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UNIDADE 3 DISCUTINDO A LEGISLAÇÃO APLICADA Já conhecemos no tópico anterior a legislação aplicada aos bancos de perfis genéticos e seu impacto jurídico, ao modificar outros dois dispositivos legais. Mas em que ela se baseia e quais os impactos práticos da mesma? Vamos nos aprofundar neste assunto. Cada vez mais, os agentes estatais se utilizam das tecnologias disponíveis para potencializar o nível de precisão e de eficácia das ferramentas de persecução penal, tendência que se verifica a nível mundial. Foi à vista disso que surgiu a iniciativa de criar os bancos de perfis genéticos — potencializar e fomentar a investigação criminal brasileira. Como visto na Unidade anterior, a Lei n° 12.654, publicada em de 28 de maio de 2012, inaugurou no ordenamento jurídico pátrio a possibilidade da coleta de perfil genético como forma de identificação criminal. Para tanto, promoveu alterações nos dispositivos então vigentes, como a Lei nº 12.037, de 1º de outubro de 2009, que trata da identificação criminal, e a Lei 7.210/1984, de 11 de julho de 1984, que institui a Lei de Execução Penal. Pautando-se nos altos índices de impunidade e crescente criminalidade brasileiros, a nova legislação estabeleceu a identificação por perfil genético como um importante instrumento para combater esse quadro nacional. A possibilidade de realização da coleta de amostra biológica para fins de obtenção do perfil genético, nos casos de identificação criminal, passou a ser uma importante ferramenta para as investigações policiais. O artigo 3º, inciso IV, da Lei 12.037/2009 prevê que, quando "a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa". Além disso, o parágrafo único do artigo 5º do mesmo diploma estipula que, na hipótese do inciso IV do http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12037.htm artigo 3º, "a identificação criminal poderá incluir a coleta de material biológico para a obtenção do perfil genético". Por outro lado, de maneira obrigatória e independente de autorização judicial, o ordenamento jurídico também trouxe importante instrumento, prevendo que os condenados por determinados crimes tenham armazenado em banco de dados sua identificação de perfil genético realizada mediante extração de DNA (ácido desoxirribonucleico), por técnica adequada e indolor, conforme previsto no artigo 9º A da Lei de Execução Penal (LEP). Nesse sentido, a aplicação das legislações relativas aos bancos de perfis genéticos mostra-se de extrema importância na elucidação de crimes ainda sem solução, auxiliando o Sistema Judiciário na revisão de condenações, na possibilidade de absolvição de inocentes e, precipuamente, na busca do uso da tecnologia para punir criminosos e fortalecer a segurança pública. A legislação determina que as informações genéticas contidas nos bancos de dados de perfis genéticos não poderão revelar traços somáticos ou comportamentais das pessoas, exceto determinação genética de gênero. Cabe ressaltar ainda que a Lei nº 12.654/2012, ao impor em seu artigo 2º que "as informações genéticas contidas nos bancos de dados de perfis genéticos não poderão revelar traços somáticos ou comportamentais das pessoas", mostra-se adequada ao quanto dispõe a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, adotada, em 2005, pela 33ª Sessão da Conferência Geral da UNESCO: Art. 9º. A privacidade dos indivíduos envolvidos e a confidencialidade de suas informações devem ser respeitadas. Com esforço máximo possível de proteção, tais informações não devem ser usadas ou reveladas para outros propósitos que não aqueles para os quais foram coletadas ou consentidas, em consonância com o direito internacional, em particular com a legislação internacional sobre direitos humanos. É notório que, adotadas as devidas cautelas no gerenciamento do Banco Nacional de Perfis Genéticos e da RIBPG, são minimizados os riscos de mau uso e erro, e os órgãos de persecução criminal ganham uma ferramenta poderosa para elucidação de fatos submetidos à investigação criminal, não somente para a obtenção de condenações, mas também para evitar condenações injustas. Visando à avaliação da qualidade e melhoria contínua dos processos de controle dos procedimentos adotados pela RIBPG, o Decreto nº 7.950/2013 previu a realização periódica de auditorias externas nos laboratórios de genética forense: Art. 9º Compete ao Ministério da Justiça e Segurança Pública auditar periodicamente o Banco Nacional de Perfis Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos para averiguar se suas atividades estão em conformidade com este Decreto, nos termos do disposto no acordo de cooperação técnica de que trata o § 3º do art. 1º, observados os requisitos técnicos previstos no inciso IV do caput do art. 5º. Parágrafo único. Participarão da auditoria especialistas vinculados a instituições científicas ou de ensino superior sem fins lucrativos. Ao prever a possibilidade de submissão da pessoa para coleta de material biológico e documentação do perfil genético, seja para fins de identificação criminal, seja para inserção em banco de dados de perfil genético, diversas vozes, na doutrina nacional, indicaram a inconstitucionalidade do diploma legal por contrariedade a preceitos da Constituição brasileira que encontram previsões assemelhadas, quando não idênticas, a enunciados constantes de Convenções e Tratados Internacionais. Vejamos alguns trechos do artigo “Investigação criminal genética – banco de perfis genéticos, fornecimento compulsório de amostra biológica e prazo de armazenamento de dados” (Rev. Bras. de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 4, n. 2, p. 809-842, mai.