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- -1 FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA TENDÊNCIA LIBERTÁRIA E LIBERTADORA EM EDUCAÇÃO - -2 Olá! Ao final desta aula, você será capaz de: 1. Saberá diferenciar as bases teóricas das tendências libertária e libertadora no campo da educação. 2. Conhecerá o legado de Paulo Freire. 3. Refletirá sobre as obras Pedagogia do Oprimido e Pedagogia da Autonomia. Em aulas anteriores, tratamos das teorias liberais em educação demonstrando a crença de que através da educação vai se resolver o problema da marginalidade social. Verificamos também como tais teorias se materializaram na prática escolar. Além disso, tratamos das teorias crítico-reprodutivistas, elaboradas na França na década de 70 do século passado, em que apontaram o caráter reprodutor da educação e da escola, ou seja, em última instância o papel da educação é reproduzir as desigualdades sociais e as relações de poder dominante da sociedade capitalista. Nesta aula, teremos a preocupação de tratar de duas teorias progressistas em educação. São elas: Tendência Libertária e Tendência Libertadora. Destacaremos também o legado de Paulo Freire e duas obras deste pensador: Pedagogia do Oprimido e Pedagogia da Autonomia. - -3 1 Tendência Libertária em Educação • Pressupostos Teóricos Tem como base a corrente do anarquismo que defende que “o caminho da liberdade é a própria liberdade”. Sendo assim, questiona a ordem social existente e preocupa-se com a educação política dos indivíduos e com o desenvolvimento de pessoas mais livres. Por rejeitarem toda forma de governo, como também a burocracia como instrumento de ação dominadora e controladora do Estado, o anarquismo defende a autogestão. Sendo assim, estabelece uma profunda ligação entre a educação e os processos de mudanças sociais. Portanto, sustentam a finalidade social e política da educação e a compreendem como instrumento de luta de professores ao lado de outras práticas sociais. • Papel da Escola Seu papel é o de desenvolver mecanismos de mudanças institucionais e de mudanças nos alunos com base na participação grupal, onde ocorre a prática de todo processo de aprendizagem, ou seja, deve exercer uma transformação na personalidade, no sentido libertário e autogestionário. • Conteúdos de Ensino O conhecimento considerado mais importante é o que resulta das experiências vividas no grupo, sendo assim, os conteúdos são colocados à disposição dos alunos, porém não são exigidos. Portanto, o conhecimento é a descoberta de respostas às necessidades e exigências vividas pelo grupo. Assim, a apropriação dos conteúdos só tem sentido quando convertidos em práticas sociais libertárias. • Avaliação Não prevê nenhum tipo de avaliação dos conteúdos, mas a avaliação ocorre em situações vivenciadas, experimentadas pelos alunos e devem ser incorporadas para serem utilizadas em novas situações. • Relação Professor-Aluno Professores e alunos são seres livres e desenvolvem uma relação baseada na autogestão e no antiautoriarismo. • • • • • - -4 O professor é um orientador, ou seja, um catalisador que realiza reflexões em comum com os alunos cabendo-lhe: ajudar o grupo a se desenvolver na autogestão; auxiliar o desenvolvimento de um clima grupal em que seja possível aprender e superar os obstáculos; ajudar o coletivo a descobrir e utilizar os diferentes métodos de pesquisa, ação e observação; liberar as forças instituintes do grupo, que funcionam como analisadores das instituições. O exercício da liberdade pelo aluno tem que ser efetivo e real desde o início, com caráter progressivo, manifestando-se plenamente nos últimos anos escolares. • Métodos de Ensino Por defender que a participação grupal deve ser obtida através de assembleias, conselhos, eleições, reuniões, associações, de tal forma que o aluno leve para a escola e para a vida cotidiana tudo o que aprendeu, compreende que seu método deve resumir tanto objetivo pedagógico quanto o político Tem por base o método indutivo, racional, experimental e científico estimula a curiosidade, favorece a atividade cerebral, coloca a razão e a memória no seu devido lugar e se afasta de toda e qualquer credulidade. Seu método faz o movimento do composto ao simples, do geral ao particular, do número à unidade, da harmonia ao som, da regra ao fato, do princípio à aplicação, do observado ao não-observado e do conhecido ao desconhecido. Portanto, estimula à pesquisa independente. • Técnicas de Ensino Suas técnicas de ensino estão baseadas na experiência grupal, nas assembleias, nos conselhos e nas reuniões onde professores e alunos problematizam, discutem e constroem soluções. • Principais Representantes Freinet (1896-1966) – Educação pelo trabalho e pedagogia do bom senso. Lobrat (discípulo de Freinet) – Pedagogia institucional e auto-gestão pedagógica. Maurício Tragtemberg – autogestão institucional. 2 Tendência Libertadora Pressupostos Teóricos • • • - -5 Sua teoria de conhecimento aplicada à educação se sustenta na perspectiva dialética em que educador e educando, homens e mulheres, aprendem juntos numa relação dinâmica na qual a prática, orientada pela teoria, reorienta a teoria, num processo de constante aperfeiçoamento. Sustenta a conscientização como categoria pedagógica preocupada com a formação da autonomia intelectual do sujeito para intervir na realidade social concreta, pois, compreende que a educação é um ato político. Tem como relação pedagógica a cultura do grupo enfatizando o amor, a esperança, a humildade, a fé, a confiança e a criticidade. Pauta-se numa perspectiva humanista cristã libertadora fazendo uma síntese do neotomismo, da fenomenologia, do existencialismo e do neomarxismo. Papel da escola É a formação da consciência política do aluno para atuar e transformar a realidade. Sendo assim, problematiza a realidade, as relações sociais do homem com a natureza e com os outros homens, tendo por finalidade a transformação social. Conteúdos de Ensino Denominados de temas geradores e extraídos da problematização da prática de vida dos educandos. Assim, a codificação de uma situação-problema revela a força motivadora da aprendizagem. Para tanto, deve-se tomar distância da situação-problema para analisá-la criticamente. A análise envolve o exercício da abstração, através da qual procura-se alcançar, por meio das representações da realidade concreta, a razão de ser dos fatos. Avaliação Propõe uma prática emancipadora onde o desenvolvimento e o progresso do grupo se dão através de um programa definido coletivamente visando a reflexão e a compreensão crítica. Para tanto, a avaliação se dará através de trabalhos escritos e das autoavaliações a partir dos compromissos assumidos como o grupo e com a prática social. Relação Professor-Aluno Educadores e educandos são vistos como sujeitos do ato de conhecimento. Sendo o professor o coordenador dos debates estabelecendo uma relação horizontal, adaptando-se às características e necessidades do grupo. Por sua vez, o aluno é sujeito participante do e no grupo. Métodos de Ensino Conhecido como método dialógico, ativo e crítico. Portanto, exige uma relação de autêntico diálogo em que os sujeitos do ato de conhecer se encontram mediatizados pelo objeto a ser conhecido. Ao grupo de discussão cabe o ato de autogerir a aprendizagem, definindo o conteúdo e a dinâmica das atividades. Sendo assim, o professor deve se adaptar ao grupo para ajudar o desenvolvimento próprio de cada - -6 sujeito. Para tanto, deve-se problematizar situações que permitam aos educandos chegar a uma compreensão crítica da realidade, através da troca de experiências em torno da prática social. Técnicas de Ensino Métodos e técnicas se fazem e refazem na práxis através de discussões, debates, entrevistas, tomada de consciência para a transformação, visando a passagem da ingenuidade à criticidade. Principais representantes Paulo Freire, Moacir Gadotti e Rubem Alves 3 O legado de Paulo Freire Considerado como um dos pensadores mais notáveisna história da pedagogia mundial, Freire nasceu em Recife (1921) e faleceu na cidade de São Paulo no dia 02 de maio de 1997. Seus trabalhos destacaram-se na área da educação popular voltada para a escolarização dos mais pobres através de uma formação da consciência. Embora tenha origem em uma família de classe média, enfrentou na infância a pobreza e a fome decorrentes da depressão econômica de 1929, o que o levou a se preocupar com os mais pobres. Por seu empenho em ajudá-los tornou-se inspiração para as gerações de professores, em especial, da América Latina e da África. Esta opção o levou à perseguição do Regime Militar no Brasil (1964-1985), sendo preso e forçado ao exílio. Enquanto estudioso e teórico procurou construir uma síntese de algumas correntes do pensamento filosófico de sua época. Tais como: o existencialismo cristão, a fenomenologia, a dialética hegeliana e o materialismo histórico. Sua produção conquistou um amplo público de pedagogos, cientistas sociais, teólogos (influenciando inclusive as comunidades eclesiais de base – CEB – da Igreja Católica vinculada à teologia da libertação) e militantes políticos. Suas primeiras experiências no Rio Grande do Norte, em 1963, quando ensinou 300 adultos a ler e a escrever em 45 dias, através de um método inovador de alfabetização de jovens e adultos. Tal projeto estava vinculado ao nacionalismo desenvolvimentista do governo de João Goulart. - -7 Foi professor de História e Filosofia da Educação na Escola de Belas Artes da Universidade de Recife e após a publicação do livro Educação como Prática da Liberdade foi convidado para ser professor visitante da Universidade de Harvard em 1969. Seu mais famoso livro foi Pedagogia do Oprimido, lançado em 1968 e publicado em várias línguas como o espanhol, o inglês e até em hebraico. Foi consultor educacional do Conselho Mundial de Igrejas na Suíça. Neste mesmo período atuou como consultor em reformas educacionais em colônias portuguesas na África (Guiné- Bissau e Moçambique). Em 1991, foi criado o Instituto Paulo Freire com o objetivo de estender e elaborar as ideias deste filósofo, pedagogo e educador brasileiro. 4 A pedagogia do Oprimido “Se nada ficar destas páginas, algo, pelo menos, esperamos que permaneça: nossa confiança no povo. Nossa fé nos homens, na criação de um mundo em que seja menos difícil amar". (Paulo Freire) Partindo da compreensão de que vivemos em uma sociedade dividida em classes sociais, Freire afirma que os privilégios de poucos impedem que a maioria tenha o direito de usufruir dos bens produzidos socialmente. Dentre esses bens encontra-se a educação - da qual é excluída a maior parte da população mundial - como condição necessária para concretizar a vocação humana do ser mais. Freire desta a existência de dois tipos de pedagogia: a dos dominantes, onde a educação é instrumento de dominação e a do oprimido, que precisa ser realizada como prática da liberdade. Tal prática deve emergir dos próprios oprimidos e a pedagogia decorrente será “aquela que tem que ser forjada com ele e não para ele, enquanto homens ou povos, na luta incessante de recuperação de sua humanidade". Para tanto, não é suficiente que o oprimido tome consciência crítica das condições de opressão, mas, que se proponha a transformar tal condição através de um trabalho de conscientização e politização. - -8 Para Freire a educação bancária está fundamentada numa concepção autoritária em que há a predominância de uma prática verbalista dirigida para a transmissão e avaliação de conhecimentos abstratos, numa relação vertical, onde o saber é dado como sendo algo natural e não historicamente construído. Sendo, assim, o educando encontra-se numa condição passiva, ou seja, torna-se um objeto receptor da doação do saber do educador, ou seja, não atua sobre o que aprende e, consequentemente, não solidifica por experiências aquilo que aprende. Na contramão desse esquema negativo, propõe um método em que não se ensina a mera repetição de palavras, entretanto coloca o alfabetizando em condições de vivenciar de forma crítica as palavras de seu mundo, ou seja, de reescrever a vida como autor e testemunha de sua própria história. Segundo Freire a alfabetização não deve ser compreendida como um jogo de palavras, mas como consciência reflexiva da cultura, da reconstrução crítica do mundo humano. Portanto, é expressar-se expressando o mundo e aprender a ler é aprender a dizer a palavra. De acordo com Freire, a luta do oprimido pela sua humanização somente tem sentido quando homens e mulheres buscarem recuperar a humanidade tanto dos opressores quantos dos oprimidos. Salienta que esta tarefa só será possível ser construída por aquele que sofre a opressão de um processo de desumanização. Paulo Freire alerta que o processo de libertação do homem é doloroso por depender do próprio indivíduo expulsar ou não o opressor que existe dentro de si mesmo. Um dos problemas que se coloca à libertação é que opressores e oprimidos precisam ganhar consciência crítica da opressão e esta se dará através da práxis autêntica como ação-reflexão-ação, visando transformar o mundo. Para tanto, compreende que a prática problematizadora propõe aos homens e as mulheres sua situação como foco do problema. Nesse sentido, o diálogo assume uma exigência existencial para que se possa construir uma prática libertadora, pois será através deste que o sujeito poderá reconstruir o sentido de sua própria existência. - -9 5 Pedagogia da Autonomia Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém (Paulo Freire) No primeiro capítulo dedicado a relação dialética de que não há docência sem discência, afirma, que não é vergonhoso ao professor o não-saber, mas que é belo quando se assume que não se sabe e busca o saber de modo contínuo. Ressalta que o ato de ensinar exige: rigorosidade metódica, pesquisa, criticidade, respeito aos saberes dos educandos, risco de aceitar o novo e rejeitar qualquer forma de discriminação, reconhecimento da identidade cultural, estética e ética. Além disso, ressalta a necessidade de haver pureza nas palavras do professor, de modo a propiciar um ambiente favorável que possibilite a experiência, por parte do educando, como ser social. No capítulo II, Ensinar não é transferir conhecimento, enfoca outras exigências do ato de ensinar, tais como: a compreensão de que somos seres condicionados e inacabados; respeito à autonomia do educando; a necessidade do bom senso; humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educandos; curiosidade; crença de que a mudança é possível e; apreensão da realidade. Ressalta que uma das tarefas do educador é fazer com que o aluno deixe de ser dependente do professor (heteronomia) e passe a interagir com o conhecimento chegando à condição de um ser autônomo. Por fim, no capítulo III — Ensinar é uma especificidade Humana — aponta a questão de quem e para quem se ensina, afirma que a prática educativa é um exercício contínuo em defesa da produção e do desenvolvimento da autonomia de educadores e educandos cuja finalidade é a construção, a redescoberta e a ressignificação do conhecimento. Além disso, aponta outras exigências para o ato de ensinar, tais como: segurança, competência profissional e generosidade; compreensão de que a educação é uma forma de intervenção política no mundo, reconhecendo-a como ideológica; defesa da liberdade e autoridade; saber escutar e tomar decisões conscientes; disponibilidade para o diálogo e; querer bem aos educandos. O que vem na próxima aula Na próxima aula, você vai: • Compreender os princípios que norteiam a proposta de educação de Karl Marx e Friederich Engels. • Entender o papel do intelectual e da escola unitária segundo Gramsci. • Analisar as bases teórico-metodológicas da Pedagogia Histórico Crítico-Social dos Conteúdos de Dermeval Saviani. • • • - -10 CONCLUSÃO Nesta aula, você: • Compreendeu as bases teóricas das tendências libertárias e libertadoras. • Refletiu sobre o papel daescola, o método e os conteúdos de ensino, a avaliação, a relação professor- aluno e as técnicas de ensino dessas tendências. • Conheceu o legado de Paulo Freire e as principais ideias de duas grandes obras deste pensador: Pedagogia do Oprimido e Pedagogia da Autonomia. • • •
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