro básico tentar 
conceituar as mulheres essencialmente como vítimas. Agir de tal forma, 
impede-nos de perceber como os referentes femininos são peças essenciais e 
centrais para criar e manter a sociedade. De fato, através delas surgem as 
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novas pautas que as inserem como objetos de estudos. Para Joana Maria 
Pedro (2005, p. 80) o que influenciou a mudança de perspectiva dos 
pesquisadores foi o movimento feminista que, na sua primeira onda lutava a 
favor de direitos civis femininos, e na segunda onda, pela liberdade em geral, 
inclusive do corpo e do ato de gerar. 
 
Para as pesquisadoras feministas deveria existir um grupo que mostrasse a 
existência feminina, uma categoria que percebesse a multiplicidade do delas. 
Assim, dentro dos padrões de pesquisas, o termo de análise do objeto passou 
a ser intitulado de “mulheres”, no fim das contas. E mais para frente de 
“gênero”. 
 
Vale salientar que algumas características ligadas ao processo de pesquisa 
também adquirem fôlego nessa época. Para Pinsky (2009, p. 164), a História 
das Mulheres adquiriu expressão a partir da década de 1970, “dá-se ênfase em 
temas como família, sexualidade, representações, cotidiano, grupos 
“excluídos”. Seu sucesso atrelou-se aos avanços da Nouvelle Histoire, Social 
History, Cultural History e dos Estudos de População. A autora aponta ainda 
que a produção historiográfica passível da História das Mulheres é bastante 
diversificada em termos de assuntos e métodos. De acordo com Perrot, após 
essa ruptura, muitas historiadoras afastaram-se de uma história regida por um 
sentido, militante, movendo-se em busca da idade do ouro e de ancestrais 
heroicos - Matriarcado, Amazonas (PERROT, 1995, p.22). 
 
Um dos primeiros passos tomados pelos historiadores, de acordo com Pinsky 
(2009, p. 170), foi voltar aos métodos antigos e escrever biografias de mulheres 
e as evidências da participação feminina nos acontecimentos históricos e na 
vida pública. Assim: “Nas pesquisas sobre “pessoas comuns”, as mulheres 
também foram contempladas em “biografias coletivas” de diversos grupos 
sociais” (TILLY, 1990, p. 40). Certos trabalhos apresentaram as mulheres 
atuando na história da mesma forma que os homens. Enquanto outros 
separavam a história produzida pelas mulheres e pelos homens. Mais uma vez 
vê-se o isolamento da “cultura das mulheres”, conforme Lerner apontou, como 
se elas não fizessem parte da História geral e oficial. 
 
Após mais de cinquenta anos, consolidou-se um campo de pesquisas que 
evoluiu nos seus objetos, seus métodos e pontos de vista. Tratava-se 
inicialmente de tornar visível o que estava escondido, de reencontrar traços e 
de se questionar sobre as razões do silêncio que envolvia as mulheres 
enquanto sujeitos da história. Isso conduziu a uma reflexão em torno da história 
enquanto produto da dominação masculina, a qual atuava em dois níveis: nível 
dos próprios acontecimentos e nível da elaboração deles empreendida pelo 
relato (PERROT, 1994, p.
19). 
 
Ademais, com o crescimento do campo, as pesquisas sobre o feminino na 
história tomaram como objeto de análise as prostitutas, as domésticas, as 
operárias, as mulheres agredidas, as vítimas e, sobretudo, a expressão da 
13 
 
condição feminina. Na investigação de Perrot, emerge como central a questão 
do corpo das mulheres, suas funções, sua apropriação, sua representação. 
 
Essas perspectivas de inserção do feminino influenciou as várias pesquisas no 
Brasil. Mas essa porta nos foi aberta por volta dos anos de 1970. Ao apontar 
como os teóricos europeus inspirou os brasileiros, a escritora Heloisa Buarque 
de Hollanda (1994, p. 10), aponta que a partir da década de 70 o feminismo 
como ideologia política surge como novidade no campo acadêmico, e se impõe 
como uma tendência teórica inovadora e de forte potencial crítico e político. 
No Brasil muitas foram as historiadoras que se dedicaram a esse campo, 
aponta Mary Del Priore que deu voz as resistências femininas. Para a autora 
era importante conduzir uma produção que falasse mais do que apenas das 
misérias da vida feminina, pois era importante dar holofote aos poderes e 
estratégias de resistência que elas articulavam, para burlar o poder masculino 
e a imposta subordinação (PRIORE, 1994, p. 34). Assim, com os escritos de 
Del Priore, observa-se que as primeiras produções ficaram muito centradas no 
período colonial, fazendo uso de relatos de viajantes, processos civis e 
iconografia como fonte (SILVA, 2008, p. 227). 
 
No entanto, mesmo diante dos avanços, é importante perceber os espaços nos 
quais das mulheres pouco se fala. Faço menção ao espaço escolar, onde os 
materiais muitas vezes atrasados, acabam perpetuando uma visão de história 
na qual elas não são sujeitos ativos em sua construção. Por vezes é comum 
perceber um abismo entre os novos frutos dos trabalhos historiográficos 
acadêmicos e os escolares. Essa grande distância nos chama a atenção e nos 
leva a refletir sobre os motivos que cercam essa questão. 
 
As Mulheres no Ensino de História 
 
Mesmo diante da inserção de novas temáticas no meio acadêmico, nota-se 
como o feminino na educação e no Ensino de História pouca evolução teve. Ao 
recordar a raiz da ausência de referentes femininos somos levados a pensar na 
forma como a educação das mulheres foi moldada. Aqui no Brasil, o sistema 
educacional tornou-se mais uma expressão das dessemelhanças entre homens 
e mulheres. De acordo com Hahner, percebemos como a educação para as 
meninas permanecia atrasada em relação à dos meninos. O processo 
educacional foi tão difícil para elas, que quando permitido “não devia ir além 
dos livros de orações, porque seria inútil à mulher, nem deveriam, elas, 
escrever, pois como foi justamente observado, poderiam fazer mau uso desta 
arte” (HAHNER, 1980, p.56). 
 
O pontapé de mudança é apontado por Rosemberg como o um longo processo 
para a permissão legal do acesso geral e irrestrito das brasileiras à educação 
escolar. Vemos, por exemplo, que apenas em 1827 foi autorizada a Lei Geral 
do ensino de 5 de outubro, mas era restrita apenas às escolas femininas de 
primeiras letras. Dessa forma, a educação para as mulheres só conseguiu 
romper as últimas barreiras legais em 1971 com a Lei de Diretrizes e Bases da 
14 
 
Educação (LDB) que atribuiu equivalência entre os cursos secundários 
(ROSEMBERG, 2016, p. 334). 
 
Entretanto, o debate estabelecido por Hahner nos anos de 1980 acerca do 
processo educacional e de como essas mulheres recebiam uma instrução 
diferente, só se ampliou com o passar do tempo. Por mais que aos poucos o 
direito civil ao estudo e formação profissional feminina fosse ampliado, não se 
pode deixar de pontuar como o Ensino de História permaneceu por longos 
anos atrasados em suas temáticas de ensino. Por outro lado, é importante 
perceber que essa é uma discussão levantada até os dias de hoje, pois pouca 
melhora aconteceu. 
 
