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Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Museu Nacional 
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FACETAS DO RÁDIO 
Uma Etnografia das Emissoras de Ilhéus (Sul da Bahia) 
 
 
 
 
 
 
 
 
Silvia Garcia Nogueira 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Fevereiro de 2005 
 
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Museu Nacional 
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social 
 
 
 
 
 
 
 
FACETAS DO RÁDIO 
Uma Etnografia das Emissoras de Ilhéus (Sul da Bahia) 
 
 
 
 
Silvia Garcia Nogueira 
 
 
 
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu 
Nacional da Universidade Federal do Rio de 
Janeiro 
 
 
 
 
 
Marcio Goldman 
Orientador 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Fevereiro de 2005 
 
FOLHA DE APROVAÇÃO 
 
 
SILVIA GARCIA NOGUEIRA 
 
 
FACETAS DO RÁDIO 
UMA ETNOGRAFIA DAS EMISSORAS DE ILHÉUS (SUL DA BAHIA) 
 
 
 
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu 
Nacional da Universidade Federal do Rio de 
Janeiro 
 
 
Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 2005. 
 
 
__________________________________________________ 
Marcio Goldman 
(Doutor, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social – Museu Nacional 
Universidade Federal do Rio de Janeiro) 
 
__________________________________________________ 
Federico Neiburg 
(Doutor, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social – Museu Nacional 
Universidade Federal do Rio de Janeiro) 
 
__________________________________________________ 
Antonádia Monteiro Borges 
(Doutora, Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social – Museu Nacional 
Universidade Federal do Rio de Janeiro) 
 
__________________________________________________ 
Christine de Alencar Chaves 
(Doutora, Departamento de Antropologia 
Universidade Federal do Paraná) 
 
__________________________________________________ 
Isabel Siqueira Travancas 
(Doutora, Bolsista do CNPq) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Para Yasmin, cada minuto no 
campo e todas as linhas desta tese. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
 
“ Nada está fora, nada está dentro. 
 Pois o que está fora está dentro” 
(Bilhete de Erwin para Friedrich, em O Livro 
das Fábulas, de Hermann Hesse) 
 
 
 
 
Os agradecimentos que virão a seguir são dirigidos a todos àqueles com os quais tenho, de 
maneiras distintas, uma dívida de gratidão fundada nesses cinco anos de caminhada. 
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a todos os radialistas com os quais convivi em 
Ilhéus. A Jonildo Glória, em particular, que mesmo depois da volta para o Rio continuou tão 
disponível para responder às minhas dúvidas quanto durante meu trabalho de campo. 
Campo, aliás, somente possível devido ao total apoio do meu orientador, Marcio 
Goldman, que além de ter viabilizado os recursos necessários para sua realização, me apresentou 
ao município e contagiou-me com suas conversas sobre o lugar. Aproveito a oportunidade para 
agradecer também a convivência ao longo dos dez anos da nossa relação acadêmica, que se 
iniciou no mestrado, e a liberdade e a confiança depositadas para a realização deste trabalho. 
Ao professores José Sérgio Leite Lopes, Federico Neiburg e Gilberto Velho agradeço os 
ricos comentários proferidos na ocasião do meu exame de qualificação (primeira e segunda 
fases). Agradeço ainda a todos os demais professores do PPGAS com os quais convivi e em 
especial àqueles que contribuíram, por meio de suas aulas, à minha passagem do jornalismo para 
a antropologia. 
Só posso dizer muito obrigada aos professores Federico Neiburg, Antonádia Borges, 
Christine Chaves e Isabel Travancas, que aceitaram participar da banca examinadora desta tese. 
Longe de ser um agradecimento formal, agradeço sinceramente a oportunidade ímpar de ter um 
trabalho lido e criticado com tanta dedicação. Estendo os agradecimentos aos suplentes da banca, 
Otávio Velho e José Carlos Rodrigues, por terem aceitado “correr o risco” de precisarem 
participar da defesa. 
Para Isabel Travancas e José Carlos Rodrigues, um agradecimento especial – mesmo que 
ambos não me inspirassem academicamente com seus trabalhos desenvolvidos na interface 
Antropologia/Comunicação, os nossos encontros formais ou informais, sempre prazerosos, já 
justificariam o agradecimento. 
Sem os recursos financeiros que obtive da Capes (bolsa de doutorado), da Faperj (bolsa de 
doutorado, “programa Bolsa Nota 10”) e do Nuap/Pronex (que possibilitou minha ida e a 
permanência em Ilhéus) nada teria sido possível. Obrigada. 
Aproveito para agradecer também a convivência e a amizade de todos os colegas do 
Museu Nacional. Isso inclui também os funcionários da secretaria (Tânia, Luís Cláudio, Rose, 
Rita) e da biblioteca (Maria Izabel, Cristina e Carla). Para estas, um carinhoso agradecimento 
pelas inestimáveis ajudas, particularmente neste final de tese. 
Não é possível falar em final de tese sem lembrar de duas pessoas muito generosas: 
Georgina Marçal e David Rodgers (com Ana Paula). A primeira pelo atendimento de um pedido 
de última hora para revisar o texto (pagarei com prazer pelos serviços prestados: comprar 
roupinhas de bebê para uma família carente que ela ajuda). Nas mesmas condições de prazo, de 
uma noite para um dia, David aceitou sem qualquer porém transformar meu resumo em um 
abstract. Muito obrigada. 
Embora sejam os últimos nesta lista de agradecimentos, meus pais, minha filha e meu 
amor com certeza estão entre aqueles com os quais minha dívida de gratidão é maior – eterna, eu 
diria. A Heitor e Mirian, não tenho como pagar o apoio operacional, emocional, afetivo e 
intelectual para a realização desta tese (na verdade, ao longo da vida). A Yasmin, anexo ao 
agradecimento um pedido de desculpas por tê-la levado involuntariamente para morar longe de 
casa (consolo-me, contudo, por entender que essa experiência enriqueceu sua vida) e o aviso de 
que “mamãe voltou”. A Paulo César respondo definitivamente à sua constante pergunta “em que 
posso te ajudar?”: já ajudou muito e o tempo todo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
 
 
Este trabalho pretende apresentar uma análise etnográfica de cinco emissoras de rádio em 
Ilhéus (Sul da Bahia), contemplando as relações que se estabelecem dentro desse universo. 
Procura, ainda, investigar a inserção do rádio em uma dimensão mais ampla no município - por 
exemplo, em interação com esferas políticas e religiosas -, com a intenção de inspirar reflexões 
sobre os significados sociais do rádio e o exercício profissional de radialista. Tendo como base as 
visões nativas acerca das experiências vivenciadas pelos participantes desse universo, esta tese 
abandona a idéia do rádio como um meio de comunicação de massa para tratá-lo como um 
espaço social com múltiplas facetas. 
 
 
ABSTRACT 
 
 
 
This thesis looks to provide an ethnographic analysis of five radio stations in Ilhéus (south 
of Bahia state, Brazil) through a close examination of the relations generated within this universe. 
It also investigates the ways in which radio is inserted within a wider local space – including, for 
example, its interaction with political and religious spheres – as a means of deepening our 
understanding of the social meanings of radio and the radio broadcasting profession. Taking as its 
basis native ideas concerning the experiences of people involved in this universe, the study 
abandons the idea of radio as a medium of mass communication in order to explore it as multi-
faceted social space. 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO …………………………………………………………………........................11 
CAPÍTULO 1 - OS RADIALISTAS E SUAS MEMÓRIAS ...................................................35 
 1.1 Trajetórias das rádios....................................................................................................41 
 1.1.1 Rádio Culturade Ilhéus..................................................................................45 
 1.1.2 Rádio Jornal/Rádio Santa Cruz .....................................................................49 
 1.1.3 Rádio Baiana/Rádio NovoTempo/Rádio Baiana...........................................61 
 1.1.4 Rádio FM Cidade de Ilhéus...........................................................................67 
 1.1.5 Rádio Gabriela FM........................................................................................70 
 1.2 Percepções nativas do passado no presente: política, tecnologia e interior..................73 
 
CAPÍTULO 2 – RÁDIO: PROFISSÃO ......................................................................................83 
 2.1 Trajetória do rádio no Brasil.........................................................................................85 
 2.1.1 Neutralidade e parcialidade............................................................................88 
 2.2 Ingresso na carreira de radialista..................................................................................94 
 2.2.1 Idealismo na época boa do rádio e missão profissional..............................102 
 2.2.2 Voz, nomes de radialistas e gêneros de programa.......................................104 
 2.2.2.1 Esporte e polícia............................................................................112 
 2.3 Premiações..................................................................................................................113 
 2.3.1 Condutas passíveis de reprovação................................................................115 
 2.4 Sindicato.....................................................................................................................121 
 2.4.1 Cargos, salários, jornadas de trabalho..........................................................124 
 2.5 Conflitos e dilemas profissionais................................................................................129 
 2.5.1 Locutor ou comunicador?............................................................................132 
 2.5.2 Script ou improviso?....................................................................................135 
 2.5.3 AM ou FM?..................................................................................................138 
 2.5.4 Um vício, um carma ou um grande amor?...................................................141 
 2.6 Entrosamento e cooperação profissionais...................................................................147 
 
CAPÍTULO 3 – RÁDIO E POLÍTICA ....................................................................................154 
 3.1 As rádios, os políticos e a política..............................................................................156 
 3.1.1 Trabalho social: demandas, encaminhamentos, atendimentos....................162 
 3.2 As rádios e os recursos................................................................................................167 
 3.2.1 Popularidade, prestígio e parceria................................................................172 
 3.2.2 Adesão sem dependência da política...........................................................174 
 3.3 O jogo.........................................................................................................................179 
 3.3.1 Radialistas: formas de pressão e procedimentos defensivos........................180 
 3.3.2 Estratégias dos políticos...............................................................................185 
 3.4 Assessoria de Comunicação Social.............................................................................191 
 3.4.1 O Assessor de Imprensa...............................................................................196 
3.5 Radialista ou político?................................................................................................200 
3.6 Dominação dos meios de comunicação de Ilhéus: breve comentário........................208 
 
CAPÍTULO 4 – RÁDIO E IGREJA .........................................................................................212 
 4.1 O primeiro contato em 2000.......................................................................................216 
 4.1.1 Rádio Novo Tempo......................................................................................219 
 4.1.1.1 Entre marretadas e férias, com respeito........................................223 
 4.1.2 Rádio Cultura e FM Cidade.........................................................................226 
 4.1.2.1 As grades e as barreiras invisíveis.................................................228 
 4.2 A volta em 2002: sem a Novo Tempo........................................................................233 
 4.2.1 Repórter da Globo disfarçada......................................................................237 
 4.2.2 Operação credencial.....................................................................................238 
 4.3 Os radialistas não evangélicos e os pastores...............................................................241 
 4.3.1 Entre sussurros e espreitas...........................................................................244 
 4.3.2 Alternativa: ser do sindicato........................................................................248 
 4.4 Mundo do rádio e mundo da Igreja............................................................................250 
 4.4.1 Normas de condutas apropriadas dentro e fora da emissora........................254 
 4.4.2 Status diferenciados.....................................................................................258 
 4.4.3 Quem quer e quem não quer trabalhar em uma rádio religiosa...................262 
 4.5 Mundo da Igreja e universo político...........................................................................264 
 
CAPÍTULO 5 – RADIALISTA E OUVINTE ..........................................................................271 
 5.1 Combate à solidão e meio de socialização..................................................................282 
 5.2 Personagens, personalidades: o radialista e seu duplo................................................287 
 5.3 Rádio e Internet...........................................................................................................293 
 5.4 A voz e a aparência.....................................................................................................298 
 5.4.1 Voz bonita e padrão de beleza.....................................................................302 
 5.5 Meios de contatos: cartas, telefonemas, visitas..........................................................308 
 5.5.1 Por carta: denúncia, apelo, pedido, promoção, elogio.................................309 
 5.5.2 Ao telefone: opinião, alô e recado...............................................................315 
 5.5.3 Visitas à rádio..............................................................................................320 
 5.6 Criar intimidade ou dar ousadia: os limites da relação entre radialista e ouvinte.....323 
 5.7 Radialistas e ouvintes.................................................................................................330 
 
CONCLUSÃO............................................................................................................................338 
GLOSSÁRIO..............................................................................................................................348 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................................362 
 11 
INTRODUÇÃO 
 
“...o processo químico onde palavras se juntam 
a outras palavras em sentenças para formar 
 um composto mais complexo” 
(Louise Varèse) 
 
 
Sobre o que é esta tese? A resposta à pergunta feita ao longo de todo o processo de 
pesquisa - trabalhode campo, leitura de bibliografia, análise de material e redação - foi ganhando 
substância ao longo do tempo. É uma descrição analítica de cinco emissoras de rádio de Ilhéus, 
no Sul da Bahia, e uma análise etnográfica das relações que se estabelecem dentro desse 
universo, daquilo que o compõe, e o insere em uma dimensão social mais ampla. Trata-se, ainda, 
de um estudo que pretende inspirar reflexões sobre os significados sociais do rádio e discutir 
algumas questões relativas ao próprio veículo de comunicação e ao exercício da profissão de 
radialista. 
 Tais possibilidades de leitura da tese fazem referência a um conjunto de dados coletados 
ao longo de 11 meses de pesquisa, divididos em dois períodos - julho a dezembro de 2000 e 
fevereiro a julho de 2002. Durante esse tempo, ocorreu uma modificação de foco. A proposta 
inicial, norteadora do primeiro trabalho de campo, era investigar a dinâmica dos meios de 
comunicação em um contexto social relativamente passível de controle analítico, de modo que 
fosse possível tecer uma espécie de quadro etnográfico local de algo que eu chamaria de meio 
jornalístico. Essa pretensão correspondia à expressão de um desejo de dar continuidade a um 
trabalho de pesquisa anterior, que teve como objeto de investigação as redações de dois grandes 
jornais no Rio de Janeiro (Pereira 1998). Desta vez, a idéia era tentar ampliar o espectro de 
 12 
determinadas linhas de questões levantadas, já que elas foram limitadas naquela ocasião a uma 
única mídia. 
 A escolha dos veículos para investigação foi estabelecida a partir da pergunta sobre quais 
eram as principais fontes de informação da população de Ilhéus, o município selecionado por 
atender a exigências como tamanho da população (pelo Censo Demográfico/2000 do IBGE, 
222.127 habitantes, dos quais 162.125 residentes na área urbana) e acesso a diferentes tipos de 
meios de comunicação.Antes, porém, a opção por Ilhéus se deveu ao fato de que o orientador 
desta tese e outros pesquisadores a ele relacionados haviam empreendido - ou ainda estavam 
desenvolvendo - estudos no local, o que facilitaria em grande medida a entrada no campo, tanto 
em relação aos aspectos operacionais (onde ficar, como circular no município) quanto às 
informações prévias à pesquisa (quantos e quais os veículos de comunicação social, panorama 
político municipal, dados sobre diferentes segmentos sociais, literatura local). 
Para chegar à lista final dos meios de comunicação a serem estudados, foram feitas 
observações e estabelecidas conversas informais nas bancas de jornal com os jornaleiros, 
consultas a profissionais da imprensa local, observação do dia-a-dia das pessoas na rua. Foram, 
portanto, obedecidos dois critérios principais para a seleção final: o primeiro, centrado nas 
minhas próprias impressões ao chegar ao município e consulta anterior ao orientador deste 
trabalho; o segundo, tendo por base as indicações de pessoas com quem mantive contato assim 
que cheguei. 
 Essa última orientação serviu na verdade como direcionamento para quase tudo na 
pesquisa, em sua dimensão metodológica inicial: procurou-se seguir sempre sugestões nativas 
sobre quem ouvir. Como numa configuração arbórea, foram sendo tecidos galhos de relações, em 
níveis cada vez mais complexos. Obviamente, alguns nomes apareciam mais repetidamente que 
outros, assim como suas respostas às minhas perguntas sobre os meios de comunicação mais 
 13 
utilizados como fontes e outras indagações posteriores. Estariam contempladas, assim, duas 
emissoras de televisão localizadas no município vizinho (Itabuna), cinco emissoras de rádio em 
Ilhéus, dois jornais semanais de Itabuna e um diário local. 
 Desse modo, no primeiro trabalho de campo, procurou-se fazer um mapeamento dos 
meios de comunicação, tentando entender a dinâmica de integração entre eles e suas rotinas 
particulares. Paralelamente, foi sendo construído um quadro de relações entre os diversos 
profissionais e destes com outros segmentos da sociedade local, como o político. Para chegar a 
esses dados, acompanhou-se diariamente o cotidiano das emissoras e redações, e foram realizadas 
entrevistas formais e informais com os profissionais. 
 No intervalo até o trabalho de campo seguinte, ficou claro que o tempo limitado para 
realizar a pesquisa não possibilitaria conhecer em profundidade a dinâmica do meio jornalístico 
local. Analisando o material, foi feita a opção por concentrar a análise nas emissoras de rádio de 
Ilhéus, uma vez que, se por um lado, era o veículo que estava exclusivamente sediado no 
município, por outro, e talvez por esse fato mesmo, parecia ser o que interagia com maior 
proximidade e regularidade da vida social local, tanto em seus níveis institucionais (relações com 
a prefeitura, a câmara de vereadores, a associação comercial, etc.) quanto de modo interpessoal, 
no contato constante e direto com as pessoas no município - moradores ou gente de passagem. 
 Um outro fator determinante, de ordem pessoal, foi o fato de desde o início eu ter sido 
bem recebida entre os radialistas. O acesso a eles e a empatia ocorrida desde o primeiro momento 
do contato foram significativos. Essa sensação, porém, diz respeito a algo além de uma 
experiência pessoal. Trata-se de uma característica do próprio meio estabelecer proximidade com 
quem entra em relação. Por isso, é considerado por eles como o veículo de mais fácil acesso à 
população em geral. Ou, na linguagem dos radialistas locais, o mais popular. 
 14 
 O segundo trabalho de campo consistiu no acompanhamento diário das atividades 
desenvolvidas nas emissoras, em entrevistas formais e informais com quase todos os radialistas 
atuantes e na convivência fora dos recintos das emissoras. Com a confiança adquirida a partir do 
cumprimento da promessa de volta em um outro período para dar seguimento à pesquisa, 
modificando a natureza das nossas relações - de pesquisadora do Rio de Janeiro para Silvinha -, 
o método da observação participante foi delineando cada vez mais o meu nível de participação 
nas atividades profissionais daqueles que formalmente constituíam meu objeto de pesquisa. 
 Se antes eu eventualmente era chamada para opinar no ar sobre determinados assuntos, 
por minha autoridade acadêmica, passei a ser estimulada a fazer outros tipos de tarefas nos 
bastidores. Ajudei a produzir programas, fiz sorteios no ar, atendi pessoas que procuravam as 
emissoras, simulei ser alguém entrevistado na rua, passei até mesmo a ser reconhecida por 
ouvintes. Tornei-me também confidente, pela aquisição de um status ao mesmo tempo de alguém 
de fora e da casa, dependendo do tipo de comportamento que se esperava de mim e da visão 
particular de cada um dos radialistas a meu respeito 
 A união das informações panorâmicas obtidas no primeiro período da pesquisa com os 
dados mais específicos no segundo permitiu um entendimento maior do modo como 
cotidianamente os acontecimentos concretos nas emissoras referem-se simultaneamente a um 
estrutura social mais ampla e a um momento de interação específico. Foi justamente essa 
percepção que tornou possível a pretensão de tentar construir uma análise do que seja não tanto o 
“mundo”, mas o universo do rádio em Ilhéus dentro do qual gravitam diferentes atores sociais 
com variados propósitos e expectativas. 
 A noção de universo implica em compreender aquela realidade recortada para análise de 
um modo tal que as fronteiras que definem seus limites não possam ser cristalizadas de forma 
alguma, pois a etnografia realizada indica que os limites não podem ser precisamente definidos 
 15 
nem pela natureza do próprio meio (a imprecisão do alcance das transmissões, a falta de 
conhecimento sobre todos os que efetivamente ouvem rádio e de que modo, os efeitos 
instantâneos e de longo prazo dos conteúdos veiculados sobre os ouvintes) nem pela dinâmica 
das emissoras e dos profissionais em interação entresi e com diversos outros segmentos da vida 
social em que estão inseridos. 
Essa opção não significa que não existam particularidades próprias comuns a 
determinadas pessoas a quem são atribuídos os pertencimentos a um grupo específico, o de 
radialistas, e tudo o que isso afeta. A identificação indivíduo-universo profissional é definida por 
meio de muitas frentes, variando desde a legislação profissional que indica quem é ou não 
formalmente radialista até o que poderíamos chamar de um estilo, um jeito de ser, em 
determinadas ocasiões. Antes, o que se defende é que essas são marcas importantes na vida real 
das pessoas identificadas como radialistas, embora não definam necessariamente todas as ações, 
as visões sobre a realidade experimentada, os sentimentos, as condutas e os valores que, em 
última instância, compõem o que as pessoas são e como se posicionam no mundo. 
 Em conseqüência da adoção desse tipo de olhar, o rádio como um meio de comunicação 
de massa é destituído de sua característica de massa e tratada com um meio de comunicação que 
instaura um tipo particular de sociabilidade, na medida em que serve tanto de cenário quanto de 
motivo para que relações de diferentes naturezas aconteçam. As pessoas entram em relação e 
interagem nas rádios, com as rádios (e seus profissionais) e devido às rádios. 
De modo geral, os sujeitos da comunicação (emissores e receptores das mensagens) não 
são nem desconhecidos nem indefinidos. O trabalho de pesquisa mostrou, assim, a pouca 
rentabilidade do uso da noção de massa para analisar as relações concretas que se desenvolvem 
no universo estudado. Essa constatação etnográfica dá origem, portanto, a uma das teses deste 
trabalho: a de que as mensagens radiofônicas quase sempre possuem destinatários 
 16 
predeterminados e conhecidos, embora o que poderia ser chamado de massa (ver mais adiante) 
também capte as mensagens. O mecanismo que permite isso é a existência de um conjunto de 
códigos dos quais os significados das mensagens estão dotados, cujo acesso é restrito aos reais 
interlocutores. 
Assim, quando um radialista dedica uma música para uma ouvinte dizendo que é para 
você, ouvinte, minha flor, para todas as ouvintes pode significar que ele está dedicando a música 
para cada uma em particular. No entanto, sua intenção é estabelecer uma comunicação restrita 
com a pessoa para quem ele efetivamente dedicou a canção – o código flor é combinado 
previamente com a destinatária da mensagem –, e esta sabe que é para ela que a mensagem foi 
emitida. Do mesmo modo, quando nas rádios se critica os serviços prestados por uma secretaria 
municipal, o objetivo de cumprir um serviço de utilidade pública é a leitura feita geralmente pelo 
público. O grupo político no poder, porém, ao ouvir a mensagem – e foi para ele que se emitiu a 
mensagem - entende que se trata de um recado enviado no ar de que é preciso negociar novos 
anúncios e maior apoio financeiro. Trata-se, portanto, de uma “linguagem subterrânea” (Goffman 
1975: 180) estabelecida entre eles, embora captada em outro registro pelos demais receptores da 
transmissão. 
Uma outra tese que atravessa todo o trabalho é a de que o termo rádio é simultaneamente 
um lugar físico, uma atividade profissional e um espaço social, fazendo parte da vida cotidiana 
local em suas dimensões concretas e simbólicas. Em sua constituição, encontram-se bens 
materiais e imateriais, equipamentos e pessoas, normas e sentimentos, condutas e valores. A 
definição do que é rádio em Ilhéus ocorre no instante mesmo em que se desenrolam as diversas 
situações cotidianas e nas referências feitas a ele pelos atores envolvidos. Em decorrência disso, 
ser radialista corresponde simultaneamente a um processo de construção social – na medida em 
que os profissionais são legitimamente reconhecidos como tais e seguem trajetórias que os 
 17 
qualifiquem para exercerem essa função – e de construção de si, não só por meio de condutas, 
preceitos morais e expectativas de comportamentos, mas também por sentimentos e valores que 
norteiam suas adesões pessoais à profissão, com reflexos em outras esferas de sua vida. 
Uma terceira tese levantada é a de que as posições ocupadas dentro desse universo do 
rádio não são de modo algum fixas para os agentes que o compõem, variando conforme a 
situação, embora cada um deles possua um status social predominante. Assim, existem radialistas 
que fazem política no rádio, e políticos que fazem rádio; radialistas que se comportam do mesmo 
modo que ouvintes, e ouvintes que dominam certos códigos profissionais; emissoras religiosas 
que compartilham a mesma lógica que sustenta a estrutura religiosa do grupo ao qual pertencem, 
sendo tratadas como partes integrantes, e pastores que utilizam a linguagem radiofônica para 
fazerem pregação religiosa. 
 A proposta deste trabalho é, então, tratar o rádio como um universo que se delineia na 
situação a qual está referido, optando quase inevitavelmente por levar às últimas conseqüências 
as percepções nativas. A conseqüência disso é respeitar o que dizem sobre si nesse contexto e 
sobre o próprio contexto. Isso significa que a história, a percepção do funcionamento e do papel 
social, a relação entre as diversas empresas e destas com outros segmentos sociais, e os próprios 
temas que serão abordados neste trabalho partiram das pessoas com as quais convivi naqueles 
onze meses. 
 Como de praxe na pesquisa antropológica que se pretende etnográfica, este trabalho 
resulta do encontro entre o olhar dos radialistas e as minhas reflexões sobre as vivências 
compartilhadas por/entre nós. No plano concreto, nossas experiências resultaram não somente 
neste trabalho como também estimulou um radialista e jornalista local, em conjunto com 
professores do Departamento de Comunicação da Universidade Estadual de Santa Cruz, 
 18 
localizada na região, a desenvolver um projeto de preservação da memória do rádio local, em 
função da observação desta pesquisa e da participação como entrevistado. 
 Em contrapartida, além de desempenharem o papel central como razão de ser da tese, uma 
herança legada a mim involuntariamente pelo convívio foi o desenvolvimento de percepções 
antes não detectadas. Um determinado tipo de sensibilidade musical, maior atenção à voz e aos 
diversos conteúdos que carrega, e o envolvimento emocional nos dramas das pessoas foram 
alguns dos efeitos do campo. Talvez eles expliquem a cena de despedida para mim realizada por 
uma amiga locutora - no ar, como não poderia deixar de ser-, que lembrou mais uma vez à 
analista que eles eram tanto objetos de análise científica quanto de afeto. 
Foi esse sentimento que possibilitou, portanto, o nível de confiança que imagino ter 
adquirido dos meus informantes, gerando informações relevantes para se entender o rádio 
naquele universo. Indicou, ainda, que é impossível falar de rádio sem levar em consideração o 
quanto as emoções permeiam tudo o que é feito nesse meio. São elas que estimulam os ouvintes a 
ligarem para os programas ou procurarem a rádio, que faz com que alguns radialistas percebam 
sua profissão como um vício, um carma ou um grande amor, e que torne mais suportável a vida 
de algumas pessoas que têm na voz do locutor ou na convivência com os radialistas uma fonte de 
fantasia e inspiração. 
 
 18 
Dialogando com algumas teorias 
 
O rádio está presente em mais de 90% dos lares brasileiros (Moreira 2002: 9). As 
explicações teóricas para essa maciça presença do rádio é a de que é o veículo de 
comunicação de massa mais barato, transmite informação imediata, explicando as notícias 
para as pessoas que estão em movimento e que são iletradas (Carneiro 1994: 118), e, além 
desses motivos, por estabelecer uma intimidade em sua recepção (Bordenave 1988: 73-74). 
As principais funções do rádio seriam a de oferecer entretenimento e informação 
(Mendelsohn 1979: 93), funcionando como um importantecanal de socialização (Dominick 
1979: 99). Para outros autores (Nordlund 1979: 190; Katz et all. 1979: 214) o rádio pode tanto 
gerar algum tipo de “escapismo” da realidade vivida, que leva à solidão dos indivíduos, 
quanto pode servir como um modo de conectá-los em um outro registro. 
Apesar dessas características serem reconhecidas pelos estudiosos de comunicação em 
geral, como aponta Moreira (2002: 9-11), ainda existem poucos estudos sobre rádio, em 
especial os de caráter etnográfico, como os de Chagas (1993) e Boff (1994). Alguns trabalhos 
nessa área têm como tema o que poderia ser chamado de uma história geral do rádio no Brasil 
(Moreira 2000; Sampaio 1984; Murce 1976); outro conjunto de trabalhos voltou-se para o 
registro das trajetórias de emissoras (Saroldi & Moreira 1998; Chagas 1993; Moreira 1987), 
de programas (Casé 1995; Boff 1994; Costa 1992) e de profissionais do rádio em particular 
(Costa 1984; Pereira 1967); outros estudos, ainda, relacionam rádio à esfera política (Haussen 
1997; Motter 1994) ou defendem a mídia como um meio de participação popular (Souza 
2003; Charrasse 1981). 
 19 
Nem mesmo na área de conhecimento, que ficou conhecida como da Teoria de 
Comunicação, nas pesquisas sobre a “indústria cultural”1, o rádio, abordado como um meio de 
comunicação de massa, vem sendo investigado em profundidade. Os estudo sobre esse meio, 
nas análises empreendidas, tendem a enfatizar o caráter de massa, que inclui também outras 
mídias, no lugar de tentar descrever a sua dinâmica particular. 
O conceito de massa relacionado aos meios de comunicação social tem sido objeto de 
discussão dentro de uma tradição de estudos e pesquisas que se iniciou no início do século 
passado (cf Araújo 1996, capítulo 2). Para Blummer (1971), a massa é destituída das 
características de uma sociedade ou de uma comunidade. Não possui organização social, 
costumes, tradição, um corpo estabelecido de regras ou rituais, um conjunto organizado de 
sentimentos, nem qualquer estrutura de status-papel ou liderança institucionalizadas. Na 
verdade, é constituída por um agregado de indivíduos que se encontram separados, desligados 
e anônimos e, mesmo assim, formando um grupo homogêneo em termos de comportamento 
de massa que, justamente por não resultar de regras ou expectativas preestabelecidas, é 
espontâneo, inato e elementar. 
A partir dessa definição, Freidson (1971) avança sobre a discussão acerca dos meios 
de comunicação de massa colocando em dúvida a adequação do termo para os veículos que 
seriam enquadrados nessa categoria (jornais, televisão, rádio e cinema), uma vez que os 
receptores das mensagens de modo geral não são compostos por pessoas anônimas entre si, 
 
1 Desse modo, estudar as emissoras de Ilhéus a partir de pressupostos teóricos contidos em 
análises realizadas no âmbito das análises sobre a chamada “indústria cultural” (Adorno & 
Horkheimer 1985; Bourdieu 1997; Araújo 1996), “visão mediática” (Martín-Barbero 1995; 
Champagne 1997b) ou meio de comunicação de massa (Blummer 1971; Katz et al 1979; 
Araújo 1996) significaria, neste trabalho, reduzir a complexidade dos fenômenos encontrados 
e ignorar a premissa básica desta tese de respeitar as visões e percepções nativas. Tais termos, 
e tudo o que de algum modo podem engendrar – por exemplo uma certa passividade dos 
receptores das informações e a presença de uma espécie de conspiração política ou comercial 
 20 
mas, ao contrário, costumam interagir com outras pessoas de seus grupos sociais comentando 
a respeito dos conteúdos emitidos. Por outro lado, o próprio Freidson aceita a aplicação do 
conceito de massa desde que a perspectiva seja não dos indivíduos mas dos grupos sociais. 
Schramm (1971) afirma ainda que o receptor da mensagem nunca pode ser 
classificado como passivo ou ativo, pois o que existe para ele é um contínuo que vai do mais 
ativo para o menos ativo. Analisando essa discussão presente entre os teóricos da 
comunicação, Rego (1986: 21) afirma que existem várias definições do conceito de massa e 
que “está quase universalmente aceito” que todas as mensagens transmitidas são “filtradas” 
pelos grupos sociais a que estão afiliadas quase todas as pessoas. Ele afirma, por fim, que “o 
que caracteriza o meio como sendo de massa [...] é o fato de que, sob o ponto de vista do 
comunicador, a mensagem é endereçada a quem interessar possa [grifo do autor]”, atingindo 
um grande número de pessoas (:24). 
 À frente de uma das diversas correntes teóricas da Teoria da Comunicação que estudos 
ou meios de comunicação de massa, um dos autores que influenciou diversas gerações de 
estudiosos do assunto foi Marshall McLuhan (1979). Entre suas teorias, criticadas por 
diversos autores (entre eles, Orvell 1983; Meyrowitz 1985; Thompson 1998) a de que o meio 
é a mensagem, uma vez que modifica por si só a vida das pessoas ao desenvolver novas 
sensibilidades. Para McLuhan, os meios seriam classificados de acordo com sua natureza: 
quente, que se dirige a apenas um sentido, saturando-o, não deixando espaços para serem 
preenchidos - o rádio, o cinema, o livro, etc.-, e frio, que se dirige a mais de um sentido, 
deixando espaço para a imaginação completar o que não foi saturado, permitindo a distração - 
televisão, telefone, etc. (cf. discussão sobre o assunto em Araújo 1996). 
 
dos empresários do ramo – não são nem discutidos nem temas de reflexão para os radialistas 
de Ilhéus em seus afazeres diários. 
 
 21 
 Uma análise do rádio em Ilhéus, do ponto de vista das situações concretas 
presenciadas, permite afirmar que alguns desses pressupostos teóricos que vêm predominando 
nas teorias de comunicação devem ser problematizados. Em primeiro lugar, o alcance do 
rádio no município não parece direcionar-se especifica e intencionalmente com esse propósito 
para as pessoas iletradas, com objetivos de levar informações para um público que não teria 
acesso às notícias. Tal dimensão, embora algumas vezes constatadas no dia-a-dia das 
atividades radiofônicas, nunca pareceu ser necessariamente relevante para os atores sociais 
em questão (radialistas ou ouvintes). As distinções entre os ouvintes obedeciam a outros 
critérios que não necessariamente o letramento: proximidade com os radialistas, interações 
com os profissionais e visitas às emissoras, pertencimentos a redes sociais específicas, etc. 
 Um outro pressuposto teórico e analítico utilizado por alguns teóricos da comunicação, 
como visto acima, descartado desde o início da pesquisa, foi a rentabilidade do conceito de 
massa para dar conta da investigação do universo do rádio em Ilhéus. Compartilhando da 
idéia apresentada por Thompson (1998: 30) de que “comunicação ‘de massa’ é uma expressão 
infeliz”, uma vez que o termo massa evoca a imagem de uma vasta audiência, o que se 
encontra em Ilhéus é que os receptores das mensagens transmitidas no rádio, o ouvinte, quase 
sempre tem voz, nome, endereço, sentimentos, e agência, não sendo passivos de modo algum. 
 Nesse sentido, pode-se dizer que os sujeitos da comunicação por meio do rádio 
naquele universo social são quase sempre definidos. Mesmo que as mensagens tenham sido 
também proferidas para receptores sem rosto. Desse modo, uma mensagem era tanto proferida 
quanto decodificada de modo diferenciado em sua emissão e em sua recepção de acordo com 
o tipo de relação existente entre os interlocutores, que criam códigos comuns anteriores2 para 
a transmissão e o entendimento desejado da mensagem. Ou seja, apesar de atingir um grande 
 22 
número de pessoas, nas situações concretas do dia-a-dia, quase tudo o que é transmitido é 
direcionado na maioria das situações para um indivíduo ou um grupo específico conhecido 
com intenções tambémsingulares: ouvintes fiéis, namorados (as), amigos (as), autoridades, 
políticos, diretores de órgão públicos, comerciantes, taxistas, etc. 
Pretende-se, portanto, abandonar o conceito de massa, uma vez que em sua dimensão 
concreta da vida cotidiana em Ilhéus, a comunicação via rádio funciona como uma conversa 
entre interlocutores que se conhecem ou que a partir do rádio fundam uma relação. Da 
perspectiva adotada para a análise do material coletado, optou-se por abandonar esse 
pressuposto de difusão para e em massa - salvo quando essa característica era discutida 
concretamente pelos agentes envolvidos - por entender-se que nada acrescentaria à percepção 
das relações em jogo naquele contexto local, um dos objetivos deste trabalho. 
 Sob esse aspecto, este trabalho aproxima-se das abordagens etnográficas empreendidas 
por Chagas (1993) e Boff (1994), que acompanharam in loco o que se desenrolava na Rádio 
Farroupilha de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. A primeira, buscando investigar os modos de 
interação de diversos segmentos populares com a emissora e seus profissionais, em especial 
com o radialista Sérgio Zambiasi. A segunda, focalizando freqüentadores de um programa 
radiofônico de namoro (“Namoro no Rádio”), com faixa etária entre 40 e 70 anos, para 
observar manifestações de afeto e meios de sociabilidade ali inaugurados. 
 Distancia-se desses trabalhos especialmente pelo recorte analítico adotado: o foco de 
ambos direciona-se para o que as autoras denominam de grupos “populares”, freqüentadores 
da Rádio Farroupilha, que compartilham um determinado “ethos” – “tom jocoso, estilo 
melodramático, oralidade como característica fundamental da expressão” (Boff 1994: 9). 
Embora estabeleçam uma série de ressalvas a respeito do uso do termo “popular”, ao longo de 
 
2 É preciso ressaltar que, como já observado por Chagas em pesquisa sobre uma emissora de rádio no Rio 
Grande do Sul (1993: 41), muitas vezes “o locutor partilha da mesma ‘origem’ de uma grande parte de seus 
 23 
suas etnografias acabam por reforçá-lo, não somente por ele ter servido como critério para 
seleção dos sujeitos a serem investigados, como por terem explicitamente como contraponto 
longínquo – ou, seja, não tratadas diretamente mas citadas - as “manifestações culturais 
consagradas como legítimas (...) da ‘cultura dominante’” (: 41). 
 Na pesquisa realizada em Ilhéus, o centro em torno do qual todas as fases de 
investigação giraram localizou-se nos radialistas em atividade profissional. Mesmo quando 
ouvintes e freqüentadores das emissoras foram analisados, as referências sempre foram os 
acontecimentos ocorridos dentro das rádios ou que envolviam diretamente algum radialista 
em atividade. Nesse sentido, o termo “popular” ao qual os informantes da pesquisa se 
referiam é tratado ao longo desta tese como um termo nativo e não proveniente de uma 
construção teórica analítica a priori. A noção nativa popular é muito mais maleável do que as 
apresentadas em tais estudos. Pode ter um sentido relacionado ao ethos, de que fala Boff, mas 
também pode estar ligado a uma idéia de amplitude. Pode, ainda, servir quase como uma 
palavra utilizada por “inércia”, sem muitas reflexões a seu respeito, uma vez que há uma 
representação difundida entre os radialistas de que toda rádio AM é popular. A manifestação 
de tal identificação (AM-popular) pode servir também como uma forma dos radialistas de 
AM dizerem que são diferentes dos profissionais de FM. O significado do termo e sua 
utilização pelos radialistas dependem, então, da situação e dos interlocutores nela envolvidos. 
 A abordagem adotada nesta tese, aproxima-se, assim, de uma perspectiva 
interacionista, definida por Blumer (1980: 136-138) como relacionada a três premissas: o 
comportamento humano fundamenta-se nos significados dos elementos do mundo; a fonte dos 
significados é a interação social; a utilização dos significados ocorre através de um processo 
de interpretação. Para Goffman (1975), que além desta tese inspirou outros trabalhos sobre 
mídia (Meyrowitz 1985; Altheide 1985; Ericson et al.1989), a interação pode ser definida 
 
ouvintes-participantes”. 
 24 
como toda intenção que ocorre em qualquer ocasião, quando, num conjunto de indivíduos, 
uns se encontram na presença imediata de outros (Goffman 1975: 23). Quando isso ocorre, 
suas ações influenciarão a definição que se vai apresentar (: 15). Quando um indivíduo 
desempenha o mesmo movimento para o mesmo público em diferentes ocasiões, “há a 
probabilidade de surgir um relacionamento social” (: 24), pois ele executa uma representação 
em um período caracterizado pela sua presença contínua junto a esse público sobre o qual 
exerce alguma influência (: 29). Fora da presença do público, do mesmo modo, nos bastidores 
ou fora dos cenários das rádios, também ocorrem interações contínuas, com tempos de 
durações variáveis, formando outros tipos de relações (: 137-139). Como observado por 
Goffman, “assim como é conveniente executar os diversos papéis do indivíduo diante de 
diferentes platéias, também é conveniente separar as diversas platéias que alguém tenha para 
o mesmo papel” (:129). 
O presente estudo, portanto, foi construído a partir das observações diárias das 
interações desenvolvidas nas rádios e fora delas, desde que envolvessem de algum modo os 
radialistas e seus relacionamentos sociais – nos termos apontados por Goffman. A percepção 
desta tese do que é universo do rádio em Ilhéus e de quem são os radialistas que o integram 
foi construída a partir da análise das situações em que os atores principais (radialistas) 
desempenhavam com destreza em suas representações seus papéis junto à platéia (os outros 
com quem interagem), tentando manter o controle das impressões (Goffman 1975: 114-115). 
A impressões causadas é que definiam, em grande medida, o estabelecimento e a manutenção 
dos relacionamentos sociais de diversas naturezas e por vezes simultâneas: profissionais, 
amorosas, religiosas, de amizade, por interesses financeiros e políticos. 
 
 25 
O campo 
 
Para difundir um estilo de vida específico, e atrelado a interesses particulares dos 
fazendeiros de cacau e líderes políticos da região, foram criados em Ilhéus os primeiros meios 
de comunicação social. Desde o início, com a fundação do primeiro jornal, em 1901, as 
principais motivações para o surgimento de um veículo de comunicação estiveram ligadas às 
questões políticas municipais e regionais (Barbosa 1994: 30). Essa representação persiste 
ainda junto aos profissionais de imprensa em atividade, ao fazerem uma análise do que pode 
ser chamado de imprensa local. 
Ilhéus foi fundada em 1534, como sede da Capitania doada por D. João III a Jorge de 
Figueiredo Correia. A partir de 1753 a Capitania foi incorporada à Coroa portuguesa, ficando 
subordinada à da Bahia na condição de Comarca. A partir de 1860, a produção cacaueira, uma 
nova atividade voltada para o mercado externo, passou a ser incrementada e expandida em 
Ilhéus, atraindo trabalhadores ociosos em região da fronteira, em busca de enriquecimento e 
possibilidade de ascendência social. A divulgação dessas possibilidades, porém, fazia parte de 
um projeto que envolvia os setores governamentais e os grandes proprietários rurais (Freitas 
& Paraíso 2001: 84-85). 
O período de implantação da monocultura do cacau pode ser localizado entre 1890 e 
1920, tornando-se o principal produto baiano de exportação e influenciando a região sob 
vários aspectos: demográficos, sociais, econômicos, administrativos e políticos (:99). Isso 
ocorreu, em parte, pela crise da mão-de-obra, docapital e das condições do mercado 
internacional do açúcar na segunda metade do século XIX (Ribeiro 2001: 154). 
A partir do final da década de 1920 e início dos anos 30, no entanto, a monocultura do 
cacau passou a alternar sucessivas crises – a primeira grande crise ocorreu entre 1928 e 1931 - 
 26 
e retomadas de crescimento, até que na década de 1980 ocorreu a última grande crise – da 
qual ainda não saiu -, com a chegada da vassoura-de-bruxa na plantação, um problema não 
completamente sanado (Silva 2004). 
Se até o fim do século XIX a vila de São Jorge dos Ilhéus funcionava como um 
simples “aglomerado humano”, tendo como cultura de subsistência a pesca e o artesanato, 
com a implantação da monocultura do cacau surge um centro urbano, Ilhéus (Freitas & 
Paraíso 2001: 133-134). Em 1920 a população era de 10.779 habitantes, e 20 anos depois já 
era de 15.807 (: 138). Ao longo desse tempo, formou-se uma burguesia cacaueira, composta 
por grandes produtores e comerciantes exportadores (: 168). O capital formado e acumulado 
com o cacau foi aplicado na formação e manutenção de partidos políticos. O município 
tornou-se o reduto por excelência dos coronéis (Ribeiro 2001: 15), estabelecendo uma 
“estreita relação entre família, poder e território” (: 16). 
Os primeiros meios de comunicação social do município foram criados justamente 
para que essa elite política e econômica pudesse divulgar um estilo de vida específico e 
atender a seus interesses particulares. De acordo com Barbosa (1994: 30), o primeiro jornal de 
Ilhéus foi a “Gazeta de Ilhéus”, “periódico político e noticioso”, bissemanal, que funcionou de 
1901 a 1906. O autor lista, além dele, até os anos 1970, o surgimento de 23 jornais, com 
tempos de funcionamento diferenciados – alguns resistiram a dois números outros 
permaneceram em atividade ao longo de vários anos. Entre estes, um jornal sempre citado 
durante o trabalho de pesquisa pelos radialistas e jornalistas locais foi o “Diário da Tarde”, 
fundado em 1928 e de propriedade de uma importante referência política local, Francisco 
Dórea. Na década de 90 ele é extinto, e alguns funcionários, então desempregados, se reúnem 
para fundar o “Diário de Ilhéus”, totalmente tipográfico, que passou a circular em 24 de julho 
de 1999. 
 27 
 Antes, nas décadas de 70 e 80, são fundados alguns veículos de comunicação, também 
em circulação, embora com periodicidade nem sempre regular: “Ilhéus Revista”, “Jornal da 
Manhã” (de um jornalista e radialista local) e outros informativos esporádicos. Além deles, 
publicações do vizinho município de Itabuna circulam no município: os semanários “Agora” 
(fundado em 1981) e “A Região” (de 1987), e o “Diário do Sul” (de 1999). 
 As primeiras emissoras de rádio do município foram a Cultura de Ilhéus (1949), de 
Alceu Nunes da Fonseca, com o prefixo ZYW 7; a Jornal (1959), de Osvaldo Bernardes, ZYN 
34; e Baiana (1961), de Robert Assef, ZYN 36. Depois vieram as rádios FM Cidade de Ilhéus 
(1983), do fazendeiro de cacau Roy Cox e Gabriela FM (1994), do empresário mineiro 
Valderico Reis. A rádio Jornal em 1979 transforma-se em Rádio Santa Cruz devido a um 
projeto político não concretizado de separação do sul da Bahia do resto do estado –recebendo 
o nome de Estado de Santa Cruz - e em 1994 a Baiana dá lugar à Rádio Novo Tempo, da 
Igreja Adventista do Sétimo Dia. Esta, em 2001, é vendida para o ex-funcionário Salomão 
Batista, voltando a receber a denominação Rádio Baiana. 
 A população de Ilhéus a partir de 1987 passa a contar com a emissão da TV Cabrália, 
vinculada à extinta Rede Manchete de Televisão. Em 1988, a TV Santa Cruz, afiliada à Rede 
Globo, entra em operação e, por fim, em 2003, passa a funcionar a TV Sul Bahia, ligada ao 
Sistema Brasileiro de Televisão (SBT). Todas localizadas em Itabuna. 
Embora funcionem como empresas distintas e com dinâmicas específicas, os meios 
locais de comunicação interagem permanentemente, seja por intermédio de seus profissionais 
que muitas vezes trabalham em mais de um tipo de veículo e pelas relações que mantêm entre 
si, seja devido ao fato deles constituírem simultaneamente como meios e fontes de 
informações para a divulgação de notícias produzidas pelos demais veículos. 
 28 
Assim, um jornal tanto divulga uma notícia apurada por seus repórteres, quanto uma 
informação transmitida em uma emissora de rádio. Do mesmo modo, o conteúdo divulgado 
nos informativos das rádios tem como fonte principal as matérias publicadas nos jornais locais 
e estaduais, informações colhidas na Internet e revistas de divulgação nacional (“Veja”, 
“Istoé”, revistas de fofocas em geral). Essa prática ultrapassa os limites do rádio em Ilhéus: de 
acordo com Carneiro (1995: 118) é uma característica os jornais serem fontes para as rádios e 
a maioria das emissoras de rádio não contratarem repórteres. 
A interação entre esses meios de comunicação é que permite falar de uma imprensa 
local. Submetidas a características regionais, em especial aquelas relacionadas a uma estreita 
proximidade com a esfera política municipal – desde o surgimento do primeiro jornal, ou 
acompanhando a trajetória das rádios no município, as motivações para a criação de um 
veículo de comunicação tenderam a ser políticas -, a imprensa local sempre acompanhou os 
ciclos e ritmos mais amplos da vida social de Ilhéus: prosperidade obtida com a monocultura 
do cacau e o comércio, decadência financeira do município pela crise da produção e ligações 
cada vez mais estreitas com grupos políticos que se alternam no poder e ocupam a lacuna 
deixada pela falta de investimento do comércio local nos meios de comunicação em geral. 
 
Estrutura da tese 
 
 A tese está dividida em cinco capítulos, além da Introdução, da Conclusão, do 
Glossário e dos Anexos. Cada um dos capítulos funciona de modo relativamente autônomo. 
Embora tenham como referencial o mesmo objeto, correspondem tanto a aspectos distintos do 
universo do rádio quanto a abordagens diferenciadas dos temas focalizados. Essa autonomia 
remete à opção analítica adotada, pelo entendimento de que a variação de algum modo está 
presente no próprio objeto de pesquisa, cuja característica principal é a diversidade: de estilos 
 29 
de programas e radialistas, de ouvintes, de papéis que desempenham, de modos de interação 
com variados segmentos sociais, de sentimentos e emoções que envolvem a prática 
profissional cotidiana. 
 A escolha por apresentar os dados da forma mais próxima possível da visão dos 
radialistas e de seu cotidiano se refletiu ainda na linguagem adotada ao longo de todo este 
trabalho: um tom coloquial, utilizado no dia-a-dia dos atores sociais analisados, e a 
incorporação no texto em fonte normal de palavras e expressões específicas do meio 
profissional, que foram usados para dar uma espécie de “clima” das experiências 
compartilhadas pelos agentes estudados e pela própria analista . Para facilitar a leitura dos 
termos nativos, ao final da tese, um glossário trará explicações a respeito de seus significados. 
 Para uma melhor compreensão gráfica sobre as procedências dos termos utilizados 
(idéias minhas, dos radialistas em geral ou algum em particular, de autores citados) foram 
seguidos os seguintes critérios: 1) toda vez que uma palavra, uma expressão ou uma fala 
aparecer em itálico, indica uma palavra, uma expressão ou uma fala dita literalmente por 
algum nativo, podendo estar incorporada no texto de modo corrente, ou explicitamente 
destacada como uma citação nativa; 2) as “aspas duplas” serão utilizadas sempre que um 
termo corresponder a uma palavra ou uma expressão da analista - inspirada pelo contexto 
estudado - ou por uma pequena citação de algum autor, com a respectiva indicação da fonte; 
3) as citações de autores com mais de três linhas serão destacadas com margens, corpos de 
letras e entrelinhas diferenciados no corpo do texto, aparecendo sem nenhum tipo deaspas ou 
caracterização do estilo da fonte usada. 
 A narrativa da tese, além de coloquial, procurou seguir um modelo de apresentação 
que abrange simultaneamente descrições etnográficas e respectivas análises, em vez de 
separar o que poderia ser identificado como um conjunto descritivo, de um lado, e de outro, 
 30 
um conjunto interpretativo e teórico. Espera-se que, assim, ocorra uma melhor fluidez na 
leitura deste trabalho, com a construção processual de uma interpretação sobre o objeto da 
análise em questão. 
Assim como ocorreu em relação aos aspectos gráficos e formais da tese, a opção pela 
proximidade estabelecida com os atores sociais estudados fez com que a abordagem 
etnográfica, a “descrição densa” tal qual definida por Geertz (1973: 15-17), norteasse todas as 
etapas da investigação, da pesquisa de campo à análise final cujo resultado é esta tese. Isso 
significa que os pontos de vistas e dados apresentados nesta etnografia baseiam-se em relatos 
e representações nativas – mesmo que em alguns momentos conflitantes entre si - sem que se 
entre no mérito de suas correspondências necessariamente concretas. 
O posicionamento adotado, portanto, tenta afastar-se ao máximo de qualquer 
julgamento moral pessoal, ou mesmo verificação se o que foi dito era “verdade”. Tal 
procedimento ocorreu por entender-se que as visões nativas devem ser levadas a sério, 
possuindo um valor em si mesmas, uma vez que resultam das experiências vividas e das 
interpretações dos agentes sobre elas, bem como compõem o que analiticamente está sendo 
chamado de universo do rádio em Ilhéus. 
Duas últimas observações em relação à estrutura da tese. Os nomes aqui utilizados são 
fictícios, para garantir a proteção daqueles que em mim depositaram sua confiança. As 
exceções ocorreram sempre que se julgou que a identidade de alguém e as práticas de uma 
instituição eram amplamente conhecidas localmente - sendo inócua a manutenção do sigilo -, 
e que a revelação do nome não afetaria de modo significativo a vida daquela pessoa ou 
instituição citada. Ao contrário, há ainda alguns casos que a omissão da fonte tornou-se 
primordial, gerando três estratégias assumidas: uma identificação extremamente geral (de 
radialista, antigo radialista, etc.), uma não identificação de qualquer espécie (aparecendo 
 31 
somente o depoimento ou a descrição de um acontecimento) e uma troca de caracterização 
(por exemplo, atribuir um nome masculino a uma mulher, e vice-versa). 
 Por fim, a observação de que o acesso às diversas fontes de pesquisa (documentos, 
pessoas, organizações formais, etc.) foi diferenciado. Isso implicou tanto em uma variação 
relativa ao nível de profundidade dos assuntos abordados quanto à dimensão quantitativa dos 
dados apresentados. Para sanar essas limitações, procurou-se explicitar ao máximo o grau de 
acesso aos dados. Ainda em relação às fontes de pesquisa utilizadas em cada capítulo 
particularmente, a natureza de cada um provocou a utilização predominante de um ou mais 
tipos de fontes. 
Sendo assim, o primeiro capítulo, Os Radialistas e Suas Memórias, foi o que utilizou 
como principais fontes depoimentos formais, gravados (em sua maioria), e informais, dos 
agentes sociais em estudo, ou mesmo relatos registrados por eles em livros sob a forma de 
narrativas na primeira pessoa. O capítulo procura apresentar as trajetórias das emissoras de 
rádio em Ilhéus, a partir da memória dos radialistas que acompanharam e fizeram parte dos 
acontecimentos ao longo do tempo. 
Como fica claro nos depoimentos coletados, é possível perceber que os profissionais 
fazem uma distinção qualitativa entre o passado (época boa) e o presente do rádio, e que, 
embora tenha ocorrido um avanço tecnológico no meio, de modo geral as condições de 
trabalho atuais não são julgadas como as ideais. Isso faz com o exercício profissional seja 
avaliado pelos radialistas como típico de rádio no/do interior (em oposição à radio na/da 
capital). Finalmente, será apresentada a representação compartilhada entre os radialistas de 
que, desde o surgimento da primeira emissora, o rádio no município sempre esteve atrelado a 
interesses e grupos políticos e/ou religiosos. 
 32 
O segundo capítulo, Rádio: Profissão, baseia-se na mesma proporção em 
depoimentos formais e informais dos atores sociais, e nas observações diretas e participantes 
da analista. É o capítulo da tese que trata de modo mais restrito o rádio como um ofício, e os 
radialistas como profissionais, sob uma ótica em que as relações do meio e as interações com 
outras esferas da vida social não são tratadas especialmente na análise – o que será realizado 
nos capítulos subseqüentes (Rádio e Política, Rádio e Igreja, e Radialista e Ouvinte). Para 
isso, apresenta algumas formas de ingresso na carreira, bem como as habilidades necessárias 
para o exercício profissional, e o papel desempenhado pelo sindicato da categoria. Mostra, 
ainda, alguns dilemas e conflitos vivenciados pelos radialistas, cujas performances podem ser 
passíveis tanto de premiações quanto de sanções formais. 
O terceiro capítulo, Rádio e Política, parte dos depoimentos formais, mas baseia-se 
principalmente nos depoimentos informais - alguns dados com pedidos de segredo de fonte - e 
na observação direta das situações presenciadas no cotidiano do trabalho de campo. Fontes 
documentais também foram utilizadas, em especial os jornais locais ou regionais, de modo 
assistemático. Ao analisar a rede de relações formada por profissionais do rádio e da política, 
por emissoras e órgão públicos e pela população em geral de Ilhéus, o capítulo busca mostrar 
que, no município, os radialistas ao desenvolverem suas atividades fazem de diversas 
maneiras política, e que os políticos fazem política por intermédio dos meios de comunicação. 
A existência de práticas comuns e representações coincidentes nos universos político e do 
rádio gera uma percepção pelos agentes – políticos, radialistas e população em geral – de que 
em Ilhéus rádio é política, frase repetida em vários depoimentos nativos. 
O quarto capítulo, Rádio e Igreja, assim como o capítulo anterior, definiu-se a partir 
de uma representação nativa de que fazer rádio em Ilhéus é mover-se entre a política e a 
religião. Os dados obtidos para descrever o “mundo” das emissoras evangélicas locais foram 
 33 
os de mais difícil acesso. Desse modo, as descrições e análises empreendidas no capítulo 
basearam-se principalmente nos depoimentos formais e informais coletados junto aos 
radialistas não evangélicos e alguns poucos evangélicos, mas principalmente pelas 
observações diretas dos acontecimentos e as vivências particulares da analista. Entre elas, a 
submissão a uma série de constrangimentos e limitações impostos em relação à presença de 
alguém de fora nas emissoras. Este capítulo procura analisar, portanto, as especificidades das 
emissoras evangélicas de Ilhéus, que inseridas em uma rede social mais ampla, são norteadas 
por expectativas de condutas e valores religiosos à quais estão referidas. Tais orientações 
marcam o exercício profissional dos radialistas nessas emissoras e delimitam fronteiras 
simultaneamente concretas e simbólicas sobre aqueles que são da Igreja e aqueles que não 
são. Nesse sentido, o grau de confiança depositado sobre os integrantes das rádios e/ou do 
grupo religioso é que define os status sociais nessa rede que tende a misturar profissão com 
religião. 
O último capítulo, Radialista e Ouvinte, fecha a tese e a abordagem do rádio e dos 
radialistas em relações sociais mais amplas com outros segmentos. Observação direta e 
participante, conversas informais e depoimentos formais, além de documentos como cartas 
dos ouvintes foram as fontes utilizadas. O capítulo busca explorar tanto os aspectos formais 
da relação entre radialistas e ouvintes quanto os aspectos informais que norteiam as interações 
cotidianas, perto ou longedos microfones da rádio. Pretende-se discutir etnograficamente 
alguns pressupostos mais gerais no campo da teoria da comunicação - a abordagem do rádio 
como um meio de comunicação de massa e a utilização da categoria padronizada “ouvinte”, 
definidora dos receptores das mensagens radiofônicas -, mostrando como eles são pouco 
rentáveis para analisar a diversidade de experiências que ocorre entre os agentes envolvidos 
no processo de comunicação por intermédio de e no rádio. 
 34 
Assim, serão abordados assuntos como solidão e socialização dos ouvintes via rádio; 
radialistas como personalidades no município e seus duplos ou personagens; a voz como 
instrumento de sedução e construção de existência do radialista e/ou ouvinte; os limites da 
intimidade estabelecida e construída entre radialistas e ouvintes, e seus efeitos concretos. 
Serão ainda traçados um breve paralelo entre rádio e Internet em seus aspectos relacionais, e 
um rápido comentário sobre a proposição desta tese, apresentada menos explicitamente ao 
longo da etnografia, de que todo radialista é ouvinte. 
A Conclusão procurará reunir algumas das principais questões abordadas no decorrer 
de todo este trabalho, funcionando como um fio condutor que costura todos os demais 
capítulos da tese. 
O Glossário, espera-se, cumprirá mais do que a função de tradutora de expressões 
nativas, tornando mais inteligível a compreensão dos termos utilizados pelos agentes sociais 
estudados. Acompanhados de fotos que servem de exemplos locais específicos, os termos 
trarão em alguns casos descrições e explicações relativas a acontecimentos presenciados, indo 
além das definições formais das palavras. Serão contemplados tanto os termos e as 
expressões, quanto os gestos correspondentes a códigos profissionais estabelecidos na 
comunicação interna ao grupo de radialista em atividade. 
Nos Anexos estão contemplados materiais que de algum modo enriquecem a 
compreensão do rádio em Ilhéus: programações das emissoras, cartas de leitores, notícias 
sobre o meio profissional em variados veículos de comunicação locais, fotos. 
 35 
CAPÍTULO 1 
OS RADIALISTAS E SUAS MEMÓRIAS 
 
 
 
“Porque os homens passam, 
e as opiniões duram, 
os homens perecem, 
e as opiniões germinam” 
(Rui Barbosa, “Ontem e Amanhã”) 
 
 
 Em Ilhéus há uma relativa preocupação com o registro escrito dos acontecimentos 
históricos do município por aqueles que acompanharam seus desenvolvimentos de perto ou de 
longe (Freitas & Paraíso 2001; Macêdo & Freitas 2001; Sá Barreto 1988; Almeida 1996; 
Andrade 1996; Barbosa 1994; Heine 1994; Asmar 1987 e 1983). Apesar disso, quase nada 
existe sobre o que pode chamar-se de uma trajetória do rádio local, que implicaria no 
acompanhamento dos acontecimentos relativos às cinco emissoras do município. 
Se é que é possível falar de uma “história” das emissoras de Ilhéus, entendida como 
um desenrolar de fatos ao longo de uma linha de tempo, quase todas as informações obtidas 
para tal fim convergem para uma mesma fonte: os depoimentos e relatos daqueles que 
viveram os acontecimentos. Enquanto o registro de tais acontecimentos nas memórias 
individuais tende a obedecer a critérios afetivos que transformaram as vivências em 
lembranças, o momento do relato implicou, além dos mesmos critérios, em um julgamento 
racional do que deveria ser dito. 
 A raridade de registro sobre esse assunto reflete uma não preocupação dos atores em 
formar o que foi denominado por um dos radialistas como uma memória do rádio local3. O 
 
3 Não se pretende aqui dizer que é exclusividade do campo estudado a predominância do registro oral sobre o 
passado, com base nas memórias e seus respectivos relatos, mas tentar enfatizar que no caso das rádios em 
Ilhéus, o “sonoro” é uma referência para os atores que constroem o universo do rádio. O resultado disso é uma 
exacerbação da predominância do oral não apenas por características individuais dos que vivem ou viveram 
 36 
próprio acesso aos documentos necessários ao funcionamento legal das rádios é tarefa difícil - 
ninguém sabe bem onde está4. Além disso, as fitas e o material escrito, contendo as 
programações diárias, duram em média de 30 a 60 dias, tempo exigido pela lei para o 
armazenamento dos dados para fins de fiscalização do órgão governamental responsável 
(Anatel). Assim, como quase tudo o que se produz em rádio é oral, se não for gravado e 
armazenado por um longo período, perde-se na memória dos ouvintes ou dos profissionais. 
Como é recorrente, para ter acesso a tal memória, é preciso que seus depositários sejam 
estimulados por alguma situação interna ou externa a torná-la pública, como, no caso, a coleta 
dos depoimentos para esta pesquisa. 
 Os relatos, no entanto, foram inicialmente obtidos com a intenção de conhecer as 
trajetórias profissionais dos radialistas em atividade. Conforme iam contando suas vidas, 
falavam também do próprio entorno: das trajetórias das emissoras e da vida social de Ilhéus. 
Foram ouvidos, com esse propósito específico, 37 radialistas. Além de apresentarem as 
formas de entrada na profissão e o modo como as relações profissionais efetivamente vão 
sendo construídas, possibilitaram ainda a compreensão de como a rede de interações dos 
agentes nesse universo é tecida cotidianamente. 
 Seria ingenuidade imaginar a existência de uma explicação simplista para o fato das 
pessoas não registrarem o passado do rádio de modo mais formal. Ao longo do trabalho de 
campo, tal questão não estava em jogo nem para aqueles sobre quem a investigação trata, e 
por isso mesmo, nem para aquela que os estava escutando. No entanto, analisando os 
depoimentos e interpretando vivências cotidianas compartilhadas, algumas pistas foram 
reveladas pelos dados obtidos, o que não significa que expliquem o fato, mas que auxiliam a 
 
nesse universo, mas por características que definem o próprio rádio, implicando em uma não preocupação dos 
agentes com o registro da própria “vida” do rádio local. 
 37 
sua compreensão. Essa não preocupação nativa com a preservação de uma memória do rádio é 
sintomática de três características específicas do rádio: imediatismo, improviso e o sentimento 
de que tudo acontece por acaso. 
 De acordo com os depoimentos e com a própria dinâmica diária das atividades nas 
rádios, o que importa é o agora, o que está indo ao ar, o preenchimento de cada instante com 
uma informação sonora. A programação vai sendo construída com a sucessão de cada fração 
de tempo, acompanhada pelos que comandam os programas por meio da observação contínua 
de um relógio. 
 Os tempos são todos regulados - a hora do comercial, a hora de um quadro dentro do 
programa, o tempo para participação de ouvinte. Não é possível voltar ao instante passado. 
Nem é possível avançar. No ar, para seus profissionais, só existe o presente. Mesmo que eles 
tenham em mãos, como é comum, material organizado para ser consultado ao longo do 
programa, que ouvintes fiquem na linha telefônica aguardando o momento certo de entrar no 
ar ou que sejam esperadas ligações de repórteres em determinadas partes do município para 
dar informações frescas sobre acontecimentos nas áreas de polícia, hospital ou esporte. Nesse 
sentido, rádio, para seus profissionais, é imediatismo, e como tudo o que é percebido como 
imediato, é singular. 
 Em parte, isso pode ser explicado pelo que Goffman (1975: 52) notou a respeito dos 
atores (radialistas) em interação com o que ele denominou “platéia habitual” (os ouvintes): 
“os atores tendem a alimentar a impressão de que o atual desempenho de sua rotina e seu 
relacionamento com a platéia habitual tem um caráter especial e único”. O idioma para se 
chegar ao ponto em que todos sentem aquele momentocomo específico, especial, único, é o 
 
4 Desconfiei que alguns soubessem, mas o fato é que não consegui ver nenhum documento. É bom lembrar, 
claro, que as concessões dos serviços possuem duração de 10 anos (Art. 223 parag. 57, Constituição Federal. 
Para uma reflexão acerca das renovações das concessões de rádio e TV ver Amorese 2000. 
 38 
da “espontaneidade” - ainda para utilizar uma expressão de Goffman - ou o que os nativos 
chamam de improviso. 
 Há uma polêmica local entre os profissionais de rádio se o programa fica melhor 
quando é feito com base no improviso ou se ele deve ser completamente planejado, para 
evitar erros ou problemas, uma vez que não há a possibilidade de apagar o erro, mas apenas 
de remediá-lo em uma transmissão radiofônica. De qualquer modo, há um consenso de que o 
bom radialista é capaz de improvisar bem, contribuindo para o sucesso do programa junto aos 
ouvintes, e que o mal ou o inexperiente não conseguirá fazê-lo bem. Além disso, sendo o 
programa planejado ou não, o ouvinte deve captar sinceridade/espontaneidade nas palavras do 
locutor, formando assim a impressão de que o momento é realmente único, especial5. E como 
tal, não se repete. 
 Ao lado do imediatismo e do improviso no rádio, uma outra idéia marca tanto as 
trajetórias profissionais dos radialistas quanto as atividades que eles desenvolvem quando 
estão no exercício do seu trabalho: o acaso. Por acaso eles entendem algo que não foi 
planejado, que não era esperado, sobre o qual não tinham controle. Geralmente as referências 
são feitas a acontecimentos externos, cujas narrações são quase sempre iniciadas por um dia, 
de repente, por um acaso, não sei como. Pode estar relacionado a alguém que chamou para 
fazer um teste numa emissora, um ouvinte que ligou no meio de um programa ou que 
apareceu na rádio com alguma informação de última hora, ou ainda uma coincidência 
qualquer. 
 Desse modo, os radialistas constroem seu cotidiano profissional - por meio do 
desempenho de suas atividades - em uma rotina baseada no imediatismo, no improviso e no 
 
5 O contrário desse tipo de percepção causaria problemas para a relação radialista/ouvinte. Para citar Goffman 
mais uma vez, “uma falsa impressão mantida por um indivíduo em qualquer de suas práticas pode ser uma 
ameaça ao relacionamento ou papel inteiro do qual a prática é apenas uma parte, pois uma revelação desonrosa 
 39 
acaso. Mesmo que seja feito um planejamento das tarefas executadas no ar, uma preparação 
prévia de material para os programas ou uma repetição de determinados artifícios e recursos a 
serem utilizados, esses três elementos são inerentes ao papel de radialista. Em um certo 
sentido, pensar em rádio, falar de rádio ou fazer rádio em Ilhéus é de algum modo ter no 
horizonte tais características, influenciando em maior ou menor grau, de formas e sob 
aspectos distintos, tudo o que a ele está relacionado. Inclusive, o nível de envolvimento com o 
que foi feito no rádio. O que foi produzido, já foi. Não mereceu registro formal, salvo os 
previstos pela legislação. O que ficou retido foi o produto da sucessão de vivências daqueles 
inúmeros “presentes”: as lembranças afetivas e as conseqüências concretas do que os 
conteúdos geraram para fora do universo do rádio (relações com diversos agentes sociais, com 
ouvintes, etc.). 
 Em boa parte dos relatos formais ou informais, gravados ou não, os entrevistados 
sempre se emocionavam ao falar do passado de suas vidas. Alguns informaram nunca terem 
parado para pensar em suas trajetórias, outros disseram que nunca lhes haviam perguntado 
sobre suas carreiras. A memória do rádio existente, até o momento, é, assim, uma memória 
oral-afetiva. Aliás, seguindo uma idéia nativa de que o carisma e a capacidade de emocionar 
são elementos fundamentais para aqueles que exercem a profissão, pode-se dizer que as 
emoções são algumas das substâncias de que são feitas as rádios - e suas memórias - em 
Ilhéus. 
 Essa é uma marca presente mesmo nos registros formais, escritos em primeira pessoa, 
dos dois profissionais da região que lançaram livros sobre o assunto (Valadares 2002; Aquino 
1999)6 - ambos em tons testemunhais, utilizando como recurso estilístico a narração dos 
assuntos sob a forma de casos assistidos, vivenciados ou transmitidos por outras pessoas, 
 
em uma área de atividade do indivíduo lançará dúvida sobre as múltiplas outras, nas quais não tenha que ocultar” 
(1975: 65). 
 40 
modo de narração típica de radialistas (Guedes 2003). O primeiro autor, com a utilização de 
poucas referências a datas mais precisas; o segundo, enfocando mais precisamente os meios 
de comunicação na vizinha Itabuna. Além deles, dois estudantes tiveram o tema como escolha 
de suas monografias de conclusão de curso de graduação (Souza 2003; Lopes 2001), em que 
falavam de modo mais genérico sobre o rádio ou, em particular, das emissoras ou radialistas 
de Itabuna. 
 Este primeiro capítulo, portanto, pretende trazer algumas informações contextuais que, 
acredita-se, deverão ajudar a apreensão de um quadro mais geral sobre quem são os agentes 
dos quais trata esta tese e do ambiente em que tudo se desenrola, respeitando as ênfases nos 
assuntos levantados pelos entrevistados. Serão analisados ainda alguns aspectos levantados 
nos próprios depoimentos, mesmo que representem um pequeno desvio na narrativa 
relativamente linear. Sendo assim, o objetivo não é construir uma “história” das emissoras de 
rádio em Ilhéus, do município ou dos radialistas, mas fornecer elementos para a compreensão 
de posteriores análises, empreendidas nos capítulos subseqüentes, como as relações 
estabelecidas com os políticos locais e as igrejas evangélicas, o exercício profissional e as 
relações entre radialistas e ouvintes. 
 A tarefa de construção sistemática de uma Memória do Rádio de Ilhéus e Itabuna - 
título do projeto - está atualmente a cargo de uma professora do Departamento de Letras e um 
jornalista/radialista da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC)7. Inspirados pela 
iniciativa empreendida para esta pesquisa de coleta de depoimentos dos radialistas e pela 
escassez de registro escrito ou oral sobre o tema deram início a tal projeto, atualmente em 
desenvolvimento. 
 
6 Até 2002, essas foram as únicas referências encontradas. 
7 A UESC possui um curso de graduação em Telejornalismo e Radiojornalismo - subordinado ao Departamento 
de Letras - que formou há menos de cinco anos sua primeira turma. Antes do curso, os jornalistas da região que 
 41 
 A maior dificuldade ao se tentar traçar uma linha de relativa continuidade neste 
trabalho, ordenando os fatos cronologicamente, tendo como fonte principal os depoimentos, 
foi alcançar uma precisão quanto às datas. Desse modo, algumas delas são aproximadas. 
Outra dificuldade foi a recuperação completa de dados para a tentativa de formação de uma 
genealogia dos donos8 das emissoras, o que ocasionou algumas lacunas no empreendimento 
dessa tarefa. De qualquer forma, a opção foi por apresentar pessoas, fatos e datas reunidos na 
convergência e, algumas vezes, na divergência dos depoimentos, por se entender que ainda 
assim tornam mais inteligível o universo do rádio em Ilhéus. 
 
1.1 Trajetórias das rádios9 
 
A primeira emissora de rádio no Brasil foi inaugurada oficialmente no Rio de Janeiro, 
por ocasião da Exposição do Centenário da Independência, em 7 de setembro de 1922 (Murce 
1976)10.

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