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2. Arquivos, Documentos e Poder

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15 
ARQUIVOS, DOCUMENTOS E PODER: A CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA 
MODERNA2 
Joan M. Schwartz* e Terry Cook** 
Trad. Cylaine Maria das Neves; Maria Cristina Vendrameto; Pedro Condoleo de 
Queiroz 
Arquivos, documentos, poder: três palavras que agora ecoam por meio de uma gama de 
disciplinas acadêmicas e atividades profissionais. Individualmente, estes termos são 
freqüentemente desencadeadores de debates acalorados sobre valores sociais, identidades 
culturais, e responsabilidade institucional. Coletivamente, porém, "arquivos, documentos 
e poder" representam uma combinação improvável: o que têm haver arquivos velhos, 
empoeirados, armazenados em catacumbas, com poder? 
Durante muito tempo, os arquivistas foram vistos de fora, como "rachadores de lenha e 
tiradores de água", ou seja, como aqueles que recebiam documentos das entidades 
produtoras e apenas os disponibilizavam para os pesquisadores. Os arquivistas se 
consideravam neutros, objetivos e imparciais. De ambas as perspectivas, os arquivistas e 
seus documentos pareciam constituir a própria antítese do poder. Certamente, os textos 
recentemente produzidos, sobre instituições culturais, raramente abordaram o forte 
impacto dos arquivos e registros sobre a memória coletiva e a identidade cultural, ao 
contrário do papel atualmente atribuído aos museus de história natural e cultural, galerias 
de arte, bibliotecas, monumentos históricos, e, até mesmo, jardins zoológicos. Enquanto 
alguns escritores começam a explorar determinados aspectos do "arquivo" em seu sentido 
metafórico ou filosófico, quase sempre isso é feito sem uma mínima compreensão dos 
arquivos como uma instituição real, e a arquivologia, como uma profissão real (a segunda 
mais velha!) e como uma disciplina real com seus próprios referenciais teóricos, 
metodológicos e práticos. De modo geral, a literatura arquivística profissional é raramente 
citada pelos não-arquivistas que escrevem sobre "o arquivo". 
Não obstante, várias reflexões pós-modernas das últimas duas décadas deixam claro que 
os arquivos – como instituições – exercem poder sobre a administração, a lei, a 
responsabilidade fiscal dos governos, corporações e indivíduos, e se ocupa de debates 
importantes da política pública a respeito do direito ao conhecimento, à liberdade de 
informação, proteção à privacidade, direito autoral e propriedade intelectual e protocolos 
para o comércio eletrônico. Os arquivos – como registros – exercem poder sobre a 
construção do conhecimento histórico, da memória coletiva, e da identidade nacional, 
sobre como nós nos conhecemos como indivíduos, grupos e sociedades. E, por fim, na 
busca de suas responsabilidades profissionais, os arquivistas – como gestores de arquivos 
– detêm o poder sobre os próprios documentos essenciais à formação da memória e da 
identidade, por 
2 Texto publicado originalmente, em inglês, na revista Archival Science. SCHWARTZ, Joan M; COOK, 
Terry. Archives, records, and Power: the making of moderny memory. Archival Science, Dordrecht 
(Netherlands), v.2, n.1-2, 2002, p.1-19. 
* National Archives of Canadá/Queen’s University. 
** University of Manitoba/Clio Consulting. 
 16 
meio da gestão ativa dos registros antes deles se tornarem arquivos, de sua avaliação e 
seleção como arquivos e, posteriormente, de sua descrição, preservação e uso em 
permanente evolução enquanto fonte histórica. 
Em conjunto, a contínua negação dos arquivistas a respeito do seu poder sobre a memória; 
o fracasso em explorar os muitos fatores que afetam profundamente os registros antes 
deles se tornarem arquivos; e a contínua crença dos muitos usuários dos arquivos, de que 
os documentos apresentados a eles não são discutíveis, contribuem para a esterilidade do 
debate. Quando o poder é negado, ignorado ou incontestado, isso é um erro na melhor e 
um perigo na pior das hipóteses. O poder reconhecido torna-se um poder que pode ser 
questionado, responsabilizado e aberto ao diálogo transparente e ao entendimento 
enriquecido. 
Este poder do arquivo – sua natureza subjacente, pressupostos teóricos, aplicações 
práticas, evolução histórica e conseqüências para os usuários – é o foco dos ensaios no 
primeiro dos 2 números temáticos especiais da Revista Archival Science sobre "Arquivos, 
Documentos e Poder"3. 
Construindo e desconstruindo arquivos 
Arquivos são construções sociais. Suas origens se sustentam na necessidade de 
informação e nos valores sociais dos ditadores, governos, negócios, associações, e 
indivíduos que os determinam e os mantêm. Apesar das mudanças em sua natureza, dos 
seus usos e da necessidade de preservá-los, os arquivos, desde os mnemons da Grécia 
Antiga são relacionados ao poder – à manutenção do poder, ao controle pelo presente 
daquilo que é, e será, conhecido sobre o passado e ao poder da lembrança sobre o 
esquecimento. Mas, como Maurice Halbwachs nos lembra, "nenhuma memória é possível 
fora dos contextos usados por pessoas vivendo em sociedade para determinar e recordar 
as suas lembranças". Arquivos são um elemento crítico desses contextos sociais e 
intelectuais. A recordação (ou re-criação) do passado pela pesquisa histórica em 
documentos arquivísticos não é simplesmente "a recuperação da informação armazenada, 
mas a reivindicação do sentido do passado por meio do contexto do conhecimento cultural 
compartilhado"4. Os próprios arquivos são parte da reivindicação e dessa forma moldam 
a compreensão. 
Quer por meio de idéias ou de sentimentos, ações ou transações, a escolha do que registrar 
e a decisão sobre o que preservar e dessa forma privilegiar – ocorre em contextos 
socialmente construídos, mas agora tidos como “naturais”, que determinam as 
significações daquilo que se tornará arquivo. Dentro deles, os princípios e as estratégias 
que os 
3 Esta série de assuntos temáticos da Revista Archival Science (este volume e o seguinte) é dedicada em 
amizade a Hugh Taylor, o decano dos arquivistas canadenses. As idéias exploradas devem muito às suas 
reflexões na mídia, o significado relativo ao documento, as transformações tecnológicas, a evolução da 
oralidade e dos mnemônicos antigos e medievais (arquivistas como aqueles que lembram) por meio dos 
arquivos sem barreiras em um mundo onde a transmissão é feita por redes, para propósitos aparentemente 
bons (seu próprio impulso biorregional, ecológico, espiritual para o empenho da memória arquivística) ou 
propósitos aparentemente maus (uma mega corporação eletrônica mundial que poderia realizar o controle 
da exploração humana na revolução industrial parece ser uma comparação modesta). Nos desafios da 
arquivística tradicional, práticas e convenções, entre 1960 e a metade dos anos 90, se coloca o germe da 
sensibilidade pós-modernista nos editores). 
 17 
4 Maurice Halbwachs, Sobre a Memória Coletiva, Lewis A. Coser (ed. e trad.), (Chicago, 1941, 1992), cap. 
2, "Linguagem e Memória", p. 43. 
arquivistas adotam com o passar do tempo, e as atividades que desenvolvem – 
especialmente selecionar e avaliar o que se tornará de guarda permanente e o que será 
descartado – influenciam a natureza e ordenação dos conteúdos arquivísticos e, dessa 
forma, a memória da sociedade. Estes contextos culturais subjacentes são vitais para o 
entendimento da natureza dos arquivos enquanto instituições e enquanto lugares de 
memória social. Tais contextos também influenciam os arquivos no nível individual da 
criação e da sobrevivência de um único documento: a carta, a fotografia, o diário, o vídeo 
caseiro. Como os arquivos coletivamente, um documento individual não é somente 
portador de conteúdo histórico, mas, também um reflexo das necessidades e desejos do 
seu produtor, dos propósitos de sua criação, do seu usuário, do alcance legal, técnico, 
organizacional, social, e cultural-intelectual com o qual o produtor e o usuário operam, e 
no qual o documento tem significado, e a intervenção inicial e a mediação contínua dos 
arquivistas. A natureza do "arquivo" resultante tem assim sériasconseqüências para a 
responsabilidade administrativa, o direito dos cidadãos, a memória coletiva, e o 
conhecimento histórico, tudo isso moldado – tacitamente, sutilmente, às vezes 
inconscientemente, mas mesmo assim profundamente – pela aparente naturalidade, pelo 
poder invisível e raramente questionado dos arquivos. 
Recentemente, a palavra “arquivo” experimentou um ressurgimento muito além de sua 
conotação popular de porões empoeirados e pergaminhos velhos em estudos culturais, na 
rede mundial e em toda parte. Teóricos culturais, especialmente Michel Foucault e 
Jacques Derrida, vêem "o arquivo" como uma construção metafórica central sobre a qual 
basear suas perspectivas a respeito de conhecimento, memória, poder e busca por justiça. 
Inspirando-se em Foucault e sugerindo que informação, como poder, "não existe no 
vácuo", Thomas Richards, em O Arquivo Imperial, discute "o arquivo", como "um espaço 
utópico de conhecimento abrangente... não uma construção, nem até mesmo uma coleção 
de textos, mas a junção coletivamente imaginada de tudo que é ou pode se tornar 
conhecido”, e procura demonstrar como "o arquivo imperial foi uma fantasia de 
conhecimento coletada e unida a serviço do Estado e do Império"5. Constituindo-se na " 
microfísica do poder" imbricada em registros fotográficos produzidos por departamentos 
médicos, educacionais, sanitários e de engenharia, John Tagg declara, "Como o Estado, 
a câmara nunca é neutra. As representações que ela produz são altamente codificadas, e 
o poder que ela exerce nunca é dela mesma"6. O controle do arquivo – definido de várias 
maneiras – significa o controle da sociedade e assim de determinar os vencedores e 
perdedores da história. Verne Harris, inspirado em Derrida, mostrou contuldentemente 
como isso funciona sob o regime de Apartheid na África do Sul e seus arquivos nacionais 
cativos, e como esse poder que passa por natural pode ser diferente sob as condições pós-
apartheid7. 
5 Thomas Richards, O Arquivo Imperial: conhecimento e a fantasia do Império (Londres e Nova York, 
1993), p. 73, 11, 6. 
6 John Tagg, A responsabilidade da representação: ensaios sobre fotografias e histórias (Amherst MA, 
1988), p. 63-64. Semelhante a Rosalind Krauss, Allan Sekula e outros que têm usado "o arquivo" como um 
"espaço discursivo" no qual registros fotográficos, tanto de paisagem quanto de pessoas têm o seu 
significado. Veja Allan Sekula, O corpo e o arquivo, e Rosalind Krauss, Espaço do discurso fotográfico, 
ambos em Richard Bolton (ed.), O debate sobre o significado: histórias críticas da fotografia (Cambridge 
MA, 1992), p. 286-301, 343-388. 
 18 
7 Veja Verne Harris, "A redefinição dos arquivos na África do Sul: arquivos públicos e sociedade em 
transição, 1990-1996", Archivaria 42 (Fall 1996); e seu complemento "Reivindicando menos, opinando 
mais: uma crítica da formulação positivista sobre os arquivos na África do Sul", Archivaria 44 (Fall 1997); 
como também seu ensaio neste volume. 
Como qualquer um que visita a Internet sabe, no mundo da tecnologia da informação, 
"arquivo" é um substantivo que descreve um sítio de informações anteriores (qualquer 
coisa entre meses e uma hora atrás) legível por máquina; "arquivar" é também um verbo 
transitivo para transferir informação de computador a um lugar pouco freqüentado, por 
exemplo: Arquivar informações do disco rígido do computador em fitas de segurança ou 
CD-ROM. Enquanto tanto teóricos culturais como tecnólogos de informação abraçam a 
idéia do arquivo como um depósito de informação, aqueles concebem o arquivo como 
uma fonte de conhecimento e poder essencial para a identidade social e pessoal e estes 
como uma acumulação neutra, até mecânica, de informação para a própria segurança. 
Os ensaios nesses dois números confrontam os pressupostos mutáveis, contestados, mas 
pouco questionados subjacentes à natureza e significado dos arquivos na sociedade. Os 
autores procuram nos demonstrar que as teorias, princípios, natureza, e evolução histórica 
dos "arquivos" como instituições, e dos "registros" como documentos – coletivamente "o 
arquivo" – não são universais no espaço nem estáveis no tempo. A crescente literatura 
sobre a memória social ou coletiva sugere a necessidade de olhar novo sobre o arquivo à 
luz das mudanças na produção e preservação dos documentos, nos meios mutáveis de 
registro e na natureza do que é documentado e quem faz a documentação, assim como a 
necessidade de examinar o impacto dessas mudanças sobre a gestão de registros e sua 
prática, e sobre arquivos e sua prática. 
Enquanto estudiosos – historiadores, antropólogos, teóricos culturais, geógrafos 
históricos, sociólogos, e outros – cada vez mais descobrem e se concentram em contexto, 
é essencial reconsiderar a relação entre arquivos e as sociedades que os criam e usam. No 
centro dessa relação está no poder. Mas poder – poder para registrar certos eventos e 
idéias e não outros, poder para nomear, rotular e ordenar registros de acordo com as 
necessidades de negócios, governos e pessoas, poder para preservar e mediar o arquivo, 
poder sobre o acesso, poder sobre os direitos e liberdades individuais, sobre a memória 
coletiva e a identidade nacional – é um conceito muito ausente da perspectiva arquivística 
tradicional. Ironicamente, ao mesmo tempo em que o escrutínio acadêmico sobre um 
leque de disciplinas é treinado no poder do arquivo no sentido metafórico, as práticas 
arquivísticas perpetuam o mito central da profissão no século passado, o de que o 
arquivista é (ou deveria ser) um objetivo, neutro, passivo (ou passivo, e nesse caso auto-
restritivo) guardião da verdade. De fato, há evidência de que muitos usuários aceitam essa 
auto-imagem sem questionar. 
A recusa da profissão arquivística em admitir as relações de poder embutidas em seu 
exercício carrega a abdicação da responsabilidade pelas conseqüências do uso desse 
poder, gerando sérias conseqüências para a compreensão e conclusão do papel dos 
arquivos num presente mutável, ou para um uso sutil e reflexivo dos arquivos no futuro. 
Nesse aspecto, é um cego conduzindo outro, em ambas as direções: estudiosos usando 
arquivos sem perceber as espessas camadas de intervenção e significado codificado nos 
registros por seus produtores e pelos arquivistas muito antes das pesquisas começarem; e 
arquivistas tratando seus arquivos sem sensibilidade para as marcas que estão deixando 
no registro arquivístico. Estudiosos e arquivistas percebem (e promovem) o arquivo como 
 19 
coleção documental e pesquisa histórica indiferente, em vez de um lugar para contestação 
do poder, memória e identidade. 
Extrapolando os arquivos 
À luz de críticas recentes ao “arquivo” vindas de fora, os arquivistas deveriam considerar 
a rica e crescente literatura sobre a natureza da história e da evidência, da memória 
coletiva e da formação de identidade; a relação entre representação e realidade; as culturas 
organizacionais e necessidades pessoais que influenciam a produção e manutenção dos 
registros; a necessidade psicológica de coletar e preservar arquivos; e o impacto do nosso 
conhecimento do passado sobre nossa percepção do presente, e vice-versa. 
Como os arquivos e Registros se situam em relação ao nexo de poder e conhecimento 
descrito por Foucault? Como são eles centrais aos estudos que traçam a evolução da 
memória coletiva ou da exteriorização da memória – isto é, as maneiras pelas quais a 
memória é mantida fora de sua faculdade humana – de forma oral, escrita, impressa, 
visual e eletrônica. Através dos tempos, novos meios de registro causaram mudanças no 
armazenamento e comunicação da informação, e também na nossa maneira de saber, 
pensar e articular nossa relação com o mundo a nossa volta. Essas revoluções na 
tecnologia da informação são de interesse, não só porque mudaram o que os arquivos 
colecionam, mas também porque mudaram o papel dos arquivos na sociedade. Não basta 
responder àqueles; é preciso considerar esta. 
Na crescente literaturasobre a história e memória, o poder do arquivo na sociedade é 
explicitado na discussão de Jacques Le Goff sobre as origens da consideração política 
central no antigo mundo sob um monarca e o estabelecimento dos primeiros arquivos 
para apoiar seu controle. O exame de Patrick Hutton sobre a exteriorização da memória 
da cabeça para o artefato mostra a transferência da memória individual para a coletiva 
como a base da coesão social8. Os arquivos medievais; revela Patrick Geary, eram 
coletados e depois torcidos e reconstruídos – não só para registrar transações legais e 
comerciais, mas também, e explicitamente para servir a propósitos sacros e simbólicos, 
mas apenas para os eventos e figuras julgadas dignas de celebração, no contexto do seu 
tempo9. Documentos ligados à Segunda Guerra Mundial foram moldados, sabe-se agora, 
para pôr as forças de combate na luz mais favorável possível e depois alterados para 
diminuir a culpa dos generais pelo morticínio no Fronte Ocidental10. Olhando os 
marginalizados pelo arquivo, Gerda Lerner traçou da Idade Média ao século XX, a 
sistemática exclusão das mulheres da memória da sociedade, inclusive nos arquivos11. De 
outra perspectiva, arquivistas de países em desenvolvimento questionam se conceitos 
arquivísticos clássicos vindos da cultura escrita das burocracias européias são adequados 
para preservar as memórias de culturas 
8 Jacques Le Goff, História e Memória, Steven Rendall e Elizabeth Claman (trad.), (Nova York, 1992, 
originalmente publicado em 1986); Patrick Hutton, História como Arte e Memória (Hanover NH, 1993). 
9 Patrick J. Geary, Fantasmas da lembrança: memória e esquecimento do fim do primeiro milênio 
(Princeton, 1994), p. 86-87, 177, e especialmente cap. 3, "Memória arquivística e a destruição do passado" 
e passim; e Rosamond McKitterick, Os carolíngios e a palavra escrita (Cambridge, 1989). 
10 Veja Tim Cook, "Documentando a guerra e forjando reputações: Sir Max Aiken e os Arquivos 
Canadenses Oficiais sobre a Primeira Guerra Mundial", Guerra na História (o futuro admitido); Robert 
McIntosh, "A Grande Guerra, Arquivos, e Memória Moderna", Archivaria 46 (outuno de 1998); e Denis 
 20 
Winter, O comando de Haig: uma revisão (Harmondsworth, 1991), especialmente a sessão final, 
"falsificando o documento". 
11 Para mulheres e arquivos, veja Gerda Lerner, A criação da consciência feminista: da Idade Média ao 
século XVIII (Nova York e Oxford, 1993), passim, mas especialmente cap. 11, "A procura pela história 
das mulheres", veja também Anke Voss-Hubbard, "'Sem documentos – sem história': Mary Ritter Beard e 
a História inicial dos arquivos das mulheres", American Archivist 58 (inverno de 1995). Veja também as 
fontes citadas na nota 25. 
orais12. A comparação dos estudos coloniais e pós-coloniais com o pós-moderno ou da 
"virada histórica", como nos artigos de Ann Stoler e Jim O ́Toole sugere que, tratando 
registros e arquivos como locais controversos de poder, podemos trazer novas 
sensibilidades à compreensão de registros e arquivos como tecnologias dinâmicas de 
dominação que na verdade criam as histórias e realidades sociais que supostamente se 
limitam a descrever. 
Enquanto estudiosos das ciências sociais e humanidades, entre outras, lutam com 
questões de representação, verdade e objetividade, profissionais e usuários de arquivos 
tardam em reconhecer a natureza dos arquivos como instituições socialmente construídas, 
a relação dos arquivos com idéias de memória e verdade, o papel dos arquivos na 
produção do conhecimento sobre o passado, e principalmente o poder dos arquivos e 
registros para moldar nossas idéias de história, identidade e memória. Os ensaios nesses 
dois números de “Ciência Arquivística” visam corrigir este desequilíbrio. Expondo 
pressupostos sobre a natureza e o papel dos arquivos tidos por muito tempo como 
“naturais”, todos os ensaios encorajam uma maior consciência do impacto social e das 
conseqüências históricas dos arquivos em questões culturais e no entendimento humano. 
Paralelos entre museus e arquivos são óbvios e instrutivos. Certamente arquivos e 
registros, como museus e artefatos, “têm uma longa e complexa história que molda o que 
eles são hoje"13. Arquivos, como museus, certamente “incorporam e moldam as 
percepções do público do que é valioso e importante” e “são parte da história e filosofia 
do conhecimento nas humanidades e nas ciências, e essa história e filosofia é em parte 
criada por eles14". Consideremos como os arquivos refletem e constituem as necessidades 
de informação da sociedade. Seguindo o raciocínio de Stephen Kern15, qual é , por 
exemplo, o impacto sobre a produção, preservação e uso dos registros e arquivos desde 
meados do século XIX – o século que testemunhou o estabelecimento, profissionalização 
e crescimento do arquivo moderno – do surgimento da alfabetização geral, da educação 
pública, cartas, diários, serviços postais, o telégrafo, o telefone, o rádio, a fotografia, o 
filme e a televisão (e a literatura visual que eles engendram), da democracia, imposto de 
renda, sistemas de escritório, informatização, movimento feminista, pós-modernidade e 
muitas outras influências culturais e tecnológicas? 
12 Para um de muitos escritos, veja Verne Harris e Sello Hatang, "Arquivos, Identidade e Lugar: um diálogo 
sobre O que (possa) pretende ser um arquivista africano", ESARBICA Journal 19 (2000), como também 
inter alia os artigos por Verne Harris e Evelyn Wareham nesses dois assuntos da Archival Science. 
13 Veja, por exemplo, Susan Pearce, Museus, Objetos e Coleções (Washington, 1992), especialmente cap. 
5, "Museus: a razão intelectual"; e Tony Bennett, O nascimento do museu: História, Teoria, Política 
(Londres e Nova York, 1995). Joan M. Schwartz nota que há "um importante paralelo entre museus e 
arquivos como 'instituições de memória'" em "'Nós construímos nossas ferramentas e nossas ferramentas 
nos constroem'": Lições de fotografias para a prática, política, e poética da diplomática", Archivaria 40 
(outono de 1995): 40- 74, e especialmente a referência na nota 115. 
 21 
14 Pearce, Museus, objetos e coleções, p. 89. Para uma análise paralela da história arquivística, e como o 
passado transforma as idéias sobre o arquivo, sustentando tanto pensamentos, estratégias, e práticas diárias, 
como os arquivos se moveram do estado focalizado por um cliente – ou a aproximação focalizada do 
cidadão e, por meio disso, encontrando os seus valores, menos refletindo e servindo ao seu patrocinador do 
que à sociedade, veja Terry Cook, "O que é passado é preâmbulo: uma história das idéias arquivísticas 
desde 1898, e a mudança do paradigma futuro", Archivaria 43 (Primavera de 1997). 
15 Stephen Kern, A cultura do tempo e espaço, 1880-1918 (Cambridge MA, 1983). 
Se fazemos essas perguntas sobre a função do arquivo na sociedade, devemos lidar com 
dois temas intimamente ligados, mas concebidos em separado: “o conhecimento e a 
moldagem dos arquivos” e “os arquivos e a moldagem do conhecimento"16. Imbricado 
nesses temas está o poder - o poder sobre a informação e o poder dos institutos de 
informação. Também está envolvida a crise da representação – o poder dos registros e 
arquivos como representações e a representação do poder nos registros e arquivos 
E a desestabilização pós-moderna dos nossos conceitos inflexíveis de realidade e 
objetividade coloca o poder e a representação sob exame, e de fato as nossas tradições 
profissionais, tão dependentes de idéias de neutralidade e objetividade, são abaladas pelas 
preocupações pós-modernas com conhecimento, alteridade, hibridismo, liminaridade e 
plurivocalidade. 
"Ciência" arquivística e verdade arquivística 
Assim como qualquer esforço para demonstrar que arquivos são construções lida com a 
idéia de arquivos como neutros e registros como inocentes, e arquivistas como objetivos, 
ele precisa confrontar a noção de “ciência arquivística”, já que a idéia de ciência mudou 
nas últimas décadas, questionandosua suposta neutralidade e objetividade para com a 
sociedade. Assim, o argumento de que o “arquivo” é uma “ciência” não mais o exime de 
ser uma construção social, uma vez que até a natureza “científica” (leia-se objetiva, 
natural, positivista) da ciência vem sendo desmitificada17. 
Enquanto a discussão da natureza da ciência evolui, “objetividade” é cada vez mais 
apreendida como “conhecimento situado” ou “perspectiva parcial”18 – ou contexto. Mas 
enquanto estudiosos externos à profissão descobrem e se concentram mais e mais no 
contexto, com o cuidado de reconhecer o chão que pisam e a parcialidade de suas 
perspectivas, os arquivistas – guardiães do contexto – evitam (com crescentes exceções) 
teorizar sobre arquivos e registros e as relações de poder que encerram, fugindo das 
perspectivas dinâmicas, mutáveis e interativas da relatividade pós-moderna em favor da 
posição confortável de observador isento19. 
16 Veja Eilean Hooper-Greenhill, Museus e a configuração do conhecimento (Nova York, 1992); e Kevin 
Walsh, A representação do passado: museus e herança no mundo pós-moderno (Nova York, 1992). 
17 Para a crítica da "ciência arquivística" como termo e conceito, como usado pelos arquivistas, veja Terry 
Cook, "Ciência arquivística e pós-modernidade: novas formulações para um antigo conceito", Archival 
Science: International Journal on Recorded Information 1.1 (2001), especialmente 11-16. A crítica central 
sobre dois pontos: a mistura de "ciência" e "pseudociência" para ganhar o status profissional e 
respeitabilidade e a deficiência do conhecimento em sustentar a crítica da ciência "pura" desde Karl Popper 
e Thomas Kuhn, deixa somente para a mais recente feminista e estudiosos pós-modernos. 
18 Arquivistas devem considerar o capítulo de Dona Haraway, "Conhecimento situado: a questão da ciência 
para o Feminismo e o privilégio da perspectiva parcial", que começa: "Feministas acadêmicas e ativistas 
 22 
tentam repetidamente distinguir as questões que podem significar, para os curiosos, o inescapável termo da 
'objetividade'", "e concluem que 'objetividade não está relacionada ao descomprometimento". Veja Donna 
J. Haraway, Símios, Ciborgs e mulheres: A reinvenção da natureza (Nova York, 1991), p. 183-201. 
19 Recentemente, arquivistas começaram a questionar o contexto amplo do "pós-modernista", o tradicional, 
neutro, passivo, positivista, e o estatuto "científico" de sua profissão. A primeira menção ao pós-
modernismo (pelo menos em Inglês) por um arquivista em um título de artigo escrito por Terry Cook, em 
"Documentos eletrônicos, mentes de papel: a revolução em administração de informática e arquivos na era 
pós-custódia e pós-modernista", Archives and Manuscripts 22 (novembro de 1994). Os temas eram 
antecipados em sua "Mente sobre assunto: para uma nova teoria da avaliação arquivística", em Barbara 
Craig (Ed.), A imaginação da arquivística canadense: ensaios em honra de Hugh A. Taylor (Ottawa, 1992); 
e continuado em seu "O que é passado é prólogo: uma história das idéias arquivísticas", Archivaria, e dois 
artigos inter-relacionados: 
Coisas que mereceram a memória da sociedade (e dos arquivos) tem sido justificadas por 
conceitos como verdade, autoridade, ordem , evidência e valor. Mas, como a “ciência”, 
esses conceitos tem agora suas próprias histórias20. Qual o significado de arquivos cujo 
poder está em seu valor de verdade? Crenças tradicionais apresentam os arquivos como 
guardiães da verdade; os registros conteriam a cristalina evidência dos atos passados e 
dos 
"Ciência arquivística e pós-modernismo: novas formulações para antigos conceitos", Archival Science; e 
"Tolice moderna ou renascimento profissional: pós-modernismo e prática dos arquivos", Archivaria 51 
(primavera de 2001). Dois arquivistas pós-modernos pioneiros anteriores à Cook, e também canadenses, 
Brien Brothman e Richard Brown. Entre outros trabalhos, veja por Brien Brothman, "Ordens de valor: 
sondando as condições teóricas da prática arquivística", Archivaria 52 (verão de 1991); "Os limites dos 
limites: a desconstrução de Derridean e a instituição arquivística", Archivaria 36 (outono de 1993); a 
revisão sondando a febre de arquivo de Jacques Derrida, em Archivaria 43 (Primavera de 1997), que foi 
muito profundamente em seu "Recusando Derrida: Integridade, tensegrity, e a preservação dos arquivos a 
partir da desconstrução", Archivaria 48 (outono de 1999); e "O passado que mantém os arquivos: memória, 
história, e a preservação dos arquivos", Archivaria 51 (Primavera de 2001); e por Richard Brown, 
"Estratégia de aquisição de arquivos e sua fundação teórica: o caso para um conceito da hermenêutica 
arquivística", Archivaria 33 (inverno de 1991-1992); "O valor da 'narratividade' na avaliação dos 
documentos históricos: fundação para uma teoria da hermenêutica arquivística", Archivaria 32 (verão de 
1991); e "Morte de um documento guardião da Renascença: o assassinato de Tomasso da Tortona em 
Ferrara, 1385", Archivaria 44 (inverno de 1997). Outras declarações pós-modernas pelos canadenses 
incluindo Joan M. Schwartz, "'Nós construímos nossas ferramentas e nossas ferramentas nos constroem': 
lições de fotografias para a prática, política, e poética da diplomática", Archivaria; e "Documentos de 
simples verdade e precisão: fotografia, arquivos e a ilusão do controle", Archivaria 50 (inverno de 2000); 
Preben Mortensen, "O lugar da teoria em prática arquivística", Archivaria 47 (primavera de 1999); Tom 
Nesmith, "Ainda indistinto, mas mais preciso: alguns pensamentos sobre os 'fantasmas' da teoria 
arquivística", Archivaria 47 (primavera de 1999); Bernadine Dodge, "Lugares separados: arquivos se 
dissolvendo no tempo e no espaço", Archivaria 44 (inverno de 1997); Theresa Rowat, "Os arquivos e o 
repositório como uma forma cultural de expressão", Archivaria 36 (outono de 1993); Robert McIntosh, "A 
grande guerra, arquivos, e memória moderna", Archivaria; Carolyn Heald, "Há espaço para arquivos no 
mundo pós-moderno?" American Archivist 59 (1996); e Lilly Koltun, "A promessa e a ameaça de opções 
digitais em uma idade da arquivística", Archivaria 47 (Primavera de 1999). Os escritores não canadenses 
da arquivística pós-moderna incluem Eric Ketelaar, "Archivalisation e arquivando", Archives and 
Manuscripts 27 (maio de 1999); "Procurando os arquivos no Rose Garden", Arkhiyyon. Reader in Archival 
Studies and Documentation, Israel Archives Association 10-11 (1999): XXVII-XLII, e "Narrativas tácitas: 
os significados dos arquivos", Archival Science 1.2 (2001): 143- 155, entre outros trabalhos, e 
especialmente Verne Harris, "Reivindicando menos, entregando mais: uma crítica da formulação positivista 
em arquivos da África do Sul: arquivos públicos e sociedade em transição, 1990-1996", Archivaria; 
Explorando arquivos: uma introdução às idéias e práticas arquivísticas na África do Sul, 2. ed. (Pretoria, 
2000); "Um raio na escuridão: Derrida no arquivo", em Carolyn Hamilton et al. (eds.), Reconfigurando o 
arquivo (Cape Town, 2002); "Sobre a odisséia arquivística", Archivaria 51 (primavera de 2001): 2-14; e, 
com Sello Hatang, "Arquivos, identidade e lugar", ESARBICA Journal, entre muitos outros escritos; 
Elizabeth Kaplan, "Nós somos o que colecionamos, nós colecionamos o que somos", American Archivist 
 23 
63 (primavera / verão de 2000); e Francis X. Blouin Jr., "Arquivistas, mediação e construção da memória 
social", Archival Issues 24 (1999). Esta lista parcial é constantemente acrescida com autores estabelecidos 
e novos, como esses dois assuntos temáticos da Archival Science. 
20 Steven Shapin, Uma história social da verdade: civilidade e ciência na Inglaterra do século XVII 
(Chicago, 1994); Mary Poovey, Uma história do fato moderno: problemas do conhecimento nas ciências 
da riqueza e da sociedade (Chicago, 1998). O trabalho acima citado de Brien Brothman, bem como o novo 
artigo no segundo dos dois assuntos temáticos da Archival Science, expõe a natureza construída e mediadacomo evidência do conceito arquivístico, ordem, memória e valor. Veja também Terry Cook, "Arquivos, 
evidência e memória: pensamentos em uma tradição dividida", Archival Issues 22 (1997); e Joan M 
Schwartz, "Arquivos como simples verdade e precisão: fotografia, arquivos e a ilusão do controle", 
Archivaria. Em noções variáveis de "valor" em arquivos com o passar do tempo, e em como os arquivistas 
buscaram preservar a evidência e a ordem dos arquivos, veja novamente Terry Cook, "O que é passado é 
prólogo: uma história das idéias arquivísticas", Archivaria. 
 
fatos históricos21. Mas e a verdade dos próprios arquivos? E quais as conseqüências para 
a história do que eles acatam? Responder a isso exige a compreensão de que os arquivos 
se originam das necessidades de informação e dos valores sociais dos governantes, 
negócios e indivíduos que os estabelecem e mantém. Arquivos não são depósitos de 
documentos empilhados, mas um reflexo e uma justificação da sociedade que os 
produziu. Com a crescente complexidade de sociedade, de seus meios de comunicação e 
de suas necessidades de informação, as práticas dos que produzem registros, assim como 
as instituições de memória coletiva, vêm mudando. Mas a percepção dessas mudanças se 
arrasta, com conseqüências para os que tentam compreender o passado. 
Confrontando "a idéia de que natureza é construída, não descoberta – que a verdade é 
feita, não encontrada", Donna Haraway argumenta que: 
“O conhecimento racional não pretende se isentar: vir de toda parte e de nenhum lugar, 
ser despojado de interpretações, de representações, de ser auto-contido e moldável. O 
conhecimento racional é um processo contínuo de interpretação crítica entre “campos” 
de intérpretes e decodificadores. É uma conversação sensível ao poder”22. 
Também os arquivos e registros não pretendem se isentar; eles precisam se sujeitar a um 
processo “interpretação crítica contínua” entre produtores, guardiões e usuários de 
 24 
arquivos e documentos; e a relação entre os arquivos e documentos e a sociedade é uma 
forma de “conversação sensível ao poder”. 
Assim, mudanças na cultura da ciência têm acontecido num clima contemporâneo de 
relatividade, já há algum tempo. Essa corrente filosófica, como as mais recentes feminista 
e ecológica, desenvolveram-se ao longo de importantes mudanças na sociedade23. A 
crescente preocupação com o nexo poder/conhecimento e com as relações entre 
representação e realidade, história e memória, lugar e identidade, vem produzindo uma 
grande e crescente literatura que os arquivistas podem extrapolar para melhor entender a 
historicidade e especificidade da relação entre a prática arquivística e as necessidades da 
sociedade e avaliar as relações de poder inerentes às teorias e práticas arquivísticas e à 
natureza dos registros e sua manutenção. 
Arquivos do poder, o poder dos arquivos 
Os arquivos sempre foram sobre o poder, seja o do estado, da igreja, da corporação, da 
21 Nesta consideração, a articulação clássica está em Hilary Jenkinson, arquivista sênior do Arquivo Público 
da Inglaterra na primeira metade do século XX: "O credo dos arquivistas, a santidade da evidência; sua 
Tarefa, a conservação de cada fragmento de evidência que se prende aos documentos confiados a seu cargo; 
seu objetivo é prover sem discriminação ou malícia, para todos que desejem conhecer, o significado 
do conhecimento... O bom arquivista é talvez o mais abnegado à Verdade produzida pelo mundo 
moderno. Para uma discussão (com citações) das visões de Jenkinson dentro do seu contexto histórico, e 
seu impacto, veja Cook, "O que é passado é prólogo", 22-26. 
22 Haraway, "Conhecimento situado: a questão da ciência para o Feminismo e o privilégio da perspectiva 
parcial", em seu Símios, Ciborgs e mulheres: A reinvenção da natureza, p. 196. Aqui, Haraway faz 
referência a Katie King, "Cânones sem inocência" (Tese de PhD, Universidade da Califórnia em Santa 
Cruz, 1987). 
23 Para uma mistura estimulando destes três fluxos, veja Richard Tarnas, A paixão da mente ocidental: 
entendendo as idéias que têm proporcionado nossa visão do mundo (Nova York, 1991). 
família, do público ou do indivíduo. Os arquivos têm o poder de privilegiar ou de 
marginalizar. Podem ser uma ferramenta de hegemonia ou de resistência. Ambos refletem 
e constituem relações de poder. São um produto da necessidade de informação da 
sociedade, que se reflete na abundância e circulação de documentos. Eles são a base e a 
validação das histórias que nós contamos, das narrativas que dão coesão e significado aos 
indivíduos, grupos e sociedades. 
Os arquivos têm sido a intersecção de passado, presente e futuro – as "interfaces" de 
Margaret Hedstrom. Nesses espaços de poder, o presente controla o que o futuro saberá 
do passado. Portanto, os arquivistas devem enfrentar o desafio do pós-modernismo e estar 
preparados para a continuidade e as mudanças nos conceitos, necessidades e usos do 
passado, da memória, da informação, do conhecimento, pois está em jogo a relevância 
dos arquivos para a sociedade, o poder do registro, a força do presente e a vitalidade futura 
da profissão de arquivista. 
Os arquivistas detêm enorme poder, embora muitos arquivistas e acadêmicos relutem, em 
admitir. Mas esse poder não é estável; ele muda em resposta a muitos fatores, dentro e 
fora do mundo dos arquivos, incluindo mudanças na natureza dos arquivos e sua 
capacidade para armazenar e comunicar informação, e mudanças na natureza da 
manutenção dos registros conforme a tecnologia, a cultura organizacional e as exigências 
 25 
da sociedade. O poder dos arquivos e registros tem mudado no tempo e espaço em 
resposta a eventos históricos: conflitos religiosos, guerras civis, revoluções políticas, 
dominação imperial, e levantes de gênero, raça e classe, e ainda a circunstâncias 
geográficas: distância, transporte e comunicação. As suspeitas pós-modernas que recaem 
sobre as metanarrativas e universalidades exige que consideremos a historicidade e a 
especificidade dos arquivos como instituições, como documentos, e como profissão. 
Os documentos são sobre poder. Sobre a imposição de controle e ordem nas transações, 
eventos, pessoas e sociedades pelo poder legal simbólico, estrutural e operacional da 
comunicação documentada. Seu desenho e formato; sua metodologia de classificação; 
sua organização, participação e lugar dentro de sistemas de informação maiores; seu uso 
para fortalecer organizações e indivíduos poderosos em suas operações e subseqüentes 
recursos legais; o uso (ou não uso, como em testemunhos orais) de mídia específica de 
documento; a sofisticação técnica (e o custo) de sua produção e manutenção, incluindo o 
treinamento de uma elite especializada, (dos antigos escribas e monges medievais aos 
modernos especialistas em mídia audiovisual e computadorizada): esses e outros fatores 
(reais e simbólicos) permitem a alguns criar e manter registros, e não a outros; a algumas 
vozes serem ouvidas e outras não; a algumas idéias sobre a sociedade serem privilegiadas 
enquanto outras são marginalizadas. 
Mais tarde, uma fração mínima dos documentos é selecionada, avaliada e memorizada 
como arquivo; a vasta maioria não é. Escolhas sobre como descrever esse fragmento 
arquivístico reforça valores e impõe ênfase e ordem. Critérios sobre o que disponibilizar 
ou não criam filtros que influenciam a percepção dos arquivos e, portanto, do passado. 
Mesmo termos profissionais usados antes e depois dos documentos chegam ao “arquivo 
(histórico)” para descrever esses processos - “evidência”, “gestão”, “administração”, 
“confiabilidade”, “autenticidade”, “controle” etc. – sugerem um processo natural, 
orgânico, e reforçam a neutralidade e objetividade profissional. Essa inclinação 
lingüística mascara o exercício de poder sobre a memória e a identidade, tornando o poder 
mais eficaz. Todos esses temas – nos quais os artigos desses números temáticos tocam 
coletivamente – envolvem o exercício do poderou seu reflexo na sociedade. 
Mas afirmar que os arquivos e registros são apenas sobre poder, sobre impor o controle e 
a ordem é uma visão incompleta 24. Não sugerimos que arquivistas tradicionais conspiram 
conscientemente, menos ainda que aspirem ao poder. Sistemas humanos (incluindo suas 
manifestações em documentos e arquivos) são projetados em função do controle, ordem 
e regulamentos por algum fenômeno social. Mas tais sistemas são mais eficientes quando 
planejados e executados com disciplina – enquanto a história da produção e manutenção 
de arquivos é caótica, excêntrica, inconsistente e subjetiva tanto quanto é caracterizada 
por ordem, seqüência e conformidade – como fica claro nos ensaios de Barbara Craig e 
Ciaran Trace neste número de “Archival Science”. Além disso, os pontos de vista nos 
arquivos e registros não são só os pontos de vista privilegiados e dominantes dos 
poderosos, pois os mesmos arquivos criados pelos privilegiados podem ser 
desconstruídos por novos pensadores que se opõe ao ou ironizam o poder. Sem contar os 
arquivos singulares criados e mantidos por microcosmos de poder (por exemplo, grupos 
ou indivíduos resistentes) destinados a maior visibilidade no futuro. E certamente 
sistemas de classificação podem se espalhar sem impor um significado ou refletir um 
poder privilegiado. Enquanto a ordem alfabética é criação ocidental e largamente 
utilizada no Ocidente, ela não se limita ao uso dos poderosos. Pode ser um instrumento 
útil na documentação marginal tanto quanto na oficial. 
 26 
Feitas essas ressalvas, as relações de poder contidas nos arquivos e registros têm que ser 
reconhecidas neste momento. Por um lado, as características revolucionárias dos registros 
computadorizados, as estratégias dos arquivos e arquivistas para lidar com elas, as 
definições e a retórica usadas para discutir registros eletrônicos e descrevê-los nos 
arquivos e os contextos rapidamente mutáveis de suas produções, tudo isso significa que 
se o poder não tomar medidas corretivas agora, só alguns tipos de informação e portanto 
de pessoas e organizações na sociedade serão privilegiados na nossa memória social por 
este novo meio25. Por outro lado, a capacidade revolucionária e a velocidade da 
informação tecnológica para transmitir informações através de todas as mídias a públicos 
geográfica, social e culturalmente dispersos dota os arquivos de poder para tornar os 
registros acessíveis a um público empobrecido por esse mesmo acesso. O poder 
eletronicamente aumentado dos arquivos para prover acesso aos registros amplifica o 
poder tradicional dos arquivos para mediar o acesso aos registros. Através de práticas 
descritivas e arquitetura de sistemas, de seleção – em todos os níveis – para o acesso on-
line, da produção de exibições virtuais, os arquivos exercem poder sobre o que será 
conhecido do que foi preservado. 
As relações de poder nos arquivos estão implicadas no foco obsessivo na identidade, 
caracterizado na atitude intelectual frente às disciplinas desde os anos 8026. Esse discurso 
24 Agradecemos a Lilly Koltun por valorizar esses assuntos conosco. 
25 Para uma crítica mais detalhada ao longo dessas linhas, veja Terry Cook, "O impacto de David Bearman 
sobre o pensamento da arquivística moderna: um ensaio sobre assuntos pessoais de reflexão e de crítica", 
Archives and Museum Informatics 11.1 (1997): 15-37; e o ensaio por Brien Brothman no segundo desses 
dois assuntos temáticos. 
26 Para "dar um gosto" somente, veja, por exemplo, Eric Hobsbawn e Terence Ranger (eds.), A invenção da 
tradição (Cambridge, 1983); David Lowenthal, O passado é um país estrangeiro (Cambridge MA, 1985); 
Michael Kammen, Cordas místicas da memória: a transformação da tradição na cultura americana (Nova 
York, 1991); John Bodnar, Refazendo a América: memória pública, comemoração e patriotismo no século 
XX 
abrange exames da formação e das manifestações de identidades nacionais, étnicas, 
raciais e de gênero, classe e comunidades locais. O debate se divide em duas posições: 
uma visão essencialista da identidade (como “real”, intrínseca a indivíduos e 
comunidades, até biológica) e uma visão da identidade como construção (não menos 
“real”, mas criada culturalmente por razões políticas, sociais e históricas). 
Conscientemente ou não, os arquivistas são artífices das políticas de identidade. Eles 
avaliam, coletam e preservam os suportes das noções de identidade. Estas são 
confirmadas e justificadas como documentos históricos validados pela autoridade da 
“evidência”. Enquanto as relações entre arquivos e identidade ocorrem em diversos 
contextos históricos e culturais, questões comuns envolvendo o poder sobre os arquivos 
ligam as crises de identidade experimentadas por vários grupos subalternos que procuram 
construir uma identidade viável, autêntica e coesiva. Assim, o papel dos arquivos e 
arquivistas deve ser examinado contra esse pano de fundo de discurso sobre a identidade. 
A natureza sexista do arquivo através dos tempos é um forte exemplo de que os arquivos 
não são (nunca foram) neutros e objetivos na sociedade. Desde suas origens no antigo 
mundo, eles sistematicamente excluem registros sobre e por mulheres e, como 
instituições, têm sido agentes da criação do patriarcado ao apoiar os poderosos contra os 
marginalizados. Como Bonnie Smith mostra em The Gender in History: Men, Women 
 27 
and Historical Practice (O Gênero na História: Homens, Mulheres e a Prática Histórica 
), o surgimento da história “profissional” no século XIX (que coincide com a 
profissionalização dos arquivistas – treinados como historiadores), baniu a narrativa, o 
fantástico e o psíquico, o espiritual e o feminino ( e, claro, as arquivistas “amadoras”), 
em favor de homens (exclusivamente) buscando uma história “científica” e “profissional” 
nos arquivos e nos campos de batalha dos seminários universitários. Esses historiadores 
(e arquivistas) ignoraram a vida real das famílias, fazendas, das histórias e experiências 
de mulheres, das comunidades locais, entre outros, em favor da política nacional, da 
administração, diplomacia, guerra, e das experiências dos homens no poder. Esses 
historiadores (e arquivistas) veneravam e justificavam seus métodos e conclusões 
“científicos” como baseados em fatos, objetivos, neutros, frios – um meio de resgatar a 
Verdade sobre o passado27. 
O poder sobre o registro documental (????), e por extensão sobre a memória coletiva 
dos membros marginalizados da sociedade – sejam mulheres, não-brancos, gays e 
lésbicas, crianças, pobres, presidiários ou analfabetos – e sobre sua representação e 
integração nas metanarrativas da história, reside nas decisões que arquivistas e curadores 
de manuscritos tomam ao solicitar e avaliar as coleções, o modo de distribuir recursos 
institucionais para a 
(Princeton, 1992); John Gillis (ed.), Comemorações: a política da identidade nacional (Princeton, 1994); e 
Jonathan Vance, Morte tão nobre: memória, significado e a Primeira Guerra Mundial (Vancouver, 1997). 
27 Veja Bonnie G. Smith, O gênero da história: homens, mulheres e a prática histórica (Cambridge MA e 
Londres, 1998). Em A criação da consciência feminista (1993), Gerda Lerner devota um capítulo inteiro 
para mostrar de que maneira as mulheres têm procurado recuperar a sua própria história por meio da 
mudança do caminho da recolha de arquivos e descrição de documentos, freqüentemente tendo que 
patrocinar os arquivos elas mesmas. Veja também A criação do patriarcado (Nova York, 1986); Riane 
Eisler, A taça & a espada San Francisco, 1987); e Leonard Shlain, O alfabeto versus a deusa: o conflito 
entre a palavra e a imagem (Nova York, 1998) para críticas relevantes da natureza patriarcal do 
empreendimento arquivístico através dos séculos. 
 
procuração e processamento das coleções e a prioridade dada a sua difusão através de 
guias, publicações, exibições e sites. E quando os documentos desses grupos e indivíduos 
marginalizados chegam ao arquivo, osintegralistas e reformistas não são favorecidos 
contra os elementos mais radicais e segregacionistas? Os homens contra as mulheres? O 
urbano contra o rural? A questão é complexa, pois a culpa é às vezes do sexismo (ou 
racismo, ou classismo), mas às vezes é da ignorância ou indiferença. Mas sempre os 
arquivistas devem exercer seu poder para considerar a relevância histórica e a 
multiplicidade de vozes sem se submeter às agendas e prioridades em voga. 
Não se trata de “correção política”, pois os marginalizados por algumas funções na 
sociedade (e nos registros) podem ser corporações de negócios de direita em vez de 
sindicatos de direita, construtoras em vez de ambientalistas, o centro em vez das regiões, 
homens em vez de mulheres, racistas em vez de reformistas. O ponto é que os arquivistas 
devem procurar as vozes ocultas, pela complexidade das atividades humanas e 
organizacionais em estudo, para que os arquivos possam refletir as múltiplas vozes e não, 
por omissão, apenas as dos poderosos. Cautela aqui: É importante, como nota Verne 
Harris, não romantizar os marginalizados e não se auto-congratular por salva-los do 
esquecimento. Alguns não querem ser “resgatados” por arquivos oficiais e alguns se 
 28 
sentirão mais marginalizados ao serem nomeados como tal.28. Esses dilemas morais 
devem ocupar, mas não paralisar os arquivistas. Eles só podem acatar e respeitar o 
“Outro” e tentar contar a história mais completa possível, através de avaliação, descrição 
e alcance, “usando registros e locais de criação de registros como matérias-primas 
essenciais”. Claro, apesar de pesquisas cuidadosas e do “vigoroso exercício da razão”, 
arquivistas sensíveis sempre saberão “que outras histórias poderiam ter sido escolhidas 
para contar"29. 
Conclusão 
A memória, como a história, tem raiz nos arquivos. Sem eles, a memória falha, o 
conhecimento das realizações se apaga, o orgulho de um passado compartilhado se 
dissipa. Os arquivos combatem essas perdas. Eles contêm a evidência do que se passou. 
Especialmente no mundo moderno. Com o desaparecimento da aldeia, do prolongamento 
da família, compartilhar narrativas não é mais possível. O arquivo é a fundação restante 
do entendimento histórico. Eles ratificam nossas experiências, percepções, narrativas e 
histórias. Arquivos são nossas memórias. Mas o que acontece neles é pouco conhecido. 
Seus usuários (historiadores e outros) e moldadores (produtores e gestores de 
documentos, e arquivistas) acrescentam camadas de significado que se tornam “naturais”, 
internalizados e incontestados. 
Essa falta de questionamento é perigosa porque implicitamente apóia o mito arquivístico 
de neutralidade e objetividade e sanciona a já forte predileção dos arquivos e arquivistas 
por documentar primordialmente a cultura oficial e os documentos dos poderosos. Ela 
privilegia as narrativas oficiais do Estado sobre as narrativas dos indivíduos. Suas regras 
de evidência e autenticidade favorecem documentos textuais, dos quais essas regras 
foram derivadas, em detrimento de outras formas de experimentar o presente e ver o 
passado. Sua 
28 Veja especialmente Verne Harris, "Vendo por meio da cegueira: África do Sul, Arquivos e paixão por 
justiça", ensaio esboçado para a apresentação aos arquivistas da Nova Zelândia, agosto de 2001. 
29 Verne Harris, Explorando arquivos, p. 45. 
coloração positivista e “científica” inibe os arquivistas de adotarem múltiplas formas de 
ver e conhecer. 
A ordem original é imposta em vez de se procurarem novas ordens ou desordens entre os 
documentos e arquivos. E desorienta os arquivistas lidar com documentos eletrônicos, 
onde a intervenção ativa dos arquivistas, em vez do recebimento passivo de arquivos 
criados há tempos e depois descartados, é a única esperança de que a história de hoje 
possa ser escrita amanhã. 
Este par de números temáticos da “Archival Science”, no presente volume e no próximo, 
é uma colaboração que pretende impulsionar a profissão arquivística a pensar no que 
arquivos, registros e arquivistas fazem no nível teórico e filosófico, no poder que eles 
detêm, no impacto que produzem. É uma incursão num excitante terreno intelectual onde 
princípios positivistas encontram teorias pós-modernas, onde “verdades” arquivísticas 
têm conseqüências históricas. Eles exploram as “interfaces”, na sugestiva metáfora de 
Margaret Hedstrom, entre arquivos, documentos, e poder, e seu contexto cultural e 
tecnológico. Não se engajar nesse debate é uma forte opção pelo status quo, implicando 
 29 
apoiar o poder oficial. Gerando discussão e reação, esperamos forçar os mantenedores e 
os usuários dos arquivos a confrontar, com decisão, as atuais preocupações com 
intencionalidade, instrumentalidade, representação e poder30. 
TITLE 
Archives, Records, and Power: The making of modern memory. 
TITRE 
Archives, Documents et Pouvoir: La construction de la mémoire moderne. 
RESUMO 
Este artigo serve de introdução geral pelos autores convidados para o primeiro de dois 
assuntos temáticos da Revista Archival Science que irão explorar o tema "arquivos, 
documentos e poder". Arquivos como instituições e registros como documentos 
geralmente são vistos por acadêmicos e outros usuários e pela sociedade em geral, como 
recursos passivos a serem explorados por vários propósitos culturais e históricos. 
Historiadores desde a metade do século XIX, ao dotarem de cientificidade a história, 
necessitaram de um arquivo que fosse um depósito neutro de fatos. Até muito 
recentemente, os arquivistas foram obrigados a exaltar o mito da sua própria 
imparcialidade, neutralidade e objetividade. Contudo, os arquivos são determinados pelos 
poderosos para proteger e destacar sua posição na sociedade. É por meio dos arquivos 
que o passado é controlado. Certos fatos históricos são privilegiados e outros 
marginalizados. E os arquivistas são parte integrante desta forma de contar histórias. No 
projeto dos sistemas de arquivamento, na avaliação e seleção de um minúsculo fragmento 
dentre todos os possíveis documentos para fazer parte do arquivo, nos enfoques para 
subseqüente e sempre mutável descrição e preservação do arquivo, e em seus padrões de 
comunicação e uso, os arquivistas continuamente reformatam, reinterpretam, e 
reinventam o arquivo. Isso representa enorme poder sobre a memória e a identidade, sobre 
os modos fundamentais pelos quais a sociedade busca a 
30 Leitores notem que: os co-editores convidados unificaram a ortografia e a gramática para conformar o 
estilo canadense-inglês; entretanto, os estilos variados de notas de rodapé foram respeitados e somente 
foram feitos dentro de cada artigo, mas não para todos os artigos. 
evidência de quais foram e são seus valores centrais, de onde ele veio, e para onde está 
indo. Arquivos, então, não são depósitos passivos de coisas velhas, mas lugares ativos 
onde o poder social é negociado, contestado, confirmado. O poder dos arquivos, dos 
documentos e dos arquivistas não deveria continuar a ser neutralizado ou negado, mas 
estar aberto ao debate vital e à responsabilidade transparente. 
ABSTRACT 
This article serves as the general introduction by the guest editors to the first of two 
thematic issues of Archival Science that will explore the theme, “archives, records and 
power.” Archives as institutions and records as documents are generally seen by academic 
and other users, and by society generally, as passive resources to be exploited for various 
historical and cultural purposes. Historians since the mid-nineteenth century, in pursuing 
the new scientific history, needed an archive that was a neutral repositories of facts. Until 
very recently, archivists obliged by extolling their own professional myth of impartiality, 
neutrality, and objectivity. Yet archives are established by the powerful to protect or 
enhance their position in society. Through archives, the past is controlled. Certain stories 
 30 
are privileged and others marginalized. And archivistsare an integral part of this story- 
telling. In the design of record-keeping systems, in the appraisal and selection of a tiny 
fragment of all possible records to enter the archive, in approaches to subsequent and 
ever- changing description and preservation of the archive, and in its patterns of 
communication and use, archivists continually reshape, reinterpret, and reinvent the 
archive. This represents enormous power over memory and identity, over the fundamental 
ways in which society seeks evidence of what its core values are and have been, where it 
has come from, and where it is going. Archives, then, are not passive storehouses of old 
stuff, but active sites where social power is negotiated, contested, confirmed. The power 
of archives, records, and archivists should no longer remain naturalized or denied, but 
opened to vital debate and 
transparent accountability. 
RESUMÉ 
Cet article sert d’introduction générale par les auteurs invités pour le premier des deux 
sujets thématiques de la Revue Archival Science qui devra exploiter le thème “archives, 
documents et pouvoir”. Archives comme instituitions et registres comme documents sont 
généralement vus par l’académicien et par la societé en général comme ressources 
passives d’être exploités avec des objectifs culturels et historiques. Les historiens, dès la 
moitié du XIX siècle, ont donné du cientificisme à l’histoire et ont eu besoin de l’archive 
qui était vu comme un “dêpot” neutre des faits. Jusqu’à très peu de temps, les archivistes 
ont été obligés d’exalter le propre mythe de l’impartialité, neutralité et objectivité. Les 
archives n’étaient pas encore determinés par son pouvoir de protéger et réléver ses 
positions dans la societé. C’est par rapport les archives que le passé est controlé. Certains 
faits historiques sont privilegiés et d’autres sont mis à l’écart. Et les archivistes sont partie 
importante de ce discours historique. Dans le projet d’archivage, dans l’avaliation et 
sélection d’un miniscule fragment dans tous les possibles documents qui puissent faire 
partie de l’archive, avec point de vues variables pour ultérieure déscription et préservation 
de l’archive, et dans ses manières de communication et usage, les archivistes refont 
continuellement , réinterprètent et inventent de nouveau l’archive. Cela répresente 
énorme pouvoir sur la mémoire et l’indentité, sur les manières fondamentales sur 
laquelles la societé cherche l’évidence de que ses valeurs sont et ont été centrales, d’où 
ils sont venus et 
où ils vont. Les archives, alors, ne sont pas les depôts passifs de choses anciennes, mais 
lieux actifs où le pouvoir social est négociable, contesté et confirmé. Le pouvoir des 
archives, des documents et des archivistes ne devrait pas continuer à être nié, mais être 
ouvert au débat transparent et à la responsabilité. 
P ALAVRAS-CHAVE Teoria arquivística; arquivos e relações de poder; formação de 
identidade; representação e realidade; memória social. 
KEYWORDS 
Archival theory; archives and power relationships; identity formation; representation and 
reality; social memory. 
MOTS-CLÉS 
Théorie archivisthique; connexion entre archive et pouvoir; formation d’ identité; 
répresentation et réalité; mémoire sociale. 
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Rebeca Gontijo

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