As últimas publicações acerca do feminino no Ensino de História nos mostram 
como a partir de 2015 houve um intenso interesse em elucidar essas questões. 
Para Souza, há uma grande relação de aprisionamento do feminino que tem 
sido remodelada no século XXI. Notamos que essas mudanças, de acordo com 
a autora, incomodam grupos políticos da sociedade que ao não concordam 
com o estudo de gênero nas escolas, lutam contra a reformulação dos 
materiais didáticos (SOUZA, 2020, p. 20). Por outro lado, fazendo uso de uma 
metodologia muito comum no campo do ensino, ela analisa doze livros 
didáticos de História que foram escritos em função das orientações da BNCC, 
na busca de estudar como os materiais abordavam a História das Mulheres e 
as questões de gênero. 
 
Com base nisso, foi constatado que as mulheres e suas histórias ainda são 
marginalizadas nos livros, todavia, algumas obras apresentam informações que 
possibilitam aos educandos refletirem sobre como o gênero é atravessado 
pelas questões de classe e étnico-raciais, e como os desígnios de gênero 
podem mudar de uma sociedade para a outra. 
 
Ademias, nos debates acerca das ausências de sujeitos históricos, algumas se 
indagam sobre o que ocasiona o efeito “falta de comunicação” na História, ou 
seja, por que os avanços no campo da História, por exemplo, não refletem nos 
materiais didáticos que essas mulheres têm acesso nas escolas? Se as 
pesquisas estão sendo produzidas, onde está a falha? 
 
Duas questões foram elencadas para responder a essa problemática. Ferreira 
(2006, p. 100) aponta como a história das mulheres fica à mercê da mediação 
que o livro didático faz entre o conhecimento produzido dentro das 
universidades e o saber escolar. Para a autora, é notável que muito pouco do 
que foi produzido pelos historiadores a respeito das mulheres no ensino de 
história, foi incluído nos textos didáticos, logo, fica evidente as incongruências 
entre as demandas sociais de representação de personagens para o estímulo 
de uma cidadania ativa, pois nessa relação os referentes femininos não 
aparecem devidamente a disposição dos alunos. 
 
Além das questões que cercam o debate acerca da falha da mediação que o 
livro didático faz com o conhecimento produzido, outros autores discutem ainda 
15 
 
as questões de identidade que cercam os professores. Para Viana, no 
processo de escrita dos historiadores acerca da inserção de novos sujeitos no 
ensino de história, deve-se pensar a respeito da prática da escrita sendo 
conduzida pelas novas condições de produção, elencando também a 
necessidade de repensar durante essa ação o “novo perfil do professor” na 
pós-modernidade (VIANA, 2017, p. 19-20). 
 
Para a autora quando bem analisado o espaço acadêmico contribui de forma 
efetiva para a formação do professor de história e consequentemente para a 
formação da identidade do pesquisador. Soma-se a isso o fato de que 
enquanto sujeito pesquisador fruto do seu tempo e, consequentemente, a 
mercê das mudanças da identidade cultural na pós-modernidade, o docente 
recai dentro de uma dualidade ao perceber que a sua identidade não é fixa e 
sim plural. 
 
Para Pacheco (2020, p. 222-223) o debate sobre identidades pode direcionar 
as respostas acerca da ausência do feminino em sala de aula. O autor percebe 
que a discussão que cerca o tema da formação das identidades dentro do 
espaço temporal em que os nossos alunos estão, onde os debates sobre o 
feminino se encontram tão presente, é de suma importância para entender não 
só como esse discente pode vir a construir sua identidade nesse meio social, 
como também, salienta a perspectiva de uma “crise identitária” nos docentes. 
Assim, ao debater os princípios que contribuem para formar as identidades 
sociais e, particularmente, a identidade do indivíduo através da subjetividade 
que ele incorpora da sociedade em que vive, ele nos leva a pensar sobre as 
práticas sociais de um grupo e a incorporação de hábitos que contribuem para 
a formação da sua própria identidade. 
 
Portanto, o historiador se mantém como sujeito que forma e
difunde a memória. 
Cabendo ainda ao mesmo a capacidade de denunciar o que o autor intitula de 
“historicidade das identidades sociais”, ou melhor, trazer luz os elementos 
simbólicos constitutivos de cada identidade social e de como eles são 
construções históricas carregadas de interesses e compromissos de poder 
(PACHECO, 2020, p. 225). E, enquanto cumpre esse papel, passa a conceber 
a sua própria memória individual. A respeito da memória individual, a 
entendemos da seguinte forma: 
 
“Na experiência vivida, a memória individual é formada pela coexistência, 
tensional e nem sempre pacífica, de várias memórias (pessoais, familiares, 
grupais, regionais, nacionais etc.) em permanente construção, devido à 
incessante mudança do presente em passado e às alterações ocorridas no 
campo das re-presentações (ou re-presentificações) do pretérito (CATROGA, 
2015, 43).” 
 
Para Catroga é importante perceber que as memórias individuais, fator 
importante no processo da construção da subjetividade do indivíduo, se forma 
a partir de uma coexistência com grupos sociais e da escolha daquilo que se 
sobrepõe ao passado. Podemos perceber também como “a consciência do eu 
16 
 
se matura em correlação com camadas memoriais adquiridas, tem de se ter 
presente que estas, para além das de origem pessoal, só se formam a partir de 
narrações contadas por outros, ou lidas e vistas em outros: o que prova que a 
memória é um processo relacional e intersubjetivo.” (CATROGA, 2015, 113). 
 
Nota-se que no processo de formação da constituição das memórias e 
identidades do historiador, por exemplo, há uma seleção do que será ou não 
esquecido. Dessa forma, o historiador se encontra nesse fogo cruzado, afinal 
de contas, ele é o formulador de pesquisas históricas responsáveis por 
contribuir para a formação da memória e identidade coletiva das pessoas, mas 
se encontra também formando a sua própria identidade e memória. E aqui 
entra uma das questões importantes discutidas anteriormente: o historiador 
diante da formação da sua própria identidade individual entra numa grande 
polarização, o historiador professor versus o historiador pesquisador. 
 
Logo, uma das respostas para o questionamento do porquê pesquisas do 
campo histórico não estão sendo discutidas em sala de aula, pode ser 
respondida da seguinte forma: há a possibilidade de o professor não ter uma 
identidade individual que se importe com uma prática pedagógica que 
propague pesquisas, como as sobre o feminino, por exemplo. Assim, percebe-
se que a lacuna do feminino no ensino pode ser apontada fazendo menção a 
falta de denúncia do professor, ou da inexistência de diálogo com as pesquisas 
estabelecidas dentro do campo historiográfico. 
 
Referência biográfica 
 
Ana Maria Lucia do Nascimento: Mestranda em História pela Universidade 
Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Formada em História pela 
universidade de Pernambuco (UPE). Pesquisadora da FACEPE. Pesquisadora 
do grupo de pesquisa Leitorado Antigo da Universidade de Pernambuco. 
Trabalho financiado pela FACEPE. 
Contato: anamarialuciadonascimento@gmail.com. 
Lattes: http://lattes.cnpq.br/8045117367096627 
 
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Pernambuco, Programa de pós-graduação em História, Pernambuco, 2017. 
 
 
 
19 
 
 
REFLEXÕES E ESTRATÉGIAS PARA UMA EDUCAÇÃO 
LIBERTADORA: A PERSPECTIVA INTERSECCIONAL 
EM ENSINANDO A TRANSGREDIR, DE BELL HOOKS 
Ana Paula Oliveira Lima 
 
 
Introdução 
 
Ao longo das últimas décadas, o debate sobre educação e liberdade tem 
apresentado cada vez mais ideias e práticas originárias do Sul Global. As 
intelectuais negras se destacam na reivindicação de uma educação não 
opressora que desafie, em conjunto, cada fundamento de desigualdade 
presente nas respectivas sociedades em que estão inseridas. Nesse sentido, 
esta análise centra-se na discussão de reflexões e estratégias para uma prática 
pedagógica crítica a partir de bell hooks e dos fundamentos elencados na obra 
Ensinando a Transgredir: a educação como prática da liberdade, difundido ao 
público pela primeira vez em 1994 (no Brasil, quase duas décadas depois, em 
2013, com a publicação pela Editora WMF). 
 
A literatura de hooks sobre hierarquias de gênero, como a de perspectiva 
pedagógica, conclama ao engajamento e à criticidade na interpretação de 
incidências estruturais nas relações humanas. Ao longo dos escritos, é possível 
capturar a transversalidade que atravessa as análises. Os eixos de 
subordinação são dinâmicos e não atuam isoladamente. Assim, sobrelevar 
classe em detrimento de outros construtos históricos como raça e gênero não 
implica em saída capaz de solucionar a longa exclusão de direitos sociais, 
políticos e civis que atinge, em graus distintos, a população negra, cuja 
vivência de desigualdade não pode ser resumida a um fator supra, 
independente, e outros secundários, acessórios. Ter tal perspectiva como 
ponto de partida é importante para fundamentar práticas que assegurem, como 
espelha Célia Xakriabá, “uma educação do jeito que a gente quer, sem matar o 
que a gente é” (XAKRIABÁ, 2018, p. 196). A retomada do território 
escola/academia
deve ser proteção que assegure o bem estar como 
possibilidade. 
 
Interseccionalidade e feminismos negros: radicalizando o debate sobre 
educação 
 
É necessária a “coragem de transgredir as fronteiras que fecham cada aluno 
numa abordagem do aprendizado como uma rotina de linha de produção” 
(HOOKS, 2013, p. 25). O ato educativo se contrapõe absolutamente aos 
ditames da subordinação capitalista, que inclui desumanização pela alienação. 
20 
 
Desta feita, uma das principais acusações à ferramenta interseccional 
reelaborada pelos feminismos negros – a de que não apresentaria validade por 
diluir classe social em raça, como querem fazer crer algumas leituras de viés 
marxista – não se sustenta, de modo que, não excluindo o pensamento de 
classe social ou reiterando estruturas de dominação, se introduz no panorama 
dos estudos sobre povos subalternizados uma leitura de “instrumentalidade 
teórico-metodológica à inseparabilidade estrutural do racismo, capitalismo e 
cisheteropatriarcado” (AKOTIRENE, 2019, p. 14). 
 
Embora haja diversas críticas ao conceito de interseccionalidade e também um 
esvaziamento significativo quanto ao seu teor político, é importante demarcar 
que isso não faz com que ele seja ineficiente em diagnosticar aquilo a que se 
propõe. Como hooks (2013) observa, professores/as parecem 
 
“fascinados pelo exercício do poder e da autoridade dentro do seu reininho – a 
sala de aula. [...] Uma coisa que me decepcionou muito foi conhecer 
professores brancos, homens, que afirmavam seguir o modelo de [Paulo] Freire 
ao mesmo tempo em que suas práticas pedagógicas estavam afundadas nas 
estruturas de dominação, espelhando os estilos dos professores conservadores 
embora os temas fossem abordados de um ponto de vista mais progressista” 
(HOOKS, 2013, p. 30-31). 
 
Uma pedagogia que faça sentido traz bem estar a todos os agentes do 
processo educativo, mas confere algumas exigências. Como seres humanos 
em integralidade, isto é, dotados de corpo, mente e espírito, estudantes 
requerem cada vez mais serem reconhecidas/os dessa forma, o que leva a 
uma tensão, como acredita a filósofa e educadora, entre elas/es e as/os 
professoras/es. Isso ocorreria porque, além de poucos/as docentes buscarem 
se autoatualizar, receiam perder a autoridade na classe ou entre os pares caso 
se relacionem de forma horizontal e afetuosa com os/as discentes. Para Vera 
Candau (2008), a 
 
“consciência do caráter homogeneizador e monocultural da escola é cada vez 
mais forte, assim como a consciência da necessidade de romper com esta e 
construir práticas educativas em que a questão da diferença e do 
multiculturalismo se façam cada vez mais presentes” (CANDAU, 2008, p. 15). 
 
A educação se insere, dessa maneira, em um contexto sociocultural mais 
amplo, por isso, dado o cruzamento de culturas possível nas instituições, os 
ambientes de escolarização também se configuram como uma arena de 
conflitos. Para efetivar a educação como prática de liberdade, pensada a partir 
da pedagogia engajada, bell hooks (2013) sugere a aproximação por meio da 
partilha, já que “quando os professores levam narrativas de sua própria 
experiência para a discussão em sala de aula, elimina-se a possibilidade de 
atuarem como inquisidores oniscientes e silenciosos” (HOOKS, 2013, p. 35). 
Assim, a medida que discentes se sentem encorajados e fortalecidos, 
docentes, por sua vez, melhor se capacitam e fortalecem ao passo que 
promovem o entusiasmo como instrumento pedagógico. 
21 
 
 
Sabe-se que “é profundo o medo de que qualquer descentralização das 
civilizações ocidentais, do cânone do homem branco, seja na realidade um ato 
de genocídio cultural” (HOOKS, 2013, p. 49), quando, porém, se observa outra 
operação: 
 
“a existência de um dispositivo de racialidade/biopoder operando na sociedade 
brasileira, que, articulando múltiplos elementos, dentre eles o epistemicídio, 
configura a racialidade como um domínio que produz saberes, poderes e 
subjetividades com repercussões sobre a educação” (CARNEIRO, 2005, p. 11). 
 
