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Indaial – 2021 DiDática e MetoDologia De ensino De língua Portuguesa e literatura Profa. Marilsa Aparecida Alberto 2a Edição Copyright © UNIASSELVI 2021 Elaboração: Profa. Marilsa Aparecida Alberto Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: A334d Alberto, Marilsa Aparecida Didática e metodologia de ensino de Língua Portuguesa e Literatura. / Marilsa Aparecida Alberto. – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 285 p.; il. ISBN 978-65-5663-592-7 ISBN Digital 978-65-5663-591-0 1. Ensino de Língua Portuguesa e de Literatura. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 469 aPresentação Prezado acadêmico, conforme definido no Projeto Pedagógico, o objetivo geral do Curso de Licenciatura em Letras/Português é formar profissionais competentes para atuarem como docentes nos anos finais do Ensino Fundamental, Médio e Profissionalizante, capazes de lidar, de forma crítica, com as linguagens, especialmente a verbal, nos contextos oral e escrito. Para atender a esse objetivo, no decorrer do curso, você está tendo contato com diversas disciplinas que permitem uma formação teórico- científica, bem como uma reflexão crítica acerca de temas e questões relativas aos conhecimentos linguísticos e literários. Entretanto, além da aprendizagem desses conteúdos inerentes a esse campo do saber, o processo de formação docente requer alguns conhecimentos específicos que contribuirão para que você tenha uma melhor atuação em sala de aula. Para tanto, a disciplina Didática e Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa e Literatura tem como objetivo proporcionar reflexões acerca do fazer docente para que você, futuro professor, esteja instrumentalizado a planejar, conduzir, intervir e avaliar o processo ensino-aprendizagem de forma consciente, crítica e reflexiva. O livro didático que você tem em mãos foi organizado em três unidades. Na primeira, denominada Didática e fundamentos do ensino de Língua Portuguesa e da Literatura, você compreenderá o que é a didática e qual a sua importância no planejamento escolar. Também terá a oportunidade de refletir sobre alguns fundamentos que norteiam o ensino de Língua Portuguesa e de Literatura. Na Unidade 2, intitulada Organização curricular e práticas pedagógicas para o ensino da Língua Portuguesa e da Literatura, você entrará em contato com os conteúdos curriculares elencados para o ensino de Língua Portuguesa e de Literatura no Ensino Fundamental e Médio, tendo como referencial a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que atualmente norteia a Educação Básica no nosso país. Por fim, na Unidade 3, que trata das Metodologias de ensino e avaliação do processo de ensino-aprendizagem, serão definidos e classificados alguns métodos de ensino, dentre eles as metodologias ativas, que muito têm sido discutidas na contemporaneidade. Nessa unidade, também será abordada a questão da avaliação educacional, além de serem apresentados alguns instrumentos avaliativos que podem ser utilizados nas disciplinas de Língua Portuguesa e de Literatura. Espera-se, assim, que o conteúdo desse livro didático contribua para sua formação, fornecendo material reflexivo e instrumental para que você possa desempenhar sua função docente de forma qualificada e crítica. Vamos iniciar esse novo percurso? Bons estudos! Profª. Marilsa Aparecida Alberto. Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi- dades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra- mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida- de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun- to em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen- tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE suMário UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA ........................................... 1 TÓPICO 1 — DIDÁTICA ..................................................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 3 2 O QUE É DIDÁTICA ......................................................................................................................... 3 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 7 3 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA DIDÁTICA .............................................................. 10 3.1 DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ENSINO E DIDÁTICA .................................................... 10 3.2 TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS NA PRÁTICA ESCOLAR .................................................. 15 3.3 ABORDAGENS TEÓRICAS CONTEMPORÂNEAS .............................................................. 21 4 PROCESSO DE ENSINO, OBJETIVOS E PLANEJAMENTO ESCOLAR ............................. 26 4.1 OBJETIVOS DE ENSINO/APRENDIZAGEM .......................................................................... 27 4.2 PLANO DE ENSINO .................................................................................................................... 28 4.3 DIFERENCIANDO PLANO DE ENSINO E PLANO DE AULA .......................................... 31 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 33 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 34 TÓPICO 2 — FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA ........................ 37 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 37 2 O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NO BRASIL ............................................................ 37 3 COMPREENDENDO O CONCEITO DE LETRAMENTO ....................................................... 42 AUTOATIVIDADE ..............................................................................................................................43 4 PRÁTICAS DE LEITURA, ESCRITA E ORALIDADE NO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA ......................................................................................................... 45 4.1 PRÁTICAS DA LEITURA ........................................................................................................... 46 4.1.1 Prática da leitura na BNCC ................................................................................................ 46 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 47 4.2 PRÁTICA DA ESCRITA ............................................................................................................... 47 4.2.1 A importância da reescrita ................................................................................................ 48 4.2.2 Prática da escrita na BNCC ................................................................................................ 49 4.3 PRÁTICAS DA ORALIDADE ..................................................................................................... 50 4.3.1 Prática da oralidade na BNCC ........................................................................................... 50 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 52 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 53 TÓPICO 3 — FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LITERATURA ............................................ 57 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 57 2 O ENSINO DA LITERATURA NO BRASIL ................................................................................ 57 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 58 3 A ESCOLARIZAÇÃO E A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LITERATURA ......................... 62 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 63 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 65 4 AS DISCIPLINAS DE LITERATURA E HISTÓRIA EM UMA PERSPECTIVA MULTIDISCIPLINAR.......................................................................................... 68 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 72 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 75 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 76 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 79 UNIDADE 2 — ORGANIZAÇÃO CURRICULAR E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA ............... 83 TÓPICO 1 — CURRÍCULO, PLANEJAMENTO E A BNCC ........................................................ 85 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 85 2 CURRÍCULO, PLANEJAMENTO DE ENSINO E PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO ............................................................................................................ 86 2.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE CURRÍCULO E PLANEJAMENTO DE ENSINO ......................... 86 2.2 O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO ................................................................................... 87 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 89 3 CONTEXTUALIZANDO A BNCC: ALGUNS MARCOS LEGAIS ORIENTADORES DA EDUCAÇÃO.............................................................................................. 