Prévia do material em texto
FISIOLOGIA APLICADA A FISIOTERAPIA Isadora Rebolho Sisto Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar os princípios do treinamento físico e esportivo. � Diferenciar os principais tipos de treinamento físico e esportivo de acordo com a rota metabólica. � Relacionar o tipo de treinamento físico realizado de acordo com as adaptações observadas nos sistemas neuromusculares, cardiovascu- lares, cardiorrespiratórios e neuroendócrinos. Introdução A fisiologia do exercício estuda como o corpo humano, seus sistemas, órgãos e processos reagem e se adaptam fisiologicamente ao estresse agudo do exercício, ou seja, à atividade física, bem como ao estresse crônico do treinamento físico. Nesse sentido, antes de prescrevermos exercício físico, precisamos entender a fundo como o corpo funciona. Não é possível periodizar um treinamento de corrida, visando um objetivo, se não entendermos sobre as rotas metabólicas. Não temos como pensar em força muscular se não conhecemos as estruturas e como ocorrem as diferentes adaptações nos músculos. Além disso, de uma forma geral, o corpo não mantém estruturas que não estão sendo utilizadas, e isso é visto claramente no processo de destreino. Outro ponto importante que você deve ter sempre em mente é que o corpo está em constante busca por um equilíbrio, busca sempre a homeostase de seus sistemas. Portanto, neste capítulo você vai identificar os princípios do treina- mento físico e esportivo, diferenciar os principais tipos de treinamento de acordo com a rota metabólica de cada um e relacionar o tipo de treinamento físico realizado de acordo com as adaptações observadas nos sistemas neuromusculares, cardiovasculares, cardiorrespiratórios e neuroendócrinos. Os princípios do treinamento físico e esportivo Atualmente, inúmeros princípios do treinamento físico e esportivo estão sendo utilizados, apesar de sua validade ser questionável, porque poucos profissionais da área concordam com a maioria deles. No entanto, existem alguns que são aceitos por todos os profissionais do treinamento de força: o princípio da especificidade, o da sobrecarga progressiva, o da individualidade, o da variabilidade, o da manutenção e o da reversibilidade. Independente do objetivo do treinamento físico, existem alguns princípios que podem ser utilizados para qualquer programa de exercício físico (HEYWARD, 2011). Princípio da especificidade: Em uma definição mais básica, significa treinar de forma específica para produzir efeitos específicos. As respostas do organismo devem ser específicas para o tipo de exercício realizado. Por exemplo, para melhorar a resistência cardiorrespiratória, devem ser realizados exercícios com contrações contínuas e rítmicas de grandes grupos musculares; se o objetivo imediato é aumentar a força de 1-RM, é necessário treinar com amplitude de repetições, tempos de intervalo e frequência semanal apropriados, visando otimizar ganhos de força. Além disso, se o objetivo é melhorar o desempenho em algum esporte em especial, os exercícios devem imitar os movimentos exe- cutados na modalidade, além de serem realizados em uma velocidade similar. Princípio da sobrecarga de treinamento e progressão: Relacionado à ne- cessidade de utilizar cargas maiores para estimular o desenvolvimento dos componentes da aptidão física. É o aumento contínuo da intensidade da sessão de treino conforme o músculo se acostuma com o nível de intensidade atual. Isso pode ser feito aumentando o peso levantado, o número de repetições realizadas ou o número total de séries ou, ainda, diminuindo o tempo de descanso entre as séries. O aumento contínuo do estresse aplicado no músculo permite o incremento da força muscular e evita a estagnação. Pode ocorrer pelo aumento na frequência, intensidade, número de repetições, entre outras Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico2 formas de alcançar a sobrecarga. Ainda, é necessário aumentar gradualmente o volume ou a sobrecarga do treinamento para estimular melhora na aptidão física. Princípio da individualidade: É a teoria de que qualquer programa de trei- namento deve considerar as necessidades