É fundamental compreender essa perversa articulação entre dispositivos que 
se desdobra em silenciamento e políticas de morte porque, no respeito às 
identidades de resistência, é possível estabelecer uma mediação crítica que 
ofereça reorientação quanto a práticas aparentemente transgressoras, mas 
que, no fundo, apenas simulam mudança. As ideologias hegemônicas, tidas 
como naturais, normais e inevitáveis, servem somente ao controle social, 
sobretudo de mulheres negras e racializadas, como defende Collins (2019). 
 
Em compreensão semelhante a Ailton Krenak (2019), hooks (2013) enfatiza a 
urgência de construir uma sociedade fundamentada na solidariedade entre 
pessoas, onde seres humanos tenham mais valor do que os bens impostos 
pelas necessidades capitalistas. No sistema predatório do capital, a 
desinformação cumpre o papel de diminuir nossa capacidade de intervenção 
na realidade injusta. Nesse quadro, os movimentos sociais se insurgem como 
importantes atores (re)educadores. A vontade política em reeducar a sociedade 
brasileira foi tarefa assumida pelo movimento negro, conquanto lidemos, 
conforme problematiza Nilma Gomes (2017), com uma “construção de 
ausências” relativa à essa atuação organizativa. 
 
A desinformação, sendo parte constitutiva da cultura de dominação, revela, na 
arena dos antagonismos sociais, que, mais do que vencer a apologia à 
desinformação, nas escolas, a luta inclui oposição a desmontes, precarização 
salarial, cortes orçamentários, perseguição a professores com base em 
mecanismos ilegais e escusos, além de carga horária excessiva e adoecedora. 
E para ressignificar uma academia “moribunda e corrupta”, nos dizeres de 
hooks (2013), se requer a união de múltiplas forças pela onipresença do 
conservadorismo e a retomada intensificada de concepções violentas ligadas à 
xenofobia, ao isolacionismo e ao nacionalismo cingido. 
 
Transformar “o como” e “o que ensinar” corrobora à consolidação de uma 
prática de interculturalidade (CANDAU, 2008, p. 22) na qual pode-se 
materializar uma democracia radicalizada, uma sociedade justa fundada na 
emancipação, solidariedade, pluralidade e desierarquização (CARNEIRO, 
2005; HOOKS, 2019; COLLINS, 2019). 
 
A implementação de estratégias modificadoras da realidade social envolve 
conhecimento e preparo disponíveis através de atividades formativas, pois 
22 
 
esses momentos permitem que “professores tenham a oportunidade de 
expressar seus temores e ao mesmo tempo aprender a criar estratégias para 
abordar a sala de aula e o currículo multiculturais” (HOOKS, 2013, p. 52). 
Nesse sentido, como ensinam os feminismos negros, a consciência crítica 
pode ser estimulada a qualquer tempo. 
 
Desafios e possibilidades para uma prática de ensino-aprendizagem 
anticolonialista: interlocuções entre pedagogias 
 
Comprometer-se com uma prática de ensino-aprendizagem anticolonial é 
premissa para o que hooks denominou pedagogia revolucionária de 
resistência. Um dos relatos mais exemplares da ausência como um paradigma 
e dos desafios que atravessam a sala de aula feminista em Ensinando a 
Transgredir é a constatação, pela autora, de que, ao contestar as turmas sobre 
as referências delas sobre autorias negras, os nomes que ecoam são 
masculinos e, se acaso se lembram das obras de mulheres negras, conhecem, 
em geral, apenas a escrita literária ou ficcional delas. 
 
Enquanto concebermos a ideia de comunidade negra unicentrada na figura 
masculina e de mulheres unificada em mulheres brancas, o sexismo e o 
sexismo institucional, o racismo e o racismo institucional, respectivamente, 
prevalecem. Um dos ensinamentos mais significativos de Paulo Freire, cuja 
defesa é expressa também no conjunto de textos de bell hooks, é o de que não 
devemos entrar nas batalhas como objetos esperando tornarmo-nos sujeitos só 
depois. Este é um ponto em que pedagogias convergem: efetivando uma 
“confrontação construtiva”, haverá lugar para o entusiasmo e a realização
pessoal em aprender, ouvir, falar, um ambiente no qual professores/as 
verdadeiramente ensinem e discentes se interessem em aprender, cada qual 
reconhecendo sua função e exercendo suas capacidades para fazer o 
processo ocorrer. As investigações cujo seio é a pedagogia feminista podem 
auxiliar a transformar as aulas nessa comunidade de aprendizado. 
 
Entender as lutas de libertação como um fenômeno global (FREIRE, 2018; 
DAVIS, 2018) suscita o debate sobre ética e autonomia. Em bell hooks, práxis 
é ação e reflexão. Uma aplicação interessante desse axioma ocorre quando a 
própria hooks acentua ao também educador e filósofo Paulo Freire sobre o fato 
de as obras com as quais tivera contato deixarem entrever certo sexismo – ao 
não distinguir a materialidade das opressões segundo o sexo (ao menos as 
primeiras obras que ele havia escrito). Acerca de tal observação, acrescento: 
faz-se notar, ainda, que na coletânea também não há reflexões contundentes 
sobre a questão racial, ainda que o autor esteja inserido em um país de maioria 
sociorracial negra, o Brasil. 
 
As divergências, longe de apagarem as possibilidades contributivas de um 
pensamento, são, em si mesmas, aprendizado em transformação. É Freire 
(1987) quem diz: 
 
23 
 
“Somente quando os oprimidos descobrem, nitidamente, o opressor, e se 
engajam na luta organizada por sua libertação, começam a crer em si mesmos 
[...]. Se esta descoberta não pode ser feita em nível puramente intelectual, mas 
da ação, o que nos parece fundamental, é que esta [...] esteja associada a 
sério empenho de reflexão, para que seja práxis. 
O diálogo crítico e libertador [...] tem de ser feito com os oprimidos, qualquer 
que seja o grau em que esteja a luta por sua libertação. [...] 
O que pode e deve variar [...] é o conteúdo do diálogo. Substituí-lo pelo 
antidiálogo, pela sloganização, pela verticalidade, pelos comunicados, é 
pretender a libertarão dos oprimidos com instrumentos da “domesticação”. 
Pretender a libertação deles sem a sua reflexão [...] é transformá-los em objeto 
[...] e em massa de manobra” (FREIRE, 1987, p. 33). 
 
Só um “sério empenho de reflexão” fornece a criticidade e horizontalidade 
essenciais para que nenhum discurso salvacionista interfira na construção de 
práticas subversivas para o livre viver. A teoria descontrói a conformidade de 
uma sociedade aparentemente homogênea. Se a teoria se enreda em sacudir 
o jugo opressivo, não admite a pretensão do saber absoluto; teorias 
reacionárias, narcisistas e complacentes, que apenas solidificam o elitismo 
classista (HOOKS, 2013) retiram a autonomia dos sujeitos revolucionários, 
capazes de autonomia e planos de ação coletiva. Tornar a teoria um lugar de 
resfôlego é lembrar a humanidade inerente a cada ser diante das inúmeras 
adversidades que interceptam as vidas de povos subalternizados. Tal 
compromisso é ético. 
 
