Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Estruturação e formação da personalidade Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Definir personalidade e sua estruturação. � Descrever diferentes traços de personalidade. � Identificar as contribuições de Gordon Allport, Hans Eysenck e Raymond Cattell para a teoria dos traços de personalidade. Introdução O homem, com suas percepções, emoções e pensamentos sobre o mundo e sobre os seres humanos, é um tema que ocupa a humanidade pelo menos desde os grandes filósofos gregos. Quando o homem não aceita mais as explicações míticas e passa a questionar a origem da vida, o pensamento mítico dá lugar ao pensamento racional. É por meio da racionalidade, portanto, que o homem busca explicar a personalidade atualmente. Contudo, como você deve imaginar, a tarefa de apresentar uma definição única para a personalidade é praticamente inviável e inadequada, tendo em vista a abrangência, o foco de estudos e os métodos de pesquisa utilizados. Assim, você deve notar que a defini- ção da personalidade dependerá totalmente dos referenciais teóricos considerados. Neste capítulo, você vai estudar as abordagens que consideram que a personalidade é motivada por forças e conflitos internos pouco conscientes e controláveis, que são as teorias psicodinâmicas. O pio- neiro dessa corrente foi Sigmund Freud, posteriormente seguido por Carl Jung, Karen Horney e Alfred Adler. Você também vai conhecer a teoria dos cinco fatores e as contribuições de Gordon Allport, Hans Eysenck e Raymond Cattell para o entendimento da teoria dos traços de personalidade. Definição de personalidade e sua estruturação Para estudar a personalidade, você deve conhecer as diversas correntes psicoló- gicas que se dedicaram a ela. Você vai ver que não existe uma definição única e consolidada, considerando que os métodos de pesquisas e teorias desenvolvidas são distintos. Até o século XIX, todas as ciências humanas ficaram vinculadas ao destino da filosofia e da antropologia filosófica. Com o surgimento da psicologia científica, apareceram duas correntes significativas: a clínica e a experimental (ambas de extrema influência no estudo da personalidade humana). A personalidade é amplamente estudada na ciência da psicologia. Aqui, você vai iniciar o seu estudo pela abordagem psicodinâmica, que considera que a personalidade é motivada por forças e conflitos internos pouco conscientes e controláveis. O pioneiro dessa abordagem foi Sigmund Freud e, posteriormente, se destacaram estudiosos como Carl Jung, Karen Horney e Alfred Adler. Para Hall, Lindzey e Campbell (2000), embora a diversidade no uso co- mum da palavra personalidade possa parecer considerável, ela é superada pela variedade de significados atribuídos ao termo pelos psicólogos. Em 1937, Allport extraiu quase 50 definições diferentes sobre a personalidade, classificando-as em amplas categorias. Hall, Lindzey e Campbell (2000) consideram uma difícil tarefa apresentar uma definição única, geral, tendo em vista a abrangência, o foco de estudos e os métodos de pesquisa utilizados. Assim, de modo geral, algumas definições da personalidade são focadas em sua função integrativa e organizadora. Nesse sentido, ela atua como uma força ativa dentro do indivíduo e consiste nos esforços de ajustamento variados e específicos para cada pessoa. Ainda, a personalidade pode ser relacionada aos aspectos individuais do comportamento. De outro modo, há teóricos que entendem que a personalidade se refere àquela parte do indivíduo mais representativa, ou seja, a que mostra como ele realmente é. Ou seja, qualquer que seja a definição de personalidade escolhida, estará embasada em um referencial teórico (HALL; LINDZEY; CAMPBELL, 2000). Teoria psicanalítica de Sigmund Freud Para Freud (1856–1939), grande parte do comportamento humano é influenciado pelo inconsciente (pulsões, desejos, demandas, necessidades), com uma parte consciente e outra subconsciente. Na sua segunda teoria do aparelho psíquico, Freud introduziu os conceitos de id, ego e superego para referir-se à estrutura da personalidade. É uma estrutura dinâmica que possui interação interna e externa, com forças e instintos que motivam o comportamento. Estruturação e formação da personalidade2 O id é a instância inconsciente, sendo o reservatório das energias psíqui- cas, em que se localizam as pulsões, os instintos, os desejos. São impulsos com uma torrente de energia ilimitada que exerce pressão contínua sobre a personalidade. Seu objetivo é a satisfação imediata para reduzir a tensão, pois é regido pelo princípio do prazer. Nesse sentido, a realidade impede essa descarga. O id está presente desde o nascimento. A realidade é representada pelo ego. Ele tenta equilibrar as demandas do id com as exigências da realidade do mundo externo e as ordens do superego. É a instância que busca manter a segurança do indivíduo e ajuda na integração com a sociedade. O ego é regido pelo princípio da realidade, sendo um regulador com as funções básicas de percepção, memória, sentimento e pensamento. O ego representa a personalidade, é o “eu” do indivíduo, que toma decisões e controla ações considerando as condições objetivas da realidade (sociedade). Ele também se desenvolve desde o nascimento. Durante o desenvolvimento da infância, outra instância da personalidade se forma: o superego. Ele surge com a internalização das proibições, dos limites e da autoridade imposta pelos pais e professores — em conformidade com a realidade. Quando essas exigências sociais e culturais são internalizadas, ninguém mais necessita “dizer não”; a proibição já está dentro do indivíduo, o que gera muitos conflitos internos (FELDMAN, 2015). Para Bock, Furtado e Teixeira (2001, p. 101): [...] o ego e, posteriormente, o superego são diferenciações do id, o que demonstra uma interdependência entre estes três sistemas, retirando a ideia de sistemas separados. O id refere-se ao inconsciente, mas o ego e o superego têm, também, aspectos ou ‘partes’ inconscientes. Essas instâncias comportam as experiências pessoais de cada um e expressam o estágio de desenvolvimento atual. Em decorrência disso, o psicólogo investiga a história pessoal em relação à história dos familiares e dos demais grupos sociais, que também se inscrevem nos valores e crenças da sociedade. Para Freud, a personalidade se desenvolve por meio de cinco estágios: oral, anal, fálico, latência e genital. Durante esses estágios, as crianças enfrentam 3Estruturação e formação da personalidade conflitos originados pelas demandas da sociedade e os próprios impulsos sexuais (nessas fases, a sexualidade é relacionada com a experiência do prazer; e não do prazer das relações sexuais da fase genital). Esses conflitos, quando não solucionados em determinada fase, implicam uma fixação no estágio, que persiste até a vida adulta. O entendimento e o conhecimento dessa estrutura, com as experiências e dificuldades desses estágios, pode indicar características específicas na personalidade adulta. A dinâmica que ocorre no desenvolvimento da personalidade e os conflitos enfrentados geram ansiedade. Para dar conta desse desconforto e desprazer, Freud atribuiu esse processo aos mecanismos de defesa operados pelo ego, que exclui da consciência os conteúdos indesejáveis, protegendo o aparelho psíquico. O ego movimenta esses recursos para suprimir ou dissimular a per- cepção de perigo interno, com estratégias de defesa inconscientes para reduzir a ansiedade. Dessa forma, altera a percepção da realidade e encobre a fonte de ansiedade do próprio indivíduo. Os mecanismos utilizados são: repressão, regressão, deslocamento, racionalização, negação, projeção, sublimação e formação reativa, que podem ser utilizados de forma ampla e variada para a defesa da ansiedade. As pessoas utilizam esses mecanismos de defesa em algum grau e, quando eles se tornam excessivos, para esconder e recanalizar os impulsosinconcebíveis, podem gerar transtorno mental produzido pela ansiedade — Freud denominou isso de neurose (FELDMAN, 2015). A teoria de Freud foi refutada por psicólogos da época (1900) e ainda hoje sofre críticas por não ter sido comprovada cientificamente. Segundo Feldman (2015, p. 391), “[...] a ênfase de Freud no inconsciente foi parcialmente apoiada pela pesquisa atual sobre os sonhos e a memória implícita [...], sendo os avanços na neurociência compatíveis com alguns de seus argumentos”. Além disso, “[...] os psicólogos cognitivistas e sociais encontraram evidências crescentes de que os processos inconscientes nos ajudam a pensar sobre e avaliar nosso mundo, definir objetivos e escolher uma rota de ação” (FELDMAN, 2015, p. 391). Teoria analítica de Carl Jung Carl Jung (1875–1961), psiquiatra suíço, foi discípulo de Freud de 1907 a 1913. Ele foi um dos principais integrantes do movimento psicanalítico na sua fase inicial, momento em que foi o primeiro presidente da Associação Psicanalítica Internacional (International Psychoanalytical Association — IPA). Jung era especialista em “psicoses” e encantado pelo orientalismo. Em função da sua especialidade, iniciou com Freud e Bleurer um profundo estudo sobre a Estruturação e formação da personalidade4 esquizofrenia e sobre a questão do autoerotismo e do autismo. Jung encontrou na obra de Freud a confirmação de seus estudos sobre o subconsciente, as associações verbais e os complexos. Em 1912, publicou Metamorfoses da Alma e seus Símbolos, marcando um rompimento definitivo com Freud. O motivo do rompimento foi a controvérsia a respeito da teoria da libido. Jung tentou persuadir Freud para “dessexualizar” sua doutrina (nem que fosse para ser melhor acolhida). A partir de 1914, Jung e os junguianos se desligaram oficialmente da associação psicanalítica para se dedicar ao próprio movimento, que nunca teria a amplitude da psicanálise freudiana. Do movimento junguiano, surgiu a psicologia analítica, na qual se baseia o método de psicoterapia. Em 1919, Jung apresentou a noção de imago para definir uma forma preexistente do inconsciente que determina o psiquismo e fomenta um símbolo que surge nos sonhos, na arte e na religião. O estudioso apresentou, então, a definição dos três principais arquétipos: o animus (imagem do masculino), a anima (imagem do feminino) e o selbst (si mesmo) como o verdadeiro centro da personalidade (ROUDINESCO; PLON, 1998). Segundo Feldman (2015), o inconsciente coletivo jungiano pode ser com- preendido como um conjunto de ideias, imagens e símbolos comuns que as pessoas herdam de seus parentes e de toda a raça humana e seus ancestrais. Ele é compartilhado por todos e expresso no comportamento, igual em todas as culturas. Conforme Roudinesco e Plon (1998, p. 423): [...] os arquétipos constituem o inconsciente coletivo, base da psique, estrutura imutável, espécie de patrimônio simbólico próprio de toda a humanidade. Essa representação da psique é complementada por “tipos psicológicos”, isto é, características individuais articuladas em torno da alternância introversão/ extroversão, e por um processo de individuação, que conduz o ser humano à unidade de sua personalidade através de uma série de metamorfoses (os estádios freudianos). A criança emerge, assim, do inconsciente coletivo para ir até a individuação, assumindo a anima e o animus. Teoria de Karen Horney Karen Horney (1885–1952) orientou-se para o culturalismo, procurando fun- damentar a psicologia da mulher sobre uma identidade própria. Segundo Feldman (2015), ela é referida como a primeira psicóloga feminista. Com seus estudos, sugeriu “[...] que a personalidade se desenvolve no contexto das relações sociais e depende particularmente da relação entre os pais e o filho e do quanto as necessidades da criança são atendidas” (FELDMAN, 2015). 5Estruturação e formação da personalidade Horney entendia que as influências maiores na personalidade se dão por meio de ocorrências sociais na infância. Assim, a mente consciente tem um papel na personalidade humana, apresentando uma visão holística e humanista da psique individual, colocando ênfase nas diferenças culturais e sociais ao redor do mundo. Horney atribui o sentimento de inferioridade experimentado por algumas mulheres a fatores sociais. Essa autora: [...] é geralmente vista como pertencendo ao grupo dos chamados neo- freudianos, também referidos como escola cultural, pois foi uma das pri- meiras a enfatizar a importância dos fatores culturais na determinação da personalidade. Por exemplo, ela propôs que os rígidos papéis de gênero da sociedade para as mulheres levaram-nas a experimentar ambivalência quanto ao sucesso porque temem fazer inimigos se tiverem muito sucesso (FELDMAN, 2015, p. 392). Teoria de Alfred Adler Alfred Adler (1870–1937) também foi discípulo de Freud, de quem se distanciou por discordar da superestimação do fator sexual. Foi fundador da psicologia do desenvolvimento individual. Para ele, o ambiente social e a obsessão inces- sante do indivíduo em atingir metas preestabelecidas são os determinantes do comportamento humano, envolvendo a sede pelo poder e pela fama. Segundo Dainez e Smolka (2014, p. 1098): [...] na psicologia individual de Adler, cada pessoa é concebida como uma totalidade integrada dentro de um sistema social. A personalidade, então, corresponde a uma unidade e o seu estudo se orienta para a luta que ela re- aliza para se desenvolver e