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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA MONOGRAFIA DE BACHARELADO Sustentabilidade e inovação no enfoque corporativo: O caso da Vale S.A VINÍCIUS COSTA Q. FRANÇA matrícula nº: 108018854 ORIENTADORA: Prof. Valéria da Vinha AGOSTO 2012 1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA MONOGRAFIA DE BACHARELADO Sustentabilidade e inovação no enfoque corporativo: O caso da Vale S.A _______________________________________ VINÍCIUS COSTA Q. FRANÇA matrícula nº: 108018854 ORIENTADORA: Prof. Valéria da Vinha AGOSTO 2012 2 As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do(a) autor(a) 3 RESUMO Trata-se de um estudo introdutório, que procura discutir as questões atuais referentes à sustentabilidade e à inovação em grandes empresas, com foco em uma empresa de grande porte brasileira. São discutidas as principais correntes de pensamento sobre sustentabilidade e buscou-se entender e aproximar as visões antagônicas predominantes: a que defende que o desenvolvimento econômico gerado pelo capitalismo é um dos responsáveis pela exaustão dos recursos naturais e, portanto, deve ser detido em prol de uma segurança “sócio- ambiental” e a que, opostamente, crê que o capitalismo, por ser conceitualmente estimulador de inovações e novas tecnologias, promove, no longo prazo, o desenvolvimento sustentável. É apresentadao a política socioambiental da Vale, uma das maiores empresas mundiais e atuante em setores destrutivos dos recursos naturais (mineração/siderurgia), que busca atender aos novos desafios impostos por uma maior conscientização da sociedade e de seu representante institucional: o Poder Público. São detalhadas duas iniciativas na área da inovação com foco no desenvolvimento sustentável, visando minimizar os impactos causados às comunidades que habitam o entorno dos empreendimentos da empresa. Na parte final do trabalho, é desenvolvida uma discussão acerca da competição dos stakeholders pelo valor adicionado pela empresa, com a conclusão de que não parece claro para a empresa esse processo de divisão de valor e de que em muitas ocasiões a Vale ainda perde a batalha da comunicação adequada sobre esse processo de atendimento “justo” às variadas demandas de seus stakeholders. 4 ÍNDICE INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................. 6 CAPÍTULO I - DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: SUAS CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA NO SISTEMA ECONÔMICO ................................................................................................... 7 I.1 - INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 7 I.1 -.A CONTRIBUIÇÃO DA RESPONSABILIDADE EMPRESARIAL ................................................................. 11 CAPÍTULO II - INOVAÇÃO: SUAS CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA NO SISTEMA ECONÔMICO ............................................................................................................................................................. 17 II.1 - CORRENTES TEÓRICAS E CARACTERIZAÇÃO .......................................................................................... 17 II.2 - INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE .............................................................................................................. 26 CAPÍTULO III - APRESENTAÇÃO DA VALE E SUA POLÍTICA DE SUSTENTABILIDADE ............. 29 III.1 - INTRODUÇÃO E TRAJETÓRIA ....................................................................................................................... 29 III.2 - MINERAÇÃO ..................................................................................................................................................... 31 III.3 - SIDERURGIA ..................................................................................................................................................... 33 III.4 - LOGÍSTICA ........................................................................................................................................................ 33 III.5 - VALE FERTILIZANTES ................................................................................................................................... 34 III.6 - POLÍTICA DE SUSTENTABILIDADE ............................................................................................................. 34 III.7 - CONCLUSÃO .................................................................................................................................................... 40 CAPÍTULO IV - DESAFIOS DA MINERAÇÃO, DO SETOR SIDERÚRGICO E DA VALE EM SUSTENTABILIDADE. UMA ANÁLISE DOS PRINCIPAIS PROJETOS DA VALE QUE ENVOLVEM INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE ....................................................................................... 43 IV.1 - INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 43 IV.2 - PROJETO S11D ............................................................................................................................................... 46 IV.3 -.TECNORED........................................................................................................................................................ 50 CONCLUSÃO ............................................................................................................................................................. 56 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................................................... 58 5 FIGURAS Figura I: Presença global da Vale...........................................................................................28 Figura II: Estrutura acionária da Vale….................................................................................32 Figura III: Potenciais impactos dos projetos da Vale..............................................................35 Figura IV: Unidades com certificação ISO 14001.................................................................38 Figura V: Benefícios do processamento a seco......................................................................47 Figura VI: Benefícios das correias (truckless).......................................................................49 Figura VII: Participação da Vale na Tecnored.......................................................................50 Figura VIII : Ciclo de Vida da Tecnored...............................................................................51 Figura IX : Processo Tecnored..............................................................................................52 Figura X: Menor Opex da Tecnored.....................................................................................53 Figura XI: Vantagem ambiental da Tecnored.......................................................................54 6 INTRODUÇÃO Este trabalho tem por objetivo estudar a importância da inovação nas práticas sustentáveis do setor de mineração, usando como estudo de caso a empresa Vale e dois projetos específicos. No primeiro capítulo, descrevemos de forma geral o tema da sustentabilidade, termo bastante amplo e de difícil definição, mas que vem sendocada vez mais discutido seja no meio empresarial seja no meio acadêmico. Não temos a pretensão de apresentar um conceito, mas sim de entender sua influência nas decisões estratégicas de um segmento específico, à luz do exemplo da Vale. No segundo capítulo, discute-se o papel da inovação neste processo. O estudo busca caracterizá-la, entender suas origens, mostrar suas diferentes formas e sua relação estreita com o sistema capitalista e conseqüentemente com as firmas. O objetivo é mostrar o porquê da sua importância no meio empresarial e como as empresas devem se comportar perante a inovação. O capítulo três retrata a empresa Vale, uma das maiores empresas do Brasil, descrevendo brevemente a sua historia, suas atividades e explorando com mais detalhes a sua política de sustentabilidade. O último capítulo aprofunda mais a relação da sustentabilidade com o setor siderúrgico e mineração e como isso pode ser visto através de dois projetos modelos da Vale que são o Projeto S11D e a Tecnored. 7 CAPÍTULO I - Desenvolvimento sustentável: características e principais visões I.1. Introdução O termo desenvolvimento sustentável pode ser definido de inúmeras maneiras, assim como são inúmeras as teorias que o envolvem. Segundo Vinha (2000), trata-se de uma convenção social contemporânea, baseada na crença de que é possível alcançar a sustentabilidade do desenvolvimento desde que as dimensões econômica, social e ambiental estejam integradas. Portanto, não surgiu de uma verdade comprovada, não constituiu um paradigma cientifico, mas passou a se tornar um tema recorrente na sociedade e, apesar dos seus contornos genéricos, transformou-se numa poderosa estratégia de mercado. José Eli da Veiga observa que a palavra sustentabilidade tem sido usada em sentidos muito diferentes e é justamente por isso que o termo passou a ser discutido e aceito entre teóricos de diferentes correntes, além de ser adotado em diversas políticas, gerando medidas contraditórias e, em alguns casos, até mesmo opostas (VEIGA, 2008). Concretamente, o sentido da palavra sustentabilidade é decidido no debate teórico e na luta política. A sustentabilidade não é uma noção de natureza precisa ou aritmética. Portanto, nunca será encontrada em estado puro, sendo, portanto, contraditório. Sua força está justamente em ser capaz de atuar em um campo bastante amplo na medida em que engloba toda a problemática socioambiental do mundo contemporâneo, inserindo essas questões na agenda política e empresarial. A definição mais usada é a contida na Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1987, presidida pela então Primeira Ministra da Noruega e Secretária Geral das Nações Unidas, Gro Brundtland, segundo a qual desenvolvimento sustentável é aquele que “atende as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades”. (apud VEIGA, 2008). Hoje, o termo desenvolvimento sustentável evoca uma “ética de perpetuação da humanidade e da vida”, exprimindo a necessidade de abordar com mais atenção outras necessidades além do crescimento econômico, principalmente o uso mais responsável dos recursos ambientais. 8 Do ponto de vista empresarial, as visões sobre o desenvolvimento podem ser resumidas em duas versões extremas. A primeira visão reduz a importância da sociedade e dos stakeholders, tratando o sistema econômico como independente do sistema ecológico e recomendando a exploração ao limite dos recursos naturais. Para esta visão, o homem já alcançou um domínio completo sobre a Natureza e a tecnologia permite encarar os recursos naturais como sendo infinitos, pois o progresso tecnológico sempre terá uma solução para os problemas sociais ou ambientais. Portanto, aqui crescimento é sinônimo de desenvolvimento. Esta visão segue a cartilha da ortodoxia clássica, segundo a qual a regulação da economia é tarefa do equilíbrio entre a oferta e a demanda. Há a premissa de que os homens são racionais e assim maximizam a satisfação dos seus interesses. (VEIGA, 2008). A teoria de Gene M. Grossman e Alan B. Krug ganhou destaque pelo pioneirismo em tentar achar evidências científicas que comprovem que não há o menor dilema entre o crescimento econômico e o desenvolvimento sustentável (VEIGA, 2008). Acreditavam na introdução de tecnologias que levassem a mudanças na composição e nas técnicas de produção que por sua vez seriam fortes suficientes para evitar e até superar os efeitos ambientalmente adversos causados pelo aumento da atividade econômica. Lançado em 1995, em um dos mais respeitados periódicos científicos de economia: o “QJE” (The Quarterly Journal of Economics”), os autores buscaram examinar a relação entre o comportamento da renda per capita e quatro tipos de indicadores de deterioração ambiental – poluição atmosférica urbana, oxigenação de bacias hidrográficas, e duas de suas contaminações (fecal e por metais pesados), e a conclusão foi de que a fase da piora desses indicadores e depois a recuperação dos mesmos índices estariam separados por um ponto que representaria em torno de 8 mil dólares de renda per capita. Utilizaram os dados disponíveis mais confiáveis sobre a qualidade do ar em grandes cidades e qualidade de água em suas bacias hidrográficas usando séries publicadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o Global Environmental Monitoring System (GEMS) e também com a agência federal dos Estados Unidos para o meio ambiente. O dióxido de enxofre e a fumaça relacionou-se com o PIB per capita na forma de uma curva em U invertido, mas os próprios autores consideraram o número de observações usadas por eles muito baixo. A mesma curva foi identificada para demais indicadores de poluição do ar e da água levando os autores a afirmarem que o crescimento econômico é 9 totalmente compatível com o desenvolvimento sustentável. Segundo eles, o meio ambiente, ao contrario, é beneficiado pelo crescimento econômico, após atingir certos níveis de PIB per capita que seria por volta dos mesmos 8 mil dólares. José Eli da Veiga, porém, faz duras críticas a esse estudo. Primeiro, em termos de metodologia aplicada. O número pequeno de medidas usadas pelos autores estaria longe de descrever a situação total do ecossistema, não podendo ser usadas assim para generalizar os problemas ambientais, e indicadores de poluição não são termômetros para a qualidade ambiental. Além disso, a teoria de G&K estaria cometendo outro equívoco de não incluir os impactos sobre os níveis de entropia usados, por sua vez, por teóricos de várias correntes reunidos na chamada Economia Ecológica. Essa visão otimista sobre o crescimento econômico foi compartilhada pelo economista Robert M. Solow, ganhador do premio Nobel de 1987. Em sua teoria, a Natureza jamais constituiria um obstáculo à expansão econômica (VEIGA, 2008). Qualquer elemento da biosfera que se mostrar limitante ao processo produtivo seria, para Solow, substituído pela combinação do trabalho humano, capital produzido e outros recursos naturais. Isso se deve ao progresso científico tecnológico, capaz de introduzir as alterações necessárias. A noção de sustentabilidade existente na teoria de Solow é muito fraca, na visão de Veiga. Resume-se em manter o nível de trabalho e capital produzido na mesma proporção em que há o declínio do estoque de recursos naturais como se isso fosse plenamente possível com as inovações tecnológicas. A idéia de desenvolvimento sustentável acaba novamente sendo reduzida a crescimento econômico. (VEIGA, 2008). Esta tese foi absorvida com facilidade pela maior parte dos economistas neoclássicos e firmou-se durante um longo tempo como visão dominante. Aqueles que não concordaram inteiramente com a posição de Solow eram apenas menos otimistas sobre a possibilidade de trocaentre os fatores de produção, mas não se preocupavam com um outro conceito de sustentabilidade. Essa convenção consolidou-se ao longo da expansão do modelo capitalista moldando o comportamento das empresas. Mas as crises recorrentes abalaram as certezas em relação ao mercado, que hoje não é mais considerado uma instituição perfeita, e na medida em que esta visão vem se transformando em uma nova convenção, as regras da 10 concorrência capitalista também tem se alterado, obrigando as empresas a internalizar práticas socioambientais. Dissemina-se, assim, uma segunda visão sobre a sustentabilidade. Nicolas Georgescu – Roegen, em 1971, alertou sobre o aumento da entropia no mundo provocado pelo crescimento econômico. Baseado na segunda lei da termodinâmica, ele mostrou que a atividade econômica transforma energia em formas de calor inutilizáveis. Segundo ele, a humanidade tira da Natureza os elementos de baixa entropia e gera elementos de alta entropia. Seguindo este ritmo, chegará uma hora em que não haverá como explorar as diferentes formas de energia e, por conseguinte a humanidade terá que conviver com a retração econômica. Esta visão era tão contrária à corrente dominante que por algum tempo foi esquecida no meio acadêmico até ser retomada com Hermam Daly que incorporou as idéias de Georgescu com uma visão menos pessimista. (VEIGA, 2008) Herman criticou diversos pontos da teoria de Solow. Segundo ele, é impossível imaginar uma economia sem recursos naturais e que estes e capitais são elementos complementares e não substitutos. (apud VEIGA, 2008). Para Daly, a alternativa à decadência ecológica decretada por Georgescu-Roegen está na chamada “condição estacionária”. Essa condição não corresponde a um crescimento zero. A economia continuaria a melhorar em termos qualitativos, mas seria necessário abolir a obsessão pelo crescimento. Seria uma situação sem crescimento populacional e do estoque físico de capital, mas com contínua melhoria tecnológica e ética. Sua imposição teria que começar pelas economias mais desenvolvidas, onde o uso dos recursos já é suficiente para permitir uma boa qualidade de vida para população e compatível à capacidade de suporte do meio ambiente. Para isso seria preciso não mais contabilizar o consumo de capital natural como renda. O consumo se fosse chamado de renda, deveria deixar intacta a capacidade de se produzir e consumir o mesmo volume no ano seguinte. Assim, a noção de sustentabilidade estaria inserida na própria definição de renda. Além disso, Daly recomenda tributar menos a renda e mais o uso dos recursos naturais. Assim, seria muito melhor economizar no uso da Natureza devido aos altos custos 11 externos da depleção e poluição, e ao mesmo tempo favorecer a ocupação de mão-de-obra capaz de reduzir o desemprego. Portanto, seria preciso elevar a produtividade dos recursos naturais. Ele reconhece que são limitadas as possibilidades desse tipo de substituição entre recursos naturais e trabalho, mas seria importante tirar o máximo possível. Essa segunda visão, bem mais recente, vem ganhando crescente importância por não dissociar o sistema econômico do contexto socioambiental, mostrando a interdependência de todas as esferas. José Eli da Veiga mostra que o desenvolvimento tem sido bem definido nos relatórios anuais do PNUD, que nada tem a ver diretamente com crescimento econômico, mas como garantir a possibilidade de as pessoas viverem o tipo de vida que escolheram, sendo necessário, portanto, considerar desde a proteção dos direitos humanos até o aprofundamento da democracia. O crescimento pode facilitar o desenvolvimento, mas precisa vir acompanhado de um projeto socioambiental que priorize a efetiva melhoria das condições de vida dessa população e preserve o meio ambiente. (VEIGA, 2008). Ao fazer uma regressão histórica, José Eli da Veiga afirma que o desenvolvimento tem sido uma exceção histórica, mesmo com todo o crescimento econômico. E que esse desenvolvimento não veio de um resultado espontâneo da livre interação das forças de mercado, dado que este é apenas uma de várias instituições que participam do processo de desenvolvimento. Como exemplo, ele cita que os únicos países da periferia que se saíram bem no século XX foram justamente aqueles que não aplicaram as prescrições cultuadas no chamado Consenso de Washington, símbolo de política ortodoxa. Esta visão reconhece que os recursos da terra são limitados e que é preciso simplificar as nossas necessidades se quisermos ter uma trajetória positiva no longo prazo. A tecnologia é essencial para resolver problemas sociais e ambientais, mas não é suficiente. I.2. A contribuição da Responsabilidade Social Empresarial Essa transição rumo a uma consciência sustentável passa por todo um contexto histórico que se intensificou ao longo do século XX, mas que começa muito antes com o surgimento da empresa capitalista no final da Idade Media. A responsabilidade social da empresa ganhava importância em períodos cujas circunstâncias sociais eram ruins e perdia em momentos de pujança econômica, onde as empresas se preocupavam mais com os ganhos de produção. 12 O foco de atuação da responsabilidade social também variou bastante. Inicialmente o papel social das empresas manifestou-se com relação às relações de trabalho, como a garantia de benefícios e encargos trabalhistas e foi evoluindo para os diversos assuntos como meio ambiente, problemas nas comunidades e outros, na medida em que a sustentabilidade foi ganhando importância. Durante os séculos XVI e XVII, a qual se preponderou o sistema econômico mercantilista, a moral vigente impunha as corporações um comportamento com muito pouca responsabilidade sócio-ambiental. Exemplo disso é a intensa exploração das colônias. Mais tarde, com a revolução industrial, os impactos que as empresas provocavam sobre o meio ambiente, trabalhadores e sociedade impunham o repensar no papel das empresas na sociedade. Havia muitas críticas às condições de trabalho e à desestabilização da estrutura social. Com a criação dos primeiros sindicatos, a sociedade passa a exigir uma nova postura da empresa. Surgiram nessa época empresários filantropos que foram pioneiros ao considerarem a importância de um bom relacionamento da empresa com a sociedade. Para aliviar as tensões trabalhistas, passaram a construir igrejas, hospitais, lugares para entretenimento repartindo assim parte do valor gerado pela empresa para seus trabalhadores. As ações empresariais, porém, se restringiam ao assistencialismo, com pouco envolvimento e não focadas na raiz dos problemas sociais. Com a depressão econômica, em 1929, esse debate foi intensificado. John Keynes questionou o liberalismo econômico e, como conseqüência dessa fase, as empresas e os governantes passaram a perceber que a busca por lucros não era suficiente para garantir o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade dos negócios no longo prazo. Mesmo assim, o entendimento das empresas acerca dos seus problemas socioambientais ainda era praticamente nulo, e o tema em si era assunto marginal nos meios acadêmicos e políticos. Com o crescimento da economia no pós-guerra (1945-1960) essas discussões esfriaram ainda mais, voltando apenas na década de 1970 com novos temas, entre eles, a preocupação com o meio ambiente. (BMFBOVESPA, 2011) O choque do petróleo, em 1973, aliado ao fim do crescimento intenso da economia mundial e às pressões do movimento ambientalista foram os responsáveis para retomar a importância da responsabilidade social empresarial. 13 A regulação sobre assuntos socioambientais endureceu e houve muita resistência inicial por parte das empresas que precisaram atender as novas obrigações de forma a manter a licença legal para operar. (BMFBOVESPA, 2011) A partir da década de 1980, algumas empresas perceberamque práticas de prevenção à poluição e ecoeficiência, geravam oportunidades de ganhos econômicos e que desta forma valia a pena não se restringir apenas à legislação ambiental, passando a se antecipar à novas regulamentações, aplicando essa política em outros países em que elas também estavam presentes. Aos poucos, o conceito de sustentabilidade corporativa se consolidou como uma abordagem de gestão, fazendo com que as empresas passassem a mensurar seus impactos, inovarem seus processos e produtos, prestassem contas a seus stakeholders, influenciando na sua cadeia de valor. Passou, portanto, a existir uma compreensão de que as empresas precisam caminhar em direção ao desenvolvimento sustentável. De certa forma, já existia um marco regulatório que impunha certas medidas que as firmas precisam adotar em prol da sustentabilidade. Mas a tendência passou a ser ainda mais favorável. Na medida em que as empresas percebem que a sustentabilidade vem ganhando crescente adesão da sociedade, considerado um valor importante para os diversos grupos de interesse – produtores, consumidores e investidores – a empresa procura ir além do que a legislação obriga (VINHA 2000). Ter apenas um desempenho financeiro bom passou a não ser suficiente para avaliar uma empresa, sendo preciso lidar de forma adequada com questões sócio-ambientais e com governança corporativa. Essas são as características do novo “investidor responsável”, conforme salienta a Bovespa (BMFBOVESPA, 2011). Nos Estados Unidos e na Europa, o investimento responsável já corresponde por cerca de 10% dos ativos sob gestão profissional e isso exige uma resposta das empresas. (BMFBOVESPA, 2011) Assim a firma, tem evoluído para a fase cognitiva com relação à sustentabilidade, adotando por conta própria, princípios do desenvolvimento sustentável na sua cultura organizacional, criando procedimentos que facilitem essa interação social e consolide uma nova modalidade de gestão empresarial: a socioambiental. O setor produtivo e as organizações socioambientais têm trabalhado em parceria para atender as demandas dos grupos de interesse e as empresas têm chegado à conclusão 14 que essa estratégia de valorizar os stakeholders em geral é a principal fonte de vantagem competitiva e que o desenvolvimento sustentável se tornou um elemento importante no sistema capitalista. Porém, críticas apontam que esse novo modelo de desenvolvimento precisa de uma nova ética que ainda esta longe de ter sido incorporado nas organizações e que não dependem exclusivamente das corporações. Segundo Roberto Guimarães, ainda não se adotam medidas indispensáveis para transformar algumas instituições vigentes. Para ele é preciso enfrentar de vez processos institucionais que regulam a propriedade, o controle e o uso dos recursos naturais para que esse movimento em direção ao desenvolvimento sustentável não passe de transformações que ele chama de cosméticas (apud Vinha, 2000). Outros autores, como Paul Hawken, apontam as empresas como instituições líderes nesse processo, afirmando que hoje a maioria das corporações, independentemente do montante de recursos que destina a programas socioambientais, ainda são destruidores da Natureza e indica algumas soluções para inverter esse quadro, recomendando restaurar a credibilidade social das empresas, fazer da conservação um negócio lucrativo e fortalecer a governabilidade institucional do setor público (VINHA 2000) John Elkington compartilha dessa teoria e admite que a liderança pela sustentabilidade deva vir do empresariado, sendo que este precisa lidar com as questões socioambientais dando mais atenção aos stakeholders e que somente assim as firmas terão uma trajetória de sucesso. Essa liderança pode vir de diferentes tipos de empresas sem distinção de atividade ou porte, mas as firmas maiores, como a Vale, por exemplo, possuem algumas vantagens que as fizeram líderes desse processo. Ao observamos as quinhentas maiores empresas do mundo, vemos que estas correspondem a mais de um terço de tudo que é produzido no planeta e, portanto qualquer melhoria referente às praticas de sustentabilidades dessas firmas tem um impacto positivo e profundo na sociedade (SCHATSKY, 2012). Mas, mais importante que isso é que essas companhias tem uma influência enorme em toda a cadeia de produção referente às suas atividades e assim o maior progresso em relação ao desenvolvimento sustentável se dará nos impactos das operações externas às suas, ou seja, no controle indireto da cadeia de suprimentos pelas empresas líderes que precisarão exigir práticas melhores dos seus fornecedores ou clientes. 15 Isso já está ocorrendo em diversos setores. Exemplos como a empresa Puma que estimou que 90% das emissões de gases poluentes e dos custos ligados à utilização de água estão relacionados às atividades dos seus fornecedores, levando-a a diagnosticar e promover soluções junto a eles, dado o seu poder de influência. Uma pesquisa feita pela Green Research indicou que 87% das empresas de grande porte estudadas, no quesito sustentabilidade focam apenas nas suas próprias operações e apenas 4% tinham políticas efetivas que envolviam toda a cadeia de produção. (SCHATSKY, 2012). Uma das razões desse problema é ainda o desconhecimento sobre a real influência que uma empresa grande consegue exercer sobre toda a cadeia. A pesquisa apontou que apenas 27% dos executivos de empresas de maior porte eram convictos de que poderiam rapidamente mudar padrões de comportamento de uma indústria como um todo. Mas a pesquisa também aponta avanços e cita alguns casos interessantes e que vêm obtendo sucesso nessa linha como as políticas adotadas, por exemplo, pela Walmart e pela Procter&Gamble, gigantes em suas áreas. Ambas adotaram um tipo de relatório (“scorecard”), que é enviado a toda a cadeia de fornecedores, incluindo questionários sobre as práticas de sustentabilidade destes e também metas a serem cumpridas. A liderança, porém, vem da grande empresa que tem mais expertise e tem mais recursos para alavancar os negócios dos seus fornecedores. O principal resultado desta estratégia são os menores custos da cadeia dado o aumento de eficiência, mas outras oportunidades também podem ser exploradas pela empresa-líder. A Siemens, por exemplo, estabeleceu metas de consumo de energia de seus fornecedores que por sua vez compram da própria Siemens, gigante na área de tecnologia, soluções de ecoeficiência. Desta forma, dada sua participação na economia e sua influência em toda a cadeia de produção, é natural que as maiores empresas continuem liderando as iniciativas mais bem sucedidas em práticas sustentáveis. Desta forma, concluimos com a indicação de que, apesar da existência de teorias conflitantes, há uma tendência em prol de uma visão que acredita que os recursos são de fato limitados, sendo preciso adequar a produção , visando não somente o crescimento, mas, também, garantir a perpetuidade das atividades econômicas. As empresas aos poucos 16 estão se enquadrando nesse contexto, se adaptando e mudando sua gestão antes voltada apenas ao shareholder para atender aos demais stakeholders. 17 CAPÍTULO II - Inovação: suas características e importância no sistema econômico II. 1. Correntes teóricas e caracterização Diferentemente da sustentabilidade, a inovação tem uma definição bem mais precisa. Às vezes confundida com os termos “tecnologia” e “ invenção”, é importante fazer a distinção conceitual entre elas e entender suas similaridades. (TIGRE,2006) A tecnologia pode ser definida como conhecimento sobre técnicas, estas por sua vez correspondem a aplicações desse conhecimento em produtos e processos. Já a invenção se refere à criação desses produtos e processos, podendo ser patenteada e visualizada através de protótipossem ser necessariamente, viável na prática, no sentido econômico por exemplo. A inovação ocorre justamente na efetiva aplicação prática de uma invenção, não havendo, portanto inovação sem invenção que por sua vez não existe sem as técnicas. Essa definição é compatível com o conceito schumpeteriano de inovação que é bem abrangente (SCHUMPETER, 1984). Para Schumpeter, tudo que diferencia e cria valor a um negócio se enquadra no conceito de inovação. Isso pode se dar desde o desenvolvimento de novos produtos e serviços até a reestruturação dos métodos de organização, desde que esteja focado na melhoria da competitividade de uma empresa no mercado. É por essa ótica que Schumpeter analisa a importância da inovação no sistema capitalista e como eles são interdependentes entre si. Essa conclusão parte do seu estudo sobre a economia e de como esta evoluiu, permitindo ganhos para a sociedade como um todo. Schumpeter observou a média de crescimento dos países nos últimos séculos e afirmou que o sistema capitalista foi responsável pelo aumento dessa taxa, permitindo não somente um ganho relevante no PIB per capita como também na qualidade dos produtos e serviços, confirmando assim o seu sucesso como forma de economia. (SCHUMPETER, 1984). Mostrou que inclusive para as classes mais baixas, houve um ganho em termos reais muito grande, justamente pela máquina capitalista ser um aparelho de produção em massa. São mais pessoas gastando mais em serviços pessoais e em mercadorias manufaturadas. Como exemplo, ele cita as condições de vida em que o Rei Luis XIV da 18 Franca vivia e que centenas de anos depois, em termos de bens materiais, não difere muito dos bens possuídos por um trabalhador comum que teve seu poder aquisitivo engrandecido, refletindo assim o progresso sócio-econômico da economia. Schumpeter credita o êxito do capitalismo à mudança da ordem social que elevou a classe burguesa comercial e industrial que por sua vez valorizavam o trabalho. Para esta classe, sucesso significa ganhar dinheiro e isso torna o sistema econômico eficiente. O sistema burguês de vida iguala o êxito social ao êxito dos negócios. Privilegia a meritocracia, exige habilidade e uma capacidade de trabalho acima do normal. A ordem capitalista, segundo Schumpeter, prende de forma eficiente o capitalista ao trabalho e assim os interesses pessoais dos industriais e comerciantes levam ao rendimento máximo que, por fim, na visão de Schumpeter, beneficia a todos. Schumpeter não acredita que esse benefício seja máximo num sistema baseado em concorrência perfeita e critica estudiosos que acreditam que houve uma migração da concorrência perfeita para a formação de oligopólios. Na verdade, Schumpeter afirma que jamais existiu a concorrência perfeita e não vê mal nisso. Aliás, seu estudo mostrou que os maiores progressos em termos qualitativos e de custos ocorreram em produtos e serviços fornecidos por grandes empresas que operavam em um ambiente mais concentrado. (SCHUMPETER, 1984). Esse ambiente, afirma, é necessário para estimular a criação de novas empresas que precisam ter a oportunidade de um momento favorável no início para ter a coragem de investir. A flexibilidade perfeita e geral dos preços pode, em épocas de depressão, instabilizar ainda mais o sistema. Independemente da concentração da indústria, Schumpeter diz que todas têm que se adaptar às revoluções na estrutura econômica que sempre acontecem. Diferentes produtos, mercados, métodos de organização, entre outras inovações, estão em constante mudança e toda empresa precisa se adaptar a isso para sobreviver. Esse processo se chama destruição criadora e é inerente ao sistema capitalista. Monopólios existentes no longo prazo são raros, dado que a capacidade de explorar à vontade um tipo de procura não consegue se perdurar para sempre, a não ser que se fundamente no poder público. Esse processo é motivado pela concorrência que sempre busca uma superioridade no custo ou na qualidade para garantir uma maior fatia na margem de lucro, que por sua vez reflete o seu valor para a sociedade. Assim, todo homem de negócios se vê em 19 constante ameaça e essa pressão no longo prazo leva a um comportamento parecido como se sua empresa tivesse posicionado em um sistema de concorrência perfeita. A posição de único vendedor só consegue ser mantida por décadas se esse nunca agir como se fosse monopolista. É necessário inovar para sobreviver. Segundo Schumpeter, a inovação representa a força dinâmica inerente ao capitalismo, o seu impacto reduz a importância de práticas que restringem a produção e garantem o máximo de lucro. Isso expande a produção e reduz os preços contribuindo novamente para o progresso socioeconômico. Atualmente, a referência metodológica utilizada para analisar o processo de inovação é o Manual de Oslo, desenvolvido pela OCDE, permitindo comparações de estatísticas internacionais. O manual inspirou a criação da Pesquisa Industrial sobre Inovação Tecnológica (PINTEC) do IBGE. O objetivo de ambas é monitorar basicamente três tipos de inovação, a de produtos, a de processos e aquela referente às mudanças organizacionais e assim obter os impactos percebidos na empresa e os incentivos e obstáculos à inovação (TIGRE, 2006) A inovação do produto se refere à criação de um produto tecnologicamente novo, ou seja, com características fundamentais significativamente diferentes daquela usada anteriormente. A inovação de processos se refere à introdução de novas tecnologias de produção, ou seja, métodos novos, podendo alterar o nível da qualidade do produto e os custos de produção e entrega. (TIGRE, 2006) As inovações organizacionais referem-se a mudanças que ocorrem na estrutura gerencial da empresa como na especialização dos trabalhadores e no relacionamento com fornecedores e clientes. Outra classificação utilizada para a inovação se relaciona com a dimensão dos seus impactos. O nível mais gradual de mudança tecnológica é representado pelas inovações incrementais. Ocorrem de forma contínua e são normalmente resultado de aprendizado interno do que através de pesquisa e desenvolvimento. Como exemplo, podemos utilizar aperfeiçoamentos no layout de um produto ou uma melhoria no design do mesmo. Porém, quando a inovação rompe com uma rota tecnológica ela é considerada radical. Representa um salto na produtividade a uma criação de uma nova direção tecnológica. Normalmente é resultado de investimento em pesquisa e desenvolvimento. A 20 internet é um bom exemplo, revolucionando as formas de comunicação e criando novas áreas de atividade econômica. O consenso é de que existem basicamente duas forças distintas que induzem o processo de inovação. A primeira, proposta por Schomookler e chamada “demand-pull”, mostra que a mudança tecnológica vai ao encontro das necessidades dos consumidores finais. (apud TIGRE,2006) A segunda, “technology-push”, define a tecnologia como autônomo e derivada dos avanços da ciência. Basicamente, segundo a teoria, a ciência básica é que cria as oportunidades para aplicações lucrativas do uso de novas tecnologias. Os centros de P&D, principalmente em países desenvolvidos, são motivados pela pesquisa em si e não para atender a alguma necessidade específica. A inovação aqui é impulsionada pela própria tecnologia. Isso leva a uma maior capacidade da geração de inovações do tipo radical que mais tarde fornecerão oportunidades de novos negócios. Giovanni Dosi concorda com esses dois determinantes e buscou interpretar qual seria a visão predominante e as conclusões foram diversas (DOSI,1982). Segundo ele, o “demand-pull” pressupõe que os agentes vão inovar na medida em que surgem novas necessidades. Os consumidores primeiro têm que expressar novas preferências, refletindo na sua função utilidade que só então irá coordenar os produtores a buscar os produtose serviços novos que atendam a essa nova necessidade. Portanto, o processo de inovação é a última etapa. O argumento básico para essa teoria é que é possível conhecer antecipadamente os sinais dados pelo mercado sobre que bens e serviços se está buscando. Esse sinal viria, por exemplo, do ajuste perfeito dos preços relativos e quantidades do mercado e a partir destes sinais é que se iniciaria o processo de inovação. Dosi reconhece que as dificuldades desse modelo são grandes. É preciso crer na eficiência do mercado na teoria de preços relativos e também na facilidade de se obter curvas de demanda e, portanto de utilidade a partir das preferências dos consumidores. Além disso, o tempo entre a inovação e a disponibilidade dos produtos oriundos dela teria que ser bem curto o que nem sempre acontece. Assim, essa teoria pode ser útil para explicar apenas parte das inovações, principalmente aquelas consideradas incrementais, até porque aquelas que quebram com 21 um paradigma tecnológico dificilmente vão ser motivadas por consumidores que desconhecem os frutos gerados por esse tipo de inovação. Por outro lado, temos a inovação motivada pelo lado da oferta, “tecnology-push” e, segundo Dosi, há muitos indícios da sua importância. Primeiro, percebe-se um aumento da complexidade nas atividades de pesquisa e desenvolvimento, o que torna o processo de inovação mais uma solução para o planejamento de longo prazo das firmas do que para atender necessidades pontuais, dado que estas estão em constante mudança, tornando o processo de inovação complicado se esse fosse para corresponder a alguma expectativa específica. (DOSI, 1982) Porém, não dá para assumir uma posição totalmente autônoma do processo de inovação. É claro que, ao se fazer uma regressão histórica, chega-se à conclusão de que esse processo é impulsionado por fatores econômicos. Assim, Dosi, conclui que cada teoria de forma independente falha ao tentar explicar todas as mudanças tecnológicas. O ritmo de como uma tecnologia se difunde é o reflexo da sua adoção pela sociedade. Ela não se dá de forma uniforme e constante no tempo e no espaço, por ser influenciada por diferentes fatores condicionantes. Mansfield buscou entender esse processo e mostrou que uma inovação geralmente percorre um ciclo de vida composto por quatro fases distintas: introdução, crescimento, maturação e declínio (apud TIGRE, 2006). A primeira é a introdução de um novo produto, serviço ou processo, com um número pequeno de empresas adotando. Nessa fase, há grande incerteza com relação aos resultados da inovação. À medida que esse vai tendo sucesso e há assim uma melhoria progressiva do desempenho da tecnologia, ela entra em fase de crescimento. Depois, esta recebe diversas inovações incrementais para melhorar, por exemplo, a performance e o design do produto entrando na fase de maturação. No declínio, a tecnologia deixa de ser usada em função do surgimento de outras. Com relação aos fatores condicionantes que irão estimular ou restringir a nova tecnologia, podemos classificá-las de acordo com sua natureza técnica, econômica ou institucional. Do ponto de vista técnico, quanto mais complexa for a tecnologia, mais lenta será a sua difusão. Haverá necessidade de suporte técnico para os problemas e há o aumento da incerteza dada a falta de informações sobre esse tipo de inovação. É preciso que a empresa esteja bem preparada para incorporar tecnologias muito inovadoras, com uma estrutura 22 operacional e gerencial implantada, assim como rotinas, procedimentos e uma cultura organizacional adequada para o processo. A empresa ao inovar assume riscos e, portanto, precisa estar preparada para isso. Do ponto de vista econômico, o ritmo de difusão vai depender dos custos de aquisição e implantação da nova tecnologia e também a expectativa de retorno do investimento. Se a inovação permite ganhos com economia de escala e de escopo provavelmente será adotada por grandes empresas cujo volume de operações justifica essa inovação. Portanto, olhando para o fator econômico, uma estrutura muito pulverizada pode retardar as inovações, com empresas pequenas não conseguindo contar com recursos técnicos e financeiros suficientes para investir nessas tecnologias. Existem também fatores institucionais que condicionam o processo de difusão tecnológico. Entre os principais, temos os incentivos fiscais à inovação, um clima favorável de investimento no país e a existência de capital humano e instituições de apoio. Fatores culturais de uma nação, como a estratificação social, o regime jurídico do país e inclusive a religião predominante também exercem forte influência na velocidade da aceitação de uma inovação pela sociedade. Uma vez difundido, os impactos da inovação abrangem os diferentes setores da economia e da sociedade. Irão afetar a estrutura industrial destruindo e criando empresas e mercados. Do ponto de vista social, irão impactar no nível de emprego e suas qualificações que estão sempre tendo que ser atualizadas com as novas necessidades. O volume de emprego, por sua vez, também irá mudar, dependendo tanto da natureza do processo quanto das mudanças organizacionais necessárias para sua implantação. E quanto à preocupação ambiental, as novas tecnologias, podem ser ofensivas, como os veículos automotivos, ou ajudar a desenvolver fontes alternativas de energia, reduzir emissões e produzir de forma mais limpa. Existem diferentes fontes de conhecimento para a inovação que podem ser classificadas entre endógenas e exógenas, de acordo com sua origem. As fontes externas envolvem a aquisição de informações codificadas, consultorias especializadas e as tecnologias já embutidas em máquinas e equipamentos também adquiridos. A endógena se dá através de processos realizados dentro da própria empresa, no que envolve tanto o desenvolvimento de produtos e processos quanto à melhoria 23 incremental dos mesmos. Isso pode ocorrer de formas diversas. Entre elas, destaca-se a criação de um departamento de pesquisa e desenvolvimento (P&D), usado tanto para a realização de pesquisa básica, com foco no avanço científico, quanto na pesquisa aplicada, focada em problemas práticos. Nos países desenvolvidos, a maior parte da atividade é feita dentro das próprias empresas que recebem apoio governamental. Nos demais países, um número inferior de empresas consegue recursos técnicos e financeiros suficientes para criar tal departamento. Encontramos, no Brasil, vários exemplos de empresas com um departamento de P&D bastante ativo como forma de se diferenciar pela sustentabilidade. Podemos destacar o caso da Braskem, empresa líder em resinas termoplásticas na America Latina que a partir de 2002 começou a focar suas ações baseando-se numa política de tecnologia, inovação e sustentabilidade. Os resultados apareceram em 2007, quando a empresa foi a primeira a lançar um polímero verde – polietileno de alta densidade produzido a partir da cana-de- açúcar, um tipo de plástico em que as indústrias automobilísticas e de embalagens alimentícias demandam bastante e que tem um desempenho e qualidade superiores a outros polímeros. Essa inovação resultou de um projeto contínuo de pesquisa e desenvolvimento, com investimento de US$ 100 milhões ao ano, mas que possibilitou esse fator de diferenciação. (VISÃO AMBIENTAL, 2000) A Natura também segue o mesmo exemplo. Ela é a maior fabricante brasileira de cosméticos e produtos de higiene e beleza e tem sua imagem bastante vinculada às causas ambientais. Ao longo dos anos, a companhia investiu em novas tecnologias para reduzir o impacto dos seus produtos no meio ambiente, descobrindo novos ingredientes e valorizando as comunidades locais. Com isso ela conseguiu renovar a fórmula dos seus produtos e criar assim a linha Natura Ekos, que passa a ter mais de 60% de sua matéria- prima de origemvegetal e renovável, extraída de maneira sustentável, garantindo assim na visão da empresa, um modelo de gestão voltado ao crescimento econômico e à perpetuação da empresa. (VISÃO AMBIENTAL, 2000) Outra maneira de desenvolver a capacitação produtiva, organizacional e tecnológica é através do aprendizado cumulativo. Esse aprendizado ocorre em todas as esferas de atividades da firma e ocorre com o monitoramento das rotinas para identificar e a partir disso buscar as soluções para os problemas existentes. Esse processo permite aperfeiçoar rotinas operacionais, promover a reengenharia de atividades e melhorar a qualificação dos recursos humanos. Essa aprendizagem é cumulativa e o estoque de conhecimentos ao 24 longo do tempo permite gerar inovações locais em uma direção própria. Esse é o conceito de “aprender-fazendo”. Essa última fonte em particular foi estudada por Nelson e Winter, mostrando que a rotina e sua recombinação criam novos processos dentro da empresa capazes de melhorar a competitividade da empresa. (NELSON, 1982) A rotina de atividades permite criar um estoque de informações disponíveis entre os membros da empresa que trabalham baseados nelas, mas que agregam ações individuais de acordo com as suas interpretações próprias das situações vividas pela empresa. Essas interpretações se baseiam em dados contidos por cada individuo, podendo se originar nas experiências de vida dessa pessoa e/ou no estudo acadêmico. Os funcionários, portanto, conhecem seu trabalho (rotina), interpretam os problemas de forma individual, respondendo com atitudes que por fim irão coordenar o trabalho de todo mundo. Esse processo está de acordo com o conceito de “aprender-fazendo” e permite o aperfeiçoamento das rotinas operacionais, sendo, portanto, uma fonte de inovação. (VINHA, 2001) O processo de inovação, por sua vez, se tornou uma atividade tão relevante na empresa que, segundo Schumpeter, além de criar novas rotinas, ela virou também uma rotina (NELSON, 1982). Nelson e Winter citam diversos profissionais diferentes, como um pesquisador e um presidente de uma empresa, que tem como rotina solucionar problemas cuja solução está justamente em modificar determinadas rotinas. O departamento de pesquisa e desenvolvimento de uma firma exemplifica exatamente isso. A difusão desse aprendizado depende bastante da interação entre os grupos de interesse da companhia para que possa haver uma maior eficiência dinâmica. Essa interação permite expandir outra fonte de inovação, baseado no stakeholder approach (VINHA,2001). Trata-se do “learning by interacting”, na medida em que diferentes grupos de interesse conhecendo o processo operacional da empresa conseguem trazer novas idéias para provocar justamente mudanças nesse processo. Ou seja, a partir do diálogo e da participação desse stakeholder no dia-a-dia da empresa é possível criar novos processos produtivos e mudar a trajetória tecnológica da empresa. Para isso é preciso que o conhecimento agregado pelo stakeholder possa levar a 25 uma diferente rotinização das atividades. Senão, não ficará na memória dos funcionários da empresa e assim não se tornará operacional. (VINHA, 2001) É importante considerar também a estratégia competitiva que será adotada pela empresa para entender o seu posicionamento quanto ao processo inovador (TIGRE, 2006). A estratégia competitiva permite várias teorias, embora a maioria delas trate da relação entre a empresa e o ambiente externo, levando-se em conta cinco forças competitivas, segundo Porter: barreiras à entrada, ameaça de substituição, poder de barganha de fornecedores, poder de barganha de clientes e rivalidade entre competidores. Usando a teoria dos jogos, a empresa também precisa prever os movimentos do concorrente após o seu movimento. (apud TIGRE, 2006) Já as teorias reunidas em torno da chamada VBR (visão baseada em recursos) prefere focar nas capacitações da empresa e não no posicionamento da empresa no mercado. (TIGRE,2006). Independentemente da estratégia competitiva usada, a empresa consegue fazer uma análise interna e adotar um posicionamento com relação às principais variáveis, entre elas, a estratégia tecnológica. Uma taxonomia criada por Freeman caracteriza as estratégias tecnológicas em diversos tipos. (apud TIGRE, 2006). Elas não são exclusivas e as empresas adotam variações das mesmas que também vão mudando para incorporar mudanças no cenário externo. Esta estratégia pode ser ofensiva, sendo adotada por empresas que querem a liderança tecnológica em alguns segmentos da indústria. Geralmente, enfrenta grandes riscos por estar introduzindo um novo produto ou processo não testado no mercado. Não se espera retornos imediatos e por isso é preciso contar com recursos financeiros suficientes, sob pena de surgir um concorrente em melhores condições para ocupar esse novo mercado. Como exemplo, podemos apontar a Petrobrás. Ela é pioneira na exploração em águas muito profundas. Foi preciso apoio governamental com recursos técnicos e financeiros para que ela pudesse se arriscar em um projeto inovador tão complexo. Para quem não quer correr tantos riscos, a opção pode ser a estratégia defensiva. A empresa que adota essa postura não é a primeira a inovar, mas se agir de forma rápida ela consegue aprender com possíveis erros de uma concorrente pioneira e ocupar um espaço no mercado maior do que este própria concorrente. A empresa que tem uma marca conhecida e conta com boas capacitações técnicas e financeiras consegue com essas 26 vantagens superar os inovadores ofensivos. Ela não pretende copiar o inovador, mas superá-lo. Ela deixa o ônus de lançar um produto ou serviço novo para outra empresa, geralmente menor que ela, e depois lança similares incorporando diferenciais incrementais como design e performance.(TIGRE,2006) Assim, a estratégia adotada vai depender da percepção das forças e fraquezas internas à firma com relação a sua capacitação técnica e produtiva. Essa capacitação representa um estoque de recursos, tanto materiais quanto humanos, além de intangíveis como marcas e patentes. Eles estão em constante mudança e por isso o esforço recorrente de aprendizagem e investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Naturalmente, esses esforços dependerão da estratégia adotada pela firma que no final se mostrará correta ou não de acordo com a trajetória da empresa no longo prazo. II. 2. Inovação e Sustentabilidade A inovação é fundamental no processo de transição para uma economia ambientalmente mais sustentável, pois contribui para minimizar o conflito entre crescimento econômico e desenvolvimento. A inovação não acaba com o problema, dado que sempre enfrentaremos um limite em termos de recursos naturais e capacidade de suporte do Planeta sustentar, e absorver os resíduos, de todas as atividades humanas, mas certamente é um aliado essencial na mitigação dos impactos ao invés de acelerá-los, como muitas correntes acreditam. Lustosa (LUSTOSA, 1999) esclarece que não há tecnologia disponível que aproveite 100% dos insumos e, dada a capacidade de absorção do meio ambiente, a poluição é inevitável. Porém, a tecnologia pode ser usada para solucionar problemas ambientais. Porter (PORTER, 1995) explica que a visão que considera novas tecnologias e novas formas de produção como nocivas ao desenvolvimento sustentável pressupõe a existência de um trade-off obrigatório entre economia e meio ambiente, ou seja, o que é bom para um não pode ser bom para o outro, caracterizando-se uma incompatibilidade entre eles. Isso porque o meio ambiente claramente se beneficiaria com medidas mais restritivas em termos ambientais enquanto a indústria teria que se adaptar incorrendo em custos maiores ligados à prevenção e tratamento da poluição, os quais elevariam os preços e reduziriam a competitividade, tornando, assim, a economiamenos produtiva. Na visão de Porter (PORTER,1995) tal cenário só seria possível se as técnicas, produtos e processos fossem considerados fixos; neste caso, a regulação ambiental mais 27 conservadora levaria a uma economia menos competitiva. Mas a economia real não é fixa, mas sim dinâmica e uma regulação bem feita pode impulsionar novas inovações que podem aumentar a competitividade de uma economia mais alinhada com as práticas de sustentabilidade. É importante, porém, criar estímulos às inovações. Geralmente, marcos regulatórios tendem a gerar reações negativas por parte das firmas, levando-as a um movimento mais de oposição às novas regras do que de adaptação e superação destas. Isso acaba suscitando comportamentos equivocados quando a empresa procura adotar medidas ecologicamente mais corretas, levando-a a concentrar seus esforços no controle da poluição pós-produção, o que a impede de perceber as oportunidades na prevenção da poluição, que é muito mais importante. O processo de produção envolve muitas etapas em que ainda há um mau uso dos materiais, controles internos pobres que leva a um desperdício desnecessário. Ou seja, é preciso que as empresas sejam mais eficientes na prevenção da poluição, aproveitando ao máximo a produtividade dos recursos naturais, através de novas técnicas e novas formas de produção. Porter cita que já houve um dilema parecido com esse na década de 1980 entre a qualidade dos produtos e o custo dos mesmos. Acreditava-se, então, que a melhoria da qualidade levaria necessariamente a um custo mais elevado, mas a competição aliada à inovação tornou possível que novos produtos surgissem a preços mais baratos. Este mesmo autor defende que a regulação é necessária porque como há muitas incertezas e barreiras à entrada e à saída para cada indústria específica, é improvável que o administrador em algumas situações se sinta confortável em promover medidas ecoeficientes sem a garantia de que tornará sua empresa mais competitiva. A regulação, portanto, precisa ser firme a ponto de criar um choque empresarial na forma de promover a inovação; precisa criar mecanismos que obriguem as empresas a eliminar a poluição ao longo de toda a cadeia de produção, mas precisa, também, entender a dinâmica de cada indústria para não exigir mais do que pode e acabar levando a discussão a questões judiciais. (PORTER, 1995). A rapidez com que isso vai ocorrer em cada setor depende de inúmeros fatores, sobretudo os relacionados à quantidade de informação já disponível, desde capacidades técnicas conhecidas até o acesso ao conhecimento científico por parte das empresas. Assim, um segmento formado principalmente por empresas pequenas pode ter mais 28 dificuldade em se atender a regulação ambiental por deter menos conhecimento sobre as tecnologias disponíveis. Segundo Porter, se bem feita, a regulação é capaz de fomentar a criação de empresas que saibam medir seus impactos ambientais, diretamente e indiretamente, que adotem uma postura pró-ativa, antecipando-se às próximas regulações, e que compreenderão o custo de oportunidade do uso ineficiente dos seus recursos, privilegiando investimentos de longo prazo em eco-eficiência. A crescente disseminação deste comportamento empresarial reforçaria as políticas regulatórias e o investimento em inovações ambientais, o que consequentemente criaria uma economia ao mesmo tempo mais produtiva e sustentável. Concluimos, a partir disso, o quão importante é integrar a variável da sustentabiilidade à inovação de forma a proporcionar uma trajetória positiva de longo prazo para a empresa. A inovação, ainda que não suficiente para solucionar todos os problemas socioambientais, permite um melhor equilíbrio entre os shareholders e os stakeholders. Ela possibilita a competitividade, através do desenvolvimento de novos produtos e serviços, e da redução do custo destes, o que agrega valor ao shareholder, e ajuda a mitigar os efeitos negativos da atividade humana com relação às questões sociais e ambientais, o que agrada aos demais stakeholders. Dessa forma, entendemos a inovação e a sustentabilidade como fatores críticos de sucesso para qualquer empresa a fim de garantir a sua “licença social para operar”, e gerar condições para perpetuidade de seu funcionamento. 29 Capitulo III - Apresentação da Vale e sua política de sustentabilidade III. 1. Introdução e trajetória A Vale é uma mineradora brasileira presente em 39 países. Pesquisa produz e comercializa minério de ferro e pelotas, níquel, cobre, carvão, bauxita, potássio entre outros minerais. Atua também nos segmentos de logística, energia e de siderurgia. (VALE -SITE) A Vale participa da exploração mineral em 24 países (Figura 1). Os minerais são obtidos por meio de processos que envolvem pesquisa geológica, abertura e operação de minas e processamento do material. Figura I- Presença global da Vale A história da Vale começa com a atuação de grupos de investidores internacionais no início do século XX. Estes, maioria de origem inglesa, adquiriram terrenos próximos a Itabira, em 1909, e fundaram a Brazilian Hematite Syndicate, um sindicato com o objetivo de começar a exploração mineral. (VALE - SITE) Em 1911, o empresário americano, Percival Farquhar, compra esse sindicato e o transforma na Iron One Company. Os projetos de Percival, entretanto, não lograram sucesso e por fim foram inviabilizados quando Getulio Vargas assumiu o poder e encampou as reservas de ferro que pertenciam a Farquhar e a Estrada de Ferro Vitoria a Minas. Isso ocorreu no dia 1 de junho de 1942, com o decreto do presidente que criava assim a Companhia Vale do Rio Doce. 30 Os próximos 20 anos, porém seriam caracterizados pela identificação de grandes reservas de minérios de ferro, porém com pouca produção ainda. Até que em 1961 Eliezer Batista se torna presidente da Vale. Ele percebeu a necessidade dos japoneses em expandir o parque siderúrgico após os danos da Segunda Guerra Mundial, e buscou investir na rota Brasil – Japão. Foram assinados vários contratos de exploração com siderúrgicas japonesas, foi criada uma empresa de navegação (Docanave) para levar o minério até o Japão, e em 1966 foi inaugurado o Porto de Tubarão. Essas iniciativas fizeram a estatal assumir a liderança mundial na exportação de minério de ferro na década de 1970. Durante esse período, a Vale também se preparou para o Projeto Carajás que entrou em operação em 1985. A descoberta do complexo Carajás, que contém a maior reserva mundial de minério de ferro de alto teor, havia sido feita na década de 1960 ainda pela US Steel, mas a participação majoritária passou a ser da Vale após duras negociações. Foram feitas para esse projeto grandes obras de infra-estrutura, com a Usina Hidrelétrica de Tucuruí, a Estrada de Ferro Carajás- Itaqui e o Porto de Ponta da Madeira. Em 1997, a Vale é privatizada após leilão realizado na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. O processo foi iniciado em 1995, quando a Vale foi incluída no Programa Nacional de Desestabilização e a partir dessa data, iniciaram-se os preparativos para a privatização da companhia. Em 1996, foi assinado o contrato entre o BNDES e dois consórcios que fariam a avaliação econômico-financeiro, a modelagem de venda e a oferta de ações para a privatização. Dois consórcios participaram do leilão de privatização, o Consórcio Brasil e Consórcio do grupo Votorantim. O primeiro, liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional – CSN venceu o leilão realizado na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. O grupo arrematou 41,73% das ações ordinárias do Governo Federal por US$ 3,338 bilhões, correspondendo a um ágio de 19,99% sobre o preço mínimo. Além da CSN, o consórcio foi integrado pelos fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), da Petrobras ( Petros), entre outros fundos. (RUSSO,2012) Os próximos anos foram caracterizados pelas taxas expressivas de aumento do lucro da empresa e a aquisição de outras empresas de menor porte. 31 Em 2006, A Vale compra a empresa canadense INCO, tornando-se assim a segunda maior mineradora do mundo, atrás apenas da BHP Billiton. (VALE – SITE) Em 2008, A Companhia Vale do Rio Doce muda sua razão social para Vale SA apenas e ultrapassa a Petrobrás em volume de exportação. Por fim em 2010, a Vale fez uma grande aquisição no segmento de fertilizantes, adquirindo ações de propriedade da Mosaic, Ferfitos e, em especial, da Fosfértil e da Bunge (VALE-SITE). III.2. Mineração Segundo informação da Vale, o minério de ferro é o carro-chefe da empresa e a sua transformação está presente no nosso dia-a-dia desde um simples parafuso até as grandes construções. (VALE- SITE). O minério da Vale é exportado para o mundo todo, segundo a justificativa apresentada pela empresa, porque tem qualidade superior devido ao alto teor de ferro (CETEM, 2002). A partir do minério de ferro, a Vale produz: Granulado: natural grosseiro peneirado a partir do ROM com tamanho máximo razoável. Sinter feed; para ser utilizado na siderurgia, o sinter feed é submetido a uma operação de aglomeração, na qual se forma o sinter, produto que alimenta o alto forno. O sinter feed de Carajás é considerado referência mundial com alto teor de ferro, baixos níveis de impureza e boas propriedades metalúrgicas. Pellet feed: natural superfino com alto teor de ferro e baixos níveis de impureza. Para ser utilizado no alto forno deve passar pela pelotização. Pelotas: pequenas aglomerações de minério de ferro feitas a partir de uma tecnologia que permite utilizar as sobras geradas durante a extração do minério, antes consideradas resíduos do processo. A pelota é usada na fabricação de aço. A Vale possui um sistema integrado de operação entre as minas, ferrovias e os portos envolvendo o planejamento de toda a cadeia produtiva. Hoje, cada atuação esta dividida em três sistemas: Norte, Sudeste e Sul. O Sistema Sudeste é composto pela estrada de ferro Vitoria-Minas, que faz a ligação das mais de 15 minas dessa região com o porto de Tubarão no Espírito Santos. 32 Essas minas estão localizadas na região conhecida como Quadrilátero Ferrífero, no Estado de Minas Gerais, divididas em três áreas de mineração: Itabira, Minas Centrais e Mariana. A Vale opera com minas a céu aberto. As minas do Sistema Sul estão localizadas também no Quadrilátero Ferrífero. São outros 3 complexos de mineração: Itabiritiba, Vargem Grande e Paraopeba. O Sistema Sul utiliza os serviços da MRS, empresa de transporte onde a Vale tem participação, para escoar a produção ate os portos de Ilha Guaíba, em Mangaratiba; e também na Companhia Portuária de Sepetiba. O Sistema Norte é constituído da Estrada de Ferro Carajás e do Porto de Ponta de Madeira, no Maranhão, para escoar os produtos produzidos exclusivamente no Pará, nas minas de Carajás. A Vale tem como seu único mercado a indústria siderúrgica. Em 2010, a China respondeu por 42,9% do embarque de minério de ferro e pelotas e a Ásia como um todo por 60,7%. A Europa, por sua vez respondeu por 20,7% seguido do Brasil com 13,7%. Os dez clientes mais importantes representaram em torno de 44% das vendas de minério de ferro em 2010. A Vale dispõe de uma estrutura própria de escritórios de vendas no Brasil e no exterior, sendo sua política institucional assegurar que a comercialização da produção de minério de ferro seja realizada diretamente entre os escritórios comerciais e as empresas, sem a participação de quaisquer intermediários. Os principais concorrentes do mercado de minério de ferro e pelotas no mercado asiático estão localizados na Austrália e incluem subsidiárias e afiliadas da BHP Biliton e Rio Tinto. Embora essas empresas tenham custos de transporte mais baratos devido à localização, a Vale diz ser competitiva por dois motivos : 1) qualidade do minério, sendo o da Vale um dos minérios com o mais baixo nível de impureza e com outras propriedades que costumam resultar em custos mais baixos de processamento; 2) política de marketing desenvolvida com as siderúrgicas permite criar relações de vendas baseadas no fornecimento garantido de um mix específico, entrando em contato direto com o cliente para ajudá-lo a determinar a melhor mistura que convém as suas necessidades. A Valepar é a acionista controladora da Vale (Figura 2). A Valepar é uma sociedade de proposta específica organizada com o único objetivo de ter uma participação na Vale e adquirir o controle da mesma do governo em 1997 como parte do processo de privatização. 33 Figura II – Estrutura acionária da Vale III. 3. Siderurgia A Vale busca incentivar o desenvolvimento de projetos siderúrgicos no Brasil através de joint ventures. Atualmente existem alguns projetos em andamento: Thyssenkrupp CSA: A Vale e a Thyssenkrupp, uma das maiores siderúrgicas do mundo, localizada no bairro de Santa Cruz inauguraram em junho de 2010 a Thyssenkrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico. A usina tem capacidade de produção anual de 5 milhões de toneladas métricas de placas de aço. O projeto que recebeu investimentos de 8,2 bilhões de dólares engloba além de dois alto fornos, porto coqueria e uma termoelétrica, entre outros. Companhia Siderúrgica de Pecem: a construção da usina de placas de aço, no Ceará está sendo realizada em parceria com a Donggkink e a Posco, as maiores da Coréia do Sul. A planta terá capacidade de produção de 3 milhões de toneladas métricas por ano. O start-up está previsto para 2014. III.4. Logística A Vale é a empresa que mais investe em logística no Brasil, tendo investido ao longo dos anos para ampliar sua capacidade de transporte e possuindo hoje uma infra- estrutura que permite a conexão das principais regiões produtoras aos portos, viabilizando o escoamento de cargas. (VALE – SITE) 34 Em termos de ferrovias, a Vale opera com aproximadamente 10 mil quilômetros de malha ferroviária, sendo responsável por cerca de 16% de toda a carga movimentada por esse meio no Brasil. Em sua estrutura logística, a Vale também conta com nove terminais portuários, e com uma frota de vinte navios próprios e diversos contratos de afretamento. Além disso, a Vale já fez a encomenda de outros 35 navios com a capacidade de 400 mil toneladas para o transporte de minério de ferro na rota Brasil – Ásia que deverão ser entregues até 2013. III.5. Vale Fertilizantes Em 2010, a Vale adquiriu a Fosfértil (atual Vale Fertilizantes) e os ativos de nutrientes da Bunge no Brasil. (VALE – SITE) O setor de fertilizantes compreende basicamente três elementos: nitrogênio, fósforo e potássio e face ao crescente consumo do agronegócio no país, o Brasil importa mais da metade dos insumos para fertilizantes que consome. III. 6. Política de Sustentabilidade da Vale A política de sustentabilidade da Vale está descrita no seu último relatório de sustentabilidade do ano de 2010 feito de acordo com as diretrizes da Global Reporting Initiative (GRI), padrão adotado internacionalmente. (VALE, 2010) A mensagem em destaque descreve a Vale como uma empresa que busca o maior retorno ao acionista, em desenvolvimento sustentável e em clima organizacional. Segundo a Vale, operar com sustentabilidade significa adotar responsabilidade socioeconômica e ambiental em todo o ciclo de vida das suas atividades, além de contribuir por meio de parcerias e com o governo e sociedade para a construção de um legado de sustentabilidade. A sua atuação se constrói a partir do Plano de Ação em Sustentabilidade (PAS), que estabelece as metas relacionadas ao comprometimento da Vale com a sustentabilidade e que são decisivas para a remuneração variável dos empregados, sendo essas metas acompanhadas mensalmente pelos diretores.Não há uma abertura completa dos critérios dessa remuneração, mas o item saúde e segurança representa 10% da remuneração variável dos empregados da Vale. (VALE, 2010) 35 Entre 2010 a 2012, a Vale pretende investir em torno de 335 milhões de dólares em 880 ações que vão desde a redução de resíduos perigosos gerados até a eficiência na utilização de recursos naturais. A Vale define como sendo seus stakeholders os seguintes segmentos: os acionistas, os clientes, os empregados, os fornecedores e as comunidades com as quais trabalha e tem políticas específicas para atingir cada um deles. Ao longo dos últimos 10 anos, a Vale criou 154,5 bilhões de dólares de valor aos acionistas e distribuiu 17,4 bilhões em dividendos e juros sobre capital próprio. Isso significa um retorno total ao acionista de 38,2% ao ano entre 2001 e 2010. A Vale possui cerca 174 mil empregados, sendo 71 mil próprios e 103 mil terceirizados. Em função da implantação e operação de grandes projetos estratégicos entre 2010 e 2012 e a aprovação de outros projetos de classe mundial em diferentes países, a expectativa é de que a demanda por mão-de-obra apresente um aumento significativo nos próximos anos. De acordo com o Código de Conduta Ética da empresa a discriminação – seja por etnia, origem ou sexo – é considerada intolerável. Ainda segundo este código, e com a Política de Remuneração da Vale, não há diferenciação do salário-base entre homens e mulheres que ocupam as mesmas funções. A empresa tem uma alta taxa de retenção dos empregados. Em 2010, a taxa de turnover global da Vale foi de apenas 6%, bem inferior aos últimos anos. Nas comunidades com a qual trabalha, a Vale afirma realizar um diagnóstico para cada uma delas, dimensionando os impactos positivos e negativos da presença da empresa e a partir desses resultados são tomadas as providências para alavancar os pontos favoráveis e mitigar os desfavoráveis, com vistas a criar um ambiente de colaboração. Convém registrar que a verificação na prática desta política, bem como a descrição de toda a controvérsia em torno dos resultados, não será tratada neste trabalho, pois exigiria ampliá-lo significativamente. Nosso objetivo é descrever a estratégia e a política de sustentabilidade da empresa, mas não temos instrumentos para avaliá-la com base em verificação de campo. A Vale adota a metodologia Front-End-Loading, que se propõe a identificar os aspectos sociais, de saúde, segurança, e meio ambiente, além de riscos econômicos e 36 operacionais. Essa metodologia visa realizar um processo estruturado de avaliação de risco em conjunto com o desenvolvimento estruturado das demais disciplinas de um projeto. Ela é um processo muito utilizado em projetos de mega empreendimentos, com o objetivo de minimizar os riscos de investimentos. Na avaliação desses projetos, os potenciais impactos socioambientais da atuação da Vale são os listados na figura abaixo (Figura 3) Figura III – Potenciais impactos da atuação da Vale A Fundação Vale é responsável pela aproximação com os stakeholders da empresa. Sua missão é contribuir para o desenvolvimento territorial integrado das regiões onde a Vale atua, potencializando e articulando os investimentos sociais, estando, portanto, em constante parceria com o poder público e organizações da sociedade civil. Em 2010, a Vale informou ter investido cerca de U$ 400 milhões em ações de infraestrutura, educação, geração de emprego, entre outros por meio da Fundação Vale. (VALE, 2010) Entre as regiões apontadas pela empresa como tendo boa performance, destacam-se Moçambique e Nova Caledônia. Em Moçambique, foi criado o Projeto Moatize que contou com o reconhecimento do Banco Mundial. O projeto gerou emprego para a comunidade local, além de permitir o reassentamento de mais de mil famílias que foram consultadas e visitadas por comitivas internacionais que referendaram a ação da Vale como um exemplo de boas práticas. Após garantir a moradia e o emprego dessas famílias, a Vale iniciou 37 programas de melhoria da qualidade de vida dessas populações, trazendo educação e alimentação para as mesmas. (VALE, 2010) Já na Nova Caledônia, o Projeto VNC contribuiu para o crescimento econômico da região. Segundos dados da Vale, esse projeto diminuiu a taxa de desemprego de 16,3% para 4,5% e incrementou a receita local e o consumo. O diagnóstico também detectou aumento da taxa de inflação e uma maior pressão sobre abastecimento de água, telecomunicações e serviços públicos. Assim, para minimizar esses impactos, a Vale assinou um acordo de 30 anos com as comunidades locais contendo três instrumentos: Comitê Consultivo Indígena Ambiental, uma fundação e um programa de reflorestamento. Esse acordo faz parte do Pacto de Desenvolvimento Sustentável do Grande Sul, que envolve a Vale e diversas tribos indígenas que povoam o local que é uma zona ambiental declarada Patrimônio Natural da Humanidade pela Unesco. Inicialmente, esse projeto sofreu protestos contra possíveis impactos desde o desrespeito aos interesses locais até a preservação ambiental. A partir desse movimento, a Vale afirma ter buscado o engajamento das partes envolvidas nesse projeto. Com isso foi criada uma fundação para fomentar o desenvolvimento sustentável na região, e foram iniciadas consultas públicas que ocorrem periodicamente para que as tribos pudessem participar da gestão local. Um instrumento de prestação de contas à sociedade é o inventário de emissões de gases do Efeito Estufa (GEE), que possibilitou à empresa conhecer o perfil de suas emissões, e a partir de então desenvolver estratégias e planos para seguir o modelo de desenvolvimento baseado em uma economia de baixo carbono. Essas informações são divulgadas tanto no Relatório de Sustentabilidade como no Carbon Disclosure Project (CDP), iniciativa de um grupo de 500 investidores, contemplando U$ 64 trilhões em ativos, de modo a permitir a gestão de gases do efeito estufa. A Vale é a única empresa na America Latina no índice de liderança do CPD. (VALE, 2010) Atualmente, as iniciativas consistem em promover a utilização de gás natural e diferentes misturas de biodiesel na frota de locomotivas de ferrovias, com o intuito de aumentar a participação das fontes renováveis, verificar as melhorias na eficiência energética e reduzir a emissão de poluentes. 38 A Vale identificou os principais ativos que estariam em risco devido às potenciais mudanças climáticas e os custos de ações de adaptação para as operações de mineração em Carajás, Estrada de Ferro Carajás e Terminal Portuário Ponta da Madeira. Esses ativos foram selecionados a partir de um estudo feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) que indicou que a área estudada apresenta uma vulnerabilidade climática alta que pode vir a alterar o balanço hidrológico e gerar uma deficiência hídrica entre outros problemas. A empresa declara estar ciente que as mudanças climáticas são um desafio para seus negócios oferecendo riscos, expondo vulnerabilidades, mas, ao mesmo tempo, acredita que este cenário cria oportunidades para as empresas que estão bem informadas sobre o impacto de suas atividades e por isso considera prudente atuar desde já neste quesito. A principal oportunidade se refere ao desenvolvimento de projetos de créditos de carbono em processos industriais e florestais. Outras oportunidades podem vir de projetos de eficiência energética e também potenciais incentivos financeiros para a geração de energia mais limpa. O relatório de sustentabilidade da Vale trabalha com cenários de riscos regulatórios, que teriam como impactos uma redução na atividade econômica geral, a necessidade de investimentos nos processos de produção por mudanças de regulamentação, e custos maiores relacionadas à introdução de metas de emissão obrigatórias e uma elevação nos custos
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