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Fundamentos Metodológicos do Ensino da Arte e Música Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Bruno Pinheiro Ribeiro Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin As Linguagens Artísticas: Música As Linguagens Artísticas: Música • Estudar os fundamentos e propostas metodológicas para o ensino de música; • Apresentar a Lei nº 11.769, de 18 de agosto de 2008 que apresenta, desde 2012, a música como conteúdo obrigatório em toda Educação Básica; • Refletir sobre o que dizem o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil e os Parâ- metros Curriculares em Arte no Ensino Fundamental I sobre esta importante linguagem da arte: a música. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Concepção de Ensino de Música; • O Fazer Musical; • A Apreciação Musical; • A Música e o Brincar; • Fundamentos no Ensino de Música; • Sobre os Objetos Sonoros; • Sobre a Construção de Instrumentos Musicais; • Proposições em Educação Musical. UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música Concepção de Ensino de Música Música: [múzika] s. f. (do Lat. musĭca, de musa ’musa’). • Arte de conjugar sons, de forma melodiosa e de acordo com determinadas regras, capaz de exprimir ou despertar emoções e evocar certas realidades; • Organização de sons com intenções estéticas, artísticas ou lúdicas, variáveis de acordo com o autor, com a zona geográfica, com a época etc.; • Forma, gênero ou técnica de composição musical; • Sequência de sons que pela harmonia, pela cadência, pelo ritmo, faz lembrar uma melodia; • Notação ou registo de uma peça musical. Fonte: https://bit.ly/30OJ3zG O que Diz a Legislação Durante o Regime Militar nos anos de 1970, a partir da Lei 5.692/71, foi realizada uma reforma educacional na qual o ensino da música passou a não mais figurar nos chamados 1º e 2º graus. Nas décadas seguintes, muitos problemas ocorreram e a situação só melhora, em 18 de agosto de 2008, com a criação da Lei Federal nº 11.769, que torna conteúdo obrigatório o ensino de música no componente curri- cular das escolas de educação básica. A legislação brasileira para o ensino de Artes, em especial da música, não pode ser explicada por si mesma, mas como resultante de um todo social nas suas determinações políticas e econômicas, pois essa legislação decorre das representações de uma sociedade num período histórico, com significações e com aspectos ideológicos do seu momento, expressando uma realidade social. (DIAS, 2010, p. 16) A lei representa avanços significativos, mas a realidade escolar ainda sofre com alguns problemas estruturais para a realização adequada e qualificada do ensino da música. Um desses problemas é que a formação para professores e professoras de música ainda é deficiente, com estruturas precárias e que não consegue atender a demanda pedagógica de um país tão e grande e complexo como o nosso. Nesse sentido, é importante perceber que a pedagogia, e mais especialmente nesse caso, o ensino da música, não está descolado do contexto sócio-histórico no qual está inserido. Os fundamentos educacionais democráticos percorrem um caminho que se orienta para a sociedade e, ao mesmo tempo, é orientado por ela, ou seja, a dimensão social do ensino da música está presente em suas bases e consequências, porque depende da movimentação política do seu tempo e porque modifica e transforma as próprias perspectivas de seu tempo ao formar cidadãos com outras possibilidades de construção simbólica, forjando, assim, um mundo mais amplo e variado culturalmente. 8 9 O ensino da música tem a função) de auxiliar crianças, adolescentes e jovens no processo de apropriação, transmissão e criação de práticas músico-culturais como parte da construção de sua cidadania. O objeto primeiro da educação musical é facilitar o acesso à multiplicidade de mani- festações musicais da nossa cultura, bem como possibilitar a compreensão de manifestações musicais de culturas mais distantes. Além disso, o traba- lho com música envolve a construção de identidades culturais de nossas crianças, adolescentes e jovens e o desenvolvimento de habilidades inter- pessoais. (HENTSCHKE, 2003, p. 179) Figura 1 – ABOYA, M. “Songs of Freedom” Fonte: photographerswithoutborders.org O que Dizem os Parâmetros Curriculares Nacionais em Arte? Lançados pelo Governo Federal dez anos antes da Lei de obrigatoriedade do ensino da música, os Parâmetros Curriculares em