Conforme enaltece István Mészáros (2006) educadores precisam entender 
amplamente as teias que cercam a educação para, com isso, conquistarem a 
mudança essencial, ou seja, radical, da arena social. Em uma comunidade de 
aprendizado, 
 
“Quando nossa experiência vivida da teorização está fundamentalmente ligada 
a processos de autorrecuperação, de libertação coletiva, não existe brecha 
entre a teoria e a prática. Com efeito, o que essa experiência mais evidencia é 
o elo entre as duas – um processo que, em última análise, é recíproco, onde 
uma capacita a outra” (HOOKS, 2013, p. 85-86). 
 
Ainda que rejeitar a educação bancária seja uma dificuldade para professores 
por muitos motivos, a luta com enraizamento teórico informa, molda e 
possibilita a prática (HOOKS, 2013) de problematizar classe, regime de 
autorização discursiva e imposição do silenciamento. “Quem fala? Quem ouve? 
E por quê?” (HOOKS, 2013, p. 57). Os mecanismos referidos se manifestam 
sob falsa naturalidade nos ambientes de educação, onde as vozes mais 
facilmente ouvidas são as mesmas legitimadas no transcurso histórico, isto é, a 
de homens brancos heterossexuais. 
 
É importante evidenciar que, na interação, de acordo com bell hooks (2013), 
professores devem dimensionar o significado da fala de cada discente para que 
alguns não incorram no erro de pressupor que tenham uma experiência mais 
24 
 
válida que os demais ou que aquilo que tenham para dizer deva ser o centro 
das atenções. Segundo sintetiza Lourenço Cardoso (2014), “no conflito racial, o 
branco, no primeiro momento, possui a força para construir-SE e construir o 
OUTRO. Ele como superior; o Outro como inferior. Ele como ser desejável; o 
Outro como ser repulsivo” (CARDOSO, 2014, p. 82, grifo do autor), e assim, 
educadores brancos devem estudar e ensinar sobre branquitude para entender 
as questões que a cercam e saberem se autocriticar, além de criar formas 
autênticas e seguras de se expressar para o corpo estudantil. 
 
No entanto, reações ao modo de conduzir a aula podem vir sob forma de 
críticas. Se a resposta for essa, agir respeitosamente e ponderar sobre como 
se sente a turma ou as conclusões que obtiveram sobre as discussões é uma 
opção, de acordo, certamente, com aquilo que se questiona, pois “a 
combinação do analítico com o experimental constitui um modo de 
conhecimento mais rico” (HOOKS, 2013, p. 121). Ao se deparar com a noção 
de autoridade da experiência conferida pelas pesquisas na área do feminismo, 
a filósofa explica que há um conhecimento particular advindo do sofrimento. 
Manifesto no corpo, ele habilita a experiência que permite acessar o 
conhecimento. No entanto, no caso de a experiência pessoal ser um peso e 
mais atrapalhar do que auxiliar a acessar diversos pontos de vista, ela deve ser 
posta de lado. Essas ocasiões, quer aconteçam na escola ou outros lugares, 
imprimem uma ideia positiva aos desafios tido como intransponíveis com os 
quais nos deparamos e decidimos não resolver. 
 
Aventar a hipótese de serem raça, gênero e classe marcadores importantes 
nas relações sociais implica em reposicionamentos importantes, porque é 
marcante nas sociedades o entendimento de que corpo e mente são instâncias 
apartadas. Afirmar o oposto disso representa um risco. A educadora 
estadunidense exemplifica o exposto ao apontar o tratamento desigual para 
com meninas e mulheres provindo de abusos de poder dispensados em 
coerção, punição e assédio verbal (e, acrescento, sexual), enquanto docentes, 
em maior medida, são tidos apenas como intelecto. A importância de romper tal 
tradição reside no que, ao perceber o/a professor/a como corpo e mente, 
entendemos seu efeito de responsabilidade sobre o desenvolvimento integral 
dos estudantes e a forma de perceber a realidade por eles/as (HOOKS, 2013, 
p. 183). 
 
Nesse sentido, o corpo, sobretudo o das mulheres, aparece associado ao 
legado da repressão. Importa assinalar que punitivismo e recompensa são 
faces do mesmo sistema burguês e autoritário que, infiltrado nos ambientes 
educacionais, insinua a miopia do não reconhecimento da presença e das 
potencialidades de cada pessoa, ferindo o valor do respeito, do “significado 
originário da palavra [respeito], ‘olham para’ uns aos outros” (HOOKS, 2013, p. 
247). Uma das formas utilizadas para exercer controle e emanar obediência é 
a língua do opressor, aquela pela qual nos comunicamos e que não possui 
todas as palavras de que necessitamos (LORDE, 2019). Lancemo-nos, pois, na 
empreitada de combate ao silenciamento. Eros, como pulsão de vida, pode 
expandir nossa capacidade de autoatualização e inventividade na busca ou 
25 
 
renovação de práticas de liberdade que engendrem o fim da falsa dicotomia 
exterior/interior em relação à escola/academia. 
 
Considerações finais 
 
A educação constitui um campo cujas reflexões são inúmeras dado mesmo à 
necessidade que o avançar das décadas suscita. Ainda que os desafios que 
vivemos há quase três décadas não sejam exatamente idênticos aos que 
enfrentamos hoje, a necessidade de transformar a escola e os ambientes de 
educação em espaços de crítica, autocrítica,
acolhimento e liberdade 
permanece. A interseccionalidade proposta e abrigada nas análises das 
feministas negras revela a operacionalidade de uma ferramenta que conecta 
eixos de opressão sem subordiná-los à hierarquia do mais importante. Aplicada 
ao contexto das relações educacionais, o resultado pode ser uma densa 
construção de ideias e problemas como observado em Ensinando a 
Transgredir. 
 
Ao apontar com acuidade as teias da internalização dos parâmetros do capital 
(MÉSZÁROS, 2006), a obra indica os abismos entre capitalismo e liberdade e 
discute estratégias para fazer com que o entusiasmo crítico e a práxis retornem 
à educação, que torna admissível a (falsa) dicotomia mundo exterior/mundo 
exterior. Quando insiste na viabilidade de estratégias como autoatualização 
docente, conjugação de diversas pedagogias – por meio da qual uma dialoga 
conscientemente com ao outra –, autocrítica e autonomia, a filósofa demonstra 
que, sem a (dádiva?) da onisciência, “Só somos porque estamos sendo. Estar 
sendo é a condição, entre nós, para ser” (FREIRE, 2002, p. 15). Estar sendo é 
a condição para quem deseja não tornar a sala de aula um “local de asilo”, mas 
de crescimento e troca dialética (HOOKS, 2013, p. 222). Como a liberdade é 
uma luta constante (DAVIS, 2018), inspirar o conhecimento também é uma luta 
constante. 
 
Referências biográficas 
 
Ana Paula Oliveira Lima, mestranda em História na Universidade de Brasília 
(UnB). 
 
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(USP), São Paulo, 2005. 
 