-ago. 2018): “A implementação efetiva do banco nacional de perfis genéticos, isoladamente, não será suficiente para aplacar essa crise, mas pode constituir um fator coadjuvante no aprimoramento da investigação de crimes graves, por meio da utilização de solução tecnológica compatível com o arcabouço jurídico que orienta a persecução penal como um todo. [...] A corrente contrária ao uso mais amplo dessa ferramenta tecnológica no enfrentamento do crime (que implica a obrigatoriedade de o investigado ou sentenciado tolerar a retirada de seu material biológico – cooperação passiva do imputado) levanta preocupações legítimas sobre os riscos de mau uso dos dados armazenados, que poderiam redundar em violações da intimidade, em especial a intimidade genética, e na estigmatização ainda maior da população carcerária e dos investigados mais pobres. [...] Quanto à compatibilidade da coleta corporal compulsória de DNA com a garantia da não autoincriminação, é certo que bons argumentos existem em ambos os sentidos, mas é necessário enriquecer essa reflexão levando-se em conta a experiência estrangeira, a palavra das cortes internacionais de direitos humanos, a tendência de funcionalização do Direito Internacional e os reclamos de efetividade do processo penal. [...] Com o avanço em escala global da criminalidade organizada e do terrorismo, o respeito aos direitos individuais na persecução criminal é desafiado constantemente pelo discurso da necessidade de se garantir a segurança da população. [...] Se, por um lado, argumenta-se que o uso da prova genética pode colocar em xeque direitos individuais – sobretudo os direitos à intimidade, à liberdade e à integridade física e a não produzir prova contra si mesmo –, por outro não se pode esquecer que a segurança pública também é um direito fundamental, de titularidade da sociedade, indispensável para a legitimação e o funcionamento do próprio Estado. [...] Assim, direitos básicos como a vida, a liberdade, a incolumidade física e a propriedade não podem ser exercidos se for constantea ameaça gerada pela falta de segurança pública. [...] Necessário, porém, considerar nessa ponderação de interesses que o banco de dados jamais cumprirá sua função social se sua alimentação depender da voluntariedade da entrega de material genético por parte dos imputados ou de buscas e apreensões para a coleta de amostras biológicas dos investigados em locais que tenham frequentado ou de objetos que tenham usado, pois a complexidade desse procedimento reduziria significativamente o número de perfis genéticos disponíveis para confronto, comprometendo a eficácia do sistema. [...] Um banco de perfis genéticos constitui um repositório de “impressões digitais do DNA” (DNA fingerprints) ou “fotografias genéticas” de indivíduos e serve para identificá-los ou individualiza-los. Possui enorme valor forense, pois, a partir das sequências de DNA armazenadas, é possível afirmar com probabilidade extremamente alta que uma amostra biológica (sangue, raiz capilar, sêmen, osso, dente, saliva, suor, pele, urina etc.) se originou de determinada pessoa. [...] Outro fator justificante da identificação por perfil genético, no caso previsto no art. 9º-A da LEP, é a constatação de que, diante dos altos índices de reincidência observados no Brasil e da gravidade dos crimes que justificam a medida de identificação, é do interesse público manter por certo período os dados genéticos do sentenciado, como forma de proteção social, tanto pela inibição de novas condutas criminosas quanto pela facilitação da sua persecução criminal. [...] Considerando a necessidade de assegurar à população o direito fundamental à segurança pública em um momento de grave crise nessa área, abrir mão de um meio investigativo que tem se mostrado eficaz em outros países somente se justificaria se a lesão ou ameaça a outros direitos fundamentais fosse desproporcionalmente significativa, o que não se verifica na situação vertente, pois, adotadas as cautelas e procedimentos técnicos devidos e instituídos mecanismos de respeito ao sigilo dos dados armazenados, a intervenção corporal e o risco à privacidade são diminutos. [...] Uma vez obtido legitimamente pelo Estado o perfil genético de alguém, tal informação poderá ser utilizada para finalidades de persecução criminal não inicialmente previstas, como por exemplo reavivar investigação arquivada por indefinição quanto à autoria delitiva, em caso de convergência entre aquele perfil genético e o constante do banco de dados, vinculado a amostra biológica colhida no local do crime cuja investigação havia sido interrompida. Após a leitura destes trechos, conclui-se que é importantíssimo que o direito interno acompanhe a evolução da sociedade, não sendo defensável que se preserve as garantias de uma época anterior. A legislação passou pela necessidade do Brasil incorporar os bancos de perfis genéticos à sua realidade, os quais tratam-se de inovação tecnológica útil ao aprimoramento da persecução penal. Igual caminho fizeram os países mais desenvolvidos, onde há um grande crescimento de tais bancos. O alto índice de impunidade e da crescente criminalidade no país também dá respaldo à identificação por perfil genético, a qual atua como um novo instrumento para combater e reverter o cenário atual no Brasil. Há um grande potencial no uso de informações e bancos de perfis genéticos como agentes de mudança na situação de impunidade no que se refere aos crimes violentos no país. Neste aspecto, a legislação vigente passou a permitir, por meio de ordem judicial, que no curso da persecução criminal seja possível a coleta de material genético, denominada identificação criminal facultativa. Entretanto, aos condenados por crimes previstos no artigo 9ºA da LEP, a coleta de material genético é obrigatória. O legislador brasileiro teve o cuidado de restringir a finalidade do banco de dados de perfil genético na esfera criminal: trata-se de banco de dados dirigido estritamente à identificação criminal. Não se admite qualquer utilização para outros fins , seja de definição comportamental ou para fins de eugenia ou de definição criminológica ou criminógena do sujeito ali identificado. Essa coleta, para fins de investigação criminal, não viola a garantia da não autoincriminação, pois o investigado não está obrigado a adotar postura ativa no sentido de fornecer a prova, nem mesmo pode ser compelido a abrir a boca para a coleta de células com suabe se não quiser cooperar. Salienta-se que os dados constantes dos bancos de perfis genéticos possuem caráter sigiloso, podendo aquele que infringi-lo responder civil, penal e administrativamente, se permitir ou promover sua utilização para fins diversos daquelas previstos legalmente ou através de decisão judicial. O legislador interno indicou, ainda, que o cotejo dos dados extraídos dos bancos de perfis genéticos dá-se apenas e tão somente por meio de perícia oficial. As informações colhidas a partir da coincidência de perfis genéticos deverão ser consignadas em laudo pericial firmado por perito oficial devidamente habilitado. Segundo Suxberger, no artigo “A funcionalização como tendência evolutiva do Direito Internacional e sua contribuição ao regime legal do banco de dados de identificação de perfil genético no Brasil” (Revista de Direito Internacional, Brasília, Vol. 12, No. 2, p. 649-665, 2015): Os dados têm caráter sigiloso, isto é, a fixação do sigilo é estipulada legalmente e funda-se — vale destacar — na conformação legal do direito constitucional à intimidade (ou à vida privada), tal como positivado no inciso X do artigo 5.º da Constituição, também na Convenção Europeia de Direitos Humanos de 1950 e na Convenção Americana de Direitos Humanos. [...] Tais cuidados — ou elementos que dificultam o acesso ao banco — protegem, salvaguardam e garantem a intimidade do particular em face da atuação persecutória do Estado. Não houvesse essa previsão legal, aí sim se poderia cogitar de malferimento do direito à intimidade, o qual, aliás, projeta-se em diversas outras garantias de igual ou maior jaez: como o sigilo bancário, o sigilo fiscal, etc. Entende-se que o direito de não produzir provas contra si mesmo pode e deve ser usado em um processo ou investigação penal, mas jamais pode servir como um “salvo-conduto” para não o identificar em caso de prática de novos delitos. Como se pode concluir, a análise de DNA acerca da investigação criminal contribui para um processo penal mais adequado e justo, inserindo a ideia da busca pela verdade real, de forma a apontar os verdadeiros culpados e impedir que pessoas inocentes sejam condenadas. OPINIÃO TÉCNICA DE MAGISTRADOS A Procuradora Geral da República de 2017 a 2019, Vossa Excelência Raquel Dodge, no PARECER nº 07/2017 – AJCR/SGJ/PGR referente ao RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 973837/MG, afirma: “ A evolução científica disponibilizou novos exames em favor da moderna investigação, sobretudo relacionadas à genética. Atualmente, é possível coletar e identificar traços de DNA e relacioná-los a determinado indivíduo a partir de vestígios colhidos da vítima ou extraídos do local do crime. A identificação da pessoa é direito estatal voltado à preservação da segurança pública. A Constituição, ao tratar sobre a identificação, estabeleceu sua compulsoriedade – coleta de impressões digitais –, tendo desautorizado a identificação criminal quando já promovida a identificação civil. É dizer: já houve o balizamento e autorização constitucional de intervenção corporal – ainda que coercitiva – para coleta de material pessoal (impressões digitais) para fins de identificação criminal mediante exame datiloscópico, a fim de resguardar a segurança pública. Há notar que a diretriz da suficiência da identificação civil deve ser interpretada à luz do contexto histórico em que editada, quando inexistentes outros instrumentos igualmente válidos para auxiliar na identificação criminal.Agora, não mais subsistindo a equivalência entre a identificação criminal e a civil, não deve se obstaculizar a coleta de dados, para fins de identificação criminal, quando a medida mostre-se necessária, ainda que determinado investigado tenha apresentado documentação válida e suficiente à sua identificação civil. O que se exige, para tal balizamento, é a fiel observância dos postulados concernentes ao exame da proporcionalidade da medida – necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito. O legislador, ao editar a Lei 12.654/2012, estabeleceu a utilização, mediante cooperação jurídica, do Sistema CODIS – Combined DNA Index System –, criado pelo FBI norte-americano e já utilizado em mais de 30 países, para auxiliar no gerenciamento dos dados ali lançados. Trouxe, ainda, dois instrumentos bastante úteis na investigação criminal: o primeiro, relativo à coleta e armazenamento de material biológico extraído da vítima ou do local do crime, assim como de investigados; o segundo, concernente à coleta de material biológico de indivíduos condenados pela prática de crimes graves ou cometidos com violência. Nesse segundo caso enquadra-se o recorrente. De início, há afastar a suposta abstração do artigo 5º–II da Constituição, uma vez tratar-se de obrigação estabelecida em lei. O recorrente invoca, ainda, que o direito de não produzir prova contra si mesmo acoberta o direito de o condenado não fornecer o material biológico determinado. Ora, a lei, malgrado estabeleça obrigação, não tratou do emprego de meios coercitivos diretos para obtenção do material. Logo, não há presumir ser possível o emprego de força, a fim de compelir o investigado ou condenado a fornecer o material biológico. Por outro lado, obtido o material genético por meio diverso não- invasivo, autorizada está sua submissão à perícia, cruzamento de informações e armazenamento do perfil genético em banco de dados. Nestes casos, a obtenção da prova dar-se-á a partir de prévia decisão judicial que avaliará, no caso concreto, a proporcionalidade da medida. Para a análise da prerrogativa contra a autoincriminação, é necessário observar que, mesmo nos casos que dependem de uma participação ativa do agente, uma vez fornecido voluntariamente o material não há falar em ofensa ao princípio da não autoincriminação. O direito não apenas reputa válida a prova assim obtida, mas a encoraja. Com efeito, o fornecimento de padrão gráfico ou vocal para perícias, por exemplo, não é viável senão mediante a sujeição do indivíduo ao quanto determina a lei. Em caso de discordância, não é possível compelir o sujeito sem que para tanto se ofendam direitos assegurados aos indivíduos, assim como as próprias condições exigidas para o exame. No caso de confrontação de perfis genéticos, certo é que a produção da prova prescinde de um comportamento ativo do sujeito, mas depende, por outro lado, de sua anuência, uma vez que o procedimento impõe uma intervenção corporal, ainda que mínima e indolor. Desautorizada a coleta, o procedimento padrão para a coleta do material não deve ser executado. Logo, não há supor ofensa à aludida prerrogativa nos casos em que o investigado atenda à determinação legal e, voluntariamente, submeta-se a exame para coleta de material genético, assim como não há afronta ao aludido princípio nos casos em que o agente abra mão do direito ao silêncio e confessa a prática de determinado crime. Relevante observar, contudo, que, no presente caso, é possível a obtenção de material genético independentemente da anuência do agente. Normatizou-se como técnica padrão para a obtenção do perfil genético o esfregaço bucal com suabe. Cuida-se de técnica pouco invasiva e indolor. A despeito de ser possível obter o material genético mediante intervenção corporal desautorizada, certo é que o legislador assim não dispôs. O Instituto Nacional de Criminalística, ao tratar do tema, esclareceu que procedimentos alternativos para coleta do perfil genético terão lugar quando o agente não concordar em fornecer o material biológico. Nesse sentido, listou três distintas possibilidades, todas sempre acompanhadas por perito, a fim de evitar a contaminação do material e documentar a cadeia de custódia: a) a utilização de material biológico coletado em eventuais exames de saúde feitos no indivíduo custodiado; b) a coleta de objetos pessoais – escovas de cabelo, copos ou talheres usados, roupas íntimas, entre outros, coletados em ambiente isolado e/ou controlado; c) a busca e apreensão mediante prévia autorização judicial de objetos pessoais – esta última hipótese de aplicação mais restrita. Certo é que, em caso de recusa, a coleta não é feita pelo método ordinário, não se compelindo o agente a fornecer o material. Nestes casos, documenta-se o fato em termo próprio e se o submete à autoridade judicial competente, que deliberará pela obtenção do material mediante um dos procedimentos alternativos existentes. Da obtenção deste material não há supor ofensa à não autoincriminação, nem, tampouco, à dignidade do indivíduo. Assim, ainda que se estenda a prerrogativa do silêncio para além do que expressamente enuncia o texto constitucional, certo é que tal direito não pode ser invocado em procedimentos em que o agente não produza ativamente prova contra si. É possível entrever, na execução dos procedimentos alternativos, alguma incursão na esfera privada do indivíduo; daí, todavia, não reponta inconstitucionalidade da lei. Em casos tais, imperioso o sopesamento dos direitos constitucionais em apreço. A lei prevê inúmeras hipóteses em que a privacidade do indivíduo cede ante a segurança: assim, por exemplo, as interceptações telefônicas, quebras de sigilos bancário, fiscal, telemático e telefônico, o procedimento de reconhecimento, entre tantos outros. Mostra-se, pois, viável a limitação legal deste direito, desde que a lei observe os reclamos da proporcionalidade e não atinja o núcleo essencial do direito. A lei atende aos reclamos da proporcionalidade: o acesso ao banco de dados deve ser precedido de autorização judicial; os perfis dirão respeito a amostras extraídas do local do crime, de investigados ou de condenados por crimes graves ou praticados com violência; não haverá registro de informações relativas a doenças ou outras características somáticas, exceto o gênero biológico; os dados serão arquivados por tempo definido, sendo competência exclusiva do Poder Público o armazenamento destes dados genéticos. As informações encaminhadas pelo INP esclareceram, ainda, que o perfil genético não pode estar associado a qualquer informação pessoal, mas apenas a um código conhecido apenas pela instituição responsável pela inserção do perfil no banco de dados. Em tudo se observa a preocupação do legislador em regulamentar de modo adequado tema tão sensível, de modo a evitar a utilização dos dados coletados para finalidade distinta daquela para o qual foi concebido, assim como para minimizar a limitação de outros direitos envolvidos, razão pela qual não se enxerga ilegítima incursão no núcleo essencial de direitos constitucionais assegurados ao indivíduo. Por outro lado, não se pode descurar que a coleta de perfil genético trará significativos avanços para as investigações, contribuindo para o esclarecimento de diversos crimes, servindo, inclusive, para exculpar investigados e até condenados pela Justiça. Nesse rumo, aliás, o trabalho existente nos Estados Unidos da América denominado Innocence Project – Projeto Inocência –, que dedica-se a coletar amostras de DNA de condenados que se declaram inocentes com o objetivo de revisar condenações criminais injustas, sobretudo as baseadas em provas dúbias ou não suficientemente conclusivas. De fato, o banco de dados garantirá ao inocente o acesso a uma prova de forte conteúdo exculpante. Não havendo duas pessoas com o mesmo perfil genético, aquele cuja presença não for confirmada na cena do crime pelaperícia não poderá ser condenado injustamente. O banco de dados criado a partir da lei em análise já permitiu, inclusive, concretamente a revisão criminal e absolvição de condenado pela prática de crime sexual, evidenciando a necessidade da medida para robustecer a convicção e o processo penal. Observa-se que a inclusão do perfil genético de condenados pela prática de crimes graves ou cometidos com violência contra a pessoa não prejudicará sua condição civil e tampouco ensejará condenação antecipada pela prática de outros delitos; donde, não há falar em ofensa ao princípio constitucional da não- culpabilidade. A coleta do perfil genético viabiliza a produção de uma prova adicional sujeita não apenas a todos os procedimentos legais estabelecidos e à demonstração do nexo causal, mas também à apreciação do Judiciário, assegurando-se, evidentemente, todos os meios e recursos legais existentes e disponíveis à defesa, caso confirmada a identidade entre determinado material coletado e eventual crime ainda sob investigação: o processo penal está sedimentado na ampla defesa e no contraditório, razão pela qual não há supor ofensa a tais postulados. Ora, a prova eventualmente produzida a partir da confrontação de perfis genéticos é plena, e deverá ser adequadamente apreciada pelo Judiciário. Portanto, a lei disponibilizou apenas mais um instrumento de investigação criminal, voltado à identificação do autor da prática de um crime, à semelhança da perícia datiloscópica e da identificação por fotografia. A restrição da coleta de dados aos indivíduos condenados por determinados crimes graves prende-se, sobretudo, ao fato de os autores de delitos desta natureza muitas vezes praticarem mais de um crime, apontando a estatística para reincidência superior a 50%. Nessa mesma direção, o índice de homicídios esclarecidos no Brasil não ultrapassa 5% dos casos, o que sugere a necessidade urgente do implemento de outros meios para a investigação, como a utilização deste importante instrumento que é a perícia de DNA. O Brasil, lamentavelmente, ocupa o 6º lugar no ranking de homicídios, e possui um dos mais baixos índices de elucidação, inferiores a 10% (e-STF fls. 295/297). Por outro lado, estudos já evidenciaram a eficiência dos bancos de perfis genéticos. Nos Estados Unidos, a taxa de coincidência é próxima a 50%, na Holanda remonta a 54% e no Reino Unido é superior a 63%. Isto é, em cada 100 casos em que se confrontam dados coletados do corpo de delito e aqueles constantes do banco de dados, 63 são prontamente identificados (e-STF fl. 219/220). Tal sistemática é sobretudo relevante em casos em que não há sequer um suspeito, permitindo a solução de crimes que, até então, compunham a cifra negra da criminalidade. No Brasil, apesar de ainda pequeno o volume de dados coletados, já se começaram a coletar os frutos da experiência. Até o dia 28 de maio de 2017, a Rede Integrada dos Bancos de Perfis Genéticos apresentou ao poder público 279 coincidências confirmadas, auxiliando 372 investigações . Estudos mencionados nas informações do Instituto Nacional de Criminalística apontaram, ainda, que o incremento de 10% na alimentação dos bancos de DNA levou à redução de 5,2% da taxa de homicídios e 5,5% da taxa de estupros, além de ressaltar, para além da eficiência do instrumento na apuração e repressão de crimes, o caráter inibitório que a existência do banco de dados acarreta, prevenindo seus cometimentos (e-STF fl. 220). A investigação criminal tem se valido, sobretudo nos tempos atuais, dos mais modernos meios de investigação, como escutas telefônicas, interceptação telemática, ações controladas, reconstituições criminais. Estes novos meios de prova têm sido acompanhados pelo Ministério Público e sempre autorizados pelo Judiciário, o que dá ao cidadão a garantia. A partir da noção de dignidade humana, da concepção de que todos os homens são iguais e determinam suas próprias ações, cabe ao Estado não só permitir o aprimoramento dos instrumentos existentes para a investigação criminal mas, também, prover os meios para tanto necessários, a fim, inclusive, de assegurar os direitos fundamentais de todos os cidadãos, entre eles, o direito à vida, à segurança, ao livre desenvolvimento da personalidade, à integridade física e moral, à liberdade de ideias e crenças, à honra, à própria imagem e a todos aqueles inerentes à própria condição de ser humano. O instrumento aqui em discussão, portanto, em vez de abstrair a dignidade humana, tem por finalidade precípua promovê-la, sem afetar o núcleo essencial de qualquer direito assegurado a investigados e condenados. Além disso, importante recordar que a lei mostra-se adequada ao quanto dispõe a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, adotada, em 2005, pela 33ª Sessão da Conferência Geral da UNESCO: Art. 9º. A privacidade dos indivíduos envolvidos e a confidencialidade de suas informações devem ser respeitadas. Com esforço máximo possível de proteção, tais informações não devem ser usadas ou reveladas para outros propósitos que não aqueles para os quais foram coletadas ou consentidas, em consonância com o direito internacional, em particular com a legislação internacional sobre direitos humanos. Assim, a coleta de perfil genético mostra-se, de fato, como reflexo da progressão científica, cuja eficiência e indiscutível relevância têm ensejado progressiva adoção nos mais diversos países do mundo. De resto, vale notar que a União Europeia editou a Resolução 193/2002, em que os Estados Europeus comprometeram-se a estabelecer uma relação de cooperação e intercâmbio de dados de DNA, com o fim de facilitar o acesso a informações e ampliar as possibilidades da investigação criminal. Ante o exposto, opino pelo desprovimento do recurso. Brasília, 18 de dezembro de 2017”. Sobre o tema, o juiz Costa Neto (2020) explica: “Inicialmente, verifico a necessidade de coleta do material genético do acusado, como medida cautelar probatória. No Brasil, a coleta de material genético de condenados a certos crimes é obrigatória. Já no caso de investigados, a coleta será obrigatória a depender de ordem judicial que a repute essencial à elucidação dos fatos. São essas as inovações da Lei n. 12.654/12. Embora a coleta de DNA não tenha sido devidamente efetivada, já há várias amostras no Banco Nacional. Nesse contexto, o Relatório do Banco Nacional de Perfis Genéticos, disponível da página do Ministério da Justiça, demonstra que muitos crimes notadamente de estupro, no DF e na Paraíba, por exemplo, só foram solucionados graças ao Banco. A constitucionalidade do Banco Nacional de Perfis Genéticos será decidida no Recurso Extraordinário (RE) 973837. Há ao menos dois importantes argumentos a favor da constitucionalidade da lei: a) a Procuradoria-Geral da República sustenta que a identificação por DNA é como a identificação por meio de impressão digital. Logo, é perfeitamente constitucional; b) a Academia de Ciências Forenses defende que a colheita de DNA é passiva e não invasiva. Logo, seria constitucional. A Lei nº 12.654/12 que criou o Banco Nacional de Perfis Genéticos impõe a coleta de DNA de condenados por crimes violentos e, desde que com autorização judicial, de investigados. Registro que a legislação aplicada a identificação pelo perfil genético não fere o direito à não autoincriminação. O exame de DNA adotado para fins forenses é realizado com a utilização do suabe (espécie de cotonete) passado suavemente na superfície interna da boca (céu da boca), procedimento indolor e que não implica nenhum risco para a saúde do fornecedor. O direito de não produzir prova contra si mesmo veda apenas: (1) que o acusado seja obrigado a colaborar, por meio de comportamentos ativos, à produção de provas; e (2) meios de extração de prova invasivos. Não se pode exigir, por exemplo, que o réu participe da reconstituição do crime, porque isso exigiria uma colaboraçãoativa do acusado contra seus próprios interesses. Também não se pode extrair sangue do acusado coercitivamente, já que a extração é considerada invasiva e diz respeito diretamente à integridade corporal do acusado. Mas nada impede que o acusado seja obrigado a participar de um reconhecimento de pessoas. Sempre se entendeu na jurisprudência que o acusado pode ser coercitivamente enfileirado junto de outras pessoas para que a vítima ou uma testemunha possa indicar se, dentre os presentes, está aquele que teria cometido o crime. Isso porque o reconhecimento é meramente passivo. O mesmo ocorre na coleta de DNA. Nesse contexto, também se pode obrigar o acusado a permitir que um cotonete seja levemente passado no céu da sua boca. É só isso que o suabe bucal envolve: passar um cotonete no céu da boca de uma pessoa. Diferentemente da extração de sangue, o cotonete não penetra no corpo do acusado. A coleta de provas é totalmente superficial. Com efeito, não se trata de meio invasivo. Em suma: a extração de DNA pelo chamado suabe bucal não é nem invasiva, nem demanda comportamento ativo do acusado. Logo, não fere o direito a não autoincriminação. No caso do condenado, a coleta do material genético configura verdadeiro efeito extrapenal genérico da condenação. Se o Estado pode tomar a liberdade e a propriedade do condenado por crime, se pode impedi-lo de dirigir ou de exercer sua profissão, então é certo que o Estado também pode obrigar o condenado a fornecer material genético, em nome de interesses coletivos cogentes. Mas e no caso do investigado? A colheita seria constitucional? Afinal, o investigado, diferentemente do condenado, não pode ser tratado como culpado. Trata-se de decorrência da própria regra de tratamento inerente à presunção de inocência. No caso do investigado, a colheita do material genético que se submete à reserva de jurisdição (o Richtervorbehalt do direito alemão) é uma verdadeira medida cautelar probatória. Se o Juiz, após pedido do MP, pode determinar a apreensão de escritos do acusado para realizar futuro exame grafotécnico, também pode determinar, de maneira circunstanciada e com base na gravidade concreta do crime, que seja recolhido o material genético do acusado seja na investigação, seja no processo penal. No Brasil, aquele que ainda não foi condenado só poderá ter o material genético recolhido se o Juiz, em decisão adequadamente fundamentada, entender que esse material é importante para a investigação ou para o processo penal em curso. Não se trata de recolher material genético indiscriminadamente. A reserva de jurisdição oferece uma garantia ao réu, que poderá, inclusive, impugnar a decisão nas instâncias superiores, se o Juiz agir de forma arbitrária. Esse raciocínio é totalmente compatível com a Constituição Federal. A CF/88 estabelece em seu art. 5º, LVIII, que o “ (...) civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei. Já o art. 3º, IV, da Lei 12.037/09 (Lei de Identificação Criminal) permite a identificação criminal, ainda que apresentado documento de identificação, quando a (...) identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa . A coleta de material genético não viola, portanto, a CF/88. Consigno que, no exterior, as democracias civilizadas têm entendido pela admissibilidade do DNA. É o caso, por exemplo, dos EUA, merecendo menção o caso Maryland v. King, 569 U.S. 435 (2013), julgado pela Suprema Corte norte americana. O STF já decidiu várias vezes, inspirado no Tribunal Constitucional Federal alemão, que a máxima da proporcionalidade inclui o princípio da proibição da proteção insuficiente (Untermaßverbot). Isso significa que cabe ao Estado desincumbir-se do seu dever de proteção (Schutzpflicht). O dever de proteger a população obriga o Estado a instituir mandamentos de criminalização; a combater o crime; e a efetivar todos os meios ao seu alcance que permitam o esclarecimento de infrações penais, a exoneração de inocentes acusados de maneira injusta, e também a condenação dos culpados. A Lei 12.654/2012 não é apenas constitucional. Ela é uma exigência da própria Constituição. O Estado tem o dever de usar a tecnologia para exonerar os injustamente acusados, para proteger os direitos fundamentais das vítimas e para punir os criminosos” COSTA NETO (2020) ressalta ainda: “O artigo 9ºA da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) obriga a coleta do DNA para todos os condenados por determinados crimes, não se tratando, portanto, de uma opção para o magistrado. O mesmo ocorre quando presentes os requisitos de concessão da cautelar probatória no caso de investigados. A lei diz expressamente, inclusive no caso de investigados, que a medida pode e deve ser concedida de ofício pelo juiz, quando preenchidos os requisitos. A decisão do TJSP foi tomada por 2 votos a 1, tendo o voto divergente defendido em todos os seus termos a decisão do magistrado de primeiro grau. A Defensoria Pública tem contestado esse trecho da Lei, inclusive com ação no Supremo Tribunal Federal. No entanto, no momento, a lei permanece vigente e goza de presunção de constitucionalidade. O STF nunca suspendeu os efeitos da lei, o que poderia ter feito. Cabe lembrar ainda que a coleta do DNA é um procedimento passivo e não invasivo. É semelhante a outros processos de identificação, como o da coleta de impressões digitais, em que não se considera que o condenado é obrigado a produzir provas contra si. Não há desrespeito à Constituição Federal. O DNA é uma ferramenta que tem ajudado a Justiça a solucionar casos pendentes, no sentido de encontrar culpados, mas também de provar a inocência dos injustamente acusados. O famoso caso Israel, por exemplo, permitiu a exoneração de um homem injustamente condenado por um estupro que nunca cometeu. Todavia, Israel passou anos preso. Se o DNA já fosse uma realidade no Brasil, como é em democracias consolidadas, a história teria sido outra.” A IMPORTÂNCIA DA RIBPG PARA A SEGURANÇA PÚBLICA Atualmente, os Bancos de Perfis Genéticos têm uma importância muito grande para a Segurança Pública por ser mais uma ferramenta de investigação e de coibição da reincidência criminal. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021 apresentou as estatísticas criminais por unidade da federação para os anos de 2019 e 2020. Segundo os dados disponíveis, durante o ano de 2020 ocorreram no Brasil: TIPO DO CRIME QUANTIDADE Homicídio doloso 42.105 Lesão corporal seguida de morte 627 Latrocínio 1.428 Estupros 12.246 Estupros de vulnerável 39.070 Tabela – Quantidade de ocorrências criminais relacionadas a mortes intencionais e estupros em 2020 no Brasil segundo Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021. O número de mais de 44 mil ocorrências/ano de mortes intencionais e mais de 51 mil ocorrências/ano de estupros durante o ano de 2020 impressiona e lança um grande desafio para a segurança pública nacional. Com relação aos estupros ainda se salienta que trata-se de um dos tipos criminais mais subnotificados por uma questão cultural e pelas dificuldades que a vítima encontra, o que se reflete na possibilidade destes quantitativos serem ainda maiores e a situação mais alarmante. Portanto, existem no Brasil muitos crimes cuja resolução pode ser auxiliada pelas técnicas de investigação criminal e pela produção de prova técnico-científica. Ressalta-se que estes mesmos tipos criminais violentos (homicídios e estupros) costumam deixar materiais biológicos como vestígios, que podem ser laboratorialmente analisados e gerar perfis genéticos, abastecendo bancos de dados e possibilitando sua comparação com materiais de referência previamente cadastrados. Outro ponto a ser analisado é a situaçãoda reincidência no Brasil. Sobre este tema, em anos anteriores, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) celebrou acordo de cooperação técnica com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para que fosse realizada uma pesquisa sobre reincidência criminal no Brasil. O termo previu um trabalho capaz de apresentar um panorama da reincidência criminal com base em dados coletados em alguns estados do país. O estudo considerou apenas o conceito de reincidência legal, ou seja, conforme os artigos 63 e 64 do Código Penal, só reincide aquele que volta a ser condenado no prazo de cinco anos após cumprimento da pena anterior. A pesquisa revelou que a cada quatro ex-condenados, um volta a ser condenado por algum crime no prazo de cinco anos, uma taxa de 24,4%. O resultado foi obtido pela análise amostral de 817 processos em cinco unidades da federação (Alagoas, Minas Gerais, Pernambuco, Paraná e Rio de Janeiro) de onde se constatou 199 reincidências criminais. Um dos fatores que retroalimenta a reincidência é a sensação de impunidade presente no país. Neste ponto, os bancos de dados de perfis genéticos são uma extraordinária ferramenta de investigação e coibição da impunidade, tendo em vista que criminosos condenados por crimes de grave violência contra a pessoa (além de investigados com autorização judicial) terão seus perfis genéticos armazenados nos bancos de dados e, em caso de reincidência, serão identificados prontamente. O Brasil tem uma demanda muito grande em relação à segurança pública, sendo hoje uma das principais preocupações dos cidadãos brasileiros. Atualmente, os bancos de dados de perfis genéticos são um excelente meio de prova e, juntamente com outros vestígios e análises investigatórias, pode auxiliar a justiça na elucidação de crimes. A economista norte-americana Jennifer Doleac (2016) realizou um estudo sobre os efeitos dos bancos de dados de DNA na investigação criminal e identificou que tal ferramenta possui um grande potencial na Segurança Pública. Segundo sua pesquisa, nos Estados Unidos um incremento de 10% no banco de dados de perfis genéticos leva a uma redução de 5.2% nos homicídios e 5.5% nos estupros. Ao analisar os valores, em 2016, para a alimentação das bases de dados de perfis genéticos e outros meios, a autora concluiu que o custo para evitar um crime violento e de natureza grave nos Estados Unidos é de 26 mil dólares americanos se optar pelo aumento do policiamento, mais de 7 mil dólares americanos se escolher pelo aumento de penas e apenas 600 dólares americanos caso a opção seja pela alimentação dos bancos de perfis genéticos. E, por fim, tal estudo também afirma que há um efeito dissuasor, ou seja, de diminuição de reincidência criminal e de aumento da taxa de detecção do reincidente. Assim sendo, quando há reincidência, também há uma maior probabilidade de identificar esse reincidente, porque os seus dados já estão disponíveis para um potencial confronto. Ressalta-se que as coincidências entre perfis de diferentes locais de crime permitem a identificação de crimes em série e permitem que diferentes equipes de investigação compartilhem informações em busca da autoria. Por outro lado, as coincidências entre vestígios e perfis de indivíduos cadastrados criminalmente podem auxiliar as equipes de investigação na identificação dos autores dos delitos, trazendo rápida resposta à Sociedade Brasileira. CONCLUSÃO Terminamos aqui a terceira unidade. Esta unidade possui material complementar referente a legislação pertinente ao tema. Vamos para a próxima unidade!? Até lá! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COSTA NETO, J. R. VOTO nº 990 - HABEAS CORPUS nº 2057654-47.2019.8.26.0000 - TJSP. Disponível em https://www.conjur.com.br/dl/hc2057654-4720198260000- perfil-genetico.pdf FBSP, FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2021. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp- content/uploads/2021/07/anuario-2021-completo-v6-bx.pdf DODGE, R. E. F. Parecer nº 07/2017 – AJCR/SGJ/PGR. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=313604115&ext=.pd f IPEA. Reincidência Criminal no Brasil – Relatório de Pesquisa. 2015. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/70/reincidencia-criminal-no-brasil DOLEAC, J. The Effects od DNA Databases on Crime. http://jenniferdoleac.com/wp- content/uploads/2015/03/Doleac_DNA_databases.pdf MINERVINO, A; SILVA JR., R. C.; MALTA, A. A.; BECKER, C. M. S.; MALAGHINI, M. Projeto de Coleta de Amostra de Condenados: Incremento do Auxílio a Investigações e a Justiça. Revista Brasileira de Ciências Policiais, v.11, n.3, 2020. RIBPG. MANUAL DE PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS DA RIBPG (VERSÃO 4). Brasília : Resolução nº 14. 2019. Disponível em: https://www.justica.gov.br/sua- seguranca/seguranca-publica/ribpg RIBPG. Resolução nº 10 - Procedimentos para a Coleta de Material Biológico de que trata a Lei nº 12.654/2012. 2019. Disponível em: https://www.justica.gov.br/sua- seguranca/seguranca-publica/ribpg/resolucoes SINESP. Dados Nacionais de Segurança Pública. Disponível em: https://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica https://www.conjur.com.br/dl/hc2057654-4720198260000-perfil-genetico.pdf https://www.conjur.com.br/dl/hc2057654-4720198260000-perfil-genetico.pdf http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=313604115&ext=.pdf http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=313604115&ext=.pdf https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/artigo/70/reincidencia-criminal-no-brasil https://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/ribpg/resolucoes https://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/ribpg/resolucoes https://www.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica