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Apostila-Completa-Teoria-da-Literatura

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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI
TEORIA DA LITERATURA
GUARULHOS - SP
SUMÁRIO
2 INTRODUÇÃO	4
3 O QUE É LITERATURA?	5
3.1 Teoria literária: o que é, e como surgiu?	9
3.2 Teoria literária: uma visão geral	10
3.3 Alguns pontos importantes da teoria literária	13
3.4 A estética da recepção e o fenômeno literário	17
3.5 Novos rumos da teoria da Literatura	21
4 TEORIA DA LÍRICA	23
4.1 Gênero Lírico	23
4.2 O que é poesia lírica?	24
4.3 Subjetividade	27
4.4 Lírica Moderna	28
4.5 Mudanças no conceito de lírica	31
4.6 Características da lírica moderna	33
5 TEORIA DA NARRATIVA	36
5.1 Gênero Narrativo	36
5.2 Caracterização do gênero narrativo	37
5.3 Tipos de narrativa	39
5.4 Foco narrativo	40
5.5 A narratologia e seus pressupostos fundamentais	43
5.6 Pressupostos fundamentais — as narrativas e a narratividade	46
6 TEORIA DO DRAMA	50
6.1 Gênero Dramático	50
6.2 Estrutura do texto dramático e linguagem	54
6.3 (
2
)Literatura dramática em diálogo com outras expressões literárias	59
 (
3
)
7 BIBLIOGRAFIA BÁSICA	65
7.1 Referências bibliográficas	65
1 INTRODUÇÃO
Prezado aluno!
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades.
Bons estudos!
 (
7
)
2 O QUE É LITERATURA?
A palavra literatura, em sentido amplo, aplica-se a todas as produções literárias de um país ou de uma época, sendo, portanto, um dos ramos essenciais do conhecimento humano. Literatura abrange os textos, orais ou escritos, sejam eles poesia, história, textos de gramática, eloquência, textos filosóficos ou teológicos, textos das ciências, dramas, etc., entretanto, a literatura não pode ser reduzida à sua etimologia — litterae, litteratura —, que se refere à “coisa escrita”. (GERCKE, 2016)
A literatura é um fenômeno extremamente complexo. É um tipo de arte que se utiliza da linguagem verbal (mas não necessariamente só dela) e, sendo assim, é um aspecto da cultura dos diferentes povos e nações. Se as culturas vão se modificando ao longo dos tempos com as novas realidades e necessidades, a literatura também vai ganhando novas roupagens e elementos. O que é considerado como literatura também se modifica de acordo com quem está pensando sobre isso. (MINUZZI, 2019)
Fonte:www.brasilescola.uol.com.br
A literatura pode parecer algo muito simples de ser definido e conceituado. Contudo, tente pensar a fundo sobre o que é literatura e por que alguns textos são considerados como literários e outros não. Afinal, as mesmas palavras que usamos no nosso dia a dia são aquelas que estão presentes em um romance ou em uma
poesia, por exemplo. E por que a poesia e o romance são considerados como literatura e nossas conversas com amigos não? O que diferencia um texto literário de um texto não literário? Essa não é uma questão simples, e muitos teóricos já se debruçaram sobre o problema, a fim de tentar resolvê-lo. (MINUZZI, 2019)
Eagleton (2006), em sua obra Teoria da literatura: uma introdução, levanta inúmeras definições já dadas à literatura ao longo dos tempos, sempre mostrando como elas não funcionam — ou como não funcionam em todos os casos e para todos os tipos de textos. Você também pode tentar fazer esse exercício com seus alunos: como eles conceituariam literatura? Pode ser que surjam respostas como: “É um texto que conta uma história” ou “É uma história que está em um livro”. Todas elas, na verdade, são simplistas demais e estão longe de dar conta da complexidade do fenômeno literário. Notícias e matérias de jornal, por exemplo, não são textos que contam histórias? O que, portanto, distingue a literatura de uma reportagem? Podemos falar antecipadamente que a literatura é uma forma de arte, assim como a pintura, a escultura, a música ou a arquitetura — a arte literária seria uma forma de arte com palavras. A seguir, analisaremos alguns conceitos e explicações de teóricos e pesquisadores para literatura. De acordo com Eagleton (2006, p. 24):
Se não é possível ver a literatura como uma categoria “objetiva”, descritiva, também não é possível dizer que a literatura é apenas aquilo que, caprichosamente, queremos chamar de literatura. [...]. Portanto, o que descobrimos até agora não é apenas que a literatura não existe da mesma maneira que os insetos, e que os juízos de valor que a constituem são historicamente variáveis, mas que esses juízos têm, eles próprios, uma estreita relação com as ideologias sociais. Eles se referem, em última análise, não apenas ao gosto particular, mas aos pressupostos pelos quais certos grupos sociais exercem e mantêm o poder sobre outros.