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e a política do empoderamento. Trad. Jamille Pinheiro Dias. São Paulo: 
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DAVIS, Angela. A liberdade é uma luta constante. Trad. Heci Regina Candiani. 
São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. 
 
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____________. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. 
 
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por emancipação. Petrópolis: Editora Vozes, 2017. 
 
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Trad. Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013. 
 
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Terras Tradicionais) – Universidade de Brasília (UnB), Brasília, 2018. 
 
 
 
27 
 
 
ENSINO DE HISTÓRIA E HOMOSSEXUALIDADE: UMA 
EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE SEXUAL E DE 
GÊNERO 
Antonio Xavier M. Neto e Jefferson G. Silva Espinoza 
 
Este estudo se propõe analisar o ensino de História tendo como objeto para 
nossa reflexão acerca da homossexualidade. A pertinência desse conteúdo 
para o ensino se verifica na necessidade de promoção da cidadania e da 
identidade homoafetiva e no que se refere as possibilidades do ensino, 
apresentar elementos para a constituição da historicidade da 
homossexualidade em sala de aula. 
 
Tendo em vista a conjuntura de crimes contra as minorias sexuais e a restrição 
da cidadania LGBTQIA+ no Brasil, além da necessidade de fazer das aulas de 
história um “local da aprendizagem de que as regras do espaço público 
democrático garantem a igualdade, do ponto de vista da cidadania, e ao 
mesmo tempo a diversidade, como direito” (BRASIL, 1998c, p. 69), 
apresentamos nas páginas que se seguem algumas considerações sobre a 
inclusão do tema transversal da diversidade sexual e de gênero nas aulas de 
história. 
 
Altmann (2013) destaca a importância da escola na construção de uma 
educação democrática. Para o autor: 
 
“a importância da escola diante destas questões está relacionada ao caráter 
democrático de tal instituição, tanto no que se refere à democratização do 
acesso e às condições de permanência, quanto às relações que ali se 
estabelecem. A escola é uma forma fundamental de promoção da igualdade de 
direitos. Para que cumpra esta função, o respeito à diversidade sexual é ali 
imprescindível, caso contrário, ela instaura práticas discriminatórias e 
heteronormativas que excluem ou invisibilizam diferenças.” (ALTMANN, 2013, 
p. 77). 
 
Apesar disso, o mais habitual é que os educadores considerem essa pauta 
muito específica e particular, excluindo-a da estrutura curricular da escola e 
invisibilizando as concepções de mundo e sofrimentos pelos quais passa o 
alunado LGBTQIA+. Mesmo quando o assunto acaba surgindo nas aulas, ele 
seria marcado pelos preconceitos e estereótipos típicos da LGBTfobia. Dessa 
forma, educadores se somariam a diversos outros sujeitos sociais na condição 
de responsáveis por fazer circular uma série de discursos, textos, modos de 
viver e pensar repletos de ideias e valores homofóbicos que sujeitam gays, 
lésbicas, bissexuais, transexuais e transgêneros a uma condição de 
28 
 
vulnerabilidade social e de risco de violência. 
 
“Esse cenário de exclusão apela para que o tema da diversidade sexual e de 
gênero seja incluído no currículo de formação de novas professoras e 
professores para que possam futuramente desenvolver estratégias de 
resistência ao currículo heteronormativo. A omissão e o silenciamento 
significam pactuar com a violência exercida contra estudantes gays, lésbicas, 
bissexuais, travestis e transexuais. A escola deve ser também um espaço de 
formação de cidadania e respeito aos direitos humanos, assim as (os) docentes 
devem ser encorajadas a assumir sua responsabilidade no combate a todas as 
formas de preconceitos e discriminação que permeiam o espaço escolar.” 
(DINIS, 2011, p. 48-49) 
 
É perceptível a ausência do tema da diversidade sexual e de gênero nas salas 
de aula. Pode-se verificar que os diversos livros didáticos de História 
elaborados, especificamente aqueles para os anos finais do ensino 
fundamental, os quais tratam sobre a temática Nazista, não contemplam o 
assunto de forma consistente, reservando uma ou duas linhas para 
expressarem frases como ''nos campos de concentração também tinham 
homossexuais''. Assim se encerra a presença dos LGBTQIA+ nos livros 
didáticos, após essa frase vem o ponto final, o qual não apenas reproduz um 
final para o conteúdo escrito, mas principalmente o sufocamento do 
reconhecimento e o melhor entendimento acerca dessas experiências, que são 
únicas a esses indivíduos prisioneiros do nazismo. 
 
Diversas pesquisas na área de História e Ensino enfatizam a necessidade de 
se pensar a escola como lugar de produção de saber histórico, pensando que o 
processo de ensino e aprendizagem se dá pela orientação do pensamento 
histórico em sentido restrito, e que tal sentido é fundamental na elaboração de 
narrativas originais pelos educandos e educadores. 
 
Em pesquisa de grande impacto realizada em parceira entre o Ministério da 
Educação (MEC),
a Organização dos Estados Ibero-americanos para a 
Educação, a Ciência e a Cultura (OEI) e a Faculdade Latino-Americana de 
Ciências Sociais (Flacso), constatou-se que a homofobia continua sendo um 
dos principais tipos de preconceito nas escolas. “Homossexuais, transexuais, 
transgêneros e travestis são indicados como pessoas que não se queria ter 
como colega de classe por 19,3% dos alunos, sendo os jovens do EM [Ensino 
Médio] os que mais rejeitam essas pessoas. Existem diferenças na 
predisposição com os colegas quando separamos os alunos por sexo. (...) 
Enquanto 31,3% dos rapazes dizem não querer ter como colegas de classe 
homossexuais, transexuais, transgêneros e travestis, baixa para 8% a 
proporção de meninas que assim se expressam” (ABRAMOVAY; CASTRO; 
WAISELFISZ, 2015, p. 94). 
 
Paulo Freire (2001), afirma que a escola não pode ser apenas um depositário 
de pessoas e conhecimentos empacotados. Nesta perspectiva acerca dos 
espaços de produção saber, relembraram as pesquisas que a escola deve ser 
29 
 
um espaço de reinvenção do conhecimento e não apenas o seu reprodutor. 
 
Como já indicado anteriormente, não faltam dados e justificativas que atestam 
a necessidade de que esse debate seja acolhido pelas escolas. É 
compreensível que muitos professores tenham receio em abordar esse 
conteúdo, seja por falta de preparação ou, principalmente, pelos desafios que 
um tema envolto por tantos preconceitos e tabus impõe. É preciso, assim, que, 
uma vez convencidos da importância da inclusão dessa discussão, os 
educadores tenham consciência de que não podem ser constrangidos por 
abordar esse tema, pois ele está previsto em diversas diretrizes e parâmetros 
curriculares. 
 
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de nove anos 
(BRASIL, 1998a) afirmam, em seu artigo 16, que "os componentes curriculares 
e as áreas de conhecimento devem articular em seus conteúdos (...) a 
abordagem de temas abrangentes e contemporâneos” – e lista sexualidade e 
gênero entre eles. Já as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio 
(BRASIL, 1998b), também em seu artigo 16, determinam que "o projeto 
político-pedagógico das unidades escolares que ofertam o Ensino Médio deve 
considerar: (...) XV – valorização e promoção dos direitos humanos mediante 
temas relativos a gênero, identidade de gênero, raça e etnia, religião, 
orientação sexual, pessoas com deficiência, entre outros, bem como práticas 
que contribuam para a igualdade e para o enfrentamento de todas as formas 
de preconceito, discriminação e violência sob todas as formas”. 
 
Contudo, o que se observa é que mesmo com todo esse respaldo legal, muitos 
educadores preferem passar longe desse assunto, invisibilizando esses 
sujeitos, as opressões e a restrição de direitos de que são vítimas. Esse 
diagnóstico contribui na elaboração de argumentos que fundamentam o 
trabalho pedagógico com esse tema, com especial atenção ao aparato legal 
que o respalda, regulamenta e orienta. 
 
Para Silva & Vieira (2009, p. 190), em uma breve análise histórica sobre a 
homossexualidade, percebemos associações com as ideias de crime, pecado, 
patologia, ao contrário da heterossexualidade “apresentada como norma, como 
sendo a sexualidade inerente à menina e ao menino”. Nessa lógica, o ver e o 
dizer sobre as práticas homossexuais são constituídos historicamente a partir 
de mecanismos de força que organizam e delimitam conceitos e significados a 
partir de influências ideológicas, culturais, sociais, políticas e, da mesma forma, 
demarcando funções variadas de um mesmo conceito ou uma mesma prática. 
 
A temática acerca da diversidade sexual e de gênero, do combate à homofobia 
e da ampliação da cidadania LGBTQIA+ apresenta-se, como um relevante 
desafio para o ensino de história. Propor esse diálogo no espaço escolar, 
permite que se confronte o currículo da disciplina com narrativas históricas de 
grupos sociais até então invisibilizados. Acões nesse sentido são essênciais no 
desenvolvimento de experiências com vistas a “identificar e repensar tabus e 
preconceitos referentes à sexualidade, evitando comportamentos 
30 
 
discriminatórios e intolerantes e analisando criticamente os estereótipos” 
(BRASIL, 1998d, p. 311), tornando possível fazer da escola um ambiente 
verdadeiramente formador para a cidadania e a diversidade 
 
Nossas inquietações acerca da homossexualidade, entendida aqui como uma 
das expressões da sexualidade humana, partem das observações do cotidiano 
escolar que vivenciamos como docentes. Não é difícil perceber que a escola, 
lugar de entrecruzamentos da diversidade cultural, possui ainda muita 
dificuldade em trabalhar com a pluralidade, sobretudo em relação à temática de 
gênero e sexualidade. Como afirma Louro (2014): 
 
“Diferenças, distinções, desigualdades... A escola entende disso. Na verdade, a 
escola produz isso. Desde seus inícios, a instituição escolar exerceu uma ação 
distintiva. Ela se incumbiu de separar sujeitos – tornando aqueles que nela 
entravam distintos dos outros, os que a ela não tinham acesso. Ela dividiu 
também, internamente, os que estavam lá, através de múltiplos mecanismos de 
classificação, ordenamento, hierarquização. A escola que nos foi legada pela 
sociedade ocidental moderna começou por separar adultos de crianças, 
católicos de protestantes. Ela também se fez diferente para os ricos e para os 
pobres e ela imediatamente separou meninos de meninas”. (LOURO, 2014, p. 
61). 
 
Os diversos problemas que encontramos em sociedade, e principalmente em 
sala de aula, para discutir o tema da diversidade de orientação sexual está 
justamente ligado na apreensão sobre funções e papéis sociais dos sexos 
individualmente, ou seja, na afirmação frequente da ideia de “linha de 
chegada”. Espera-se das mulheres que tenham determinadas ações e inclusive 
determinadas reações a situações do cotidiano, da mesma forma que espera-
se dos homens um determinado tipo de conduta que, supostamente, seja 
condizente com o “ser homem”. 
 
Para Bourdieu (2002), essas relações sociais entre os gêneros são fruto de 
construções, e elas também demonstram a maneira pela qual nossa sociedade 
concebe os corpos femininos e os corpos masculinos. Sentar e cruzar as 
pernas não seria uma conduta masculina, ou sentar e abri-las não seria uma 
conduta feminina. Estas ações, aparentemente simples do cotidiano, estão 
permeadas por relações de poder que instituem nos corpos códigos de conduta 
que, somente a partir destes, aqueles corpos poderiam ser reconhecidos como 
sendo homem ou como sendo mulher em um padrão social inventado de 
normalidade e adequação. A homofobia é uma das violências mais recorrentes 
no espaço escolar, e não se constitui apenas de violência física ou mesmo 
explícita, muitas são veladas, através de pequenas formas de segregação e 
exclusão. 
 
A importância do debate sobre a Homossexualidade no ensino, se centra na 
constatação de que o não reconhecimento da possibilidade da diversidade de 
orientação sexual e afirmação perene da ideia de “linha de chegada” sobre os 
corpos e determinação desta “linha de chegada” dentro de pressupostos 
31 
 
heteronormativos, levou a sociedade ao que o antropólogo Luiz Mott chamou 
de Homocausto. 
 
A diversidade sexual e de gênero não costuma ser um tema comumente 
contemplado no ensino de história, tampouco é constituinte de conteúdos 
convencionais do currículo dessa disciplina. Essa ausência por si só já 
representa um obstáculo significativo, pois demanda uma grande mobilização 
por parte dos professores que se dispõe a trabalhar com o assunto. 
 
Essa constatação vai de encontro à hipótese de que os professores nunca 
agiriam sozinhos no processo de mediação didática, uma vez que haveria uma 
transposição externa realizada na noosfera (agências governamentais, autores 
de livros didáticos, formuladores de currículos) que necessariamente se 
anteciparia à transposição interna operada pelos professores em sua atividade 
docente. Como se observa,
o trabalho com a diversidade sexual e de gênero 
demonstra a magnitude que a participação ativa dos professores nos 
processos de mediação didática pode alcançar. 
 
A metodologia proposta para integrar essa dimensão da realidade social aos 
currículos é justamente a dos temas transversais, definidos como questões 
sociais eleitas para o trabalho escolar por seu potencial pedagógico na 
construção da cidadania e da democracia e por envolverem diversos aspectos 
da vida social. Assim, os temas transversais teriam uma natureza distinta das 
áreas convencionais e disciplinares. Enquanto processos vividos intensamente 
pelos mais diversos grupos sociais e que integram múltiplas dimensões do 
cotidiano, esses temas atravessam as diversas áreas do conhecimento. 
Levando em conta essas características, é mais do que razoável considerar “a 
necessidade de que tais questões sejam trabalhadas de forma contínua, 
sistemática, abrangente e integrada e não como áreas ou disciplinas” (BRASIL, 
1998d, p. 25-27). 
 
Portanto, conclui-se que um dos grandes desafios a se enfrentar é justamente 
a tentativa de encontrar interseções e relações possíveis entre a área de 
ensino de história e os estudos em torno do tema da transversalidade. A 
educação para a diversidade sexual e de gênero, embora respaldada por uma 
série de documentos da legislação educacional que regulamenta os mais 
diversos sistemas de ensino no país, continua sendo um campo pouco visitado 
nas escolas. Isso se deve não somente para a falta de formação dos 
professores em relação ao tema, mas principalmente à resistência social que 
essa questão ainda enfrenta. 
 
Acolher esse compromisso exige, ainda, do docente uma ampla preparação 
que envolve dominar a legislação acerca da temática, conhecer minimamente a 
bibliografia e as pesquisas sobre sexualidade humana, LGBTfobia e restrição 
de direitos da comunidade LGBTQIA+, além de muita sensibilidade na 
condução de atividades acerca de um assunto que envolve muitas polêmicas, 
tabus e resistências. 
 
32 
 
O silenciamento da estrutura currícular é um dos principais problemas que 
possuímos no repertório do drama que tem se caracterizado a vida de 
estudantes homossexuais em sala de aula. E a homofobia possui, nesse 
quadro, amplo campo de desenvolvimento, uma vez que necessita justamente 
do silêncio daqueles responsáveis pela organização escolar, silêncio que em 
muitos casos pode ser interpretado como conivência. 
 
Referências biográficas 
 
Antonio Xavier Miranda Neto, licenciado em História pela Universidade 
Estadual do Maranhão – UEMA. 
 
Jefferson Giovani Silva Espinoza, licenciado em História pela Universidade 
Estadual do Piauí – UESPI. 
 
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sentidos e buscas: Por que frequentam? Brasília-DF: Flacso - Brasil, OEI, 
MEC, 2015. 
 
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de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. 
 
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Educação. 
Câmara de Educação Básica. Parecer CEB n. 4/98. Diretrizes Curriculares 
Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília, DF: MEC/CNE, 1998a. 
 
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional de 
Educação. 
Câmara de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino 
Médio. Resolução CEB no 3/1998. Brasília, DF: MEC/CNE, 1998b. 
 
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares 
Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos 
parâmetros curriculares nacionais, Brasília: MEC/SEF, 1998c. 
 
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares 
Nacionais: 
terceiro e quarto ciclos: apresentação dos temas transversais, Brasília: 
MEC/SEF, 
1998d. 
 
DINIS, Nilson Fernandes. Homofobia e educação: quando a omissão também é 
signo de violência. Educar em Revista (Impresso), v. 39, p. 39-50, 2011. 
 
FREIRE, P. Aprendendo com a própria história. Vol. 1. 2ª ed. São Paulo: Paz e 
33 
 
Terra, 2001. 
 
LOURO Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação. Uma abordagem 
pós-estruturalista. 16. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. 
 
SILVA, Aline Ferraz da; VIEIRA, Jarbas Santos. Pelo sentido da vista: um olhar 
gay na escola. Currículo sem Fronteiras, v.9, n.2, pp. 185-200, Jul/Dez 2009. 
 
 
 
34 
 
 
ENSINO DE HISTÓRIA E DECOLONIALIDADE: 
CONTRIBUIÇÕES DA INTERCULTURALIDADE E DA 
INTERSECCIONALIDADE NOS ESTUDOS DE GÊNERO 
Caroline Machado Costa e Giovanna Santana 
 
Este trabalho apresenta as categorias de interculturalidade e 
interseccionalidade como possibilidades para pensar o ensino de História a 
partir de uma perspectiva decolonial. Dialoga com as produções de autoras e 
autores latino-americanos/as com o objetivo de entender a construção histórica 
das relações de poder, problematizando as diferenças culturais historicamente 
estabelecidas enquanto desigualdades sociais. Nesse aspecto, gênero, 
sexualidade, etnia/raça, classe social, religiosidade, entre outros, tornam-se 
elementos fundamentais para a compreensão da proposta decolonial na 
disputa pela narrativa histórica. 
 
Nesta comunicação com recorte nos estudos de gênero, trazemos as 
contribuições de pensadoras ativistas como María Lugones (2014), Catherine 
Walsh (2020), Vera Maria Candau (2017) com o propósito de sistematizar as 
discussões teórico-metodológicas das categorias supracitadas, assim como 
refletir sobre suas potencialidades para se pensar a disciplina de História 
vinculada à proposta decolonial. 
 
As categorias de interculturalidade e interseccionalidade são categorias 
estruturais mobilizadas pelo movimento feminista e pedagógico da 
decolonialidade que visam uma mudança da Colonialidade do poder, da 
natureza, do ser e do gênero. A decolonialidade podemos definir a como o 
amadurecimento do conceito de pensamento fronteiriço, inicialmente 
desenvolvido por Walter Mignolo (BALLESTRIN, 2013). Com essa definição, o 
filósofo argentino defende que o paradigma da modernidade e de racismos na 
produção de conhecimentos não pode ser ignorado ou subestimado. No caso 
dos/das latinoamerianos/as trata-se de pensar a condição dos povos e grupos 
subjugados no continente, sobretudo pelos projetos de explorações espanhóis 
e portugueses, a partir de um referencial teórico próprio, não construído por 
uma análise da modernidade explicitada somente por eventos endógenos à 
Europa. Assim, a decolonialidade se constituí a partir daradicalização do 
argumento pós-colonial, promovido pelos Estudos Subalternos Indianos e 
Latino-americanos. Vale acrescentar que nesse conjunto de pesquisas 
precedentes, o colonialismo e o nacionalismo, especialmente britânicos, foram 
assuntos chaves para o estudo dos processos de dominação europeia na sua 
articulação com as elites da Índia e do mundo “oriental” (MIRANDA, 2017). 
 
35 
 
A decolonialidade como proposta teórico-metodológica surge na década de 
1990, com a reunião do Grupo Modernidade/Colonialidade em torno da tese, 
na qual a inserção da Abya Yala (o continente americano) no sistema-mundo 
demarca o início da modernidade capitalista, bem como inicia a construção da 
ideia de raça como elemento fundante da hierarquia no novo sistema 
econômico global. Em distinção ao colonialismo, como sistema de submissão 
econômica e cultural das colônias às metrópoles, a definição de colonialidade 
evidencia a continuidade de determinadas relações de poder oriundas do 
período colonial, mesmo após os movimentos de independência, mantendo-se 
como aspectos inerentes das opressões e violências vividas no tempo 
presente. 
 
É nesse contexto que María Lugones (2014) amplifica a noção de colonialidade 
do poder de Aníbal Quijano para refletir sobre o papel da colonialidade do 
gênero nos processos civilizatórios. A colonialidade do poder diz respeito à 
classificação das diferentes populações em raças, configurando a cisão 
colonizador/colonizado em um sistema de exploração mundialmente

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