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O Paradoxo do Direito à Privacidade

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
FERNANDA LAGE ALVES DANTAS
O PARADOXO DO DIREITO À PRIVACIDADE E SUA 
OPERACIONALIZAÇÃO
RIO DE JANEIRO
2015
FERNANDA LAGE ALVES DANTAS
O PARADOXO DO DIREITO À PRIVACIDADE E SUA 
OPERACIONALIZAÇÃO
Dissertação de mestrado, apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Direito, Faculdade Nacional de Direito, 
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito 
parcial à obtenção do título de Mestre em Direito.
Orientadora: Juliana Neuenschwander Magalhães
Rio de Janeiro
2015
Fernanda Lage Alves Dantas
O PARADOXO DO DIREITO À PRIVACIDADE E SUA OPERACIONALIZAÇÃO
Dissertação de mestrado, apresentada ao Programa de Pós-graduação em Direito, 
Faculdade Nacional de Direito, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito 
parcial à obtenção do título de Mestre em Direito.
Aprovada em
___________________________________________________________
Juliana Neuenschwander Magalhães, Doutora 
Universidade Federal do Rio de Janeiro – Orientadora
____________________________________________________________
Alexandre Bernardino Costa, Doutor
Universidade de Brasília
____________________________________________________________
Margarida Lacombe Camargo, Doutora
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
DEDICATÓRIA
Para meu filho, Daniel Lage Dantas, inspiração mor do meu ser.
Para meu marido, Raphael Lage Reis Dantas, inspiração de muitas batalhas travadas e 
vividas aos longo dos últimos quase 12 anos, com quem sonhei e pude partilhar nos 
últimos três anos, as angústias de uma mulher e mãe dedicada ao mestrado. 
Para meu pai, Pedro Alves de Souza, e minha mãe, Terezinha Lage Alves, cujos 
exemplos me inspiraram os meios para chegar até aqui; perseguindo meus sonhos e me 
dedicando aos meus objetivos. 
A Juliana Neuenshwander Magalhães, professora e inspiração acadêmica para este 
trabalho.
AGRADECIMENTOS
À família: 
Aos meus pais, que sempre estiveram por perto, me apoiando e me inspirando. Jamais 
me esquecerei do suporte materno que tive nesta caminhada do mestrado.
 
À minha irmã, Fabíola Lage Alves, por ser a irmã mais próxima e estar sempre a 
disposição com muito carinho e afeto.
Ao meu marido, Raphael Lage Reis Dantas, cujo amor e compreensão superam 
qualquer agradecimento.
Ao meu filho lindo e querido, Daniel Lage Dantas, que com amor incondicional me 
nutriu nesta árdua jornada.
À minha sogra, Jucimara Reis Dantas, que com muito carinho e compreensão sempre se 
esforçou por proporcionar momentos mais agradáveis no decorrer desta jornada.
Aos professores e acadêmicos: 
A minha orientadora, Juliana Neuenschwander Magalhães, que me recebeu e acolheu no 
Programa de Pós-Graduação em Direito da FND, sempre me motivando e encorajando 
na árdua tarefa da pesquisa.
Aos demais professores do PPGD, que ao longo desta jornada muito me estimularam, 
dando aporte aos meus anseios.
Aos colegas de mestrado, parceiros de um período rico da vida acadêmica.
Finalmente, agradeço aos servidores do Programa de Pós-graduação em Direito na 
UFRJ e aos funcionários da Biblioteca Carvalho de Mendonça pelo apoio técnico, 
indispensável à minha pesquisa.
EPÍGRAFE
“Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado 
um com o outro. Cada um me contou a narrativa de por que se haviam zangado. 
Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham 
razão. Não era que um via uma coisa e outro outra, ou que um via um lado das 
coisas e outro de um outro lado diferente. Não: cada um via as coisas exatamente 
como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro, mas 
cada um via uma coisa diferente, e cada um, portanto, tinha razão. Fiquei confuso 
desta dupla existência da verdade.”
Fernando Pessoa 
RESUMO
ALVES DANTAS, Fernanda L. O Paradoxo do Direito à Privacidade e sua 
Operacionalização: um estudo de caso. Rio de Janeiro, 2015. Dissertação (Mestrado 
em Direito) – Faculdade Nacional de Direito, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 
Rio de Janeiro, 2015. 173p.
Esta dissertação analisa o cenário desafiador e carente de compreensão do direito à 
privacidade e o seu declínio diante da intensificação dos fluxos de informações. Este 
direito se vê frente ao direito de acesso, num processo de solidificação e expansão do 
dever de informação do Estado. A aparente tensão entre o direito à privacidade e o 
dever de informação, analisados a partir da promulgação da Lei de Acesso à Informação 
e a consequente previsão de divulgação da remuneração dos servidores público federais, 
coloca-nos diante de um paradoxo operativo do direito, termo cunhado na teoria da 
sociedade. O debate sobre a divulgação dos salários dos servidores no Portal da 
Transparência e sua resultante e ampla repercussão chamam a atenção para este 
paradoxo. O processo de redução de sua dimensão pelo qual o direito à privacidade, 
enquanto direito humano, vem passando, revela a necessidade de que as teorias jurídicas 
contemporâneas se debrucem sobre o tema. Para tanto, partiremos da compreensão do 
que é Estado Democrático de Direito, implicado na imprescindível necessidade de mais 
transparência. Buscamos trilhar por caminho inverso aos clássicos de pesquisa nessa 
área, trazendo exemplos do cinema e da literatura associado à relação que há entre 
direito/não direito; a maneira como ocorre a paradoxalidade entre o direito e sua 
negação. Desenvolveremos como ocorreu a regulamentação do direito de acesso no 
Brasil e os desafios deste para a administração pública, comparando ainda as LAIs 
brasileira e mexicana. Por fim trataremos de dois problemas cruciais para a democracia, 
a complexidade e a distribuição dos riscos.
ABSTRACT
ALVES DANTAS, Fernanda L. The Right to Privacy Paradox and its 
operationalization: a case study. Rio de Janeiro, 2015. Dissertation (Mcs in Law) - 
National Faculty of Law, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. 
173p.
This dissertation analyzes the challenging scenario and the lack of understanding of the 
right to privacy and its decline before the intensification of information flows. This right 
is faced to the right of access in a process of solidifying and expanding the duty of 
government information. The apparent tension between the right to privacy and the duty 
to inform, analyzed since the promulgation of the Access to Information Act and the 
consequent impact on the dissemination of the remuneration of federal public servants, 
puts us in front of an operating paradox of law, a basic concept/a definittion created by 
the Society Theory of Luhman. The debate on the dissemination of the servers salaries 
in the Transparency Portal and its wide repercussion draw attention to this paradox. The 
process of size reduction through of the right to privacy as a human right has been 
suffering, reveals the need that contemporary legal theories look into this matter. For 
this, we start from the understanding of what is a Democratic Rule of Law, involved in 
the indispensable need for more transparency. We seek to take the opposite way of the 
classic research in this area, bringing examples on film and literature associated with the 
relation between right/ not right; and how occurs the paradoxicality between the right 
and its denial. We will develop how occurred the regulation of the right of access in 
Brazil and the challenges of this for public administration, even comparing the Brazilian 
and Mexican Laws. Finally we will take care about two key problems for democracy, 
the complexity and the distribution of risks.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................... 11
1 O DIREITO À PRIVACIDADE: INDIVIDUALISMO E O DIREITO 
MODERNO..........................................................................................................
14
1.1 O DIREITO A PRIVACIDADE: CONSTRUÇÃOE EVOLUÇÃO.............. 21
1.1.1 Aspectos filosóficos da noção de privacidade.............................................. 21
1.1.2 As construções jurídicas acerca do direito à privacidade: a juridicização 
da privacidade e da intimidade...............................................................................
29
1.1.3 A ruptura com as bases clássicas do direito à privacidade: um conceito em 
crise?......................................................................................................................
33
1.2 O DIREITO À PRIVACIDADE NO BRASIL: LEGISLAÇÃO E 
JURISPRUDÊNCIA..............................................................................................
36
1.2.1 O Direito à privacidade no Brasil: legislação e jurisprudência..................... 36
1.2.1.1 Jurisprudência do STF............................................................................... 39
1.2.1.2 Jurisprudência do STJ................................................................................ 45
1.2.2 A privacidade na constituição – um paradoxo operativo.............................. 47
1.3 O DIREITO À PRIVACIDADE: COMPLEXIDADE E RISCO.................... 49
1.3.1 Obama Gate................................................................................................... 51
1.3.2 Debate das biografias.................................................................................... 55
1.3.3 Lei da transparência – servidores públicos................................................... 64
2 O DEVER DE INFORMAÇÃO NO QUADRO DE UM ESTADO 
DEMOCRÁTICO DE DIREITO.......................................................................
69
2.1 Direito e Política: O que significa Estado Democrático de Direito................. 69
2.2 O Estado Democrático de Direito entre o segredo e a transparência............... 81
2.2.1 Democracia e Opinião Pública...................................................................... 84
2.3 A Regulamentação do Acesso à Informação no Brasil.................................... 88
2.3.1 Os desafios da Administração Pública.......................................................... 94
2.4 O Exemplo Mexicano de Transparência Pública Governamental................... 98
2.5 A Lei da Comissão Nacional da Verdade e a Necessidade de Acesso às 
Informações sobre as Ações do Estado..................................................................
103
2.5.1 Contexto Histórico-brasileiro da criação da Comissão Nacional da 
Verdade..................................................................................................................
110
2.5.2 Instalação e execução dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade..... 113
2.5.3 Direito à memória e à verdade no acoplamento estrutural entre direito e 
política....................................................................................................................
116
3 TORNANDO O PARADOXO OPERATIVO ENTRE O DIREITO À 
PRIVACIDADE E O DEVER DE INFORMAÇÃO........................................