A explicação de Eagleton (2006) é bastante interessante na medida em que toca no assunto da complexidade do fenômeno literário. Essa complexidade resulta em uma dificuldade em conceituá-lo. A literatura não é uma categoria objetiva como a de insetos: os insetos formam um grupo com características predominantes e, assim, não interessa o tempo no qual eu vivo ou o espaço que habito, insetos sempre serão insetos. A literatura, ao contrário, é algo muito mais subjetiva: uma sociedade machista, por exemplo, pode apresentar a tendência de considerar textos escritos por homens muito mais frequentemente como textos literários do que aqueles produzidos
por mulheres; em uma sociedade racista, o mesmo ocorreria em relação a produções de brancos e de negros, por exemplo. Assim, o grupo que está no poder pode decidir o que será considerado ou não como literatura, uma vez que a definição do que é literário passa por juízos de valores, opiniões e gostos.
Às vezes, um texto pode ser escrito ou publicado inicialmente como não literário e acabar se tornando literário. Um exemplo é a carta de Pero Vaz de Caminha, que conta sobre o que ele e sua frota haviam encontrado ao chegar às terras brasileiras: Pero Vaz de Caminha tinha como objetivo, no momento da escrita, simplesmente o de avisar o rei de Portugal sobre o povo e as riquezas achadas; hoje em dia, porém, consideramos esse como o primeiro documento literário brasileiro, devido à sua importância histórica e cultural. Outro exemplo é o livro chamado Carta ao pai, de Franz Kafka. Kafka e seu pai viviam em conflito. Tentando resolver os problemas entre os dois, o autor escreve uma carta ao progenitor — mas acaba nunca a mandando. Depois de sua morte, a carta é publicada como literatura — e literatura de alta qualidade, diga-se de passagem. Apesar de todas as dificuldades de se definir literatura, podemos pensar em algumas possibilidades, como o conceito de Coutinho (1978, p. 9), no qual ele sublinha a literatura como uma forma de arte:
A literatura, como toda arte, é uma transfiguração do real, é a realidade recriada, através do espírito do artista e retransmitida através da língua para as formas, que são os gêneros, e com os quais ela toma corpo e nova realidade. Passa, então, a viver outra vida, autônoma, independente do autor e da experiência de realidade de onde proveio. [...] O artista literário cria ou recria um mundo de verdades que não são mais medidas pelos mesmos padrões das verdades ocorridas. Os fatos que manipula não têm comparação com os da realidade concreta. São as verdades humanas gerais, que traduzem antes um sentimentode experiência, uma compreensão e um julgamento das coisas humanas, um sentido de vida, e que fornecem um retrato vivo e insinuante da vida. A Literatura é, assim, vida, parte da vida, não se admitindo possa haver conflito entre uma e outra. Através das obras literárias, tomamos contato com a vida, nas suas verdades eternas, comuns a todos os homens e lugares, porque são as verdades da mesma condição humana.
Coutinho (1978) traz uma importante ideia: a literatura não é simplesmente uma cópia do real para dentro do texto, mas uma transfiguração do real. Existe uma anedota sobre uma conversa entre o poeta simbolista francês Stéphane Mallarmé e o pintor Edgar Degas. O pintor teria dito para o poeta que, apesar de estar com a cabeça cheia de ideias para um poema, ele sentava e não conseguia escrever absolutamente nada. Como resposta, Mallarmé diz que não se fazem poemas com ideias, mas com palavras. Em outras palavras: podemos até nos inspirar no real e em experiências do
mundo físico para produzir um texto literário, mas a literatura é muito mais do que isso (COUTINHO, 1978).
