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Extradição executória e soberania estatal A omissão de declarações ao fisco espanhol, objetivando a supressão de tributos, corresponde ao crime de sonegação fiscal tipificado no art. 1o, I, da Lei 8.137/1990, a satisfazer a exigência da dupla incriminação, que prescinde da absoluta identidade entre os tipos penais. A impossibilidade da conversão da pena de multa em prisão em decorrência de seu descumprimento é questão não afeta à jurisdição brasileira, sob pena de afronta à soberania do Estado na regulação de seus institutos penais. Com base nessa orientação, a Primeira Turma, por maioria, deferiu pedido de extradição formulado pelo Governo da Espanha. Na espécie, tratava-se de pleito de extradição executória para que o extraditando cumprisse o restante da pena, que fora acrescida de cinco meses em razão do inadimplemento da pena de multa. A Turma esclareceu não se tratar de dívida, porém, de pena acessória a uma pena criminal, com característica de sanção penal. Destacou que o Estado requerente deverá firmar o compromisso de descontar da pena o tempo de prisão do extraditando no território brasileiro para fins de extradição. Assinalou que a ausência de legislação a respeito da competência do Estado requerente para o processo e o julgamento não teria relevância em face do princípio da territorialidade, aplicável em se tratando de prática delituosa contra o seu fisco. A alegada prescrição da pretensão punitiva seria impertinente, porquanto se trataria de sentença penal transitada em julgado, vale dizer, de questão afeta à prescrição da pretensão executória. A inexistência de comprovação dos marcos interruptivos do curso prescricional não impossibilitaria verificar a inocorrência da causa extintiva da pena, mercê de o art. 133 do Código Penal espanhol dispor que o prazo prescricional da pretensão executória começaria a fluir do trânsito em julgado da sentença (2.2.2011), ou seja, entre o marco inicial e a presente data não teria transcorrido o lapso prescricional de cinco anos previsto na legislação espanhola. De igual forma, não estaria configurada a prescrição segundo a lei brasileira, que prevê o prazo prescricional de oito anos para a pena superior a dois anos e não excedente a quatro anos. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que concluía não ser possível a entrega do extraditando. Lembrava que o Brasil subscrevera o Pacto de São José da Costa Rica e, com isso, fora revogada a prisão por dívida civil. Aduzia que não se coadunaria com nosso ordenamento jurídico a transformação de uma dívida em pena privativa de liberdade. Frisava que, em face do princípio da simetria, se o crime tivesse ocorrido no Brasil, os cinco meses que teriam sido acrescidos em razão do inadimplemento da pena de multa resultantes da transformação não seriam cumpridos. Ext 1375/DF, rel. Min. Luiz Fux, 25.8.2015. (Ext-1375) (Informativo 796, 1a Turma) Extradição e falsidade de registro civil de nascimento A Segunda Turma deferiu pedido de extradição instrutória, formulado pelo Governo do Paraguai em desfavor de seu nacional, para o processamento de ação penal instaurada naquele país em razão de sua suposta participação em dois crimes de homicídio doloso. A defesa sustentava a condição de brasileiro nato do extraditando, sendo falso seu registro civil no Paraguai, o que impediria o deferimento da extradição. A Turma afirmou que o pedido de extradição fora devidamente instruído pelo Estado requerente, observando- se todos os requisitos legais. Assim, foram apresentadas cópias da ordem de prisão expedida pela autoridade judiciária competente e dos demais documentos exigidos, havendo indicações seguras e precisas sobre o local, a data, a natureza, as circunstâncias e a qualificação legal dos fatos delituosos. Ademais, estariam configuradas, na espécie, a dupla tipicidade e a dupla punibilidade, na medida em que os fatos delituosos imputados ao extraditando corresponderiam, no Brasil, ao crime de homicídio qualificado, previsto no art. 121, § 2o, IV, do CP, e não teria ocorrido a prescrição da pretensão punitiva, consoante os textos legais apresentados pelo Estado requerente e a legislação penal brasileira (CP, art. 109, I). Relativamente à suposta condição de brasileiro nato do extraditando, o Colegiado