específicas ou os objetivos e as habilidades do indivíduo para quem o programa foi elaborado. Refere-se às diferenças que existem entre os indivíduos, o que interfere nas respostas individuais do treinamento. Princípio da variabilidade: Prediz alterações nas cargas de trabalho e no tipo de atividade física praticada em todas as fases do treinamento. A variabilidade deve ocorrer para que o aluno sofra constantemente quebra da homeostasia, com consequente alternância de ativação das vias metabólicas (aeróbia e anaeróbia), bem como das fibras dos tipos I e II. Quando não aplicamos esse princípio, corremos o risco de promover estagnação nos processos adaptativos e nas capacidades biomotoras treinadas naquele momento, ou seja, não importa o quão efetivo seja um programa de treino, ele o será apenas por um curto período. Uma vez que o indivíduo apresente adaptações específicas propor- cionadas por dado programa de treino, um novo estímulo deve ser aplicado nos músculos, ou o progresso contínuo ficará estagnado. Essa é a base da periodização, sendo a razão pela qual os ciclos de treino devem ser utilizados. Princípio da manutenção: Assim que o indivíduo alcança o seu objetivo, é necessário menos trabalho para manter o nível de força ou massa muscular. Se a pessoa estiver satisfeita com esse nível, a frequência de treino pode ser reduzida. Esse é tipicamente um bom período para incorporar outros tipos de treinamento, fazendo com que outros componentes da aptidão física possam ser aprimorados. Princípio da reversibilidade: os efeitos atingidos com o treinamento são gradualmente anulados com o destreinamento. Isso ocorre quando há ausência de treinamento físico ou quando o aluno retorna de períodos de recuperação de lesões. Por exemplo, uma vez que o programa de treinamento de força é interrompido ou não é mantido em um nível mínimo de frequência ou inten- sidade, as adaptações na força ou hipertrofia obtidas com o programa não somente deixarão de progredir, mas serão revertidas de volta ao ponto inicial. A partir do conhecimento dos efeitos do exercício físico no organismo, o fisioterapeuta pode realizar uma reflexão, pensando sobre quais efeitos gostaria 3Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico de proporcionar ao organismo, e, a partir dessa definição, pode estabelecer qual exercício físico se torna mais adequado para aquele indivíduo que será tratado. Modalidades de exercícios físicos Conforme as necessidades funcionais observadas pelo fisioterapeuta em seu paciente, existem diferentes modalidades de exercícios que podem ser utilizadas para suprir essas necessidades. Exercícios aeróbios Os exercícios aeróbios contribuem para melhorar a resistência cardiorrespira- tória por produzir aumentos significativos no consumo máximo de oxigênio (VO2 máx). Uma das modalidades de treinamento é o treinamento contínuo, que prioriza o exercício aeróbio em intensidade baixa a moderada, porém sem intervalos (repouso). Uma vantagem é a manutenção da intensidade do exercício, sendo mais seguro, confortável e mais adequado para indivíduos que estão iniciando um programa de exercícios aeróbios. Exemplos de treinamento contínuo são a caminhada, a corrida, o ciclismo e a subida de escadas. O treinamento descontínuo envolve a realização de vários blocos intermi- tentes de exercício aeróbio com intensidade de baixa a alta intercalada com períodos de descanso. Por ser intermitente, o treinamento descontínuo permite uma maior intensidade de exercício, assim como uma maior quantidade total de trabalho. Essa versatilidade do treinamento descontínuo torna-o muito utilizado por indivíduos com aptidão cardiorrespiratória baixa. Alguns exemplos desse treinamentosão o treino intervalado e o treinamento de força em circuito. A comparação das duas modalidades de treinamento, contínua ou descon- tínua, indica que o VO2 máximo melhora com maior intensidade no treino descontínuo quando o volume de exercício é controlado; no entanto, as duas opções de treino possuem vantagens e desvantagens. A escolha da melhor modalidade deve ir ao encontro do objetivo inicial do treinamento. Exercícios resistidos