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MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 1 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 2 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br Como tirar o melhor proveito deste E-BOOK? Material liberado para vocês se prepararem com questões discursivas para os concursos que fazem tal exigência, como Delegado PC-AL, GO, DF, RS e outros que estão por sair. Nos meus cursos, tal como neste material, coloco algumas diretrizes para potencializar o estudo de vocês: 1. Cada questão deste material é acompanhada de um material de leitura/julgados e da nossa sugestão de resposta. Nunca leia a sugestão de resposta sem tentar responder a questão. A fim de que a sua resposta não seja um completo chute, excepcionalmente, estude o material de leitura/julgados para depois responder. Quando isso acontecer, a sugestão é que o estudo ocorra em um dia e, a elaboração da sua resposta, no dia seguinte. Isso serve, inclusive, como diretriz de estudo para discursivas em geral. 2. Utilizamos como limite um padrão de 15 linhas para a sua resposta. Contudo, utilize o quantitativo de linhas de acordo com o edital da prova que você fará! 3. Vamos continuar o nosso treinamento? 2º E-BOOK DE QUESTÕES DISCURSIVAS AUTORAIS • Após o sucesso do 1ª ebook, lançamos esse! • 53 questões discursivas e autorais em mais de 300 páginas; • Cada questão composta por ficha de pontuação, material de leitura e ficha de resposta; e • Temas atuais, jurisprudências recentes e material atualizado. 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Sobre o tema, analise a evolução jurisprudencial e indique o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal. Versão Definitiva da Questão Dissertativa 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 https://www.brunozanotti.com.br/ebook-discursivas MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 5 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br 20 DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS: Julgado 1 STF Julgado 2 STF Português (0,2 por erro) NOTA FINAL MATERIAL DE LEITURA E/OU JULGADOS SOBRE O TEMA: Para o STJ, não substitui a exigência de um mandado de busca e apreensão a mera autorização do morador para entrada na sua residência sem a comprovação, por parte dos policiais, da prova da legalidade e da voluntariedade de tal consentimento. Sobre o tema, o STJ1 fixou cinco teses centrais a serem seguidas pelas polícias: 1) Na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito. 2) O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado como crime de natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado no domicílio onde supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso decorrente da obtenção de mandado judicial se possa, objetiva e concretamente, inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada. 3) O consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou coação. 4) A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo, e preservada tal prova enquanto durar o processo. 5) A violação a essas regras e condições legais e constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal dos agentes públicos que tenham realizado a diligência. Observe que essa decisão determinou, com eficácia erga omnes, que as polícias do país gravem em vídeo a permissão dos moradores todas as vezes que precisarem invadir uma residência sem ordem judicial e fora das hipóteses legalmente previstas. Via de consequência, houve a 1 HC 598.051/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 02/03/2021. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 6 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br imposição de um ônus ao Poder Executivo, com um custo financeiro para o Estado, em razão da necessidade de aparelhar as polícias e fazer a aquisição de câmeras para gravação. Essa decisão chegou ao STF2 e, para oMinistro Alexandre de Moraes, a decisão do STJ foi equivocada por 2 motivos: • A natureza do Habeas Corpus não permite sua utilização de forma abrangente e totalmente genérica para que alcance indiscriminado a todos os processos; e • A decisão extrapolou a competência do STJ, ao restringir as hipóteses constitucionais de inviolabilidade do domicílio, inovando em matéria constitucional, de modo a criar uma nova exigência – a gravação audiovisual da autorização do morador - não prevista no artigo 5º, inciso XI, da CF. Em síntese, nas palavras do Ministro Alexandre de Moraes, "é incabível ao Poder Judiciário, em sede de Habeas Corpus individual, determinar ao Poder Executivo que faça o aparelhamento de suas polícias como medida obrigatória para executar buscas domiciliares, sob o argumento de serem necessárias para evitar eventuais abusos e ilegalidades". No entanto, em novo capítulo sobre o tema, o STF entendeu que o local adequado para fixação de tal obrigação seria em sede de ADPF, cujo julgamento naturalmente possui efeito erga omnes. Ao julgar a ADPF nº 635, em 3/2/2022, entre várias medidas, o Tribunal consignou a obrigatoriedade de o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 dias, instalar equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos. Sobre o tema: DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS Plano de redução de letalidade policial e controle de violações de direitos humanos - ADPF 635 MC-ED/RJ Resumo: O Estado do Rio de Janeiro deve elaborar, no prazo máximo de 90 dias, um plano para redução da letalidade policial e controle das violações aos direitos humanos pelas forças de segurança, que apresente medidas objetivas, cronogramas específicos e previsão dos recursos necessários para a sua implementação. Nesse mesmo sentido, até que plano mais abrangente seja formulado, o emprego e a fiscalização da legalidade do uso da força devem ser feitos à luz dos “Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei”, com todos os desdobramentos daí derivados. Desse modo, cabe às forças de segurança a análise, diante das situações concretas, da proporcionalidade e da excepcionalidade do uso da força, servindo os princípios como guias para o exame das justificativas apresentadas a fortiori. Portanto, o uso da força letal por agentes de Estado só se justifica quando, ressalvada a ineficácia da elevação gradativa do nível da força empregada para neutralizar a situação de risco ou de violência, exauridos os demais meios, inclusive os de armas não-letais, e 2 RE 1.342.077, Min. Alexandre de Moraes, julgado em 2/12/2021. http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5816502 http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5816502 http://portal.stf.jus.br/assets/audio/1042/2.mp3 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 7 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br necessário para proteger a vida ou prevenir um dano sério, decorrente de uma ameaça concreta e iminente. Ademais, nos termos do art. 227 da Constituição Federal, é imperiosa a necessidade de dar prioridade absoluta às investigações de incidentes que tenham como vítimas crianças ou adolescentes. Além disso, a fim de resguardar o direito à vida, deve-se reconhecer a obrigatoriedade de disponibilização de ambulâncias em operações policiais previamente planejadas em que haja a possibilidade de confrontos armados. De igual modo, no caso de buscas domiciliares por parte das forças de segurança do Estado do Rio de Janeiro, devem ser observadas as seguintes diretrizes constitucionais, sob pena de responsabilidade: (i) a diligência, no caso específico de cumprimento de mandado judicial, deve ser realizada somente durante o dia, vedando-se, assim, o ingresso forçado a domicílios à noite; (ii) a diligência, quando feita sem mandado judicial, deve estar lastreada em causas prévias e robustas que indiquem a existência de flagrante delito, não se admitindo que informações obtidas por meio de denúncias anônimas sejam utilizadas como justificativa exclusiva para a deflagração de ingresso forçado em domicílio; (iii) a diligência deve ser justificada e detalhada por meio da elaboração de auto circunstanciado, que deverá instruir eventual auto de prisão em flagrante ou de apreensão de adolescente por ato infracional e ser remetido ao juízo da audiência de custódia para viabilizar o controle judicial posterior; e (iv) a diligência deve ser realizada nos estritos limites dos fins excepcionais a que se destina. Por fim, o Estado do Rio de Janeiro deve, no prazo máximo de 180 dias, instalar equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos. Com base nesses e em outros fundamentos, o Plenário acolheu parcialmente embargos de declaração em medida cautelar em arguição de descumprimento de preceito fundamental. ADPF 635 MC-ED/RJ, relator Min. Edson Fachin, julgamento em 2 e 3.2.2022 Síntese dos 8 pontos centrais da ADPF das favelas (fonte: dizer o direito): O STF determinou que: 1) o Estado do Rio de Janeiro elabore e encaminhe ao STF, no prazo máximo de 90 dias, um plano para redução da letalidade policial e controle das violações aos direitos humanos pelas forças de segurança, que apresente medidas objetivas, cronogramas específicos e previsão dos recursos necessários para a sua implementação. 2) o emprego e a fiscalização da legalidade do uso da força sejam feitos à luz dos Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei. 3) seja criado um grupo de trabalho sobre Polícia Cidadã no Observatório de Direitos Humanos localizado no Conselho Nacional de Justiça; 4) nos termos dos Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, só se justifica o uso da força letal por agentes http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5816502 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 8 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br de Estado quando, ressalvada a ineficácia da elevação gradativa do nível da força empregada para neutralizar a situação de risco ou de violência, exauridos os demais meios, inclusive os de armas não-letais, e necessário para proteger a vida ou prevenir um dano sério, decorrente de uma ameaça concreta e iminente. 5) as investigações de incidentes que tenham como vítimas crianças ou adolescentes terão a prioridade absoluta; 6) No caso de buscas domiciliares por parte das forças de segurança do Estado do Rio de Janeiro, devem ser observadas as seguintes diretrizes constitucionais, sob pena de responsabilidade: (i) a diligência, no caso específico de cumprimento de mandado judicial, deve ser realizada somente durante o dia, vedando-se, assim, o ingresso forçado a domicílios à noite; (ii) a diligência, quando feita sem mandado judicial, deve estar lastreada em causas prévias e robustas que indiquem a existência de flagrante delito, não se admitindo que informações obtidas por meio de denúncias anônimas sejam utilizadas como justificativa exclusiva para a deflagração de ingresso forçado em domicílio; (iii) a diligência deve ser justificada e detalhada por meio da elaboração de auto circunstanciado, que deverá instruir eventual auto de prisão em flagrante ou de apreensão de adolescente porato infracional e ser remetido ao juízo da audiência de custódia para viabilizar o controle judicial posterior; e (iv) a diligência deve ser realizada nos estritos limites dos fins excepcionais a que se destina. 7) seja obrigatória a disponibilização de ambulâncias em operações policiais previamente planejadas em que haja a possibilidade de confrontos armados, sem prejuízo da atuação dos agentes públicos e das operações; 8) o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 dias, instale equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos. SUGESTÃO DE RESPOSTA: Em 2021, como exposto no texto da questão, o Superior Tribunal de Justiça fixou a obrigatoriedade de toda operação policial ser registrada em áudio e vídeo. O Supremo Tribunal Federal, contudo, cassou tal decisão, seja porque a natureza do Habeas Corpus não permite sua utilização de forma abrangente e totalmente genérica, seja porque a decisão extrapolou a competência do Superior Tribunal de Justiça, ao restringir as hipóteses constitucionais de inviolabilidade do domicílio, inovando em matéria constitucional. No entanto, em novo capítulo sobre o tema, o STF entendeu que o local adequado para fixação de tal obrigação seria em sede de ADPF, cujo julgamento naturalmente possui efeito erga omnes. Nessa linha, o Tribunal consignou a obrigatoriedade de o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 dias, instalar equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 9 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 10 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br QUESTÃO DISSERTATIVA O Supremo Tribunal Federal, em repercussão geral, julgou o Recurso Extraordinário nº 1055941 e decidiu pela constitucionalidade do compartilhamento de relatórios de inteligência financeira da UIF e procedimento fiscalizatório da Receita Federal para fins criminais sem autorização judicial. À luz da decisão, não se trata de cláusula de reserva de jurisdição, inexistindo violação de direitos constitucionais, como a privacidade, pois existe mera transferência de informações de um procedimento sigiloso para outro. Considerando a decisão mencionada, no curso de uma investigação criminal, o Delegado de Polícia requisita, sem autorização judicial, cópia de um procedimento fiscalizatório da Receita Federal. A atuação do Delegado de Polícia foi correta? Fundamente a sua resposta. Versão Definitiva da Questão Dissertativa 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 11 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS: Foi correta? Fundamento. Português (0,2 por erro) NOTA FINAL MATERIAL DE LEITURA E/OU JULGADOS SOBRE O TEMA: Processo RHC 82.233-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por maioria, julgado em 09/02/2022. DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL Dados fiscais. Requisição pelo Ministério Público. Autorização judicial. Ausência. Ilegalidade. DESTAQUE É ilegal a requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público. INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário 1.055.941/SP, em sede de repercussão geral, firmou a orientação de que é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional (Tema 990). Da leitura desatenta da ementa do julgado, poder-se-ia chegar à conclusão de que o entendimento consolidado autorizaria a requisição direta de dados pelo Ministério Público à Receita Federal, para fins criminais. No entanto, a análise acurada do acórdão demonstra que tal conclusão não foi compreendida no julgado, que trata da Representação Fiscal para fins penais, instituto legal que autoriza o compartilhamento, de ofício, pela Receita Federal, de dados relacionados a supostos ilícitos tributários ou previdenciários após devido procedimento administrativo fiscal. Assim, a requisição ou o requerimento, de forma direta, pelo órgão da acusação à Receita Federal, com o fim de coletar indícios para subsidiar investigação ou instrução criminal, além de não ter sido satisfatoriamente enfrentada no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, não se encontra abarcada pela tese firmada no âmbito da repercussão geral em questão. Ainda, as poucas https://processo.stj.jus.br/webstj/processo/justica/jurisprudencia.asp?tipo=num_pro&valor=RHC82233 http://www.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&cod_tema_inicial=990&cod_tema_final=990 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 12 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br referências que o acórdão faz ao acesso direto pelo Ministério Público aos dados, sem intervenção judicial, é no sentido de sua ilegalidade. Em um estado de direito não é possível se admitir que órgãos de investigação, em procedimentos informais e não urgentes, solicitem informações detalhadas sobre indivíduos ou empresas, informações essas constitucionalmente protegidas, salvo autorização judicial. Uma coisa é órgão de fiscalização financeira, dentro de suas atribuições, identificar indícios de crime e comunicar suas suspeitas aos órgãos de investigação para que, dentro da legalidade e de suas atribuições, investiguem a procedência de tais suspeitas. Outra, é o órgão de investigação, a polícia ou o Ministério Público, sem qualquer tipo de controle, alegando a possibilidade de ocorrência de algum crime, solicitar ao COAF ou à Receita Federal informações financeiras sigilosas detalhadas sobre determinada pessoa, física ou jurídica, sem a prévia autorização judicial. Assim, é ilegal a requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público. SUGESTÃO DE RESPOSTA: A decisão do Supremo Tribunal Federal constitui importante precedente para fins de compartilhamento de dados pela Receita Federal. Contudo, isso não importa na desnecessidade de autorização judicial pelo Delegado de Polícia quando esse, de sua iniciativa, buscar o acesso a tais informações sigilosas. De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, uma coisa é órgão de fiscalização financeira, dentro de suas atribuições, identificar indícios de crime e comunicar suas suspeitas aos órgãos de investigação para que, dentro da legalidade e de suas atribuições, investiguem a procedência de tais suspeitas. Outra, é o Delegado de Polícia, sem qualquer tipo de controle, alegando a possibilidade de ocorrência de algum crime, solicitar à Receita Federal informações financeiras sigilosas detalhadas sobre determinadapessoa, física ou jurídica, sem a prévia autorização judicial. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 13 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br QUESTÃO DISSERTATIVA O foro por prerrogativa passou por sensíveis limitações nos últimos anos, com uma atuação do Supremo Tribunal federal e do Superior Tribunal de Justiça no sentido de diminuir a sua incidência em cenários que, até então, eram de incidência típica de tal prerrogativa. Sobre o tema, em uma investigação envolvendo promotor de justiça por fato sem relação à função, o Delegado de Polícia deverá solicitar autorização do respectivo foro para instaurar o inquérito policial? E se for hipótese de investigação envolvendo o Governador do Estado em fato sem relação ao mandato? E, por fim, se for hipótese de investigação envolvendo um vereador por fato ocorrido no curso do mandato e em razão deste, com foro previsto no respectivo Tribunal de Justiça? As respostas devem acompanhar a atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Versão Definitiva da Questão Dissertativa 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 14 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS: Promotor de Justiça Deputado Estadual Vereador Português (0,2 por erro) NOTA FINAL MATERIAL DE LEITURA E/OU JULGADOS SOBRE O TEMA: 1. Distinguindo entendimentos sobre a incidência do foro por prerrogativa de função entre o STF e o STJ A principal finalidade do inquérito policial é apurar a autoria e a materialidade das infrações penais, de modo a contribuir na formação do convencimento (opinio delicti) do Ministério Público e, excepcionalmente, da vítima (querelante). No entanto, é possível que, no curso da investigação criminal, o Delegado de Polícia verifique que um dos autores seja um cidadão que possua foro por prerrogativa de função. Diante do exposto, questiona-se: A Autoridade Policial possui atribuição para investigar um cidadão que possua foro por prerrogativa de função? A questão foi amplamente debatida na Pet 3825 QO,3 julgada em 2007, pelo STF. De um lado, o Ministro Sepúlveda Pertence se posicionou pela possibilidade de a Autoridade Policial investigar pessoas com foro por prerrogativa de função, e, por outro lado, o Ministro Gilmar Mendes, que inclusive liderou seus pares, entendeu que o Delegado de Polícia não possui atribuição para investigar pessoas com foro por prerrogativa de função. O Ministro Sepúlveda Pertence4 motivou sua decisão em três fundamentos: (a) a instauração de inquérito policial para a apuração de fato em que se verifique a possibilidade de envolvimento de titular de foro por prerro-gativa de função não depende de iniciativa do Ministério Público vinculado ao respectivo Tribunal, nem o mero indiciamento formal reclama prévia decisão de um Desembargador desse Tribunal; (b) tanto a abertura das investigações de qualquer fato delituoso, quanto, no curso delas, o indiciamento formal, são atos privativos do Delegado de Polícia que preside o inquérito policial; e (c) a prerrogativa de foro do suposto autor do fato delituoso é critério exclusivo para determinar a competência jurisdicional originária do Tribunal respectivo, quando do oferecimento da denúncia ou, eventualmente, antes dela, se se fizer necessária diligência sujeita à prévia autorização judicial, não abrangendo o procedimento investigatório prévio. Por outro lado, de acordo com o Ministro Gilmar Mendes,5 se a Constituição Federal estabelece, por exemplo, que os agentes políticos respondem, por crime comum, perante o STF (CF, art. 102, I, b), não há razão constitucional plausível para que as atividades diretamente relacionadas à supervisão judicial (abertura de procedimento investigatório) sejam retiradas do controle judicial do STF, devendo, portanto, a iniciativa do procedimento investigatório ser confiada ao MPF com a supervisão do Ministro-Relator do STF. 3. Pet 3825 QO, Relator(a): Min. Sepúlveda Pertence, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 10/10/2007. 4. Pet 3825 QO, Relator(a): Min. Sepúlveda Pertence, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 10/10/2007. 5. Pet 3825 QO, Relator(a): Min. Sepúlveda Pertence, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 10/10/2007. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 15 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br O Ministro Sepúlveda Pertence foi voto vencido e fixou-se o entendimento de que não é qualquer suposto autor de crime que pode ser investigado em um inquérito policial. Apesar de a Constituição Federal indicar somente o órgão competente para o julgamento das autoridades com foro por prerrogativa de função e silenciar acerca do procedimento investigatório preparativo para a ação penal, o Pretório Excelso entende que o foro por prerrogativa de função se estende também à etapa da investigação criminal. Em síntese, no que diz respeito às autoridades com foro no STF, o Tribunal6 entende que a abertura do procedimento investigativo, as medidas cautelares e o indiciamento pela Autoridade Policial estão condicionados à autorização do Ministro relator da causa no STF. Nessas hipóteses, a abertura do procedimento ou ato de indiciamento pela Autoridade Policial apresenta-se como ato complexo por depender de duas vontades para a sua efetivação. Segue um exemplo para ilustrar a questão. Trata-se da quebra do sigilo bancário feita pelo STF em 2018 em face do Presidente da República, a fim de instruir inquérito policial em andamento relativo ao “Decreto dos Portos”, onde supostamente houve favorecimento a determinada empresa. Como um Presidente da República possui foro por prerrogativa de função no STF, cabe a esse Tribunal decidir sobre as medidas cautelares relativas às investigações criminais em curso. E mais, nos casos em que o investigado com foro por prerrogativa de função é identificado no curso da investigação criminal, ainda assim é necessária a remessa ao Tribunal competente. Nas palavras do STF7, “a prerrogativa de foro enseja a imediata remessa do inquérito à corte competente e não seu trancamento automático por nulidade processual”. Contudo, a caracterização do foro reclama que a participação da autoridade deva estar fundamentada em elementos de informação aptos a provocar a convicção de que pode realmente ter havido algum envolvimento dessa autoridade com prerrogativa. Em outras palavras, a caracterização do foro não pode decorrer de meras alusões genéricas mencionando o nome da autoridade, sendo imprescindíveis, para tanto, elementos de informação aptos a provocar a convicção de que pode realmente ter havido algum envolvimento da autoridade com prerrogativa.8 No mesmo sentido é a posição do STJ: A mera presença de autoridade com foro por prerrogativa de função em conversas captadas por meio de procedimento de interceptação telefônica não é suficiente para determinar a imediata remessa dos autos ao foro competente em razão da pessoa. Este procedimento deve ser tomado após exame acerca da idoneidade e da suficiência dos dados colhidos para se firmar o convencimento acerca do possível envolvimento do detentor de prerrogativa de foro com a prática dos fatos apurados. Precedentes.9 Por outro lado, em relação aos foros por prerrogativa dos demais Tribunais, as duas turmas do STJ seguemlinha distinta da sistemática presente no STF. O STJ faz uma interpretação restritiva do entendimento acima apresentado, no sentido de que o posicionamento do STF sobre o tema se aplica somente ao respectivo Tribunal, uma vez que a extensão do foro por prerrogativa de função à etapa investigativa decorre exclusivamente de determinação presente no Regimento Interno do STF. Nessa linha, para o STJ, o Delegado de Polícia pode investigar e indiciar pessoas com foro por prerrogativa de função sem ingerência do respectivo Tribunal; a única ressalva seria eventual medida cautelar que deve ser encaminhada ao Tribunal de foro para análise da representação. Segue o entendimento da 5ª Turma do STJ: 10 6. Inq 2411 QO, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 10/10/2007. 7 RHC 122338 AgR, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 22/03/2019. HC 153417 ED-segundos, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 12/03/2019. 8 HC 153417 ED-segundos, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 12/03/2019. 9 HC 482.175/GO, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 19/03/2019. 10 RHC 79.910/MA, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 26/03/2019. No mesmo sentido, julgado analisando de forma mais específica o ato de indiciamento: AgRg MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 16 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br 1. No que concerne às investigações relativas a pessoas com foro por prerrogativa de função, tem- se que, embora possuam a prerrogativa de serem processados perante o tribunal, a lei não excepciona a forma como se procederá à investigação, devendo ser aplicada, assim, a regra geral trazida no art. 5º, inciso II, do Código de Processo Penal, a qual não requer prévia autorização do Judiciário. "A prerrogativa de foro do autor do fato delituoso é critério atinente, de modo exclusivo, à determinação da competência jurisdicional originária do tribunal respectivo, quando do oferecimento da denúncia ou, eventualmente, antes dela, se se fizer necessária diligência sujeita à prévia autorização judicial" (Pet 3825 QO, Relator p/ acórdão: Min. Gilmar Mendes, Pleno, julgado em 10/10/2007). Precedentes do STF e do STJ. 2. Não há razão jurídica para condicionar a investigação de autoridade com foro por prerrogativa de função a prévia autorização judicial, sendo certo que a garantia constitucional diz respeito tão somente ao processamento e ao julgamento de eventual ação penal movida em desfavor de ocupante de cargo cujo status constitucional assegure privilégio de foro, de modo a evitar persecução criminal infundada. Por isso, não há que se falar em nulidade quando o procedimento de investigação instaurado pelo Ministério Público prossegue sem a chancela do Poder Judiciário, pois trata-se de procedimento pré-processual, não acobertado pela garantia de foro especial. 3. Em resumo: a) O Código de Processo Penal prevê, como primeira hipótese, a instauração de inquérito policial ex officio pela Polícia Judiciária, em cumprimento de seu dever constitucional, sem necessidade de requerimento ou provocação de qualquer órgão externo; b) O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 593.727/MG, assentou a concorrência de atribuição entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária para realizar investigações criminais; c) Sendo assim, a mesma sistemática é válida tanto para procedimentos investigatórios ordinários quanto para investigações que envolvam autoridades com prerrogativa de função; d) Por constituírem limitações ao poder de investigação conferido pela Constituição Federal à Polícia Judiciária e ao Ministério Público, as hipóteses em que a atividade investigatória é condicionada à prévia autorização judicial exigem previsão legal expressa - REsp n. 1.697.146/MA, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 9/10/2018, DJe 17/10/2018. No mesmo diapasão: RHC n. 93.723/PE, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 7/8/2018, DJe 15/8/2018 e RHC n. 73.829/CE, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 31/05/2017. 4. A defesa tem razão quando sustenta que a quebra de sigilo bancário, além de outras medidas acobertadas pela reserva de jurisdição, devem partir do Juízo competente para o julgamento da ação principal. (...) E o STF, está de acordo com tal entendimento do STJ? Inicialmente, as duas Turmas do STF divergiam sobre o tema. De acordo com a 1ª Turma do STF11, “o ato de instauração de inquérito ou procedimento investigatório contra Prefeitos Municipais independe de autorização do Tribunal competente para processar e julgar o detentor da prerrogativa de foro”. De forma mais incisiva, vale citar parte do inteiro teor deste julgado: “Nessa toada, como bem salientou o parecer ministerial: no que concerne às investigações relativas a pessoas com foro por prerrogativa de função, tem-se que, embora possuam a prerrogativa de serem processados perante o tribunal, a lei não excepciona a forma como se procederá à investigação, devendo ser aplicada, assim, a regra geral trazida no art. 5º, inciso II, do Código de Processo Penal, a qual não requer prévia autorização do Judiciário”. no HC 404.228/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 01/03/2018. No mesmo sentido, a 6ª Turma do STJ: AgRg no AREsp 1541633/PR, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/10/2020. 11 HC 177992 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 23/08/2021. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 17 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br Por outro lado, para a 2ª turma do STF12, "é indispensável a existência de prévia autorização judicial para a instauração de inquérito ou outro procedimento investigatório em face de autoridade com foro por prerrogativa de função em TJ." O tema teve novo avanço em meados de 2022. Por unanimidade, em 16/05/2022, o STF13 validou dispositivo do regimento interno do Tribunal de Justiça do Amapá que incluiu, entre as atribuições do desembargador-relator, a prerrogativa de autorizar a instauração de inquérito, a pedido do procurador-geral de Justiça, contra autoridades com prerrogativa de foro no tribunal. De acordo com o voto da Relatora, a Ministra Cármem Lúcia, “quanto à necessidade de supervisão judicial dos atos investigatórios, tem-se, pela interpretação sistemática da CF/88 e com fulcro na jurisprudência consolidada desta Corte, que o mesmo tratamento conferido às autoridades com foro por prerrogativa de função no STF deve ser aplicado, por simetria, àquelas com foro em outros tribunais, em observância ao princípio da isonomia, que garante o mesmo tratamento aos que estejam em situação igual”. Nessa linha, o STF abre divergência clara em relação ao STJ, quando caracterizado o foro por prerrogativa de função, em razão da necessidade de prévia autorização do respectivo foro para instaurar investigação, para indiciar e para eventual medida cautelar. 2 . Foros por prerrogativa de função na Constituição Federal A Constituição Federal criou inúmeros foros por prerrogativas de função. Segue um quadro com todas as hipóteses nela previstas: AUTORIDADE FORO COMPETENTE 1. Presidente e Vice-Presidente da República, Deputados Federais e Senadores, Ministros do STF, Procurador-Geral da República, Ministros de Estado, Advogado-Geral da União, Comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica, Ministros do STJ, STM, TST e TSE, Ministros do TCU, Chefes de missão diplomática de caráter permanente STF 2. Governadores, Desembargadores(TJ, TRF e TRT), membros do TRE, conselheiros dos Tribunais de Contas, membros do MPU que oficiem perante tribunais STJ 3. Juízes Federais, Juízes Militares, Juízes do Trabalho, Membros do MPU de 1ª instância TRF ou TRE 4. Juízes de Direito, Promotores, Deputados Estaduais ou Distritais e Procuradores de Justiça. TJ ou TRE 5. Prefeitos TJ, TRF ou TRE 12 HC 201965/RJ, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento em 30.11.2021. 13 ADI 7083, Rel. Min. Cármen Lúcia, 13.05.2022. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 18 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br No que diz respeito ao quadro, o foro por prerrogativa dos Deputados Estaduais ou Distritais não estão expressamente previstos na Constituição Federal, mas o STJ14 entende que eles decorem implicitamente da Constituição Federal por aplicação do princípio da simetria em conjunto com os artigos 25 e 27, § 1º, da Constituição Federal. Sobre o tema, as Constituições Estaduais podem criar outras hipóteses de foro por prerrogativa de função para além daquelas previstas na Constituição Federal? O tema foi trabalhado nas ADI 2553, ADI 6515 e ADI 6508,15 julgadas em meados de 2021. Nos diversos precedentes, a Constituição Estadual criava foro por prerrogativa, por exemplo, para os procuradores de Estado, procuradores da assembleia legislativa, defensores públicos, delegados de polícia, vereadores e vice-prefeitos, de modo que todos fossem julgados perante o tribunal de justiça. Nos procedentes, o Supremo Tribunal Federal entendeu que tais foros são inconstitucionais. Contudo, um ponto final deve ser levantado: É possível a Constituição Estadual criar, com base no princípio da simetria, foros por prerrogativa de função? Essa é uma resposta complexa e a jurisprudência do STF variou muito recentemente: ADI 2553 2019 Não admite a ampliação do foro por prerrogativa no âmbito estadual com base no princípio da simetria (só a CF pode criar foros). ADI 6515 ADI 6508 Agosto de 2021 Admite a ampliação do foro por prerrogativa no âmbito estadual com base no princípio da simetria: ““É inconstitucional norma de constituição estadual que estende o foro por prerrogativa de função a autoridades não contempladas pela Constituição Federal de forma expressa ou por simetria”.” ADI 6506 Novembro de 2021. Não admite a ampliação do foro por prerrogativa no âmbito estadual com base no princípio da simetria (só a CF pode criar foros). “A Constituição Federal estabeleceu exceções ao duplo grau de jurisdição nas esferas federal, estadual e municipal, quanto a autoridades de todos os Poderes, de modo que não caberia aos Estados estabelecer, seja livremente, seja por simetria, prerrogativas de foro às autoridades não abarcadas pelo legislador constituinte”. ADI 6510 Abril de 2022. Admite a ampliação do foro por prerrogativa no âmbito estadual com base no princípio da simetria: “(Os Estados) devem observar, em razão do princípio da simetria, o modelo adotado na Carta Magna, sob pena de invalidade da prerrogativa de foro“ Nesse ponto, deve-se citar a Súmula Vinculante nº 45 do Supremo Tribunal Federal: “A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela constituição estadual”. 14 CC 105.227-TO, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 24/11/2010. 15 ADI 6501/PA e ADI 6508, ambas do relator Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 20.8.2021. ADI 2553/MA, rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, 15.5.2019 http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5971309 http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5971309 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 19 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br 3 . A questão da pertinência temática O foro por prerrogativa de função tem início com a diplomação, em relação aos cargos eletivos, ou com a posse, em relação aos cargos decorrentes de concurso público. Até o ano de 2018, o foro por prerrogativa de função, ou foro privilegiado, na interpretação adotada pelo Supremo Tribunal Federal, alcançava todos os crimes de que são acusados os agentes públicos, inclusive os praticados antes da investidura no cargo e os que não guardam qualquer relação com o seu exercício. Contudo, atualmente, o foro não abrange todos os crimes cometidos por essas autoridades, uma vez que o STF limitou a sua incidência para os casos com a pertinência temática devidamente comprovada. À luz do que decidido na AP 937 QO,16 a partir de 2018, a comprovação da pertinência temática envolve o preenchimento de dois requisitos cumulativos: • Requisito temporal: o crime deve ser praticado durante o exercício do cargo, sendo tal requisito de ordem objetiva (análise de marcos temporais delineados); • Requisito material ou substancial: o crime deve ter sido praticado em razão do cargo, sendo tal requisito de ordem subjetiva (faz-se necessário analisar à luz das provas o preenchimento do requisito). Preenchidos os dois requisitos, estará caracterizada a incidência do foro por prerrogativa de função. Atenção para a distinção jurisprudencial: • Foro no STF: a abertura do procedimento investigativo, as medidas cautelares e o indiciamento pela Autoridade Policial ficam condicionados à autorização do Ministro relator. • Foro no STJ e nos demais tribunais: somente as medidas cautelares ficam condicionadas à autorização do Ministro ou Desembargador relator, podendo o Delegado de Polícia abrir procedimento investigativo e indiciar independentemente do respetivo foro por prerrogativa. Contudo, como ficam os crimes em que os dois requisitos não estão preenchidos? Os crimes sem preenchimentos de tais requisitos não ficarão sob a supervisão do respectivo Tribunal, de modo que a abertura do procedimento investigativo e o indiciamento pela Autoridade Policial são feitos diretamente pelo Delegado de Polícia sem ingerência do Tribunal, do mesmo modo que as medidas cautelares serão representadas diretamente ao juiz de primeira instância. Observe o quadro mnemônico: SITUAÇÃO STF – CENÁRIO INVESTIGATIVO STJ e demais Tribunais – CENÁRIO INVESTIGATIVO 1. Crime cometido antes da diplomação Investigação e indiciamento pelo Delegado sem autorização do Tribunal. Medidas cautelares em 1ª instância. 2. Crime cometido após a diplomação e SEM relação com as funções 3. Crime cometido após a diplomação e COM relação com as funções Precisa de autorização do Tribunal para instauração do procedimento investigativo, indiciamento e medida cautelar. Investigação e indiciamento pelo Delegado sem autorização do Tribunal. Precisa de autorização do Tribunal somente para as medidas cautelares. 16 AP 937 QO, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/05/2018. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 20 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br OBS: Vale pontuar que essa informação está de acordo com o STJ e 1ª Turma do STF. Já que, para a 2ª Turma do STF, a investigação e o indiciamento precisam de autorização do respectivo Tribunal. 4. Crime ocorrido após o fim do mandato Investigação e indiciamento pelo Delegado sem autorização do Tribunal. Medidas cautelares em 1ª instância. Sobre o indiciamento pelo Delegado de Polícia em investigação envolvendo foro no STF, vale citar um importante detalhe. O Ministro Roberto Barroso, em decisão liminar, no INQ 4621, de 2018, autorizou o indiciamento por Delegado de Polícia, sem necessidadede prévia autorização do STF, em face do Presidente da República à época. No caso, prevaleceu o argumento de que o indiciamento seria legítimo e não dependeria de autorização judicial prévia, uma vez que o inquérito contra o Presidente da República foi instaurado e tramitou sempre sob a supervisão de Ministro do STF, pontuando, ainda, que o indiciamento é ato privativo da autoridade policial, nos termos da Lei n° 12.830/13. De acordo com o voto do Ministro, a autorização para prévio indiciamento somente seria necessária quando a investigação não tiver sido previamente autorizada pelo ministro relator. Sobre o indiciamento pelo Delegado de Polícia em investigação envolvendo os demais foros (STJ e demais Tribunais, vale citar decisão da 5ª Turma do STJ17 que denegou habeas corpus contra ato de Delegado de Polícia e “assentou o entendimento de que o mero indiciamento em inquérito policial, desde que não seja abusivo e ocorra antes do recebimento da exordial acusatória, não constitui manifesto constrangimento ilegal”. No mesmo sentido, a 1ª Turma do STF e, em sentido contrário (necessidade de prévia autorização do Tribunal), a 2ª Turma do STF, tal como explicado acima. 7. Delegado de Polícia pode investigar ou indiciar magistrado e membro do Ministério Público? O procedimento investigativo, em relação ao magistrado, consta do art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar nº 35 de 1979. Sempre que, no curso de uma investigação, houver indício da prática de crime por parte do magistrado, a Autoridade Policial deverá remeter os respectivos autos ao Tribunal ou órgão especial competente para o julgamento, a fim de que prossiga a investigação. Procedimento similar se aplica ao Promotor de Justiça em razão do art. 41, inciso II e parágrafo único, da Lei n° 8.625/1993. Nas duas hipóteses, o procedimento investigativo continuará no âmbito do Poder Judiciário ou do Ministério Público. De qualquer modo, o STJ e o STF admitem, no curso da investigação de supostos autores com foro por prerrogativa de função, a delegação à Polícia Civil ou Federal – a depender da atribuição de cada uma – de alguns atos da investigação: Não se sustentam os argumentos da impetração, ao afirmar que o inquérito transformou- se em procedimento da Polícia Federal, porquanto está apenas exerce a função de Polícia Judiciária, por delegação e sob as ordens do Poder Judiciário. Os autos demonstram tratar- se de inquérito que tramita no Superior Tribunal de Justiça, sob o comando de Ministro 17 AgRg no HC 404.228/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 01/03/2018. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 21 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br daquela Corte Superior de Justiça, ao qual caberá dirigir o processo sob a sua relatoria, devendo tomar todas as decisões necessárias ao bom andamento das investigações.18 O Delegado de Polícia, portanto, não pode presidir investigação ou indiciar magistrado e membro do Ministério Público. A presidência de tais investigações será feita, portanto, pelo Ministério Público ou pelo Poder Judiciário. SUGESTÃO DE RESPOSTA: No primeiro cenário, em uma investigação envolvendo promotor de justiça por fato sem relação à função, o Delegado de Polícia não poderá presidir o mencionado procedimento, devendo encaminhar o procedimento ao respectivo Procurador-Geral de Justiça para as deliberações necessárias. Se for hipótese de investigação envolvendo o Governador do Estado em fato sem relação ao mandato, o Delegado presidirá o procedimento, que não terá foro por prerrogativa envolvido, já que todo o procedimento terá curso perante o magistrado de primeiro grau. Por fim, se for hipótese de investigação envolvendo um vereador por fato ocorrido no curso do mandato e em razão deste, com foro previsto no respectivo Tribunal de Justiça, deve-se pontuar que tal foro é constitucional, consoante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, já que a Constituição Estadual pode regular tais foros em razão do princípio da simetria. Nessa hipótese, o Delegado presidirá o procedimento, que terá foro por prerrogativa no respectivo Tribunal de Justiça. 18. HC 94278, Relator(a): Min. Menezes Direito, Tribunal Pleno, julgado em 25/09/2008. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 22 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DIREITO PROCESSUAL PENAL QUESTÃO DISSERTATIVA A derrubada de um dos vetos do pacote anticrime pelo Congresso Nacional trouxe um tratamento diferenciado para a investigação envolvendo agentes da segurança pública, tema tratado, atualmente, no art. 14-A do CPP. Considerando o tema, indique o objeto investigativo da inovação legislativa inerente ao art. 14- A, bem como duas diretrizes legislativas que impactam nessa investigação. Versão Definitiva da Questão Dissertativa 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 23 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS: Objeto da Investigação • direcionado para qualquer procedimento investigativo • uso da força letal – consumada ou tentada, mesmo com cláusula de excludente de ilicitude • Qualquer agente do art. 144 da CF 2 diretrizes legislativas Português (0,2 por erro) NOTA FINAL MATERIAL DE LEITURA E/OU JULGADOS SOBRE O TEMA: INVESTIGAÇÃO EM FACE DE AGENTES DA SEGURANÇA PÚBLICA O tema foi inserido no art. 14-A do CPP pela Lei n° 13.964/19. Nos casos em que servidores vinculados às instituições dispostas no art. 144 da Constituição Federal figurarem como investigados em inquéritos policiais, inquéritos policiais militares e demais procedimentos extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou tentada, mesmo se for suposta hipótese de excludente de ilicitude, o indiciado poderá constituir defensor. A inovação legislativa trouxe nova obrigação legal ao Delegado de Polícia por ocasião da instauração do inquérito policial quando se tratar da situação narrada no parágrafo anterior, entendimento esse aplicável a qualquer procedimento investigativo à luz do disposto no mencionado artigo. De acordo com o art. 14, § 1º, do CPP, o investigado deverá ser citado da instauração do procedimento investigatório, podendo constituir defensor no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação. Tal ciência ao investigado é qualificada como uma decorrência do contraditório e da ampla defesa, de modo que toda a investigação policial não se efetue a sua revelia. Como colocado, existe a possibilidade de o investigado constituir defensor; contudo, sempre haverá a obrigatoriedade de um defensor acompanhar o procedimento, uma vez que, nos termos do art. 14, § 1º, do CPP, caso o investigado não constitua o defensor, “a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado”. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 24 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br Vale ressaltar que a novidade não decorre da participaçãodo advogado no procedimento, situação que já ocorre em qualquer investigação e tem previsão legal no estatuto da OAB (art. 7º, XXI, da Lei nº 8.906/94). A inovação, portanto, se fundamenta na obrigatoriedade de o investigado ser notificado da investigação e na obrigatoriedade da presença do advogado no curso do procedimento (mesmo que o investigado não constitua defensor). Para avançar no estudo, um questionamento se faz necessário. De fato, existe a possibilidade de o investigado constituir defensor, no entanto, ele pode ficar inerte no prazo de 48 (quarenta e oito) horas a contar do recebimento da citação, cenário em que a instituição a que está vinculado o investigado deve indicar defensor para o caso. Mas quem seria este defensor para a representação do investigado? Com a derrubada dos vetos dos §§ 3ºa 5º, essa pergunta é respondida nos seguintes termos: § 3º Havendo necessidade de indicação de defensor nos termos do § 2º deste artigo, a defesa caberá preferencialmente à Defensoria Pública, e, nos locais em que ela não estiver instalada, a União ou a Unidade da Federação correspondente à respectiva competência territorial do procedimento instaurado deverá disponibilizar profissional para acompanhamento e realização de todos os atos relacionados à defesa administrativa do investigado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência) § 4º A indicação do profissional a que se refere o § 3º deste artigo deverá ser precedida de manifestação de que não existe defensor público lotado na área territorial onde tramita o inquérito e com atribuição para nele atuar, hipótese em que poderá ser indicado profissional que não integre os quadros próprios da Administração. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência) § 5º Na hipótese de não atuação da Defensoria Pública, os custos com o patrocínio dos interesses dos investigados nos procedimentos de que trata este artigo correrão por conta do orçamento próprio da instituição a que este esteja vinculado à época da ocorrência dos fatos investigados. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência) Pela leitura dos dispositivos, observa-se que, inicialmente, a defesa cabe à Defensoria Pública. Há quem19 sustente a inconstitucionalidade de tal dispositivo pelos mesmos fundamentos apresentados no veto do Presidente da República20 . Contudo não é necessário que o dispositivo seja declarado inconstitucional, mostrando-se suficiente outorga-lo uma leitura constitucional em eventual ADI. Afinal, podem existir servidores do art. 144 da Constituição Federal que – realmente – necessitem de um defensor público. Nessa linha, a utilização da técnica da interpretação conforme a Constituição se mostra necessária, a fim de que a atuação da Defensoria Pública incida somente quando ela realmente for necessária, ou seja, dentro de suas 19 Nesse sentido, Renato Brasileiro (Rejeição de vetos ao pacote anticrime, 2021, p. 21). 20 Termos do veto: “A propositura legislativa, ao prever que os agentes investigados em inquéritos policiais por fatos relacionados ao uso da força letal praticados no exercício profissional serão defendidos prioritariamente pela Defensoria Pública e, nos locais em que ela não tiver instalada, a União ou a Unidade da Federação correspondente deverá disponibilizar profissional, viola o disposto no art. 5º, inciso LXXIV, combinado com o art. 134, bem como os arts. 132 e 132, todos da Constituição da República, que confere à Advocacia-Geral da União e às Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal, também função essencial à Justiça, a representação judicial das respectivas unidades federadas, e destas competências constitucionais deriva a competência de representar judicialmente seus agentes públicos, em consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal (v.g., ADI 3.022, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 02/08/2004, DJ 04/03/2005.” http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art20 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art20 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art20 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 25 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br finalidades institucionais previstas na Constituição Federal e nas leis de regência. Compatibiliza- se, desse modo, a atuação da Defensoria Pública com o texto legal do art. 14-A do CPP. Por fim, essa normativa se aplica aos servidores militares vinculados às Forças Armadas, desde que os fatos investigados digam respeito a missões para a Garantia da Lei e da Ordem. SUGESTÃO DE RESPOSTA: A inovação legislativa incide em qualquer procedimento investigativo, inclusive de natureza militar, desde que o objeto seja um fato relacionado ao uso letal da força, praticado no exercício da função de agentes da segurança pública do art. 144 da Constituição Federal, bem como aos agentes do art. 142, quando em missões para a Garantia da Lei e da Ordem, de forma tentada ou consumada, mesmo se incidente eventual excludente de ilicitude. Em tal cenário, a alteração legislativa traz duas inovações relevantes. Primeiro, o presidente do procedimento investigado deve citar o investigado da instauração da investigação, podendo constituir defensor no prazo de até 48h, contados do recebimento da citação. Segundo, passado o prazo de 48 horas, a autoridade responsável pela investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do investigado. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 26 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 27 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br QUESTÃO DISSERTATIVA Como muito se coloca, em sede de inquérito policial, passou-se a distinguir o termo “elementos de informação” de “elementos de prova”. Isso é decorrência da reforma promovida ao Código de Processo Penal pela Lei nº 11.690 de 2008, que passou a diferenciar os dois conceitos. Sobre o tema, qual o elemento central de distingue entre elementos de informação e elementos de prova? Quais são as provas presentes no inquérito policial? É possível a antecipação cautelar de provas com fundamento no decurso do tempo para policiais? Versão Definitiva da Questão Dissertativa 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 28 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS: Elemento de informação x Elemento de provas Provas no IP Antecipação cautelar de provas – policial Português (0,2 por erro) NOTA FINAL MATERIAL DE LEITURA E/OU JULGADOS SOBRE O TEMA: O PROBLEMA RELATIVO AO VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL Como muito se coloca, em sede de inquérito policial utiliza-se o termo “elementos de informação”, e não “elementos de prova”. Isso é decorrênciada reforma promovida ao CPP pela Lei nº 11.690 de 2008, que passou a diferenciar os dois conceitos: Art. 155 do CPP: O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. O termo “prova” é utilizado para se referir aos elementos produzidos em contraditório (mesmo que diferido), ao passo que o termo “elementos de informação” abrange todos os demais que foram produzidos inquisitoriamente ou por uma das partes fora do devido processo legal.21 Não se pode esquecer que, excepcionalmente, existe produção de provas (e não só de elementos de informação) na fase inquisitorial. Perícias e documentos produzidos na fase inquisitorial são revestidos de eficácia probatória sem a necessidade de serem repetidos no curso da ação penal por se sujeitarem ao contraditório diferido.22 Na verdade, essa distinção entre prova e elementos de informação guarda relação com o valor probatório do inquérito policial, o qual tem as suas ressalvas para ser utilizado em juízo. Em regra, os elementos de informação produzidos no curso do inquérito policial devem ser repetidos em juízo. Isso consta do art. 155 do CPP, ao prescrever que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. De fato, o juiz não pode fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação; no entanto, tais elementos possuem papel de relevância no contexto do livro convencimento do magistrado, como o STF23 já se posicionou em inúmeras vezes: 21. LIMA, 2011, p. 116. 2222 AgRg no REsp 1522716/SE, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, julgado em 20/03/2018. 23. RE 425734 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 04/10/2005 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 29 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br (...) 3. Ao contrário do que alegado pelos ora agravantes, o conjunto probatório que ensejou a condenação dos recorrentes não vem embasado apenas nas declarações prestadas em sede policial, tendo suporte, também, em outras provas colhidas na fase judicial. Confirmação em juízo dos testemunhos prestados na fase inquisitorial. 4. Os elementos do inquérito podem influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório em juízo. Nessa linha, para o STJ24, as provas inicialmente produzidas na esfera inquisitorial e reexaminadas na instrução criminal, com observância do contraditório e da ampla defesa, não violam o art. 155 do Código de Processo Penal - CPP visto que eventuais irregularidades ocorridas no inquérito policial não contaminam a ação penal dele decorrente. O art. 155 do CPP tem por finalidade evitar o contato judicial com as provas inquisitoriais, o que poderia interferir na sua imparcialidade para o julgamento da causa. Por isso, a atuação do magistrado no inquérito policial deve ocorrer de forma excepcional. Nesse contexto, no curso do inquérito policial, o seu contato com a investigação somente ocorre em três hipóteses: (a) quando houver lesão ou ameaça de lesão a direitos subjetivos, (b) quando houver algum tipo de prejuízo à efetividade da jurisdição penal e (c) quando houver necessidade de controle da legalidade dos atos produzidos no curso do inquérito policial. Outro tipo de atuação por parte do magistrado importaria na violação ao princípio constitucional da imparcialidade, uma vez que ele tomaria conhecimento do material probatório. De acordo com Eugênio Pacelli de Oliveira,25 o sistema acusatório não permite que o juiz tenha contato direto com as provas produzidas nessa etapa: Ora, não cabe ao juiz tutelar a qualidade da investigação, sobretudo porque sobre ela, ressalvadas determinadas provas urgentes, não se exercerá jurisdição. O conhecimento judicial acerca do material probatório deve ser reservado à fase de prolação de sentença, quando se estará no exercício de função tipicamente jurisdicional. O STF26 seguiu o entendimento doutrinário acima ao concluir que: [...] o Judiciário, em nosso sistema processual penal, atua no inquérito para assegurar a observância dos direitos e liberdades fundamentais e dos princípios sobre os quais se assenta o Estado Democrático de Direito. Em sentido contrário, a reforma do CPP, promovida pela Lei nº 11.690, de 2008, facultou ao juiz a produção da prova no curso do inquérito policial, desde que preenchidos alguns requisitos. Segue, abaixo, o dispositivo legal: Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: 24 AgRg nos EDcl no AREsp 1006059/SP,Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, julgado em 20/03/2018. 25. OLIVEIRA, 2010, p. 11. 26. HC 92893, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 2/10/2008, conforme noticiado no Inf. 522 do STF. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 30 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; Nestor Távora e Fábio Roque Araújo27 chamam a atenção para a duvidosa constitucionalidade do artigo. A produção da prova pelo juiz, de ofício, no curso do inquérito policial, ocasionaria a violação ao sistema acusatório. O magistrado, na hipótese legal, também exteriorizaria um juízo de valor sobre os fatos ao verificar o que se trata de prova “urgente e relevante”, antecipando a sua análise sobre diversas questões de direito, violando o princípio constitucional da imparcialidade. Em tese, toda produção antecipada de provas autorizada ou determinada pelo magistrado consiste numa medida cautelar, uma vez que possuem caráter excepcional. Citam-se, como exemplos, o mandado de busca e apreensão, a interceptação telefônica e a quebra do sigilo de dados bancários ou fiscais. Essas hipóteses, por serem medidas cautelares em sentido estrito, devem ter preenchidos, além dos requisitos de cada medida, os pressupostos do fumus comissi delicti (existência de indícios plausíveis da comprovação de que um determinado cidadão está envolvido em uma infração penal) e do periculum in mora (risco ou prejuízo que a não realização imediata da diligência poderá acarretar para a investigação criminal e posterior instrução criminal). A partir de um poder geral de cautela, o magistrado pode, também, conceder outras medidas cautelares não previstas em lei, mas necessárias para o inquérito policial ou para a ação penal. Diante do exposto, questiona-se: A idade avançada de uma pessoa pode ser fundamento para o periculum in mora de eventual medida cautelar com a finalidade de sua oitiva antecipada no curso do inquérito policial e de posterior aproveitamento de seu depoimento na ação penal? A análise deve ser feita a partir de cada caso concreto, norteada pela razoabilidade, de modo a envolver a análise de elementos como a idade da pessoa, a sua saúde e o risco que a não realização imediata dessa prova poderá acarretar para a futura instrução criminal. Deve-se levar em consideração, ainda, fatores como a demora no trâmite de inquéritos policiais e da futura ação penal. Em regra, a decisão que determina a produção antecipada de provas com base noart. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo, tal como consta da Súmula 455 do STJ. Excepcionalmente, o STF28 entendeu ser possível a antecipação de provas em situação correlata: No caso, o paciente foi denunciado pela suposta prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor, delito previsto no art. 302 da Lei 9.503/1997. Como estava foragido, foi citado por edital, com a consequente suspensão do processo (CPC/1973, art. 366). O juízo determinou, em seguida, a realização de audiência de produção antecipada de prova. Na impetração, o réu alegava haver cerceamento de defesa em virtude de, na mencionada audiência, a antecipação de prova ter como único fundamento o decurso do tempo. A Turma entendeu que a antecipação da prova testemunhal configura medida necessária, pela gravidade do crime praticado e possibilidade concreta de perecimento, haja vista que as testemunhas 27. TÁVORA e ARAÚJO, 2010, p. 223. No mesmo sentido, é a posição de Eugênio Pacelli de Oliveira (2010, p. 11). 28. HC 135386/DF, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 13.12.2016 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 31 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br poderiam se esquecer de detalhes importantes dos fatos em decorrência do decurso do tempo. Afirmou que a antecipação da oitiva das testemunhas não revela nenhum prejuízo às garantias inerentes à defesa. Afinal, quando o processo retomar seu curso, caso haja algum ponto novo a ser esclarecido em favor do réu, basta se proceder à nova inquirição. Ainda sobre o tema, de acordo com o STJ29, é possível a antecipação da colheita da prova testemunhal, com base no art. 366 do CPP, nas hipóteses em que as testemunhas são policiais, tendo em vista a relevante probabilidade de esvaziamento da prova pela natureza da atuação profissional, marcada pelo contato diário com fatos criminosos: I - A Terceira Seção desta Corte, por ocasião do julgamento do RHC 64.086/DF, assentou entendimento no sentido da necessidade de mitigar o rigor da Súmula 455/STJ, de modo que as testemunhas, cuja natureza da atividade profissional seja marcada pelo contato diário com fatos criminosos semelhantes, devem ser ouvidas com a máxima urgência possível. II - Na espécie, há situação excepcional a lastrear a necessidade de ouvida das testemunhas presenciais, pois os fatos praticados remontam à data de 15/04/2014, havendo o risco de que detalhes relevantes do caso se percam na memória dos policiais. (AgRg no AREsp 1908229/GO, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 16/11/2021, DJe 25/11/2021) Por fim, é importante ressaltar que, seja nas hipóteses em que a atuação do magistrado é constitucional, seja na hipótese do art. 156, inciso I, do CPP, o juiz que atuar no inquérito policial estará prevento para a futura ação penal30. SUGESTÃO DE RESPOSTA: O termo “prova” é utilizado para se referir aos elementos produzidos em contraditório, mesmo que diferido, ao passo que o termo “elementos de informação” abrange todos os demais que foram produzidos inquisitoriamente ou por uma das partes fora do devido processo legal. Observe que o inquérito policial possui elementos de prova e elementos de informação, em especial porque, no inquérito, podem ser produzidas as provas cautelares, não repetíveis ou antecipadas. Uma dessas provas guarda relação com a antecipação cautelar de provas, medida essa que, em regra, não pode se fundamentar exclusivamente no decurso do tempo. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça tem restringido tal entendimento para os policiais, cuja natureza da atividade profissional é marcada pelo contato diário com fatos criminosos semelhantes, para que sejam ouvidas com a máxima urgência possível. 29 RHC 074576/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 21/08/2018. 30. HC 94188, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 26/0/2008; HC 93762, Relator(a): Min. Eros Grau, Segunda Turma, julgado em 29/4/2008; HC 99353, Relator(a): Min. Eros Grau, Segunda Turma, julgado em 18/08/2009. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 32 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DIREITO PENAL QUESTÃO DISSERTATIVA Um ponto central, relativo a atuação dos Delegados de Polícia e que gera polêmica na doutrina, diz respeito a (im)possibilidade de aplicação do princípio da insignificância no curso de uma investigação policial. Sobre o tema, elabore um texto dissertativo explicando os conceitos e as relações entre o princípio da insignificância, o princípio da intervenção mínima e a tipicidade conglobante. Ao responder, indique os quatro elementos da insignificância à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, bem como analise a possibilidade de sua aplicação pelo Delegado de Polícia à luz da doutrina policial, inclusive para fins de não se lavrar eventual auto de prisão em flagrante delito. Versão Definitiva da Questão Dissertativa 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 33 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br DISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS: Insignificância x intervenção mínima x conglobante – conceitos e relações 4 elementos - STF. Possibilidade de aplicação pelo Delegado Não lavrar APFD? Português (0,2 por erro) NOTA FINAL MATERIAL DE LEITURA E/OU JULGADOS SOBRE O TEMA: Resumo sobre o tema: A lavratura do Auto de Prisão em Flagrante Delito tem por pressuposto a existência de um fato típico, em seu aspecto formal e material, cenário que não está caracterizado quando se tratar de hipótese de aplicação do princípio da insignificância. O princípio da intervenção mínima, fundamento central do Direito Penal, institui a necessidade de se regulamentar e punir somente os fatos indesejados pela sociedade, sendo direcionado por duas diretrizes-base, quais sejam, a subsidiariedade e a fragmentariedade. A subsidiariedade institui o necessário caráter secundário do Direito Penal. Já a fragmentariedade estabelece que o Direito Penal só irá intervir quando se tratar de um bem jurídico relevante e o fato indesejado causar lesão ou perigo de lesão relevante (concreto) ao bem jurídico tutelado. É nesse contexto, de acordo com Roxin, que o princípio da insignificância se apresenta como corolário do princípio da intervenção mínima, tanto no âmbito da subsidiariedade, quanto no âmbito da fragmentariedade. Zaffaroni segue a mesma linha de pensamento ao compreender que o princípio da lesividade, tal como o princípio da intervenção mínima para Roxin, demanda a punição somente das pessoas que efetivamente lesionem um bem jurídico. Em outras palavras, se não há uma lesão, não existe um conflito; se não existe um conflito, não pode existir um delito; e se não existe um delito, não se pode falar em sanção penal pelo Estado. Não basta, portanto, que um bem jurídico seja tutelado (tipificado) pelo Código Penal, uma vez que se faz necessário que o bem jurídico seja lesionado para a atuação do Direito Penal. O princípio da insignificância surge, assim, como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material,de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima. Na linha de entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade envolve um juízo de tipicidade conglobante. Importa investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, de modo a impedir que acabe desvirtuado o objetivo a que visou o legislador quando formulou a tipificação legal. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 34 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br No RHC 12627231, em um típico caso de insignificância que chegou ao STJ, o Ministro Relator destacou que o Delegado de Polícia foi o único a agir corretamente dentre os demais agentes estatais (MP e Poder Judiciário), de modo a aplicar precedentes da Corte ao não ratificar a prisão em flagrante, reconhecendo o valor irrisório do produto furtado, dentre outros requisitos. Nas palavras do Ministro Relator, "está-se utilizando o sistema de Justiça Criminal para perseguir quem furtou R$4,00 de alimentos, que representam 0,5% do salário mínimo à época, sendo que a jurisprudência do STJ indica que é possível aplicar a insignificância quando o valor do bem furtado não ultrapassar 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos”. Não obstante, para incidir no presente caso o princípio da insignificância, a jurisprudência pacífica do STF demanda o preenchimento de quatro requisitos. Primeiro, a mínima ofensividade da conduta do agente está configurada. Segundo, verifica-se que a conduta não possui nenhuma periculosidade social da ação. Terceiro, tem-se configurado o grau reduzido de reprovabilidade do comportamento. Quarto, verifica-se a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Em razão do exposto, caracterizado cenário de incidência do princípio da insignificância, afasta- se a tipicidade e, por consequência, a existência do crime. ALGUMAS INFORMAÇÕES IMPORTANTES E CURIOSIDADES SOBRE APLICAÇÃO DA INSIGNIFICÂNCIA ANTES DA INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL (POR PORTARIA OU APFD) 1. Precisa determinar o encaminhamento de cópia ao MP ou PJ? Todo o procedimento é feito em sede de BOLETIM DE OCORRÊNCIA/VPI (não existe IP instaurado), de modo que não existe determinação legal para o delegado enviar para MP ou PJ. Alguns poucos Estados possuem normativa estadual pela obrigatoriedade de envio para o MP. 2. Precisa encaminhar ao superior hierárquico ou Delegado Geral? Em regra não! Alguns poucos Estados possuem normativa estadual pela obrigatoriedade de envio ao superior hierárquico ou Delegado Geral. 3. O Delegado de Polícia precisa instaurar IP? Ou pode o delegado arquivar o procedimento feito em sede de VPI (verificação preliminar de informações)? O delegado pode instaurar IP após decisão acima estudada e, em alguns estados, existe normativa determinando a instauração do IP. De fato, alguns Delegados de Polícia preferem instaurar IP nesses casos para, quase em ato sequencial, relatar pelo arquivamento. Entendo não ser o melhor caminho! Observe que o procedimento (Boletim de ocorrência, oitivas e outros elementos) se equipara a uma VPI, já que vinculado a um boletim de ocorrência, de modo que o Delegado de Polícia pode determinar o seu arquivamento (lembre- se: o art. 17 do CPP se limita a inquérito policial instaurado e aqui inexiste IP) quando os elementos de informações já forem robustos. 31 RHC 126272, Rel. Rogerio Schietti, julgado em 01/06/2021. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 35 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br TRECHO RETIRADO DO LIVRO DELEGADO DE POLÍCIA EM AÇÃO – 7ª ed, 2021: Pela leitura do boletim de ocorrência, o Delegado de Polícia poderá arquivá-lo se verificar que não existe crime (fato típico, antijurídico e culpável) ou que existe alguma causa extintiva de punibilidade. Havendo dúvida ou se não houver elementos probatórios suficientes para o arquivamento, o boletim de ocorrência não poderá ser arquivado, devendo ser instaurado o inquérito policial (caso haja elementos de autoria e materialidade suficientes) ou efetuar uma verificação preliminar de inquérito – VPI – (caso os elementos de autoria e materialidade não sejam suficientes para instaurar o inquérito policial). Cita-se a prescrição como exemplo de arquivamento do boletim de ocorrência, pois, como regra, pode ser verificada pela simples leitura do documento. 4. Professor, e se o Delegado que receber o flagrante for o responsável por presidir eventual IP? O normal é que exista um Delegado de Polícia plantonista, que receberá o flagrante e tomará a decisão acima montada pela não lavratura em caso de insignificância, e outro que, posteriormente, venha a receber o que foi feito durante o plantão para, se for o caso, instaurar eventual IP. Contudo, é possível que, em Municípios pequenos ou locais sem muita estrutura, que o delegado plantonista seja o mesmo que vai presidir o IP. Nessa hipótese, e desde que o Delegado entenda pela necessidade de instaurar o IP, pode ser feito DIRETAMENTE A INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL POR MEIO DE PORTARIA sem o despacho trabalho neste tópico. JULGADOS SOBRE O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: EMENTA: Processual penal. Agravo regimental em recurso ordinário em habeas corpus. Furto qualificado tentado. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal tem entendimento consolidado no sentido de que o princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente, as seguintes condições objetivas: (i) mínima ofensividade da conduta do agente; (ii) nenhuma periculosidade social da ação; (iii) grau reduzido de reprovabilidade do comportamento; (iv) inexpressividade da lesão jurídica provocada, ressaltando, ainda, que a contumácia na prática delitiva impede a aplicação do princípio. 2. O acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça não divergiu dessa orientação, ao assentar que “o decisum agravado foi claro ao afirmar a impossibilidade de incidência do princípio da insignificância ao caso, haja vista o valor da res furtiva – que equivale a, aproximadamente, 25% do salário mínimo vigente à época dos fatos –, além do fato de que o réu ostenta anotações e condenações definitivas anteriores pelo delito de furto”. Nessa linha, veja-se o HC 171.536- AgR, Rel. Min. Luiz Fux. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 36 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br (RHC 205936 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 23/11/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG 07-12-2021 PUBLIC 09-12-2021) EMENTA AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. CONCURSO DE PESSOAS. VULNERABILIDADE DA VÍTIMA. PACIENTE MULTIRREINCIDENTE. CARACTERIZADA A REPROVABILIDADE DO COMPORTAMENTO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE DO PLEITO ABSOLUTÓRIO. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS DESPROVIDO. 1. É aplicável o princípio da insignificância no sistema penal brasileiro desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: “a) a mínima ofensividade da conduta do agente, b) nenhuma periculosidade social da ação, c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada” (HC84.412, ministro Celso de Mello). 2. Na presença desses quatro vetores, o princípio da insignificância incidirá para afastar, no plano material, a própria tipicidade da conduta diante da ausência de lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. 3. A insignificância, princípio que afasta a tipicidade da conduta, especialmente nos crimes patrimoniais, não deve ser tida como regra geral, a se observar unicamente o valor da coisa objeto do delito. Deve ser aplicada, segundo penso, apenas quando estiver demonstrado nos autos a presença cumulativa dos quatro vetores objetivos que venho de referir. 4. A contumácia ou reiteração delitiva, a multirreincidência, a reincidência específica são exemplos de elementos aptos a indicar a reprovabilidade do comportamento, fator hábil a afastar a aplicação do princípio da insignificância. (...) . (RHC 198550 AgR, Relator(a): NUNES MARQUES, Segunda Turma, julgado em 04/10/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-238 DIVULG 01-12-2021 PUBLIC 02-12-2021) Ementa: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO. ATESTADO MÉDICO. EMPREGADO DA EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. REPROVABILIDADE DA CONDUTA. 1. Na linha de entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade envolve um juízo de tipicidade conglobante, muito mais abrangente que a simples expressão do resultado da conduta. Importa investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, de modo a impedir que acabe desvirtuado o objetivo a que visou o legislador quando formulou a tipificação legal. 2. A falsificação de documento, delito imputado ao paciente, é figura típica cuja objetividade jurídico-penal abrange o risco de dano à fé pública, com a circulação de documento inautêntico, exprimindo realidade fictícia, capaz de ludibriar a confiança de pessoas nele interessadas. 3. No caso, o agravante foi denunciado por alterar informação constante de atestado médico em detrimento da empresa pública com a qual mantinha vínculo, se distanciando dos deveres do cargo que exercia. Nesse contexto, revela-se reprovável a conduta, impossibilitando a incidência do denominado princípio da insignificância. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (HC 133226 AgR, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 29/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-082 DIVULG 27-04-2016 PUBLIC 28-04-2016) DOUTRINA SOBRE O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 37 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br (texto completo: http://site.fdv.br/wp-content/uploads/2018/06/bruno-taufner-zanotti.pdf ) O princípio da intervenção mínima, fundamento central do Direito Penal, institui a necessidade de se regulamentar e punir somente os fatos indesejados pela sociedade, sendo direcionado por duas diretrizes-base, quais sejam, a subsidiariedade e a fragmentariedade. A subsidiariedade institui o necessário caráter secundário do Direito Penal32. Parte da premissa de que a proteção de bens juridicamente tutelados não constitui objetivo exclusivo do Direito Penal, na medida em que todo o sistema vigente traz ferramentas para alcançar essa finalidade, v.g., no âmbito do Direito Civil, no âmbito do Direito Administrativo ou mesmo no âmbito do Direito Tributário. Mais do que isso, entre uma ordem de preferência para a proteção dos bens, o Direito Penal — e, em especial, a pena — deve se apresentar como a ultima ratio, com uma missão subsidiária em relação aos demais ramos do Direito: O Direito penal é apenas a última dentre todas as medidas de proteção existentes, é dizer que somente é possível intervir quando os outros meios de resolução de conflitos falham — como a ação civil, os regulamentos policiais ou técnico-jurídicos, as sanções não penais etc. Por isso se concebe a pena como a “ultima ratio da política social” e se define a sua finalidade de proteção subsidiária de bens jurídicos. (ROXIN, 1997, p. 65, grifo do autor, tradução nossa)33. Já a fragmentariedade estabelece que o Direito Penal só irá intervir quando se tratar de um bem jurídico relevante e o fato indesejado causar lesão ou perigo de lesão relevante (concreto) ao bem jurídico tutelado34. Nas palavras de Roxin (1997, p. 65, tradução 32 “Atualmente, somente para exemplificar, determinadas infrações administrativas de trânsito possuem punições mais temidas pelos motoristas, diante das elevadas multas e do ganho de pontos no prontuário, que podem levar à perda da carteira de habilitação do que a aplicação de uma multa penal, sensivelmente menor” (NUCCI, 2013, p. 93). 33 “El Derecho penal sólo es incluso la última de entre todas las medidas protectoras que hay que considerar, es decir que sólo se le puede hacer intervenir cuando fallen otros medios de solución social del problema —como la acción civil, las regulaciones de policía o jurídico- técnicas, las sanciones no penales, etc. Por ello se denomina a la pena como la ‘ultima ratio de la política social’ y se define su misión como protección subsidiaria de bienes jurídicos”. 34 “O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O Direito Penal http://site.fdv.br/wp-content/uploads/2018/06/bruno-taufner-zanotti.pdf MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 38 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br nossa)35 “[...] na medida em que o Direito Penal protege somente uma parte dos bens jurídicos, mesmo que nem sempre de maneira geral, mas frequentemente (como no patrimônio) só contra ataques concretos, fala-se também na natureza ‘fragmentária’ do Direito Penal” (grifo do autor). É nesse contexto que o princípio da insignificância se apresenta como corolário do princípio da intervenção mínima, tanto no âmbito da subsidiariedade, quanto no âmbito da fragmentariedade (ROXIN, 1997, p. 1027-1028)36. Zaffaroni (2010, p. 110) segue a mesma linha de pensamento ao compreender que o princípio da lesividade, tal como o princípio da intervenção mínima para Roxin, demanda a punição somente das pessoas que efetivamente lesionem um bem jurídico. Em outras palavras, se não há uma lesão, não existe um conflito; se não existe um conflito, não pode existir um delito; e se não existe um delito, não se pode falar em sanção penal pelo Estado (ZAFFARONI, 2010, p. 110). Não basta, portanto, que um bem jurídico seja tutelado (tipificado) pelo Código Penal, uma vez que se faz necessário que o bem jurídico seja lesionado para a atuação do Direito Penal (ZAFFARONI, 2010, p. 111). Por isso, uma conduta insignificante resulta em uma inadequada condenação criminal, uma vez que seria suficiente uma desqualificação de um crime para uma contravenção penal (se o sistema jurídico vigente permitisse), uma compensação no âmbito civil ou ainda uma condenação administrativa relativa às consequências do dano que o fato ocasionou: Em virtude da subsidiariedade da proteção jurídico-penal de bens jurídicos, o legislador deve estatuir uma contravenção onde uma sanção não penal baste para assegurar o fim que se busca. Assim ocorre, sobre tudo, em delitos que envolvam apenas uma diminuição insignificante dos bens jurídicos (cf. os §§111 ss. OWiG). Mas também há que considerar essapossibilidade quando uma conduta, apesar de causar um dano, às vezes considerável, desvela apenas uma pequena desvalorização ética; então, no caso de imprudência não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor — por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes — não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social” (HC 84412, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 19/10/2004). 35 “[...] en la medida en que el Derecho penal sólo protege una parte de los bienes jurídicos, e incluso ésa no siempre de modo general, sino frecuentemente (como el patrimionio) sólo frente a formas de ataque concretas, se habla también de la naturaleza ‘fragmentaria’ del Derecho penal.” 36 “Como bem se sabe, o princípio da insignificância — que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal — tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material, consoante assinala expressivo magistério doutrinário expendido na análise do tema de referência” (HC 84412, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 19/10/2004). MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 39 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br insignificante, atualmente punível muitas vezes com uma infração penal, sua sanção como contravenção poderia cumprir a mesma função protetiva, ainda mais quando o dever de indenização civil produza um efeito preventivo considerável. Em outros casos — por exemplo, em algumas formas de condutas nocivas para o meio ambiente — os deveres e as sanções administrativas podem ser mais eficazes do que a persecução penal, que, nesses casos, frequentemente, encontram dificuldades para elucidar a responsabilidade individual. Também se apresentam como possibilidades, longe de serem esgotadas pela política jurídica, a substituição de soluções penais por soluções do Direito civil (ROXIN, 1997, p. 66, tradução nossa)37. É importante ressaltar que os autores trabalham os princípios da intervenção mínima e da insignificância como conquistas da evolução do Direito Penal. Roxin (1997, p. 66 e p. 1027) compreende que o Direito Penal não pode ser mais interpretado e compreendido sem que tais princípios sejam capazes de reger e limitar o conceito de crime. Para Zaffaroni (2010, p. 369 e p. 118), a insignificância deve ser vista como consequência do princípio republicano de governo, o qual institui, entre outros postulados, a proibição de se criminalizar uma conduta de forma injusta (sem lesividade). Reconhecida a insignificância como meio para possibilitar outros ramos do Direito resolverem um conflito, o abandono de tal prática reintroduziria um modelo punitivo que já foi superado. O princípio da insignificância, portanto, apresenta-se como uma prática republicana. Nesse sentido, Busato (2017, p. 52-59), Galvão (2011, p. 116 e 117) e Bitencourt (2017, p. 55-58) compreendem a intervenção mínima como decorrência direta do paradigma do Estado Democrático de Direito, já que o avançar do constitucionalismo mostrou que o poder coercitivo deve ser exercido de forma adequada e proporcional à ação do autor, contexto no qual o constitucionalismo brasileiro também se insere. Seja pelo reconhecimento do princípio republicano, seja em razão do avanço do Direito Penal (não só em nível mundial, mas também no Brasil), seja pela adoção do paradigma do Estado 37 “En virtud de la subsidiariedad de la protección jurídicopenal de bienes jurídicos, el legislador debe estatuir una contravención allí donde una sanción no penal baste para asegurar el fin que persigue. Así sucede sobre todo en caso de delitos que suponen sólo un menoscabo insignificante de bienes jurídicos (cfr. los §§111 ss. OWiG). Pero también hay que considerar esa posibilidad cuando una conducta, pese a causar un daño a veces considerable, sólo muestra un escaso contenido de desvalor ético; así en el caso de la imprudencia insignificante, que hoy se castiga muchas veces como infracción criminal, su sanción como contravención podría cumplir la misma función de protección, tanto más cuanto que el deber de indemnización civil despliega un considerable efecto preventivo. En otros casos — p.ej. en algunas formas de conductas nocivas para el medio ambiente — los deberes y sanciones administrativas pueden ser a menudo más eficaces que la persecución penal, que en estos casos frecuentemente tropieza con dificultades para aclarar la responsabilidad individual. También ofrece posibilidades que con mucho no se han agotado aún a efectos de política jurídica la sustitución de soluciones penales por soluciones del Derecho civil”. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 40 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br Democrático de Direito, os mencionados princípios apresentam-se como determinantes para reformular e reestruturar o Direito Penal brasileiro. A coesão entre os argumentos jurídicos que se fundamentam em uma relação incindível (a partir da unidade do valor) entre os princípios da intervenção mínima, da subsidiariedade e da fragmentariedade, outorga consistência normativa ao princípio da insignificância38, capaz de conferir caráter não discricionário à atuação do delegado de polícia. Ocorre, nas palavras de Zaffaroni (2010, p. 369), uma reestruturação do conceito do crime por esses princípios constitucionais, de modo que todo fato deve ser capaz de gerar uma real lesão ao bem jurídico para ser considerado crime. Com isso, o fato típico, além da tipicidade formal, passa a ser estruturado com uma tipicidade conglobante, na qual é reconhecida a existência da insignificância com consequência que parte de um estudo constitucional do Direito Penal. O conceito em estudo [...] exige que o comportamento delitivo tenha algo mais que a subsunção típica. A tipicidade não decorre da mera verificação que a conduta é aquela prevista no tipo penal. É preciso observar se o comportamento violou ou pôs em perigo o bem jurídico que legitima a norma de proteção, do contrário não haverá materialidade capaz de atrair a atenção do direito penal (BOTTINI et al., 2012, p. 121). Assim concebida, a tipicidade conglobante não autoriza toda (e irrestrita) legitimação punitiva estatal no âmbito do Direito Penal (ZAFFARONI, 2010, p. 370). O fato típico ganha normatividade, no sentido de que não basta a simples previsão de um fato como crime no Código Penal, sendo necessária uma lesão concreta ao bem juridicamente tutelado39. 38 Essa reflexão delega um caráter também histórico ao princípio da insignificância, fruto da evolução do poder punitivo estatal (LUZ, 2012, p. 205-209). 39 Ao analisar o ordenamento jurídico brasileiro, Zaffaroni e Pierangeli (2013, p. 505) compreendem que a insignificância está presente no Brasil, estruturada no âmbito da tipicidade conglobante, como corretivo da tipicidade penal. Inclusive, os autores trabalham alguns exemplos para a sua aplicação. “A conduta de quem estaciona seu veículo tão próximo a nosso automóvel, a ponto de nos impedir a saída, não configura alguma previsão à liberdade; nem os presentes de uso, como as propinas aos servidores públicos por ocasião do Natal, configuram uma lesão à imagem pública da administração, configuradora da tipicidade do art. 317 do CP; nem arrancar um fio de cabelo, por mais que possa ser considerado uma ofensa à integridade corporal (art. 129, caput, do CP), resulta numa afetação do bem jurídico típico de lesões; nem a subtração de uma palito de fósforo da caixa que encontramosno escritório vizinho configura um furto, ainda que se trate de uma coisa móvel totalmente alheia”. MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 41 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. BOTTINI, Pierpaolo Cruz; OLIVEIRA, Ana Carolina Carlos de; PAPA, Douglas de Barros Ibarra; RIBEIRO, Thaísa Bernhardt. A confusa exegese do princípio da insignificância e sua aplicação pelo STF: análise estatística de julgados. Revista Brasileira de Ciências Criminais, [S.l.], v. 20, n. 98, p. 117-148, set./out. 2012. BUSATO, Paulo César. Direito Penal: parte geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2017. GALVÃO, Fernando. Direito Penal: parte geral. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. LUZ, Yuri Corrêa da. Princípio da insignificância em matéria penal: entre aceitação ampla e aplicação problemática. Revista Brasileira GV, v. 15. n. 1, p. 203-236, jan./jun. 2012. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. ROXIN, Claus. Derecho Penal: parte general. Tradução de Diego-Manuel Luzón Peña, Miguel Díaz y Garcia Conlledo e Javier de Vicente Remesal. Madrid: Civitas, 1997. Disponível em: <https://juristasfraternitas.files.wordpress.com/2012/01/derecho_penal_-_parte_general_- _claus_roxin.pdf>. Acesso em18 out. 2017. ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro: parte geral. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de Derecho Penal: parte general. 2. ed. e 4. reimp. Buenos Aires: Ediar, 2010. Mais doutrina sobre o tema: https://www.conjur.com.br/2019-fev-12/academia-policia-flagrantes-bagatela-prisao-delito https://www.conjur.com.br/2015-ago-18/academia-policia-delegado-aplicar-principio- insignificancia SUGESTÃO DE RESPOSTA: O princípio da intervenção mínima, fundamento central do Direito Penal, institui a necessidade de se regulamentar e punir somente os fatos indesejados pela sociedade, sendo direcionado por duas diretrizes-base, quais sejam, a subsidiariedade e a fragmentariedade. A subsidiariedade institui o necessário caráter secundário do Direito Penal. Já a fragmentariedade estabelece que o Direito Penal só irá intervir quando se tratar de um bem jurídico relevante e o fato indesejado causar lesão ou perigo de lesão relevante (concreto) ao bem jurídico tutelado. É nesse contexto, de acordo com Roxin, que o princípio da insignificância se apresenta como corolário do princípio da intervenção mínima, tanto no âmbito da subsidiariedade, quanto no âmbito da fragmentariedade. https://www.conjur.com.br/2019-fev-12/academia-policia-flagrantes-bagatela-prisao-delito https://www.conjur.com.br/2015-ago-18/academia-policia-delegado-aplicar-principio-insignificancia https://www.conjur.com.br/2015-ago-18/academia-policia-delegado-aplicar-principio-insignificancia MATERIAL GRATUITO – Questões Discursivas - 2022 Prof. Bruno Zanotti @delegadobrunozanotti (instagram) 42 www.brunozanotti.com.br // curso@brunozanotti.com.br O princípio da insignificância surge, assim, como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção do fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, consagrando os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima. Na linha de entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade envolve um juízo de tipicidade conglobante. Ademais, quatro são os requisitos para caracterizar a insignificância. Primeiro, a mínima ofensividade da conduta do agente está configurada. Segundo, verifica-se que a conduta não possui nenhuma periculosidade social da ação. Terceiro, tem-se configurado o grau reduzido de reprovabilidade do comportamento. Quarto, verifica-se a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Em razão do exposto, caracterizado cenário de incidência do princípio da insignificância, afasta- se a tipicidade e, por consequência, a existência do crime, o que impacta em procedimento presidido pelo Delegado de Polícia à luz da doutrina moderna, inclusive para fins de não lavratura do auto de prisão em flagrante delito. Por fim, vale pontuar que, em recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Relator destacou que o Delegado de Polícia foi o único a agir corretamente dentre os demais agentes estatais (MP e Poder Judiciário), de modo a aplicar precedentes da Corte ao não ratificar a prisão em flagrante, reconhecendo o valor irrisório do produto furtado, dentre outros requisitos.