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aula Redução de Danos

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Por que falar de Redução de Danos hoje, mais ainda?
  Agosto/2021
A história do Uso de Drogas na Humanidade
Por que usamos drogas?
Experimentações;                                                             Uso religioso;
Em busca da saúde e bem-estar;                                    Tratamento de dependências;
Melhorar interação social;
Facilitar comportamento sexual;
Combater o cansaço
Facilitar a lida com a angústia;
Curiosidade sensorial;
Expandir percepção;
Prazer;
A História do uso de Drogas na Humanidade
A história do uso de drogas na humanidade: mesmo contando e recontando a história da humanidade por diversos aspectos, sempre haverá concomitantemente a história do uso de substâncias psicoativas. Não há como desprezar as drogas 
- no contexto das sociabilidades humanas;
- No contexto dos rituais coletivos e crenças/espiritualidade;
- Contexto econômico e político;
- No contexto da construção da cena urbana e disputas territoriais;
- Práticas terapêuticas e farmacológicas;
A História do Uso de Drogas na Humanidade
Falar sobre drogas é falar sobre muitas coisas e uma pequena parte é falar sobre as substâncias, que inertes, sem a intersecção entre quem usa, como usa e o contexto, resultam em maneiras como podemos pensar os usos;
Historicamente, algumas mudanças de comportamento e alguns acontecimentos vão demarcando um contexto de restrição em relação as drogas;
O século XIX e XX podem ser apontados como um períodos em que muitos dispositivos de controle dos corpos e da população em que foram pensados sobre a extinção dos negros, enquanto horizonte, a partir do discurso do Brasil civilizado (branco). Nesse momento maconha foi interpretada como vingança dos negros pela escravidão. 
A história da droga vai se tornando a história da proibição das drogas. Ligadas diretamente a história do racismo;
A lei seca EUA: aumento do consumo de destilados e da violência contra as mulheres que encamparam vários movimentos de abstinência e tratamento (A história do AA);
Guerra as drogas (1971) Nixon – militariza, para onde flui muito dinheiro (indústria bélica);
O mito do mundo sem drogas: 1998 a assembleia da ONU prevê um mundo livre de drogas em 10;
2008 é constatado o aumento de produção, circulação e comercio de várias drogas ilícitas;
2016 ONU revê a política sobre drogas; Cartilha UNGASS 2016.
A industrialização, o modo de produção capitalista e o neoliberalismo interseccionam a maneira como os usos e a forma como vemos os usos se modificam ao longo do tempo. O uso de drogas perde aspectos da coletividade, do sentido místico, e ganha contorno de consumo inveterado, puro gozo, puro excesso, desconectado do outro. 
O usuário de crack (noia) somos nós enquantos consumidores...é o paradigma da sociedade neoliberal e da ditadura do consumismo sem limites.
A História da Redução de Danos
A redução de danos foi inaugurada na Inglaterra em 1926, graças à autorização da 
prescrição médica, como inciativa heroica para tratamento das dependências opiáceas, 
em particular da heroína, segundo critérios e circunstâncias específicos: “manejo da síndrome 
de abstinência em tratamentos com o objetivo de cura; quando ficasse demonstrado 
que, após prolongadas tentativas de cura, o uso da droga não pode ser seguramente 
descontinuado; quando ficasse demonstrado que o paciente apenas é capaz de levar 
uma vida normal e produtiva se uma dose mínima de droga for administrada regularmente, 
mas ficasse incapaz disso quando a droga fosse inteiramente descontinuada” (Relatório 
Rolleston, 1926).
A História da Redução de Danos
Em 1974, portanto 48 anos depois da experiência inglesa, a OMS, através do vigésimo informe do seu Comitê de Especialistas, propunha que “...o principal objetivo neste campo [da saúde]deveria ser prevenir ou reduzir a incidência e severidade dos problemas associados com o uso não médico de drogas. Este é um objetivo muito mais amplo que a prevenção ou redução do uso de drogas em geral;
Somente mais tarde, no início dos anos oitenta, nas cidades de Amsterdam e Rotterdam, na Holanda, foi inaugurada a prática de trocar de seringas usadas por seringas novas,  graças à iniciativa de uma associação de usuários, diante das mortes relacionadas à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA/AIDS), e a forte prevalência de hepatites B e C, pelo compartilhamento de seringas entre usuários de Injetáveis;
A História da Redução de Danos
É do ano de 1989, na cidade de Santos, a primeira iniciativa formal brasileira voltada para a redução de danos, “frustrada por iniciativa judicial” que, a meu ver, interpretando de forma míope a Lei 6.368 de 1976, na medida em que considerou a prática de troca de seringas como uma ação incentivadora do consumo de drogas, sem considerar que, para além deste ato clínico, trocar seringas, os trabalhadores buscavam alcançar e estabelecer laços afetivos com  pessoas ‘invisíveis’ e matáveis;
Esta experiência deu lugar na Bahia, em 1995, através do Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas (CETAD), atividade de Extensão da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, a duas experiências muito próximas: o Programa de Redução de Danos do CETAD/UFBA, e o primeiro Consultório de Rua, no Brasil.
História da Redução de Danos
A estratégia de redução de danos surge, primeiramente em um contexto específico, nos anos 80, em que ocorria um alto uso de drogas injetáveis e essa FORMA de usar as drogas traziam junto consigo, diversas outras doenças associadas;
 O uso de materiais contaminados e compartilhados aumentava em muito a circulação de diversas doenças como hepatite e AIDS.
 Nesse contexto então as estratégias surgem no sentido de permitir que essas pessoas se aproximem dos dispositivos de cuidado e se sintam partes de estratégias de cuidado com a vida e a saúde delas, não condicionadas à necessidade de que elas parem de usar a substância.
Redução de Danos: O que é?
O uso da substância nesta proposta, se torna uma questão secundária. Se a pessoa usa ou não a substância, isso não é o elemento mais importante e nem a abstinência é condição para o cuidado; 
Ao profissional interessa se essa pessoa deseja resgatar alguns aspectos de saúde, sociabilidade, contratualidade, em sua vida. A aposta é de que o cuidado possa motivar a pessoa a olhar para o uso de drogas e poder repensar o lugar das drogas na sua vida, podendo ter como horizonte a abstinência, ou não; 
FALSA POLÊMICA: REDUÇÃO DE DANOS X ABSTINÊNCIA
Redução de danos: O que é?
A Redução de Danos então, evolui na história das políticas públicas:  de estratégias pontuais ao desdobramento de paradigma ou ético e político; 
RD – Estratégias pragmáticas 
RD – Paradigma 
RD – Política 
Redução de Danos: O que é?
Redução de Danos não é uma estratégia de “tratamento de dependentes químicos”, mas uma estratégia de recuperação de algumas populações, mais vulneráveis e castigadas pela exclusão em muitos campos de suas vidas e, por isso, expostas a maiores riscos; 
Como pensar o crack na contemporaneidade. 
A rua e a perda de vínculos, o aumento da marginalização, a perda de contato com qualquer estrutura de cuidados; 
Redução de Danos: O que é
A RD propõe a radicalidade de valores como equidade, integralidade, acessibilidade, defesa da vida e a garantia de direitos. 
Encontramos pessoas, em sua grande maioria, que estão levando sua vida como podem, conseguem ou querem levar e nenhum profissional tem o direito de dizer para o outro como ele deve viver. 
“da pele pra dentro quem manda sou eu” 
O que é possível e oferecer alternativas de cuidado e de retomada da condição de cidadão. 
Referências Bibliográficas
REDUÇÃO DE DANOS: Ampliação da vida e materialização de direitos/ Luciana Togni de Lima e Silva Surjus; Patricia Carvalho Silva (Orgs.)/ 2019
Plataforma Brasileira de Política sobre Drogas: Cartilha UNGASS: Entendendo a Política de Drogas no Cenário Internacional, 2016. ONU
Princípios e Parâmetros para o Cuidado
1. Disponibilidade para Agenda do Outro
Acolher ouse disponibilizar para o outro é valorizar com o usuário se apresenta, é o serviço estar de porta aberta para o usuário, com suas vivências e seu sofrimento. Assim, gera uma atitude de reconhecimento do outro como legítimo interlocutor;
2. Acolhimento e Escuta Radical da Singularidade
O acolhimento deve ser entendido como uma grande possibilidade (janela de oportunidades) para a atenção e o cuidado, podendo este usuário retornar várias vezes.
Deve ser realizado sem demora, evitando procedimentos burocráticos na chegada do usuário. É preciso facilitar que o usuário apresente a sua demanda ou solicitação;
 Não condicionar oferta de cuidados à exigência de frequência diária, à abstinência, respeitando o momento e o desejo do usuário, utilizando estratégias de redução de danos e baixa exigência;
Os familiares quando presentes também devem ser acolhidos em suas angústias e atendidos como usuários do sistema;
A escuta qualificada configura-se como uma intervençao que potencializa a organização e a realização da Promoção de saúde. Essa prática favorece a avavaliação do caso e o potencial de risco com o grau de sofrimento.
Qualidade é Direito – Serviços de Saúde Mental e a Qualidade do Cuidado 
O Projeto QualityRights: boas práticas que traduzem o compromisso dos serviços com respeito aos direitos, às necessidades, à autonomia, à dignidade e à autodeterminação dos seus usuários. São exemplos dessas boas práticas:
Consentimento informado – Nenhum usuário deverá ser privado ilegal ou arbitrariamente de sua liberdade e a admissão, e o tratamento em serviços de saúde mental deve estar de acordo com o consentimento livre e informado dos seus usuários;
Diretivas Antecipadas de Vontade: Trata-se de um documento no qual é especificado com antecedência um “conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade” (Resolução CFM 1995/2012). As diretivas antecipadas podem incluir também opções de tratamento e reabilitação que uma pessoa não deseja ter e, dessa forma, pode ajudar a assegurar que não receba qualquer intervenção contra sua vontade.
Técnica de Redução de Escalada da Crise: Constituem condutas para o manejo de situações eminentes de comportamento agitado e/ou agressivo, com vistas a evitar o isolamento, a contenção física e/ou química, além de prevenir danos aos usuários e às pessoas ao seu redor. Essas técnicas incluem: avaliação imediata e intervenção rápida em crises potenciais; postura de redução de risco; uso de métodos de resolução de problemas com a pessoa envolvida
Cenas e Histórias da RD
A Mulher do Lenço
Projeto de Redução de Danos junto a Atenção Básica (Escola de Redução de danos do SUS): Fabiana, 29 anos, usuária de múltiplas drogas, uso acentuado de crack. Residia com a mãe acamada (obesa, diabética, problemas nas articulações e renal), irmão envolvimento com tráfico, cunhada, filho (8 anos), filha (14 anos) e sobrinhos (4, 6, 9 e 12). História longa com a UBS e tentativas de cuidado. Acidente e internação na unidade de queimados. Visitas do ARD's. Preparação da alta hospitalar para CAPS AD em HN; Vinculação com o serviço; Articulações de com cuidado do corpo na UBS; Cuidado de si em casa. Fabiana de volta ao meio comunitário;  
Cenas e Histórias da RD
Vou ali e já volto
Sr. José naquele dia chegou ao CAPS AD há poucos dias. O serviço era novo para ele e pouco tinha conseguido falar de si. No terceiro dia frequentando o serviço, José saiu no meio da manhã e voltou bem embriagado. A equipe realizou os cuidados clínicos (repouso, hidratação) e ele foi participando dos grupos e oficinas da maneira como pode e conseguiu estar. Essa cena se repetiu por mais alguns dias e a profissional de referência o chamou para uma conversa. Combinaram de que quando ele quisesse sair pra beber conversaria primeiro com ela. No dia posterior, Sr. José chama e diz, vou sair. A profissional convence ficar só para o grupo, depois só para a oficina e depois só para o almoço. Ele diz de seu limite e fala que se não puder sair vai pular o muro. O portão é aberto, ele sai e volta alcoolizado. Senta ao lado da profissional e começa a conta: amanhã, minha filha começa a quimioterapia...
Cenas e Histórias de RD
Vou ali e já volto II
Dona Maria, alcoolista crônica, 67 anos, vinha de um tempo de estabilização em relação ao uso da bebida, dois filhos presentes e que cuidavam bastante dela, mas naquela semana por conta de conflitos em casa, que o CAPS AD já conhecia e encaminhava de perto, estava em um uso exacerbado de álcool. Neste dia, saiu e voltou mais de seis vezes, para beber. A equipe tentou muito manejos que não fizeram efeito. Com Dona Maria e a história do seu uso, era sabido que intervenções podiam ser feitas mesmo com Maria sob efeito  e que o limite precisava ser dado pelo outro nesse momento. Então de maneira muito afetiva a referência diz "hoje, a senhora não está conseguindo ficar no CAPS, hoje a senhora quer apenas beber, então vá pra casa, mas volte amanhã que estarei te esperando para entendermos o que tá acontecendo, o que acha?"
Cenas e Histórias de RD
Uma criança e seu cavalo
Hudson, 13 anos, chegou ao acolhimento com a família, no CAPS infantil quando tinha 7 anos. Começou usar drogas nessa idade. Vivia em uma periferia onde o tráfico estava muito estabelecido. Havia uma história de que o avô fazia avião para o tráfico em algum momento. Mãe usuária grave de crack, irmão de 17 anos com quadro de esquizofrenia e uso de drogas e Hudson começou o uso e foi aliciado pelo tráfico desde os 6 anos. Quando o conhecemos era chamado de "macaquinho do tráfico" no território onde morava. Aos 9 anos já era o cara que cobrava as dívidas do tráfico. Contou que executou pessoas. Andava armado. Em anos de tentativas de intervenções articuladas, em alguns momentos Hudson apresentava melhoras, quis voltar para escola, ganhou seu primeiro caderno da sua psicóloga do CAPSi. Era um garoto afetivo. Fomos aos poucos entendendo e reconhecendo o lugar de cuidado da mãe de Hudson na vida dele. Internação compulsória como estratégia (pasmem). Consultório de Rua;  O encontro com o cavalo; o desfecho

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