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1 Lila Abu-Lughod: "As mulheres muçulmanas precisam realmente de salvação? Reflexões antropológicas sobre o relativismo cultural e seus Outros” Universidade de Columbia, Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 20, n. 2, p.451-470, maio-agosto 2012. Na obra intitulada "As mulheres muçulmanas precisam realmente de salvação? Reflexões antropológicas sobre o relativismo cultural e seus Outros” a autora Lila Abu-Lughod, aborda a ética da “guerra ao terrorismo” e se questiona sobre libertar ou salvar mulheres afegãs, todo relativismo cultural que envolve esse tema, e a visão ocidental em torno disso, utilizando conhecimentos da antropologia. A autora inicia sua discussão discorrendo sobre a “guerra ao terrorismo” que tem como objetivo libertar ou salvar mulheres afegãs, e se questiona se a antropologia possui algo a oferecer em relação a essa guerra e seus objetivos, para nos guiar. Portanto o ponto utilizado para o desencadeamento dessa abordagem é o estudo da antropologia que tem como papel entender as diferentes culturas. Além disso, a autora fala que não são colocadas pautas verdadeiramente necessárias para a compreensão da verdadeira problemática desse tema reduzindo assim ao debate de suas crenças religiosas e o tratamento dispensado às mulheres, no caso, segundo Abu-Lughod (2012) afirma: Em vez de explicações políticas e históricas, solicitava-se dos especialistas explicações culturais. Em vez de questões que talvez levassem à exploração das interconexões globais, ofereceram-nos outras que serviam para artificialmente dividir o mundo em esferas separadas – recriando uma geografia imaginária do Ocidente em oposição ao Oriente (...) (Abu-Lughod, 2012 p.453). Nesse sentido, práticas não populares no ocidente foram usadas para justificar o domínio, é feito uso da questão feminina nas políticas coloniais, que são causas superficiais desse complexo conflito territorial, deturpando sua imagem e tornando talibã-e-os-terroristas únicos, distinções importantes que deveriam ter sido mantidas. “Homens brancos salvando mulheres marrons de homens marrons” (SPIVAK, 1988 apud ABU-LUGHOD, 2012), essa frase citada explana o tom cínico que essa situação transparece, e como é ignorado todo passado de colonialismo de uma nação, e em contradição criticando a imposição sofrida pelos afegãos em relação ao modo de vida e religião. No texto a autora aponta casos similares que aconteceram no colonialismo francês, que a justificativa feminina também era usada para justificar o domínio dos povos, a questão era a libertação do uso dos véus pelas mulheres argelinas, análoga a libertação das burcas, e essa libertação chega acompanhada de avanços militares. 2 Segundo Abu-Lughod (2012) o uso do véu marcou muitos pontos na cultura da região, como a separação das esferas femininas masculinas, a associação das mulheres à casa e família, ao pertencimento a uma cultura em que a família é o centro e a casa é associado a santidade da mulher, e tem um significado protetor onde são respeitadas e invioláveis mesmo estando entre estranhos. E como a autora apresentou, é sabido que as pessoas no mundo todo em diferentes culturas se vestem de acordo com classes sociais e comunidades onde estão inseridas, seguindo assim um padrão, mesmo que digam o contrário, também são guiadas ao modo de vestir, e Abu-Lughod (2012) dá um exemplo muito pertinente, lembrando da expressão “a tirania da moda”. Mais um exemplo mostrado no texto é o comentário de uma vendedora de rua que diz não poder usar a burca pois a burca é para as ‘boas mulheres’ que ficam dentro de suas casas, mostrando a relação de status atrelado à burca. A problemática do regime Talibã é a imposição de um costume em detrimento de outros, mesmo que seguindo características da cultura local, e a noção de “liberdade” estadunidense é falha quando só se é considerado liberdade a noção ocidental da mesma. Para a autora o debate sobre a vestimenta é uma problemática político-ética bem mais profunda que precisa ser analisada de maneira delicada e não devem ser mudadas de maneira violenta e nem imposta, deve ser respeitado as concepções de liberdade de uma nação que foi constituída historicamente diferente da ocidental. Portanto, esse texto trouxe uma reflexão muito válida que nos permite ir além dos muros do Afeganistão, pois o domínio de culturas denominadas como inferiores sempre esteve presente na história da humanidade, e na contemporaneidade. Abu-Lughod (2012) enfatiza o cuidado que devemos ter para não reduzir uma situação complexa a um fato ou comportamento, e cair em polarizações que colocam o ocidente no pedestal. Enquanto a estrutura do texto, este fornece a compreensão clara do assunto pois a autora utilizou de argumentos concretos e as informações claramente apresentadas de maneira com que a dinâmica do texto fizesse com que o leitor entendesse a mensagem. A linguagem exige uma leitura atenciosa para compreender as informações que o texto expõe.