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Fatores Genéticos na Qualidade da Carne

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fmvz-unesp 
FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA - BOTUCATU 
Curso de Pós-Graduação em Zootecnia – Nutrição e Produção Animal 
 
 
 
 
 
 
 
 
FATORES GENÉTICOS QUE AFETAM A QUALIDADE DA CARNE 
 
Mirella Leme Franco Geraldini Sirol 
Zootecnista 
 
 
 
 
 
 
 
 
Disciplina: Métodos de Avaliação da Qualidade de Carnes 
Prof. Roberto de Oliveira Roça 
Departamento de Gestão e Tecnologia Agroindustrial 
Fazenda Experimental Lageado, Caixa Postal, 237 
F.C.A. - UNESP - Campus de Botucatu 
 CEP 18.603-970 - BOTUCATU - SP 
 robertoroca@fca.unesp.br
 
 
 
 
 
 
mailto:robertoroca@fca.unesp.br
1. Introdução 
 
A carne possui várias características que irão determinar a sua 
qualidade frente ao consumidor, tais como, cor, sabor, aroma, maciez, 
suculência, entre outras. Dentre elas, talvez a mais facilmente identificada e 
que mais influencia na decisão do consumidor na escolha da carne, seja a 
maciez. Alguns trabalhos têm sugerido até, que os consumidores estão 
dispostos a pagar mais para garantir a maciez do produto (Boleman et al., 
1997, citado por Brooks et al., 2000). 
No entanto, existe muita dificuldade de incluir a maciez como objetivo 
de seleção nos programas de melhoramento genético, por ser uma 
característica complexa, que requer em geral, medidas destrutivas e uma 
idade avançada do animal (Soria & Corva, 2004). 
A causa da grande variabilidade da maciez da carne bovina está 
associada não apenas a constituição genética do animal, como também com 
diferenças ambientais (Soria & Corva, 2004). Assim, de forma geral, os 
fatores que afetam a maciez da carne podem ser divididos em dois grandes 
grupos, ou seja, os fatores ante-mortem: genótipo (raça), idade, sexo, 
nutrição, exercício, estresse antes do abate, presença de tecido conjuntivo, 
espessura e comprimento do sarcômero, uso de promotores de crescimento; 
e aqueles, post-mortem: estimulação elétrica, rigor-mortis, esfriamento da 
carcaça, maturação, método e temperatura de cozimento, pH final, aplicação 
de substâncias químicas (enzimas, cálcio, etc.), entre outros (Roça, 
comunicação pessoal, a). 
No que se refere ao componente genético, tem sido observado que 
existem variações na maciez entre e dentro de raças bovinas (Shackelford et 
al. 1994; Wulf et al. e Sherbeck et al. 1996; Maher, et al. e Soria & Corva, 
2004). Mas também, a maciez é reduzida à medida que se aumenta o grau de 
sangue Bos indicus (Johnson et al. e Whipple et al., 1990; Sherbeck et al. 
1995; Sherbeck et al. 1996; O’Connor et al., 1997). 
No Brasil, no entanto, a maior parte do rebanho bovino de corte é 
constituído de animais zebuínos, puros e cruzados, criados a pasto, com 
pouca ou nenhuma suplementação, o que leva a uma idade de abate 
 1
avançada (média de 30 a 36 meses), e conseqüentemente, a produção de 
carcaças de baixa qualidade. 
Parte desse cenário pode ser explicado pela falta de incentivo à 
qualidade da carne, uma vez que a maioria os frigoríficos pagam somente 
pelo peso da carcaça quente, sem considerar as características quantitativas 
e qualitativas da carne, tais como, rendimento de traseiro, rendimento de 
cortes cárneos, acabamento de gordura, cor, maciez, suculência, entre 
outras. 
Mais recentemente, com o aumento da exportação de carne fresca, o 
mercado varejista brasileiro passou a exigir dos frigoríficos produtos com 
maior qualidade, que por sua vez, passou a procurar por produtores que 
forneçam animais mais jovens, com melhor acabamento de gordura e que 
tenham, potencialmente, produtos de melhor qualidade. Isso gerou, por parte 
das secretarias de agricultura estaduais, o incentivo à produção de novilhos 
precoces (24 a 30 meses) e super precoces (18 a 24 meses), por meio da 
redução de ICMS. Todavia, essas técnicas de produção ainda não se 
consolidaram em todo o país, sendo restrita a algumas regiões, como 
Sudeste e Sul do país e algumas partes do Centro-oeste. 
Mesmo nos lugares aonde a tipificação de carcaça já vem sendo 
realizada por vários anos, como EUA, União Européia e Austrália, a maciez 
continua sendo objetivo de estudo, uma vez que essa característica está 
diretamente ligada à aceitabilidade do consumidor. 
 
 
2. Modificações post mortem 
 
Independente do genótipo do animal, após o abate ocorrem várias 
modificações no músculo, tanto estruturais como bioquímicas, que irão 
transformá-lo em carne, propriamente dita. As modificações bioquímicas e 
estruturais ocorrem simultaneamente e são dependentes dos tratamentos 
ante-mortem, do processo de abate e das técnicas de armazenamento da 
carne (Roça, comunicação pessoal; b). 
Após o sacrifício do animal, a circulação sanguínea cessa e dá-se 
início as reações bioquímicas anaeróbicas, que irão produzir ácido lático, o 
 2
qual será responsável pela queda do pH. Esse processo de acidificação é 
dependente da quantidade de glicogênio disponível no músculo, que por sua 
vez, dependerá da dieta que o animal vinha recebendo, do manejo e do nível 
de estresse pelo qual o animal passou antes do abate (Soria & Corva, 2004). 
O valor ideal de pH oscila entre 5,4 a 5,8 (Warriss, 2000; citado por Soria & 
Corva, 2004), sendo que esses níveis são atingidos entorno das 24 horas 
post-mortem (Roça, comunicação pessoal; b). Quando o pH final da carne é 
maior ou igual a 6,2, a carne é mais escura, dura e seca 
(Soria & Corva, 2004) e também pode estar mais susceptível ao 
desenvolvimento de microorganismos patogênicos durante o armazenamento. 
No período entre as 12 e 24 horas post-martem, também ocorre um 
outro processo chamado rigor mortis, de forma que o músculo passa de um 
estado de repouso, onde apresenta flexibilidade e elasticidade, para um 
estado, onde a sua capacidade de extensibilidade diminui marcadamente. 
Este endurecimento muscular é progressivo e está associado com 
encurtamento do sarcômero. A resolução do rigor mortis ocorre por meio de 
ações de enzimas proteolíticas. 
De acordo com alguns autores citados por Soria & Corva (2004), o 
valor final da maciez resulta de um balanço entre processos opostos: um que 
reduz a maciez devido a um reforço da união actina-miosina e ao 
encurtamento do sarcômero durante as primeiras 24 horas e outro, que 
produz amaciamento, devido à redução do vigor da união de proteínas 
miofibrilares (actina-miosina), associado com um processo de proteólise das 
mesmas. 
Ainda de acordo com Soria & Corva (2004), o processo de maturação 
também pode variar devido à “maciez inicial” da carne, que depende 
principalmente do tamanho do sarcômero, o conteúdo e estrutura do tecido 
conjuntivo e do conteúdo de gordura intramuscular e a “maciez final”, que 
depende principalmente do grau de proteólise. 
Contudo, esses fatores citados por Soria & Corva (2004), que 
influenciam tanto a maciez inicial como final da carne estão diretamente 
ligados a fatores genéticos, ou seja, essas características variam entre raças 
e também entre indivíduos dentro de raças. 
 
 3
 
3. Efeito Genético na Maciez 
 
A maioria dos programas de melhoramento genético de bovinos de 
corte tem focado as características de crescimento, tais como, peso vivo a 
diferentes idades e ganho de peso, como principal objetivo de seleção, uma 
vez que essas características são fáceis de medir, apresentam boa resposta à 
seleção e também influem no peso da carcaça. 
No entanto, as características de crescimento nem sempre apresentam 
relações favoráveis com as características de qualidade da carne. Segundo 
Pariacote et al. (1998) observou que existe um certo antagonismo genético 
entre as características de qualidade e de quantidade de carne, ao estudar 
características de carcaça de animais da raça Shorthorn, ou seja, os autores 
encontraram correlações genéticas altas e positivas do peso da carcaça 
quente com o rendimento de carcaça (0,65) e com área de olho de lombo 
(0,70), porém esta característica foi negativamente correlacionadacom 
marmoreio, espessura de gordura, quantidade de gordura abdominal e “yield 
grade” (fórmula usada para classificar a carcaça, que envolve medidas de 
espessura de gordura, quantidade de gordura no rim, coração e pélvica, peso 
da carcaça quente, área de olho de lombo). 
Gregory et al. (1994), quando utilizaram vários genótipos, tanto 
compostos Bos indicos como Bos taurus, relataram que as estimativas de 
herdabilidade foram intermediárias a alta para as medidas de gordura (0,30 
para espessura gordura ajustada na 12a costela e 0,28 para porcentagem de 
gordura), mas foram geralmente baixas para os atributos de palatabilidade 
(maciez, suculência e flavor). Também observaram alta correlação genética 
negativa (-0,56) entre rendimento de carcaça e escore de marmoreio e 
relativamente baixa correlação genética entre rendimento de carcaça e os 
atributos de palatabilidade (0,34, 0,28 e 0,34, respectivamente para maciez, 
suculência e flavor). Esses resultados sugerem, segundo os autores, a 
necessidade de se dar atenção simultânea ao rendimento de carcaça e as 
características de palatabilidade, que somente ao escore de marmoreio. 
A herdabilidade é a fração da variabilidade de uma característica que 
pode ser atribuída a diferenças no valor genético dos animais, por tanto, 
 4
determinarão a eficácia da seleção artificial (Soria & Corva, 2004). 
Características com herdabilidade alta, responderão bem a seleção, já as 
características de baixa herdabilidade terão uma resposta muito lenta, assim, 
o mais indicado é o cruzamento com outras raças que apresentem 
herdabilidade maior para a mesma característica. Mas também, é importante 
se avaliar as correlações genéticas entre as características, pois elas se 
originam quando um gene ou um grupo de genes controla mais de um 
processo na expressão fenotípica de duas ou mais características. 
Shackelford et al. (1994), também utilizaram várias raças para estimar 
herdabilidades e correlações genéticas para atividade da calpastatina (CA), 
conteúdo de gordura intramuscular (IMF), Warner-Braztler shear force (WBS), 
rendimento de carcaça (RPY, ”retail product yield”) e taxa de ganho (GR). Os 
autores encontraram valores de herdabilidade moderadas para rendimento de 
carcaça (0,45) e taxa de ganho (0,32) e herdabilidade alta para as 
características de qualidade de carne (0,65, 0,93, 0,53, respectivamente para 
CA, IMF e WBS). A correlação genética da atividade da calpastatina com 
shear force, rendimento de carcaça e taxa de ganho foi 0,50, 0,44, e 0,25, 
respectivamente e de conteúdo de gordura intramuscular com shear force, 
rendimento e taxa de ganho foi -0,57, -0,63 e -0,04, respectivamente. Os 
autores concluíram que de acordo com essas herdabilidades e correlações 
genéticas, a seleção contra a atividade da calpastatina seria uma estratégia 
mais adequada para melhorar a maciez da carne, que a seleção para 
aumentar o conteúdo de gordura intramuscular porque o nível de 
antagonismo genético entre atividade da calpastatina e rendimento de 
carcaça é menor que entre conteúdo de gordura intramuscular e rendimento. 
Vários fatores têm sido apontados como causa da variação na maciez, 
tanto entre como dentro de raças, tais como, a atividade da calpastatina, o 
conteúdo de gordura intramuscular, a espessura de gordura de acabamento, 
o comprimento do sarcômero, a composição de colágeno dos músculos, 
quantidade e tipo de tecido conjuntivo presente, entre outros. 
A atividade da calpastatina, medida 24 horas post-motem, tem sido 
apontada como a principal responsável pela variação na proteólise muscular 
entre Bos indicus e Bos taurus, uma vez que animais Bos indicus têm 
apresentado uma maior atividade da calpastatina, 24 h post-mortem, 
 5
reduzindo a velocidade do processo de maturação da carne logo após o 
sacrifico. (Wheeler et al. e Whipple et al., 1990). 
A calpastatina é uma enzima inibidora da atividade das calpaínas, que 
são responsáveis pelo início da resolução do rigor mortis. O sistema 
denominado calpaínas, também conhecido como CAF - enzimas fatoradas 
pelo cálcio, constitui-se de duas enzimas, a µ-calpaína, que necessita de 5 a 
50 µM de íons cálcio para sua atividade e a m-calpaína, que requer 300 a 
1000 µM do mesmo íon para sua atividade, e um inibidor, a calpastatina, que 
tem como principal função inativar as calpaínas (Roça, comunicação pessoal; 
b). As calpaínas reduzem o vigor da ligação entre as proteínas miofibrilares. 
Em geral, a herdabilidade para a atividade da calpastatina tem variado 
de 0,15 a 0,65, tendo uma média de 0,43. (Soria & Corva, 2004) e, também 
tem apresentado relação com outras características envolvidas com a 
qualidade da carne (Quadro 1). 
Ainda de acordo com Soria & Corva (2004), um dos motivos das 
variações encontradas nas estimativas de herdabilidade e de correlações 
genéticas para as características que relacionam a composição corporal com 
a qualidade da carne, se deve a heterogeneidade no ponto final de abate de 
cada experimento, já que o momento do sacrifício pode ser determinado com 
base na idade, no peso ou num ponto de terminação constante; as 
comparações sob o ponto de terminação constante parecem ser os que 
fornecem resultados mais consistentes (Burrow et al., 2001, citado por Soria & 
Corva, 2004). 
Outra fonte de variação nestas estimativas pode estar relacionada com 
o número reduzido de animais analisados na maioria dos trabalhos e também, 
Quadro 1 – Correlações genéticas estimadas entre distintos pares de 
características relacionadas com qualidade de carne*
Características Correlação Genética (rg) 
Número de 
experimentos 
 Média Variação 
Maciez x RC1 -0,86 -0,64 a -1,00 9 
Maciez x marmoreio 0,38 0,00 a 0,90 9 
Maciez x CA2 -0,70 -1,00 a 0,00 3 
 6
RC x marmoreio -0,47 -1,00 a 0,28 10 
RC x CA 0,63 0,35 a 1,00 4 
 
* (adaptado de Soria & Corva, 2004). 
1 RC = Resistência ao corte. 
2 CA = Atividade da Calpastatina. 
 
pelas diferenças em modelagens estatísticas e de metodologias adotadas, 
por exemplo, alguns trabalhos mediram atividade da calpastatina logo após o 
abate (Rubensam et al. 1998) enquanto outros congelaram a amostra de 
carne a -70 oC para se proceder a análise posteriormente (Shackelford et al. 
1994; Wulf et al. 1996; .O’Connor et al. 1997). 
 O problema de maciez causado pelos animais Bos indicus nos 
cruzamentos com Bos taurus é mais evidente quando os animais têm grau de 
sangue 50% ou mais Bos indicus e idealmente, os animais não deveriam ter 
mais que 25% de sangue Bos indicus, apesar de que os compostos 3/8 Bos 
indicus apresentam maciez aceitável desde que os outros 5/8 sejam 
compostos por uma raça com alto potencial genético para marmoreio e 
maciez de carne (Dikeman, 1995; citado por O’Connor et al., (1997). 
Shackelford et al. (1995) demonstraram que a maciez de diferentes 
músculos diminui progressivamente à medida que aumenta a porcentagem de 
genes zebuínos nos cruzamentos, sendo mais evidente quando a 
contribuição da raça índica excede 25%. Segundo Sherbeck et al. (1995), a 
carne produzida por novilhos com mais que 50% de sangue da raça Brahman 
tem maior e mais variável valor de shear force e uma maior incidência de 
valores de shear force acima de 3,9 kg (indesejável), comparado com carne 
de novilhos que não tenham sangue Brahman. 
Rubensam et al. (1998), observou variação semelhante na maciez da 
carne, quando comparou animais puro Hereford, 3/4 Hereford x 1/4 Nelore e 
5/8 Hereford x 3/8 Nelore, na região Sul do Brasil, ou seja, os animais 
3/8 Nelore apresentaram maior atividade da calpastatina e shear force que 
novilhos Hereford puros e 3/4 Hereford x 1/4 Nelore. Porém após 10 dias de 
maturação não houve diferença significativa na atividade da calpastatina entre 
 7
os genótipos estudados, mas a diferença de shear force se manteve 
significativa entre Hereford puro e 5/8. 
Vários estudos têm sugerido queessas diferenças genéticas na maciez 
da carne estão associadas à taxa e ao grau de proteólise muscular que 
ocorre durante a estocagem post-mortem da carne fresca (.Whipple et al., 
1990; Sherbeck et al. 1994; Wulf et al. 1996). No entanto, tem sido observado 
também, que as diferenças de maciez entre as raças é reduzida quando a 
carne é maturada por um período de tempo adequado. 
Monsón et al. (2004) quando estudou a influência de raça e tempo de 
maturação na textura da carne, utilizando animais das raças Holandesa 
leiteira, Pardo-Suíça de dupla aptidão, Lumousin e Blonde d’Aquitaine (raças 
de crescimento rápido), observaram que a partir de 14 dias de maturação 
houve tendência de redução nas diferenças de maciez da carne tanto entre 
como dentro das raças, sendo consideradas similares aos 21 dias. 
Resultado semelhante foi observado por Maher et al. (2004), os quais 
relataram que após 14 dias de maturação post-mortem, a variação em torno 
da média das características de qualidade de carne estudadas, foi similar 
quando as três raças (Holandês da Nova Zelândia, Holandês Europeu/Norte 
Americano e cruzados de Belgian Blue x Holandês), os dois gêneros (touro ou 
novilho) e os dois pesos pré-abate (620 e 720 kg) foram comparados. 
O’Connor et al. (1997), ao avaliarem o efeito genético na maciez da 
carne comparando compostos Bos indicus com animais Bos taurus, utilizando 
dois grupos, o grupo de novilhos 3/8 Bos indicus (Braford, Red Brangus e 
Simbrah) e o grupo de novilhos Bos taurus (3/4 Red Angus x 1/4 Simental, 1/2 
Red Angus x 1/2 Simental e Hereford puro), observaram que no primeiro dia 
post-mortem os valores de shear force para os dois tipos biológicos não 
diferiram (P< 0,05). No entanto a carne produzida por novilhos Bos taurus 
exibiu uma taxa de maturação muito mais rápida de 1 a 4 dias de maturação. 
Como resultado, sugeriram que a diferença de shear force entre os dois 
grupos, apesar de significativa, se tornou menos pronunciada para os 
períodos de maturação mais longos. E a taxa de maturação mais lenta 
durante os primeiros 7 dias post-mortem para a carne produzida por novilhos 
3/8 Bos indicus foi associada com a maior atividade da calpastatina. Os 
autores concluem que devido às diferenças nas taxas de maturação 
 8
post-mortem, a carne de Bos indicus comparada com a de Bos taurus teria 
requerimentos de maturação diferentes para atingir um nível de maciez 
aceitável. Concluem ainda, que de acordo com os dados a carne de 
3/8 Bos indicus foi relativamente macia por ter sido maturada por um período 
de tempo suficiente (aproximadamente 21 dias) para compensar a reduzida 
resposta à maturação associada com sua maior atividade da calpastatina. 
Mesmo dentro das raças Bos taurus existem diferenças quanto à 
maciez. Wulf et al. (1996) relataram que as diferenças de shear force entre 
reprodutores se manteve com o aumento do tempo de maturação e que a 
classificação dos reprodutores pelo grau de maciez foi similar para todos os 
tempos de maturação estudados, sugerindo que as diferenças genéticas 
entre Charolês e Limounsin e entre os reprodutores dentro de raça, não foram 
resultado de diferenças biológicas no mecanismo pelo qual se melhora a 
maciez de 1 a 35 dias. A diferença genética na maciez entre e dentro de 
raças deveria ser relacionada a: 1) diferenças genéticas que influenciam na 
maciez nas primeiras 24 horas post-mortem (por exemplo, mudanças mais 
cedo na estrutura das miofibrilas post-mortem e ou mais breve atividade 
proteolítica post-mortem) e 2) diferenças genéticas na maciez já 
estabelecidas no momento do abate (por exemplo, tecido conjuntivo, tipo de 
fibra, mamoreio). 
Outra questão importante é o custo de se avaliar características de 
carcaça, tanto qualitativas quanto quantitativas, e que tais informações são 
obtidas somente após o abate do animal, levando a um período de tempo 
avançado para se obter os dados, dificultando a inclusão dessas 
características nos programas de melhoramento genético. 
De acordo com Moser et al. (1998) muitas associações de raças de 
bovinos de corte têm coletado informações de carcaça das progênies dos 
reprodutores registrados, com o intuito de se estimar DPE’s (diferença 
esperada na progênie; os valores de DEP’s são publicados nos catálogos de 
touro para venda de sêmen), para essas características. No entanto, 
ressaltam a reduzida quantidade de dados devido às dificuldades econômicas 
e de medição. 
Por isso, tem-se estudado a possibilidade de se utilizar medidas de 
carcaça obtidas por meio de imagens de ultra-som do animal vivo com um 
 9
ano de idade. Porém é necessário se conhecer as relações genéticas entre 
as medidas de ultra-som do animal vivo com as medidas feitas na carcaça do 
animal abatido, para que se possam calcular os valores genéticos para os 
reprodutores de maneira acurada (Johnston et al., 1999; citado por Reverter 
et al. 2000). 
Arnold et al. (1991) utilizando dados de novilhos Hereford, encontrou 
estimativas de herdabilidade para as medidas de ultra-som, a um peso 
constante dos animais, da espessura de gordura e área de olho de lombo de 
0,26 e 0,25, respectivamente. Apesar desses valores de herdabilidade não 
serem muito baixos, os autores ressaltam que os resultados obtidos deveriam 
ser analisados com cuidado, uma vez que devido ao antagonismo genético 
existente entre a área de olho de lombo e espessura de gordura, para o 
animal abatido, a medida de gordura obtida por meio de ultra-som no animal 
jovem poderia ter diferentes relações com crescimento e com musculosidade, 
sugerindo a necessidade de mais estudos entre as medidas de ultra-som e de 
carcaça. 
Moser et al. (1998) estimou parâmetros genéticos para medidas da 
carcaça e de ultra-som a um ano de idade em animais da raça Brangus. Os 
autores encontraram herdabilidade de 0,11 para espessura de gordura 
medida por ultra-som e de 0,29 para área de olho de lombo, também medida 
por ultra-som e correlações genéticas altas e favoráveis entre as medidas de 
carcaça e de ultra-som, indicando que essas medidas obtidas por ultra-som 
seriam úteis para se predizer valores genéticos para quantidade de carne na 
carcaça e área de olho de lombo. 
Reverter et al. (2000) encontrou herdabilidades mais altas que Moser 
et al. (1999), para as raças Angus e Hereford, sendo 0,33 (0,20), 0,55 (0,31), 
0,51 (0,18), e 0,42 (0,38), respectivamente para conteúdo de gordura 
intramuscular, espessura de gordura da garupa medida no ponto P8, 
espessura de gordura na 12a costela e área de olho de lombo para os animais 
Angus (Hereford), todas obtidas por meio de ultra-som. Também relataram 
correlações genéticas moderadas a altas e positivas, entre as características 
de carcaça e as escaneadas, sugerindo que seleção usando medidas de 
ultra-som a um ano de idade resultaria em melhoria genética que poderia ser 
predita para as características de carcaça medida no animal abatido. 
 10 
Entretanto, também encontraram antagonismo genético entre conteúdo de 
carne na carcaça e medidas de gordura escaneadas, e entre área de olho de 
lombo escaneadas com medidas de gordura medida ao abate, sendo que 
essas correlações foram bastante diferentes ente as raças. 
 
 
4. Considerações finais 
 
• De acordo com as estimativas de herdabilidade para a atividade da 
calpastatina e sua correlação a maciez, é possível se obter 
melhoria na maciez da carne dos animais zebuínos criados no país 
por meio de seleção contra a atividade da calpastatina. 
• Outra estratégia de melhoria na maciez que pode ser adotada no 
país é a utilização de cruzamentos com animais de raças com alto 
potencial genético para maciez e marmoreio. 
• Porém para regiões muito quentes, onde a produção de animais de 
raças Bos taurus não é viável, indica-se lançar mão de outros 
artifícios como, a redução da idade de abate, a redução do estresse 
pré-abate, assim como, a utilizaçãode técnicas de processamento 
mais adequadas, como o aumento no tempo de maturação (mínimo 
de 21 dias). 
• E por fim, mais estudos devem ser feitos utilizando-se medidas de 
ultra-som, de forma que, ao menos algumas das características de 
qualidade da carcaça que influenciam na maciez da carne possam 
ser incluídas nos programas de seleção. 
 11 
Literatura Citada 
 
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