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Isoimunização Rh VICTOR D’ANDRADE GINECOLOGIA · Doença Hemolítica Perinatal (DHPN): Eritroblastose Fetal, ocorre pela produção de anticorpos maternos contra antígenos do sangue fetal devido incompatibilidade sanguínea. - Antígenos dos grupos ABO e Rh são os principais responsáveis. Outros antígenos, chamados de irregulares, raramente causam doença e, quando causam, em geral têm apresentação branda. - Apesar da incompatibilidade ABO responder pela maioria dos casos, a doença pela produção de anticorpos a partir do fator Rh tem maior relevância. Devido a sua maior gravidade, é responsável por cerca de 80% dos casos de doenças clinicamente detectáveis. SISTEMA Rh · Na incompatibilidade materno-fetal, o sistema Rh é o mais importante e o antígeno D é o maior causador da doença hemolítica grave. · Para a ocorrência da doença hemolítica, é necessário o preenchimento das seguintes etapas: (1) incompatibilidade sanguínea materno-fetal; (3) aloimunização materna; (3) passagem de anticorpos da gestante para o feto; e (4) ação dos anticorpos maternos no organismo fetal. · Incompatibilidade Sanguínea Materno-Fetal: para a ocorrência de DHPN é necessário que o feto possua um antígeno eritrocitário ausente no organismo da gestante e seja capaz de imunizá-la. Para isso, o pai deve ser Rh positivo, feto Rh positivo e mãe Rh negativo. · Aloimunização (sensibilização) Materna: aparecimento de anticorpos circulantes anti-D (IgG) na circulação de gestantes Rh negativo em resposta ao contato com antígenos D. O principal mecanismo de sensibilização é pela entrada de antígenos provenientes da circulação de fetos Rh positivo, inexistentes nas hemácias maternas. - O contato do sangue fetal com o materno ocorre a partir de hemorragias que podem ocorrer durante a gestação, como nos casos de sangramento de primeiro trimestre e, principalmente, durante o parto, em especial nos do tipo operatório. - Outra forma seria através de transfusão sanguínea incompatível. - Em gestações subsequentes, com novo contato com hemácias fetais ou transfusões incompatíveis, haverá nova passagem de hemácias Rh positivo para a circulação materna. Mas, devido à memória linfocitária, ocorrerá um reconhecimento antigênico e produção acelerada de anticorpos IgG, que podem atravessar a barreira placentária. · Coombs Indireto: teste que identifica o anticorpo contra hemácias no plasma materno. A presença de IgG pode ser detectada pelo teste, o qual não é capaz de detectar IgM. Um teste negativo significa ausência de produção de IgG (sem sensibilização). · Passagem de Anticorpos da Gestante para o Feto: anticorpos IgG podem cruzar a placenta por difusão passiva e transporte ativo e, ao invadirem a circulação fetal, podem se fixar às hemácias dos fetos por uma reação antígeno-anticorpo, com posterior hemólise. · Ação dos Anticorpos Maternos no Organismo Fetal: podem surgir manifestações mais graves como hidropisia fetal e kernicterus, dependentes hemólise e da anemia. - Hemólise: causa aumento compensatório da produção de eritropoetina e eritropoiese medular. Com o agravamento do quadro, a medula não será capaz de manter a eritropoiese adequada e instala-se hematopoiese extramedular, especialmente no fígado e baço. Este processo é responsável pelo desenvolvimento da anemia fetal. - Anemia: -ocorre diminuição da viscosidade sanguínea pela menor concentração de hemácias. A anemia leva à hipóxia tissular e posterior vasodilatação periférica, estimulação dos quimiorreceptores e aumento da contratilidade miocárdica. Assim, ocorre aumento do DC, configurando o quadro de hipercinesia. Posteriormente, com o agravamento da anemia, pode ocorrer IC e consequente falência miocárdica. Ademais, devido à hematopoiese extramedular, pode haver desenvolvimento de disfunção hepatocelular, com consequente hipertensão porta e hipoproteinemia. - Hidropsia Fetal e Kernicterus: anemia e hemólise são responsáveis pelo quadro de hidropisia fetal, caracterizado pelo extravasamento de líquido para o terceiro espaço, com derrame pleural, pericárdico, ascite e edema cerebral. Além disso, pode haver o desenvolvimento de kernicterus, pela impregnação das células cerebrais por bilirrubina, desenvolvendo letargia, hipertonicidade, perda auditiva, paralisia cerebral e dificuldade de aprendizado. DHPN E A GESTANTE · 1º do acompanhamento pré-natal, mesmo sem história prévia de DHPN, é avaliar se há incompatibilidade sanguínea entre o casal. Se gestante Rh negativo e pai Rh positivo, segue-se protocolos de acompanhamentos ditados pelo Coombs indireto. - Se negativo, deve ser repetido com 28, 32, 36 e 40 semanas, para diagnóstico de possível sensibilização no curso da gravidez. Além disso, deve ser solicitado no pós-parto imediato, juntamente com o teste de Coombs direto e fator Rh do RN. - Se positivo e a titulação ≤ 1:8, deve ser repetido mensalmente até o parto. Estes resultados são mais associados a fetos não acometidos e, portanto, dispensam os testes de rastreamento de anemia. Se > 1:8 (≥ 1:16), repetido e confirmado, deve-se pesquisar hemólise fetal pela Dopplerfluxometria, preferencialmente. - Após a 1ª gestação acometida gravemente (óbito ou necessidade de transfusão fetal), o acompanhamento através dos títulos de Coombs indireto não se mostra eficaz, devendo-se optar pela investigação através da dopplerfluxometria de artéria cerebral média. - Outra estratégia é administração de Imunoglobulina com 28 semanas, ao invés do seguimento com Coombs indireto. DHPN E O FETO · Avaliação da Anemia Fetal: por métodos não invasivos e invasivos. · Métodos Não Invasivos: - Cardiotocografia: evidencia clássicas alterações apenas nos casos de doença grave (ausência de variabilidade e DIP tardios) ou a oscilação sinusoide. Altera-se somente em fases avançadas da doença, quando as medidas terapêuticas já não são tão eficazes na redução da morbimortalidade fetais. - USG: sem grande valor no seguimento e diagnóstico da anemia fetal, pois só será capaz de detectar alterações tardias e de gravidade acentuada. Pode evidenciar sinal do duplo contorno da bexiga fetal (ascite inicial), aumento da circunferência abdominal (hepatoesplenomegalia), derrames pericárdico e pleural, alterações placentárias (espessamento e perda da estrutura da placenta, sugerindo edema) e polidramnia. É bastante útil como ferramenta auxiliar aos procedimentos invasivos, guiando a amniocentese e a cordocentese. - Dopplervelocimetria: anemia fetal levar à redução da viscosidade sanguínea e a um estado de circulação hiperdinâmica, por conta de um aumento compensatório do DC para tentar suprir a demanda de oxigênio dos tecidos e posterior aumento do fluxo sanguíneo. O feto anêmico tende a apresentar valores de velocidade máxima do pico sistólico acima do limite esperado para a IG. Este é o método de escolha para o rastreamento de anemia fetal. O acompanhamento deve ser iniciado a partir de 18 semanas se Coombs indireto > 1:8. Apesar de a velocidade sanguínea aumentar em toda circulação, a ACM parece ser o melhor vaso a ser estudado, pois o SNC responde mais rapidamente à hipoxemia, devido à grande dependência do tecido cerebral do suprimento de oxigênio. Na prática, a curva de Mari é dividida em três faixas: > Vmax abaixo da mediana para a IG: não há hipercinesia e, portanto, não há anemia fetal que necessite intervenção; > Vmax entre a mediana e 1,5: pode haver anemia fetal, mas ainda não justifica a cordocentese, pois os níveis de hemoglobina ainda não atingiram grau que necessite de transfusão. As reavaliações nestes dois casos ocorrem a cada 1-2 semanas; > Vmax acima de 1,5: relacionado a fetos com hematócrito < 30% e está indicada a cordocentese para confirmação da anemia e transfusão intravascular. > Após 35 semanas, ocorre aumento das taxas de resultados falso-positivos. Desta forma, valores alterados em IG próximo do termo indicam a interrupção da gravidez. · Métodos Invasivos: - Espectrofotometria: permite estimar a concentração de bilirrubina no líquido amniótico, que é o produto final da hemólise dashemácias fetais. Assim, reflete a ocorrência de hemólise fetal. Pouco usada. - Cordocentese: padrão-ouro de avaliação da anemia fetal, permitindo a dosagem do hematócrito e hemoglobina, além de confirmar a tipagem sanguínea fetal e quantificar os anticorpos eritrocitários presentes na circulação fetal (Coombs direto). Permite a realização de terapêutica intrauterina, através de transfusão sanguínea. Seu uso deve ser restrito aos casos onde há forte suspeita de anemia fetal significativa pela dopplerfluxometria, visando sua confirmação e tratamento (transfusão intrauterina). São indicações: hidropisia fetal e dopplerfluxometria com velocidade aumentada. TRATAMENTO DA ANEMIA FETAL · Pode-se optar pelo tratamento intrauterino ou após o nascimento, que dependerá da IG em comparação com o risco da permanência intrauterina. Assim, indica-se a antecipação do parto em casos de fetos a termo ou próximos da maturidade, ou transfusão intrauterina em casos de doença grave (Ht < 30% ou Hb < 10 g/dl, ou hidrópicos) em fetos muito prematuros (< 34 semanas). · A escolha da via de parto é controversa. De forma geral, o parto pode ser tentado por via vaginal em fetos levemente acometidos, sendo a cesariana a via de parto de escolha em fetos gravemente acometidos. · TIU (Transfusão Intrauterina): sangue é administrado através da veia umbilical, por meio de cordocentese. O sanguíneo infundido deve ser sempre O- e o objetivo é um Ht entre 40 e 45%. - Outra via possível é a intraperitoneal que, apesar de mais simples tecnicamente, está caindo em desuso, pois a reversão da anemia se dá de forma mais lenta. Além disso, pode levar a lesões de órgãos abdominais. É especialmente útil em casos de fetos muito prematuros, onde o cordão umbilical não pode ser facilmente acessado. - Após uma TIU, a dopplerfluxometria e a amniocentese não se mostraram eficazes no seguimento fetal e, portanto, a cordocentese passa a ser o método de escolha. - O procedimento será repetido sempre que necessário, com intervalos de 2-21 dias, de acordo com os níveis hematimétricos ao final de cada transfusão, tendo-se em mente que a queda do hematócrito é de 1% ao dia após cada transfusão. O parto por via alta deve ser então executado entre 36 e 38 semanas. TRATAMENTO DO RECÉM-NASCIDO · O grupo sanguíneo e o fator Rh do RN podem ser determinados pela cordocentese ou após o parto. Confirmando ou não o diagnóstico de aloimunização durante a gravidez, o Coombs direto deve ser realizado em todos os filhos de mães Rh negativas. · O tratamento do RN gravemente acometido se baseia na exsanguinotransfusão, e nos casos mais leves é possível realizar fototerapia. · Em geral, as gestações subsequentes apresentarão uma maior gravidade da DHPN devido a uma resposta amnéstica materna pela entrada de células fetais na circulação materna no momento do parto. DHPN: PREVENÇÃO · Só é possível nas pacientes não imunizadas, pois naquelas já sensibilizadas não há medidas eficazes em diminuir a intensidade e progressão da agressão fetal. Nestes casos, a única opção terapêutica recai sobre a transfusão fetal (TIU ou exsanguinotransfusão). · Profilaxia é realizada com imunoglobulina anti-D e é mandatória para todas as pacientes Rh negativo não sensibilizadas (Coombs indireto negativo) após o parto (até 72 horas) e/ou em qualquer caso de hemorragia durante a gestação, interrupção precoce (abortamento, parto prematuro, gestação ectópica, doença trofoblástica) e procedimentos invasivos (biópsia de vilo corial, amniocentese, cordocentese). · Utiliza-se uma dose única de 300 mcg IM. · Nas pacientes não isoimunizadas, recomenda-se administrar imunoglobulina na 28ª semana de gestação.
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