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Calcando Cancoes,, ,
Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”
Faculdade de Artes Arquitetura
e Comunicação
Thanile Goncalves Reis,
Projeto de Conclusão de Curso
Design - Projeto de Produto
Orientador - Prof. Dr. Cláudio Roberto y Goya
Bauru 2012
Agradecimentos
Agradeço aos meus pais e meu irmão pelo
apoio de uma vida inteira.
Agradeço aos meus amigos que, ao longo 
da faculdade, se tornaram minha família.
Agradeço ao meu namorado pela dedicação.
Obrigada, meninas de Uberlândia!
Obrigada, Carol e meninos da Asilo!
Obrigada, meninas da Casa da Praia!
Um agradecimento especial ao pessoal da
Mix Brasil.
E, finalmente, obrigada Goya, meu querido
amigo, professor e orientador.
Resumo
Um dos poetas brasileiros que mais sensivelmente sintoniza
of eminino; Escritor, dramaturgo e músico, Chico Buarque é 
reconhecido por captar e emitir a voz feminina, vertendo-a
em palavras, traduzindo-a em música. Em composições que
se primam pela decantação do eu lírico feminino, emerge
o ser e a voz da mulher.
Assim como Chico explana a mulher e a faz transparecer em
música e poesia, o projeto Calçando Canções tem o intento
de apresentar algumas de suas composições e personagens
na configuração de calçado feminino.
A proposição de criar e produzir uma linha de calçados 
fundamentada em canções de Chico Buarque transcende a
percepção sonora. É a concretização da poesia e beleza de
suas composições por meio do Design.
Introducao, ,
Calçando Canções é uma linha de calçados femininos que 
tem o intuito de transcender a sonoridade das composições
de Chico Buarque, visando a materialização do imaginário de
sua poesia.É , portanto, uma releitura tridimensional de sua 
obra, que se tornou possível através do Design de Calçados.
O relatório do produto estrutura-se em módulos, de maneira
a conduzir o leitor pelo tema, primeiramente apresentando
o calçado, em seguida as canções selecionadas, as 
mulheres cantadas, as criações e, por fim, a produção.
Relacionando as composições poéticas à musicalidade,
àf eminilidade, ao calçado e ao design.
No módulo “Introdução ao Calçado” serão explorados os
 
termos técnicos utilizados na produção de um calçado, sua
estrutura e a maneira como ele é criado e produzido dentro
de uma fábrica.
O módulo entilulado “As canções” introduz as composições
escolhidas para fazer parte do projeto, e apresenta uma 
análise do feminino cantado por Chico, das personalidades
marcantes, porém distintas, de suas mulheres. “Os calçados”
é a apresentação das criações, juntamente com seus 
respectivos desenhos técnicos. Um módulo que expõe os 
materiais, modelos, cores e formas estipulados e quais as
relações que se estabelecem entre eles e as personagens.
Em “Produção”, um detalhamento do processo de geração
da linha, desde os desenhos técnicos até o produto final,
passando pela escolha de materiais, modelagem e 
fabricação dos protótipos.
Em seguida, uma série de fotografias clicadas por Lucas
Ribeiro, exibe os calçados recém saídos da fábrica, que
estariam prontos não fossem as intervensões artísticas e 
manuais posteriores.
“Considerações”, “Conclusão” e “Bibliografia” seguem com as 
ponderações e informes finais.
Percebe-se ao longo do projeto o mérito do Design em
agregar conceito e sentido aos objetos. Nessa obra, o 
Design atua como vetor de transferência de significados,
alcançando a materialização de um produto tridimensional
através da releitura de um produto sonoro.
Os calçados concebidos, não apenas atendem às
expectativas do consumidor atual, seguindo “tendências”
do mercado de moda, talvez até, por influência do tempo 
trabalhado como designer em uma fábrica de calçados,
eles sobressaem pelo modo com que foram concebidos.
Designados, desde sua origem no mundo das ideias, para
portar significado e valor.
São calçados contemporâneos, passíveis de produção em
escala, salvo algumas intervenções artísticas posteriormente
definidas, mas acima de tudo são calçados que carregam 
música, poesia e sentimento em sua essência.
Introducao ao Calcado,,,
Calçando Canções é uma linha de calçados inspirados em
canções de Chico Buarque, para uma melhor compreensão
desse projeto, é necessário explanar alguns termos técnicos.
O calçado é composto por Construção (parte inferior: salto,
sola, palmilha, meia pata) e Cabedal (parte superior, que 
envolve o pé). Uma linha de calçados é formada por pares
cujas construções permanecem as mesmas, alterando 
apenas o cabedal.
A criação de um Cabedal tem seu início no desenho técnico
do calçado, cabe ao modelista interpretá-lo e transformá-lo
em moldes que serão utilizados para o corte e confecção da
peça.E sse processo de fabricação dos moldes é 
denominado Modelagem.
As Cancoes, ,
Foram selecionadas sete canções para compor o projeto,
de maneira que elas pudessem, juntas, contar uma história.
E essa história começa pela manhã com “Folhetim”,
desdobra-se ao longo do horário comercial com
“Se eu fosse teu patrão” e tem seu entardecer no porto com
“Minha História”. O retorno ao lar no final do dia é 
representado por “Tatuagem”, onde, ao anoitecer, enfrenta-se
uma dolorosa separação em “Atrás da Porta”.A noite
estende-se num cabaré ao som de “Bastidores” e a história
tem seu desfecho quando “A Rita” decide, enfim, partir.
E eu te farei as vontades
Direi meias verdades
Sempre à meia luz
E te farei, vaidoso, supor
Que é o maior e que me possuis
Se acaso me quiseres
Sou dessas mulheres
Que só dizem sim
Por uma coisa à toa
Uma noitada boa,
Um cinema, um botequim
E, se tiveres renda
Aceito uma prenda
Qualquer coisa assim
Como uma pedra falsa
Um sonho de valsa
Ou um corte de cetim
Mas na manhã seguinte
Não conta até vinte
Te afasta de mim
Pois já não vales nada
És página virada
Descartada do meu folhetim
Folhetim
(1977-78) Chico Buarque
Chico Buarque, além de escrever o texto de “Ópera do
Malandro”, compôs 17 músicas para a peça.
Dentre elas está “Folhetim” , que segundo o compositor que 
pensava a música para além dos palcos, tinha a cara de Gal 
Costa e servia para a personagem.
Em “Folhetim” a mulher adquire uma postura de ascendência 
sobre o homem, e essa superioridade feminina fica em 
evidência especialmente nos versos da terceira estrofe:
“E te farei, vaidoso, supor que é o maior e que me possuis”
O deliberado descompromisso por parte da personagem é
revelado pelo caráter fugaz de seus encontros, o que reforça
a não submissão da mulher e a consciência de seu domínio
sobre o homem.
A mulher de “Folhetim” trata seus “encontros” como mera 
troca de favores.
Se eu fosse teu patrão
(1977-78) Chico Buarque
Eu te adivinhava
E te cobiçava
E, te arrematava em leilão
Te ferrava a boca, morena
Se eu fosse o teu patrão
Aí, eu tratava
Como uma escrava
Aí, eu não te dava perdão
Te rasgava a roupa, morena
Se eu fosse o teu patrão
Eu te encarcerava
Te acorrentava
Te atava ao pé do fogão
Não te dava sopa, morena
Se eu fosse o teu patrão
Eu encurralava
Te dominava
Te violava no chão
Te deixava rota, morena
Se eu fosse o teu patrão
Quando tu quebrava
E tu desmontava
E tu não prestava mais não
Eu comprava outra, morena
Se eu fosse o teu patrão
Pois eu te pagava direito
Soldo de cidadão
Punha uma medalha em teu peito
Se eu fosse o teu patrão
O tempo passava sereno
E sem reclamação
Tu nem reparava, moreno
Na tua maldição
E tu só pegava veneno
Beijando a minha mão
Ódio te abrandava, moreno
Ódio do teu irmão
Teu filho pegava gangrena
Raiva, peste e sezão
Cólera na tua morena
E tu não chiava não
Eu te dava café pequeno
E manteiga no pão
Depois te afagava, moreno
Como se afaga um cão
Eu sempre te dava esperança
D'um futuro bão
Tu me idolatrava, criança
Seu eu fosse o teu patrão
“Se eu fosse teu patrão” faz parte do repertório de músicas 
compostas por Chico para a peça “Ópera do Malandro”.
A música é uma verdadeira desmistificação do amor, da
mulher, e da relação entre os sexos. Aqui, o confronto
Homem x Mulher também é o confronto Patrão x Empregado,
numa luta de classes em que cada grupo se coloca na pele
de“patrão” do outro.
Nesse conflito identificamos dois discursos distintos,
o masculino e o feminino. O primeiro é o da violência aberta
e brutal, inclusive na esfera sexual com as metáforas da 
violação. É um fetiche de dominação que tem por detrás uma 
submissão de fato, o que faz gerar no homem a revolta de 
estar numa condição inferior à mulher.
O segundo discurso é “venenoso”, o discurso feminino trata
do desprezo e da dissimulação. Nele, a mulher demonstra
dominação não com a violência, mas com uma calma e 
tranquila submissão. O homem fica "sereno e sem
reclamação" sem sequer reparar que está sendo dominado 
e afagado, como se afaga um cão. O discurso da mulher 
torna-se tanto mais odioso quanto mascarado pelo afeto.
Quando enfim eu nasci minha mãe embrulhou-me num manto
Me vestiu como se eu fosse assim uma espécie de santo
Mas por não se lembrar de acalantos, a pobre mulher
Me ninava cantando cantigas de cabaré
Ele vinha sem muita conversa, sem muito explicar
Eu só sei que falava e cheirava e gostava de mar
Sei que tinha tatuagem no braço e dourado no dente
E minha mãe se entregou a esse homem perdidamente
Ele assim como veio partiu não se sabe pra onde
E deixou minha mão com o olhar cada dia mais longe
Esperando, parada, pregada na pedra do porto
Com seu único velho vestido cada dia mais curto
Minha mãe não tardou a alertar toda a vizinhança
A mostrar que ali estava bem mais que uma simples criança
E não sei bem se por ironia ou se por amor
Resolveu me chamar com o nome do Nosso Senhor
história (Gesù bambino)
Lucio Dalla
Minha
e PaolaP allottino versão de Chico Buarque
Minha história é esse nome que ainda hoje carrego comigo
Quando vou bar em bar, viro a mesa, berro, bebo e brigo
Os ladrões e as amantes, meus colegas de copo e de cruz
Me conhecem só pelo meu nome de Menino Jesus 
(1970)
A música original de Lucio Dalla e Paola Pallotino tinha
 “O filho da guerra” como subtítulo, que é como são 
conhecidas as crianças nascidas de mães solteiras italianas 
com soldados estrangeiros. Chico brincava que o subtítulo
de sua versão seria“ O filho da puta”.O título “Menino Jesus”
nao agradou a censura e foi, portanto, substituído por
“Minha História”.
Diferentemente das demais canções escolhidas para compor
esse projeto, em “Minha História” o emissor não é feminino.
Na primeira estrofe ele apresenta o que seria seu pai 
estereotipado, numa descrição que sugere um aventureiro,
homem do mar sem pouso certo, do qual se desconhece a 
origem.A mãe é personagem principal das três estrofes
seguintes, e é descrita com certa ternura e pena por um
menino Jesus às avessas. Uma espécie de Maria que 
cometeu seus pecados, mais para Maria Madalena que para
Virgem Maria.
Tatuagem
(1972-73)Chico Buarque
Quero ficar no teu corpo
Feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
Prá seguir viagem
Quando a noite vem
E também pra me perpetuar
Em tua escrava
Que você pega, esfrega
Nega, mas não lava
Quero brincar no teu corpo
Feito bailarina
Que logo se alucina
Salta e te ilumina
Quando a noite vem
E nos músculos exaustos
Do teu braço
Repousar frouxa, murcha
Farta, morta de cansaço
Quero pesar feito cruz
Nas tuas costas
Que te retalha em postas
Mas no fundo gostas
Quando a noite vem
Quero ser a cicatriz
Risonha e corrosiva
Marcada a frio
Ferro e fogo
Em carne viva
Corações de mãe, arpões
Sereias e serpentes
Que te rabiscam
O corpo todo
Mas não sentes
Originalmente composta para a peça “Calabar” que Chico 
produziu com Ruy Guerra, “Tatuagem”, assim como todas as 
canções que o autor compôs para várias peças teatrais, não
se limita ao contexto da peça, apresentanto, então, um
caráter universal.
“Tatuagem” revela o desejo feminino de fazer parte do corpo
do amante através de uma subordinação voluntária e 
consciente. A imagem de continuidade se reproduz ao longo
do texto, as estrofes construídas em paralelismo revelam o 
desejo do eu-feminino de ser parte do seu homem e 
expressam a sua necessidade de completude.
A última estrofe reafirma a metáfora “tatuagem”a través da 
forma que ela popularmente assume:
“Corações de mãe, arpões, sereias e serpentes”.
Quando olhaste bem nos olhos meus
E o teu olhar era de adeus
Juro que não acreditei
Eu te estranhei
Me debrucei
Sobre teu corpo e duvidei
E me arrastei e te arranhei
E me agarrei nos teus cabelos
No teu peito (Nos teus pelos)*
Teu pijama
Nos teus pés
Ao pé da cama
Sem carinho, sem coberta
No tapete atrás da porta
Reclamei baixinho
Dei pra maldizer o nosso lar
Pra sujar teu nome, te humilhar
E me vingar a qualquer preço
Te adorando pelo avesso
Pra mostrar que inda sou tua
Só pra provar que inda sou tua...
Atrás
(1972) Chico Buarque
da porta
eF rancis Hime
*verso original vetado pela censura
“Atrás da porta” é a primeira parceria da dupla Francis Hime
e Chico Buarque. Chico compôs a primeira parte da música
em público, algo que nunca havia feito e nunca voltaria a 
fazer, enquanto Francis cantarolava em um piano. A segunda 
parte só foi composta quando a primeira já estava gravada 
com a voz da intéprete, Elis Regina.
A música revela um intenso dilaceramento devido ao conflito
da separação, o título enfatiza a barreira que se instala entre
 
o casal pela porta que se fecha.O texto segue revelando a 
perda da auto-estima e autocontrole, a dignidade é rebaixada 
ao nível da humilhação e a repetição do “r” dimensiona o 
rastejar da mulher abandonada.
A segunda estrofe pode ser sintetizada pela imagem “Te
adorando pelo avesso”.U ma separação mostrada quase que
cinematograficamente. O distanciamento do amante em
relação à mulher abandonada corresponde ao rebaixamento
de altura de um ser humano em pé, ao chão.
Bastidores
(1979)Chico Buarque
Cantei, cantei
Como é cruel cantar assim
E num instante de ilusão
Te vi pelo salão
A caçoar de mim
Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
E me tranquei no camarim
Tomei o calmante, o excitante
E um bocado de gim
Amaldiçoei
O dia em que te conheci
Com muitos brilhos me vesti
Depois me pintei, me pintei
Me pintei, me pintei
Não me troquei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar
Cantei cantei
Nem sei como eu cantava assim
Só sei que todo o cabaré
Me aplaudiu de pé
Quando cheguei ao fim
Mas não bisei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar
Cantei cantei
Jamais cantei tão lindo assim
E os homens lá pedindo bis
Bêbados e febris
A se rasgar por mim
Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
Tarso de Castro, que estava produzindo o novo disco de 
Caubby Peixoto, pediu uma música para Chico. O autor, que
não tinha composição nova, propôs “Bastidores”, porém
preveniu que já havia sido gravada na voz de sua irmã,
Cristina. Não se sabe porque, mas o disco do cantor saiu 
primeiro, e sua performance excepcional fez com que ele
voltasse às paradas de sucesso. Cristina acabou nos 
bastidores da canção feita para ela.
Em “Bastidores”, o rompimento da relação conjugal é tratada
em tom de desespero. Identifica-se a presença da mesma
dor que destrói nos bastidores e constrói nos palcos. E esses 
dois momentos alternams-e entre aplausos e prantos, brilhos
e lágrimas. A dor intensa que leva a personagem a cometer 
atos desatinados também a impulsiona a mascarar-se para
o palco. Os dois últimos versos, que retomam os dois 
primeiros, sugerem a implacável solidão do sofrimento.
O poeta enfatiza o paradoxo das situações geradas pela 
mesma dor, e realça seus efeitos sobre a criação artística.
A Rita
(1965) Chico Buarque
A Rita levou meu sorriso
No sorriso dela
Meu assunto
Levou junto com ela
O que me é de direito
E Arrancou-me do peito
E tem mais
Levou seu retrato, seu trapo, seu prato
Que papel!
Uma imagem de São Francisco
E um bom disco de Noel
A Rita matou nosso amor
De vingança
Nem herança deixou
Não levou um tostão
Porque não tinha não
Mas causou perdas e danos
Levou os meus planos
Meus pobres enganos
Os meus vinte anos
O meu coração
E além de tudo
Me deixou mudo
Um violãoSamba suave que conduz o lamento poético de quem foi
abandonado. Como nas músicas de Noel Rosa, poeta da
velha geração a quem Chico faz referência na música, a 
mulher cantada é pintada como ingrata, talvez infiel.
Rita se foi, não se sabe bem porque, e levou com ela, não 
somente suas coisas (retrato, trapo, prato), levou também a 
alegria de seu ex parceiro (meu sorriso, meu assunto).
Observamos as graves consequências que a partida de Rita
teve para seu amante, que, amargurado, se queixa de ter 
seus planos, seus enganos, sua juventude e seu coração
levados pela mulher amada.
Entretanto, a pior consequência do abandono, como fica
evidente nos três últimos versos, pode ter sido o violão
emudecido pela dor da separação.
Os Calcados,
Uma linha pré-existente e já em uso na fábrica de calçados
Mix Brasil da cidade de Jaú foi definida como base para os
calçados desse projeto. O propósito é evidenciar quantos
modelos diferentes é possível criar a partir de uma mesma
base, dentro de uma mesma linha.
As personagens das canções apresentam diferentes 
comportamentos, reações, sentimentos e classes sociais,
mas ao mesmo tempo elas revelam algo em comum, são 
todas mulheres de Chico Buarque. O compositor, neste caso,
é a base que compõe a “linha” de seus diferentes modelos de
mulher.
Assim como as personagens, os calçados de “Calçando 
Canções” possuem uma mesma base e compõe uma linha.
Todos partiram de uma mesma forma, apresentam o mesmo 
salto, sola e meia pata, variando apenas os materiais usados 
para revestimento, as cores e o modelo de cabedal.
Folhetim
O calçado de “Folhetim” retrata a postura da personagem
em relação aos seus homens, suas conquistas. Simboliza, à
primeira vista, a atração, o domínio e, subsequentemente, o 
desprezo do eu lírico feminino perante seus amantes.
O modelo é um peep toe nada casual, para ocasiões em que
a mulher se veste para o triunfo. Confeccionado em cetim
cor de rosa choque com drapeado na traseira, o calçado faz 
alusão às prendas (Sonho de Valsa, corte de cetim) que a 
personagem sugere ao amante que tiver renda. As pedras 
falsas fixadas na meia pata retratam todas as “prendas” que a 
protagonista já obteve ao longo de sua trajetória, nota-se,
também, sua desconsideração por tais presentes, já que as 
pedras estão “jogadas” de forma desordenada na superfície 
da meia pata, parte do calçado próxima à sola e ao chão. A
mulher de “Folhetim” desdenha de suas conquistas e “pisa”
em suas prendas.
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5. Calçado Paris Hilton1. Calçados Charlotte Olympia
2. Calçado Yves Saint Laurent
3. Rasteira Kate Spade
4. Plataforma Giuseppe Zanotti
Se eu fosse teu patrao
O calçado de “Se eu fosse teu patrão” representa o conflito
femino x masculino e patrão x empregado presente na 
música. O sapato inspira o desejo de se impor sobre o outro,
sugere poder e, principalmente, coloca a mulher na posição
de dominante.
O modelo apresenta elementos, como o couro verniz e as
costuras na frente do cabedal, normalmente presente nos 
sapatos sociais masculinos. Ou seja, ele apresenta traços de 
calçados regularmente usados por homens de classe social 
elevada, ou que ocupam cargos importantes, usualmente 
bem remunerados.
O salto, que por sua vez é revestido de sintético dourado 
metalizado, representa o pedestal sobre o qual a mulher se 
ergue para ostentar sua posição de domínio. O calçado é, 
portanto, a simbologia de suas conquistas, seu troféu.
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1. Sandália Zara
2. Sapato Florsheim da década de 1970
3. Scarpin Jimmy Choo
4. Oxford Maison Martin Margiela
5. Sapato Casadei
6. Peep toe Dorothy Perkins
7. Sapato Charlotte Olympia
Minha historia
O calçado de “Minha história” conta a versão da personagem
mãe do eu lírico do poema. Fala de sua história de amor e 
desilusão com um marinheiro e de seu filho, fruto desse 
relacionamento.
O cabedal do modelo é confeccionado em tecido floral e
representa seu único velho vestido usado durante a gravidez,
suas cores remetem ao azul do mar e ao azul do manto de 
Nossa Senhora, já que, ao dar ao filho o nome de Jesus, ela
provavelmente se sentia um pouco Maria.
O salto revestido de corda e a fita que se prende ao pé
remetem ao fato da personagem ter ficado “amarrada”,
parada e pregada na pedra do porto esperando seu homem
do mar que não mais voltaria.
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5. Rasteira Blowfish
6. Espadrille Schutz
1. Espadrille Schutz
2. Plataforma Seychelles
3. Sandália Schutz
4. Calçado Naughty Monkey
Tatuagem
O calçado de “Tatuagem” representa o desejo de 
continuidade do eu feminino e o seu anseio em fazer parte 
de seu amante, convertendo-se em uma espécie de 
prolongamento do ser amado.
O modelo fechado feito em Nobuck cor nude exibe uma 
textura agradável ao toque, simbolizando a continuidade da
pele. O calçado, neste caso, atua como prolongamento do 
ser que o calça.
O diferencial desse modelo encontra-se no solado,
o desenho criado pela designer e tatuadora Simone 
Domingos estampa a sola do calçado e faz referência à 
última estrofe da canção: “Corações de mãe, arpões, sereias
e serpentes”.
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1. Calçados Taylor Reeve
2. Calçado meia pata AX Paris
3. Calçado meia pata Taylor Reeve
4. Calçado meia pata Taylor Reeve
Atras da porta
O calçado de “Atrás da porta” representa o dilaceramento
intenso vivido pela personagem devido à quebra de sua 
união. Entretanto, tal dilaceramento é mostrado de maneira
sutil por um calçado clássico, já que a mulher da canção não 
toma drásticas atitudes depois do desespero demonstrado
logo assim que o rompimento acontece. Ela apenas agoniza 
no tapete atrás da porta, chora baixinho, difama e se percebe 
ainda pertencente ao ser amado que a deixou.
O modelo é inspirado no Chanel clássico em verniz bege 
com detalhe em preto na biqueira. O diferencial está nas 
“amarras”, o calçado possui duas fivelas quando o normal
seria apenas uma. Esse “exagero” de tiras que se prendem
ao pé faz alusão à forma com que a personagem se prende 
ao amado. Originalmente, o calçado foi projetado para
apresentar a maior parte do cabedal virada do avesso,
deixando-o exposto e retomando o verso “Te adorando pelo 
avesso”, o que não foi tecnicamente viável.
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1. Calçado Kelsi Dagger
2. Chanel com meia pata Yves Saint Laurent
3. Calçado Yves Saint Laurent
4. Ankle boot Chanel
Bastidores
O calçado de “Bastidores” representa tanto o glamour dos
palcos quanto a profunda dor e desespero que assolam a 
personagem.
O modelo, uma sandália pensada para encantar nos palcos,
 
foi confeccionado em veludo fazendo alusão às cortinas de
um espetáculo que se abrem para a performance da 
personagem que, por sua vez, arranca aplausos de todo 
cabaré. No entanto, o azul do material que remete a cor do 
zimbro, matéria prima na fabricação do Gim, inspira tristeza,
embriaguez e prantos.
Assim como a canção, o calçado melancólico e deslumbrante
é paradoxal por retratar a contradição da dor que edifica nos 
palcos e aniquila nos bastidores.
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1. Slipper Del Toro
2. Slipper Giuseppe Zanotti
3. Calçado Dolce & Gabbana
4. Sandália Valentino
A Rita
A Rita partiu e levou mais que apenas seus pertences, e seu
calçado representa tudo que fora levado para longe do 
homem que chora por tê-la perdido.
A sandália de “A Rita” simboliza a “trouxa” em que a 
personagem carrega seus trapos, pratos e retratos, uma 
trouxa feita às pressas, quase como se Rita fugisse de seu
companheiro. O padrão xadrez nas cores vermelho e branco,
mais conhecido por estampar toalhas de mesa, sugerem
 
uma “mala” feita por quem tem pressa de partir. O nó no topo
do cabedal “amarra” tudo o que Rita leva consigo ao 
abandonar seu homem.
O salto ganha destaque ao ser revestido de verniz vermelho 
e faz alusão a um punhal ou estaca, simbolizando os 
coraçãos feridos que Rita deixa pelo seu caminho.
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1. Sandália e plataforma Charlotte Olympia
2. Calçado Kurt Geiger
3. Peep toe Christian Louboutin
4. Plataforma Charlotte Russe 
5. CalçadoCharlotte Olympia
Producao, ,
O processo de produção dos calçados teve seu início com os
desenhos técnicos, com eles é possível especificar a linha, 
os modelos, os detalhes, materiais, fivelas e tipos de costura.
O próximo passo foi passar os desenhos para o modelista,
profissional responsável por transformar os desenhos 
técnicos em moldes para o corte dos materiais.
Os moldes já prontos foram passados para o computador da
fábrica, e então para a máquina computadorizada de corte.
Depois dos cortes realizados, deu-se início à montagem dos
modelos.
Durante a montagem os modelos são colados, lixados e os
cabedais são, então, fixados à construção. O toque final é a 
limpeza de eventuais resíduos da superfície do calçado.
Os Calcados,
Folhetim
Se eu fosse teu patrao,
Minha historia,
Tatuagem
Atras da porta,
Bastidores
A Rita
Consideracoes, ,
O produto final como eu havia definido teoricamente no início
do projeto sofreu várias alterações e adaptou-se a cada 
etapa da concepção e produção.
Os tecidos para a confecção dos modelos de “A Rita” e 
“Folhetim” não se encontravam disponíveis na fábrica, foram
então, comprados em uma loja de tecidos e dublados em
uma empresa especializada para que adquirissem maior 
resistência para a confecção do calçado.
O modelo de “Atrás da Porta”, como consta no relatório,
deveria ter sido montado do avesso, o que na realidade não 
aconteceupor inviabilidades técnicas.
O modelista não trabalha para a fábrica que produziu os 
protótipos, o que dificultou a comunicação e resultou em
vários pequenos defeitos nos moldes, corrigidos em parte,
posteriormente.
A fábrica que se disponibilizou para produzir os modelos está
localizada em Jaú, por isso não acompanhei a produção tão
de perto quanto eu gostaria. Além disso, o projeto teve de se
adaptar às condições da fábrica, isso inclui forma, materiais
e principalmente o tempo que eles poderiam trabalhar nos 
calçados do projeto.
O projeto que inicialmente seria composto de uma linha de
calçados e um ensaio fotográfico estilo editorial de moda teve
de ser resumido. O ensaio não foi realizado devido aos
prazos do modelista, da fábrica e da entrega do trabalho.
Encomendar uma linha de calçados a uma fábrica não é algo
economicamente viável nem para a fábrica, que teria de 
produzir novas formas e procurar novos materiais para
apenas alguns pares de calçados, nem para o cliente, que 
teria de pagar por essas novas matrizes. Portanto é um
projeto sujeito a diversas adaptações e diversos favores.
Conclusao,
Com o projeto “Calçando Canções” conclui-se que, a partir
do design, é possível transcender música, literatura e poesia
e criar seguindo não somente especificações técnicas.
Quando a análise de produtos similares deixa de ser a parte
mais importante da metodologia do projeto é quando o 
design se mostra mais criativo.
Projetar e criar a partir de canções, palavras e pinturas foi o
que mais me chamou atenção no meu primeiro período no 
curso de Design. E assim como nas disciplinas de Plástica,
eu encerro meus projetos como graduanda em Design 
compondo a partir daquilo que me inspira. Orientada pelo 
professor cuja metodologia de ensino me intrigava e 
inspirava quando caloura, hoje eu concebo, como trabalho de 
conclusão de curso, produtos de design singular na essência,
calçados criados através da materialização da percepção 
sonora.

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