O exercício resistido tem como principal objetivo otimizar o funcionamento do desempenho muscular, restaurando, melhorando ou mantendo a força, a potência e a resistência à fadiga. Em consequência, é observado um aumento na força dos tecidos conjuntivos (tendões, ligamentos, tecido conjuntivo intra- muscular), maior densidade mineral óssea e menor enfraquecimento ósseo pela Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico4 desmineralização óssea. Além disso, ocorre uma diminuição da sobrecarga nas articulações durante a execução de atividades físicas e funcionais, redução no risco de lesões e aumento na sensação de bem-estar e qualidade de vida. Essa modalidade de exercício interfere diretamente no desempenho mus- cular por atuar na força, na potência e na resistência à fadiga conforme a intensidade, a frequência e a duração do exercício. O treinamento de força, por exemplo, é formado por exercícios de fortalecimento, nos quais a musculatura esquelética controla cargas pesadas (resistência) durante um número baixo de repetições ou por um curto período de tempo. A consequência é o aumento na capacidade do músculo de produzir forma máxima. O treinamento da potência muscular é embasado no treinamento de força muscular, pois esse é o elemento básico para o desenvolvimento de potência. Para implementar essa variável é necessário aumentar o trabalho do músculo ou reduzir o tempo necessário para produzir determinada força. Dessa forma, quanto maior a intensidade do exercício e menor o tempo necessário para gerar força, maior a potência muscular. Um exemplo desse treinamento é o treino pliométrico, que consiste de um alongamento rapidamente seguido de um encurtamento muscular. O treinamento de resistência à fadiga está relacionado à ação da musculatura esquelética em gerar movimento de uma carga leve por várias repetições ou, ainda, manter uma contração muscular por um longo período. Diferentemente do treino de força, as cargas utilizadas são leves no treinamento de resistência. A adaptação ocorre pelo aumento da capacidade oxidativa e metabólica do músculo, permitindo uma melhor distribuição e uso de oxigênio. Uma vantagem desse treinamento é gerar baixos níveis de sobrecarga sobre as articulações e tecidos moles. Diferenças entre os principais tipos de treinamento físico e esportivo O exercício físico é uma condição onde ocorre um aumento da demanda ener- gética do organismo visando a manutenção da atividade muscular. A energia derivada dos nutrientes ingeridos na alimentação tem fundamental importância para o fornecimento de energia química, contribuindo com a manutenção do trabalho muscular a partir da geração de adenosina trifosfato (ATP). Dentre os vários sistemas envolvidos no fornecimento energético para ressíntese de ATP, podemos destacar o papel das reservas de substratos energéticos, que, por diferentes vias de fornecimento de energia, contribuem para a constante homeostase energética (SILVERTHORN, 2017). 5Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico As reservas de substratos energéticos dos diferentes tecidos têm fundamental papel na manutenção da homeostase orgânica, uma vez que a impossibilidade de armazenamento de grandes quantidades de ATP nas células gera a contínua necessidade de sua ressíntese. As vias geradoras de energia pela utilização das reservas de substratos teciduais podem depender ou não da presença de oxigê- nio para a ocorrência de suas reações, sendo que a predominância dessas vias metabólicas tem íntima relação com a duração e a intensidade da atividade. O sistema de fornecimento de energia dependente de oxigênio (aeróbio) produz ATP continuamente, porém sua velocidade de produção é baixa. Nos momentos iniciais, devido ao aumento abrupto da necessidade energética, a ativação da via anaeróbia tem grande participação no fornecimento energético, em função do déficit inicial de oxigênio. Nessa fase inicial de transição, o composto de alta energia creatina-fosfato (CP) é o principal responsável pelo desempenho do trabalho muscular durante o exercício, principalmente nos segundos iniciais. Para iniciar um exercício, é necessário ter energia para que ocorra contração da musculatura esquelética, e essa energia é obtida por vias metabólicas. Inicialmente a energia é proveniente da quebra de moléculas de adenosina trifosfato (ATP) existentes nas fibras musculares. No entanto, pouco ATP existe nas fibras mus- culares, por isso a adenosina difosfato (ADP) proveniente da quebra do ATP passa a ser novamente convertida em ATP por ação do fosfato de creatina (FCr). Esse processo é denominado via anaeróbia alática e é sustentado por poucos segundos (em média 15 segundos) devido à pequena quantidade de FCr na fibra muscular. A continuidade do exercício exige que novas vias sejam ativadas para obtenção do ATP a partir de substratos provenientes de nutrientes. Parte desses substratos está localizada nas fibras musculares, enquanto a outra parte é direcionada pela corrente sanguínea de outras estruturas do corpo, como o fígado e o tecido adiposo, até a musculatura esquelética. Conforme a disponibilidade de oxigênio, pode ocorrer ou não a fosforilação oxidativa para fornecimento de ATP para a contração muscular. Em caso de existência de oxigênio, substratos como a glicose ou ácidos graxos podem ser metabolizados pela via aeróbia (via da glicólise-ciclo do ácido cítrico ou via oxidativa), e o piruvato, produto final, é convertido em acetil CoA para que participe do ciclo do ácido-cítrico. No caso de ser limitada a quantidade de oxigênio, o ATP passa a ser fornecido por vias anaeróbias a partir do subs- trato glicose, e o piruvato, proveniente da glicólise, é convertido em lactato (via anaeróbica lática). A produção do ATP é 2,5 vezes mais rápida pela via anaeróbica lática, porém apenas são produzidas 2 moléculas de ATP para cada molécula de glicose. Por outro lado, a via aeróbia é mais lenta, porém produz entre 30 e 32 moléculas de ATP para cada molécula de glicose. Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico6 Exercícios que necessitam de força, como o levantamento de peso ou corridas de curta distância e altíssima velocidade são muito dependentes do metabolismo anaeróbico. Nesse caso, existe uma predominância de ação das fibras musculares do tipo II, que possuem a capacidade de contração rápida e obtêm energia por meio da via da glicólise anaeróbia. Os exercícios de resistência e os aeróbios, como corridas de longa distância, necessitam principalmente do metabolismo aeróbio. As fibras musculares mais atuantes nessa situação são as fibras do tipo I, denominadas fibras lentas oxidativas, por serem altamente vascularizadas e com grande quantidade de mitocôndrias e mioglobina, produzindo energia pela quebra de ATP por oxidação aeróbica. Utilização de substrato energético durante o exercício Estudos recentes têm investigado a participação das diferentes vias metabólicas para o fornecimento de energia em várias condições experimentais. Ridell et al. (2001) avaliaram a utilização de substrato energético durante a realização do exercício (90 minutos de exercício em cicloergômetro a 55% do VO2máx) em meninos com idade entre 10 e 14 anos, discriminando a participação das gorduras e carboidratos no fornecimento de energia (Figura 1). Concordando com os achados clássicos, os resultados do estudo indicaram que a participação do metabolismo glicídico é reduzida com a passar do exercício, enquanto a contribuição por meio da oxidação das gordurasaumenta de maneira inversa (RIDELL et al., 2001). Figura 1. Porcentagem de contribuição energética proveniente de gordura e carboidrato. Fonte: Adaptada de Riddell et al. (2001). 100% 80% 60% 40% 20% 0% 10 30 50 70 90 % d a en er gi a to ta l Tempo gordura carboidrato 7Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico Vídeo sobre sistema energético nos diferentes tipos de exercício físico: aeróbico e anaeróbico. https://goo.gl/BcTPB8 Treinamento físico realizado de acordo com as adaptações observadas nos sistemas neuromusculares, cardiovasculares, cardiorrespiratórios e neuroendócrinos Adaptações neuromusculares O exercício físico é capaz de promover uma série de respostas no organismo humano; contudo, a magnitude dessas respostas dependerá das características pessoais apresentadas pelos indivíduos e do exercício realizado. No âmbito do treinamento físico, podem-se destacar as atividades de caráter aeróbio, que promovem o aperfeiçoamento funcional das fibras de contração lenta (TIPO IA) por meio do aprimoramento da capacidade respiratória das mitocôndrias, viabilizado pelo aumento do número e tamanho destas . O exercício anaeróbio, que tem os incrementos de força, potência e a ocor- rência da hipertrofia muscular como suas principais respostas representantes, e o treinamento concorrente, que, ao integrar os dois citados treinos em um mesmo plano regular de exercício físico, promove respostas adaptativas de me- nor amplitude quando comparadas às possibilitadas pelos referidos realizados isoladamente. Estímulos de tensão muscular, advindos fundamentalmente do treinamento de força, concretizam-se como o principal fator de ativação das células satélites (entre outros), pois esses estímulos (tensão) induzem a liberação dos fatores de crescimento hepatócitos dependes de óxido nítrico, que, por sua vez, interagem com as mencionadas células e iniciam uma cascata de eventos que sinalizam o estabelecimento da síntese do DNA e do consequente tecido musculo-esquelético, conforme demonstrado no Quadro 1. Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico8 Fo nt e: A da pt ad o de M ed ei ro s e S ou za (2 00 9) . Ti po d e ad ap ta çã o Re fe rê nc ia d e Es tu do Re sp os ta a da pt at iv a N eu ro fis io ló gi ca M or fo ló gi ca M et ab ól ic a Fo lla nd e W ill ia m s ( 20 07 ) Ro ss e t a l. (2 00 1) Ca m po s e t a l. (2 00 2) ; F ry e t a l. (2 00 3) ; D aw so n et a l. (1 99 8) ; Bl az ev ic h et a l. (2 00 3) Ro ss e L ev er itt (2 00 1) ; O rt en bl ad e t a l. (2 00 0) Fo lla nd e W ill ia m s ( 20 07 ); An de rs on e P ili po w ic z (2 00 2) , Ta ts um i e t a l. (2 00 2) , W oz ni ak et a l. (2 00 3) Bu rg om as te r e t a l. (2 00 6; 2 00 8) M ac do ug al e t a l. (1 98 4) ; K ub o et a l. (2 00 2) ; R ee ve s e t a l. (2 00 3) Ro ss e L ev er itt (2 00 1) ↑ Fo rç a e po tê nc ia ↑ Fo rç a e po tê nc ia ↑ Co nv er sã o en tr e os su bt ip os d e fib ra m us cu la r: do ti po II B pa ra II A ↑ Re tíc ul o sa rc op la sm át ic o ↑ Li be ra çã o e re m oç ão d o cá lc io in tr am us cu la r ↑ M as sa m us cu la r ↑A tiv aç ão d as c él ul as s at él ite s ↑ Re se rv a en er gé tic a: A TP , A TP -C P, gl ic og ên io m us cu la r ↑ D en sid ad e do te ci do c on ju nt iv o ↑ M et ab ol ism o gl ic ol íti co e fo sf og ên ic o ↑ Ap rim or am en to d a aç ão d a in su lin a Q ua dr o 1. A da pt aç õe s n eu ro m us cu la re s f re nt e ao e xe rc íc io a na er ób io 9Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico Os exercícios de resistência provocam adaptações musculares que controlam o fornecimento de energia. As adaptações que ocorrem com o treinamento promovem alterações no metabolismo muscular, adaptando-o para aumentar a velocidade das trocas entre os capilares e as células e consequentemente uma melhoria no desempenho físico (AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE, 2002). Adaptações cardiovasculares As respostas da pressão arterial (PAS e PAD) aos exercícios de resistência com alto componente isométrico, tais como o levantamento de peso, são diferentes das observadas durante exercícios dinâmicos, como corridas e caminhadas. Durante os exercícios isométricos de alta intensidade, a PA pode exceder em muito os valores referenciais de 120 e 80mmHg, respectivamente (AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE, 2002). Uma das razões para tal refere-se ao fato de que, nesses tipos de exercícios, é muito comum a utilização da manobra de Valsalva. Isso provoca um aumento exagerado na pressão intratoráxica, fazendo com que grande parte do aumento da PA ocorra na tentativa do organismo de suportar a elevada pressão interna causada por essa manobra. Diante disso, se o exercício realizado apresentar características isométricas, a obstrução mecânica do fluxo sanguíneo também pode aumentar a resistência vascular periférica. Esse mecanismo causará o aumento na PAS, principalmente pelo maior acúmulo de