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RESENHA SOBRE O FILME VALE DOS ESQUECIDOS E A COMPLEXIDADE DE DEMARCAÇÃO E DIVISÃO DE TERRAS

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
BACHARELADO EM DIREITO
DISCIPLINA: DIREITO DOS POVOS ORIGINÁRIOS
RESENHA ACERCA DO FILME VALE DOS ESQUECIDOS E A COMPLEXIDADE DE DEMARCAÇÃO E DIVISÃO DE TERRAS
A questão referente a propriedade e posse de terras no que tange aos povos indígenas e demais grupos que vivem nas matas e florestas ao longo do território brasileiro é, sobretudo, complexa. Nessa perspectiva, o filme Vale dos Esquecidos versa sobre um conflito de terras no nordeste do Estado do Mato Grosso e a retomada de território do povo A'uwe Uptabi após 46 anos. 
Destaca-se no mesmo a criação da maior fazenda existente no mundo na década de 70 detentora de1,5 milhões de hectares, denominada Fazenda Suiá-Missú.
Nessa perspectiva, conforme preceitua a autora Elizângela Cardoso de Araújo Silva, é válido ressaltar que: 
Com o avanço do capitalismo no campo, a terra cumpre a função de mercadoria (“terra de negócio”, nos termos de José de Souza Martins). Desse modo, a questão da “propriedade” da terra no Brasil é complexa. Em termos legais, dispomos de muitas modalidades de posse, porém a realidade e a legislação são instâncias marcadas pela desigualdade.
Na base dos conflitos de terra no Brasil está o interesse capitalista da burguesia agrária pela exploração da grande riqueza natural existente nas terras ainda ocupadas por indígenas e os limites da força política e econômica das diferentes modalidades de trabalhadores do campo, entre eles os povos originários.
No filme em tela, o bispo emérito Dom Pedro disserta acerca do cenário no qual se encontrava esta região quando da sua chegada. Assim, ele explana acerca da ausência de infraestrutura no local e também descaso e abandono por parte do próprio Estado. Ainda, que a grande problemática local era a Terra, quer dizer, a posse e propriedade das terras em relação aos indígenas, os posseiros, os grileiros, as pessoas sem-terra, os fazendeiros e também aqueles que trabalhavam para os fazendeiros. 
Cabível destacar que o conflito de terras entre esses grupos estava acontecendo em um contexto de ditadura militar e que o Brasil possuía uma postura latifundiária. Nesse contexto, é criada a SUDAM, a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia, a qual financiou a Fazenda Suiá-Missú por meio de 30 milhões de dólares, algo que somente foi possível em razão de um documento da FUNAI (Fundação Nacional do Índio) no qual atestava a inexistência de índios na região. 
Dessa forma, pode-se verificar o quanto o Estado há décadas figura como omisso em relação a questões de divisões de propriedade de terra para com os indígenas, ainda, fomenta e auxilia a agropecuária e o desmatamento nas regiões da Amazônia e em outros locais pelo país por meio de patrocínio e óbice a questão do reconhecimento da posse e propriedade dos povos originários, como os indígenas e quilombolas, e a consequente demarcação e divisão de terras. Corrobora-se o exposto conforme exegese da Caldart: 
[...] o que se observa em relação à terra no Brasil é uma complexa realidade que envolve, de um lado, múltiplas formas de acesso coletivo e comunitário, e lutas pelo seu controle democrático, no que diz respeito a terras indígenas, quilombolas, tradicionalmente ocupadas ou ocupadas pelos movimentos sociais em luta pela Reforma Agrária; e, de outro, a reafirmação de formas monopolistas de controle da propriedade da terra no Brasil, favorecidas por ações das diversas esferas do Estado brasileiro, seja quando nega a titulação de terras indígenas, rejeita o reconhecimento de terras quilombolas e não legitima terras tradicionalmente ocupadas, seja quando não desapropria para fins de Reforma Agrária as terras que descumprem a função social, favorece a grilagem de terras, garante a manutenção de latifúndios improdutivos intocados e preserva o direito de propriedade de quem utiliza mão de obra escrava. (Caldart et al. 2012, p. 444).
Nesse sentido, desde décadas passadas até os dias atuais, observa-se fortemente o viés econômico por trás das questões que envolvem as terras, haja vista o sistema capitalista vigente na sociedade uma vez que Governo e seus órgãos e representantes juntamente de empresários e fazendeiros, objetivam a posse e propriedade dos territórios para obtenção do lucro por meio da criação de gado, desmatamento das inúmeras árvores e exploração da fauna e flora de modo geral. Isto posto, não é de relevância para o Governo a efetiva demarcação de terras indígenas e quilombolas, direito dos mesmos uma vez que são povos originários, e sua consequente divisão e correta distribuição entre os inúmeros povos.
A propriedade possui assegurada constitucionalmente, conforme inciso XXIII, art. 5º, o atendimento a função social, no caso, como bem explanado pelo professor Dr. Valter Lúcio de Oliveira (PPGS/UFF), a função social da propriedade rural é ser produtiva, algo que seria realizado pelos povos indígenas e os demais que efetivamente possuam direito de habitá-la. Ainda, no que tange aos índios, direito este também garantido constitucionalmente que vem, contudo, sendo violado há décadas, vejamos: 
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
Cabível destacar que nesse contexto, ao longo dos anos, o país foi cenário de muita luta por parte dos indígenas, dos grupos sociais que o apoiam juntamente dos órgãos que de fato atuam em sua defesa, por isso, há legislação atualmente direcionada para a tutela destes povos. Porém, com a ganância e busca pelo lucro de grandes empresários, fazendários e, por vezes, a omissão ou negligência governamental, estes povos e sua proteção legislativa vivem em constante ameaça e instabilidade, sobretudo, a natureza que habitam como em locais como o Mato Grosso e a Amazônia. 
Portanto, explana Elizângela Cardoso que “embora reconheçamos a impossibilidade da norma, de a lei transformar a vida concreta, [...], e da função social do sistema jurídico na sociedade capitalista, é importante destacar o avanço normativo que trata dos direitos dos povos indígenas no Brasil. A aceitação social de que as terras indígenas são “direitos originários”, ou seja, antecedem a criação do próprio Estado brasileiro, é fundamental para os processos de demarcação, considerando as pressões constantes do grande capital através do agronegócio que amplia os processos de expropriação dos povos indígenas de suas terras.”
REFERÊNCIAS 
ALCANTARA, Gustavo Kenner. TINOCO, Livia Nascimento. MAIA, Luciano Mariz. Índios, direitos originários e territorialidade. Editora ANPR, Brasília, 2018.
ARAUJO SILVA, Elizângela Cardoso de. Povos indígenas e o direito à terra na realidade brasileira. São Paulo, 2018. 
CALDART, Roseli Salete. (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil). Pedagogia do Movimento Sem Terra: escola é mais do que escola. Editoria Vozes. Petrópolis, Rio de Janeiro, 2000. 
VALE DOS ESQUECIDOS. Direção: Maria Raduan. Brasil: Espaço Filmes, 2011.

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