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LITERATURA COMPARADA

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LITERATURA
COMPARADA
Francieli Borges
Gabriela Semensato 
Ferreira
Karina Regedor 
Gercke
Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094
B732l Borges, Francieli.
Literatura comparada / Francieli Borges, Gabriela 
Semensato Ferreira, Karina Regedor Gercke. – Porto 
Alegre : SAGAH, 2017.
222 p. : il. ; 22,5 cm. 
ISBN 978-85-9502-040-5
1. Literatura comparada. I. Ferreira, Gabriela 
Semensato. II. Gercke, Karina Regedor. III. Título. 
CDU 82.091
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 2 25/01/2017 16:37:39
Análise comparativa 
dos poemas de Carlos 
Drummond de Andrade, 
João Cabral de Melo Neto, 
Vasco Popa, Czeslaw 
Milosz, Francis Ponge 
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
 � Reconhecer a importância da atividade comparativa para o panorama 
literário.
 � Identificar as principais características nas obras dos autores citados.
 � Relacionar textos dos escritores que estudou nesta unidade.
Introdução
Você sabia que a análise comparativa pode ser muito produtiva nos 
estudos literários? Ela permite analisar cada texto individualmente para 
que se considere, em seguida, a relação entre os diferentes elementos. 
Interpretar textos, entretanto, demanda reativar conhecimentos e leituras 
prévias. Só assim, muitas vezes, conseguimos perceber referências a outros 
textos, artistas e momentos históricos, por exemplo. Neste texto, você 
vai interpretar e comparar poemas de Carlos Drummond de Andrade, 
João Cabral de Melo Neto, Vasco Popa, Czeslaw Milosz e Francis Ponge. 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 207 25/01/2017 16:37:54
Análise comparativa
Ao realizarmos estudos de Literatura Comparada, há diversas possibilidades 
metodológicas para a análise de determinada obra. Você deve lembrar, entre-
tanto, que certos conceitos, antes em voga na disciplina, são substituídos por 
outros, assim como determinados termos podem ser revisados ou revisitados 
pelos teóricos. O conceito de mimese, estudado por Aristóteles, por exemplo, 
é um exemplo. Foi considerado de forma complexa e até mesmo abrangente 
pelo filósofo grego, mas ao longo dos séculos entendido mais estritamente 
como cópia ou imitação. Depois, foi retomado a partir de filósofos da arte 
mais atuais, recobrando o sentido de possibilidade, de algo, em uma obra, que 
poderia acontecer, que tem verossimilhança.
Como leitor, ou pesquisador, é importante que você primeiro considere qual 
é o principal objetivo de seu estudo e qual seu viés de leitura de um determinado 
texto. Após reflexão inicial, poderá decidir quais elementos ou textos serão 
comparados e por que essa ação é necessária ou produtiva para o estudo. O 
objetivo é relacionar outras histórias e costumes? Outras culturas e línguas? 
É para conhecer estilos e práticas de autores diversos? É porque determinada 
obra se aproxima mais de seus gostos pessoais, e você quer descobrir o que 
realmente lhe chama atenção? A análise comparativa nos ajuda a considerar 
todos esses detalhes e a pensar a literatura da maneira mais coerente, porém 
também mais instigante. 
O processo de leitura de uma obra por um especialista é cheio de in-
formações diferenciadas e simultâneas, como se o estudioso usasse óculos 
multifocais, para não perder de vista as relações do tempo presente com o 
presente, do presente com o passado, e do passado com sua própria época.
Os principais objetos de estudo em uma análise comparativa podem ser a 
literatura de dois ou mais grupos linguísticos, considerando diferentes teorias 
a partir delas, ou então diferentes linguagens artísticas, assim como saberes 
ou disciplinas. Parte-se, em geral, de obras literárias, mas também podemos 
considerar o papel ou função do escritor, do leitor, do público ou sociedade, 
do contexto histórico, cultural e de criação do texto. 
Podemos começar a concluir que o objetivo fundamental de uma análise 
comparativa é fazer com que uma obra literária deixe de ser apenas um texto 
encantador, comovente e isolado e passe a ser considerado uma produção 
cultural com vínculos na realidade social, na vida, e na própria história da 
arte. Através desse viés, aspectos que em um primeiro momento fogem à 
nossa compreensão são revelados e podem interagir com outras obras, auto-
res, expressões sociais, culturais, políticas e artísticas. Por meio da análise 
Literatura comparada208
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 208 25/01/2017 16:37:54
comparativa é possível apurar o senso crítico. Demanda, ainda, um estudo 
sistemático e metódico de cada texto.
Veja mais alguns objetivos da disciplina:
 � Articular e relacionar os conhecimentos literários conforme questio-
namentos políticos, sociais e culturais.
 � Ir além dos conhecimentos obtidos em uma primeira leitura.
 � Diferenciar os elementos de generalidade e particularidade da obra para 
que não sejam confundidos com individualidade (aspectos subjetivos) 
e singularidade absoluta.
 � Investigar os princípios gerais da literatura.
 � Definir conceitos para que os estudos literários não sejam apenas atos 
individuais de leitura.
 � Estudar as obras como um todo, com uma análise linguística, semântica, 
temática, histórica, dentro de um âmbito internacional – ou seja, nos 
termos da literatura universal.
 � Mesmo considerando os elementos ambientais, contextuais e históricos, 
buscar o que é específico e único em cada obra, o que pode determinar 
a condição artística do texto.
A comparação pode ser uma técnica que remete também ao processo mental que 
beneficia a generalização ou a diferenciação, a indução e a dedução. Não pode ser 
entendida, porém, como sinônimo de comparatismo, ou de literatura comparada. Para 
a literatura comparada, a comparação é um recurso analítico e interpretativo, um dos 
métodos utilizados, possibilitando a exploração adequada dos campos de trabalho, 
e o alcance dos objetivos dos estudos realizados. Assim, a comparação é um meio, 
uma ferramenta, e não um fim.
A análise comparativa nos faz entender o que as obras de poetas como 
Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Vasco Popa, 
Czeslaw Milosz e Francis Ponge podem ter em comum, ou quais os pontos de 
contato e de diferenças que os tornam expressivos nas linguagens artísticas 
do século XX.
209Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 209 25/01/2017 16:37:54
Os poetas
Uma das definições importantes da poesia modernista é aquela que a descreve 
como sendo uma desautomatização da linguagem. É uma concepção mais 
formalista da poesia, com sua lógica e sistemática, porém conectada aos 
acontecimentos de seu tempo. Cada poeta apresentado aqui carrega suas 
características, semelhanças e diferenças ― e ajuda a traçar um panorama 
da produção poética do século XX.
Carlos Drummond de Andrade
Dentre a vasta obra de Carlos Drummond de Andrade, seus primeiros livros, 
Alguma poesia, de 1930, e Brejo das almas, de 1934, são citados como parte 
do modernismo brasileiro, apesar dessa vinculação não ser considerada tão 
expressiva na obra desse poeta como um todo. Ainda assim, Drummond 
apresenta, já nesses escritos, uma característica organização sintática e uma 
espécie de ‘poema-piada’, que parecem aproximá-lo do modernismo.
Um dos traços dominantes em sua produção é a individualidade e a relação 
contraditória com a ordem e com o tempo. Trata-se de uma poesia atormen-
tada pelo presente, passado e futuro, em que o eu-lírico mostra-se ciente do 
contexto social, das vidas de outros, e é tomado muitas vezes pela melancolia 
e pelo ceticismo. Frente a isso, utiliza-se da ironia, da sátira, mas também do 
profundo requinte no domínio da palavra poética.
A poesia de Drummond é a cheia de rigor, de técnica. Porém demonstra 
consciência do trabalho árduo do poeta, de sua subjetividade, de sua existência 
no cotidiano social. Algumas de suas publicações de destaque são: Sentimento 
do mundo, de 1940, e A rosado povo, de 1945. Nelas, você pode perceber um 
sentimento não só de individualidade, mas também de coletividade, e de luta 
frente aos obstáculos da vida.
Drummond, por essas e outras razões, é considerado pela crítica literária 
como um dos escritores brasileiros mais significativos. Contemporâneo de 
João Cabral, ele trilha, em sua poesia, um caminho quase oposto. Irônico, 
subjetivo e lírico, Drummond explora ao máximo as liberdades que o movi-
mento modernista permitia, tanto em forma quanto em conteúdo. Versos livres 
e temas controversos, como o choque social, os poemas-piadas e o papel do 
indivíduo no mundo, são frequentes em sua obra.
Literatura comparada210
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 210 25/01/2017 16:37:54
João Cabral de Melo Neto
Poeta e diplomata, João Cabral de Melo Neto inaugurou uma nova forma de 
fazer poesia no Brasil. Guiado pelo raciocínio e avesso ao confessionalismo, 
sua obra é caracterizada pelo rigor estético e pelo uso de rimas toantes. 
Divide com Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira o título de um 
dos poetas brasileiros de maior destaque.
As rimas toantes são aquelas em que apenas as vogais tônicas rimam entre si. Não 
há a presença de consoantes. João Cabral de Melo Neto é um expert no uso da rima 
toante. Em Morte e vida severina, de João Cabral, encontramos (MELO NETO, 2003):
Severino retirante,
deixe agora que lhe diga:
eu não sei bem a resposta
da pergunta que fazia,
se não vale mais saltar
fora da ponte da vida;
nem conheço essa resposta,
se quer mesmo que lhe diga;
Perceba que, nos versos pares, há a repetição das vogais i – a ao final do verso. 
A rima toante é muito frequente na poesia e no cancioneiro populares.
A obra de João Cabral de Melo Neto é considerada, em parte, como poesia 
popular, além de apresentar alguns traços surrealistas. Pelo período em que 
publica e por suas características, é tratado também como escritor modernista, 
porém de 3ª fase. 
A poesia de João Cabral também chama a atenção pelo rigor utilizado na 
escrita dos versos, que podem ter estrutura mais fixa e rima. Não tem um 
estilo sentimentalista ou romântico, entretanto, mas mais objetivo. Apresenta, 
211Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 211 25/01/2017 16:37:54
sobretudo, formas de perceber o real, de forma concreta e a partir das sensações 
geradas pela observação do contexto. Não evita oposições ou tensões, mas as 
trabalha de forma criativa. 
Assim, as palavras, em sua obra, podem ser concebidas como “palavras-
-coisas”, dotadas de uma organização formal e oriundas de um trabalho lógico 
e racional. Não valoriza a ironia ou o verso livre, mais relacionadas à primeira 
geração do modernismo. 
Preocupação social é, também, marca de João Cabral de Melo Neto, em 
uma poesia mais lógica e sistemática, porém conectada aos acontecimentos de 
seu tempo. Em Morte e vida Severina (MELO NETO, 2003) – obra máxima 
do autor –, Cabral retrata o caminho do retirante fugindo da morte no campo 
castigado pela falta de chuva para encontrar, na capital, uma vida melhor.
Vasco Popa
Vasco Popa foi um dos poetas europeus mais populares do pós-guerra. Contem-
porâneo de autores como o brasileiro João Cabral de Melo Neto (1920 – 1999), 
o italiano Pier Paolo Pasolini (1922 - 1975) ou o americano Robert Creeley 
(1926 – 2005), sua arte aponta para a grande diversidade poética desse período. 
Sua poesia apresenta uma característica marcante, que Haroldo de Campos 
(1929 - 2003) chamaria na orelha da antologia Osso a Osso (POPA, 1989) de 
“materialismo ôntico”, após alinhar a obra de Vasco Popa ao que ele chamou 
de coisismo, reconhecendo-o na poesia de Francis Ponge e João Cabral. 
Vasco Popa, nascido em 29 de junho de 1922, em Grébenatz, na Sérvia, 
é um dos mais representativos poetas contemporâneos da Iugoslávia. Suas 
obras já foram traduzidas para mais de 19 idiomas, sendo considerado uma 
figura marcante no cenário poético internacional.
Popa parece operar mais em nome de uma pobreza de recursos que uma 
pureza de expressão. É importante notar que este objetivismo de Popa, se 
seguirmos as palavras de Haroldo de Campos (1997), está distante do obje-
tivismo que guiou a poesia brasileira do final do século XX, muito marcada 
pelas obras de João Cabral de Melo Neto e Robert Creeley, por exemplo. 
Czeslaw Milosz
Czeslaw Milosz foi um poeta, romancista e ensaísta lituano, nascido no período 
em que seu país ainda fazia parte do império russo. Cercado pelos círculos 
de vanguarda, durante sua formação, é notável a tendência de sua poesia ao 
viés político. 
Literatura comparada212
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 212 25/01/2017 16:37:54
Esse escritor também atuou durante a Segunda Guerra Mundial, passando 
pela experiência de clandestinidade. Publicou poemas de resistência, como 
Canção invencível, em 1942. Publicou também uma coletânea de ensaios 
sobre a submissão dos intelectuais poloneses ao comunismo, intitulada A 
mente cativa, em 1953. Milosz morou em Paris e emigrou para os Estados 
Unidos, tratando ainda de temas como a fragilidade humana, a crueldade, a 
corrupção, mas também o humanismo, a liberdade, a consciência e o poder. 
Por sua contribuição à arte poética, ganhou, em 1980, o Nobel de Literatura.
Os poemas de Milosz transcritos aqui vêm da antologia Não Mais, publicada 
em 2003 pela editora da Universidade de Brasília, com seleção, tradução e 
introdução de Henryk Siewierski e Marcelo Paiva de Souza. Na apresentação, 
os tradutores ressaltam bem a preocupação de Czeslaw Milosz em perseguir 
a realidade em seus poemas (MILOSZ, 2003): 
“Sou um poeta da realidade. 
 Digo que a terra não é um eco,
 Nem o homem um fantasma.”
Observe a força dos versos finais do poema “Não Mais”, que deu título à 
antologia brasileira (MILOSZ, 2003):
NÃO MAIS
Preciso contar um dia como mudei
Minha opinião sobre a poesia e por que
Me considero hoje um dos muitos
Mercadores e artesãos do Império do Japão
Compondo versos sobre a floração da cerejeira,
Sobre crisântemos e a lua cheia
Se eu pudesse descrever as cortesãs
De Veneza, como incitam com uma vareta o
 [ pavão no pátio
E desfolhar do tecido sedoso, da cinta nacarina
Os seios pesados, a marca
Avermelhada no ventre onde o vestido se
 [ abotoa,
213Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 213 25/01/2017 16:37:54
Ao menos assim como as viu o dono das
 [ galeotas
Arribadas àquela manhã carregando ouro;
E se ao mesmo tempo pudesse encerrar seus
 [ pobres ossos
No cemitério, onde o mar oleoso lambe
 [ o portão,
Em palavras mais duráveis que o derradeiro
 [ pente
Que entre carcomas sob a lápide, só, espera
 [ pela luz
Não duvidaria. Da resistência da matéria
O que se retém? Nada, quando muito o belo.
Então devem nos bastar as flores da cerejeira
E os crisântemos e a lua cheia.
Aprecie também a elegância de “Janela” e “Dádiva” (MILOSZ, 2003).
JANELA
Olhei pela janela ao raiar do dia e vi uma jovem macieira, diáfana em 
meio à luz
Quando olhei de novo ao raiar do dia lá estava uma grande macieira, 
carregada de fruto.
Passaram-se decerto muitos anos, mas não me lembro de nada do 
que aconteceu neste sonho.
DÁDIVA
Um dia tão feliz.
A névoa baixou cedo, eu trabalhava no jardim.
Os colibris se demoravam sobre a flor de
 [ madressilva.
Não havia coisa na terra que eu quisesse
 [ possuir.
Não conhecia ninguém que valesse a pena
 [ invejar.
Literatura comparada214
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 214 25/01/201716:37:54
O que aconteceu de mau, esqueci.
Não tinha vergonha ao pensar que fui quem sou.
Não sentia no corpo nenhuma dor.
Me endireitando, vi o mar azul e velas.
Francis Ponge
Francis Ponge foi um poeta francês nascido em 1899. Uma de suas obras mais 
conhecidas é Le parti pris des choses, de 1942, traduzida em português 
como O partido das coisas (PONGE, 2000). Esse texto mostra, de início, a 
multiplicidade de sentidos que sua poética oferece, já que o título também é 
entendido em outras línguas (o inglês, por exemplo) como “a voz”, “o modo” 
ou “a natureza das coisas”.
Considerada modernista, sua poesia afasta-se do lirismo e da subjetividade 
e aproxima-se também da objetividade, para descrever objetos do cotidiano. 
Constrói, para isso, prosas poéticas, cheias de reflexão sobre a própria língua, 
tornando-se, por isso, metalinguísticas. Desse modo, opera jogos de palavras, ou 
entre palavras e coisas, demandando uma leitura crítica e ativa de seus textos. 
Francis Ponge ainda é pouco conhecido no Brasil. Os estudos de sua obra, 
por aqui, aconteceram mais fortemente na década de 1980, com as contribuições 
de Leila Perrone Moisés, Júlio Castañon Guimarães, Leda Tenório da Motta, 
entre outros. Contudo, podemos identificar em muitos escritores brasileiros 
influências, homenagens, citações e escolhas poéticas com base na obra de 
Ponge. Entre eles: João Cabral de Melo Neto, no poema O sim contra o sim; 
Wally Salomão, cujo livro, Lábia, é iniciado com epígrafe de Ponge; Manoel de 
Barros, em que a escolha poética pelas coisas simples em muito se assemelha 
à poética de Ponge; Murilo Mendes, autor do neologismo “francispongei-me”, 
inscrito no poema Texto de informação.
Dos exemplos citados, talvez Manoel de Barros represente, atualmente, o 
autor mais próximo da poética de Ponge, pelo fato de reiterar, em sua obra, que 
estejamos alertas às coisas simples do mundo, para que as ressignifiquemos 
em nosso cotidiano.
215Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 215 25/01/2017 16:37:54
Considerações sobre a análise da poética
Octavio Paz, um estudioso da Literatura do séc. XX para quem o pensamento 
sobre a criação jamais se aparta da criação em si, afirmou no “Prólogo” de La 
casa de la presencia (PAZ, 2003) que 
A história da poesia moderna é inseparável das poéticas que a justificam 
e defendem. Essas poéticas, apesar de sua diversidade contraditória, 
possuem um traço comum que as distingue das de outras épocas: todas 
elas são animadas por um ânimo beligerante, quer ante o passado, quer 
perante a realidade presente. São poéticas combatentes, duplamente 
críticas, tanto da tradição poética, quanto da sociedade, seus valores, 
suas instituições.
A citação do poeta e ensaísta mexicano aponta ainda uma faceta do problema 
que, de outro ângulo, já foi considerado por Jonathan Culler (1999, 2015). O 
teórico chamou atenção para a importância de uma investigação crítica dos 
moldes conceituais de hábito pressupostas na leitura dos poemas modernos.
A reflexão de Culler (1999, 2015) tem o objetivo de elucidar até que ponto 
são satisfatórias as diretrizes teóricas que estabeleceram a produção poética. A 
reflexão sobre a poesia se faz ao modo do conflito com o passado e o presente 
imediato da criação, bem como com seus arredores sociais.
Lendo ou comentando poetas dos séculos XIX e XX evocamos certo en-
tendimento, tacitamente pressuposto, de poesia moderna ou lírica moderna, 
segundo Jonathan Culler (1999, 2015). Caberia, portanto, esperar das pesquisas 
do comparatismo, segundo Culler (1999, 2015), a proposição de modelos teóricos 
que se prestassem à análise das obras individuais representativas nas fronteiras 
das diversas literaturas nacionais. Além disso, argumenta o teórico, caberia ainda 
aos comparatistas a tarefa de proceder à análise do modelo de lírica que está 
subentendida na leitura desta ou daquela obra poética moderna, a fim de avaliá-
-lo criticamente na perspectiva mais ampla ensejada pela literatura comparada.
Círculo de correspondências 
Francis Ponge e João Cabral já tiveram suas poéticas comparadas. Alguns 
críticos relacionaram as obras devido à alusão feita pelo próprio Cabral 
ao poeta francês em seu poema “O sim contra o sim”, no qual os estilos 
Literatura comparada216
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 216 25/01/2017 16:37:54
de diversos artistas que tiveram impacto na escrita Cabral são elogiados 
(MELO NETO, 2003, p. 298): 
Francis Ponge, outro cirurgião, 
adota uma outra técnica: 
gira-as nos dedos, gira 
ao redor das coisas que opera. 
Apalpa-as com todos os dez 
mil dedos da linguagem 
não tem bisturi reto 
mas um que se ramificasse. 
Com ele envolve tanto a coisa 
Que quase a enovela 
E quase a enovelando, 
Se perde, enovelado nela. 
E no instante em que até parece 
Que já não a penetra 
Ela entra sem cortar: 
Saltou por descuidada fresta 
Os estudos comparativos apontam como característica comum entre as duas 
poéticas a composição objetivista e calculada e a influência de Ponge sobre 
Cabral. Entretanto, embora tenha sido marcado pela poética de Ponge, Cabral 
desenvolveu características peculiares e originais ao longo de sua obra poética. 
Haroldo de Campos (1997, p. 206) afirma que o poeta brasileiro foi o primeiro 
a conceber a “[...] construção do poema como uma coisa [feita] de palavras [...]”.
Ponge, à semelhança de uma aranha, enovela cautelosamente o objeto com os 
fios da linguagem até fundi-los, transformando-os num poema ou, mais especi-
ficamente, em um “objoego” (termo cunhado pelo próprio poeta). Por sua vez, 
Cabral – engenheiro e pedreiro – é mais afeito à construção e ao empilhamento 
de palavras-pedras do que ao enredamento dos objetos. Cada palavra é tratada 
como uma pedra bruta a qual cabe ao poeta polir e lapidar a fim de erguer o 
poema-monumento ou, para aludir à sua obra, erguer a cidade de “Tebas-poema” 
proposta em “A fábula de Anfion”. Outra característica comum aos dois poetas – e 
217Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 217 25/01/2017 16:37:54
que tem sido pouco discutida pela crítica brasileira – é a participação de ambos 
no movimento surrealista no início de suas carreiras literárias. 
Embora se distanciem na forma como abordam os objetos do mundo, tanto 
Ponge quanto Cabral se assemelham na maneira como lutam incansavelmente 
com a linguagem na composição de suas obras poéticas. É interessante notar 
que ambos os poetas, embora estejam conscientes das restrições e incapacidades 
da linguagem, se apegam estritamente a ela. 
Em outro lado do círculo de correspondências e relações, vemos Drum-
mond e João Cabral. O poema a seguir (MELO NETO, 1996), escrito em 
1943, revela a decisiva importância da obra de Carlos Drummond de Andrade 
nas primeiras produções de João Cabral de Melo Neto. 
Difícil ser funcionário
Difícil ser funcionário
Nesta segunda-feira.
Eu te telefono, Carlos
Pedindo conselho.
Não é lá fora o dia
Que me deixa assim,
Cinemas, avenidas,
E outros não-fazeres.
É a dor das coisas,
O luto desta mesa;
É o regimento proibindo
Assovios, versos, flores.
Eu nunca suspeitara
Tanta roupa preta;
Tão pouco essas palavras —
Funcionárias, sem amor.
Literatura comparada218
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 218 25/01/2017 16:37:55
Carlos, há uma máquina
Que nunca escreve cartas;
Há uma garrafa de tinta
Que nunca bebeu álcool.
E os arquivos, Carlos,
As caixas de papéis:
Túmulos para todos
Os tamanhos de meu corpo.
Não me sinto correto
De gravata de cor,
E na cabeça uma moça
Em forma de lembrança
Não encontro a palavra
Que diga a esses móveis.
Se os pudesse encarar...
Fazer seu nojo meu...
Carlos, dessa náusea
Como colher a flor?
Eu te telefono, Carlos,
Pedindo conselho.
Como você pode observar, cada poeta destacado até aqui participa, de 
alguma forma, do modernismo, porém mantém característicasparticula-
res, mostrando as diferentes direções de seus percursos poéticos. Assim, é 
importante, no estudo comparatista, considerar estilos e princípios de um 
movimento artístico, porém sem perder de vista que cada texto literário é 
único a seu modo.
219Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
SER_Literatura_Comparada_Book.indb 219 25/01/2017 16:37:55
1. São características da poesia de 
João Cabral de Melo Neto:
a) Para o poeta, todo o ato de 
escrever provém da inspiração, 
fruto de uma investigação 
íntima que privilegia os 
sentimentos e o lirismo.
b) O lirismo de João Cabral de 
Melo Neto, que tem raízes 
no neossimbolismo, concilia 
o humor com temas do 
cotidiano, como a infância, 
a vida, a morte e o amor.
c) Dada sua farta produção poética, 
a poesia de João Cabral de 
Melo Neto costuma ser dividida 
em fases, de acordo com as 
influências que recebeu de 
outros artistas visuais e poetas.
d) João Cabral de Melo Neto 
integra o grupo de poetas 
religiosos que se formou no 
Rio de Janeiro entre as décadas 
de 1930 e 40. Sua poesia é 
dividida em duas fases: a fase 
transcendental e a fase material.
e) Corte profundo entre a 
poesia romântica e a poesia 
moderna. O poeta criou um 
novo conceito de poesia, 
que dessacraliza a chamada 
“poesia profunda”, ou seja, a 
poesia em que predominam 
os versos de sentimentos ou 
de abordagem introspectiva. 
Sua poesia é antilírica, presa 
ao real e direcionada ao 
intelecto, não às emoções.
2. Sobre Carlos Drummond de 
Andrade é correto afirmar:
a) Sua obra está inserida na 
segunda geração modernista 
e sua principal característica 
é a poesia surrealista 
inspirada no cristianismo e no 
experimentalismo linguístico.
b) Escritor cuja obra pertence à 
segunda geração modernista, 
quatro fases podem ser 
identificadas em sua obra: fase 
gauche, fase social, a fase do 
“não” e a fase da memória.
c) Sua poesia denuncia a condição 
de exploração e marginalização 
dos negros em nosso país e 
também apresenta grande 
enfoque nos temas religiosos.
d) Um dos grandes nomes da 
poesia da segunda geração 
modernista, sua obra é marcada 
pela preocupação religiosa 
e pela angústia existencial 
diante da condição humana.
e) O poeta assumiu uma linguagem 
romântica e temas sempre 
envolvendo o eu-lírico.
3. Sobre Vasco Popa podemos afirmar:
a) Seus poemas são marcados 
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pelo objetivismo.
b) Sobre a guerra só conhecia o 
que lhe contavam. Não houve 
envolvimento em um contexto 
político-social que contribuiu 
com a trajetória de sua obra.
c) É um dos mais representativos 
poetas românticos da Iugoslávia.
d) É um poeta de linguagem 
descarnada, minimalista, 
pesquisador da forma, Vasco 
Popa, contudo, é mais do que 
esses rótulos que, de certo 
modo, apenas resumem parte 
de seu trabalho poético.
e) Vasco Popa não é muito 
conhecido, pois sua obra 
tem pouca expressão.
4. Sobre Czeslaw Milosz:
a) Poeta muito influenciado pela 
lírica clássica. O ato de escrever 
sempre foi apenas um meio 
de expressar sentimentos.
b) O poeta fala das coisas etéreas 
e do espírito em seus poemas.
c) Milosz é um exemplo 
excepcional na poesia implicada 
pela totalidade histórica, 
religiosa, política e artística do 
humano. Sua obra apresenta-se 
como o diálogo ininterrupto 
de uma consciência múltipla, 
é uma polifonia de registros 
líricos, narrativos, irônicos, 
confessionais e parabólicos.
d) Czeslaw Milosz não viveu a 
guerra, mas mesmo assim essa 
lhe serviu de inspiração.
e) Milosz publicou poucas 
coletâneas de poemas.
5. Sobre Francis Ponge 
podemos afirmar que:
a) Sua obra está repleta de poemas 
com linguagem lírica rebuscada.
b) Vinícius de Moraes representa, 
atualmente, o autor mais 
próximo da poética de Ponge, 
pelo fato de reiterar, em sua 
obra, que estejamos alerta 
às coisas simples do mundo, 
para que as ressignifiquemos 
em nosso cotidiano.
c) Embora se distanciem na forma 
como abordam os objetos do 
mundo, tanto Ponge quanto 
João Cabral de Melo Neto se 
assemelham na maneira como 
lutam incansavelmente com 
a linguagem na composição 
de suas obras poéticas.
d) Francis Ponge é o poeta 
das coisas indefinidas.
e) Em sua obra são frequentes 
os temas sobre os 
horrores da guerra.
221Análise comparativa dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto... 
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Rio de Janeiro, n. 1, p. 60, mar. 1996.
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Literatura comparada222
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Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para 
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual 
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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