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20 4 DIFERENTES TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS: LIBERAIS E PROGRESSISTAS Pensar sobre a escola é entender que em seu meio estarão sendo preparados estudantes para conviver bem em sociedade, apropriando-se das produções da cultura humana e das condições necessárias para atuar no mercado de trabalho e exercer a sua cidadania. Para atingir tais objetivos educacionais, pode- se considerar que as aptidões individuais desses alunos são determinantes para o seu desempenho escolar, ou, ainda, que possam existir outros fatores intervenientes nesse processo, como a classe social a que eles pertencem ou quaisquer outros tipos de desigualdade que venham a enfrentar. 4.1 A pedagogia liberal e suas ramificações Com o tempo, as ideias sobre a finalidade da escola e as concepções de aluno e de professor passaram por mudanças e se reconfiguraram, seguindo as tendências presentes em cada período histórico. Isso se deve ao fato de que, de acordo com as tendências e a presença de determinadas teorizações em cada período histórico, as práticas escolares materializam-se de formas diferenciadas. Entende-se por tendência pedagógica “[...] as diversas teorias filosóficas que pretenderam dar conta da compreensão e da orientação da prática educacional em diversos momentos e circunstâncias da história humana” (LUCKESI, 1994, p. 53). Você com certeza já deve ter ouvido inúmeros comentários e até mesmo críticas a respeito da escola “tradicional”, não é mesmo? Ou deve ter manifestado interesse sobre escolas diferentes, consideradas de vanguarda. Mas o que seria uma escola tradicional? O que a diferenciaria das demais? Essas perguntas serão respondidas à medida que aprendermos um pouco sobre a chamada pedagogia liberal. Uma das principais características da pedagogia liberal é a ênfase que coloca nas aptidões individuais dos estudantes para que o processo de ensino e aprendizagem ocorra. Nessa perspectiva, o aluno é visto, prioritariamente, de forma individual e independente do seu contexto. Dessa forma, são minimizados os aspectos que compõem a realidade social do aluno, e enfatizam-se os conhecimentos e conteúdos a serem transmitidos pelo professor, que protagoniza o 21 processo de ensino. Cabe ao aluno receber as explicações e, a partir de suas capacidades, aprender como portar-se e ocupar, assim, os papéis destinados a ele na vida social. Embora possamos entender que a nossa sociedade atualmente valoriza muito os conhecimentos adquiridos via educação formal, que ocorre na escola, a grande crítica que alguns autores apresentam à pedagogia liberal é justamente o fato de não discutir ou considerar que outros fatores possam intervir na educação escolar, como a classe social à qual o aluno pertence ou os diferentes aspectos da desigualdade que podem existir entre os diversos estudantes da escola. Ao referir- se à pedagogia liberal, Libâneo (2002, p. 21), comenta que, no interior da escola: [...] os indivíduos precisam aprender a adaptar-se aos valores e às normas vigentes na sociedade de classes, através do desenvolvimento da cultura individual. A ênfase no aspecto cultural esconde a realidade das diferenças de classe, pois, embora difunda a ideia de igualdade de oportunidades, não leva em conta a desigualdade de condições [...]. Em outras palavras, o autor chama a atenção para a necessidade de refletir, a partir de sua análise sobre a pedagogia liberal, se as condições a partir das quais os estudantes se apresentam às escolas seriam as mesmas, mesmo existindo igualdade de oportunidades ou de acesso à educação. Ainda, provoca a pensar sobre o fato de existirem escolas mais bem-estruturadas, com mais recursos, professores mais bem-preparados e até mesmo valorizados, e currículos de maior qualidade. Dentro do espectro da pedagogia liberal, encontramos quatro subclassificações (LIBÂNEO, 2002): tendência pedagógica liberal tradicional; tendência pedagógica liberal renovada progressista; tendência pedagógica liberal renovada não diretiva; tendência pedagógica liberal tecnicista. Vamos agora conhecer o que constitui cada uma dessas classificações propostas pela pedagogia liberal. Ao realizar a leitura, procure imaginar o seu tempo de escola e perceba se já vivenciou alguma dessas características e desses modos de atuar por parte de seus professores e gestores escolares. 22 4.1.1 Tendência pedagógica liberal tradicional Essa tendência pedagógica é a mais antiga que vamos encontrar no Brasil, pois remete à sua colonização inicial. Queiroz e Moita (2007, p. 3) comentam que “[...] a tendência tradicional está no Brasil, desde os padres jesuítas. O principal objetivo da escola era preparar os alunos para assumirem papéis na sociedade, já que quem tinha acesso às escolas eram os filhos dos burgueses”. Algumas características compõem o que se denomina como pedagogia liberal. Segundo Libâneo (2002), uma delas é o distanciamento do cotidiano dos alunos e de sua realidade social, nos aspectos que se referem aos conteúdos a serem ensinados e às técnicas e metodologias didáticas a serem colocadas em prática. Outra característica marcante é a relação entre o professor e o aluno: existe a “[...] predominância da palavra do professor, das regras impostas, do cultivo exclusivamente intelectual” (LIBÂNEO, 2002, p. 22). Então, o professor transmite os conteúdos, que representam as verdades que devem ser aprendidas; o aluno, passivamente, deverá absorvê-los. Caso esse processo não seja bem resolvido, usa-se a disciplina para corrigir possíveis condutas estudantis, que se desviem do que foi estabelecido, fazendo com que impere o silêncio e a ordem em sala de aula. 23 4.1.2 Tendência pedagógica liberal renovada progressivista A tendência pedagógica renovada é fruto do Movimento da Escola Nova, iniciado na Europa, que procurou “[...] mudar o rumo da educação tradicional, intelectualista e livresca, dando-lhe sentido vivo e ativo. Por isso se deu também a esse movimento o nome de ‘escola ativa’” (LUZURIAGA, 1984, p. 227). Esse movimento gerou modificações na estrutura da escola no Brasil, a partir do Manifesto da Escola Nova, de 1932. O escolanovismo, como foi chamado, produziu duas tendências de pensamento pedagógico: a tendência pedagógica liberal renovada progressivista e a tendência pedagógica liberal renovada não diretiva. A pedagogia liberal renovada progressivista parte do entendimento de que a educação é um processo interno do indivíduo e que, por esse motivo, devem ser consideradas as experiências que o aluno vivencia, bem como a problematização e os desafios, como estratégia didática por parte do professor. Essa pedagogia entende que a principal função da educação é preparar o indivíduo, adaptando-o para o meio social do qual faz parte. Libâneo (2002, p. 25) afirma que “[...] é mais importante o processo de aquisição do saber do que o saber propriamente dito”. Por esse motivo, são valorizados os processos de autoeducação e autoaprendizagem, estimulando o aprender a aprender, ou seja, maneiras para que os estudantes aprendam de forma mais eficiente. Essa pedagogia apresenta autores bem significativos para a área da educação, como Maria Montessori, John Dewey, Ovide Decroly e Jean Piaget. 4.1.3 Tendência pedagógica liberal renovada não diretiva Assim como a anterior, essa tendência também é oriunda do Movimento da Escola Nova. Entretanto, a tendência liberal renovada não diretiva foi desenvolvida a partir do trabalho do psicólogo norte-americano Carl Rogers (1902–1987). Ele propôs que os principais aspectos a serem considerados na escola são as questões psicológicas em que os alunos se encontram envolvidos, com maior grau de importância do que os aspectos sociais ou pedagógicos. Ao referir-se a essa pedagogia, Libâneo (2002, p. 27) destaca que: 24 [...] os procedimentosdidáticos, a competência na matéria, as aulas, livros, tudo tem muito pouca importância, face ao propósito de favorecer […] um clima de autodesenvolvimento e realização pessoal, o que implica estar bem consigo mesmo e com seus semelhantes. Logo, se os conteúdos e métodos de ensino são secundários ou menos importantes, o professor vai, nessa pedagogia, apresentar uma postura que favoreça e estimule as relações interpessoais com o estudante, o seu jeito de ser e a crença de que, agindo assim, ele vai se autodesenvolver. São amplamente utilizadas nessa tendência pedagógica as autoavaliações, em detrimento de outras avaliações quantitativas e disciplinares. De acordo com Queiroz e Moita (2007, p. 6), ao se referirem às escolas renovadas (progressivista e não diretiva): [...] essa tendência retira o professor e os conteúdos disciplinares do centro do processo pedagógico e coloca o aluno como fundamental, que deve ter sua curiosidade, criatividade, inventividade, estimulados pelo professor, que deve ter o papel de facilitador do ensino. 4.1.3 Tendência pedagógica liberal tecnicista Essa pedagogia relaciona diretamente a escola e o ambiente produtivo do mercado de trabalho. Nesse caso, cabe à escola ensinar aos estudantes as técnicas necessárias para que se tornem competentes nas funções a serem desempenhadas em seus empregos. Dessa forma, como o que se objetiva é a aprendizagem de técnicas específicas, esses princípios científicos, normas e leis (conteúdos) serão repassados aos alunos de forma lógica, sequencial e objetiva, proporcionando que o conhecimento adquirido possa ser facilmente observado e medido. Nessa pedagogia, “[...] o professor é apenas um elo [...] entre a verdade científica e o aluno, cabendo-lhe empregar o sistema instrucional previsto” (LIBÂNEO, 2002, p. 30). Saviani (2010, p. 381) comenta que “[...] com base no pressuposto da neutralidade científica e inspirada nos princípios de racionalidade, eficiência e produtividade, a pedagogia tecnicista advoga a reordenação do processo educativo de maneira que o torne objetivo e operacional”. Dessa forma, ao valer-se de técnicas e procedimentos que favoreçam a transmissão e a recepção de informações, ela restringe o espaço para discussões, debates ou eventuais questionamentos em sala de aula. Essa tendência é fundamentada nas teorias do psicólogo norte-americano 25 Burrhus Frederic Skinner e, por esse motivo, a aprendizagem é considerada como condicionamento, que pode ser realizado a partir do reforço sobre as respostas dos alunos, modificando o seu desempenho. Queiroz e Moita (2007, p. 8) acrescentam que: O chamado “tecnicismo educacional”, inspirado nas teorias da aprendizagem e da abordagem do ensino de forma sistêmica, constituiu-se numa prática pedagógica fortemente controladora das ações dos alunos e, até, dos professores, direcionadas por atividades repetitivas, sem reflexão e absolutamente programadas, com riqueza de detalhes. 4.2 A pedagogia progressista e suas tendências Segundo Queiroz e Moita (2007), as tendências progressistas surgiram na França a partir de 1968. Já no Brasil, coincidem com o início da abertura política e sua efervescência cultural (início da década de 1980). A pedagogia progressista apresenta algumas características gerais, que a distinguem e diferenciam especialmente das pedagogias liberais. Entre elas, destaca-se o aspecto de entender que professor e aluno se encontram numa relação horizontal, ou seja, ambos se encontram sem uma hierarquia que os separe, permitindo uma atuação baseada no diálogo. Dessa forma, não existirá uma imposição do que precisa ser aprendido por parte do docente, pois tanto o aluno quanto o professor podem aprender durante o processo de ensino-aprendizagem. Outro aspecto interessante é o objetivo de desenvolver a criticidade dos estudantes, possibilitando que aspectos de suas realidades sociais cotidianas sejam a base de sua aprendizagem. Segundo os autores que seguem essa tendência, isso 26 propicia que esses indivíduos se tornem atuantes no contexto no qual estão inseridos. A pedagogia progressista é dividida em (LIBÂNEO, 2002): tendência pedagógica progressista libertadora; tendência pedagógica progressista libertária; tendência pedagógica progressista crítico-social dos conteúdos. Veja a seguir as principais características que compõem cada uma delas. 4.2.1 Tendência pedagógica progressista libertadora Essa tendência pedagógica baseia-se nos pensamentos e nas obras do educador brasileiro Paulo Reglus Neves Freire, sendo também conhecida como pedagogia problematizadora. Nesta tendência pedagógica, a atividade escolar deveria centrar-se em discussões de temas sociais e políticos e em ações concretas sobre a realidade social imediata. O professor deveria agir como um coordenador de atividades, aquele que organiza e atua conjuntamente com os alunos (QUEIROZ; MOITA, 2007, p. 12). Paulo Freire trabalha com duas ideias potentes, ao produzir as bases dessa pedagogia: a educação bancária e a educação libertadora ou problematizadora. A educação bancária seria aquela na qual o professor, detentor de todo o conhecimento, é central no processo de ensino. O professor vai transmitir ou “depositar” o conhecimento que possui no aluno. O aluno, por sua vez, recebe esses conhecimentos, que passam a compor o seu repertório de conhecimento e cultura. Nessa educação bancária, não há espaço para que se dialogue ou se exerça a percepção das realidades ou críticas sobre elas: [...] o educador aparece como seu indiscutível agente, como o seu real sujeito, cuja tarefa indeclinável é ‘encher’ os educandos de conteúdos de sua narração. Conteúdos que são retalhos da realidade desconectados da totalidade em que se engendram e em cuja visão ganhariam significação (FREIRE, 1987, p. 57). Já a educação problematizadora parte da análise da realidade social na qual o aluno se encontra envolvido e, a partir de problematizações, por um processo dialógico entre professor e aluno, ocorre a aprendizagem crítica dos conteúdos que precisam ser desenvolvidos. 27 Paulo Freire comenta que “[...] ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou sua construção” (FREIRE, 2003, p. 47). Nessa pedagogia, os alunos e os professores são sujeitos do processo de ensino e aprendizagem, e ambos aprendem a partir de suas experiências em sala de aula, quebrando a ideia de verticalidade e imposição do ensino tradicional. 4.2.2 Tendência pedagógica progressista libertária Essa tendência propõe a ideia de que deve haver a autogestão na educação, ou seja, ao aluno cabe escolher entre os conteúdos a serem estudados, e a base da aprendizagem se dá pelo movimento político promovido pelas atividades realizadas em grupo, o que proporcionaria maior liberdade aos alunos. Libâneo (2002) comenta que é mais importante essa vivência e participação crítica nas ações em grupo do que os próprios aspectos relacionados aos conteúdos que se pretenda ensinar. Esta tendência surge junto com o momento histórico democrático brasileiro e, por esse motivo defende, apoia e estimula a participação em grupos e movimentos sociais: sindicatos, grupos de mães, comunitários, associações de moradores etc.., para além dos muros escolares e, ao mesmo tempo, trazendo para dentro dela essa realidade pulsante da sociedade (QUEIROZ; MOITA, 2007, p. 13). Essa tendência propõe o início da criação de espaços de participação democrática da sociedade na escola, como os conselhos escolares, grêmios estudantis e a própria eleição de diretores. Ainda, na tendência pedagógica progressista libertária, “[...] o professor é um catalisador, ele se mistura ao grupo, para uma reflexão em comum” (LIBÂNEO, 2002, p. 37). Ao colocar-se junto aos alunos, o professor procura criar condiçõespara que estes não se sintam coagidos ou oprimidos e possam, assim, exercer os seus estudos críticos de forma livre. Essa pedagogia fundamenta-se nos estudos do pedagogo espanhol Francisco Ferrer Guardia. 4.2.3 Tendência pedagógica progressista crítico-social dos conteúdos Essa tendência é pautada na ideia de que, segundo Libâneo (2002), os conteúdos ensinados na escola são concretos, reais e vinculados com as realidades 28 sociais existentes, uma vez que são “[...] conteúdos culturais universais que se constituíram em domínios de conhecimento relativamente autônomos, incorporados pela humanidade, mas permanentemente reavaliados face as realidades sociais” (LIBÂNEO, 2002, p. 39). Em essência, admite-se a ideia de que os conteúdos são reconfigurados e atualizados de acordo com cada momento histórico que a sociedade esteja vivenciando. Queiroz e Moita (2007) reforçam as ideias dessa tendência, ao afirmar que a pedagogia crítico-social dos conteúdos defende a necessidade de se assegurar a função social e política da escola, por meio do trabalho com conhecimentos sistematizado e da inserção de classes populares nas escolas, garantindo as condições para uma efetiva participação nas lutas sociais. Para que a aprendizagem ocorra, nessa pedagogia, o professor deverá vincular os conteúdos com a realidade e as experiências dos alunos. Tanto o professor deve compreender como o aluno se expressa e age, quanto o aluno deve ter compreensão sobre o que o professor está dizendo. Dessa forma, os estudantes podem ter uma visão ampliada e mais nítida das realidades analisadas e estudadas. Essa pedagogia baseia-se nos estudos de Carlos Libâneo e Demerval Saviani. 4.3 As teorias pedagógicas e a escola atual As escolas encontram-se permeadas por tendências pedagógicas que norteiam as práticas docentes, servindo de matrizes e de balizadoras das ações de 29 planejamento das atividades cotidianas em sala de aula. É importante perceber, porém, que: [...] tendências e procedimentos ganham corpo, são aceitas e depois perdem a sua força, enfraquecidas por novas tendências, por novos procedimentos, que vêm no bojo da própria evolução do pensamento pedagógico, motivados pelo contexto vivido (contexto aqui no seu sentido amplo, político, social e econômico (SILVA, 1996, p. 11). Dessa forma, vamos discorrer sobre algumas tendências que modificam a forma como os professores atuam nos tempos contemporâneos, e que apresentam relação estreita com os campos sociais, políticos e econômicos e suas reconfigurações. É importante destacarmos que a possibilidade de o docente escolher atuar de acordo com as teorizações pedagógicas com as quais mais se identifica é amparada constitucionalmente. Na Constituição Federal de 1988, no Artigo 206, que estabelece os princípios nos quais a educação nacional deverá basear-se, temos o “[...] pluralismo de ideias e concepções pedagógicas” (BRASIL, 1988, documento on- line). Esse princípio será novamente reforçado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), em seu Artigo 3º, Inciso III. Também na LDB atual determina-se que as escolas deverão elaborar e executar as suas propostas pedagógicas. Esse processo de elaboração, que normalmente resulta na construção de um projeto político-pedagógico, requer participação coletiva e estudo de quais as tendências que vão alicerçar as práticas existentes nessas instituições de ensino. Na atualidade, ainda há lugar para todas as tendências pedagógicas; mais do que isso, todas elas disputam espaço no interior das escolas. Além disso, mudanças nos contextos culturais, sociais, políticos e econômicos têm desafiado as práticas pedagógicas das escolas. Vamos abordar agora algumas das tendências que se encontram presentes nos estudos acadêmicos sobre novas formas de ensinar e aprender, presentes na atualidade, e que envolvem a educação formal escolarizada, bem como a educação informal. São elas: pedagogias do consenso e do conflito; pedagogias culturais; pedagogias do corpo; desescolarização. 30 Entre as tendências que você vai aprender, que se encontram presentes no cotidiano escolar e aliam-se à forma como a escola deve ser conduzida, a partir dos estudos da administração educacional, estão a pedagogia do consenso e a do conflito, propostas por Benno Sander, em 1983. Baseadas na evolução dos pensadores da área da sociologia, essas teorias focam a sua análise nas formas como a administração escolar procura resolver os seus conflitos e organizar os seus procedimentos nas diversas áreas que compõem a instituição escolar. A pedagogia do consenso, derivada das ideias de Auguste Comte, Herbert Spencer, Émile Durkheim e Talcott Parsons, trabalha com a ideia liberal de integração, procurando “[...] satisfazer simultaneamente tanto as expectativas institucionais como as necessidades e motivações pessoais, sem comprometer o alcance dos objetivos de manutenção e reprodução do sistema” (SANDER, 1983, p. 22). Em outras palavras, essa tendência pedagógica entende que a organização escolar acaba influenciando ou produzindo os indivíduos a partir do que faz, com mínimas possibilidades do contrário, ou seja, de os indivíduos personalizarem, adaptarem ou modificarem a escola. A pedagogia do conflito, por sua vez, origina-se da interpretação das ideias iniciais de Karl Marx e Friedrich Engels, desenvolvidas por Bourdieu e Passeron, e Althusser e Gramsci. Essa tendência aparece como uma crítica ao pensamento anterior (do consenso), propondo uma análise que sai da centralização no aluno ou no educador e “[...] centra-se no papel das instituições e sistemas de ensino” (SANDER, 1983, p. 24). A ideia do conflito é justamente a percepção de que as escolas se encontram imersas nas grandes desigualdades culturais existentes entre os alunos, mas acabam reproduzindo a cultura da classe dominante e elitizada. Essas duas formas de enxergar a escola, pelo aspecto da reprodução (consenso) ou da crítica de suas finalidades e formas de atuar (conflito), acaba se inserindo fortemente no pensamento e nas ações docentes na escola contemporânea. Outra tendência pedagógica muito forte e presente no âmbito acadêmico na atualidade e que tem gerado inúmeras pesquisas, principalmente na linha teórica dos estudos culturais em educação são as denominadas pedagogias culturais. As pedagogias culturais entendem que todo e qualquer artefato cultural, ou seja, algo produzido pelo homem, pode ensinar algo e exercer função pedagógica. Dessa 31 forma, analisa elementos de nossa cultura que contribuem para essa aprendizagem, como as mídias eletrônicas e os processos que se estabelecem via internet, e que possuem força de produzir subjetividades nas pessoas e modificar as suas condutas e o seu jeito de ser, pensar e agir: [...] a pedagogia cultural está estruturada pela dinâmica comercial, por forças que se impõem a todos os aspectos de nossas vidas privadas e das vidas de nossos/as filhos/as. Os padrões de consumo moldados pela publicidade empresarial fortalecem as instituições comerciais como os professores do nosso milênio (STEINBERG, 1997, p. 102). Como podemos perceber pelo conceito de pedagogia cultural, além das questões que envolvem a mídia, temos também as questões econômicas, que envolvem o consumo. Estas são analisadas na forma como se encontram inseridas nos mais diversos setores da sociedade (inclusive na escola), problematizando como a nossa vida hoje é pautada pelas relações de acumulação e consumo típicas do capitalismo. Enfim, apresentando resumidamente a pedagogia cultural, devemos entender que ela “[...] pode representar uma das muitas alternativas possíveis para considerar as influências educativas informais em uma era de expansão da globalização e mercantilização” (HICKEY-MOODY; SAVAGE; WINDLE, 2010,p. 231, tradução nossa). Dessa forma, inúmeras análises articulam as mudanças que ocorrem nos aspectos educativos formais e informais, principalmente após a expansão da globalização, após os anos 1990, no Brasil e no mundo. Já as pedagogias do corpo propõem uma série de estudos que consideram o corpo como o veículo que acaba sendo objeto de disputa e sobre o qual são dispostas ações de governo, no sentido de conduzir as ações individuais que modelam um jeito de ser e estar no mundo. No viés dessas análises, as discussões de gênero, corpo e sexualidade se fazem presentes, entendendo que nos tornamos homens ou mulheres a partir de discursos que estabelecem um status desses gêneros e um papel social a desempenhar por esse corpo masculino ou feminino. Dessa forma, as pedagogias do corpo entendem que: [...] as muitas formas de fazer-se mulher ou homem, as várias possibilidades de viver prazeres e desejos corporais são sempre sugeridas, anunciadas, promovidas socialmente (e hoje possivelmente de formas mais explícitas do que antes). Elas são também, renovadamente, reguladas, condenadas ou negadas (LOURO, 2007, p. 4). 32 Dentro das pesquisas que envolvem as pedagogias do corpo, problematizam- se as questões do gênero, procurando compreender os parâmetros impostos por uma sociedade que se constitui tendo a heterossexualidade como caminho certo e normal a ser seguido. Se a constituição dos sujeitos homens e mulheres se dá a partir de regulações sociais e culturais, as representações de indivíduos homossexuais, gays, transexuais e outras denominações presentes em nossa sociedade atual, da mesma forma, também merecem respeito e não devem ser discriminadas ou sofrer preconceitos sociais. As pedagogias do corpo servem de espaço de luta pelos direitos dessas minorias, que se constituem como cidadãos de direitos tanto quanto os heterossexuais. Finalizando, vamos destacar estudos que apontam novos caminhos para as práticas educativas e que têm ganhado força no mundo inteiro. Trata-se das críticas e discussões em torno da desescolarização, baseadas nas obras do pedagogo Ivan Illich. O tema da desescolarização coloca a questão: a escola seria realmente necessária e positiva para todas as nações existentes no mundo? Os princípios defendidos pelo autor concentram-se na ideia “[...] de transformar cada momento da vida em uma ocasião de aprender, geralmente e de preferência, fora do sistema escolar” (GAJARDO, 2010, p. 13). Dessa forma, a desescolarização traz uma grande crítica às instituições sociais existentes, propondo uma sociedade sem escolas. A ideia defendida pela desescolarização parte do princípio de que a escola institucionalizada na forma como se encontra acaba privilegiando aqueles que possuem maior capital cultural ao frequentá-la. Existe a crítica ao valor que é repassado ao aluno a partir do conhecimento que adquire na escola, sendo este acumulativo e certificado pelos graus ou diplomas. Para o autor: [...] a aprendizagem é a atividade humana que menos necessita da intervenção de terceiros; a maior parte da aprendizagem não é consequência da instrução, mas o resultado de uma relação do aprendiz com um meio que tem um sentido, enquanto a instituição escolar o faz crer que o desenvolvimento cognitivo pessoal depende, necessariamente, de programas e de manipulações complexas (GAJARDO, 2010, p. 17). Esse pensamento nos leva a refletir sobre os processos de aprendizagem que encontramos hoje, sobretudo aqueles que ocorrem via internet, no ciberespaço.
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