exprimir [...] os mais importantes determinantes da estrutura da vida da personalidade se originam nos primeiros tempos da infância [...] sendo que o propósito específico e o efeito particular da vida psíquica não se fundem sobre uma realidade objetiva, mas sobre a impressão subjetiva que o indivíduo teve dos acontecimentos da vida. Cada indivíduo se organiza em função de sua percepção subjetiva do mundo social. Como você viu, a personalidade e o comportamento são expressões do psiquismo humano que estão interligadas e são estudadas por diferentes perspectivas. Do ponto de vista teórico, o behaviorismo foi uma das primeiras escolas a estudar o comportamento como uma interação entre a ação do sujeito e o ambiente onde a sua ação acontece. Por conta do método e de coerência Estruturação e formação da personalidade6 doutrinária, a psicologia behaviorista desconsiderou o papel do imaginário na vida dos indivíduos, reduzindo o pensamento somente aos fenômenos sensório- -motrizes passíveis de observação — expurgando da psicologia científica o recurso à observação interna dos fatos da consciência. No entanto, a psicologia não podia prescindir do estudo da imaginação, do afeto, das emoções e dos sentimentos: eis a psicanálise. Hoje, existem outras perspectivas, como a cognitivista, que demonstra evidências crescen- tes de que os processos inconscientes ajudam os indivíduos a pensar sobre o mundo e avaliá-lo, definir objetivos e escolher uma rota de ação. Além disso, como você viu, os estudos da neurociência têm apoiado a existência do inconsciente pela pesquisa atual sobre os sonhos e a memória implícita (FELDMAN, 2015). Diferentes traços de personalidade O entendimento da personalidade por traços é tarefa dos psicólogos que a estudam com o objetivo de estabelecer um consenso na avaliação psicológica da personalidade. Segundo Feist, Feist e Roberts (2015, p. 253), “[...] um traço torna as pessoas únicas e contribui para a coerência de como elas se comportam em diferentes situações ao longo do tempo”. A partir da década de 1980, com as pesquisas e a teoria de Robert McCrae e Paul Costa, foram consensadas cinco dimensões principais da personalidade, que são: extroversão, amabilidade, conscienciosidade, neuroticismo e abertura à experiência (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015). Segundo Silva e Nakano (2011, p. 51), [...] a pesquisa da personalidade ganhou novo ímpeto e direção a partir do estabelecimento de um consenso acerca da sua estrutura, por meio do modelofatorial da personalidade baseado em cinco fatores. A importância desse modelo se embasa principalmente no fato de ter sido aplicado em diversas culturas e por meio de numerosas fontes de informação (incluindo autoa- valiação, avaliação por pares e avaliações clínicas), tendo demonstrado sua adequação nos diferentes usos. 7Estruturação e formação da personalidade A teoria dos cinco fatores é um dos modelos mais utilizados para descrever a perso- nalidade dentro da teoria dos traços, principalmente a personalidade adulta do ponto de vista psicométrico. Esse ponto de vista é adotado pelos principais questionários e inventários de avaliação de personalidade utilizados: o 16PF, o MMPI, a escala de necessidades de Murray, o Califórnia Q-Set, as escalas de Comrey, entre outros. Os traços podem ser utilizados para sintetizar, prognosticar e elucidar a conduta de uma pessoa, indicando algum tipo de processo interno que origine o comportamento. Os traços de personalidade representam características psicológicas das pessoas na sua forma de pensar, sentir e atuar. Eles podem ser alterados em função das interações das pessoas com seu meio social, como também pela motivação, pelo afeto e pelos aspectos comportamentais e atitudinais. No Brasil, os cinco fatores básicos têm sido chamados de extroversão, neuroticismo, socialização, realização e abertura à experiência. O traço de extroversão é definido como a quantidade e a intensidade das interações interpessoais favoritas, o nível de atividade, a necessidade de estimulação e a capacidade de alegrar-se. Por socialização, entende-se a perspectiva interpes- soal no que diz respeito aos tipos de interações que uma pessoa demonstra. A realização é um traço que retrata o grau de organização, perseverança, controle e motivação para atingir suas metas. O neuroticismo e a abertura à experiência referem-se ao nível permanente de ajustamento emocional e instabilidade e ao reconhecimento da relevância de ter novas experiências (SILVA; NAKANO, 2011). Você pode ver os fatores no Quadro 1, a seguir. Extroversão Escores altos Escores baixos Afetivo Reservado Agregador Solitário Falante Quieto Adora diversão Sóbrio Ativo Passivo Apaixonado Insensível Quadro 1. Modelo da personalidade dos cinco fatores de Costa e McCrae. (Continua) Estruturação e formação da personalidade8 Fonte: adaptado de FESIT, J. et al. (2015). Neuroticismo Ansioso Calmo Temperamental Equilibrado Autoindulgente Satisfeito consigo Inseguro Tranquilo Emocional Não emocional Vulnerável Resistente Abertura à experiência Imaginativo Prático Criativo Não criativo Original Convencional Prefere variedade Prefere rotina Curioso Não curioso Liberal Conservador Amabilidade Gentil Insensível Confiante Desconfiado Generoso Mesquinho Aquiescente Antagonista Flexível Crítico Bondoso Irritável Conscienciosidade Consciencioso Negligente Trabalhador Preguiçoso Organizado Desorganizado Pontual Atrasado Ambiocioso Sem objetivo Perseverante Pouco persistente Quadro 1. Modelo da personalidade dos cinco fatores de Costa e McCrae. Segundo Feist, Feist e Roberts (2015), as pessoas geralmente apresentam re- sultados intermediários nas escalas. Veja, a seguir, como escores extremos podem ser interpretados nos casos de neuroticismo, extroversão e abertura à mudança. (Continuação) 9Estruturação e formação da personalidade � Neuroticismo: escores altos indicam que a pessoa tende a ser ansiosa e temperamental. Ela busca desculpar os próprios erros, é emocional e suscetível ao estresse. Já o escore baixo nesses traços significa que a pessoas tende, em geral, a ser mais calma, equilibrada e não emocional. � Extroversão: os escores altos indicam que a pessoa é afetuosa, alegre, comunicativa e adora diversão. Já os escores baixos indicam pessoa contida, solitária, passiva e sem habilidade para expressar emoção. � Abertura à mudança: distingue os indivíduos que buscam experiências diversificadas e põem em questão os valores consagrados, são mais criativos, curiosos e inovadores (escores altos) dos que não estão abertos às experiências, que se apegam muito a algo familiar, são conservadores, sem muita curiosidade (escore baixo). Na teoria da personalidade dos cinco fatores, o comportamento é anali- sado com base no entendimento de três elementos: (1) tendências básicas, (2) adaptações características e (3) autoconceito. De maneira geral, essa teoria possibilita um estudo do comportamento humano com a avaliação psicomé- trica, não significando uma previsão e uma explicação do comportamento. Conforme Feist, Feist e Roberts (2015, p. 265–266), [...] as teorias dos traços e fatores são exemplos de uma abordagem estritamente empírica de investigação da personalidade. Elas foram construídas por meio da coleta de tantos dados quanto fosse possível em um grande número de pessoas, inter-relacionando os escores, submetendo matrizes de correlação à análise fatorial e aplicando significância psicológica apropriada aos fatores resultantes. Uma abordagem psicométrica, em vez do julgamento clínico, é o pilar das teorias dos traços e fatores. Para saber mais sobre os sistemas da personalidade, acompanhe, na Figura 1, um esquema ilustrativo com operações da personalidade a partir da teoria dos cinco fatores. Atente para as bases biológicas, as tendências básicas, as adaptações características, a biografia objetiva, as influências externas e o autoconceito — interligados por meio de setas que representam processos dinâmicos. Estruturação e formação da personalidade10 Figura 1. Operação do sistema da personalidade de acordo com a teoria dos cinco fatores. Fonte: adaptada de Feist, Feist e Roberts (2015). Bases biológicas Tendências básicas Neuroticismo, extroversão, abertura à experiência, amabilidade, conscienciosidade Processos dinâmicos Adaptações características • Fenômenos culturalmente condicionados • Esforços pessoais, atitudes Autoconceito Esquemas pessoais, mitos pessoais Biogra�a objetiva Reações emocionais, mudanças de carreira: comportamento In�uências externas Normas culturais, eventos na vida: situação Processos dinâmicos Processos dinâmicos Processosdinâmicos Processos dinâmicos Processos dinâmicos Processos dinâmicos Contribuições para a teoria dos traços de personalidade Gordon Allport Allport (1897–1967) buscou estudar a personalidade em seus aspectos mais singulares e individuais, fundando a psicologia individual. Para ele, o indi- víduo está situado mais no presente do que no passado. Assim, Allport não acreditava que o positivismo levava o homem a um organismo vazio, rejeitava o empirismo e desaprovava os estudos fatoriais analíticos da personalidade. Para Hall, Lindzey e Campbell (2000, p. 227–228): Allport propôs uma posição epistemológica para a pesquisa da personalidade [...] aceita a suposição de senso comum de que as pessoas são seres reais, que cada um tem uma organização neuropsíquica real, e que o nosso trabalho 11Estruturação e formação da personalidade é compreender tal organização tanto quanto possível [...] a personalidade é primariamente representada em termos de traço, e ao mesmo tempo, o com- portamento é motivado ou impulsionado pelos traços. Allport também considerava que a personalidade está em constante de- senvolvimento e transformação, tendo uma organização interna que envolve corpo e mente consolidados numa unidade pessoal. No seu modelo de traços, estes significam o efeito da combinação ou da integração de dois ou mais hábitos. A partir de sua acurada pesquisa dos traços, Allport categorizou quase 18 mil expressões. Para o autor, o importante é o que o indivíduo pretende ou busca em seu futuro, suas intenções quanto ao que está tentando fazer, que se traduzirão no seu comportamento presente. Nesse sentido, ele propôs que todas as funções do self ou do ego fossem denominadas “funções próprias da personalidade”. Essas funções são: senso corporal, autoidentidade,autoestima, autoexpressão, senso de ser quem é, pensamento racional, autoimagem, anseios próprios, estilo cognitivo e função de conhecer. Segundo Feist, Feist e Roberts (2015, p. 237), Allport enfatizou a importância da motivação consciente [...] os adultos têm consciência do que estão fazendo e de suas razões para fazê-lo [...] entretanto, não ignorou a existência ou mesmo a importância dos processos inconscien- tes [...] reconheceu o fato de que alguma motivação é incitada por impulsos ocultos e impulsos sublimados. A ênfase no que se passa dentro do organismo é a maior crítica à teoria de Allport, pois ele desconsiderou a inter-relação entre o comportamento e o meio social (forças externas) (HALL; LINDZEY; CAMPBELL, 2000). Raymond B. Cattell Cattell (1905–1998) foi muito importante nos primeiros anos da psicometria, com sua pesquisa da estrutura psicológica intrapessoal. Nos seus estudos, também explorou as dimensões básicas da personalidade e do temperamento, a variedade de habilidades cognitivas, as dimensões dinâmicas de motivação Estruturação e formação da personalidade12 e emoção, as dimensões clínicas da personalidade anormal, os padrões de sintonia de grupo e o comportamento social, entre outros aspectos. A teoria da personalidade de Cattell é baseada na análise fatorial (metodo- logia estatística). Segundo Hall, Lindzey e Campbell (2000, p. 254): [...] o teórico fatorial começa a estudar o comportamento com um grande nú- mero de sujeitos. Dados estes índices superficiais, o investigador então aplica a técnica de análise fatorial para descobrir quais são os fatores subjacentes que determinam ou controlam a variação nas variáveis superficiais. Assim ele espera identificar um pequeno número de fatores básicos cuja operação explica a maior parte da variação no grande número de medidas que o investigador tinha ao começo [...] o teórico fatorial começa com uma grande variedade de medidas comportamentais, identifica os fatores subjacentes a essas medidas e então tenta criar um meio mais eficiente de avaliar estes fatores. A teoria de Cattell é reconhecida como “teoria do traço”, com uma visão abrangente da personalidade, buscando esquematizar empiricamente grandes extensões do domínio da personalidade, o que resultou num grande número de traços dinâmicos. Hall, Lindzey e Campbell (2000, p. 257) afirmam tam- bém que “[...] muitas das ideias de Cattell, especialmente as relacionadas ao desenvolvimento, estão intimamente ligadas às formulações de Freud e às de autores psicanalíticos que vieram depois” deste último. Para Cattell, a personalidade é uma estrutura complexa e distinta de tra- ços. O traço, para ele, é uma estrutura mental, que foi percebido a partir do comportamento observado. Você pode ver os principais fatores do teste de personalidade no Quadro 2. U.I. 16 Ego narcisista versus não assertividade disciplinada, segura U.I. 17 Inibição/timidez versus confiança U.I. 18 Esperteza maníaca versus passividade U.I. 19 Independência versus submissão U.I. 20 Comention (conformidade gregária) versus objetividade U.I. 21 Exuberância versus refreamento U.I. 22 Cortetia (prontidão cortical) versus pathemia U.I. 23 Mobilização de energia versus regressão Quadro 2. Principais fatores do teste de personalidade. (Continua) 13Estruturação e formação da personalidade Fonte: adaptado de FESIT, J. et al. (2015). U.I. 24 Ansiedade versus ajustamento U.I. 25 Realismo versus tensinflexia (tendência psicótica) U.I. 26 Autossentimento narcisista versus despretensão U.I. 27 Apatia cética versus envolvimento U.I. 28 Astenia de superego versus segurança bruta U.I. 29 Responsividade sincera versus falta de vontade U.I. 30 Impassibilidade versus dissofrustance U.I. 31 Prudência versus variabilidade impulsiva U.I. 32 Exvia (extroversão) versus invia (introversão) U.I. 33 Desânimo (pessimismo) versus atitude alegre U.I. 34 Caráter não prático versus caráter prático U.I. 35 Sonolência versus excitação U.I. 36 Autossentimento versus autossentimento frágil Quadro 2. Principais fatores do teste de personalidade. Hans Eysenck Eysenck (1916–1997) desenvolveu uma teoria fatorial semelhante à de Mc- Crae e Costa, fundamentando-a basicamente na análise fatorial e na biologia. Estabeleceu, porém, somente três dimensões da personalidade: extroversão/ introversão, neuroticismo/estabilidade e psicoticismo/superego. Para ele, as diferenças individuais na personalidade são provenientes de diferenças gené- ticas, compreendendo estruturas cerebrais, hormônios e neurotransmissores que influenciam os três fatores da personalidade. Ele define traços como disposições importantes semipermanentes da personalidade, que compõem intercorrelações significativas entre diferentes comportamentos habituais (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015). Segundo Feist, Feist e Roberts (2015, p. 276–277): (Continuação) Estruturação e formação da personalidade14 [...] os extrovertidos são caracterizados pela sociabilidade e pela impulsivida- de, mas também por jocosidade, vivacidade, perspicácia, otimismo e outros traços indicativos das pessoas que são gratificadas pela associação com os outros. Os introvertidos são caracterizados pelos traços opostos aos dos ex- trovertidos [...] são quietos, passivos, pouco sociáveis, cuidadosos, reservados, pensativos [...] as principais diferenças entre extroversão e introversão não são comportamentais, mas de natureza biológica e genética. O neuroticismo/estabilidade é indicado como forte componente hereditá- rio. Assim, a pessoa com escore alto em neuroticismo apresenta disposição para reagir com excesso emocional e dificuldade de retornar a um estado normal depois de uma alteração emocional. No entanto, Eysenck afirma que o neuroticismo não sugere compulsoriamente uma neurose, porém sobre forte estresse pode produzir um transtorno neurótico (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015). Esses dois fatores, extroversão/introversão e neuroticismo/estabilidade, foram a base da teoria da personalidade, que posteriormente reconheceu o psicotismo/superego, formando as três dimensões. As características das pes- soas com escore alto em psicotismo são: egocentrismo, frieza, impulsividade, hostilidade, agressividade, desconfiança, psicopatia e antissociabilidade. E as pessoas com baixo escore são mais altruístas, com alta socialização e empatia, cooperativas e mais convencionais. BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 2001. DAINEZ, D.; SMOLKA, A. L. B. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler: desenvolvimento humano, educação e deficiência. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 40, n. 4, out./dez. 2014. FEIST, J.; FEIST, J. G.; ROBERTS, T. A. Teorias da personalidade. 8. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. FELDMAN, R. S. Introdução à psicologia. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. HALL, C. S.; LINDZEY, G.; CAMPBELL, J. B. Teorias da personalidade. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000. ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. SILVA, I. B.; NAKANO, T. C. Modelo dos cinco grandes fatores da personalidade: análise de pesquisas. Avaliação Psicológica, v. 10, n. 1, p. 51-62, 2011. Disponível em: <http:// www.redalyc.org/html/3350/335027285007/>. Acesso em: 18 mar. 2018. 15Estruturação e formação da personalidade Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo:
Compartilhar