90 4 FUNDAMENTOS PEDAGÓGICOS DA BNCC.......................................................................... 94 4.1 O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS: CONHECIMENTOS, HABILIDADES, ATITUDES E VALORES ................................................................................. 94 4.2 O COMPROMISSO COM A EDUCAÇÃO INTEGRAL .......................................................... 98 4.3 O TRABALHO COM A IGUALDADE, A DIVERSIDADE E A EQUIDADE ...................... 99 4.4 A BNCC E OS CURRÍCULOS ................................................................................................... 101 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 104 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 105 TÓPICO 2 — PROPOSTA CURRICULAR PARA O ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA: A BNCC E OS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E ENSINO MÉDIO ......................................... 109 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 109 2 A ETAPA DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ........................................... 109 2.1 A ÁREA DE LINGUAGENS NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ............ 111 2.2 A LÍNGUA PORTUGUESA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ......... 112 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 116 2.3 PRÁTICAS DE LINGUAGEM ................................................................................................. 118 2.4 AS PRÁTICAS DE LINGUAGEM E SEUS DIVERSOS CAMPOS DE ATUAÇÃO SOCIAL ................................................................................................................... 119 2.4.1 Campo de atuação na vida pública ................................................................................. 120 2.4.2 Campo jornalístico-midiático ........................................................................................... 121 2.4.3 Campo das práticas de estudo e pesquisa ..................................................................... 121 2.4.4 Campo artístico-literário ................................................................................................... 122 3 A ETAPA DO ENSINO MÉDIO .................................................................................................... 122 3.1 AS COMPETÊNCIAS DA ÁREA DE LINGUAGENS E SUAS TECNOLOGIAS PARA O ENSINO MÉDIO ........................................................................... 124 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 125 3.2 A LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO MÉDIO ............................................................... 126 4 O ENSINO DE LITERATURA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E ENSINO MÉDIO CONFORME A BNCC .............................................. 129 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 134 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 135 TÓPICO 3 — O CURRÍCULO NA SALA DE AULA: O PLANEJAMENTO DAS AULAS ............................................................................ 139 1 INTRODUÇÃO ...............................................................................................................................139 2 A IMPORTÂNCIA DO PLANO DE AULA NA PRÁTICA DOCENTE ................................ 139 3 TRABALHANDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS ........................................................... 144 4 MODELOS DE PLANOS DE AULA E SEQUENCIAS DIDÁTICAS .................................. 147 4.1 ENTENDENDO OS CÓDIGOS ALFANUMÉRICOS DA BNCC ........................................ 148 4.2 MODELOS DE PLANO DE AULA .......................................................................................... 151 4.2.1 Modelo 1: Mecanismos de modalização de textos políticos ........................................ 151 4.2.2 Modelo 2: Rodas de Leitura ............................................................................................. 157 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 162 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 170 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 171 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 173 UNIDADE 3 — METODOLOGIAS DE ENSINO E AVALIAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM ......................................... 177 TÓPICO 1 — AS METODOLOGIAS DE ENSINO E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM .............................................................................................. 179 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 179 2 O QUE SÃO METODOLOGIAS DE ENSINO ......................................................................... 179 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 182 3 CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM ............................................. 183 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 185 3.1 ESTILOS DE APRENDIZAGEM............................................................................................... 186 4 ESTRATÉGIAS E PROCEDIMENTOS DE ENSINO ............................................................. 189 4.1 O USO DE RECURSOS DIDÁTICOS ...................................................................................... 191 4.2 O USO DE RECURSOS DIDÁTICOS NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA ............................................................................................ 196 4.2.1 Jogos ..................................................................................................................................... 197 4.2.2 Dicionário ........................................................................................................................... 198 4.2.3 Música ................................................................................................................................. 200 4.2.4 Filmes................................................................................................................................... 201 4.2.5 Podcast ................................................................................................................................ 204 4.2.6 Livro didático .................................................................................................................... 205 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 208 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 209 TÓPICO 2 — AS METODOLOGIAS ATIVAS ............................................................................. 213 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 213 2 O QUE SÃO METODOLOGIAS ATIVAS ................................................................................. 214 3 MÉTODOS ATIVOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM ...................................................... 219 3.1 APRENDIZAGEM POR PARES (PEER INSTRUCTION) ..................................................... 220 3.2 APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS (ABP) ..................................................... 221 3.3 SALA DE AULA INVERTIDA .................................................................................................. 222 3.4 TEMPESTADE MENTAL (BRAINSTORMING) .................................................................... 224 3.5 ESTUDO DE CASO .................................................................................................................... 225 3.6 PHILIPS 66 .................................................................................................................................. 226 3.7 GRUPO DE VERBALIZAÇÃO E GRUPO DE OBSERVAÇÃO (GVGO) ............................ 228 4 O MÉTODO EXPOSITIVO .......................................................................................................... 229 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 234 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 235 TÓPICO 3 — AVALIAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM .................... 239 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 239 2 A AVALIAÇÃO NA PRÁTICA ESCOLAR ............................................................................... 239 3 AVALIAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA .............................................................................. 244 3.1 AVALIAÇÃO DA COMPREENSÃO DO TEXTO (LEITURA) ........................................... 244 3.2 AVALIAÇÃO DA PRODUÇÃO TEXTUAL (ESCRITA) ....................................................... 247 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 248 3.3 AVALIAÇÃO DA ORALIDADE ............................................................................................... 250 3.4 AVALIAÇÃO DA ANÁLISE LINGUÍSTICA .......................................................................... 254 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 255 4 AVALIAÇÃO EM LITERATURA ................................................................................................. 258 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 261 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 266 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 267 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 271 1 UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • compreender o conceito de didática, percebendo que esse conceito está relacionado à forma de se conceber a educação; • comparar as diferentes concepções pedagógicas existentes no Brasil, identificando as característicasde cada uma delas; • reconhecer a importância do planejamento, que é uma atividade ineren- te à prática docente; • identificar os elementos que fazem parte de um plano de ensino e de um plano de aula; • analisar as mudanças ocorridas no ensino da Língua Portuguesa no de- correr da história; • diferenciar os termos alfabetização e letramento; • conhecer as práticas de linguagem a serem trabalhadas no ensino da Língua Portuguesa; • identificar as diversas fases pela qual o ensino da Literatura passou ao longo da história; • compreender as implicações da transposição do texto literário para a sala de aula; • perceber a relação interdisciplinar entre a Literatura e a História. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – DIDÁTICA TÓPICO 2 – FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA TÓPICO 3 – FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LITERATURA 2 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 DIDÁTICA 1 INTRODUÇÃO Acadêmico, os assuntos abordados nesse primeiro tópico têm como objetivo, inicialmente, compreender o conceito de didática enquanto área do saber que se ocupa do processo de ensino-aprendizagem, percebendo que ela está intrinsecamente relacionada ao conceito de educação. Sendo assim, diferentes concepções de educação pressupõem formas diferentes de conceber a didática e organizar o processo de ensino. Ainda, nesse tópico, você percorrerá a história da didática, tendo a oportunidade de conhecer brevemente alguns pensadores da educação, cujas ideias originaram as concepções pedagógicas hoje identificadas como Tradicional e Renovada. Ao apresentar as características de cada uma das correntes originárias dessas duas concepções, espera-se que você, futuro professor, consiga identificá- las no fazer pedagógico para que sua prática docente se efetive de forma consciente e crítica. Ao término dessa seção veremos ainda quais as perceptivas da Didática na contemporaneidade. A seguir, abordaremos a importância do planejamento do processo de ensino-aprendizagem, que inclui alguns elementos como objetivos, conteúdos, metodologia e avaliação. Como esses três últimos elementos serão abordados nas unidades posteriores, será dada atenção, nesse tópico, aos objetivos do ensino- aprendizagem. Por fim, veremos a importância do planejamento escolar e como ele se materializa por meio de alguns instrumentos, dentre os quais o Plano de Ensino. 2 O QUE É DIDÁTICA Ao longo da sua vida de estudante, você provavelmente já disse ou ouviu uma destas expressões: “Gosto muito da didática daquela professora...” ou “Aquele professor sabe a matéria, mas não tem muita didática para ensinar...”. Esse tipo de discurso traz subentendido um conceito de didática limitado às técnicas utilizadas em sala de aula pelo docente que podem facilitar ou não o processo de aprendizagem por parte dos alunos. Embora essa forma de concepção do termo não esteja incorreta, o estudo que será realizado nesta unidade abordará a didática de uma forma mais ampla, compreendendo-a enquanto área do saber que se concentra no processo de construção do conhecimento, ou seja, no processo ensino-aprendizagem. UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 4 Conforme observado, a primeira acepção encontrada no dicionário está mais próxima do que foi apresentado anteriormente, ou seja, quando se diz que um professor tem boa didática, significa que ele tem domínio da técnica ou da arte de transmitir conhecimentos, o que facilita o processo de compreensão por parte dos alunos. Conforme observado no Uni Nota anterior, analisando a segunda definição, referente à didática enquanto ramificação da Pedagogia que se concentra nos conteúdos do ensino e nos processos próprios para a construção do conhecimento, nota-se que ela é bem mais ampla. O estudo que você realizará nesse tópico abordará essa segunda acepção, ou seja, a didática compreendida como ramo do conhecimento que formula generalizações em torno das tarefas docentes comuns e fundamentais no processo de ensino, conforme apresentado por Libâneo (2015). A propósito, Haydt (2008, p. 13) explica que a didática “se refere aos conteúdos do ensino e aos processos próprios para a construção do conhecimento. Enquanto a pedagogia pode ser conceituada como ciência e a arte da educação, a didática é definida como ciência e a arte do ensino”. A Didática, portanto, é uma disciplina que: [...] estuda o processo de ensino por meio dos seus componentes – os conteúdos escolares, o ensino e a aprendizagem – para, com o embasamento numa teoria da educação, formular diretrizes orientadoras da atividade profissional dos professores. É, ao mesmo tempo, uma matéria de estudo fundamental na formação profissional dos professores e um meio de trabalho do qual os professores se servem para dirigir a atividade de ensino, cujo resultado é a aprendizagem dos conteúdos escolares pelos alunos (LIBÂNEO, 2015, p. 52). A Didática, portanto, tem como objeto de estudo o processo de ensino- aprendizagem. Ela pode ser compreendida como uma disciplina que propicia o estudo crítico dos elementos presentes na prática pedagógica, a saber: o professor, o aluno, o conhecimento, os objetivos, a metodologia e os recursos de ensino. Tal estudo deve ser mediado pela problematização, contestação e identificação de aspectos positivos e negativos que permeiam essa prática (LIBÂNEO, 2015). A propósito, consultando um dicionário encontramos duas acepções para o termo didática. Primeiramente, ela é definida como técnica ou arte de ensinar, de transmitir conhecimentos. E, ainda, como ramo ou seção específica da pedagogia que se concentra nos conteúdos do ensino e nos processos próprios para a construção do conhecimento; ciência e arte do ensino (MICHAELIS, 2021). NOTA TÓPICO 1 — DIDÁTICA 5 Pensando o processo educativo como uma relação triádica entre o professor, os alunos e o conhecimento (CORDEIRO, 2009), a didática pode ser compreendida como um campo de estudo que se ocupa com o que ensinar, a quem ensinar, por que ensinar e como ensinar, sempre levando em consideração as especificidades dos alunos e da realidade escolar. Veja bem, levar em consideração a situação do aluno e do contexto escolar significa dizer que a didática não apresenta receitas prontas acerca do ato de ensinar. De acordo com Cordeiro (2009, p. 98), “[...] pensar o ensino e a aprendizagem em termos da relação pedagógica implica admitir a complexidade da situação da sala de aula e considerar as questões de ensino de um ponto de vista dinâmico”. Essa complexidade e dinamismo apontados por Cordeiro (2009) residem no fato de que cada turma, cada aluno e cada momento são únicos. Assim, embora as teorias apresentadas ajudem a expandir os conhecimentos do educador sobre sua ação de educar, ele “nunca estará definitivamente pronto, formado, pois que a sua preparação, a sua maturação se faz no dia a dia, na meditação teórica sobre a sua prática” (LUCKESI, 2012, p. 29). Nesse sentido, a didática: [...] não poderá reduzir-se e dedicar-se tão somente ao ensino de meios e mecanismos pelos quais se possa desenvolver um processo ensino- aprendizagem, mas deverá ser um elo fundamental entre as opções filosófico-políticas da educação, os conteúdos profissionalizantes e o exercício diuturno da educação. Não poderá continuar sendo um apêndice de orientações mecânicas e tecnológicas. Deverá ser, sim, um modo crítico de desenvolver uma prática educativa, forjadora de um projeto histórico, que não se fará tão somente pelo educador, [mas] conjuntamente, com o educando e outros membros dos diversos setores da sociedade (LUCKESI, 2012, p. 33). Para Luckesi (2012), o estudo da didática deve superar uma visãoreducionista e mecanicista, levando o educador a refletir criticamente sobre sua prática. Para tanto, o docente precisa ter clareza do papel social da educação e das concepções de homem e de sociedade implícitas no ato educativo. Sobre essa questão é oportuna a contribuição de Veiga (2004), que entende a didática como uma área do conhecimento que tem como objeto de estudo o ato de ensinar: De um lado, constitui-se em um conteúdo técnico, relativo à forma de organizar, desenvolver e avaliar a transmissão, direta e indireta, do conteúdo objeto do ensino. De outro lado, o ato de ensinar vivencia dimensões colocadas como sua finalidade e também um conteúdo, aqui, denominado de pedagógico. Esse conteúdo é relativo às concepções de homem, de educação, de sociedade e de mundo vivenciadas pelos conhecimentos, valores e habilidades desenvolvidos como finalidades específicas pelo professor e compreendidos no interior de finalidades mais amplas para a escola como instituição social (VEIGA, 2004, p. 30) UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 6 Tal concepção de didática implica em pensar a educação enquanto fenômeno social, ou seja, ela é parte das relações sociais, econômicas, políticas e culturais de uma determinada sociedade. Nesse sentido, Libâneo (2015, p. 22) considera que: [...] a responsabilidade social da escola e dos professores é muito grande, pois cabe-lhes escolher qual concepção de vida e de sociedade deve ser trazida à consideração dos alunos e quais conteúdos e métodos lhes propiciam o domínio dos conhecimentos e a capacidade de raciocínios necessários à compreensão da realidade social e à atividade prática na profissão, na política, nos movimentos sociais. Tal como a educação, também o ensino é determinado socialmente. Ao mesmo tempo que cumpre objetivos e exigências da sociedade conforme interesses de grupos e classes sociais que a constituem, o ensino cria condições metodológicas e organizativas para o processo de transmissão e assimilação de conhecimentos e desenvolvimento das capacidades intelectuais e processos mentais dos alunos tendo em vista o entendimento crítico dos problemas sociais. Tendo compreendido o conceito de didática, é importante destacar que ela está estreitamente vinculada ao conceito de metodologia, estando ambas, por sua vez, relacionadas ao processo de ensino-aprendizagem. Sendo assim, para exercer a docência de forma eficiente, é necessário que o professor tenha conhecimento do conteúdo a ser ministrado, mas que também tenha conhecimento do campo didático-metodológico. O estudo da metodologia, por sua vez, não deve se restringir ao conhecimento das técnicas de ensino. A opção por um determinado tipo de metodologia revela a postura política do professor, seus valores, sua visão de mundo e de sociedade, tal como vimos em relação à didática. De acordo com Manfredi (1993, p. 1), a metodologia de ensino costuma ser definida, de uma forma um tanto quanto genérica e simplista, como sendo “o estudo das diferentes trajetórias traçadas/planejadas e vivenciadas pelos educadores para orientar/direcionar o processo de ensino-aprendizagem em função de certos objetivos ou fins educativos/formativos”. Essa definição, entretanto, pode ser utilizada para referir-se à prática de qualquer educador, independentemente de sua concepção de educação. Sendo assim, faz-se necessário pensar em metodologia de ensino de uma forma mais ampla, ou seja, levando em consideração o contexto histórico-social. Essa forma de pensar leva ao entendimento de que “talvez não exista apenas um conceito geral, universalmente válido e a-histórico de metodologia, mas sim vários, que têm por referência as diferentes concepções e práticas educativas que historicamente lhes deram suporte” (MANFREDI, 1993, p. 1). Embora o tema da metodologia de ensino seja retomado com mais profundidade na Unidade 3 desse livro didático, no decorrer da Unidade 1, retomaremos o conceito de metodologia, associando-o às diversas concepções de educação existentes. TÓPICO 1 — DIDÁTICA 7 Como você deve ter observado, o estudo da didática requer constantes reflexões acerca da educação e do processo educativo. Vejamos, então, o conceito de educação – nos sentidos amplo e estrito – e qual a sua relação com a instrução e o ensino, termos bastante recorrentes no campo da didática. Em sentido amplo, a educação pode ser compreendida como um fenômeno social inerente à constituição do ser humano, ocorrendo em diversas esferas: familiar, religiosa, política, econômica e cultural, dentre outras. Além disso, ela ocorre ao longo de toda a existência, já que “a consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inclusão num permanente movimento de busca. É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente” (FREIRE, 2002, p. 64). A educação, ainda, está presente em todas as sociedades. Isso acontece, segundo Saviani (2003, p. 7), porque: [...] o homem não se faz homem naturalmente; ele não nasce sabendo ser homem, vale dizer, ele não nasce sabendo sentir, pensar, avaliar, agir. Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir ou avaliar é preciso aprender, o que implica o trabalho educativo. Assim, o saber que diretamente interessa à educação é aquele que emerge como resultado do processo de aprendizagem, como resultado do trabalho educativo. Entretanto, para chegar a esse resultado a educação tem que partir, tem que tomar como referência, como matéria-prima de sua atividade, o saber objetivo produzido historicamente. AUTOATIVIDADE Até aqui você viu que tanto o conceito de didática como o de metodologia costumam ser abordados de forma simplista e genérica, sem levar em consideração o contexto histórico-social em que a educação ocorre. 1 Com base nessas reflexões iniciais apresentadas, o que significam didática e metodologia para você? Registre aqui suas impressões. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ Ao término da unidade, retome o que você escreveu e analise se o seu entendimento sobre o assunto foi modificado. UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 8 As reflexões apresentadas por Saviani (2003) levam ao conceito da educação em seu sentido estrito, que ocorre “em instituições específicas, escolares ou não, com finalidades explícitas de instrução e ensino mediante uma ação consciente, deliberada e planificada, embora sem separar-se daqueles processos formativos gerais” (LIBÂNEO, 2015, p. 17). Em síntese, a educação, em seu sentido amplo, é aquela que acontece ao longo da vida, constituindo-se no processo de desenvolvimento integral do ser humano, tendo em vista sua capacitação “para o autoconhecimento e para a transmissão de valores morais, culturais e cívicos que sustentam a sociedade” (MARQUES; OLIVEIRA, 2016, p. 191). Já a educação em seu sentido estrito corresponde às ações educativas mediadas, na maioria das vezes, por um professor no espaço da sala de aula. Quanto à educação escolar, trata-se de um sistema de instrução e ensino constituído por práticas organizadas e sistematizadas, que apresenta finalidades e objetivos previamente definidos. E quais seriam as diferenças entre ensino e instrução? Quando se fala em ensino, é comum as pessoas pensarem imediatamente na escola, local em que se ensinam conteúdos programáticos e teóricos, como a Língua Portuguesa, a Matemática, a Geografia e outros. As principais figuras dessa interação são o professor e o aluno.Muito embora o ensino possa ocorrer fora do ambiente escolar, seu local privilegiado é a escola. A instrução, por sua vez, difere-se do ensino por estar voltada para as destrezas corporais, para o saber-fazer. Quando se instrui também se ensina; entretanto, o conteúdo ensinado é prático, pois envolve competências corporais como aprender a nadar, a escovar os dentes, a dirigir um carro, a pintar uma tela. Embora a instrução ocorra também na escola, ela ultrapassa esse ambiente. Como você deve ter percebido, educar, ensinar e instruir são conceitos diferenciados, mas interligados. Para ampliar sua compreensão, acesse o link a seguir, no qual você terá acesso a uma explicação detalhada, com diversos exemplos acerca desses três termos e a um jogo criado por Nelson Gomes, em que você poderá testar seus conhecimentos sobre o assunto. FONTE: <https://bit.ly/34lUQpx>. Acesso em: 7 abr. 2021. DICAS TÓPICO 1 — DIDÁTICA 9 De acordo com Libâneo (2015), o processo educativo se desenvolve na escola por meio da instrução e do ensino, constituindo-se na assimilação de experiências e conhecimentos acumulados pelas gerações anteriores no decurso do desenvolvimento histórico-social. Tal processo possui caráter pedagógico, uma vez que se trata de uma ação consciente, intencional e planejada. A didática ocupa um lugar especial nesse processo, uma vez que ela: [...] investiga os fundamentos, condições e modos de realização da instrução e do ensino. A ela cabe converter objetivos sociopolíticos e pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos e métodos em função desses objetivos, estabelecer os vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos (LIBÂNEO, 2015, p. 26). Depreende-se, então, que a Didática realiza a mediação entre as bases teórico-científicas da educação escolar e a prática docente. Ela defende a superação entre teoria e prática, estabelecendo o vínculo entre ambas. De acordo com Veiga (1989), teoria e prática não existem isoladas, sendo que uma não é mais ou menos importante que a outra. Diversos filmes, nacionais e estrangeiros, abordam questões relacionadas ao ensino-aprendizagem por meio das relações estabelecidas entre professor/alunos. Um deles é o filme Escritores da liberdade, baseado no best-seller O diário dos escritores da liberdade. O filme conta a história de uma professora de Língua Inglesa e Literatura que se vê diante de estudantes cujas vidas foram marcadas pela violência e por conflitos raciais. Diante do desafio de lecionar para essa turma de alunos desmotivados e desinteressados, a profes- sora resolve utilizar uma metodologia de ensino diferenciada para conseguir atingi-los. Que tal assistir ao filme refletindo sobre as concepções de homem, sociedade e educa- ção implícitas na história? Ficha Técnica Título no Brasil: Escritores da liberdade Título original: Freedom Writers País de origem: Estados Unidos Gênero: Drama Duração: 122 minutos Ano de lançamento: 2007 Direção: Richard La Gravenese DICAS UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 10 CARTAZ DO FILME FIGURA – ESCRITORES DA LIBERDADE FONTE: <https://bit.ly/3bXAJCz>. Acesso em: 8 abr. 2021. 3 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA DIDÁTICA Após ter estudado o conceito de didática e sua relação com a educação, vamos avançar um pouco mais. Quando surgiu a didática? Quem foi seu precursor? A concepção de didática sempre foi a mesma no decorrer da história ou mudou com o passar do tempo? Qual a relação da didática com as tendências pedagógicas? Vamos lá? 3.1 DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ENSINO E DIDÁTICA A história da didática está intrinsecamente relacionada ao surgimento do ensino enquanto atividade planejada e intencional. De acordo com Libâneo (2015), até meados do século XVII não se pode falar da didática como teoria do ensino, muito embora a ação pedagógica ocorresse, de forma não sistematizada, nas escolas, mosteiros e igrejas. O termo “Didática” aparece quando os adultos começam a intervir na atividade de aprendizagem das crianças e jovens através da direção deliberada e planejada do ensino, ao contrário das formas de intervenção mais ou menos espontâneas de antes. Estabelecendo- se uma intenção propriamente pedagógica na atividade de ensino, a escola se torna uma instituição, o processo de ensino passa a ser sistematizado conforme níveis, tendo em vista a adequação as possibilidades das crianças, as idades e ritmo de assimilação dos estudos (LIBÂNEO, 2015, p. 58). TÓPICO 1 — DIDÁTICA 11 A didática propriamente dita surgiu no século XVII, quando o pastor protestante João Amós Comênio escreveu uma obra clássica denominada Didática magna, na qual ele formulou a ideia da difusão do conhecimento para todos e criou regras e princípios do ensino. Sendo assim, há mais de 360 anos Comênio: [...] convidava os educadores a pensar na questão educacional, propondo a utopia da criação de um método que fosse capaz de ensinar tudo a todos, especialmente o domínio da leitura e da escrita, base para a compreensão e interpretação dos textos bíblicos. Nascia assim a didática, no cerne de uma verdadeira revolução social e política, contra a hegemonia do poder do clero católico na condução do destino da humanidade (PIMENTA et al., 2013, p. 143). Comênio – que ficou então conhecido como o precursor da Didática Moderna – tinha como intento encontrar um método mais eficiente de divulgar as ideias religiosas, especialmente referentes à Reforma Protestante, em oposição às ideias disseminadas pelo catolicismo. Sua didática estava pautada em alguns princípios, conforme apresentado por Libâneo (2015, p. 58-59): • A finalidade da educação é conduzir à felicidade eterna com Deus, pois a educação é uma força poderosa de regeneração da vida humana. Todos os homens merecem a sabedoria, a moralidade e a religião, porque todos, ao realizarem sua própria natureza, realizam os desígnios de Deus. Portanto, a educação é um direito natural de todos. • Por ser parte da natureza, o homem deve ser educado de acordo com o seu desenvolvimento natural, isto é, de acordo com as características de idade e capacidade para o conhecimento. Consequentemente, a tarefa principal da Didática é estudar as características e os métodos de ensino correspondentes, de acordo com a ordem natural das coisas. • A assimilação dos conhecimentos não se dá instantaneamente, como se o aluno registrasse de forma mecânica na sua mente a informação do professor, como o reflexo num espelho. No ensino, ao invés disso, tem um papel decisivo a percepção sensorial das coisas. Os conhecimentos devem ser adquiridos a partir da observação das coisas e dos fenômenos, utilizando e desenvolvendo sistematicamente os órgãos dos sentidos. • O método intuitivo consiste, assim, da observação direta, pelos órgãos dos sentidos, das coisas, para o registro das impressões na mente do aluno. Primeiramente as coisas, depois as palavras. O planejamento de ensino deve obedecer ao curso da natureza infantil; por isso as coisas devem ser ensinadas uma de cada vez. Não se deve ensinar nada que a criança não possa compreender. Portanto, deve-se partir do conhecido para o desconhecido. Ao analisar os princípios nos quais se assentava a didática de Comênio, Libâneo (2015) reconhece seu mérito tanto por suas ideias inovadoras quanto por empenhar-se em desenvolver métodos de instrução mais eficientes. Entretanto, ele também observa que Comênio não escapou de algumas crenças recorrentes naquela época acerca do ensino: UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 12 Embora partindo da observação e da experiência sensorial, mantinha-se o caráter transmissor do ensino; embora procurando adaptar o ensino às fases do desenvolvimento infantil, mantinha-se o método único e o ensino simultâneo a todos. Além disso, sua ideia de que a única via de acesso dosconhecimentos é a experiência sensorial com as coisas não é suficiente, primeiro porque nossas percepções frequentemente nos enganam, segundo, porque já há uma experiência social acumulada de conhecimentos sistematizados que não necessitam ser descobertos novamente (LIBÂNEO, 2015, p. 59). Como você pode perceber, a didática está intimamente relacionada ao que se espera da educação, do homem e da sociedade em um determinado contexto e ambiência. Após Comênio, outros pensadores trouxeram novas concepções de educação, ensino-aprendizagem. Antes de conhecê-los, veja, a seguir, um pouco mais sobre o precursor da didática. João Amós Comênio nasceu na Europa, em 1592, na região que hoje corresponde à República Tcheca e morreu em 1670. Em pleno século XVII, já defendia o direito de todos à educação. O que Comênio defendia A alta didática é uma arte geral de ensinar tudo a todos. E ensinar com segurança para que o resultado aconteça. Ensinar gentilmente de forma que nem o professor nem os alunos sintam quaisquer dificuldades ou aversão, pelo contrário, ambos tenham prazer. E ensinar cuidadosamente, não superficialmente, levando todos a uma verdadeira educação, maneiras nobres e dedicada piedade. FONTE: COMENIUS, J. A. The Great Didactic of John amos Comenius. 2. ed. Londres: A. and C. Black, 1910. FIGURA – JAN AMOS KOMENSKY (COMÊNIO) FONTE: <https://bit.ly/3bYVRIv>. Acesso: 8 abr. 2021. NOTA TÓPICO 1 — DIDÁTICA 13 A partir do século XIX, surgiram outros pensadores que apresentaram novas concepções de ensino. Dentre eles, destacaram-se Jean Jacques Rousseau (1712-1778), Henrique Pestalozzi (1746-1827) e Johann Friedrich Herbart (1766- 1841). Jean Jacques Rousseau propôs uma nova concepção de ensino baseada nos interesses da criança. A obra denominada Emílio ou Da educação, publicada por ele em 1762, constitui-se em uma das maiores obras acerca da psicologia do desenvolvimento: Emílio constitui uma experiência educacional imaginária. O objetivo de Rousseau era mostrar como seria possível criar um indivíduo que pudesse agir como um agente autônomo mesmo na ordem política ilegítima de seu tempo. Visto que as instituições públicas de escolas e faculdades eram irremediavelmente corruptas, a única solução era retirar tanto aluno quanto o professor da sociedade e conduzir a experiência fora dela (PALMER, 2005, p. 74). De acordo com Libâneo (2015), Rousseau acreditava que a organização e desenvolvimento do estudo são determinados pelos interesses e necessidades imediatas do aluno. Assim, a educação é um processo natural que se fundamenta de acordo com o desenvolvimento interno do aprendiz. Ele ainda dizia que as crianças são boas por natureza, além de possuírem uma tendência natural para se desenvolverem. Acerca de Pestalozzi, Libâneo (2015) esclarece que esse pensador dedicou a maior parte de sua vida à educação de crianças pobres em instituições por ele dirigidas. O ensino que ele propunha era baseado no método intuitivo, que tinha como princípios o senso de observação, a análise dos objetos e fenômenos da natureza e a capacidade de linguagem. Herbart, por sua vez, é considerado o inspirador da pedagogia conservadora. De acordo com Libâneo (2015), ele defendia que o fim da educação é a moralidade, ou seja, educar significa instruir o homem para que aprenda a comandar a si próprio, cabendo ao professor introduzir ideias corretas na mente dos alunos. Sendo assim: [...] o sistema pedagógico de Herbert [...] trouxe esclarecimentos válidos para a organização da prática docente, como por exemplo: a necessidade de estruturação e ordenação do processo de ensino, a exigência de compreensão dos assuntos estudados e não simplesmente memorização, o significado educativo da disciplina na formação do O que se afirma sobre Comênio É difícil avaliar quanto a educação moderna deve a Comenius – talvez novas ideias teriam sido desenvolvidas mais cedo ou mais tarde de qualquer maneira –, mas não há dúvida de que foi um dos pioneiros. Como pensador, de certa forma estava na vanguarda: foi um dos primeiros que defenderam a educação das mulheres, e sentia-se tanto um patriota quanto um cidadão do mundo. Como uma pessoa honesta e corajosa, que manteve a fé em condições adversas, só se pode sentir admiração por ele (PALMER, 2005, p. 59). UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 14 caráter. Entretanto, o ensino é entendido como o repasse de ideias do professor para a cabeça do aluno; os alunos devem compreender o que o professor transmite, mas apenas com a finalidade de reproduzir a matéria transmitida (LIBÂNEO, 2015, p. 61). Os pensamentos difundidos por esses e outros teóricos da educação constituíram-se na base do pensamento pedagógico europeu, originando as concepções pedagógicas hoje identificadas como Tradicional e Renovada. Essas concepções, por sua vez, desdobram-se em diversas correntes. Você provavelmente já ouviu falar algo sobre eles. Veja, no quadro a seguir, as principais características de cada uma. QUADRO 1 – CARACTERÍSTICAS DAS CONCEPÇÕES PEDAGÓGICAS TRADICIONAL E RENOVADA FONTE: Adaptado de Libâneo (2015) Tais concepções, por sua vez, deram origem às tendências pedagógicas, que podem ser entendidas como as diversas teorias filosóficas que pretenderam dar conta da compreensão e da orientação da prática educacional em diversos momentos e circunstâncias da história humana (LUCKESI, 1994). Vale lembrar que cada uma delas tem sua forma de conceber a didática, uma vez que: [...] dependendo das circunstâncias e do momento histórico, a didática pode ser considerada como a ciência do ensino, a arte do ensino, uma teoria da instrução, uma teoria da formação ou mesmo uma tecnologia para dar suporte metodológico às disciplinas curriculares. De alguma forma, esteve sempre ligada às questões postas pelos processos de ensino, compreendidos como instrumentos de poder, a serviço de interesses diferentes e contraditórias finalidades (PIMENTA et al., 2013, p. 143). Entende-se, assim, que a concepção de didática mudou com o passar do tempo, sempre adequando-se ao conceito em voga de educação, mas também ao momento político, econômico e social vivenciado. Compreender as influências PEDAGOGIA TRADICIONAL PEDAGOGIA RENOVADA • Ação de agentes externos na formação do aluno. • Primazia do objeto de conhecimento. • Transmissão do saber constituído na tradição e nas grandes verdades acumuladas pela humanidade. • Ensino concebido como impressão de imagens propiciadas pela palavra do professor ou pela observação sensorial. • Considera a criança um ser dotado de liberdade, iniciativa e interesses próprios (sujeito da própria aprendizagem). • Considera as etapas do desenvolvimento biológico e psicológico. • Individualização do ensino conforme os diferentes ritmos de aprendizagem. • Respeito às capacidades e aptidões individuais TÓPICO 1 — DIDÁTICA 15 das tendências pedagógicas e saber identificá-las no fazer docente é uma forma do educador fundamentar sua própria prática, de forma consciente e crítica. Veja, no próximo subtópico, as tendências pedagógicas presentes no discurso educacional brasileiro. 3.2 TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS NA PRÁTICA ESCOLAR Para facilitar a compreensão, as tendências pedagógicas no Brasil são didaticamente divididas em dois grupos: as de caráter liberal e as de caráter progressista, conforme sintetizado no quadro a seguir. QUADRO 2 – TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS NO BRASIL FONTE: Adaptado de Libâneo (2015) A Pedagogia Liberal compreende as correntes influenciadas pelos ideais iluministas da Revolução Francesa (1789) de igualdade, liberdade e fraternidade, bem como pelas contribuições do liberalismo ocidental e do sistema capitalista. Segundo o ideário liberal, a escola deve preparar o aluno para desempenhar papéis sociais em conformidade com suas aptidões individuais. Dessa forma, eles desconsideram as desigualdades de oportunidades e condiçõessociais. Dentre as tendências pedagógicas liberais, destacam-se a tradicional, a renovada e a tecnicista. Suas principais características e o papel da didática em cada uma delas serão apresentados no quadro a seguir. PEDAGOGIA LIBERAL PEDAGOGIA PROGRESSISTA Tradicional Libertadora Renovada Libertária Tecnicista Crítico-Social dos Conteúdos UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 16 Tendência Pedagógica Liberal Tradicional • É centrada no professor (detentor do saber). • O professor tem como função transmitir o conhecimento ao aluno. • O aluno é receptor passivo; seu papel é memorizar o conhecimento recebido. • O aprendizado acontece por meio da ação de agentes externos. • A metodologia utilizada compõe-se de aulas expositivas, organizadas de acordo com uma sequência fixa, além de exercícios e dever de casa. • Os conteúdos são desvinculados dos interesses dos estudantes e repassados como verdades absolutas. • A avaliação tem caráter de punição e é centrada no produto. • A metodologia de ensino é entendida como um conjunto padronizado de procedimentos destinados a transmitir todo e qualquer conhecimento universal e sistematizado. • A Didática é uma disciplina normativa, um conjunto de princípios e regras que regulam o ensino. Tendência Pedagógica Liberal Renovada • É centrada no aluno, que é considerado o sujeito da aprendizagem. • Valoriza a criança, bem como os aspectos psicológico e biológico. • Defende o respeito às capacidades e aptidões individuais. • A aprendizagem acontece a partir da valorização de seus conhecimentos e experiências. • O professor é um facilitador do ensino. • Ao professor cabe motivar, orientar e organizar as situações de aprendizagem, adequando-as às capacidades e interesses individuais dos alunos. • A relação professor-aluno é democrática. • O conhecimento é visto como algo inacabado, a ser descoberto e reinventado. • Os conteúdos são estabelecidos pela experiência. • A metodologia busca o aprender experimentando, o aprender a aprender. • A avaliação valoriza o processo, e não o produto. • A metodologia do ensino é entendida como uma estratégia que visa garantir o aprimoramento individual e social. • A didática é entendida como “direção da aprendizagem”. QUADRO 3 – CARACTERÍSTICAS DAS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS LIBERAIS TÓPICO 1 — DIDÁTICA 17 FONTE: Adaptado de Libâneo (2015) e Manfredi (1993) As tendências de cunho progressista também são chamadas de teorias críticas da educação. Caracterizam-se como um conjunto de ideias voltadas para os interesses da maioria da população, defendendo a necessidade de superação do conceito de escola como redentora ou reprodutora da sociedade (SAVIANI, 2003). Subdividem-se em libertadora, libertária e crítico-social dos conteúdos. Veja, a seguir, as características de cada uma delas. Tendência Pedagógica Liberal Tecnicista • Atividades repetitivas, programadas e sem reflexão. • Defende o princípio da neutralidade, da racionalidade, da eficiência, da produtividade e da fragmentação do conhecimento. • O professor é refém da técnica, repassada pelos manuais. • O aluno é um mero reprodutor de respostas pré-estabelecidas pela escola; devendo reproduzir sem questionar. • O papel da escola é produzir indivíduos competentes para o mercado de trabalho. • A metodologia prioriza o uso da técnica para atingir objetivos instrucionais (cópia, repetição, treino). • Os conteúdos são baseados nos princípios científicos. • Utilização de manuais e módulos de autoinstrução. • A avaliação é feita com vários instrumentos de medição. • A metodologia do ensino é entendida como uma estratégia de aprimoramento técnico, no sentido de garantir maior eficiência e eficácia ao processo de ensino-aprendizagem. • A didática é instrumental, tendo como foco a racionalização do ensino. UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 18 TENDÊNCIA PEDAGÓGICA CARACTERÍSTICAS Tendência Pedagógica Progressista Libertadora • É oriunda dos movimentos de educação popular. • Visa uma escola crítica, que questiona as relações do homem no seu meio. • O aluno é sujeito do ato de conhecer e seu papel é refletir sobre sua realidade. • O professor é o coordenador das atividades. • A relação professor-aluno é horizontal. • Os conteúdos partem de temas geradores extraídos da vida dos alunos. • A metodologia é participativa, buscando a construção do conhecimento. • Prioriza a autoavaliação e a avaliação mútua. • Não tem uma proposta explícita de didática, pois muitos de seus seguidores acreditam que toda didática possui caráter tecnicista, porém, há uma didática implícita na orientação do trabalho escolar. Tendência Pedagógica Progressista Libertária • Estimula a participação do aluno em grupos e movimentos sociais como sindicatos, grupos de mães, associações de moradores etc. • O papel da escola é transformar o aluno no sentido libertário e auto gestionário. • O papel do aluno é refletir sobre sua realidade para poder engajar-se nas lutas por libertação. • O professor é o conselheiro, uma espécie de monitor à disposição do aluno. • O conhecimento baseia-se na reflexão sobre a cultura e na busca de respostas aos desafios encontrados. • A metodologia é baseada na livre-expressão. • Os conteúdos são colocados para o aluno, mas não são exigidos, pois resultam das necessidades do grupo. • Presença da autoavaliação, sem caráter punitivo. • Sua didática defende a autogestão pedagógica. Alia-se às ideias defendidas pelos anarquistas e psicanalistas que acreditam que a aprendizagem ocorre por meio da vivência em grupos. QUADRO 4 – CARACTERÍSTICAS DAS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS PROGRESSISTAS TÓPICO 1 — DIDÁTICA 19 FONTE: Adaptado de Libâneo (2015) e Manfredi (1993) Tendência Pedagógica Progressista Crítico-Social dos Conteúdos • O ponto de partida no processo formativo do aluno é a reflexão da prática social, embasada teoricamente. • Os alunos devem ter o domínio dos conhecimentos, das habilidades e capacidades para interpretar suas experiências de vida e defender seus interesses de classe. • O papel da escola é preparar o aluno para uma participação ativa na sociedade. • O aluno é visto como sujeito ativo. • O professor é a autoridade competente que direciona o processo ensino-aprendizagem; é o mediador entre os conteúdos e os alunos. • O conhecimento é construído pela experiência pessoal e subjetiva. • A metodologia parte do contexto cultural e social. • Os conteúdos são culturais e universais, sempre reavaliados frente à realidade social. • A avaliação considera que a experiência só pode ser julgada a partir de critérios internos do organismo. • A metodologia do ensino é entendida como uma estratégia que visa garantir o processo de reflexão crítica sobre a realidade vivida, percebida e concebida, visando uma tomada de consciência dessa realidade, tendo em vista a sua transformação. • Atribui grande importância à didática, que tem como objetivo a direção do processo de ensinar. Veja agora a música Estudo errado, de Gabriel o Pensador, produzida em 1995. Na música, o rapper critica o formato das escolas da época. Você também pode acessar o seguinte link para assistir ao vídeo: https://bit.ly/3oWJvFX. Estudo errado Eu tô aqui pra quê? Será que é pra aprender? Ou será que é pra sentar, me acomodar e obedecer? Tô tentando passar de ano pro meu pai não me bater Sem recreio de saco cheio porque eu não fiz o dever. A professora já tá de marcação porque sempre me pega. Disfarçando, espiando, colando toda prova dos colegas. E ela esfrega na minha cara um zero bem redondo. E quando chega o boletim lá em casa eu me escondo. Eu quero jogar botão, videogame, bola de gude. Mas meus pais só querem que eu vá pra aula! E estude! Então dessa vez eu vou estudar até decorar cumpádi. Pra me dar bem e minha mãe deixar ficar acordado até mais tarde.Ou quem sabe aumentar minha mesada. Pra eu comprar mais revistinha (do Cascão?). Não. De mulher pelada. A diversão é limitada e o meu pai não tem tempo pra nada. E a entrada no cinema é censurada (vai pra casa pirralhada!). A rua é perigosa então eu vejo televisão (Tá lá mais um corpo estendido no chão). Na hora do jornal eu desligo porque eu nem DICAS UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 20 sei nem o que é inflação. - Ué não te ensinaram? - Não. A maioria das matérias que eles dão eu acho inútil. Em vão, pouco interessantes, eu fico pu... Tô cansado de estudar, de madrugar, que sacrilégio (Vai pro colégio!). Então eu fui relendo tudo até a prova começar. Voltei louco pra contar. Manhê! Tirei um dez na prova. Me dei bem, tirei um cem e eu quero ver quem me re- prova. Decorei toda lição. Não errei nenhuma questão. Não aprendi nada de bom. Mas tirei dez (boa filhão!). Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci. Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi. Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci. Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi. Decoreba: esse é o método de ensino. Eles me tratam como ameba e assim eu não racio- cino. Não aprendo as causas e consequências só decoro os fatos. Desse jeito até história fica chato. Mas os velhos me disseram que o porquê é o segredo. Então quando eu num entendo nada, eu levanto o dedo. Porque eu quero usar a mente pra ficar inteligente. Eu sei que ainda não sou gente grande, mas eu já sou gente. E sei que o estudo é uma coi- sa boa. O problema é que sem motivação a gente enjoa. O sistema bota um monte de abobrinha no programa. Mas pra aprender a ser um ignorante. Ah, um ignorante, por mim eu nem saía da minha cama (ah, deixa eu dormir). Eu gosto dos professores e eu preciso de um mestre. Mas eu prefiro que eles me ensinem alguma coisa que preste. - O que é corrupção? Pra que serve um deputado? Não me diga que o Brasil foi descoberto por acaso! Ou que a minhoca é hermafrodita. Ou sobre a tênia solitária. Não me faça decorar as capitanias hereditárias! Vamos fugir dessa jaula! Hoje eu tô feliz (matou o presidente?). Não. A aula. Matei a aula porque num dava. Eu não aguentava mais. E fui escutar o Pensa- dor escondido dos meus pais. Mas se eles fossem da minha idade eles entenderiam. (Esse num é o valor que um aluno merecia!). Ih, sujô. (hein?). O inspetor! (Acabou a farra, já pra sala do coordenador!). Achei que ia ser suspenso, mas era só pra conversar. E me disseram que a escola era meu segundo lar. E é verdade, eu aprendo muita coisa realmente. Faço amigos, conheço gente, mas não quero estudar pra sempre! Então eu vou passar de ano. Não tenho outra saída. Mas o ideal é que a escola me prepare pra vida. Discutindo e ensi- nando os problemas atuais. E não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais. Com matérias das quais eles não lembram mais nada. E quando eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada. Manhê! Tirei um dez na prova. Me dei bem, tirei um cem e eu quero ver quem me re- prova. Decorei toda lição. Não errei nenhuma questão. Não aprendi nada de bom. Mas tirei dez (boa filhão!). Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci. Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi. Quase tudo que aprendi, amanhã eu já esqueci. Decorei, copiei, memorizei, mas não entendi. Encarem as crianças com mais seriedade. Pois na escola é onde formamos nossa perso- nalidade. Vocês tratam a educação como um negócio onde a ganância, a exploração, e a indiferença são sócios. Quem devia lucrar só é prejudicado. Assim vocês vão criar uma geração de revoltados. Tá tudo errado e eu já tô de saco cheio. Agora me dá minha bola e deixa eu ir embora pro recreio. Juquinha você tá falando demais assim eu vou ter que lhe deixar sem recreio! Mas é só a verdade professora! Eu sei, mas colabora senão eu perco o meu emprego! Após ouvir a música, responda: 1 Quais características das diversas tendências pedagógicas apresentadas que você consegue localizar na letra da música? R.: A música critica, principalmente, o tipo de conteúdo que é ensinado na escola, que não é interessante e não tem significado para a vida do aluno. Além disso, a forma como o conteúdo é ensinado exige do aluno apenas a memorização (decoreba), e não o ra- ciocínio. O professor é apresentado como alguém que vigia e pune os alunos. A nota é vista como instrumento de punição. Todas essas características remetem à tendência TÓPICO 1 — DIDÁTICA 21 pedagógica liberal tradicional, a qual é centrada no professor. Nessa tendência, o aluno é considerado um ser passivo, cujo papel é memorizar o conhecimento recebido nas aulas expositivas. 2 Passados 25 anos de produção dessa música, você percebe diferenças no formato atual das escolas? Quais? R.: Essa pergunta admite variadas respostas, dependendo da realidade em que o aluno vive. É possível que muitos constatem que, apesar das mudanças, diversas características da escola tradicional continuam existindo na escola atual, como o ensino conteudista, centrado no professor e na passividade do aluno. 3.3 ABORDAGENS TEÓRICAS CONTEMPORÂNEAS Após ter estudado as origens da didática, ainda no século XVII, e ter acompanhado as diferentes concepções que vêm norteando a prática docente no decorrer do tempo, você deve estar se perguntando quais as perceptivas da disciplina na contemporaneidade, em uma sociedade altamente influenciada pelo desenvolvimento tecnológico, marcada pelo multiculturalismo e pela diversidade. Diversos autores defendem que, nas sociedades modernas, o compromisso da educação deve ser com a formação humana, ou seja, a formação de seres sociais, de entes culturais. Sendo assim, espera-se que a educação básica possibilite que os educandos se tornem “pessoas com condições suficientes para usufruir dos recursos que a vida social pode disponibilizar para um viver melhor, para a participação e escolhas coletivas, na direção do bem comum” (GATTI, 2017, p. 1153). Complementando, Gatti (2017, p. 1153) também afirma que, partindo-se dessa perspectiva, os professores são instados a: [...] ter como responder em sua seara de trabalho por uma formação para seus alunos que os habilite a compreender o mundo, a natureza, a vida social, aprendendo a fazer escolhas com base em conhecimentos e valores. Aos profissionais do magistério, é necessária uma formação para a comunicação efetiva professores-alunos, para a escuta efetiva alunos-professores, para o diálogo pedagógico visando à construção e constituição de aprendizagens. São formas de agir que exigem aprendizagem e se sustentam em conhecimentos e práticas culturais da didática e das metodologias relativas às relações educacionais intencionais recheadas com os conteúdos relevantes à vida humana e coletiva. Como você pôde observar, ao contrário do que foi apresentado na música Estudo errado, de Gabriel o Pensador, espera-se que os alunos compreendam o sentido dos conteúdos aprendidos na escola, relacionando-os com a vida. Além disso, tais conhecimentos devem dar condições “para o exercício da cidadania, UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 22 permitindo às pessoas um viver melhor e favorecendo movimentos societários que alavancam as possibilidades humanas em seu conjunto” (GATTI, 2017, p. 1154). Para atender a esse propósito, os professores têm o papel de: Criar e recriar modos de propiciar aos seus alunos aprendizagens mais efetivas, cognitivas e socioafetivas. A aula e os campos do conhecimento, a dialética na relação cotidiana de professores e alunos, o âmbito moral dessa relação, a interveniência aí de conhecimentos, universais ou locais, no entrechoque sociocultural de parceiros diferenciados demandam práticas com fundamentos que venham a dar suporte adequado ao agir educativo (GATTI, 2017, p. 1163). A propósito, no final do século XX, Delors (1998) já apresentava os quatro pilares em torno dos quais a educação deveriaorganizar-se no século seguinte, a saber: aprender a conhecer, que visa não somente a aquisição de um repertório de saberes, mas o domínio dos instrumentos para poder adquiri-los; aprender a fazer, de modo a ter condições de agir sobre o meio, pondo em prática os conhecimentos obtidos; aprender a viver juntos, de forma cooperativa e não conflituosa e, finalmente, aprender a ser, já que a educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa, ou seja, o desenvolvimento de sua inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal e espiritualidade. A organização desses quatro pilares levou em conta a superação de um ensino centrado unicamente na transmissão de conteúdos: Não basta, de fato, que cada um acumule no começo da vida uma determinada quantidade de conhecimentos de que possa abastecer- se indefinidamente. É, antes, necessário estar à altura de aproveitar e explorar, do começo ao fim da vida, todas as ocasiões de atualizar, aprofundar e enriquecer estes primeiros conhecimentos, e de se adaptar a um mundo em mudança (DELORS, 1998, p. 89). Ainda, no final do século XX, a teoria das inteligências múltiplas, sistematizada por Howard Gardner, também causou forte impacto na área educacional ao ampliar o conceito de inteligência para além do domínio do conhecimento lógico-matemático. Para Gardner (1994), existem diversos tipos de inteligência: • Lógico-matemática – referente à capacidade de realizar operações numéricas e de fazer deduções. • Linguística – que envolve a habilidade de aprender idiomas e de usar a fala e a escrita para atingir objetivos. • Espacial – relativa à disposição para reconhecer e manipular situações que envolvam apreensões visuais. • Físico-cinestésica – que é o potencial para usar o corpo com o fim de resolver problemas ou fabricar produtos. • Interpessoal – referente à capacidade de entender as intenções e os desejos dos outros, de forma a relacionar-se bem com as pessoas. TÓPICO 1 — DIDÁTICA 23 • Intrapessoal – que é a inclinação para se conhecer e usar o entendimento de si mesmo para alcançar certos fins. • Musical – que diz respeito à aptidão para tocar, apreciar e compor padrões musicais. Posteriormente, foram ainda acrescentadas a inteligência natural, que é a capacidade de reconhecer e classificar espécies da natureza e a inteligência existencial, referente à capacidade de refletir sobre questões fundamentais da vida humana. Além disso, ele sugeriu o agrupamento da interpessoal e da intrapessoal em uma só. Reconhecer esses outros tipos de inteligência no contexto escolar implica compreender que os interesses e as habilidades de cada aluno são diferentes. Portanto, ele aprende de formas diferentes e em momentos diferentes no decorrer do processo de ensino-aprendizagem. Sendo assim, cabe à escola e ao professor adequarem as metodologias de ensino para que os alunos que apresentam maiores dificuldades em determinadas áreas possam avançar no conhecimento sem se sentirem rotulados ou frustrados. Além disso, é importante que a escola estimule os alunos a desenvolverem todas as suas potencialidades, valorizando, por conseguinte, os diversos tipos de inteligência. Ainda, nesse contexto, foram importantes as contribuições da Programação Neurolinguística (PNL) ao estudar como o cérebro e a mente funcionam, ou seja, como o indivíduo cria seus pensamentos, sentimentos, estados emocionais e comportamentos e como direcionar e otimizar esse processo nas diversas situações cotidianas, inclusive nas de aprendizagem (MANCILHA, 2013). De acordo com esses estudos, o cérebro utiliza diversas estratégias e aptidões para acelerar os processos e melhorar os desempenhos individuais. Assim, existem três sistemas que podem ser utilizados para representar mentalmente a informação: visual, auditivo e sinestésico. No caso do processo ensino-aprendizagem, a compreensão desses sistemas pode ajudar o professor na escolha das metodologias a serem utilizadas em sala de aula. Vale ressaltar que essas abordagens teóricas contemporâneas influenciam na forma de conceber o ensino e a aprendizagem, mas também nos conteúdos programáticos a serem desenvolvidos em sala de aula, conforme orientações encontradas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC). No quadro a seguir, você terá a oportunidade de conhecer alguns pontos destacados na BNCC, com relação às práticas de linguagem, que vão ao encontro das expectativas da sociedade contemporânea. Como você pode perceber, todos esses estudos e teorias vêm somar-se à prática docente contemporânea, devendo ser levados em consideração pelo docente no momento de elaborar os planos de ensino e de aula. UNIDADE 1 — DIDÁTICA E FUNDAMENTOS DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E DA LITERATURA 24 QUADRO 5 – O QUE DIZ A BNCC COM RELAÇÃO ÀS LINGUAGENS? TURMAS PRÁTICAS DE LINGUAGEM Anos Finais do Ensino Fundamental Considerar que adolescentes e jovens participam com maior criticidade de situações comunicativas diversificadas, interagindo, assim, com um número amplo de interlocutores. Fortalecer a formação para a autonomia, uma vez que os jovens assumem maior protagonismo em práticas de linguagem realizadas dentro e fora da escola. Refletir sobre a questão da confiabilidade da informação, da proliferação de fake news, da manipulação de fatos e opiniões. Tematizar a proliferação do discurso de ódio e habilidades relativas ao trato e respeito com o diferente e com a participação ética e respeitosa em discussões e debates de ideias. Conhecer os gêneros legais e normativos – abrindo-se espaço para aqueles que regulam a convivência em sociedade, a fim de promover uma consciência dos direitos, uma valorização dos direitos humanos e a formação de uma ética da responsabilidade. Fomentar uma formação que possibilite o trato crítico e criterioso das informações e dados. Possibilitar o contato com as manifestações artísticas em geral, e, de forma particular e especial, com a arte literária, oferecendo condições para que se possa reconhecer, valorizar e fruir essas manifestações. Por meio da arte e da literatura, exercitar a empatia e do diálogo, tendo em vista a potência desses recursos como expedientes que permitem o contato com diversificados valores, comportamentos, crenças, desejos e conflitos, o que contribui para reconhecer e compreender modos distintos de ser e estar no mundo. TÓPICO 1 — DIDÁTICA 25 FONTE: Adaptado de Brasil (2017) Ensino Médio Propiciar experiências significativas com práticas de linguagem em diferentes mídias (impressa, digital, analógica), situadas em campos de atuação social diversos, vinculados com o enriquecimento cultural próprio, as práticas cidadãs, o trabalho e a continuação dos estudos. Ampliar situações nas quais os jovens aprendam a tomar e sustentar decisões, fazer escolhas e assumir posições conscientes e reflexivas, balizados pelos valores da sociedade democrática e do estado de direito. Possibilitar aos estudantes condições tanto para o adensamento de seus conhecimentos, alcançando maior nível de teorização e análise crítica, quanto para o exercício contínuo de práticas discursivas em diversas linguagens, que visam à participação qualificada no mundo da produção cultural, do trabalho, do entretenimento, da vida pessoal e, principalmente, da vida pública, por meio de argumentação, formulação e avaliação de propostas e tomada de decisões orientadas pela ética e pelo bem comum. Garantir oportunidades de experienciar fazeres cada vez mais próximos das práticas da vida acadêmica, profissional, pública, cultural e pessoal e situações que demandem a articulação de conhecimentos, o planejamento de ações, a auto-organização e a negociação em relação a metas. Priorizar propostas de trabalho que potencializem aos estudantes o acesso a saberes sobre o mundo digital e a práticas da cultura digital, já que, direta ou indiretamente, impactam seu dia a dia nos vários campos
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