122
3.1 Direito à Privacidade versus Acesso à Informação no Brasil.......................... 122
3.2 Acoplamento Estrutural entre Direito e Política: os paradoxos do direito...... 136
3.3 Tornando o Paradoxo Operativo entre o Direito à Privacidade e o Dever de 
Informação.............................................................................................................
142
3.4 Complexidade e Risco..................................................................................... 149
CONCLUSÃO...................................................................................................... 158
Referências Bibliográficas................................................................................... 162
INTRODUÇÃO
O direito à privacidade e o seu visível declínio de importância nos últimos anos 
do século XX e início do XXI, diante das cada vez mais desenvolvidas técnicas da 
sociedade “globalizada” como, por exemplo, a intensificação dos fluxos de 
informações, compõe um cenário desafiador e carente de compreensão. Tal aspecto nos 
faz despertar a indagação de porque e como esse direito, fundamental e de suma 
importância na primeira metade do século passado, dito ‘inalienável’, teve suas 
dimensões modificadas e diante do qual passou a produzir riscos inerentes a essa opção 
política.
Aliado a isto, temos o dever de informação, direito também fundamental, 
recentemente regulamentado no Brasil, seguindo uma tendência mundial de transição a 
mais democracia. Este dever é correlato ao direito de acesso e visa como principal 
objetivo a solidificação e o controle democrático da prestação de contas do governo à 
sociedade. A expansão do dever de informação está colocada frente ao direito à 
privacidade, que se vê reduzido. Esta aparente tensão entre o direito à privacidade e o 
dever de informação é o mote da presente pesquisa. E para tanto, partiremos da análise 
da Lei de Acesso à Informação e sua possível previsão de divulgação da remuneração 
dos servidores público federais. A repercussão do debate sobre referida divulgação no 
Portal da Transparência evidencia a tensão existente entre ambos direitos.
Nesta pesquisa, interessa, em particular, a afirmação dada pela teoria dos 
sistemas, de que a tensão entre direitos pode ser vista não como uma tensão, mas como 
um paradoxo. E paradoxo no sentido operativo, onde o direito de um é o não direito de 
outro, e dessa forma, podemos indicar a existência de ambos direitos. Apresentado 
assim, o paradoxo não é um problema. Indo diametralmente em direção oposta ao 
sentido das teorias que buscam sopesar conflitos/colisão de direitos, amplamente 
difundidas na doutrina constitucional, a teoria dos sistemas vem dar um enfoque 
diferente à questão, propondo que a solução se dê com formas criativas de se resolver a 
possível tensão.
Dita abordagem soou para nós como algo desafiador, analisar o estado tenso 
existente entre o direito à privacidade e o dever de informação sob um enfoque 
operativo da questão. Pretendemos dar profundidade ao tema, observando como se dá a 
coexistência de dois direitos que aparentemente se contradizem um ao outro. A partir 
dessa observação de que há um paradoxo entre o direito à privacidade e o dever de 
informação procuraremos examinar uma segunda questão, que por trás do dito paradoxo 
há um mecanismo de interligação entre a política e o direito, o acoplamento estrutural. 
A tarefa não é fácil, pois requer irmos de encontro com todo o senso comum absorvido 
nos últimos anos de formação acadêmica. E por conta disso, desafiadora.
Com a finalidade de darmos uma visão geral ao tema, partimos de uma análise 
da construção e evolução histórico-filosófica do direito à privacidade, e sua 
juridicialização, abordando a aplicação legislativa e jurisprudencial do referido direito 
no território brasileiro. A ampla utilização dos mecanismos e tecnologias disponíveis 
em nossa sociedade mundial vem nos trazer diversos exemplos em que o direito à 
privacidade se vê confrontado, demonstrando o quanto essas possibilidades 
incrementam complexidade e riscos. Obama Gate, debate das biografias e a própria Lei 
de Acesso à Informação demonstram o quanto essa questão tem permanecido em voga 
nos últimos anos. O quanto o direito à privacidade, enquanto direito humano, tem tido 
sua dimensão reduzida, demonstrando a necessidade de que as teorias jurídicas 
contemporâneas, e o próprio direito, se debrucem sobre referido aspecto.
A associação entre o direito à privacidade e o dever de informação traz à tona a 
necessidade de aprofundarmos o estudo deste último, de o analisarmos num quadro de 
um Estado Democrático de Direito. Partindo da compreensão do que é Estado 
Democrático de Direito e visando desvelar o dever de informação do Estado, implicado 
na necessidade de maior transparência nos últimos anos. Iremos esmiuçar as nuances 
desse instituto sob a égide da transparênciae desde os primórdios do segredo. 
Pretendemos explicar porque a noção de segredo é incompatível com o Estado 
Democrático de Direito. Para tanto, abordaremos assuntos como democracia e opinião 
pública. E esta última acabará por nos revelar que nem sempre o segredo é maléfico ao 
Estado.
Portanto, esta é uma pesquisa do campo da Teoria do Direito. Porém, ao invés de 
percorremos os caminhos clássicos das pesquisas nessa área, propomos trilhar por um 
caminho inverso, observando através da análise da Lei de Acesso à Informação, com aporte 
em exemplos do cinema e da literatura, a relação estabelecida entre Direito/não Direito; a 
forma como se dá essa paradoxal relação entre o direito e a sua negação. Certamente uma 
incursão, num trabalho jurídico, no campo da arte, poderá causar algum estranhamento. 
Mas, conforme se verá, a literatura, o cinema, a arte de maneira geral podem falar dos 
paradoxos de um jeito que a ciência, por apegada a um modelo de lógica clássica, não pode 
se permitir. 
Buscaremos desenvolver como se deu a regulamentação do direito de acesso no 
Brasil e os desafios da aplicação deste para a administração pública. Traremos ainda, a 
título de comparação, o exemplo de transparência pública governamental do México, um 
dos primeiros países na América Latina a regulamentar o acesso à informação. Diante da 
comparação com uma das leis mais avançadas sobre o assunto, teremos condição de abordar 
algumas das proximidades e até mesmo incoerências da Lei de Acesso brasileira.
Apesar de não ser nosso objetivo principal, embora tenha uma forte ligação 
com o tema central da pesquisa, iremos abordar a lei que cria a Comissão Nacional da 
Verdade (Lei nº 12.528/11). Referida lei não poderia estar ausente, uma vez que se 
constitui como clássico exemplo da necessidade de acesso às informações sobre as 
ações do Estado. Analisá-la, é acima de tudo, trazer à tona a forte ligação que há entre 
os fundamentos de edição desta e de sua antecessora, a Lei nº 12.527/11. Tentaremos 
contextualizar historicamente a criação da Comissão Nacional da Verdade, bem como a 
instalação e a proposta de seus trabalhos. 
Neste trabalho, buscamos problematizar o contexto jurídico e político em que o 
direito à privacidade e o dever de informação transitam, almejando através das Teorias 
Jurídicas contemporâneas, atingir comprometimentos novos do Direito com a Justiça, 
procurando não retornar a conceitos Juspositivistas. Assim, dedicamos boa parte da 
pesquisa ao acoplamento estrutural entre direito e política, visível, por exemplo, a partir 
da proposta de análise do direito à memória e à verdade.
E, por fim, dedicamos a última parte da pesquisa ao exame atento do paradoxo 
operativo entre o direito à privacidade e o dever de informação. Buscaremos entender 
porque esse paradoxo não está, para a teoria dos sistemas como um problema, pois é 
através dele que podemos dar a conhecer a existência de ambos direitos. Trataremos 
também de um dos problemas cruciais da democracia: a distribuição de riscos. Riscos 
entendidos como a imprevisibilidade dos resultados decorrentes das possibilidades de 
decisão. Em meio a essa gama de variedade, constataremos ainda outro fenômeno, a 
complexidade, aspecto que se reduz e se amplia constantemente. Observaremos porque 
a complexidade e o risco estão interligados e juntos ao acoplamento e ao paradoxo 
compõem a pequenina parte daquilo que pudemos compreender da complexa teoria dos 
sistemas.
1. O DIREITO À PRIVACIDADE: INDIVIDUALISMO E O DIREITO 
MODERNO
Vivemos em uma sociedade mundial, conforme argumentou e fundamentou 
consistentemente Niklas Luhmann1, autor da Teoria da Sociedade2. Seguindo esta linha, 
de acordo com as condições atuais, o sistema global é constituído por uma única 
sociedade, e não várias. Diferentemente do que se pensou no século XIX, ocasião em 
que se falava que uma sociedade é o somatório dos Estados Nacionais. A sociedade não 
é o somatório dos Estados Nacionais, ela é uma sociedade só. Os diferentes estados são 
formas de organização política de uma única sociedade. A sociedade moderna também 
conhecida como sociedade mundial é uma sociedade funcionalmente diferenciada. 
A sociedade funcionalmente diferenciada é aquela na qual se especificaram 
formas de produção da comunicação voltadas para solução específica de problemas 
sociais, ou seja, diferenciaram-se sistemas sociais, tais como a política, a economia, a 
educação, a arte e a ciência. Esses sistemas também são globais e são diferenciados de 
uma forma que um não tem preponderância sobre o outro. De maneira que nessa 
sociedade não se pode falar nem num topo nem num centro.
Nas palavras do autor é “una sociedade que evoluciona pero que no se puede 
controlar a sí misma”. E qualquer evolução para esta sociedade dependerá de sua 
própria complexidade3. Ou seja, a cada tentativa de reduzir essa complexidade o que 
1 LUHMANN, Niklas. Globalizacion o sociedade mundial: Como concebir la sociedad moderna? 
Fonte: International Review of Sociology Mar 97, Vol. 7 Issue 1, p. 67, 13p. 