metabólitos que, ao acionarem os quimiorreceptores musculares, estimularão o sistema nervoso simpático, liberando catecolaminas. Por outro lado, nos exercícios dinâmicos, observa-se aumento da atividade nervosa simpática, que é desencadeado pela ativação do comando central, de mecanorreceptores musculares e, dependendo da intensidade do exercício, de metaborreceptores musculares. Contudo, sabe-se atualmente que uma única sessão de treinamento aeróbio ou de força é capaz de reduzir a resistência vas- cular periférica, causando assim um efeito hipotensor transitório. No exercício físico crônico, por sua vez, ocorre a reversão completa da rarefação capilar e da hipertensão arterial. Os mecanismos pelos quais o exercício físico reduz a PA ainda não foram completamente elucidados. No entanto, sabe-se que diferentes componentes têm grande participação na manutenção da homeostase pressórica (UNESCO, 2013; HOEHN; MARIEB, 2008; LANDOWNE, 2011): Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico10 a) redução da hiper-reatividade simpática; b) redução dos depósitos de gordura visceral; c) redução do estado inflamatório crônico; d) aumento da circulação de substâncias vasodilatadoras (adenosina, dióxido de carbono, etc.); e) redução da hiperinsulinemia; f) melhoria da função renal. Adaptações neuroendócrinas A regulação hormonal do metabolismo energético depende da intensidade e da duração do exercício. Cada secreção hormonal responde de uma forma, mais especificamente, aumenta de forma exponencial de acordo com o aumento da intensidade (MEDEIROS; SOUZA, 2009). O aumento dos hormônios catecolaminas, que possuem efeitos positivos, estimula a lipólise dentro dos músculos esqueléticos e do tecido adiposo, aumentando assim a atividade da fosforilase, que catalisa a degradação do glicogênio (glicogenólise), verificando-se o mesmo efeito de aumento nas concentrações de adrenalina, noradrenalina, glucagon, cortisol e GH. Esse aumento exponencial ocorre devido à modificação nas concentrações da glicose sanguínea e à estimulação do sistema nervoso simpático. A concentração de insulina durante o exercício progressivo tem padrão definido, com tendência a ficar inalterada ou reduzida (MEDEIROS; SOUZA, 2009). Mesmo exercícios de intensidade moderada tendem a causar diminuição nos níveis sanguíneos de insulina. Essa diminuição parece estar associada à maior liberação do hormônio adrenalina, o qual diminui a secreção pancreática de insulina. Com o aumento progressivo da frequência ou intensidade do exercício, induz-se ao aumento da intensidade do percentual do VO2max em função do aumento do consumo de glicose nos/pelos músculos, aumentando a sensibilidadeà insulina, bem como aumentando as concentrações de lactato sanguíneo e da acidose, que, por sua vez, inibem a liberação de insulina (UNESCO, 2013; HOEHN; MARIEB, 2008; LANDOWNE, 2011). Em exercícios intensos, representados pelas provas de velocidade no atle- tismo ou natação e até mesmo pelos estímulos de corrida de curta distância e de alta intensidade no futebol, o aumento das concentrações de catecolaminas no sangue é mais intenso, influenciando com isso o metabolismo celular nos músculos esqueléticos, nos músculos lisos, no músculo cardíaco, no tecido adiposo e no fígado (VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). 11Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico Esses efeitos ocorrem em função das concentrações aumentadas de ca- tecolaminas e produzem uma dependência quase total do catabolismo de carboidratos nos músculos, aumentando com isso o consumo de glicose pelo aumento da glicogenólise hepática induzido pela ação da adrenalina. No exercício prolongado, ocorrem reduções nos estoques do glicogênio hepático e muscular. Com as concentrações de glicogênio muscular reduzidas, ocorre o aumento ou aceleração do metabolismo da glicose, provocando reduções do açúcar sanguíneo e causando hipoglicemia. Essa reação ocorre com o exercício, que estimula a liberação de glucagon, sendo que esse hormônio atua de forma antagônica à insulina, que tem sua liberação diminuída quando ocorre trabalho muscular, principalmente como forma de tornar a glicose mais disponível para essa atividade (UNESCO, 2013). Outro ponto a ser salientado é que o processo de envelhecimento é acom- panhado por alterações dos sistemas neuromuscular e endócrino, tendo como consequência redução de força e massa muscular. O treinamento resistido tem sido apontado como eficaz em retardar o aparecimento de disfunções observadas em idosos. O treinamento resistido é uma atividade voltada para o desenvolvimento das funções musculares através da aplicação de sobrecar- gas, capaz de promover aumentos de força e massa muscular em idosos. Os exercícios resistidos induzem respostas fisiológicas agudas importantes para ganhos de força e hipertrofia muscular; alterações hormonais que promovam um ambiente anabólico apresentam papel importante nas adaptações crônicas induzidas pelo treinamento (HEYWARD, 2011). Tem sido demonstrado que os exercícios resistidos aumentam agudamente a concentração de testosterona total em homens e mulheres jovens. O cortisol, principal glicocorticoide secretado pela ativação do eixo hipotálamo-hipófise- -adrenal, apresenta função catabólica e parece sofrer elevação transitória após uma sessão de exercícios resistidos (BERNE et al., 2004). Além de todas as alterações supracitadas, os efeitos psicológicos e sociais também são de extrema importância: melhora a capacidade de trabalho; melhora a imagem de si próprio; redução da ansiedade e depressão; melhora sensação de bem-estar; melhora apetite e o ritmo de sono. Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico12 1. Os diferentes exercícios físicos estimulam diferentes vias metabólicas que exigem atuações diferenciadas do organismo. Sobre os efeitos do exercício físico sobre as vias metabólicas, marque a alternativa correta. a) A presença de oxigênio no organismo possibilita o início da via anaeróbia alática. b) Muita energia é produzida pela via anaeróbia lática, assim como é uma via rápida. c) As fibras musculares do tipo I são as principais fibras que atuam durante corridas de curta distância e máxima velocidade. d) As fibras musculares do tipo I possuem metabolismo oxidativo por apresentarem grande quantidade de mitocôndrias. e) As fibras musculares do tipo II possuem a capacidade de contração rápida pela obtenção de energia pela via aeróbica. 2. O conhecimento científico sobre a prática esportiva aponta para princípios que regem todo tipo de treinamento e que os tornam mais eficientes e seguros. A prescrição do exercício, independente da modalidade, deve considerar esses princípios dos exercícios físicos. Sobre estes princípios, marque a alternativa correta. a) O desenvolvimento da aptidão física é dependente apenas do aumento de intensidade ao longo do período de realização de exercício. b) O trabalho global de um exercício físico é a melhor alternativa para implementar respostas específicas. c) Quanto maior a aptidão física do indivíduo ao iniciar um treinamento, maiores os ganhos. d) O ritmo da melhora na aptidão física aumenta conforme aproxima-se do limite genético de cada indivíduo. e) Os benefícios do exercício físico são reversíveis depois de interrompido o período de treinamento. 3. Tanto os exercícios aeróbios quanto os exercícios resistidos possuem modalidades que desempenham efeitos adversos no organismo. A respeito desses exercícios, marque a alternativa correta. a) Os exercícios aeróbios realizados de forma contínua têm como vantagem manter a intensidade do exercício, alternando com pausas. b) O treinamento aeróbio descontínuo é interessante para indivíduos que possuem pouca condição cardiorrespiratória. c) O treino resistido pode prejudicar as articulações por causar sobrecarga nelas. d) O aumento da potência muscular está relacionado ao treino de resistência. e) O treinamento de resistência à fadiga exige que o movimento seja realizado com cargas leves. 13Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico 4. Toda atividade necessita de regras para sua organização, e, na atividade física, não é diferente, ainda mais quando trabalhamos de forma direcionada e com metas pré- estabelecidas. Para tanto, temos os princípios do treinamento, que norteiam qualquer programa ou atividade física, desde uma simples caminhada ou corrida até um treino de futebol, por exemplo. Seguir esses princípios é uma condição indispensável para que a atividade se torne proveitosa e saudável. Marque a resposta correta. a) Princípio global, sobrecarga progressiva, individualidade, variabilidade, manutenção e reversibilidade. b) Princípio da especificidade, sobrecarga progressiva, individualidade, variabilidade, manutenção e reversibilidade. c) Princípio da especificidade, sobrecarga progressiva, individualidade, variabilidade, manutenção e irreversibilidade. d) Princípio global, sobrecarga progressiva, individualidade, variabilidade, manutenção e irreversibilidade. e) Princípio da especificidade, sobrecarga progressiva, coletividade, variabilidade, manutenção e reversibilidade. 5. O exercício físico desencadeia respostas fisiológicas resultantes de adaptações autonômicas e hemodinâmicas que influenciam o sistema cardiovascular. Dentre as adaptações cardiovasculares agudas do exercício físico, marque a correta. a) Diminuição da pressão arterial. b) Diminuição da frequência cardíaca. c) Aumento do tônus simpático. d) Aumento do tônus parassimpático. e) Diminuição da frequência respiratória. AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE. Manual de pesquisa das diretrizes do ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. BARRET, K. E. et al. Fisiologia médica de Ganong. 24. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. (Série Lange). BERNE, R. M. L. M. et al. Fisiologia. 5. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. HEYWARD, V. H. Avaliação física e prescrição de exercício: técnicas avançadas. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011. HOEHN, K.; MARIEB, E. N. Anatomia e fisiologia. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. LANDOWNE, D. Fisiologia celular. Porto Alegre: AMGH, 2011. (Série Lange). Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico14 MEDEIROS, R. J. D.; SOUZA, M. S. C. Adaptações neuromusculares ao exercício físico: síntese de uma abrangente temática. CONEXÕES: Revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, v. 7, n. 1, p. 98-120, 2009. Disponível em: <https://periodicos.sbu.uni- camp.br/ojs/index.php/conexoes/article/view/8637788/5479>. Acesso em: 10 jan.2019. RIDELL, M. C. et al. Substrate utilization during exercise with glucose and glucose plus fructose ingestion in boys ages 10-14 yr. Journal of Applied Physiology, v. 90, n. 3, p. 903-911, 2001. SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. UNESCO. Fisiologia do exercício. Brasília, DF: Fundação Vale; Unesco, 2013. (Cadernos de referência de esporte, 2). VANPUTTE, C.; REGAN, J.; RUSSO, A. Anatomia e fisiologia de Seeley. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2016. Leituras recomendadas ABREU, P.; LEAL-CARDOSO, J. H.; CECCATTO, V. M. Adaptação do músculo esquelético ao exercício físico: considerações moleculares e energéticas. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v. 23, n. 1, p.60-65, jan./fev. 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ rbme/v23n1/1517-8692-rbme-23-01-00060.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2019. COSTANZO, L. S. Fisiologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. CURI, R.; ARAÚJO FILHO, J. P. Fisiologia básica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. HALL, S. J. Biomecânica básica. 5. ed. Barueri, SP: Manole, 2009. LANDOWNE, D. Fisiologia celular. Porto Alegre: AMGH, 2011. (Série Lange). MARTINI, F. H.; TIMMONS, M. J.; TALLITSCH, R. B. Anatomia humana. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. (Coleção Martini). NEUMANN, D. A. Cinesiologia do aparelho musculoesquelético: fundamentos para a reabilitação física. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. SHUMWAY-COOK, A.; WOOLLACOTT, M. H. Controle motor: teoria e aplicações práticas. 3. ed. Barueri, SP: Manole, 2010. SMITH, L. K.; WEISS, E. L.; LEHMKUHL, L. D. Cinesiologia clínica de Brunnstrom. 5. ed. Barueri, SP: Manole, 1997. 15Treinamento esportivo e desempenho anaeróbico e aeróbico Conteúdo: