Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
118 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Unidade II BIODIVERSIDADE BRASILEIRA E OS DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE Na unidade anterior foi apresentado o ferramental analítico da teoria econômica dos neoclássicos ambientalistas bem como os fundamentos utilizados pelos pensadores que se contrapõem à corrente neoclássica, denominados de ecologistas. Buscou‑se elaborar uma linha do tempo que refletisse o processo de construção do entendimento e do enfrentamento dos impactos ambientais decorrentes do crescimento econômico. Esse processo culminou num relativo entendimento de que o ecossistema terrestre não é capaz de sustentar de modo indefinido o nível de atividade e consumo do mundo moderno. O conceito de desenvolvimento sustentável amplia a concepção de bem‑estar humano ao incluir como princípio a manutenção dos serviços do capital natural no processo de expansão da atividade econômica. Também foi abordado o tema população como um dos fatores de pressão da biosfera. O crescimento populacional, como você verá nessa unidade, eleva a demanda por energia, principalmente, nos grandes centros urbanos. Seja derivada de fontes renováveis ou não renováveis a questão energética revela‑se como um dos grandes desafios das nações no futuro. Ainda na unidade anterior, fez‑se um resgate dos principais documentos que nortearam os debates internacionais e dos compromissos estabelecidos pelos países no âmbito dos Objetivos do Milênio, com ênfase às metas estabelecidas para o Brasil. Do ponto de vista dos compromissos voltados às organizações internacionais, fez‑se o resgate teórico do processo de globalização como cenário para compreender a construção dos consensos estabelecidos nos documentos em torno da governança ambiental, tanto no âmbito das empresas quanto no dos governos. Nessa unidade estaremos voltados basicamente para conhecer os termos utilizados no debate sobre desenvolvimento sustentável. Nesse aspecto, falaremos de um dos documentos internacionais que uniformizam a compreensão dos termos relacionados à biodiversidade: a Convenção sobre Diversidade Biológica (BRASIL, 2000a), aprovado na Conferência Rio‑92. Também abordarmos a biodiversidade a partir da classificação dos biomas brasileiros e concluiremos essa unidade discutindo a questão energética, especialmente, no Brasil. 5 CONVENÇÃO DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA – CDB A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), também denominada de Cúpula da Terra, Cimeira da Terra, Eco 92 ou Rio 92, realizada entre 3 e 14 de junho de 1992, na cidade do Rio de Janeiro, foi um marco para o debate sobre desenvolvimento sustentável, que teve início na Conferência de Estocolmo. Na conferência Rio 92 houve um relativo consenso por parte 119 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE da comunidade política internacional sobre a necessidade de conciliar crescimento econômico com preservação dos recursos da natureza. Lembrete Lembre‑se de que a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente ocorreu em 1972, em Estocolmo, na Suécia. Naquela ocasião, discutiam‑se os limites do crescimento, mas houve pouca convergência entre os líderes mundiais. Os principais resultados da Conferência Rio 92 foram três convenções assinadas pela maioria dos países presentes à conferência: • a Convenção sobre a Diversidade Biológica ou Biodiversidade; • a Convenção sobre Mudanças Climáticas e Desertificação (BRASIL, 1998c); • a Agenda 21. Conhecer a Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB, por ser o documento que uniformizou os conceitos a respeito do tema, é de fundamental importância. Subscrita por 175 países, foi ratificada, posteriormente, por 168 países. O Brasil, por meio do Decreto Legislativo nº 2, de 1994, aprova o texto da CDB subscrita durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Esse decreto, além de aprovar o texto na forma como foi subscrito, cria limitações à sua mudança, ao incluir um parágrafo único que restringe atos que possam resultar em revisão da referida Convenção, bem como quaisquer ajustes complementares que, nos termos do art. 49, I, da Constituição Federal, acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. Portanto, todo e qualquer ato de revisão ou ajustes complementares é de competência apenas do Congresso Nacional. Em 16 de março de 1998, por meio do Decreto nº 2.519, o Brasil promulga a CDB. Internacionalmente, o documento entrou em vigor em dezembro de 1993. 5.1 Importância da Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB Documentos como a Convenção sobre Diversidade Biológica são importantes por serem tratados internacionais e por criarem direitos e obrigações que, após a ratificação pelos países, passam a ser incorporados às leis do local. Além disso, no caso da CDB, ela está inserida no contexto de manutenção, preservação e evolução dos sistemas necessários à biosfera. São três os objetivos a serem alcançados: conservação, uso sustentável e repartição equitativa dos benefícios advindos do uso da biodiversidade. 120 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II A proposição fundamental que serviu de base à elaboração dessa convenção é a de que o planeta Terra é um conjunto de elementos interconectados e organizados harmonicamente, e o seu bom funcionamento depende do equilíbrio entre as suas partes constituintes. A integração entre seus componentes é estabelecida por meio de um fluxo de informações, matéria e energia que formam um sistema. A boa integração de seus elementos é chamada de sinergia, que significa que as transformações ocorridas em uma das partes influenciarão outras. A falta de sinergia se traduz pelo mau funcionamento do sistema e pode redundar em sua morte ou falência. Por outro lado, o termo resiliência é usado para identificar a capacidade do ecossistema de suportar as intervenções provocadas pelo homem. Sabe‑se que quanto mais abundante for a biodiversidade maior será a resiliência do sistema. Quanto mais acentuada for a intervenção do homem por meio ações como a monocultura, por exemplo, que não tem diversidade, menor será a resiliência. Composta por quarena artigos e dois anexos, a CDB abrange diversos aspectos que envolvem a preservação e manutentação da biodiversidade. Por outro aspecto, compete ao Estado a responsabilidade por seus próprios recursos biológicos e por sua utilização sustentável, uma vez que é passível de observação a redução da diversidade biológica causada por intervenções antrópicas. Conscientes de que existe um longo caminho a ser percorrido e muito a ser feito, elencaram‑se as ações que devem ser tratadas como prioritárias e, dentre elas, estão as capacitações científica, técnica e institucional, consideradas como ações preventivas. Primeiro é preciso conhecer e mapear a diversidade biológica para planejar políticas públicas eficientes de preservação. A estratégia é prever para se antecipar e combater na origem as causas da perda da diversidade biológica. Esse reconhecimento de uma atuação organizada para a preservação da diversidade biológica conduziu à assinatura da convenção, cujo objetivo está descrito da seguinte forma: Os objetivos desta Convenção, a serem cumpridos de acordo com as disposições pertinentes, são a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, e mediante financiamento adequado (BRASIL, 2000a, p. 9). Além de conceitos, a convenção trata também da jurisdição,da cooperação, de medidas de conservação e utilização sustentável, de monitoramento, de incentivos à pesquisa e treinamento, educação e conscientização pública, avaliação de impactos, acesso a recursos genéticos, acesso e transferência de tecnologia, intercâmbio de informações, da gestão da biotecnologia, dos recursos financeiros, dentre outros temas. 121 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE Observação Percebam que se trata de um documento abrangente e, portanto, definir ou elaborar projetos na área do meio ambiente passa pelo conhecimento dessa convenção, seja no âmbito das políticas públicas seja no âmbito privado. A convenção em seu ordenamento inicia tratando de conceitos, de modo a estabelecer uma uniformização de entendimento a todos os países signatários. Portanto, quanto se fala de ecossistema há a clara compreensão de que se trata de um “complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais e de micro‑organismos e o seu meio inorgânico que interagem como uma unidade funcional” (BRASIL, 2000a, p. 9). É no artigo 2º da Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB que estão definidos os conceitos, reproduzido nos mesmos termos em que foram aprovados: Utilização de termos para os propósitos desta Convenção: Área protegida significa área definida geograficamente que é destinada, ou regulamentada e administrada para alcançar objetivos específicos de conservação. Biotecnologia significa qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos, ou seus derivados, para fabricar ou modificar produtos ou processos para utilização específica. Condições in situ significa as condições em que recursos genéticos existem em ecossistemas e habitats naturais e, no caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios onde tenham desenvolvido suas propriedades características. Conservação ex situ significa a conservação de componentes da diversidade biológica fora de seus habitats naturais. Conservação in situ significa a conservação de ecossistemas e habitats naturais e a manutenção e recuperação de populações viáveis de espécies em seus meios naturais e, no caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios onde tenham desenvolvido suas propriedades características. Diversidade biológica significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; incluindo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas. 122 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Ecossistema significa um complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais e de micro‑organismos e o seu meio inorgânico que interagem como uma unidade funcional. Espécie domesticada ou cultivada significa espécie em cujo processo de evolução influiu o ser humano para atender suas necessidades. Habitat significa o lugar ou tipo de local onde um organismo ou população ocorre naturalmente. Material genético significa todo material de origem vegetal, animal, microbiana ou outra que contenha unidades funcionais de hereditariedade. Organização regional de integração econômica significa uma organização constituída de Estados soberanos de uma determinada região, a que os Estados‑Membros transferiram competência em relação a assuntos regidos por esta Convenção, e que foi devidamente autorizada, conforme seus procedimentos internos, a assinar, ratificar, aceitar, aprovar a mesma e a ela aderir. País de origem de recursos genéticos refere‑se ao país que possui esses recursos genéticos em condições in situ. País provedor de recursos genéticos refere‑se ao país que provê recursos genéticos coletados de fontes in situ, incluindo populações de espécies domesticadas e silvestres, ou obtidas de fontes ex situ, que possam ou não ter sido originados nesse país. Recursos biológicos compreendem recursos genéticos, organismos ou partes destes, populações, ou qualquer outro componente biótico de ecossistemas, de real ou potencial utilidade ou valor para a humanidade. Recursos genéticos significa material genético de valor real ou potencial. Tecnologia inclui biotecnologia. Utilização sustentável significa a utilização de componentes da diversidade biológica de modo e em ritmo tais que não levem, em longo prazo, à diminuição da diversidade biológica, mantendo assim seu potencial para atender as necessidades e aspirações das gerações presentes e futuras. Fonte: Brasil (2000a, p. 9‑10). 123 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE No artigo 3º, a convenção trata dos princípios, ao reafirmar o direito soberano do Estado1 em conformidade com a Carta das Nações Unidas2 e com os princípios de Direito internacional, [...] de explorar seus próprios recursos segundo suas políticas ambientais, e a responsabilidade de assegurar que atividades sob sua jurisdição ou controle não causem dano ao meio ambiente de outros Estados ou de áreas além dos limites da jurisdição nacional (BRASIL, 2000a, p. 10). O artigo 4º define o âmbito jurisdicional e dos limites das partes contratantes. No caso da diversidade biológica, restringe‑se às áreas dentro dos limites de sua jurisdição nacional, e, no caso de processos de atividade, aplica‑se o direito de outros Estados, independentemente de seus efeitos ocorrerem dentro ou além dos limites da jurisdição nacional (BRASIL, 2000a, p. 10). Como se trata de um documento extenso, serão pontuados alguns aspectos desse tratado. É importante ressaltar o artigo 6º, que trata das medidas gerais para conservação e utilização sustentável, atribuindo responsabilidade às partes contratantes o desenvolvimento de planos e programas para a conservação e utilização sustentável da biodiversidade. Observação Veja que se trata de uma orientação para as empresas e o governo e ela está em consonância com outros documentos que definem diretrizes para a atuação das organizações. O artigo 6º está relacionado aos artigos 7º (que trata do monitoramento), bem como aos artigos 8º, 9º e 10º. O monitoramento compete ao Estado, que deve vigiar para evitar situações que afetem a biodiversidade, uma vez que empresas que atuam em construção de estradas, hidroelétricas, barragens e madeireiras, por exemplo, promovem mudança no equilíbrio ecossistêmico. O artigo 8º, conservação in situ, o artigo 9º, conservação ex situ, e o artigo 10º, utilização sustentável de componentes da diversidade biológica, estão em consonância com o papel a ser desempenhado pelo Estado para a conservação e o uso sustentável. Definir e administrar áreas protegidas são competências do Estado, e um dos indicadores acompanhados pelos Objetivos do Milênio refere‑se à expansão de áreas de proteção. O Brasil, conforme dados já apresentados, elevou, em termos espaciais, as áreas protegidas. 1 “Estado” refere‑se à nação e é composto por povo, território e soberania. 2 A Carta das Nações Unidas foi aprovada à época da Constituição da ONU, em 1945. 124 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Saiba mais O Atol das Rocas, em Fernando de Noronha, uma área protegida – berçário de muitas espécies de aves e aquáticas – é a primeira reserva biológica marinha do Brasil, e sua administração é de responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Para saber mais sobre áreas de conservação, leia o texto a seguir, da WWF Brasil (ONG): WWF BRASIL. Unidades de conservação. [s.d.]. Disponível em: <http://www.wwf. org.br/natureza_brasileira/questoes_ambientais/unid/>. Acesso em: 10 fev. 2015. Ou ainda no endereço do Ministério do Meio Ambiente (MMA): <http://www.mma.gov.br/>.Também de competência do Estado é a regulamentação e administração de recursos biológicos. Por exemplo, a lei de crimes ambientais, que tem como objetivo a preservação do meio ambiente, e a proibição do comércio de animais em extinção compõem o arcabouço jurídico de proteção. Os animais em extinção são mapeados e incluídos na lista do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, publicado pelo Ministério do Meio Ambiente. Os Livros Vermelhos também são elaborados segundo as espécies, como répteis, peixes, anfíbios, aves, mamíferos, invertebrados terrestres e aquáticos que estão ameaçados de extinção. Figura 27 – Representação de um exemplar do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção 125 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE Acima de tudo, a importância da legislação relaciona‑se às questões de preservação de habitats e da conservação de material genético. A ideia de habitat abrange não só os seres vivos, mas também o seu meio abiótico, ou seja, a interação promovida com as substâncias abióticas (oxigênio, nitrogênio, carbono) que circulam pelo sistema terrestre. A fotossíntese é uma energia derivada dessa interação. Observação Segundo alguns autores, a fotossíntese é a fonte da vida. Quanto à questão do material genético, é preciso ter em conta que a diversidade genética está na base dos processos ecológico‑evolutivos. Não sem razão a alínea “a” do artigo 8º (BRASIL, 2000a) trata da questão de “Estabelecer um sistema de áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais precisem ser tomadas para conservar a diversidade biológica”. É a diversidade genética que promove a constituição dos níveis superiores de espécies e de ecossistemas, razão pela qual se coloca no mesmo nível de importância a conservação das espécies e da composição dos alelos genéticos. Essa composição, afirmam os especialistas, pode variar muito entre os indivíduos de uma mesma população ou entre populações diferentes de uma mesma espécie. Entre populações aparentadas há menos biodiversidade do que entre populações não aparentadas. A baixa diversidade genética compromete a viabilidade de populações em longo prazo, pois diminui a sua capacidade de adaptação a mudanças ambientais e a sua resiliência a estresses bióticos ou abióticos – como ataques de patógenos ou períodos muito quentes. Uma população geneticamente homogênea, ainda que grande, sempre possui maior risco de extinção, pois pode ter todos os seus indivíduos dizimados por uma mesma doença, por exemplo (IPEA, 2011a, p. 1). Comunidades quilombolas que vivem em pequenas comunidades tendem a ter cruzamentos entre aparentados. A mutação de um gene fará replicar os casos na comunidade (IPEA, 2011a). Por exemplo, o albinismo pode ocorrer nessas comunidades e vários membros serem portadores dessa alteração. Esse fenômeno pode ocorrer em qualquer comunidade de seres vivos que sofreram a fragmentação de seu habitat, como plantas, animais etc. A causa da erosão genética está relacionada à destruição ou fragmentação dos habitats, que conduz ao isolamento de populações que já se tornaram pequenas e com menos recursos, elevando assim os níveis de endogamia, ou seja, o cruzamento entre indivíduos aparentados. Isso promove o que se chama de alelos deletérios (prejudiciais à saúde). O alelo deletério provoca baixas taxas de fecundidade e alta mortalidade juvenil. A esse conjunto de fatores dá‑se o nome de depressão endogâmica. 126 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Observação Um alelo é cada uma das várias formas alternativas do mesmo gene, ocupando um dado locus num cromossomo. Outra forma de depressão endogâmica refere‑se às plantas geneticamente modificadas, do tipo transgênico, que, ao substituir cultivos com maior diversidade genética, podem conduzir a situações de erosão genética. O mesmo pode ser dito da técnica da clonagem, já que os descendentes desses animais carregam tão somente as mesmas informações genéticas de sua matriz. A perda de espécies ou o processo de extinção, como aconteceu com os dinossauros, pode ser um processo de longa duração, mas não deixa de ser pela ocorrência de mudanças em seu habitat. A mudança no habitat pode ser resultado de várias causas, até mesmo de catástrofes naturais de ordem climática ou de competidores mais eficientes. Assim como ocorre o desaparecimento de espécies, pode ocorrer o surgimento de novas espécies. Porém, atualmente, observa‑se que as mudanças nos ecossistemas são decorrentes muito mais da ação antrópica, que tem acelerado o processo de extinção de espécies, do que de ordem natural. A expansão da fronteira agrícola, da pecuária e do extrativismo desordenado, tem promovido a degradação e a fragmentação de ambientes naturais. O crescimento das cidades e da malha viária e a construção de hidroelétricas são eventos que também contribuem para a transformação dos habitats. As espécies que sobrevivem aos interesses econômicos dos homens, normalmente reduzidas a um pequeno número, isolam‑se e diminuem os alelos genéticos do grupo, acarretando perda de variabilidade genética, o que as leva à extinção. A perda de habitats e a fragmentação são os maiores responsáveis pela redução da diversidade genética. Daí a importância de se investir no desenvolvimento de técnicas de manejo em paisagens fragmentadas. Uma forma de enfrentamento do problema e que tem apresentado bons resultados são os corredores ecológicos interligando fragmentos. Muitas vezes, esse método se apresenta como o único capaz de conservar plantas cujos polinizadores e dispersores de sementes não atravessam as regiões entre fragmentos isolados. Pesquisas sobre a ecologia e a genética de populações mostram‑se fundamentais, pois o desconhecimento do poder de dispersão das espécies de interesse, assim como da sua estrutura genética populacional antes da fragmentação, pode ser um sério empecilho à sua conservação. A definição de fragmentos naturais que podem abrigar espécies endêmicas como de alta prioridade para a conservação é uma ação que pode frear a erosão genética. Nesse aspecto, revela‑se a importância das orientações contidas nos artigos 8º e 9º da Convenção sobre Diversidade Biológica (BRASIL, 2000a). 127 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE Para o caso da conservação ex situ, os métodos podem ser o de viveiros, zoológicos, banco de sementes, cultivo de células in vitro, criogenia, banco de dados de DNA, dentre outros. A extinção de uma espécie pode ocorrer também por razões muitas vezes consideradas como naturais, mas que na verdade têm a ação do homem como causa, como a introdução de espécies estrangeiras, por exemplo – são os casos de descolamentos de espécies para ambientes diferentes de sua origem. Muitas vezes são espécies que, pela ausência de predadores naturais, tornam‑se maior número. Então, em vantagem sobre as espécies nativas, elas passam a dominar o ambiente de sua ocorrência, reduzindo a diversidade genética. Daí a importância dos artigos 8º, 9º e 10º da Convenção sobre Diversidade Biológica (BRASIL, 2000a). Artigo 8º – Conservação in situ Cada parte contratante deve, na medida do possível e conforme o caso: a) Estabelecer um sistema de áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais precisem ser tomadas para conservar a diversidade biológica. b) Desenvolver, se necessário, diretrizes para a seleção, estabelecimento e administração de áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais precisem ser tomadas para conservar a diversidade biológica. c) Regulamentar ou administrar recursos biológicos importantes para a conservação da diversidade biológica, dentro ou fora de áreas protegidas, a fim de assegurar sua conservação e utilização sustentável. d) Promover a proteção de ecossistemas,habitats naturais e manutenção de populações viáveis de espécies em seu meio natural. e) Promover o desenvolvimento sustentável e ambientalmente sadio em áreas adjacentes às áreas protegidas, a fim de reforçar a proteção dessas áreas. f) Recuperar e restaurar ecossistemas degradados e promover a recuperação de espécies ameaçadas, mediante, entre outros meios, a elaboração e implementação de planos e outras estratégias de gestão. g) Estabelecer ou manter meios para regulamentar, administrar ou controlar os riscos associados à utilização e liberação de organismos vivos modificados, resultantes da biotecnologia que provavelmente provoquem impacto ambiental negativo que possa afetar a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica, levando também em conta os riscos para a saúde humana. 128 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II h) Controlar, erradicar ou impedir que se introduzam, espécies exóticas que ameacem os ecossistemas, habitats ou espécies. i) Procurar proporcionar as condições necessárias para compatibilizar as utilizações atuais com a conservação da diversidade biológica e a utilização sustentável de seus componentes. j) Em conformidade com sua legislação nacional, respeitar, preservar e manter o conhecimento, as inovações e as práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica e incentivar a sua mais ampla aplicação com a aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento, inovações e práticas; e encorajar a repartição equitativa dos benefícios oriundos da utilização desse conhecimento, inovações e práticas. k) Elaborar ou manter em vigor a legislação necessária e/ou outras disposições regulamentares para a proteção de espécies e populações ameaçadas. l) Quando se verifique um sensível efeito negativo à diversidade biológica, em conformidade com o art. 7º, regulamentar ou administrar os processos e as categorias de atividades em causa. m) Cooperar com o aporte de apoio financeiro e de outra natureza para a conservação in situ a que se referem as alíneas “a” a “l” acima, particularmente aos países em desenvolvimento. Artigo 9º – Conservação ex situ Cada parte contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, e principalmente a fim de complementar medidas de conservação in situ: a) Adotar medidas para a conservação ex situ de componentes da diversidade biológica, de preferência no país de origem desses componentes. b) Estabelecer e manter instalações para a conservação ex situ e pesquisa de vegetais, animais e micro‑organismos, de preferência no país de origem dos recursos genéticos. c) Adotar medidas para a recuperação e regeneração de espécies ameaçadas e para a sua reintrodução em seu habitat natural em condições adequadas. d) Regulamentar e administrar a coleta de recursos biológicos de habitats naturais com a finalidade de conservação ex situ de maneira a não ameaçar ecossistemas e populações in situ de espécies, exceto quando forem necessárias medidas temporárias especiais ex situ de acordo com a alínea (c) acima. 129 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE e) Cooperar com o aporte de apoio financeiro e de outra natureza para a conservação ex situ a que se referem as alíneas “a” a “d” acima; e com o estabelecimento e a manutenção de instalações de conservação ex situ em países em desenvolvimento. Artigo 10 – Utilização sustentável de componentes da diversidade biológica Cada parte contratante deve, na medida do possível e conforme o caso: a) Incorporar o exame da conservação e utilização sustentável de recursos biológicos no processo decisório nacional. b) Adotar medidas relacionadas à utilização de recursos biológicos para evitar ou minimizar impactos negativos na diversidade biológica. c) Proteger e encorajar a utilização costumeira de recursos biológicos de acordo com práticas culturais tradicionais compatíveis com as exigências de conservação ou utilização sustentável. d) Apoiar populações locais na elaboração e aplicação de medidas corretivas em áreas degradadas onde a diversidade biológica tenha sido reduzida. e) Estimular a cooperação entre suas autoridades governamentais e seu setor privado na elaboração de métodos de utilização sustentável de recursos biológicos. Fonte: Brasil (2000a, p. 11‑13). Segundo o Ministério do Meio Ambiente (BRASIL, 2008b, p. 5), “o Brasil já possui uma considerável gama de experiências e instrumentos que estimulam e viabilizam o alcance dos três objetivos da CDB”. No Brasil, muitas espécies já estão catalogadas com risco de extinção. São consideradas espécies ameaçadas aquelas cujas populações e habitats estão desaparecendo rapidamente e com risco de serem extintas, seja pelo comércio irregular de animais, seja pela destruição dos recursos naturais que garantem a sustentação dessas espécies, como os micro‑organismos do solo, as sementes que servem de alimentos para muitas espécies, o nível adequado de oxigenação da água etc. Os desequilíbrios dos ecossistemas alteram as funções da natureza que garantem o bem‑estar humano; isso e o desaparecimento de espécies são perdas de serviços da natureza de difícil valoração econômica. 130 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Figura 28 – Arara azul (Cyanopsitta spixii (cyano = azul escuro; psitta = psitacídeo)– espécie ameaçada de extinção no Brasil A) B) Figura 29 – Lobo‑guará e mero – espécies ameaçadas de extinção no Brasil A) B) Figura 30 – Baleia franca e mico‑leão‑preto – espécies ameaçadas de extinção no Brasil No Brasil, uma das formas encontradas para a sensibilização social das espécies ameaçadas são as campanhas realizadas pelo governo federal. Colocar a foto de alguns animais nas moedas nacionais foi uma forma de representar a força dessa riqueza natural e ainda conscientizar sobre a conservação 131 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE desses animais. O mico‑leão‑dourado está identificado na nota de vinte reais e a onça‑pintada nas notas de cinquenta reais A) B) Figura 31 – Campanha de sensibilização com inserção de figuras de espécies em extinção, em moedas de circulação nacional, como os casos do mico‑leão‑dourado, espécie nativa da mata Atlântica que se tornou símbolo da luta pela preservação, e da onça‑pintada, espécie característica do Brasil que, apesar de estar ameaçada de extinção, ainda pode ser encontrada no Pantanal Mato‑grossense e na Amazônia Saiba mais O documentário seguinte permite perceber claramente a importância da preservação do patrimônio genético brasileiro: O VENENO da Jararaca – acesso ao patrimônio genético brasileiro. Dir. Marcya Reis. Brasil: TV Câmara, 2012. 42 minutos. 5.2 Tecnologia a favor da preservação ambiental Os ecologistas apontam diversos caminhos a serem seguidos para a preservação ambiental. Um deles é o envolvimento da sociedade no monitoramento do progresso, já que a natureza é finita e que o sonho do crescimento ilimitado não é realizável. Um primeiro passo é reconhecer as limitações ecológicas e os desafios socioeconômicos que elas exigem. O prejuízo ecológico decorrente da atividade econômica não pode ser interpretado simplesmente como uma externalidade negativa, afirmam os ecologistas. Para eles, aceitar esse conceito como verdadeiro é o mesmo que reconhecer que natureza e humanidade sejam partes separadas, o que não é verdade. Eles defendem, como princípio, que homem e natureza fazem parte de um mesmo ambiente, e por isso o mundo natural não pode ser separado do mundo do trabalho. Afirmam que o modo de vida nas metrópoles dificulta a percepçãoda real dependência da natureza (BELLEN, 2006, p. 116). A natureza passa a ser considerada apenas como um ambiente de lazer e não como provedora de serviços para o bem‑estar humano. Muitas crianças nascidas e criadas nas grandes cidades acreditam que a fonte de fornecimento de seu alimento é o supermercado. A noção sobre a origem de um ovo de galinha, da fruta e da carne que consomem é muito vaga. A modernidade está relacionada ao modo de vida urbano e o atraso ao modo rural. 132 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Para a corrente dos ecologistas, as causas da degradação da natureza estão mais que esclarecidas e a sociedade deve tomar uma posição para a busca de solução, mesmo que os problemas sejam de ordem financeira. A destruição é resultado de uma busca incessante somente pelo ganho econômico, que reverte apenas para alguns, enquanto seus efeitos (externalidades negativas) atingem a todos, indistintamente. Recuperar o que foi perdido e preservar o que sobrou demanda razoável grau de investimento, principalmente em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias. A conservação ex situ requer que se reproduzam as mesmas condições do ambiente natural das espécies, e a reprodução em cativeiro de espécies em extinção não é tarefa das mais fáceis. Há que se considerar a indisponibilidade de espaços físicos, o que dificulta na apresentação de condições adequadas para as espécies. No caso dos mamíferos de grande porte, o problema aumenta na mesma proporção do tamanho desses animais. A conservação das sementes de algumas espécies já é possível e sua técnica já é de domínio público. Basta que se desidratem as sementes a 5% de seu teor de umidade inicial e as coloquem em equipamentos de armazenamento a ‑18 ºC, o que as conservará por muito e muito tempo. Porém, nem todas as sementes preservam as condições adequadas. É o caso de numerosas espécies arbóreas e arbustivas, nativas de regiões tropicais e subtropicais, e muitas de importância econômica, como o dendê (Elaeis oleifera) e o cacau (Theobroma cacao), que são danificadas e perdem a viabilidade quando armazenadas nas mesmas condições. Além disso, há espécies que se propagam apenas vegetativamente como é o caso da mandioca (Manihot esculenta). As técnicas de preservação têm evoluído e alternativas já se apresentam de forma viável, como o caso da criopreservação, definida como a conservação de material biológico em nitrogênio líquido a ‑196 ºC, ou em sua fase de vapor a ‑150 ºC. Essa abordagem já está sendo utilizada de forma eficaz na conservação de células de tecido vegetal e animal, bem como de micro‑organismos, com baixo custo relativo. Quanto à agricultura de larga escala, apesar do aumento da produtividade com o uso de sementes transgênicas de ganhos econômicos imediatos, em longo prazo, pode‑se elevar a fragilidade das espécies em relação a patógenos e comprometer a segurança alimentar por duas vias: pela dependência econômica das empresas fornecedoras de sementes e pelo desequilíbrio da biodiversidade em cultivos que vão se homogeneizando (IPEA, 2011a). Do ponto de vista econômico, cria‑se total dependência do agricultor em relação às empresas transnacionais, que são as detentoras das patentes. O uso do produto só é possível por meio de contrato com o devido pagamento de royalties. A semente de uma safra não pode ser utilizada em outra; se isso ocorrer, as empresas podem multar o agricultor e obrigá‑lo a realizar o devido pagamento dos royalties. A biotecnologia tem elevado a produtividade agrícola, razão pela qual é estratégico o conhecimento e a conservação da biodiversidade para o seu desenvolvimento de forma plena. Para isso, é preciso 133 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE investimentos em pesquisa e treinamento, bem como acesso à tecnologia e também transferência de tecnologia, conforme o estabelecido no artigo 16 da Convenção sobre Diversidade Biológica. Artigo 12 – Pesquisa e treinamento As partes contratantes, levando em conta as necessidades especiais dos países em desenvolvimento, devem: a) Estabelecer e manter programas de educação e treinamento científico e técnico sobre medidas para a identificação, conservação e utilização sustentável da diversidade biológica e seus componentes, e proporcionar apoio a esses programas de educação e treinamento destinados às necessidades específicas dos países em desenvolvimento. b) Promover e estimular pesquisas que contribuam para a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica, especialmente nos países em desenvolvimento, conforme, entre outras, as decisões da conferência das partes tomadas em consequência das recomendações do Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico, Técnico e Tecnológico. c) Em conformidade com as disposições dos arts. 16, 18 e 20, promover e cooperar na utilização de avanços científicos da pesquisa sobre diversidade biológica para elaborar métodos de conservação e utilização sustentável de recursos biológicos (BRASIL, 2000a, p. 13 e 14). Segundo o Ipea (2011a), no que diz respeito à diversidade genética, o Brasil possui pouco conhecimento, e a pesquisa em exemplares da biodiversidade brasileira encontra‑se no seu início. O que existe são estudos específicos e normalmente se concentram sobre uma única espécie. A maioria das espécies nativas ainda é desconhecida e pode estar sendo irremediavelmente perdida (IPEA, 2011a). As pesquisas estimulam e aumentam o conhecimento sobre as espécies. Esse conhecimento pode representar a descoberta de vários códigos para a cura de doenças, bem como o aumento da produção de alimentos e outros problemas que a humanidade poderá enfrentar. Segundo o Ipea (2011a), o Ministério do Meio Ambiente, no âmbito do Projeto de Estratégia Nacional da Biodiversidade, num esforço de elaborar um documento que sintetizasse o conhecimento a respeito dos grupos taxonômicos mais conhecidos e catalogados, consultou vários especialistas para esse fim. No âmbito do projeto, estimou‑se que o País detém 13% do total mundial de espécies conhecidas e catalogadas do mundo. Isso representa em termos médios que 1,8 milhão de espécies estão no Brasil, mas apenas 200 mil espécies são conhecidas e catalogadas. Os grupos taxonômicos de maior interesse econômico são os mais catalogados no mundo, como bactérias e afins, fungos e os insetos. 134 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Tabela 11 – Número total de espécies em grandes grupos taxonômicos no mundo e no Brasil (Em milhares de espécies) Grupo Mundo Brasil Média Brasil/mundo Média Limite inferior Limite superior Vírus 400 52,6 40,1 70,4 13,2% Bactérias e afins 1.000 131,4 100,2 175,9 13,1% Fungos 1.500 197,1 150,3 263,9 13,1% Protozoários 200 26,3 20,0 35,2 13,2% Algas 400 52,6 40,1 70,4 13,2% Plantas 320 51,5 48,5 54,5 16,1% Nematoides 400 52,6 40,1 70,4 13,2% Crustáceos 150 19,7 15,0 26,4 13,1% Aranhas e Afins 750 98,5 75,2 132,0 13,1% Insetos 8.000 1.051,0 801,8 1.407,6 13,1% Moluscos 200 26,3 20,0 35,2 13,2% Vertebrados e Afins 20 7,9 7,2 8,8 39,5% Outros 250 32,8 25,1 44,0 13,1% Total 13.590 1.800,3 1.383,6 2.394,7 13,2% Adaptado de: IPEA (2011a, p. 6). 5.2.1 Pesquisa e desenvolvimento O Brasil posiciona‑se como o campeão em biodiversidade. Essa diversidade o coloca entre os dezessete países megadiversos do mundo. Vários produtos consumidos atualmente tem sua fonte na biodiversidade nacional, devido às inovações de produtos e processos no campo das ciências biológicas, a Biotecnologia. A indústria farmacêutica, a de alimentos e bebidas e a química são beneficiárias desse conhecimento. O avanço do conhecimento na área da Biotecnologia tem permitido o desenvolvimento de uma gama variada de produtos e processos de fabricação. Isso tem impactadoo mercado e o mundo dos negócios. Especialistas chamam a atenção para o processo de convergência dos negócios em algumas atividades industriais. O que antes eram negócios compartimentalizados agora estão cada vez mais próximos. Os subsetores industriais como o alimentar, o farmacêutico, o químico, o da saúde, da energia e da informação estão estreitando cada vez mais os seus laços de negócios, sinalizando para o futuro a constituição de uma grande indústria: a bioindústria. A Embrapa, instituição mantida pelo governo federal, tem se tornado centro de referência no desenvolvimento de pesquisa na área da Biotecnologia. Seus pesquisadores já dominam a técnica da clonagem, sendo que o primeiro clone de animal, no Brasil, foi conduzido pelos técnicos dessa empresa. Na 135 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE unidade de Recursos Genéticos e Biotecnologia, estão sendo desenvolvidas pesquisas de nanotecnologia e biologia sintética com fios de teias da aranha Nephylengys, da biodiversidade brasileira. A plataforma tecnológica em desenvolvimento é a de moléculas de alto valor agregado conseguida a partir de plantas, animais e micro‑organismos geneticamente modificados. O estudo do genoma de aranhas coletado em três diferentes biomas brasileiros (Mata Atlântica, Amazônia e Cerrado) revelou que a teia de aranha é um dos fios mais resistentes e flexíveis da natureza, informa a Embrapa (apud DINIZ, 2013, p. 10). A técnica resume‑se na identificação e isolamento de genes das aranhas com o intuito de desenvolver polímeros. Os primeiros resultados do desenvolvimento de polímeros foram possíveis a partir da clonagem dos genes da aranha associados à produção da teia. A ideia é produzir em laboratório uma teia sintética que reúna as características de resistência e alta elasticidade. Segundo Rech (apud VASCONCELOS, 2014), um dos pesquisadores envolvidos no projeto, a Embrapa já tem o domínio da tecnologia da produção de fios de teias de aranha em laboratório, e só falta definir um meio econômico, rápido e seguro para a sua produção em larga escala. Segundo o pesquisador, isso valorizará ainda mais a biodiversidade brasileira que, num modelo de biofábricas, possibilitará a produção de medicamentos e outros insumos para o bem‑estar humano, de forma segura e acessível aos consumidores. Será possível usar o polímero sintético pesquisado na área da saúde, para suturas em cirurgias. As bactérias e os fungos são outra área de investigação que tem recebido investimento público. Esses micro‑organismos existentes no solo são os maiores produtores de moléculas conhecidas como metabólitos secundários, explica a professora Luciana G. de Oliveira, que tem estudado o assunto no âmbito do projeto Explorando a Biodiversidade Brasileira para a Obtenção de Produtos Naturais e “Não Naturais” (TOLEDO, 2012). Segundo a pesquisadora: Ao contrário do que o nome possa sugerir, essas moléculas são essenciais para a sobrevivência dos microrganismos, pois fazem parte dos processos de crescimento, desenvolvimento e reprodução. Além disso, muitos metabólitos secundários apresentam propriedades bioativas, ou seja, podem ser usados no desenvolvimento de fármacos. A maioria dos metabólitos secundários com potencial terapêutico foi descoberta na era de ouro dos antibióticos – entre 1944 e 1972 – e deu origem a medicamentos que usamos até hoje, como a eritromicina e a rapamicina (TOLEDO, 2012). Mas as pesquisas nessa área, segundo a professora (apud TOLEDO, 2012), foram diminuindo ao longo do tempo e, mais recentemente, com o barateamento das técnicas de mapeamento genético, os pesquisadores voltaram a ter esperanças. Os investimentos estão voltados para o sequenciamento do genoma das actinobactérias. Desse mapeamento, já se descobriu a presença de genes não conhecidos. O avanço desse conhecimento permitirá estimar o potencial do micro‑organismo em sintetizar alvos de interesse, informou Oliveira. 136 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Outra iniciativa, objetivando mapear de forma segura a biodiversidade no País, tem como protagonista o governo federal, com o Projeto do Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira (SiBBr), lançado em audiência pública na Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado Federal. O objetivo é construir um banco de dados “metadados”, de modo a preservar o conhecimento e garantir o uso de dados da biodiversidade, já que o País é o que detém a maior diversidade de aves, primatas e anfíbios da América do Sul. O projeto poderá contribuir para implementar políticas públicas e para a tomada de decisões sobre meio ambiente, segundo o governo federal. O investimento é da ordem de US$ 28 milhões, sendo US$ 20 milhões do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e US$ 8 milhões do Fundo Global para o Meio Ambiente. É conhecido o fato que os invertebrados respondem por 95% dos animais hoje viventes, e o número de espécimes tombados em coleção brasileira é quase oito vezes maior que o total de animais vertebrados. Por exemplo, os cupins, os ácaros e as formigas impactam nas atividades agrícolas e florestais, outros atuam como vetores de patógenos ou parasitas humanos. Outros ainda contribuem para a polinização de culturas, para a melhoria da estrutura do solo e para o desenvolvimento de fármacos, como as aranhas e os escorpiões. A função dos micro‑organismos na produção de valor na economia Micro‑organismos são seres vivos unicelulares microscópicos, incluindo bactérias, arqueas, fungos, protozoários e vírus. Do ponto de vista ecológico, sua importância se revela em toda a cadeia da vida no planeta. Do ponto de vista econômico, eles fazem parte do processo da fotossíntese, da ciclagem de nutrientes, da manutenção da fertilidade da terra, além de sua aplicação em diversos setores industriais, como: alimentos e bebidas, química, papel e celulose. Além disso, são usados no tratamento de efluentes industriais, esgoto e resíduos sólidos. O isolamento e o cultivo de micro‑organismos em laboratório respondem também por considerável parcela das inovações nas áreas médica, biotecnológica e ambiental. Porém, o conhecimento de sua diversidade ainda é reduzido em relação a outros grupos, relatam os pesquisadores da área. O processo da biodegradação e biorremediação A biorremediação é um processo ou estratégia que busca detoxificar o solo ou outros ambientes contaminados, fazendo uso de micro‑organismo como fungos, bactérias e enzimas. A poluição por petróleo e seus derivados em ambientes marinhos têm sido um dos principais problemas ambientais das últimas décadas. 137 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE Figura 32 – Representação da poluição por petróleo sobre os animais A biodegradação é um processo de estimulação natural utilizada para a limpeza de derramamentos de óleos e tratamentos terrestres e aquáticos. A descoberta de que certas bactérias que vivem em sedimentos marinhos e em areias de praia têm a capacidade de degradar os seus componentes permitiu o desenvolvimento de método biológico para o tratamento de derrames. A técnica de biorremediação envolve variações de tratamentos in situ – no local – e ex situ – fora do local – que podem incluir inúmeros procedimentos. Vários contaminantes podem ser tratados biologicamente com sucesso. Estes incluem petróleo bruto, seus hidrocarbonetos como gasolina – que contém benzeno, xileno, tolueno e etilbenzeno –, óleo diesel, combustível de avião, preservativos de madeira, solventes diversos, lodo de esgoto e outros compostos xenobióticos ou biogênicos. Outra técnica refere‑se à fitorremediação, que pode ser definida como o uso da vegetação in situ para o tratamento de solos contaminados.Os solos contaminados por metais pesados podem ser recuperados naturalmente. As plantas absorvem esses metais em seus tecidos e liberam oxigênio para o solo e outros compostos, estimulando a biorremediação por fungos ou outros micro‑organismos localizados no sistema solo‑raiz. 5.2.2 Tecnologia e biossegurança As inovações tecnológicas na área da biotecnologia remontam a meados dos anos de 1970. Devido ao pouco conhecimento existente à época, era comum relacionar a essa intervenção genética algum tipo de risco, daí utilizar‑se o termo biorrisco, ou bioperigo. À medida que se ampliam os conhecimentos a respeito da técnica e, principalmente, em razão da comercialização de produtos derivados dessa intercorrência, a terminologia é substituída por biossegurança. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) utiliza o conceito de biossegurança como o uso sadio e sustentável, em termos ambientais, de produtos biotecnológicos. Não existe consenso a respeito dos impactos que essa bioindústria pode vir a causar sobre o meio ambiente em todos os seus aspectos, incluindo a saúde humana. Nesse sentido, defende‑se a 138 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II elaboração de normas e mecanismos de monitoramento e rastreabilidade para assegurar que essas novas tecnologias não acarretem danos à saúde humana, animal e à natureza, bem como de estudos de impacto socioeconômico e culturais. Observação O Brasil aprovou a Lei de Biossegurança (nº 11.105/05) que foi regulamentada pelo Decreto nº 5.591 em 22 de novembro de 2005. Essa legislação disciplina o plantio e a comercialização de organismos geneticamente modificados (OGM) e autoriza o uso de células‑tronco embrionárias, obtidas de embriões humanos por fertilização in vitro para fins de pesquisa e terapia. Por esse dispositivo legal, também foi criado o Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), com competência para formular e implementar a Política Nacional de Biossegurança (PNB), que reestruturou a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). O artigo 16 da Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB – reconhece a importância do desenvolvimento das tecnologias e das transferências desses saberes, desde que essas tecnologias estejam em consonância com a conservação e utilização sustentável da diversidade biológica. A elaboração de medidas legislativas, administrativas ou políticas, conforme o caso, deve garantir que as partes contratantes, em particular os países em desenvolvimento, que são provedores de recursos genéticos, tenham garantido o acesso à essa tecnologia. O uso desses recursos tecnológicos e sua transferência, de comum acordo, deve incluir tecnologia protegida por patentes e outros direitos de propriedade intelectual. Nesse aspecto, a CDB, ao estimular o uso da biotecnologia, incentiva que os usuários tenham acesso tenham acesso ao conhecimento técnico por meio da transferência desses saberes. Artigo 16 – Acesso à tecnologia e transferência de tecnologia 1. Cada parte contratante, reconhecendo que a tecnologia inclui biotecnologia, e que tanto o acesso à tecnologia quanto a sua transferência entre partes contratantes são elementos essenciais para a realização dos objetivos desta Convenção, compromete‑se, sujeito ao disposto neste artigo, a permitir e/ou facilitar a outras partes contratantes o acesso a tecnologias que sejam pertinentes à conservação e utilização sustentável da diversidade biológica ou que utilizem recursos genéticos e não causem dano sensível ao meio ambiente, assim como a transferência dessas tecnologias. 2. O acesso à tecnologia e sua transferência a países em desenvolvimento, a que se refere o § 1º acima, devem ser permitidos e/ou facilitados em condições justas e as mais favoráveis, inclusive em condições concessionais e preferenciais quando de comum acordo, e, caso necessário, em conformidade com o mecanismo financeiro 139 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE estabelecido nos artigos 20 e 21. No caso de tecnologia sujeita a patentes e outros direitos de propriedade intelectual, o acesso à tecnologia e sua transferência devem ser permitidos em condições que reconheçam e sejam compatíveis com a adequada e efetiva proteção dos direitos de propriedade intelectual. A aplicação deste parágrafo deve ser compatível com os §§ 3, 4 e 5 abaixo. 3. Cada parte contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas, conforme o caso, para que as partes contratantes, em particular as que são países em desenvolvimento, que proveem recursos genéticos, tenham garantido o acesso à tecnologia que utilize esses recursos e sua transferência, de comum acordo, incluindo tecnologia protegida por patentes e outros direitos de propriedade intelectual, quando necessário, mediante as disposições dos artigos 20 e 21, de acordo com o direito internacional e conforme os §§ 4 e 5 abaixo. 4. Cada parte contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas, conforme o caso, para que o setor privado permita o acesso à tecnologia a que se refere o § 1 acima, seu desenvolvimento conjunto e sua transferência em benefício das instituições governamentais e do setor privado de países em desenvolvimento, e a esse respeito deve observar as obrigações constantes dos §§ 1, 2 e 3 acima. 5. As partes contratantes, reconhecendo que patentes e outros direitos de propriedade intelectual podem influir na implementação desta Convenção, devem cooperar a esse respeito em conformidade com a legislação nacional e o direito internacional para garantir que esses direitos apoiem e não se oponham aos objetivos desta Convenção. Fonte: Brasil (2000a, p. 15‑16). A engenharia genética genômica e as tecnologias de clonagem de animal compreendem tecnologias que envolvem o chamado DNA recombinante. Os transgênicos ou organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados encaixam‑se nessa categoria. A clonagem animal, por exemplo, consiste em substituir o núcleo de óvulo pelo material genético do animal a ser copiado. A reprodução se dá de forma assexuada. O embrião é ativado por substâncias químicas e desenvolve‑se como se fosse originado de um espermatozoide. Justifica‑se a clonagem de animais para estudos de doenças degenerativas. A expansão no uso de sementes geneticamente modificada já é uma realidade; o mercado global está estimado em US$ 9,2 bilhões, sendo que do total de culturas transgênicas 70% refere‑se à soja, 25% de milho e 46% de algodão. Ainda, o Brasil já ultrapassou a Argentina em termos de área agrícola plantada com transgênicos, e os Estados Unidos lideram a produção de transgênicos, desde o primeiro cultivo de soja transgênica, em 1996. Segundo o relatório 2013 da International Service for the Aquisition of Agri‑biotech Aplications (ISAAA), o uso global de transgênicos é recorde com 175,2 milhões de hectares plantados em todo 140 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II o mundo em 2013, o que representa crescimento à taxa anual de 3%. Vinte e sete países no mundo utilizam plantio de sementes de genes combinados. Os países em desenvolvimento foram os que mais cresceram (54%), com 94 milhões de hectares de lavouras, segundo a ISAAA. Parcerias público‑privadas foram estabelecidas com sucesso no Brasil, Indonésia e Bangladesh. No Brasil, por meio de parceria público‑privada entre a Embrapa e uma multinacional alemã, foi desenvolvida a Cultivance, uma soja geneticamente modificada. Segundo o ISAAA, entre 1996 e 2012, as culturas biotecnológicas contribuíram para a segurança alimentar, sustentabilidade, meio ambiente e mudanças climáticas. Esse feito deve‑se ao aumento da produtividade, à economia no uso de pesticidas, à redução de emissões de CO2 em 26.700 milhõesde kg, à conservação da biodiversidade por salvar 123 milhões de hectares de terras e tem contribuido para a diminuição da pobreza de milhões de pequenos agricultores e suas famílias. Porém, apesar disso, muito se discute ainda sobre os impactos dos transgênicos sobre o meio ambiente e os efeitos adversos que podem causar à saúde humana e animal. Do ponto de vista econômico, já está comprovado que essa tecnologia elevou a produtividade do plantio, mas ainda se discute a vulnerabilidade e a dependência dos países e dos pequenos agricultores, que sempre estarão submetidos a contratos e ao pagamento de royalties para as grandes empresas do setor que atuam na forma de oligopólio. Por outro lado, considerando o crescimento populacional e o aumento da expectativa de vida das pessoas, a questão alimentar torna‑se ponto crucial na agenda da sociedade. Segundo a FAO (2009), o crescimento da fome no mundo atingiu em 2009 mais de um milhão de pessoas. O desafio é garantir segurança alimentar para essas pessoas e para a geração futura, que deverá chegar a mais de nove bilhões em 2050. Nesse aspecto, é crucial o aumento da produtividade no campo e a tecnologia OGM tem respondido a essa expectativa, mesmo com as incertezas que isso pode trazer no futuro. Independente do debate que transita entre o bem e o mal dos OGM, os dados da ISAAA revelam que o crescimento no uso dessa tecnologia expandiu‑se de forma significativa nos países em desenvolvimento e que a biotecnologia já se consolidou como indústria. O uso de sementes tolerantes à seca já é uma realidade, e a lista se amplia para cana, eucalipto, alface, berinjela e mosquitos geneticamente modificados, como é o caso das experiências que estão sendo desenvolvidas no Brasil com o mosquito da dengue. 6 POLÍTICA NACIONAL DE PRESERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE De acordo com artigo 6º da CDB, as partes contratantes devem: a) Desenvolver estratégias, planos ou programas para a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica ou adaptar para esse fim estratégias, planos ou programas existentes que devem refletir, entre outros aspectos, as medidas estabelecidas nesta Convenção concernentes à parte interessada. 141 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE b) Integrar, na medida do possível e conforme o caso, a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica em planos, programas e políticas setoriais ou intersetoriais pertinentes (BRASIL, 2000a, p. 11). Todos os estudos que envolveram a questão do desenvolvimento sustentável tiveram ressonância na sociedade por manifestarem uma ética da preservação e do comportamento responsável. O reconhecimento de que os recursos naturais têm proporcionado os meios de sobrevivência aos seres humanos ao longo de sua existência e de que as descobertas na área da ciência genômica abriram novas oportunidades para o desenvolvimento sustentável conduziu à elaboração de políticas de preservação da biodiversidade. As convenções internacionais cumpriram papel relevante por criarem direitos e obrigações entre as partes signatárias. A política de preservação é importante e necessária, devido à pressão que os seres humanos exercem sobre os recursos biológicos, ameaçando‑os de extinção. Na trajetória de crescimento econômico, essa situação torna‑se insustentável e as partes tem a responsabilidade de assegurar que as atividades sob o seu território jurisdicional não causem dano sobre o meio ambiente. A CDB é importante para criar compromissos com a conservação da biodiversidade, e a política nacional brasileira insere‑se nesse contexto. Observação Atualmente, os governos estão mais envolvidos com a conservação da biodiversidade em razão da ação internacional e pelo envolvimento da sociedade. A megadiversidade brasileira coloca o País em posição de destaque entre os países megadiversos. Mas essa riqueza sofre com a biopirataria e com o pouco conhecimento sobre as espécies existentes no território nacional. No Brasil, a política nacional sobre biodiversidade inclui elaboração e atualizações permanentes de listas nacionais oficiais – os volumes do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção e os Planos de Ação Nacionais para a Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção. Mas os desafios ainda são muito grandes. Dentre eles, a formação de especialistas (taxonomistas), uma vez que existe escassez de recursos humanos e de infraestrutura nessa área. Os recursos existentes, tanto relativos ao capital humano quanto a laboratórios, concentram‑se nas regiões mais desenvolvidas do País. Os centros de pesquisas que atuam na área são: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Instituto de Medicina Tropical (IMT) da USP/SP, o Instituto Adolfo Lutz (IAL) e o Instituto Evandro Chagas (IEC), todos públicos. Poucos são os laboratórios mantidos por empresas privadas e com investimentos próprios no País. 142 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II 6.1 Código Florestal O processo de aprovação do novo Código Florestal Brasileiro foi cercado de intenso debate envolvendo a sociedade civil organizada, acadêmicos, governo e representações políticas, dentre outros. Cercado de intenso debate e pouco consenso, o código é sancionado em 25 de maio de 2012, com a promulgação da Lei nº 12.651. Como compromisso soberano do País, o código estabelece as normas de preservação das florestas e demais formas de vegetação nativa, bem como da biodiversidade, do solo, dos recursos hídricos e da integridade do sistema climático, para o bem‑estar das gerações presente e futura, buscando harmonizar o uso produtivo da terra, da água, do solo e da vegetação. É no âmbito dessa lei (BRASIL, 2012b) que se define: • Amazônia Legal como as áreas dos estados do Acre, Pará, Amazonas, Rondônia, Amapá, Mato Grosso mais as regiões situadas ao norte do paralelo 13º S, dos estados de Tocantins e Goiânia e ao oeste do meridiano de 44º W do estado do Maranhão. • Áreas de Proteção Permanente (APP) como áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem‑estar das populações humanas. • Reserva Legal (ARL) como área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, com a função de assegurar o uso econômico dos recursos naturais do imóvel rural, de modo sustentável, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção da fauna silvestre e da flora nativa. • Manejo sustentável como sendo a administração da vegetação natural para a obtenção de benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando‑se os mecanismos de sustentação do ecossistema que é objeto do manejo e considerando‑se cumulativa ou alternativamente a utilização de múltiplas espécies, madeireiras ou não, de múltiplos produtos e subprodutos da flora, bem como a utilização de outros bens e serviços. • Área rural consolidada como área de imóvel rural com ocupação antrópica preexistente a 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a adoção do regime de pousio. • Pequena propriedade ou posse rural familiar como área explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentos e projetos de reforma agrária. • Uso alternativo do solo como sendo a substituição de vegetação nativa e formações sucessoras por outras coberturas do solo, como atividades agropecuárias, industriais, de geração e transmissão de energia, de mineração e de transporte, assentamentos urbanos ou outras formas de ocupação humana.143 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE A lei define ainda o que são áreas de utilidade pública, de interesse social e outros conceitos, como manguezal, vereda, nascente etc., incluindo também o conceito de crédito de carbono como um título de direito sobre bem intangível e incorpóreo transacionável. A aprovação do código foi importante, pois estabeleceu limites de uso das áreas dos imóveis rurais, das áreas de proteção permanente, de reserva legal e de área rural consolidada. O novo Código Florestal é composto por 84 artigos distribuídos em catorze capítulos. 7 BIOMAS BRASILEIROS Em 2004, a parceria institucional entre o IBGE e o Ministerio do Meio Ambiente – MMA – resultou no Mapa de Biomas do Brasil: Primeira Aproximação. Essa iniciativa acontece após o País aprovar a CDB, assumir a responsabilidade sobre seus próprios recursos biológicos e reconhecer a necessidade de mapear e conhecer a diversidade biológica como sustentáculos para o planejamento de políticas públicas. Para a elaboração do mapa foi preciso primeiro entender e conceituar o que seria um bioma. Nesse esforço técnico, definiu‑se bioma como um conjunto de vida vegetal e animal constituído pelo agrupamento de tipos de vegetação contíguos e identificáveis em escala regional, com condições geoclimáticas similares e história compartilhada de mudanças, resultando em uma diversidade biológica própria. Definido o entendimento sobre o que é um bioma, passou‑se a classificar o País segundo esse conceito. Foram identificados seis biomas, conforme pode ser observado na figura seguinte. AM AP PA AC RO MT MA BA RN PB PE AL SETO GO DF MG ES RJ MS SP PR SC RS PI CE RR Figura 33 – Representação geográfica dos biomas brasileiros 144 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Ocupando quase a metade da porção geográfica da América do Sul, o Brasil possui uma extensão territorial de 8,5 milhões de km2. No censo de 2000, éramos quase 170 milhões de habitantes e em 2010 esse número aumentou para mais de 190 milhões, segundo os dados do censo realizado pelo IBGE. Por conta dessa vastidão geográfica, identificam‑se várias áreas climáticas e variações ecológicas distintas, formando zonas biogeográficas diferentes ou biomas. Essa variedade de biomas reflete a enorme riqueza da flora e da fauna brasileira, como o clima úmido no Norte, o semiárido no Nordeste e áreas temperadas no Sul (IBGE). Por conta dessa variedade climática, muitas espécies são classificadas como endêmicas, ou seja, espécies que são encontradas em apenas determinadas regiões geográficas. A jabuticaba, por exemplo, é uma fruta genuinamente brasileira, nativa da Mata Atlântica e, apesar de ser encontrada em outros países, ela é endêmica do Brasil. O mesmo ocorre com a seringueira: de alto valor econômico para a produção da borracha, é nativa da região amazônica e pode ser encontrada em outros países. Outro exemplo é o cajueiro, cujo fruto é o caju, rico em ferro e vitamina C e muito apreciado e consumido na região Nordeste do País, onde é mais encontrado por ser uma planta nativa da região litorânea e originariamente brasileira. De acordo com a classificação do IBGE (2004), o bioma de maior extensão territorial é o da Amazônia. Juntamente com o do Cerrado, ocupa 73% do território nacional. Esse fato revela também que são biomas importantes do ponto de vista da biodiversidade. Tabela 12 – Classificação e área aproximada dos biomas brasileiros Classificação Área aproximada (km2) Área/total Brasil Amazônia 4.196.943 49,3% Cerrado 2.036.448 23,9% Mata Atlântica 1.110.182 13% Caatinga 844.453 9,9% Pampa 176.496 2,1% Pantanal 150.355 1,8% Total Brasil 8.514.877 1,0 Fonte: IBGE (2004). 145 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE 7.1 Bioma Amazônia AM RR AP PA AC MA TO GO DF MG BA AC CE RN PB PE AL SE ES RJSP PR MS SC RS RO MT Figura 34 – Mapa geográfico do bioma amazônico Esse bioma ocupa a totalidade de cinco unidades da federação (Acre, Amapá, Amazonas, Pará e Roraima), sendo 98,8% do território de Rondônia, 54% do território de Mato Grosso, 34% do território do estado do Maranhão e 9% do estado de Tocantins. É a maior reserva de diversidade biológica do mundo, mosaico de oito áreas de endemismo e o maior bioma brasileiro em extensão, ocupando 49,29% do território brasileiro. Seu clima quente e úmido abriga uma rica diversidade de espécies animais. Em sua extensão territorial, encontra‑se um mundo verde rico em biodiversidade e sociodiversidade. A Bacia Amazônica estende‑se por sete países, são 6.110.000 km2 de extensão, desde suas nascentes nos Andes Peruanos até sua foz no Oceano Atlântico, sendo que 63% (ou 3.869.953 km²) estão em território brasileiro. Sua bacia hidrográfica é a maior do mundo, com cerca de 6 milhões de km2 abastecidos por 1.100 afluentes. Segundo a Agência Nacional de Águas (s.d.), a Bacia Amazônica é constituída pela bacia hidrográfica do rio Amazonas, pelas bacias hidrográficas dos rios existentes na Ilha de Marajó, além das bacias hidrográficas dos rios situados no estado do Amapá que deságuam no Atlântico. Além do Brasil, essa Bacia Continental estende‑se sobre Peru (17%), Bolívia (11%), Colômbia (5,8%), Equador (2,2%), Venezuela (0,7%) e Guiana (0,2%). As maiores demandas pelo uso da água na região ocorrem nas sub‑bacias dos rios Tapajós, Madeira e Negro e têm por finalidade o uso para abastecimento humano (33%) e dos animais (32%). (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, [s.d.]). O endemismo é frequente em diversas partes da região e em diversos grupos taxonômicos, como são os casos de anfíbios (86%), répteis (76%) e de plantas (75%). 146 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Tabela 13 – Estimativas de espécies existentes na região e o correspondente endemismo Grupo Total estimado de espécies Endemismo Endemismo/ Total Plantas 40 mil 30 mil 75% Mamíferos 425 172 40% Aves 1.300 263 20% Répteis 371 260 70% Anfíbios 427 366 86% Fonte: Ipea (2011a, p. 19). Estima‑se que entre 2.500 a 3.000 peixes de água doce sejam conhecidos, mas esse número não representa tudo o que existe na bacia hidrográfica do bioma. Recentes descobertas, como a realizada pela ONG World Wide Fund for Nature (WWF), consolidam as afirmações de que há muito a ser descoberto no bioma Amazônia. Em 2013, a World Wide Fund for Nature (WWF BRASIL, 2013) divulgou a descoberta de pelo menos 441 novas espécies de animais e plantas como resultado de um trabalho de equipe realizado entre 2010 e 2013. Somente na Amazônia foram compiladas 259 novas espécies de plantas, 84 de peixes, 58 de anfíbios, 22 de répteis, 18 de aves e uma de mamífero. A essa nova lista soma‑se um número incontável de novas espécies de insetos e outros invertebrados que também foram descobertos no período de 1999‑2009. Entre as descobertas do período entre 2010 e 2013 está uma espécie de macaco que ronrona como um gato, um lagarto colorido, uma piranha herbívora e uma orquídea rosa. Figura 35 – Zogue‑zogue Caqueta titi (Callicebus caquetensis): macaco que ronrona como um gato Crescem na região amazônica 2.500 espécies de árvores, o que corresponde a 1/3 de toda a madeira tropical do mundo, e 30 mil espécies de plantas, que representam 30% das existentes na América do Sul. 147 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE A região amazônica é o habitat natural das seringueiras, que crescem em solos argilosos e férteis. Existem 11 espécies catalogadas dessa árvore de grande porte e atualmente ela já é cultivada fora de seu habitat, nas monoculturas da Ásia; no Brasil, já são encontradas plantaçõesnas regiões Sudeste, Centro‑Oeste, na Bahia e no oeste do Paraná. Planta nativa da região, a seringueira foi o principal produto de exportação do Brasil nas últimas décadas do século XIX. O crescimento da demanda e do preço no mercado internacional atraiu para a região grande leva de população vinda do nordeste, principalmente do Ceará, fugindo da seca da década de 1870 (BAER, 2002, p. 40). Essa migração promoveu acelerado povoamento e a prosperidade econômica chegou à região pelo látex, seiva retirada do tronco da seringueira. Num modelo baseado no extrativismo – já que a planta encontrava‑se dispersa na floresta – o Brasil, em meados de 1890, era o principal fornecedor de látex para a crescente industrialização que ocorria em países estrangeiros. Do total de borracha consumida no mundo 90%, era originária do Brasil e chegou a representar 40% do total exportado (BAER, 2002, p. 40). Figura 36 – Imagem da forma de extração do látex Com as plantações nas colônias inglesas, cultivadas na forma de plantation e com maior produtividade, o látex exportado pelo Brasil deixou de ser competitivo. Somente no período da Segunda Guerra Mundial, depois das colônias inglesas terem sido tomadas pelos japoneses, é que o Brasil voltou a produzir em larga escala. Como insumo estratégico para os produtos utilizados no conflito bélico, o Brasil retoma posição no cenário exportador dessa matéria‑prima, que dura até a descoberta pelos americanos da fórmula da borracha sintética. 148 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II Saiba mais As sementes da seringueira que foram para a Ásia podem ser consideradas como o primeiro grande caso de biopirataria de espécies da Amazônia, cujos reflexos sobre a economia da região Norte à época foram devastadores. O livro O Ladrão no Fim do Mundo relata como um inglês contrabandeou sementes de seringueira da Floresta Amazônica para a Inglaterra, no século XIX. JACKSON, J. O ladrão no fim do mundo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011. O povoamento da Amazônia é seguido de desmatamento e muitos conflitos, entre os povos da floresta (antigos colonizadores) e os fazendeiros que para lá se dirigem em uma nova onda de exploração econômica da região. O movimento de maior expressão foi o dos seringueiros que viviam do extrativismo do látex. O líder de maior expressão nacional e internacional foi Francisco Alves Mendes Filho (Chico Mendes), cuja luta tinha como bandeira a preservação da Amazônia e, por essa razão, tornou‑se símbolo do movimento ambientalista e dos povos da floresta. As denúncias de Chico Mendes levaram o BIRD (Banco Mundial) a suspender o financiamento da BR‑364 e a exigir do governo estudos de impacto ambiental na Amazônia. Foi o único brasileiro a receber da ONU o prêmio Global 500 de preservação Ambiental. O instituto Chico Mendes, fundado em memória do líder seringueiro, dedica‑se a diversos programas voltados às questões ambientais. O governo federal também fundou um instituto em homenagem ao líder seringueiro, o ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Figura 37 – Imagem do líder seringueiro Chico Mendes 149 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 ECONOMIA E SUSTENTABILIDADE O desmatamento da Amazônia continua a preocupar ambientalistas e governo, em razão dos riscos concretos de perda dessa rica biodiversidade existente na região, batizada pela mídia internacional de celeiro verde e o pulmão do mundo. De acordo com o documento que integra o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal – PPCDAm – (BRASIL, 2013a, p. 19), que abrange o período de 2012‑2015, sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, o processo de desmatamento na Amazônia não é homogêneo e varia de acordo com as diferentes partes da região. A ocupação em curso não é um fato novo. Desde os anos de 1970, têm‑se dirigido para a região contingentes de pessoas vindos do Nordeste, do Sul, do Sudeste e Centro‑Oeste, atraídos pelos projetos de colonização do governo militar. Empresas foram seduzidas pelos benefícios fiscais do governo e aplicaram recursos em atividade agropecuária, mesmo tendo‑se consolidado economicamente em outros setores da atividade econômica, como bancos e indústrias. Somem‑se a isso os projetos de construção de estradas, que causaram profundas transformações ambientais e socioculturais na região, como os da BR‑230 – Transamazônica –, resultado de intenso desmatamento e de duvidosa potencialidade econômica. Segundo Loureiro (2002): Nas últimas décadas, enormes massas vegetais, que incluem madeiras nobres, vêm sendo queimadas impiedosamente. De 1500 a 1970, ou seja, em 470 anos, apenas 2% de toda a floresta amazônica havia sido destruído; em apenas 30 anos (1970 a 2000), segundo o INPE, 14% foi devastado. Trata‑se de um desastre sem precedentes contra o maior patrimônio natural do planeta Terra, contra a economia e a sobrevivência dos habitantes naturais – caboclos, ribeirinhos, índios e outros. E, pode‑se mesmo dizer, contra o futuro da região e das novas gerações que precisarão dela para viver. Pela avaliação de Loureiro (2002), os projetos desenvolvidos para a Amazônia foram todos equivocados, sustentados na crença de ecossistemas ricos e inesgotáveis. O rico ecossistema existente na região só se mantém rico se for preservada a floresta, fonte de alimentos do solo que sobrevive à custa desses nutrientes, retirados da biomassa, oriunda das árvores que apodrece e nutre os solos. E, ainda, o regime de chuvas da região depende da evaporação da floresta. Retirar a floresta significa deixar em seu lugar solos rasos, mal estruturados e pobres, em sua maioria, desequilibrando e desorganizando o seu ecossistema, afirma a autora. O MMA (2008) estima que a área desmatada, até 1980, atingiu cerca de 300 mil km2 e representava 6% do total da região. Entre as décadas de 1980 e 1990, mais 280 km2 foram incorporadas a essas áreas. A descoberta da existência de ouro no Pará atraiu para a região mais de 100.000 homens vindos de diversas localidades do País. O garimpo de Serra Pelada, como ficou conhecido o local de concentração da exploração desse minério, é mundialmente famoso pela devastação e pela concentração de pessoas submetidas a métodos de trabalho extremamente rudimentares e inseguros. O paraíso do ouro, como 150 Re vi sã o: C ris tin a / C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 13 /0 3/ 20 15 Unidade II foi chamado por alguns, deixou uma vastidão de terra desmatada e esgotada. Onde havia vegetação abundante restou uma área a descoberto. Figura 38 – Imagem da massa humana em busca do ouro no Garimpo de Serra Pelada, no Pará Em 2004, estimou‑se que 670 mil km2 foram desmatados, o que corresponde a 16% da área total da floresta da Amazônia Legal, ameaçando seriamente o desenvolvimento sustentável da região. Segundo dados do INPE (s.d.), obtidos pela metodologia Prodes, comparando o ano de 2013 com o anterior, verifica‑se um crescimento da ordem de 28% do desmatamento na região denominada de Amazônia Legal, quando se registrou área desmatada equivalente a 5.891 contra 4571 km2 de 2012. Observação O projeto Prodes conta com a colaboração do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama, e é financiado pelo MCTI, através da Ação de Monitoramento Ambiental da Amazônia. As florestas contribuem com o equilíbrio climático do planeta. A retirada de cobertura florestal favorece o aquecimento global, uma vez que as árvores, ao realizarem a fotossíntese, retiram gás carbônico e liberam oxigênio na atmosfera. O desmatamento anula esse serviço ambiental realizado pelas árvores. Entretanto, quando se comparam os dados de 2013 com os de 2004, observa‑se uma redução da ordem de 79% das áreas desmatadas. Ou seja, o desmatamento continua, porém em proporção menor ao observado no início do século XXI. O gráfico
Compartilhar