2 “A Teoria da Sociedade é uma oferta de descrição da sociedade na sociedade” NEUENSCHWANDER 
MAGALHÃES, Juliana. O Uso Criativo dos Paradoxos do Direito: a aplicação dos princípios gerais do 
direito pelo Tribunal de Justiça Europeu. Dissertação de Mestrado. Florianópolis, Universidade de Santa 
Catarina, 1994. p. 25
3 Complexidade: A complexidade de uma unidade indica o fato de que nem todos os elementos da dita 
unidade podem estar simultaneamente relacionados com eles mesmos. Assim, complexidade significa que 
para atualizar as relações entre os elementos é necessária uma seleção. Como fundamento da definição de 
complexidade está a distinção entre elemento e relação, que permite observar uma condição de parentesco 
seletivo, distinguindo-a de uma condição de parentesco completo entre os elementos. A complexidade 
pode ser observada num sistema ou no seu ambiente, ou ainda no mundo. 
Observa-se que o número de possíveis relações em abstrato entre os elementos de um sistema aumenta 
exponencialmente em relação ao aumento do número dos próprios elementos (dois elementos formam 
quatro relações, três elementos formam nove e etc). Consequentemente, quando em um sistema os 
elementos se tornam muito numerosos, o número de relações alcança tal tamanho que já não são 
controláveis. 
Complexidade é o fato de que existem sempre mais possibilidades de quantas podem atualizar-se como 
comunicação nos sistemas sociais. Já que o mundo está constituído como unidade da diferença entre os 
sistemas e seu ambiente, a complexidade sempre é relativa a diferença entre sistema e ambiente.
A diferença entre sistema e ambiente consiste em um gradiente de complexidade (Komplexitätgefalle): o 
ambiente é sempre mais complexo que o sistema, já que o sistema fixa os limites que delimitam o âmbito 
do possível em seu interior. CORSI, Giancarlo et al. Glosario sobre la teoria Social de Niklas 
Luhmann. Tradução de Miguel Romero Pérez e Carlos Villalobos. Coordenação de Tradução Javier 
acontece é um aumento da complexidade. Diante do qual, pode-se assinalar que a 
sociedade atual, com base na forma de sua diferenciação4, admite uma absurda 
complexidade.
Nos dias atuais, a sociedade mundial tem alcançado um maior nível de 
complexidade em relação às sociedades precedentes, com maiores contingências 
estruturais, mudanças inesperadas e imprevisíveis. Como bem ressalta Luhmann, alguns 
denominam tais acontecimentos de caos5. Pontuamos que a sociedade atual é marcada, 
sobretudo, por maior dependência de interconexão e interdependências, o que significa 
que as construções causais já não são possíveis desde um ponto de vista central e 
objetivo. Dessa forma, vivemos em uma sociedade poli contextual e poli centrica.
A questão da privacidade que nesta pesquisa pretendemos discutir está muito 
ligada ao surgimento de umarede mundial de comunicação. A mundialização é 
importante para as ameaças à privacidade nessa sociedade.
Nunca foi tão evidente o caráter mundial da sociedade porque nunca a 
comunicação se pode apresentar de uma maneira tão mundializada. O fenômeno não é 
tão recente assim. De acordo com o sociólogo Luhmann, desde a metade do século XIX 
existe um tempo único do mundo. O que significa dizer que, em qualquer lugar do 
globo terrestre – independente da hora e do lugar – pode se estabelecer simultaneamente 
com todos os outros lugares e comunicar-se com todo o mundo sem perda de tempo.6 
Do final do século XX pra cá, é mais aparente e intensa a mundialização da sociedade. 
Isto se faz possível porque partimos da simultaneidade de todo acontecer mundial 
(televisão, internet) sem nos importarmos com as condições físicas dos tempos diurnos 
ou noturnos. Por exemplo, uma determinada comunicação pode chegar aqui no Brasil à 
noite enquanto em outro lugar é dia, atravessando a fronteira dos Estados. Vivemos num 
mundo onde a questão da informação é cada vez mais relevante. Essa intensificação dos 
fluxos de informações está gerando uma cada vez maior tensão entre o direito à 
Torres Nafarrate. Universidad Iberoamericana, México: 1996.
4 Num sentido geral, se fala de diferenciação (Ausdifferenzierung) quando um sistema se diferencia no seu 
próprio ambiente, ao traçar limites. Todo sistema pode observar que existem outros sistemas no seu 
ambiente, sistemas que por sua vez se diferenciam dos próprios ambientes e podem observar tais 
ambientes segundo distinções particularmente próprias. A diferenciação de um sistema consiste na 
implementação do próprio sistema, se trata de uma forma reflexiva e recursiva de construção/replicação 
do sistema, dentro do próprio sistema. Diferenciação do sistema significa diferenciação de diferenças 
sistema/ambiente. Por exemplo, a realidade pode ser observada desde uma perspectiva política, 
econômica, científica e etc. CORSI, Giancarlo et al., Op. Cit., 1996.
5 LUHMANN, Niklas. Globalizacion o sociedade mundial: Como concebir la sociedade moderna?. 
Fonte: International Review of Sociology Mar97, Vol. 7 Issue 1, p. 67, 13p.
6 LUHMANN, Niklas. La Sociedad de la Sociedad. Tradução Javier Torres Nafarrate. 1ª Edición en 
Español. México, 2006. p. 111.
privacidade e o dever de informação. A sociedade dos dias atuais é caracterizada por 
novas possibilidades entre ausentes. Possibilidades estas, nunca antes experimentadas, 
que trouxeram desafios para o direito e para a política. Ou ainda, tornaram mais 
evidentes os problemas com os quais o direito tinha que lidar antes.
O impacto dessas mudanças é muito grande, com elas pode-se alterar o tempo, 
a qualidade e a capacidade de alcance da comunicação. Tendo em vista o aumento do 
fluxo de informações nos últimos anos se falou muito em globalização, como se a 
sociedade já não fosse mundial. Como se ela estivesse se globalizando por causa dessas 
novas tecnologias. Na verdade o que as novas tecnologias mostram é aquilo que a 
sociedade já era: global.
A sociedade já era uma só. Entretanto, isso não era tão visível quanto agora, 
momento em que temos um grande fluxo de informações. Diante de tantas mudanças 
tecnológicas e nos meios de comunicação, alguns autores, como o sociólogo Manuel 
Castells, preferem chamar a sociedade de sociedade da informação, mas nós dizemos 
que ela é a mesma sociedade de sempre, uma sociedade que tem como universo a 
comunicação. Ela se produz e reproduz a partir da recorrência da comunicação. Por 
isso, quando queremos observar a evolução desta sociedade não há outra opção senão 
focarmos no sistema social da sociedade mundial. Se existissem várias sociedades, de 
acordo com Luhmann, “estas sociedades, estarían sin relación comunicativa; o bien em 
la perspectiva de cada uma de ellas, uma comunicación com las otras sociedades sería 
imposible o no tendría consecuencias”.
Preferimos não apontar a sociedade como sociedade da informação. Uma vez 
que a informação vem a ser uma característica da complexidade da sociedade moderna, 
marcada pela emergência daquilo que Manuel Castells chamou de "paradigma 
tecnológico". Essa nova forma de organização social é pautada na difusão de redes de 
comunicação digital. Para Manuel Castells, “as redes de comunicação digital são a 
coluna vertebral” do que ele denomina de “sociedade em rede”7 Na verdade, toda essa 
tecnologia à qual Castells se refere como sociedade em rede não a observou dessa 
forma. Para nós, não é que as redes transformaram a sociedade. Apenas as redes 
tornaram mais visível o caráter global da sociedade. A sociedade continua a mesma, ela 
sempre foi mundial. Basta surgir uma nova tecnologia para as pessoas acharem que a 
sociedade mudou.
7 CASTELLS, Manuel e CARDOSO, Gustavo. (Org.). A Sociedade em Rede. Do Conhecimento à 
Acção Política. 2005: p. 17.
No contexto da sociedade moderna marcada pela complexidade, as 
informações tornaram-se um bem precioso. Assim, informações e seu consequente 
gerenciamento estão no centro da cobiça tanto de governos quanto da área privada na 
ânsia de desenvolver conhecimentos e otimizar resultados. A manipulação de tais dados 
cada vez mais enfrenta disputas políticas, econômicas e sociais. Basta referirmo-nos às 
denúncias recentes de violação de dados sigilosos de empresas e países pelos EUA para 
se constatar o alcance de tais disputas.
É notória a relevância, cada vez maior, da informação. Importante pontuar que 
na teoria dos sistemas, a informação nada mais é do que uma das etapas da 
comunicação. Neste ponto, fundamental esclarecer as definições de comunicação bem 
como de informação.8 O conceito usual de comunicação se baseia na metáfora da 
transmissão. Por outro lado, a ideia de comunicação apresentada na teoria dos sistemas 
contradiz a metáfora da transmissão, ela é uma sucessão de efeitos multiplicadores: 
primeiro um a tem, em seguida dois, e logo ela poderá ser estendida a milhões, como no 
caso da televisão. Obtém-se a comunicação mediante três componentes sintéticos – a 
informação, o ato de comunicar e o ato de entender – isoladamente, nenhum desses três 
componentes pode constituir a comunicação. Tanto a informação como o ato de 
comunicar são seleções que devem manter-se distinguidas. Tal diferença é fundamental 
na teoria sistêmica.
Dessa forma, a informação é a seleção de uma diferença. Ela provoca a 
mudança de estado do sistema e, consequentemente, opera outra diferença. A 
informação só acontece no sistema de comunicação, uma vez que ela consiste em uma 
seleção numa escala de possibilidades. Fora da comunicação não pode haver 
informação, nem partilha da comunicação, e tampouco ato de entender a comunicação. 
Sob esta ótica, de acordo com Luhmann, toda comunicação traz implicitamente um 
risco localizado na base da comunicação, pois ela “leva à decisão de que tanto a 
informação como o ato de comunicar podem ser aceitos ou recusados” 9.
No terceiro componente – ato de entender a comunicação – ocorre a conexão 
entre informação e ato de comunicar, principalmente se utilizada a linguagem, ou seja, o 
ato de entender é encarregado de que os outros dois possam ser vistos como unidade. 
Para a teoria dos sistemas, a função da comunicação consiste em tornar provável aquilo 
8 Cf. LUHMANN, Niklas. Introdução à Teoria dos Sistemas. Tradução de Ana Cristina Arantes Nasser. 
2ª ed. Ed. Vozes, 2010.
9 LUHMANN, Niklas. Op. Cit. 2010. p. 303.
que é altamente improvável. “Se, a partir da posição do ato de entender não se produz a 
diferença entre informação e ato de comunicar, não existe nenhuma comunicação”. 10 
No contexto desta sociedade moderna, que possui como característica ímpar a 
complexidade, ou, na definição de Manuel Castells, sociedade da informação, o 
armazenamento dessa informação, bem como seu processamento e produção são 
manipulados porferramentas da Tecnologia da Informação, apresentada como um novo 
campo do saber. O que caracteriza de forma marcante essa sociedade é o fato da 
informação atuar essencialmente no desenvolvimento, tanto social quanto econômico e 
político. Tal fenômeno é realmente importante, e através dele observa-se que o 
computador, ferramenta fundamental desta conjuntura, rompeu com o processo de 
sequencialidade do ato comunicacional, disse Luhmann.11 Essa modalidade de 
conhecimento cria novas modalidades de relacionamento, passando a interferir no 
cotidiano, na forma de produção e nas atividades de um modo geral do setor público e 
privado. Como reflexo desta transformação, vê-se o incremento da exposição da 
intimidade e da vida privada diante dos novos recursos tecnológicos. 
O direito em face de tal situação vê-se, certamente, pressionado a oferecer 
respostas minimamente seguras em face da intensificação do fluxo de informações e a 
consequente relevância que estas adquirem na sociedade. Muitas (novas) questões 
advêm desse novo contexto social, que vão desde o sigilo de dados de empresas e 
pessoas, até o controle da veracidade das informações disponibilizadas na rede mundial 
de computadores. Se a verdade, até bem pouco tempo, era um monopólio da ciência que 
produzia seus próprios critérios de divulgação daquilo que considerava científico e, 
portanto, verdadeiro, hoje muitas verdades são produzidas para além daquelas 
fronteiras. Isto não necessariamente é um problema para o direito, mas certamente é 
uma questão para a ciência. As questões jurídicas ligadas a esse tema parecem, no 
momento, esbarrar mais frequentemente no direito à privacidade. 
Com a chamada revolução tecnológica, especialmente o advento da rede 
mundial de computadores, conhecida como “internet”, informações de cunho pessoal 
passaram a ser veiculadas em redes de computador, facilitando a sua divulgação a 
terceiros. Vários tipos de informações são interceptados por empresas e/ou governos. 
Observa-se, portanto, o desenvolvimento absurdo da violação à privacidade. A 
preocupação em se preservar o direito à privacidade desponta através de uma função 
10 LUHMANN. Op. Cit., 2010. p. 304.
11 LUHMANN. Op. Cit., 2010. p. 315.
ainda mais “complexa” do que aquele simples direito ao isolamento, qual seja a de 
resistir a políticas de discriminações, como a predisposição genética a determinadas 
doenças, mapeada pelo projeto Genoma12.
Nesta sociedade marcada por seu caráter mundial e pela permanente 
mundialização das tecnologias de informação, intensificação dos fluxos de informação, 
resta saber qual é o papel do direito e o papel do Estado na regulação desse fluxo de 
informação. De um lado o Estado, como governo, precisa de informação. Os estados 
precisam ter um controle da informação para poder se construir como governo, para 
poder se estabelecer como Estado. Então, de um lado, o Estado precisa do controle da 
informação (da informação sobre outros Estados e da informação dos seus próprios 
cidadãos). Mas de outro lado, é dever do Estado também preservar a esfera da 
privacidade dos seus cidadãos. Este foi um dos primeiros direitos fundamentais a ser 
pensado. Todo Estado moderno surge não apenas tendo como limite a privacidade do 
cidadão, mas também tendo por função garantir essa privacidade. Então existe uma 
contradição na verdade. Percebe-se uma tensão no contexto de Estados, como é o caso 
brasileiro que se pretende democrático, entre o dever de informar13 de um lado e o 
direito à privacidade de outro. É fato que os Estados necessitem cada vez mais de 
informações detalhadas sobre os cidadãos para diminuição e combate à criminalidade e 
formulação de políticas públicas por exemplo. Contudo, é cediço que se imponha alguns 
limites ao uso das informações ditas pessoais, para que se evitem abusos na intimidade 
das pessoas. 
Portanto, admite-se ser necessário que o Estado exerça certo controle sobre os 
administrados, mormente os servidores, tendo estes e aqueles, obrigações de fornecer 
informações pessoais aos órgãos públicos. Entretanto, é bom frisar, alguns limites 
devem ser determinados ao poder estatal. E se nós estamos falando de Estado 
Democrático de Direito, a função que o Estado tem de ao mesmo tempo precisar de 
informações e ser responsável por garantir a privacidade dos cidadãos, vai ser também 
atravessada por outra tensão que é o dever de informação, dever de transparência que o 
Estado tem, em face de seus cidadãos.
12 O Projeto Genoma é destinado a mapear o código genético humano. Sua proposta pode, por um lado, 
revolucionar o tratamento de diversas patologias, mas por outro, pode gerar graves consequências, no 
caso das informações servirem como meio de se promover a exclusão de indivíduos do mercado de 
trabalho devido a, por exemplo, predisposição genética a determinadas doenças.
13 Vale lembrar que para que se chegue ao dever de informar em si, o Estado pode ter como atividades 
predecessoras a coleta adequada de dados, o gerenciamento, o cruzamento de informações, a manipulação 
e a própria divulgação.
Recentemente o jornal O Globo14 revelou, baseado em documentos secretos, 
que cidadãos e empresas usuários no Brasil da rede mundial de internet, são espionados 
pela Agência Nacional de Segurança Nacional dos EUA, a NSA, junto com a CIA. 
Como reação ao fato, a presidente Dilma Roussef propôs um isolamento geográfico da 
internet no Brasil. Ela deseja que os dados dos cidadãos brasileiros sejam armazenados 
localmente. A tendência é que reação como estas fiquem cada vez mais severas. A 
Folha de São Paulo noticiou que Sascha Meinrath, diretor do Open Technology Institute 
na New American Foundation, de Washington disse “Esta noção de soberania em 
privacidade nacional vai se tornar uma questão mais e mais relevante ao redor do 
mundo.” 15 
Dessa forma, diante da relevância do tema exposto, justifica-se estudo 
criterioso do assunto à luz do Direito. O direito reage a isso se apoiando numa 
semântica do indivíduo, ou pelo menos naquilo que a modernidade construiu como 
sendo o indivíduo, com sua individualidade e esfera de privacidade, com sua 
inviolabilidade, que parece vulnerável a essa nova realidade, sem o controle das 
informações, mesmo as mais íntimas, a seu respeito. Neste novo cenário, a intimidade e 
a vida privada restam expostas frente aos avanços tecnológicos. O direito trata esse 
indivíduo como objeto de tutela jurídica. E vai transformar esse espaço da 
individualidade no direito à privacidade. Vai juridicizar a individualidade. Mas, ao 
mesmo tempo, o direito opera nesse contexto, falando do dever da informação.
No presente capítulo irei analisar, de um lado, as dimensões do direito 
fundamental à privacidade, bem como os riscos inerentes à exposição da privacidade no 
cenário da sociedade atual. De outro, o chamado dever de informação. Para tal, 
partiremos do caso da Lei de Acesso a Informação (Lei nº 12.527, de 18 de novembro 
de 2011), cujo primeiro projeto tem como autoria do deputado Reginaldo Lopes. E a 
repercussão de referida lei no debate sobre a divulgação dos dados de servidores 
públicos no Portal da Transparência para evidenciar a tensão existente, de uma maneira 
geral e mais especificamente no Direito Brasileiro, a partir do referido caso. 
14 A matéria jornalística sobre o escândalo de espionagem dos EUA mostra que há sete anos a Agência 
Nacional de Segurança coleta informação dos cidadãos americanos, de estrangeiros residentes ou em 
trânsito no país. Os documentos utilizados para dar base à matéria mostram que o Brasil aparece como 
alvo prioritário na espionagem do tráfico de telefonia e dados, ao lado de países como China, Rússia, Irã e 
Paquistão. O Globo. O Escândalo da Espionagem dos EUA. 28/09/2013 
<http://oglobo.globo.com/mundo/o-escandalo-da-espionagem-dos-eua-10191175> Acesso em: 
28/05/2014> 
15 BROOKS, B. e BAJAK, F. Plano de “isolar” a internetdo Brasil é um erro, dizem especialistas. 
Folha de São Paulo. 17/09/2013. <http://www1.folha.uol.com.br/tec/2013/09/1343181-plano-de-isolar-a-
internet-do-brasil-e-um-erro-dizem-especialistas.shtml> Acesso em:28/05/2014.
Analisaremos, assim, a tensão entre o direito à privacidade e o dever de informação no 
ordenamento jurídico brasileiro. Essa relação ilustra como veremos o paradoxo16 da 
unidade da diferença17 entre direito e política no quadro do Estado Democrático de 
Direito. 
1.1. O DIREITO A PRIVACIDADE: CONSTRUÇÃO E EVOLUÇÃO
1.1.1. Aspectos filosóficos da noção de privacidade
O conceito de privacidade se interliga ao de liberdade18 uma vez que o 
indivíduo ao exercer tais direitos decide o que realmente deseja ou não expor a respeito 
de si mesmo. Alguns autores19 afirmam que os direitos da personalidade surgiram na 
Idade Média, ocasião em que o homem inicia o culto à espiritualidade; e outros autores20 
mencionam que foi na Antiguidade Clássica. Evidentemente, é bastante anacrônica a 
pretensão de que o direito à privacidade possa ter se esboçado antes mesmo da invenção 
da noção de indivíduo. Para Koselleck, o movimento iluminista, aquele onde o súdito se 
descobre cidadão, foi acelerado pelo abuso de poder do Rei Luís XIV21. Em 
16 Conforme o Glosario sobre la teoria social de Niklas Luhmann, os paradoxos se criam quando as 
condições de possibilidade de uma operação são ao mesmo tempo as condições de sua impossibilidade. 
Um dos exemplos mais conhecidos de paradoxo é o de Epiménides, que aparece na afirmação “esta frase 
é falsa”. Não é possível decidir se tal afirmação é verdadeira ou falsa, uma vez que as condições de sua 
falsidade são ao mesmo tempo as condições de sua verdade e vice-versa. Se qualificarmos a frase como 
verdadeira, contradizemos ao mesmo tempo o que ela enuncia (e então a frase é falsa). Se, ao contrário, a 
qualificarmos como verdadeira então estamos obrigados a concordar com seu conteúdo (e nesse caso a 
frase é verdadeira). CORSI et al, Op. cit., 1996. p. 123.
17 Por falar em unidade da diferença, Luhmann explica como uma mesma comunicação funciona 
operativamente como unidade da diferença sem poder comunicar esta unidade. Ele fala de um sistema 
que necessita de uma auto-observação e a observação é uma operação dependente da distinção que, no 
mesmo ato de operar, se manifesta como terceiro excluído. Assim, toda auto-observação está 
condicionada a um ponto cego: é possível somente porque não pode se ver. LUHMANN, Op. Cit., 1997. 
p. 61-62. 
18 NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Juliana. A formação do conceito de direitos humanos. 
Curitiba, Juruá, 2013. p. 142-146.
19 PEREIRA, Heloisa Prado. Algumas Considerações sobre a Pessoa Humana. Jus Navigandi, 
Teresina, ano 10, n. 635, 4 abr. 2005 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6491>. Acesso em: 5 fev. 
2015. Conforme a autora, o professor Juan Castan Tobeñas esclareceu que coube ao Cristianismo, desde 
seus primeiros momentos, afirmar o indivíduo como valor absoluto, exaltando o sentimento de dignidade 
da pessoa humana e proclamando uma organização da sociedade que viesse a permitir o total 
desenvolvimento de sua personalidade.
20 SIQUEIRA, Alessandro Marques de. Direitos da Personalidade. Revista Âmbito Jurídico. Disponível 
em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?
n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8509>. Acesso em 5 fev. 2015. Siqueira, ao discorrer sobre as 
referências históricas dos direitos da personalidade afirma que "A consolidação da doutrina sobre os 
Direitos da Personalidade é um caminho longo e marcado por tortuosidades, iniciado, de modo 
embrionário, na Antiguidade Clássica."
21 KOSELLECK, Reinhart. Crítica e Crise. Uma contribuição à patogênese do mundo burguês. 
Tradução do original alemão de Luciana Villas-Boas Castelo-Branco. Ed. UERJ, Rio de Janeiro, 1999. p. 
http://jus.com.br/revista/edicoes/2005
http://jus.com.br/revista/edicoes/2005
http://jus.com.br/revista/edicoes/2005/4
http://jus.com.br/revista/edicoes/2005/4/4
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Neuenschwander Magalhães, o conceito de indivíduo “ao qual se associará a noção 
moderna de direitos humanos, produziu-se apenas a partir do século XVII.”22 Num 
primeiro momento, temos a diferença entre homem e pessoa, e só mais tarde é que a 
noção de pessoa se interligará à noção de indivíduo. 
O indivíduo, ou pelo menos aquilo que desde os seiscentos indicamos como 
sendo o indivíduo, com suas qualidades e, sobretudo, faculdades morais e jurídicas, é 
uma invenção moderna. Antes do indivíduo moderno, os homens eram vistos como 
parte de um estrato social, e em função desta pertinência tinham sua vida traçada, desde 
o nascimento e sem alternativas em termos daquilo que hoje chamamos de “mobilidade 
social”. O espaço privado da Antiguidade é o espaço da família. A própria noção de 
pessoa23 é anterior àquela de indivíduo: primeiramente, assinala-se a diferença entre o 
homem enquanto animal e o homem enquanto pessoa. Essa diferença sugere que “nem 
todos os homens são pessoas. Assim como nem todas as pessoas são, como hoje resta 
evidente, humanas. A naturalidade do homem é distinta da artificialidade da pessoa.” E, 
somente mais tarde, a noção de pessoa passa a ser ligada à noção de indivíduo.24 
Contudo, de forma autêntica e decisiva, Jean-Jacques Rousseau descobriu a 
função mais relevante da privacidade, qual seja a intimidade. Privacidade significa 
“proteger aquilo que é íntimo”25, e é apresentada como o oposto da esfera social. Arendt 
nos relata que Rousseau chegou à sua descoberta mediante uma rebelião contra a 
insuportável perversão do coração humano pela sociedade. Seria uma espécie de 
rebelião “contra a intrusão da sociedade numa região recôndita do homem, que até 
então, não necessitara de qualquer tipo de proteção especial.”26. Surge, portanto, de 
forma autêntica das mãos de Rousseau, o conceito de intimidade – que consistiu numa 
reação rebelde contra a sociedade, “contra as exigências niveladoras do social, contra o 
que hoje chamaríamos de conformismo inerente a toda sociedade”27. O que hoje 
20.
22 NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Op. Cit., 2013. p. 81-82.
23 Neuenschwander Magalhães apresenta-nos a definição de pessoa dada por Boécio, nos séculos V/VI. A 
autora afirma que o conceito teológico de pessoa que Boécio ofereceu, é um conceito que atravessou o 
período medieval e conheceu, até o limiar da modernidade, grande sucesso. “Boécio definiu “pessoa” 
como “substância individual de natureza racional”. Esse conceito de pessoa permite que o termo, 
utilizado para que se identifique, na linguagem comum, o indivíduo humano, possa estender-se dos 
homens, também aos anjos e a Deus.” NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Op. Cit. 2013. p. 87.
24 NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Op. Cit., 2013. p. 81-82.
25 ARENDT, Hannah. A Condição Humana, Posfácio de Celso Lafer. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense 
Universitária. 2007.p. 48.
26 ARENDT, Hannah. Op. Cit., 2007. p. 48.
27 ARENDT, Hannah. Op. Cit., 2007. p. 49.
conhecemos como privado é um círculo de intimidade, e seus primórdios são 
encontrados no final da civilização romana. 
A liberdade passa, então, a ter significado a partir da ideia de livre arbítrio, e 
vivenciada, principalmente, por meio do isolamento28 Acreditava-se que viver na esfera 
privada significava impor privações aos membros da espécie humana, pois estes não 
haviam ainda alcançado a esfera pública (liberdade política).
Com o tempo, tanto a função, como o conteúdo da esfera privada, se 
modificaram. Para Arendt:
O que hoje chamamos de privado é um círculo de intimidade cujos 
primórdios podemos encontrar nos últimos períodos da civilização 
romana, embora dificilmente em qualquer período da antiguidade 
grega, mas cujas peculiaridades, multiformidade e variedade eram 
certamente desconhecidas de qualquer período anterior à eramoderna.29 
No Estado Absolutista, a esfera privada tinha um caráter de privativo, de 
privação. O que significa dizer que um indivíduo em estado de privacidade, era um 
indivíduo que se privava de alguma coisa, até mesmo das mais altas e mais humanas 
capacidades do homem. Qualquer um que vivesse uma vida privada “não era 
inteiramente humano”30. Como exemplo o escravo, que era proibido de participar da 
esfera pública. 
Na modernidade, a esfera da vida privada deixou de ser uma privação, 
impulsionada pela ascensão do individualismo31 e o surgimento da intimidade. Ou seja, 
só no século XVII vai-se falar de privacidade como uma característica dos indivíduos. É 
o início da modernidade tradicional, em que a igreja tenta padronizar as atitudes 
humanas, levando o homem a atuar padronizadamente, afastando-se das paixões e 
emoções egoístas advindas de sua natureza. Após a queda do Império Romano, a Igreja 
Católica ofereceu ao homem um substituto para a cidadania, antes função exclusiva do 
governo municipal32. Desta sorte, a intimidade passa a ser a rebelião do homem contra a 
opressão social.
28 ARENDT, Hannah. Op. Cit., 2007. p. 205.
29 ARENDT, Hannah. Op. Cit., 2007. p. 48.
30 ARENDT, Op. Cit., 2007. p. 48.
31 Individualismo é uma “teoria filosófica, segundo a qual a pessoa deve dispor a máxima liberdade e 
responsabilidade para estabelecer seus objetivos, escolher os meios de alcança-los e agir de acordo com 
tais pressupostos. (...) Como atitude geral, valoriza em alto grau a autoconfiança, a privacidade e o 
respeito pelos outros indivíduos. E negativamente opõe-se à tradição, à autoridade e a todas as formas de 
controle sobre o indivíduo (...).” Enciplopédia Mirador Internacional – vol. 11. São Paulo. Encyclopaedia 
Britannica do Brasil. 1995, p. 6071/6073.
32 ARENDT, Op. Cit., 2007. p. 43.
A modernidade trouxe consigo o conceito de Direitos Humanos33, com o 
primordial intuito de valorizar o indivíduo, porque este já vinha se consolidando 
conforme o sentido que entendemos hoje. A liberdade passou a ser um bem por demais 
valorizado, vide o slogan da revolução francesa: Liberdade, Fraternidade e Igualdade. E 
limitar a liberdade de um indivíduo significava afrontar a vida privada e a intimidade 
dele. É, portanto, por ocasião das revoluções americana e francesa, que se começa a 
tutelar juridicamente a personalidade humana e a intimidade. Os direitos humanos 
inserem-se neste contexto como “uma resposta para o problema tipicamente moderno da 
diferenciação funcional dos sistemas político e jurídico.”34. 
Enfim, a partir da Idade Moderna, as formas humanas são desenvolvidas pela 
intimidade e não mais pela esfera pública. A intimidade constitui-se assim, como 
principal fonte da esfera privada, que procura escapar da padronização social por meio 
da intimidade. A defesa dessa qualidade do que é íntimo representa um conceito de 
liberdade muito difundido no mundo ocidental contemporâneo, o de liberdade negativa. 
Por mais que seja relevante a padronização de alguns deveres sociais e individuais, há 
uma parte, mesmo que mínima da vida privada inviolável.
Stefano Rodotà afirma que o “nascimento da privacidade pode ser 
historicamente associado à desagregação da sociedade feudal”. Nela, os indivíduos eram 
ligados por relações que se refletiam na própria organização de sua vida cotidiana. Estar 
isolado era privilégio de pouquíssimos. Posteriormente, a possibilidade de isolamento se 
estendeu àqueles que dispunham de meios para reproduzir essa nova necessidade de 
intimidade.35 Para Koselleck, a “divisão do homem em uma esfera privada e uma esfera 
pública é constitutiva da gênese do segredo”.36 O preço pago pelo homem por esta 
liberdade privada é a sua divisão, o homem só é livre em segredo. E o ônus do Estado é 
que enquanto o súdito cumprir seu dever de obediência, o soberano está proibido de se 
interessar pela vida privada daquele. Aqui importante frisar que o Estado, devido à 
proibição de adentrar na vida privada do indivíduo, vai desenvolver diversas técnicas, 
muitas das quais rebuscadas, de vigilância e controle da população.
33 Conforme ensina Neuenschwander Magalhães, “Direitos humanos, na visão que ainda hoje é 
majoritária, são entendidos como direitos que os homens têm em função da natureza que os distinguiu 
enquanto homens.” NEUENSCHWANDER MAGALHÃES. Op. Cit. 2013. p. 25.
34 Na Teoria dos Sistemas, de Niklas Luhmann, a sociedade é considerada como um grande sistema. E 
dentro dela há outros subsistemas que interagem entre si, dentre eles o direito e a política. Ambos se 
comunicam através de suas operações, gerando o que vem a se chamar de acoplamento estrutural entre os 
sistemas. NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Op. Cit. 2013. p. 28
35 RODOTÀ, Stefano. A vida na sociedade da vigilância – A privacidade hoje. Tradução Danilo 
Doneda e Luciana Cabral Doneda. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 26.
36 KOSELLECK, Op. Cit., 1999. p. 37.
Na Monarquia, não demorou a ocorrerem conquistas no que concerne aos 
direitos individuais e fundamentais face ao poder monárquico. Foram pactuados acordos 
onde os súditos reconheciam o poder monárquico e os reis faziam algumas concessões. 
Dentre eles podemos citar a Charta Magna, assecuratória de direitos fundamentais. 
Ainda na Inglaterra, tivemos a Petition of Rights (1628) que reclamava o 
reconhecimento de direitos e liberdades para os súditos do Rei, o Habeas Corpus 
Amendment Act (1769) com a função de anular as prisões arbitrárias e o Bill of Rights 
(1688), o mais importante destes, uma vez que submetia a monarquia à soberania 
popular, transformando-a numa monarquia constitucional. Para Neuenschwander 
Magalhães o desenvolvimento econômico-político de liberdade na Inglaterra, “alcançou 
um sentido ampliado e moderno: a liberdade era uma faculdade de ‘todo inglês’.” 37 Nos 
Estados Unidos da América, podemos citar as Cartas de direitos e liberdades das 
Colônias inglesas da América, dentre as quais, a Charter of New England, de 1620 e a 
Charter of Carolina, de 1663.
Vieira38 aponta alguns registros do panorama histórico de proclamação do 
direito à privacidade. Ainda no século XVI, a Inglaterra já havia proclamado o princípio 
da inviolabilidade do domicílio, refletido no aforismo “man’s house in his castle”. 
Entretanto, referida proteção não abarcava outras espécies de privacidade (física, das 
comunicações, decisional e informacional) (VIEIRA, 2007: p. 32). Em 1846, na 
Alemanha, David Augusto Röder publicou um trabalho definindo atos violadores ao 
direito natural e à vida privada, entre outros, entrar num aposento sem se fazer anunciar. 
Em 1858, a França reconhece pela primeira vez o direito à privacidade. No caso affaire 
Rachel, o Tribunal do Sèné reconheceu à família de uma atriz famosa o direito de não 
publicarem sua imagem no leito de morte. Mas o grande marco doutrinário se dá nos 
Estados Unidos da América, em 189039, através da publicação do artigo "Right to 
Privacy" na Harvard Law Review, onde Samuel Dennis Warren e Louis Demitz 
Brandeis, ao analisarem precedentes judiciais da Suprema Corte do EUA, concluem 
37 NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Op. Cit. 2013. p. 258.
38 VIEIRA, Tatiana Malta. O Direito à privacidade na sociedade da Informação: efetividade desse 
direito fundamental diante dos avanços da tecnologia da informação. 2008. p. 32.
39 No século anterior o Parlamento Inglês impôs a Guilherme de Orange (soberano da Inglaterra) e a sua 
filha Maria Stuart que aceitassem integralmente o Bill of Rights de 1689. “Esse não era, ainda, uma 
declaração de direitos nos moldes daquelas que, no século seguinte, se produziriam em França e nos 
Estados Unidos da América do Norte. Mas já era certamente, um passo naquela direção, revelando o nexo 
existente entre a disputa religiosa e a constitucionalização da monarquia inglesa, com a aceitação do 
princípio de separação dos poderes.” NEUENSCHWANDER MAGALHÃES, Op. Cit. 2013.p. 201.
pela existência de um direito geral à privacidade extraído das decisões até então 
proferidas. 
Cabe aqui dar ênfase a alguns pontos do artigo "Right to Privacy" de Warren 
and Brandeis. Já no início eles vão falar que as mudanças políticas, sociais e 
econômicas implicam o reconhecimento de novos direitos. Nada de mais sintomática 
semelhança com os dias atuais. Mais adiante, eles expõem seu novo conceito de direito 
à vida, dizendo que o mesmo passou a significar o direito de aproveitar a vida – o 
direito de ser deixado em paz.40 E esta última expressão é amplamente utilizada entre os 
doutrinadores do direito à privacidade.
Numa tentativa de desvincular o direito à privacidade do direito de 
propriedade, os autores acrescentam que sua propriedade tem crescido para compor toda 
a forma de posse – intangíveis, bem como tangíveis. Ou seja, surgiram direitos de 
propriedade imaterial. Mais a frente, Warren e Brandeis confirmam o objetivo daquele 
artigo, onde afirmam ser seu propósito considerar se a lei existente oferece um princípio 
que pode ser utilmente invocado para proteger a privacidade do indivíduo. E, em caso 
afirmativo, qual a natureza e extensão de tal proteção.41Ainda nesta seara, a fim de 
esmiuçar ainda mais o significado e a extensão do direito à privacidade, os autores 
asseveram que a lei assegura a cada um individualmente o direito de determinar, 
ordinariamente, até que ponto os seus pensamentos, sentimentos e emoções devem ser 
comunicados aos outros. Nenhum outro tem o direito de publicar suas produções em 
qualquer forma, sem o seu consentimento. Este direito é totalmente independente dos 
materiais. Pode existir independentemente de qualquer ser corpóreo.42
Para os autores do Right to Privacy o direito à privacidade não proíbe qualquer 
publicação de matéria que é de interesse público geral.43 E é exatamente aqui que 
consiste o dilema da presente pesquisa. Qual o limite da tensão entre o direito à 
privacidade e o dever de informação? Informar e ser informado também são direitos 
tutelados. E o que se põe é a delimitação entre estes e o direito à privacidade.44
O Iluminismo da França e a Independência americana são referências 
fundamentais no surgimento das liberdades públicas. De acordo com Alexandre 
40 WARRENS, Samuel D. e BRANDEIS, Louis D. The Right to Privicy. HARWARD LAW REVIEW, 
1890. Disponível em <http://groups.csail.mit.edu/mac/classes/6.805/articles/privacy/ 
Privacy_brand_warr2.html> Acesso em 04/06/2014.
41 WARRENS, Samuel D. e BRANDEIS, Louis D. Op. cit.
42 WARRENS, Samuel D. e BRANDEIS, Louis D. Op. cit.
43 WARRENS, Samuel D. e BRANDEIS, Louis D. Op. cit.
44 MACEIRA, Irma Pereira. Op. Cit., 2012, SP. p. 31.
Moraes, encontramos representações da Revolução dos Estados Unidos da América nos 
seguintes documentos: Declaração de Direitos de Virgínia, de 1776; Declaração de 
Independência dos Estados Unidos da América, 4-7-1776; Constituição dos Estados 
Unidos da América, de 17-9-1787”. A Constituição dos EUA com suas dez primeiras 
emendas, propondo-se a limitar o poder do Estado, determinaram a separação dos 
poderes estatais e inúmeros direitos humanos fundamentais.
É fato que no século XIX, a privacidade começa a se delinear como um direito 
autônomo, típico da classe burguesa. Uma vez que os primeiros casos judiciais em que 
se reconhece a violação à privacidade diziam respeito a grandes celebridades, como o 
ocorrido na Inglaterra, que é mencionado como exórdio da matéria nos tribunais, e 
envolve os literatos Alexander Pope e Jonathan Swift, onde um editor publicou sem 
autorização a correspondência privada entre ambos, originando uma sentença favorável 
a Alexander Poper. Tal sentença reconhecia o direito de propriedade sobre as próprias 
cartas para seu autor.45 Outro caso típico das celebridades, citado acima, consiste no 
primeiro caso que envolveu a vie privée na França, envolvendo a atriz famosa Elisa 
Rachel Félix, em 1858.
Mas foi na França, com a promulgação da Declaração dos Direitos do Homem 
e do Cidadão de 1789, que ocorreu o principal marco histórico normativo dos direitos 
humanos fundamentais. Tal declaração significou nada menos que a efetivação dos 
direitos humanos e garantias fundamentais, um documento ímpar do Estado Liberal, e 
que serviu de modelo às declarações constitucionais de direitos que se seguiram. Outras 
contribuições foram as Constituições francesas de 1791 e 1793.
Os direitos humanos fundamentais são, mormente, efetivados durante o 
constitucionalismo liberal do século XIX, donde citamos como exemplos, a 
Constituição espanhola de 1812, a Constituição portuguesa de 1822, a Constituição 
Belga de 1831 e a Declaração francesa de 1848. Em contrapartida, a esse 
individualismo extremo passa a ser reconhecido direito em favor dos grupos sociais, o 
que não se fazia nas primeiras declarações. Assim, no XX, surgiram constituições 
talhadas de maior preocupação com os direitos sociais, como: a Constituição mexicana 
(1917), a Constituição de Weimar (1919), a Declaração Soviética dos Direitos do Povo 
Trabalhador e Explorado (1918), a Constituição Soviética (1918) e a Carta do Trabalho 
45 O célebre caso mereceu menção nos Commentaries de Blackstone. William Blackstone. Commentaries 
on the Laws of England. DONEDA, Danilo. Da privacidade à proteção de dados pessoais. Rio de 
Janeiro: Renovar, 2006.p.11.
(1927). Uma característica marcante dessas constituições é fazer prevalecer os valores 
coletivos sobre os individuais.
A fim de ilustrarmos o que se tem dito, buscamos aporte em algumas obras de 
arte do cinema e da literatura com o objetivo de exemplificarmos o status do direito à 
privacidade em tempos de outrora. De início, trazemos o filme Germinal, montado com 
base no livro naturalista de mesmo nome do autor Émile Zola. A obra revela um lado 
evidente do autor de denúncia da hipocrisia das elites e preferência pelos menos 
favorecidos e explorados. E faz um retrato, mostrado com muita sensibilidade, dos 
problemas sociais e do principal conflito de sua época, a luta de classes. O enredo se 
passa numa região carbonífera, e Étienne Lantier é o protagonista. Após perder o seu 
emprego na estrada de ferro, Étienne parte para o norte a fim de tentar a vida como 
minerador, onde consegue trabalhar como carregador de carrinhos na mina. No local, 
ele conhece e se apaixona por Catherine, jovem prometida a outro. Étienne pode ser 
caracterizado como idealista e sonhador e passa a difundir ideias revolucionárias diante 
das terríveis condições de trabalho e da injustiça predominante no lugar. A história é 
narrada num cenário de pobreza e opressão, que só piora à medida que avança.
Uma cena deste filme que retrata bem a falta de privacidade nas classes menos 
abastadas é a que se passa na casa da família dos Maheu46. Lá, a personagem Catherine 
toma banho, completamente despida, em um caldeirão localizado no meio da sala de 
estar, ao mesmo tempo em que o pai e os demais filhos fazem sua refeição e assistem ao 
banho da moça. A cena se passa na mais completa naturalidade, provando que este era 
um costume da época. As pessoas daquela classe social não possuíam mecanismos de 
simples privacidade no ceio dos seus lares. Sem demonstrar constrangimento, a moça 
realiza o seu banho na frente de seu pai e seus irmãos, ao mesmo tempo em que eles 
tomam sopa. Essa passagem demonstra que o direito à privacidade, a esta época, já 
vivido e reclamado pelas classes superiores, não é ainda conhecido dos menos 
favorecidos.
Um bom exemplo no Brasil, de que o direito à privacidade não se estendia às 
classes menos favorecidas é o romance O Cortiço, do brasileiro Aluísio Azevedo, 
publicado em 1890. Nele, o autor denuncia as péssimas condições de vida dos 
moradores dos cortiços cariocas no final do século XIX. Há dois trechos do romance 
que queremos transcrever, a título de exemplificar/reforçar a afirmação acima, de que o 
direitoà privacidade, até que venha a ser reconhecido constitucionalmente trilhou um 
46 GERMINAL. DVD. 151 mim. Pathé Renn Production, 1993.
longo percurso, onde no século XIX encontrava-se identificado como um direito da 
classe burguesa.
“Mas o cortiço já não era o mesmo; (...) Fizeram-se seis latrinas, seis 
torneiras de água e três banheiros. Desapareceram as pequenas 
hortas, os jardins de quatro a oito palmos e os imensos depósitos de 
garrafas vazias. (...). De cento e tantos, a numeração dos cômodos 
elevou-se a mais de quatrocentos;”(grifo nosso)
O Cortiço de João Romão, apesar de acabar de sair de uma boa reforma, vejam 
bem, para centenas de cômodos, fizeram-se seis latrinas, seis torneiras de água e três 
banheiros, os quais eram de uso comum.
Outra passagem que desperta bastante interesse é uma onde se relaciona a 
polícia. O poder da polícia era deveras temido por aqueles moradores, pois como se não 
bastasse o total desrespeito com que adentravam suas casas, as devastavam carregando 
muitos dos seus pertences.
“Fez-se logo medonha confusão. Cada qual pensou em salvar o que 
era seu. E os policiais, aproveitando o terror dos adversários, 
avançaram com ímpeto, levando na frente o que encontravam e 
penetrando enfim no infernal reduto, a dar espadeiradas para a 
direita e para a esquerda, como quem destroça uma boiada. A 
multidão atropelava-se, desembestando num alarido. Uns fugiam à 
prisão; outros cuidavam em defender a casa. Mas as praças, loucas 
de cólera, metiam dentro as portas e iam invadindo e quebrando 
tudo, sequiosas de vingança.”. (grifo nosso)
1.1.2. As construções jurídicas acerca do direito à privacidade: a 
juridicização da privacidade e da intimidade
Ora, se está provado que o direito à privacidade é um direito que protege o 
cidadão do poder do Estado e o cidadão entre cidadãos, na passagem acima está claro 
que, ao menos para esta classe desfavorecida, o direito à privacidade não era 
reconhecido pela entrada do Estado na vida privada. Mas como dissemos, o 
reconhecimento desse direito tal como hoje o é, deveu-se a uma construção no decorrer 
dos anos. Tal construção se dá a partir da noção de que a personalidade humana é 
inviolável. A partir de então se permite construir o direito à intimidade com a definição 
de seus próprios aspectos. 
E assim, o direito à privacidade passou a ser visto como uma faculdade de cada 
pessoa de impedir a ingerência de estranhos em sua intimidade e vida privada, bem 
como de controlar suas próprias informações, obstando o acesso e a divulgação não 
autorizados. Enquanto que intimidade está relacionada a uma região mais estrita da 
pessoa, reflete os pensamentos, as ideias e as emoções do indivíduo. A intimidade 
corresponde à esfera mais interior do indivíduo. Ela deve sempre ser conservada em 
segredo, constituindo-se como conhecimento apenas do próprio titular.
A intimidade revela a esfera mais reservada de uma pessoa. Já a privacidade 
está relacionada às particularidades que dizem respeito, por exemplo, à família. 
Privacidade ou vida privada faz alusão a atos que a pessoa não tem a intenção de 
publicar ou divulgar, pretende que tais atos permaneçam limitados a um círculo restrito 
de pessoas47. Ou seja, a intimidade possui menor amplitude e encontra-se no âmbito de 
incidência da vida privada. Porque da intimidade quem participa é o próprio indivíduo, 
enquanto que da vida privada participam as pessoas de convivência íntima com este 
indivíduo.
Assim, a privacidade possui proteção em quatro esferas (i) a intimidade; (ii) a 
vida privada; (iii) a honra; e (iv) a imagem. A intimidade não possui repercussão na 
esfera privada de seus semelhantes e abrange o conjunto de informações que somente 
dizem respeito ao indivíduo. A vida privada consiste na autodeterminação do indivíduo 
nas relações com outros cidadãos, diz respeito à sua família e ao seu círculo de amizade. 
A honra refere-se ao prestígio do cidadão junto aos seus pares. A imagem é constituída 
pela representação física do ser humano, cuja difusão e propagação estão a cargo do seu 
titular. Portanto, o direito à privacidade protege o seu titular contra as ingerências 
abusivas do Estado e de outros cidadãos.
Nesse sentido, além dos aspectos filosóficos concernentes à privacidade, na 
tentativa de explicar os direitos da personalidade, surgiram teorias como a dos círculos 
ou esferas concêntricas ou a teoria do mosaico. De acordo com Vieira48, Hubmann 
classificou o direito da personalidade em três círculos concêntricos. O primeiro 
(intimsphäre) é o mais íntimo de todos, nele o indivíduo pode manter-se em total 
segredo diante da coletividade. Nele ocorre a proteção em grau absoluto. O segundo 
círculo concêntrico (Geheimnisphäre) consiste na esfera secreta, mais ampla do que a 
esfera do primeiro. Nele participam indivíduos que fazem parte da vida cotidiana da 
pessoa e conhecem determinados segredos dela. O terceiro e último círculo concêntrico 
(Privatsphäre) possui um raio mais amplo do que os anteriores e resume-se no direito 
47 VIEIRA, Tatiana Malta. Op. Cit., 2008. p. 29.
48 VIEIRA, Tatiana Malta. Op. Cit., 2008. p. 30.
de subtrair do conhecimento do público em geral acontecimentos e/ou fatos da vida 
particular. O indivíduo subtrai acontecimentos e/ou fatos que não revelam 
circunstâncias extremamente reservadas da personalidade do indivíduo.
Fulgêncio Madrid Condesa critica como insuficiente a formulação da teoria 
das esferas e propõe em contrapartida, a teoria do mosaico, justamente em virtude da 
insuficiência da outra teoria para enfrentar novas e sofisticadas formas de ataque à 
privacidade. Para ele é irrelevante se a informação pertence à esfera da vida privada, da 
intimidade ou do segredo, o mais importante é o uso que dela se fará. Um viés dessa 
teoria sustenta que existem dados, a princípio, irrelevantes se considerada a proteção da 
privacidade, mas que em conexão com outras informações, que tem a faculdade de ser 
também irrelevantes, apresentam graves riscos à violação da privacidade do seu titular.49 
Tornando completamente transparente a personalidade de um indivíduo “al igual que 
ocurre con las pequeñas piedras que forman los mosaicos, que en si no dicen nada, pero 
que unidas pueden formar conjuntos plenos de significado.”50
Importante pontuar que a teoria do mosaico contribui de forma significativa 
para um dos nossos objetos de pesquisa. O problema da coleta, do armazenamento e da 
divulgação de dados pessoais por entidades públicas, especialmente naquilo que diz 
respeito à interconexão das referidas informações por modernos recursos tecnológicos. 
contribuindo para que um perfil detalhado dos titulares de tais dados seja traçado e 
divulgado com extrema rapidez. Tal fato, dependendo do cruzamento das informações, 
pode implicar em verdadeira violação de privacidade.
É com a concretização da burguesia enquanto classe somada ao crescimento 
dos núcleos urbanos que a intimidade passa a ganhar autonomia ideológica. A 
intimidade que até então era um privilégio de poucos passa a se sedimentar numa 
expectativa de muitos:
“(...) Na realidade, a intimidade era um privilégio das classes sociais 
mais altas e dos indivíduos que viviam à margem da sociedade, como 
excluídos de toda a sorte, tais como: bandidos, pastores, artistas etc. À 
medida que as condições sociais e econômicas conduziam ao 
desenvolvimento dos núcleos urbanos, crescia na burguesia emergente 
a expectativa de proteger a intimidade. Portanto, o direito à intimidade 
se sedimentou como uma aspiração burguesa, transformando um 
privilégio de poucos numa expectativa de muitos (...)”51
49 VIEIRA, Tatiana Malta. Op. Cit., 2008. p. 31.
50 MAIA, Luciano Soares. A privacidade e os princípios de proteção do indivíduo perante o banco de 
dados pessoais. CONPEDI. p. 458.
51 AIETA, Vânia Siciliano. A garantia da intimidade como direito fundamental. Rio de Janeiro: 
Lumen Júris, 1999. p. 78.Portanto, com o passar dos anos, a privacidade passa de discurso fechado 
direcionado a apenas uma classe a projetar-se amplamente sobre a coletividade. 
Com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, o direito à 
privacidade ganha reconhecimento internacional. A Declaração é clara em seu artigo 
XII, onde se afirmar que: 
"Ninguém será objeto de ingerências arbitrárias em sua vida privada, 
sua família, seu domicílio ou sua correspondência, nem de ataques à 
sua honra ou à sua reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da 
lei contra tais ingerências e ataques" (ONU. Declaração Universal dos 
Direitos do Homem, 1948).
Em 1950, o direito à privacidade é novamente previsto em documento 
internacional, qual seja, no artigo 8º da Convenção para a Proteção dos Direitos do 
Homem e das Liberdades Fundamentais. Em 1966, através do Pacto Internacional de 
Direitos Civis e Políticos, é apresentada redação similar ao da Declaração Universal dos 
Direitos do Homem. Em 1967, na Conferência Nórdica sobre Direito à Intimidade de 
Estocolmo, ocorre profunda discussão acerca do tema privacidade. E, em 1969, 
sobrevém o direito à privacidade no artigo 11 da Convenção Americana sobre Direitos 
Humanos, no Pacto de São José da Costa Rica (OEA. Pacto de San Jose da Costa Rica, 
1969).
Não obstante o aprofundamento do tema no plano internacional observa-se que 
a efetivação da proteção do direito à privacidade vem ocorrer somente mediante a 
conscientização do assunto no plano interno de cada País. Para o qual, se fez necessária 
a edição de leis que conferissem a preservação desse direito. A incorporação do direito à 
privacidade ao ordenamento jurídico interno de cada território nacional passa a ocorrer 
de forma rápida, tutelando especialmente as áreas criminal e civil. Em 1967, o direito à 
privacidade passa a ser incorporado à legislação penal alemã. E, na Itália, o artigo 615, 
referente à tutela da intimidade, é incorporado ao Código Penal. Outros países como 
Áustria, Dinamarca, Suíça e Portugal também passam a introduzir normas de proteção à 
privacidade em suas legislações penais. 
Num segundo momento, o direito à privacidade passa também a ser inserido na 
legislação civil, como forma de direito da personalidade. É a partir daí que este direito 
passa a ser reconhecido com direito garantido constitucionalmente, tendo sua 
importância reconhecida, até ser declarado como direito fundamental. Desta forma, a 
grande maioria dos países democráticos tutela o direito à privacidade em sua própria 
Constituição. 
Do exame de algumas Constituições, observa-se que umas trazem o direito à 
privacidade de forma genérica, enquanto outras protegem a privacidade de forma mais 
detalhada, prevendo inclusive a proteção da privacidade informacional52, como é o caso 
da Constituição da República Portuguesa, de 1976. Outro exemplo é a Constituição da 
República Espanhola, de 1978, que em seu artigo 1853 prevê, entre outros, o direito à 
inviolabilidade no campo da internet. É importante, também, salientar que o direito à 
privacidade correlaciona-se com uma série de outros direitos, como direito à própria 
imagem e direito ao sigilo bancário, por exemplo.
1.1.3. A ruptura com as bases clássicas do direito à privacidade: um 
conceito em crise?
Em que pese o direito à privacidade ter sido reconhecido como direito 
fundamental em diversas constituições mundo afora, especialmente54 após os ataques de 
11 de setembro de 2001, a privacidade não pode ser mais vista como direito 
fundamental, afirma Rodotà. Mas é “de fato, frequentemente considerada um obstáculo 
à segurança, sendo superada por legislações de emergência”55. Dessa forma, faz-se 
necessária a utilização dos instrumentos jurídicos já existentes no sentido de garantir 
uma proteção mais extensa à privacidade.
Apesar da difusão das leis sobre transparência, seguindo a tendência é no 
sentido de uma progressiva redução da área do sigilo. A título de exemplo temos no 
Brasil, por conta desse argumento da transparência, a divulgação de dados dos 
52 Na Constituição da República Portuguesa (1976), no seu artigo 35º temos o direito do indivíduo de 
manter o controle sobre os seus dados pessoais, por meio do exercício do direito de acesso, retificação, 
atualização e do direito ao conhecimento das finalidades para as quais foram captados esses dados. Para 
JJ. Gomes Canotilho “tende hoje a ganhar contornos um direito geral à audodeterminação informativa 
que se traduz, fundamentalmente, na faculdade de o particular determinar e controlar a utilização dos seus 
dados pessoais. NAVARRO, Ana Maria Neves de Paiva. O Direito Fundamental à Autodeterminação 
Informativa. p. 8. Disponível em <http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=86a2f353e1e6692c> 
Acesso em: 08/06/2014
53 Cf. Constituição Espanhola. Artigo 18: ―1. Se garantiza el derecho al honor, a la intimidad personal y 
familiar y a la propia imagen; 2. El domicilio es inviolable. Ninguna entrada o registro podrá hacerse en 
él sin consentimiento del titular o resolución judicial, salvo en caso de flagrante delito; 3. Se garantiza el 
secreto de las comunicaciones y, en especial, de las postales, telegráficas y telefónicas, salvo resolución 
judicial;4. La ley limitará el uso de la informática para garantizar el honor y la intimidad personal y 
familiar de los ciudadanos y el pleno ejercicio de sus derechos.” grifo nosso. NAVARRO, Ana Maria 
Neves de Paiva. Op. cit. p. 9
54 Especialmente porque é o exemplo mais emblemático nas últimas décadas de desconstrução do direito à 
privacidade. Porém, além deste e anterior à ele temos, no Brasil, o caso da Ditadura Militar, que com o 
mesmo argumento daquele, em nome da Segurança Nacional se afastou as garantias do direito à 
privacidade.
55 RODOTÀ, Op. Cit., 2008. p. 14.
servidores público federais na internet. Entretanto, temos em alguns países, a vigência 
do “mais rigoroso segredo, tanto que existem penas para aqueles que divulgam 
informações sobre a renda de uma pessoa”.56. É importante balancear os interesses, 
assegurando a coexistência da garantia dos direitos individuais com a gradual abertura 
da sociedade.
O modelo de sociedade vigiada foi imaginado por Jeremy Bentham em o 
Panopticon, “uma construção que permite ao poder vigiar sem ser visto, tornar tudo 
visível e permanecer ele próprio invisível”57, até chegarmos nos dias atuais, onde temos 
o modelo de George Orwell, o “Big Brother”. A partir dessa nova realidade faz-se 
emergir o tema da transparência, suscintamente o direito de acesso aos bancos de dados 
públicos (e privados). Nele, o controlado pode se tornar controlador, possibilitando que 
se tornem mais transparentes o comportamento de quem colhe informações. Isso, se 
bem administrados e direcionados por assim dizer. Pois aqui no Brasil, não se vê uma 
política voltada para transparência com divulgação das contas governamentais por 
exemplo. O que se tem visto são, em nome da transparência, divulgações pontuais que 
atendam ao clamor público, como é o caso da divulgação dos vencimentos dos 
servidores público federal. Que para boa parcela desses servidores, a divulgação de seus 
vencimentos em rede mundial, desperta-lhes um sentimento de verdadeira devassa em 
sua privacidade, o que nos leva a compará-los aos “The vitreous man”.58
Rodotà nos fala que não há um limite entre o mundo da defesa da privacidade e 
o da ação pública, não existe uma separação, mas um continuum. Penso que esta 
correlação feita pelo autor italiano equivale a, na teoria dos sistemas, afirmar que o 
paradoxo entre o direito à privacidade e o dever de informação não é visto com maus 
olhos. Desta perspectiva, não haveria uma tensão entre ambos os direitos. O que há é a 
correlação entre os dois direitos. Enquanto o direito de acesso vem sendo privilegiado 
nos últimos anos, o direito à privacidade está lá, correlato àquele. De acordo com a 
Teoria dos Sistemas, não nos

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