asseverou ser incontroverso o fato de o extraditando ter dois assentos de nascimento, o primeiro lavrado no Paraguai, e o segundo, no Brasil, dez anos depois. Como os dois registros apontariam que o extraditando nascera, na mesma data, em ambos os países, a impossibilidade lógica e material de sua coexistência seria manifesta. Outrossim, nos termos do art. 1.604 do CC, “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro”. Na espécie, juízo de primeira instância, em ação anulatória de registro civil ajuizada pelo Ministério Público estadual, deferira pleito de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional e cancelara o assento de nascimento do extraditando no Brasil. Assim, estando judicialmente afastada a presunção “juris tantum” de veracidade do registro brasileiro, por decisão que, não obstante provisória, continuaria a projetar seus efeitos, não haveria óbice à análise do mérito do pedido de extradição. Nesse particular, embora o pleito extradicional não fosse a sede própria para a determinação da real nacionalidade do extraditando, inúmeros elementos de prova constantes dos autos reforçariam a convicção de que ele seria natural do Paraguai, lá gozando da condição de paraguaio nato. Nesse sentido, esses elementos corroborariam a decisão de 1o grau que cancelara o seu registro civil brasileiro. Ante o consignado, não seria aplicável ao caso em comento o art. 5o, LI, da CF, que veda a extradição do brasileiro nato. Ext 1393/DF, rel. Min. Dias Toffoli, 25.8.2015. (Ext-1393) (Informativo 796, 2a Turma) Extradição e dupla tipicidade - 3 Em conclusão de julgamento, a Segunda Turma, por maioria, indeferiu pedido de extradição instrutória, formulado pelo Governo da Suécia em desfavor de seu nacional, para o processamento de ação penal instaurada em razão da suposta prática do crime de “conduta arbitrária com menor” (Código Penal sueco, art. 7o, § 4o). No caso, o extraditando, que deteria guarda compartilhada de sua filha — a qual residiria permanentemente com ele — viajara com ela para o Brasil. Posteriormente, a justiça sueca proferira decisão no sentido de transferir a guarda da menor unicamente para a mãe. Entre outras alegações, a defesa sustentava que: a) o fato imputado ao extraditando seria atípico e não encontraria correspondência na legislação penal brasileira, carecendo da dupla tipicidade, a atrair a incidência do art. 77, II, da Lei 6.815/1980; e b) seria necessário aguardar o deslinde de ação de busca, apreensão e restituição da menor, em trâmite perante a Justiça Federal, para perquirir eventual tipicidade penal da conduta do extraditando — v. Informativo 784. O Colegiado afirmou que o crime em análise teria se consumado, de acordo com a lei sueca, no momento em que o extraditando deixara a Suécia, com a sua filha, aparentemente sem o consentimento da mãe. Porém, a legislação brasileira trataria o fato de forma diferente. O pai até poderia ser autor do crime de subtração de incapazes, mas apenas se destituído ou temporariamente privado do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda, nos termos art. 249, § 1o, do CP. Portanto, não se constataria, no caso, a dupla tipicidade, na medida em que o pai, no momento da viagem, teria a guarda da menor. Somente quando a criança já estava no Brasil, movera-se ação judicial perante a Corte sueca, o que levara à cassação da guarda pelo extraditando. Se crime houvesse, de acordo com o direito brasileiro, residiria na negativa de restituição da menor pelo extraditando após a perda da guarda. O Ministro Celso de Mello salientou que a questão da subtração de menores incapazes teria, no plano penal, dois tratamentoslegais distintos, fundados no art. 249 do CP e no art. 237 do ECA. Afirmou que, em razão de o extraditando ter ingressado em território brasileiro, sob a égide de autorização judicial, na qual estabelecida a guarda compartilhada da menor, tornar-se-ia inaplicável ao caso o disposto no art. 249 do CP, considerada a restrição expressamente fixada em seu § 1o. Sob a perspectiva do art. 237 do ECA, que exigiria requisito específico para sua caracterização — a subtração para a colocação em lar substituto —, entendeu que a conduta material praticada pelo extraditando, possuidor, à luz do Código Civil, de legitimidade para exercer todos os poderes jurídicos inerentes à guarda sobre a criança, seria diversa daquela descrita no referido tipo penal. Não estaria devidamente caracterizada, portanto, a subtração a que alude a legislação penal brasileira, quer na descrição típica constante do art. 249 do CP, quer na descrição formulada pelo art. 237 do ECA. Ademais, eventual delito cometido pelo extraditando, após a transferência da guarda da menor para sua mãe, estaria sujeito à competência penal do Estado brasileiro, aplicando-se o princípio da territorialidade, que se acha consagrado expressamente no art. 5o do CP. Concluiu ser aplicável à espécie a restrição fundada no art. 77, II, do Estatuto do Estrangeiro, devendo, dessa forma, ser indeferido o pedido de extradição. Vencido, no ponto, o Ministro Teori Zavascki (relator), que deferia o pedido extradicional. O Colegiado ressaltou, por fim, que a ação de busca, apreensão e restituição da menor movida pela União, com base na Convenção sobre Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças – Convenção de Haia, visando ao retorno à Suécia e entrega da menor à genitora, não estaria prejudicada. Ext 1354/DF, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 30.6.2015. (Ext- 1354) (Informativo 792, 2a Turma) Extradição e prescrição da pretensão punitiva Por não atendido o requisito da dupla punibilidade, a Segunda Turma indeferiu pedido de extradição formulado pelo Governo da Itália. Na espécie, o estrangeiro fora condenado pela justiça italiana por crimes de falência fraudulenta. Embora presente o requisito da dupla tipicidade, os delitos teriam sido praticados sob a vigência do Decreto-Lei 7.661/1945 (Lei de Falências). A referida norma previa o prazo prescricional de dois anos para os crimes em comento, tempo esse já transcorrido. A Turma reputou extinta a pretensão executória da pena nos termos da legislação vigente no Brasil, à época dos fatos. Ext 1324/DF, rel. Min. Dias Toffoli, 7.4.2015. (Ext-1324) (Informativo 780, 2a Turma) “Em conclusão, a Segunda Turma concedeu a ordem para afastar o óbice da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito a estrangeiro não residente no país. (...) Consignou, de início, que o fato de o estrangeiro não possuir domicílio no território brasileiro não afastaria, por si só, o benefício da substituição da pena. (...) Não se trataria, pois, de critério que valorizasse a residência como elemento normativo em si mesmo. Assentou que a interpretação do art. 5o, caput, da CF não deveria ser literal, porque, de outra forma, os estrangeiros não residentes estariam alijados da titularidade de todos os direitos fundamentais. Ressaltou a existência de direitos assegurados a todos, independentemente da nacionalidade do indivíduo, porquanto considerados emanações necessárias do princípio da dignidade da pessoa humana. (...) Nesse ponto, concluiu que o fato de o paciente não possuir domicílio no Brasil não legitimaria a adoção de tratamento distintivo e superou essa objeção.” (HC 94.477, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 6-9-2011, Segunda Turma, Informativo 639.) Vide: HC 94.016, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 16-9-2008, Segunda Turma, DJE de 27-2-2009. “Deveras, antes de deliberar sobre a existência de poderes discricionários do presidente da República em matéria de extradição, ou mesmo se essa autoridade se manteve nos lindes da decisão proferida pelo Colegiado anteriormente, é necessário definir se o ato do chefe de Estado é sindicável pelo Judiciário, em abstrato. (...) O sistema ‘belga’ ou ‘da contenciosidade limitada’, adotado pelo Brasil, investe o STF na categoria de órgão juridicamente existente apenas no âmbito do direito interno, devendo, portanto, adstringir-se a examinar a legalidade da extradição; é dizer, seus aspectos formais, nos termos do art. 83 da Lei 6.815/1980 (...). O presidente da República, no sistema vigente, resta vinculado à decisão do STF apenas quando reconhecida alguma irregularidade no processo extradicional, de modo a impedir a remessa do extraditando ao arrepio do ordenamento jurídico, nunca, contudo, para determinar semelhante remessa, porquanto, o Poder Judiciário deve ser o último guardião dos direitos fundamentais de um indivíduo, seja ele nacional ou estrangeiro, mas não dos interesses políticos de Estados alienígenas, os quais devem entabular entendimentos com o chefe de Estado, vedada a pretensão de impor sua vontade através dos tribunais internos. (...) O princípio da separação dos Poderes (art. 2o da CRFB), indica não competir ao STF rever o mérito de decisão do presidente da República, enquanto no exercício da soberania do país, tendo em vista que o texto constitucional conferiu ao chefe supremo da Nação a função de representação externa do país. (...) A extradição não é ato de nenhum Poder do Estado, mas da República Federativa do Brasil, pessoa jurídica de direito público externo, representada na pessoa de seu chefe de Estado, o presidente da República. A reclamação por descumprimento de decisão ou por usurpação de poder, no caso de extradição, deve considerar que a Constituição de 1988 estabelece que a soberania deve ser exercida, em âmbito interno, pelos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e, no plano internacional, pelo chefe de Estado, por isso que é insindicável o poder exercido pelo presidente da República e, consequentemente, incabível a reclamação, porquanto juridicamente impossível submeter o ato presidencial à apreciação do Pretório Excelso.” (Rcl 11.243, Rel. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 8-6-2011, Plenário, DJE de 5-10-2011.) “Crime de tráfico de entorpecentes praticado por estrangeiro. Aplicabilidade da Lei 6.815/ 1980. Estatuto do Estrangeiro. Súdito colombiano. Expulsão do território nacional. Medida político-administrativa de proteção à ordem pública e ao interesse social. Competência exclusiva do presidente da República. Ato discricionário. Análise, pelo Poder Judiciário, da conveniência e da oportunidade do ato. Impossibilidade. Controle jurisdicional circunscrito ao exame da legitimidade jurídica do ato expulsório. Inocorrência de causas de inexpulsabilidade. Art. 75, II, da Lei 6.815/1980. Inexistência de direito público subjetivo à permanência no Brasil. Plena regularidade formal do procedimento administrativo instaurado. Pedido indeferido. A expulsão de estrangeiros – que constitui manifestação da soberania do Estado brasileiro – qualifica-se como típica medida de caráter político-administrativo, da competência exclusiva do presidente da República, a quem incumbe avaliar, discricionariamente, a conveniência, a necessidade, a utilidade e a oportunidade de sua efetivação. Doutrina. Precedentes. O julgamento da nocividade da permanência do súdito estrangeiro em território nacional inclui-se na esfera de exclusiva atribuição do chefe do Poder Executivo da União. Doutrina. Precedentes. O poder de ordenar a expulsão de estrangeiros sofre, no entanto, limitações de ordem jurídica consubstanciadas nas condições de inexpulsabilidade previstas no Estatuto do Estrangeiro (art. 75, II, a e b). O controle jurisdicional do ato de expulsão não incide, sob pena de ofensa ao princípio da separação de poderes, sobre o juízo de valor emitido pelo chefe do Poder Executivo da União. A tutela judicialcircunscreve-se, nesse contexto, apenas aos aspectos de legitimidade jurídica concernentes ao ato expulsório. Precedentes. (...) Para efeito de incidência da causa de inexpulsabilidade referida no art. 75, II, b, da Lei 6.815/1980, mostra-se imprescindível, no que concerne à pessoa do filho brasileiro, a cumulativa satisfação dos dois requisitos fixados pelo Estatuto do Estrangeiro: (a) guarda paterna e (b) dependência econômica. Precedentes.” (HC 72.851, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 25-10-1995, Plenário, DJE de 28-11- 2008.) No mesmo sentido: HC 85.203, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 6-8-2009, Plenário, DJE de 16-12-2010; HC 82.893, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 17-12- 2004, Plenário, DJ de 8-4-2005. Vide: HC 101.269, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 3-8-2010, Primeira Turma, DJE de 20-8-2010. “Privilégios diplomáticos não podem ser invocados, em processos trabalhistas, para coonestar o enriquecimento sem causa de Estados estrangeiros, em inaceitável detrimento de trabalhadores residentes em território brasileiro, sob pena de essa prática consagrar censurável desvio ético-jurídico, incompatível com o princípio da boa-fé e inconciliável com os grandes postulados do direito internacional. O privilégio resultante da imunidade de execução não inibe a Justiça brasileira de exercer jurisdição nos processos de conhecimento instaurados contra Estados estrangeiros.” (RE 222.368-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 30-4-2002, Segunda Turma, DJ de 14-2-2003.) “Não há incompatibilidade absoluta entre o instituto do asilo político e o da extradição passiva, na exata medida em que o STF não está vinculado ao juízo formulado pelo Poder Executivo na concessão administrativa daquele benefício regido pelo direito das gentes. Disso decorre que a condição jurídica de asilado político não suprime, só por si, a possibilidade de o Estado brasileiro conceder, presentes e satisfeitas as condições constitucionais e legais que a autorizam, a extradição que lhe haja sido requerida. O estrangeiro asilado no Brasil só não será passível de extradição quando o fato ensejador do pedido assumir a qualificação de crime político ou de opinião ou as circunstâncias subjacentes à ação do Estado requerente demonstrarem a configuração de inaceitável extradição política disfarçada.” (Ext 524, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 31-10-1989, Plenário, DJ de 8-3-1991.) “O súdito estrangeiro, mesmo aquele sem domicílio no Brasil, tem direito a todas as prerrogativas básicas que lhe assegurem a preservação do status libertatis e a observância, pelo Poder Público, da cláusula constitucional do due process. O súdito estrangeiro, mesmo o não domiciliado no Brasil, tem plena legitimidade para impetrar o remédio constitucional do habeas corpus, em ordem a tornar efetivo, nas hipóteses de persecução penal, o direito subjetivo, de que também é titular, à observância e ao integral respeito, por parte do Estado, das prerrogativas que compõem e dão significado à cláusula do devido processo legal. A condição jurídica de não nacional do Brasil e a circunstância de o réu estrangeiro não possuir domicílio em nosso País não legitimam a adoção, contra tal acusado, de qualquer tratamento arbitrário ou discriminatório. Precedentes. Impõe-se, ao Judiciário, o dever de assegurar, mesmo ao réu estrangeiro sem domicílio no Brasil, os direitos básicos que resultam do postulado do devido processo legal, notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante o juiz natural e à garantia de imparcialidade do magistrado processante.” (HC 94.016, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 16-9-2008, Segunda Turma, DJE de 27-2-2009.) No mesmo sentido: HC 102.041, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 20-4-2010, Segunda Turma, DJE de 20-8-2010; HC 94.404, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 18-11-2008, Segunda Turma, DJE de 18-6-2010. Vide: HC 94.477, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 6-9- 2011, Segunda Turma, Informativo 639; HC 72.391-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 8-3-1995, Plenário, DJ de 17-3-1995. “O brasileiro nato, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode ser extraditado, pelo Brasil, a pedido de governo estrangeiro, pois a CR, em cláusula que não comporta exceção, impede, em caráter absoluto, a efetivação da entrega extradicional daquele que é titular, seja pelo critério do jus soli, seja pelo critério do jus sanguinis, de nacionalidade brasileira primária ou originária. Esse privilégio constitucional, que beneficia, sem exceção, o brasileiro nato (CF, art. 5o, LI), não se descaracteriza pelo fato de o Estado estrangeiro, por lei própria, haver-lhe reconhecido a condição de titular de nacionalidade originária pertinente a esse mesmo Estado (CF, art. 12, § 4o, II, a). Se a extradição não puder ser concedida, por inadmissível, em face de a pessoa reclamada ostentar a condição de brasileira nata, legitimar- -se-á a possibilidade de o Estado brasileiro, mediante aplicação extraterritorial de sua própria lei penal (...) – e considerando, ainda, o que dispõe o Tratado de Extradição Brasil-Portugal (...) –, fazer instaurar, perante órgão judiciário nacional competente (...), a concernente persecutio criminis, em ordem a impedir, por razões de caráter ético-jurídico, que práticas delituosas, supostamente cometidas, no exterior, por brasileiros (natos ou naturalizados), fiquem impunes.” (HC 83.113-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 26-6-2003, Plenário, DJ de 29-8-2003.) No mesmo sentido: Ext 916, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 19-5-2005, Plenário, DJ de 21-10-2005. “Extradição passiva e brasileiro naturalizado. Possibilidade excepcional. Tráfico ilícito de entorpecentes. Necessidades, em tal hipótese, de que se demonstre ‘comprovado envolvimento’ do brasileiro naturalizado (CF, art. 5o, LI). Exceção constitucional ao modelo de contenciosidade limitada. Inaplicabilidade dessa regra da CR ao súdito estrangeiro, embora o coautor do mesmo fato delituoso ostente a condição de brasileiro naturalizado. O brasileiro naturalizado, em tema de extradição passiva, dispõe de proteção constitucional mais intensa que aquela outorgada aos súditos estrangeiros em geral, pois somente pode ser extraditado pelo Governo do Brasil em duas hipóteses excepcionais: (a) crimes comuns cometidos antes da naturalização e (b) tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins praticado em qualquer momento, antes ou depois de obtida a naturalização (CF, art. 5o, LI). Tratando-se de extradição requerida contra brasileiro naturalizado, fundada em suposta prática de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, impõe-se, ao Estado requerente, a comprovação do envolvi- mento da pessoa reclamada no cometimento de referido evento delituoso. A inovação jurídica introduzida pela norma inscrita no art. 5o, LI, in fine, da Constituição – além de representar, em favor do brasileiro naturalizado, clara derrogação do sistema de contenciosidade limitada – instituiu procedimento, a ser disciplinado em lei, destinado a ensejar cognição judicial mais abrangente do conteúdo da acusação (ou da condenação) penal estrangeira, em ordem a permitir, embora excepcionalmente, ao STF, na ação de extradição passiva, o exame do próprio mérito da persecutio criminis instaurada perante autoridades do Estado requerente. Precedentes: Ext 688/República Italiana, Rel. Min. Celso de Mello – Ext 934/República Oriental do Uruguai, Rel. Min. Eros Grau – Ext 1.074/República Federal da Alemanha, Rel. Min. Celso de Mello, v.g. Não se aplica, contudo, ao súdito estrangeiro, em sede extradicional, essa mesma regra constitucional de tratamento mais favorável (CF, art. 5o, LI), não obstante o coautor do fato delituoso ostente a condição de brasileiro naturalizado.” (Ext 1.082, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 19-6-2008, Plenário, DJE de 8-8-2008.)No mesmo sentido: Art. 5o, LI e LII Ext 1.121, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 18- 12-2009, Plenário, DJE de 25-6-2010; Ext 688, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 9- 10-1996, Plenário, DJ de 22-8-1997. “Ao princípio geral de inextraditabilidade do brasileiro, incluído o naturalizado, a Constituição admitiu, no art. 5o, LI, duas exceções: a primeira, de eficácia plena e aplicabilidade imediata, se a naturalização é posterior ao crime comum pelo qual procurado; a segunda, no caso de naturalização anterior ao fato, se cuida de tráfico de entorpecentes: aí, porém, admitida, não como a de qualquer estrangeiro, mas, sim, ‘na forma da lei’, e por ‘comprovado envolvimento’ no crime: a essas exigências de caráter excepcional não basta a concorrência dos requisitos formais de toda extradição, quais sejam, a dúplice incriminação do fato imputado e o juízo estrangeiro sobre a seriedade da suspeita. No ‘sistema belga’, a que se filia o da lei brasileira, os limites estreitos do processo extradicional traduzem disciplina adequada somente ao controle limitado do pedido de extradição, no qual se tomam como assentes os fatos, tal como resultem das peças produzidas pelo Estado requerente; para a extradição do brasileiro naturalizado antes do fato, porém, que só a autoriza no caso de seu ‘comprovado envolvimento’ no tráfico de drogas, a Constituição impõe à lei ordinária a criação de um procedimento específico, que comporte a cognição mais ampla da acusação na medida necessária à aferição da concorrência do pressuposto de mérito, a que excepcionalmente subordinou a procedência do pedido extraditório: por isso, a norma final do art. 5o, LI, da CF não é regra de eficácia plena, nem de aplicabilidade imediata.” (Ext 541, Rel. p/ o ac. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 7-11-1991, Plenário, DJ de 18-12- 1992.) LII – não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião; • “A presente extradição (...) reveste-se de caráter instrutório, eis que o ora extraditando ainda não sofreu condenação penal definitiva pela suposta prática do crime de conduzir veículo, sob influência de bebida alcoólica e com velocidade excessiva, em contexto de que resultou a morte de sua passageira (...). A infração penal atribuída ao extraditando acha-se desvestida de caráter político. Constitui delito comum, insuscetível de julgamento perante órgãos judiciário ou tribunais de exceção no Estado requerente.” (Ext 1.203, voto do Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 2-12-2010, Plenário, DJE de 25-2-2011.) • “Não configura crime político, para fim de obstar o acolhimento de pedido de extradição, homicídio praticado por membro de organização revolucionária clandestina, em plena normalidade institucional de Estado Democrático de Direito, sem nenhum propósito político imediato ou conotação de reação legítima a regime opressivo. (...) Não caracteriza a hipótese legal de concessão de refúgio, consistente em fundado receio de perseguição política, o pedido de extradição para regular execução de sentenças definitivas de condenação por crimes comuns, proferidas com observância do devido processo legal, quando não há prova de nenhum fato capaz de justificar receio atual de desrespeito às garantias constitucionais do condenado.” (Ext 1.085, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 16-12-2009, Plenário, DJE de 16-4-2010.) • “A ação de extradição passiva não confere, ordinariamente, ao STF, qualquer poder de indagação sobre o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto probatório em que a postulação extradicional se apoia, não cabendo, ainda, a esta Corte Suprema, o exame da negativa de autoria invocada pelo extraditando em sua defesa. Prece- dentes. Doutrina. O sistema de contenciosidade limitada, que caracteriza o regime jurídico Art. 5o, LII da extradição passiva no direito positivo brasileiro, não permite qualquer indagação probatória pertinente ao ilícito criminal cuja persecução, no exterior, justificou o ajuizamento da demanda extradicional perante o STF. Revelar-se-á excepcionalmente possível, no entanto, a análise, pelo STF, de aspectos materiais concernentes à própria substância da imputação penal, sempre que tal exame se mostrar indispensável à solução de controvérsia pertinente (a) à ocorrência de prescrição penal, (b) à observância do princípio da dupla tipicidade ou (c) à configuração eventualmente política tanto do delito atribuído ao extraditando quanto das razões que levaram o Estado estrangeiro a requerer a extradição de determinada pessoa ao Governo brasileiro. Inocorrência, na espécie, de qualquer dessas hipóteses.” (Ext 1.171, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 19-11-2009, Plenário, DJE de 25-6-2010.) • “Extradição: Colômbia: crimes relacionados à participação do extraditando – então sacerdote da Igreja Católica – em ação militar das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Questão de ordem. Reconhecimento do status de refugiado do extraditando, por decisão do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE): pertinência temática entre a motivação do deferimento do refúgio e o objeto do pedido de extradição: aplicação da Lei 9.474/1997, art. 33 (Estatuto do Refugiado), cuja constitucionalidade é reconhecida: ausência de violação do princípio constitucional da separação dos Poderes. De acordo com o art. 33 da Lei 9.474/1997, o reconhecimento administrativo da condição de refugiado, enquanto dure, é elisiva, por definição, da extradição que tenha implicações com os motivos do seu deferimento. É válida a lei que reserva ao Poder Executivo – a quem incumbe, por atribuição constitucional, a competência para tomar decisões que tenham reflexos no plano das relações internacionais do Estado – o poder privativo de conceder asilo ou refúgio. A circunstância de o prejuízo do processo advir de ato de um outro Poder – desde que compreendido na esfera de sua competência – não significa invasão da área do Poder Judiciário. Pedido de extradição não conhecido, extinto o processo, sem julgamento do mérito e determinada a soltura do extraditando. Caso em que, de qualquer sorte, incidiria a proibição constitucional da extradição por crime político, na qual se compreende a prática de eventuais crimes contra a pessoa ou contra o patrimônio no contexto de um fato de rebelião de motivação política (Ext 493).” (Ext 1.008, Rel. p/ o ac. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 21-3-2007, Plenário, DJ de 17-8-2007.) • “Uma vez constatado o entrelaçamento de crimes de natureza política e comum, impõe indeferir a extradição. Precedentes: Ext 493-0 e 694-1 (...).” (Ext 994, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 14-12-2005, Plenário, DJ de 4-8-2006.) • “Extraditabilidade do terrorista: necessidade de preservação do princípio democrático e essencialidade da cooperação internacional na repressão ao terrorismo. O estatuto da criminalidade política não se revela aplicável nem se mostra extensível, em sua projeção jurídico-constitucional, aos atos delituosos que traduzam práticas terroristas, sejam aquelas cometidas por particulares, sejam aquelas perpetradas com o apoio oficial do próprio aparato governamental, à semelhança do que se registrou, no Cone Sul, com a adoção, pelos regimes militares sul-americanos, do modelo desprezível do terrorismo de Estado. (...) A cláusula de proteção constante do art. 5o, LII, da CR – que veda a extradição de estrangeiros por crime político ou de opinião – não se estende, por tal razão, ao autor de atos delituosos de natureza terrorista, considerado o frontal repúdio que a ordem constitucional brasileira dispensa ao terrorismo e ao terrorista. A extradição – enquanto meio legítimo de cooperação internacional Art. 5o, LII e LIII na repressão às práticas de criminalidade comum – representa instrumento de significativa importância no combate eficaz ao terrorismo, que constitui ‘uma grave ameaça para os valo- res democráticos e para a paz e a segurançainternacionais (...)’ (Convenção Interamericana contra o Terrorismo, Art. 11), justificando-se, por isso mesmo, para efeitos extradicionais, a sua descaracterização como delito de natureza política.” (Ext 855, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 26-8-2004, Plenário, DJ de 1o-7-2005.) • “Extraditando acusado de transmitir ao Iraque segredo de Estado do Governo requerente (República Federal da Alemanha), utilizável em projeto de desenvolvimento de armamento nuclear. Crime político puro, cujo conceito compreende não só o cometido contra a segurança interna, como o praticado contra a segurança externa do Estado, a caracterizarem, ambas as hipóteses, a excludente de concessão de extradição (...).” (Ext 700, Rel. Min. Octavio Gallotti, julgamento em 4-3-1998, Plenário, DJ de 5-11-1999.) • “Não havendo a Constituição definido o crime político, ao Supremo cabe, em face da conceituação da legislação ordinária vigente, dizer se os delitos pelos quais se pede a extradição, constituem infração de natureza política ou não, tendo em vista o sistema da principalidade ou da preponderância.” (Ext 615, Rel. Min. Paulo Brossard, julgamento em 19- 10-1994, Plenário, DJ de 5-12-1994.) • “A inextraditabilidade de estrangeiros por delitos políticos ou de opinião reflete, em nosso sistema jurídico, uma tradição constitucional republicana. Dela emerge, em favor dos súditos estrangeiros, um direito público subjetivo, oponível ao próprio Estado e de cogência inquestionável. Há, no preceito normativo que consagra esse favor constitutionis, uma insuperável limitação jurídica ao poder de extraditar do Estado brasileiro. Não há incompatibilidade absoluta entre o instituto do asilo político e o da extradição passiva, na exata medida em que o STF não está vinculado ao juízo formulado pelo Poder Executivo na concessão administrativa daquele benefício regido pelo direito das gentes. Disso decorre que a condição jurídica de asilado político não suprime, só por si, a possibilidade de o Estado brasileiro conceder, presentes e satisfeitas as condições constitucionais e legais que a autorizam, a extradição que lhe haja sido requerida. O estrangeiro asilado no Brasil só não será passível de extradição quando o fato ensejador do pedido assumir a qualificação de crime político ou de opinião ou as circunstâncias subjacentes à ação do Estado requerente demonstrarem a configuração de inaceitável extradição política disfarçada.” (Ext 524, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 31-10-1989, Plenário, DJ de 8-3-1991.)
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