Arte têm os seguintes objetivos: • Compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito; • Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situ- ações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas; 9 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música • Conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, mate- riais e culturais como meio para construir progressivamente a noção de identi- dade nacional e pessoal e o sentimento de pertinência ao país; • Conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e sociais; • Perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente, identi- ficando seus elementos e as interações entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente; • Desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conheci- mento e no exercício da cidadania; • Conhecer o próprio corpo e dele cuidar, valorizando e adotando hábitos saudá- veis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida e agindo com respon- sabilidade em relação à sua saúde e à saúde coletiva; • Utilizar as diferentes linguagens – verbal, musical, matemática, gráfica, plástica e corporal – como meio para produzir, expressar e comunicar suas ideias, in- terpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicação; • Saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos; • Questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação (BRASIL, 1998b). Ainda, segundo os Parâmetros Curriculares em Arte, há três eixos metodológicos a serem explorados: • Produção: centrada na experimentação, criação, realização de registros e acompanhamentos na execução de músicas, tendo como produtos musicais a interpretação, a improvisação e a composição; • Apreciação: percepção tanto dos sons e silêncios quanto das estruturas e orga- nizações musicais, buscando desenvolver, por meio do prazer da escuta sensível, a capacidade de observação, análise e reconhecimento; • Reflexão: sobre questões referentes à organização, criação, produtos e produ- tores musicais, à relação entre arte e vida. Podemos citar, aqui, a abordagem triangular do ensino de arte já estudada nas unidades passadas. Os três eixos citados acima estão baseados na Abordagem Trian- gular apresentada por Ana Mae Barbosa em várias de suas publicações. Inicialmente, essa proposta estava ligada mais às artes visuais, mas há pesquisas e publicações que investigam o ler (apreciação), fazer (produção) e contextualizar (reflexão) em várias linguagens. 10 11 O Fazer Musical O fazer musical é uma forma de comunicação e expressão que acontece por meioda improvisação, da composição e da interpretação. I mprovisar é criar ins- tantaneamente, orientando-se por alguns critérios pré-definidos, mas com grande margem a realizações aleatórias, não determinadas. Compor é criar a partir de estruturas fixas e determinadas e interpretar é executar uma composição contando com a participação expressiva do intérprete. [...] é a própria prática musical, manifestada em atividades de compo- sição, execução e apreciação, que irá promover, de forma orgânica, o desenvolvimento criativo, em um processo contínuo em que a avaliação de si mesmo e dos outros desempenha um papel fundamental na apren- dizagem. (BEINEKE; LEAL, 2001) A Apreciação Musical A apreciação musical refere-se à audição e interação com músicas diversas. A escuta musical deve estar integrada, de maneira intencional, às atividades coti- dianas dos bebês e das crianças pequenas. É aconselhável a organização de um pequeno repertório que, durante algum tempo, deverá ser apresentado para que estabeleçam relações com o que escutam. Tal repertório pode contar com obras da música erudita, da música popular, do cancioneiro infantil, da música regional etc. O trabalho com a apreciação musical deverá apresentar obras que despertem o desejo de ouvir e interagir, pois, para essas crianças, ouvir é, também, movimentar-se, já que as crianças percebem e expressam-se globalmente. A apreciação é uma das atividades mais importantes para o desenvolvi- mento musical porque desenvolve a audição crítica e estética do aluno, esta (a apreciação) não pode mais ser tratada como uma mera audição descompromissada. (MOREIRA, 2010, p. 290) A Música e o Brincar A música, na educação infantil, mantém forte ligação com o brincar. Em algumas línguas, como no inglês (to play) e no francês (jouer), por exemplo, usa-se o mesmo verbo para indicar tanto as ações de brincar quanto as de tocar música. Em todas as culturas, as crianças brincam com a música. Jogos e brinquedos musicais são transmitidos por tradição oral, persistindo nas sociedades urbanas nas quais a força da cultura de massas é muito intensa, pois são fontes de vivências e desenvolvimento expressivo musical. Envolvendo o gesto, o movimento, o canto, a dança e o faz-de- -conta, esses jogos e brincadeiras são expressões da infância. 11 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música Brincar de roda, ciranda, pular corda, amarelinha etc. são maneiras de estabelecer contato consigo próprio e com o outro, de se sentir único e, ao mesmo tempo, parte de um grupo, e de trabalhar com as estruturas e formas musicais que se apresentam em cada canção e em cada brinquedo. Os jogos e brinquedos musicais da cultura infantil incluem os acalantos (cantigas de ninar); as parlendas (os brincos, as mnemônicas); as rondas (canções de roda); as adi- vinhas; os contos; os romances etc. Os jogos sonoro/musicais possibilitam a vivência de questões relacionadas ao som (e suas características), ao silêncio e à música. É muito importante brincar, dançar e cantar com as crianças, levando em conta suas necessidades de contato corporal vínculo afetivos. Deve-se cuidar para que os jogos e brinquedos não estimulem a imitação gestual mecânica e estereotipada que, muitas vezes, se apresenta como modelo às crianças. (BRASIL, 1998a, p. 59) Figura 2 – PORTINARI, C. “Quarteto de Músicos” Fonte: musicabrasilis.org Fundamentos no Ensino de Música Desvelar, ampliar e propor desafios estéticos são como poção mágica, pó de pirlimpimpim, na possível experiência lúdica e cognitiva, sensível e afetiva do poetizar, do fruir e do conhecer arte. (MARTINS; PICOSQUE; GUERRA, 2010) O modo de ser da linguagem musical tem como matérias-primas sons e silêncios articulados em pensamentos musicais. Martins, Picosque e Guerra (2010) indicam que o aprendiz de arte envolva-se com: • O pensamento musical, imaginando, relacionando e organizando sons e silêncios; • A utilização de recursos e materiais; 12 13 • A percepção dos parâmetros do som (altura, duração, intensidade e timbre); • A criação e percepção de composições e a improvisação; • A e xploração da voz, do corpo, de instrumentos musicais e objetos sonoros; • O conhecimento e a exploração da estrutura da linguagem sonora (sinais e signos, modos, melodias, ritmos etc.). Muitos educadores têm realizado estudos para encontrar caminhos no ensino de música. Podemos ampliar nosso trabalho e saberes metodológicos, conhecendo e experimentando algumas possibilidades. O autor Raymond Murray Schafer, que nasceu em 1933, em Sárnia, Ontário, Canadá, é compositor, pedagogo musical, escritor, educador e investigador do am- biente sonoro. Schafer tem a preocupação não apenas com o universo da música, mas com o universo sonoro em geral; explora a ideia de que podemos usar tanto instrumentos como objetos para a musicalização. Mas o foco principal de sua pro- posta é acordar o ouvido, tornando a habilidade da escuta sensível e pensante. Schafer tenta apresentar uma proposta pedagógica que lide com os valores tradi- cionais de maneira mais despojada e que o processo educativo seja uma oportunidade de aprendizagem para professores e alunos. Esse autor fez pesquisas e desenvolveu propostas metodológicas sobre novas formas de ensinar música. P ara ele, o estudo da música deve priorizar a criatividade e a experimentação sonora. Faz críticas e questiona a forma tradicional de ensinar música (formação de muitos músicos eru- ditos). Em suas críticas e opinião, diz que esses métodos são técnicos, mecânicos e exaustivos demais para as crianças. Realça a ideia de que não adianta as crianças aprenderem a ler partituras se não aprenderem, antes, a ouvir o universo sonoro a sua volta e a apreciar músicas de qualidade e não apenas as disponibilizadas pela cultura de massa. Coloca que a sala de aula é uma comunidade de aprendizes e ouvintes conscientes dos sons e da música, dizendo que “a aula de música é sempre uma sociedade em microcosmo” (SCHAFER, 1991, p. 279). Schafer diz “música de qualidade”, porque considera a música de massa (consumo de massa) como acontecimento social e não musical. F az críticas à relação entre arte e negócios para ganho sem a preocupação com a qualidade das produções artísticas. O autor também coloca que a música, assim como outras linguagens, tem como base a criação, a interpretação e não pode ser ensinada e nem aprendida com métodos de memorização e massificação. Conhecer, ouvir, sentir a música são atitudes a serem exploradas por ouvidos conscientes e pensantes. S chafer chama a nossa atenção para dizer que não podemos mais ensinar com base na ideia de acumulação de saberes, como se as crianças tivessem cabeças vazias. O autor expressa a preocupação, ao dizer que estamos vivendo a era da informação, um novo tempo para educação, com o foco da educação, que deve ser a descoberta e não a instrução fria e descontextualizada. O autor apresenta várias ideias de aulas, em suas publicações, que podem nutrir o repertório cultural e didático dos educadores que querem se aventurar a ensinar 13 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música música. Ele propõe a coleta sensorial, estudos e percepções sonoras e musicais. Propõe o estudo do ambiente sonoro, e explica o conceito de paisagem sonora e ecologia sonora. Há uma preocupação com o ruído, que prejudica a audição e deixa os nossos ouvidos anestesiados, uma vez que, para conviver com os sons do dia a dia, aprendemos a ignorar muitos desses sons. Apreciar a música e aprender a deixar esse ouvido em estado de estesia, ou seja, aberto ao sentir, é um dos desafios da musicalização nas escolas. Schafer também coloca que as linguagens artísticas não devem ser ensinadas separadamente, pois isso provoca uma fragmentação da expressividade da criança. Assim, desenho, pintura, escultura, música, dança e outras formas de expressão artística devem ser exploradas juntas, principalmente o desenho e a música. Para a criança de cinco anos, arte é vida e vidaé arte. A experiência, para ela, é um fluido caleidoscópio e sinestésico. Observem crianças brincando e tentem delimitar suas atividades pelas categorias das formas de arte conhecidas. Impossível. Porém, assim que essas crianças entram na escola, arte torna-se arte e vida torna-se vida. Aí elas vão descobris que “música” é algo que acontece durante uma pequena porção de tempo às quintas-feiras pela manhã enquanto às sextas-feiras à tarde há outra pequena porção chamada “pintura”. (SCHAFER, 1991, p. 290) Figura 3 – MILLER, W. Fonte: artcenter.edu Outra ideia interessante de que Schafer trata em seus estudos é a questão da caixa de música. Na proposta da caixa de música de Schafer, há muitas possibilidades de materiais. O autor fez muitas pesquisas e propõe a construção de kits que podem ser explorados nas aulas de música. Segundo sua teoria, as crianças precisam ter liberdade para ter criatividade. O desejo é motivar e desencadear a curiosidade dos alunos. Não se trata de ensinar exercícios esquematizados e repetitivos em que o professor explora o objeto e a criança reproduz, mas sim de deixar a criança explorar 14 15 o objeto para perceber suas qualidades sonoras e expressivas A ideia de Schafer é que o professor crie projetos com esses materiais. Podemos contar histórias e ir sonorizando a narrativa com esses materiais; podemos, também, estabelecer jogos musicais e explorar as qualidades sonoras como grave, agudo, som alto, baixo, leve ou intenso, entre outras possibilidades. C om base nas ideias de Schafer e sua caixa de música, podemos criar, nas escolas, uma proposta para a musicateca. A percepção sonora pode ser aguçada por meio da experimentação de materiais. Na musicateca, podem existir desde materiais simples aos mais inusitados, porém, também é possível ter instrumentos musicais presentes. A dinâmica de uma musicateca é parecida com a da brinquedoteca, mas, neste caso, os materiais são instrumentos e objetos sonoros. A ideia é que os professores de uma escola trabalhem na construção de instrumentos ou mesmo que a escola adquira alguns instrumentos industrializados. Além disso, podem levar para a musi- cateca também materiais não estruturados, como objetos do cotidiano que podem produzir sons, como, por exemplo, duas tampas de panela, potes de plásticos com pedras dentro, colheres de pau e outros materiais. A ssim, os materiais sonoros e ins- trumentos podem ser confeccionados, escolhidos e explorados ao longo dos vários anos da educação básica. Dessa forma, os objetos do cotidiano, materiais existentes na escola e alguns instrumentos mais acessíveis poderão fazer parte da musicateca. Ela pode ser um espaço especial na sala de aula e pode ser organizada em uma caixa grande, uma estante, um armário ou em um local específico se a escola tiver dispo- nibilidade. A linguagem da música é explorada em vários momentos da educação bá- sica e a musicateca pode ser um bom recurso para essas situações de aprendizagem. Instrumentos musicais podem ser confeccionados pelos alunos ou adquiridos pela escola, como exemplo, bandinhas rítmicas, apitos variados, pandeiros, violão e outros. Objetos sonoros e materiais diversos que produzam sons, como molas de cami- nhão, papéis com diferentes texturas (ondulados, por exemplo), metais, materiais plásticos e uma infinidade de possibilidades. É importante, na musicateca, haver também um aparelho que toque CD ou algo parecido para reprodução de sons e músicas, acervos de músicas variadas e imagens de instrumentos e músicos, entre outras possibilidades. Sobre os Objetos Sonoros Um objeto sonoro é um material com som perceptível; tudo o que é ouvido pelo simples fato de ouvir. O conceito de objeto sonoro na sala de aula foi estudado por Schafer e outros autores. Ele, em particular, diz que um objeto pode ser explorado em suas qualidades, como texturas, alturas, intensidade. O objeto sonoro, quando explorado pelo aluno, tem a possibilidade de desencadear a expressão e a criação. A ideia é explorar, em projetos de educação musical, objetos sonoros na sala de aula, usando os mais inusitados objetos. Veja um exemplo: a professora Cyntia Bayma, 15 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música em uma escola pública municipal de São Paulo, realizou um projeto com o nome “batuque na cozinha”, com foco na percussão, usando apenas coisas que as crianças encontram na cozinha. Colheres de pau, panelas, tampas, talheres e outros tantos objetos foram usados para criar sons e ritmos. Alguns conceitos importantes: • Altura: chama-se altura à propriedade que os sons têm de ser mais graves ou mais agudos. A altura é medida pela frequência do som, isto é, pelo número de vibrações por segundo: a uma frequência baixa, correspondem sons graves; a uma frequência alta, correspondem sons agudos. Como em vários outros aspe- tos da música, a percepção das alturas é relativa. Isso significa que a maioria das pessoas percebe as alturas em relação a outras notas (numa melodia ou num acorde). Algumas pessoas têm a capacidade de perceber cada frequência de modo absoluto. Diz-se que estas pessoas têm ouvido absoluto. Embora a altura esteja intimamente relacionada com a frequência, é mais comum, em música, utilizar os nomes das notas (LOPES-GRAÇA, F. 1984, p. 20); • Timbre: chama-se qualidade de som ou timbre a propriedade que faz distinguir entre si os sons produzidos por agentes sonoros diferentes ou de diferente cons- tituição. Um som com a mesma frequência tem uma qualidade diferente con- soante for produzido pela vibração da coluna de ar contida num tubo, por uma corda, ou por uma membrana tensa. Qualidade ou característica do som que nos permite identificar e distinguir cada fonte sonora (LOPES-GRAÇA, 1984, p. 21 e p. 22); • Ritmo: (no amplo sentido do termo) abrange tudo o que diga respeito ao aspecto temporal da música, à ordem no tempo. As relações de duração dos sons entre si constituem a essência do ritmo musical, na sua forma mais elementar. [...] Na notação musical tradicional, as durações relativas dos sons são repre- sentadas por figuras musicais e as durações relativas dos silêncios musicais, por pausas. A proporção entre essas figuras e pausas é geométrica. As designações que tanto as figuras musicais como as pausas recebem são: semibreve, mínima, semínima, colcheia, semicolcheia, fusa e semifusa (KENNEDY, 1994, p. 599; LOPES-GRAÇA, p. 29 e 107); • Intervalo: chama-se intervalo diferença de entonação de dois sons, ou seja, a relação existente entre o número das suas respetivas vibrações. Existem inter- valos conjuntos, por se formarem entre dois graus contíguos da escala musical (por exemplo, dó-ré, ré-mi etc.) e intervalos disjuntos, os quais se formam entre graus da escala que não são contíguos (por exemplo, dó-fá, lá-dó etc.) (LOPES- -GRAÇA, 1984, p. 47); • Melodia: os sons musicais podem ser considerados ou na sua sucessão ou na sua simultaneidade. Na sua sucessão, formam a essência da melodia; na sua simul- taneidade, a da harmonia. A melodia pode, pois, definir-se como uma orde- nação dos sons no tempo, a da harmonia como a sua fusão no espaço. A base da melodia é, por conseguinte, o intervalo melódico; a da harmonia o intervalo harmónico. A harmonia, como disciplina musical, é o estudo da formação e emprego dos acordes (LOPES-GRAÇA, 1984, p. 83-85). 16 17 MULLER, Wayne. Disponível em: https://bit.ly/30O1nsA Sobre a Construção de Instrumentos Musicais Cada instrumento tem suas características e podemos constituir alguns explorando materialidades (madeira, metal, plástico...). Para construir instrumento, você pode uti- lizar objetos do cotidiano da criança, como potinhos de plástico ou latinhas de refri- gerante, e enchê-los com diferentes materiais, como pedrinhas, botões, milho, arroz, entre outros. Com esse material, você poderá trabalhar noções de ritmo e as diferenças de sons (graves, médios e agudos). É importante estimular a pesquisa de possibilidades paraproduzir sons em vez de ensinar um único modo de fazer ou tocar um instrumento ou objeto. Podemos criar vários instrumentos musicais com as crianças. Proposições em Educação Musical “Toda ação artística é um ato educativo e o sujeito a que se destina essa educação é o cidadão, seja ele criança, jovem ou adulto” (FONTERRADA, 2008, p. 128). Figura 4 – BRAQUE, G. “Guitarra e folha música” Fonte: wikiart.org Na busca por conhecer propostas metodológicas no ensino de música, podemos investigar vários autores. Apresentamos, acima, algumas ideias de Murray Schafer e, agora, indicamos o estudo de mais um importante autor que pesquisou e publicou ideias e ações educativas que podem ampliar seus saberes sobre o tema e sobre o ensino de música na escola na educação básica. 17 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música Emile Jaques-Dalcroze foi um educador musical suíço que viveu entre os anos de 1865 a 1950. Como professor do Conservatório de Genebra, em seus estudos, teve como foco as relações entre educação musical e movimento corporal. Esse trabalho começou pela observação de que os alunos tinham dificuldade de imaginar o som dos acordes, que precisavam conhecer melhor como os seus corpos se manifestavam ao cantar, por exemplo. Percebeu que ensinar questões teóricas sobre a música antes de explorar o corpo dos alunos como potência musical e rítmica não era o caminho mais adequado. O enfoque de ensino musical na época era centralizar o aprendizado na mente, sem fazer ligações entre atividade cerebral e as sensações auditivas e sem explorar as percepções corporais. Dessa forma, ele foi observando como os alunos reagiam corporalmente à percepção da música e, por meio desse estudo, desenvol- veu métodos explorando as habilidades e competências tanto em ouvir como em se expressar corporalmente. No meu modo de ver, a educação musical deveria basear-se por completo na audição, ou em todo caso na percepção do fenômeno musical – median- te o ouvido que se acostuma a captar as relações entre notas, tonalidades e os acordes e o corpo inteiro, por meio de exercícios especiais, iniciando- -se na apreciação da rítmica, a [sic; da] dinâmica e os [sic; dos] coloridos agógicos da música. (DALCROZE, 1926 apud RODRIGUES, [s.d.], p. 2) Junto a suas propostas, vinha uma preocupação de levar a música para todos, tendo consciência de que a música tem influência sobre a sociedade, e a escola teria forte presença nesse trabalho. Para Dalcroze, a arte tinha o poder de suscitar, nos indivíduos, a expressão de um sentimento comum, e a intenção dele era promover a união dos indivíduos, já que ele estava vivendo um momento na história em que a população estava crescendo nos centros urbanos e a ideologia progressista do gover- no não iria conduzir o povo corretamente. Os artistas, então, deveriam liderar essa educação musical e ter consciência de sua importância na sociedade. O sistema de educação musical de Dalcroze, o qual ele mesmo dominou de “Rythmique” (rítmica), utiliza o movimento para desenvolver a fruição, conscienti- zação e expressão musical. A metodologia com a qual Dalcroze trabalhava explorava os elementos constituintes da música e seus aspectos expressivos em um só tempo. Além de trabalhar a escuta ativa, voz cantada, o movimento corporal e o uso do espaço, ele também via, nessas práticas de exercícios, a música e a expressão corporal como uma grande ferramenta para trabalhar os aspectos psicomotores, como esquema corporal, sequencialidade, consciência corpórea, espaço-tempo, tônus, entre vários aspectos im- portantes para o desenvolvimento psicológico e cognitivo de qualquer ser humano, esteja ele em qualquer idade, porém, com maior importância na fase infantil. Todos os exercícios da “rítmica” têm por objetivo reforçar a faculdade de concentrar-se, de habituar o corpo a manter-se, por assim dizer, sob pres- são esperando as ordens da zona superior, de fazer penetrar o consciente no inconsciente, e de aumentar a faculdade inconsciente de todo o contri- buto de uma cultura especial, que tem por resultado o respeito a ela. Além disso, esses exercícios tendem a criar hábitos motrizes mais numerosos e novos reflexos para obter-se com o mínimo esforço o máximo efeito, 18 19 portanto a tranquilizar o espírito, a revigorar a vontade e a estabelecer a ordem e a clareza no organismo. (DALCROZE, 1925, p. 93) Dalcroze incentivou movimentos naturais, como andar, correr, saltar, arrastar-se, deslocar-se em diferentes direções, utilizando diferentes saltos, livremente, ou seguindo um determinado ritmo. Alguns exercícios propostos são: bater palma nos tempos rít- micos acentuados; interromper ou recomeçar subitamente um movimento; expressar com um gesto as características de um som ou trecho de música; criar um movimento expressivo que represente uma determinada frase musical. Esses exercícios preveem a utilização do espaço, a audição interna, a rápida reação corporal e os estímulos sonoros. E le também apoiava a ideia de que o canto coral é uma grande ferramenta para trabalhar a música em conjunto, apoiando a ideia de música para todos. O sistema Dalcroze parte do ser humano e do movimento corporal está- tico ou em deslocamento para chegar à compreensão, fruição, conscien- tização e expressão musicais. (FONTERRADA, 2008, p. 132-133) A metodologia de Dalcroze baseia-se na vivência musical através do movimento corporal. O som é uma vibração, ou seja, um movimento, que, por sua vez, pode gerar outro movimento. Isso está presente em nosso cotidiano, por exemplo: quando escutamos uma música que nos empolga, balançamos o corpo, mesmo que seja o bater do pé na pulsação da música; ao ouvirmos uma música, seja clássica, popular ou outro de gênero, ela pode provocar reações físicas no corpo, na nossa expressão facial, fazendo-nos mover de modo mais tímido com as mãos, pés ou contaminando todo nosso corpo com ritmos. Os músicos também mostram as reações corporais da música ao executarem uma peça musical seja por meio de instrumentos ou pela voz. Segundo esse autor, os melhores intérpretes musicais são os que deixam a música transparecer no corpo inteiro, emitindo todo seu sentimento pessoal da peça. O envolvimento entre expressão corporal e música dá à criança a oportunidade de desenvolver, por meio de vivências, habilidades importantes no desenvolvimento humano, como, por exemplo, a psicomotricidade e a própria expressão corporal. Além disso, desenvolve também conceitos matemáticos, presentes na subdivisão do tempo, e de física, como, por exemplo, ao empregar a força necessária para fazer o pé bater no chão em uma frequência constante. Trabalha também a dicção, pois o aparelho fonador está dentro da expressão corporal, entre vários outros aspectos. E ssa metodologia tem como base a rítmica, o solfejo e a improvisação. A rítmica é aliada ao movimento, ou seja, reproduzir ritmos com o corpo. O solfejo é traba- lhado junto à expressão corporal, na ideia de ouvir e repetir de várias maneiras sons e ritmos. Vamos tomar como exemplo uma cantiga de roda: ela deve ser cantada, falada (com entonação vocal); pode-se cantar com os pés ou com as mãos (repro- duzir o ritmo da melodia percutindo), contribuindo para a memorização de sons; os exercícios podem evoluir e se transformar em polirritmias com percussão corporal e canto. Mas, na primeira infância, é suficiente a percussão da melodia e a da pulsação separadamente, o que não impede o professor de observar as reações da turma e ir propondo exercícios cada vez mais complexos se achar positivas as respostas dadas 19 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música pelas crianças, principalmente nas etapas seguintes do desenvolvimento dos alunos. A improvisação também é trabalhada com a expressão corporal, mas, agora, com a criação de cantos, ritmos e timbres, ou seja, criando sons. Nesse momento, não é necessário que aconteça uma busca pela perfeição de técnica vocal nem pela per- formance artística musical, masbuscar o desempenho do aluno e o envolvimento com as atividades. Os alunos podem se expressar por meio da voz e do corpo como quiserem, porém, é importante que o educador tenha atenção para a saúde vocal da criança; gritos demais podem machucar partes do aparelho fonador, o que ocasiona- rá um problema de saúde. As crianças podem perceber as potencialidades e também os limites de seu corpo, como, por exemplo, perceber a altura e intensidade da sua voz, a capacidade de emitir sons por determinado tempo, as diferenças entre a sua voz e a de outras pessoas. É interessante observar como eles sentem esses aspectos. Na mediação dos exercícios para esse tipo de percepção, os professores podem pro- vocar momentos de conversas por meio de questionamentos, como, por exemplo: • Qual é o seu tipo de voz (timbre e altura)? • É diferente da voz de seus amigos e pais? (timbre e altura); • Como se dá essa diferença? (timbre e altura); • Quando vocês gritam muito alto e por muito tempo, há reação de incomodo ou dor nas cordas vocais? (intensidade); • Onde estão suas cordas vocais? (consciência corpórea – quando trabalhar com crianças pequenas, pedir que coloquem a mão na região das cordas vocais para identificarem o local da sensibilidade); • Ao entoar uma nota musical, vocês conseguem fazer isso por quanto tempo? (duração do som e consciência corpórea); • Vamos tentar cantar em duas intensidades? Mais forte e mais fraco? O que vocês perceberam? (intensidade). Essas são apenas algumas possibilidades de perguntas e diálogo com as crianças. O professor pode estar atento à conversa e levantar mais questionamentos a partir do que elas querem saber ou sentem no uso da voz. Esse tipo de perguntas em uma roda de conversa e alguns exercícios simples, como entoar notas musicais ou sons, e perceber como as crianças sentem a reação do seu próprio corpo podem ajudar a lidar melhor com próprio aparelho fonador, estabelecendo relações entre anatomia do seu corpo e a arte de cantar. Assim, também, elas podem perceber que preci- samos cuidar e sentir o nosso corpo. Isso vale também para que o professor reflita sobre a sua saúde vocal. Com base no sistema Dalcroze, podemos pensar em alguns exercícios dessa meto- dologia. Para isso, é importante que o educador esteja atento ao comportamento e à participação dos alunos: • Como aprendem ritmo? • Como percebem as relações de sons e movimentos? 20 21 • Como sentem seus corpos como material expressivo para a música no uso da voz e gestos? • Como percebem os parâmetros sonoros como timbre, altura, duração e intensidade? • Os alunos gostam desse tipo de exercício? As questões acima são apenas exemplos. Outros aspectos podem ser observados pelo educador, que poderá dar outros encaminhamentos. É importante que os edu- cadores investiguem as diferentes propostas metodológicas e realizem exercícios para estabelecer diálogos entre prática corporal, uso da musicateca e fundamentos teóricos. A proposta é pensar como podemos usar os materiais criados para a musi- cateca em exercícios de musicalização com os alunos. A música e seu ensino são para todos. As metodologias dos professores devem: • Garantir educação musical dentro de uma concepção contemporânea; • Ter criatividade como foco; • Incentivar a apreciação (audição) sensível e consciente e respeitar o processo de aprender de cada um; • Valorizar o patrimônio cultural (musical) de qualidade; • Ensinar a ouvir e a fazer música, respeitando leituras de mundo e poéticas pessoais. Diante dessas propostas, podemos dizer que a concepção atual de ensino de música ressalta que o processo de aprendizagem deve ser democrático e integrali- zado, garantindo que todos possam participar e aprender música. Figura 5 – MULLER, W. Fonte: uscnpm.org 21 UNIDADE As Linguagens Artísticas: Música Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites Música na Educação Básica Revista: Música na Educação Básica. https://bit.ly/2zGijWR Vídeos Escola, Música e Mediação Cultural https://youtu.be/xerCQzwk41I “O Som e o Sentido”, de José Miguel Wisnik https://youtu.be/V7wqsPLTXxk Palestra – Saberes Pedagógico Musicais Necessários à Educação Musical do Século XXI https://youtu.be/AmnnxUJ7uDo Leitura Educação Antirracista e Educação Musical: Interações e Perspectivas para a Educação Básica https://bit.ly/3hCogp6 Breve Retrospectiva Histórica e Desafios do Ensino de Música na Educação Básica Brasileira https://bit.ly/3fA6tgo 22 23 Referências ALMEIDA, B. de; LEVY, G. Brincadeiras e brincadeirinhas: uma experiência de formação de professores pelo Brasil. Música na Educação Básica. Brasilia: 2013. BARBOSA, A. M. 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