A literatura não apenas conta histórias — o como se conta a história é igualmente relevante, visto que os recursos estéticos são essenciais no texto literário. A forma é uma preocupação do escritor de literatura, pois o texto literário trabalha com a linguagem estilizada, artística, utilizada de um modo diferente de como é empregada no dia a dia.
Além disso, a literatura não tem compromisso com o real: bruxas, vampiros, pessoas que voam, etc., são personagens completamente possíveis no texto literário. Apesar disso, cada texto deve ser verossimilhante (i.e., os seus elementos devem fazer sentido dentro do universo ficcional criado, mesmo que esse não seja condizente com o mundo real). Por último, devemos ressaltar, ainda, a literatura como contendo verdades humanas eternas. Você já parou para pensar no motivo de, por exemplo, continuarmos lendo as peças de William Shakespeare, que foram produzidas lá no século XVI? Elas continuam fazendo sentido para nós, pois abordam temáticas humanas universais, como a traição, a loucura ou o amor impossível. Mesmo que as histórias se passem em lugares e em tempos específicos, essas narrativas poderiam se passar em inúmeros outros contextos. A literatura, enquanto arte, não precisa servir para nada a não se causar um prazer estético. Contudo, apesar disso, em muitas ocasiões, a literatura cumpre papéis sociais determinantes. Para você pensar sobre essa questão, leia o excerto a seguir, fragmento de um romance do escritor angolano Agualusa (2012, p. 49):
Tiravam-nos tudo, a dignidade, as terras, os homens. E no fim o próprio rosto [...]. Tiravam-nos todo o passado e nós olhávamos em volta e não éramos capazes de compreender o mundo. Então começamos a escrever poesia. A poesia era um destino irreparável, naquela época, para um estudante angolano.
Estação das chuvas é um livro sobre a Guerra de Libertação em Angola. O país africano, até 1975, era colônia de Portugal. Alguns grupos, entretanto, desejavam a liberdade, e, em 1961, eclode a luta dos angolanos para ganhar a sua liberdade. Veja que a poesia, para esses homens, servia como uma forma de retomar a identidade arrancada deles pelos portugueses (o rosto arrancado pelos portugueses a que se refere o trecho). Ao longo de séculos, os europeus colocaram a cultura e os costumes
africanos como perigosos, selvagens e inferiores. Além disso, para ascender socialmente, os angolanos eram obrigados a assumir a cultura portuguesa. Na segunda metade do século XX, ao contrário, eles procuram resgatar esses elementos perdidos, e uma das formas é a produção literária. Portanto, literatura pode ser pensada como uma forma de arte que transfigura a realidade, que trata de verdades humanas e que faz parte da identidade de um indivíduo, de um grupo, de uma nação. A literatura ainda é uma categoria subjetiva.
2.1 Teoria literária: o que é, e como surgiu?
A literatura pode enriquecer a sua vida, seja como simples entretenimento, seja como fonte de conhecimento e reflexão sobre valores e ideias. Porém, são necessários certos conceitos ou ferramentas teóricas para que o leitor possa entender a linguagem literária de maneira ampla. A teoria literária traz à tona esses conceitos e ferramentas para estudar a obra, o autor, o leitor e todo o processo que envolve as produções literárias e seus conteúdos. É com base na teoria da literatura que são feitas as resenhas, as análises e as críticas literárias. A teoria da literatura possui uma base de dados. Essa base permite elaborar um método de reflexão e análise dos textos literários. No cruzamento desses dados, pertinentes à trajetória da produção literária de um determinado período, você consegue identificar as mudanças ocorridas no processo histórico com relação ao homem e tudo que o envolve. (LIMA, 2018)
Fonte : www.recortelirico.com.br
Segundo Lima, 2018 os primeiros estudos que utilizaram a expressão “teoria da literatura” datam do século XIX e apareceram na Alemanha. Os alemães empregaram igualmente a expressão “ciência da literatura” para garantir o conjunto de regras científicas, e não artísticas, de seu trabalho. No século XIX, a teoria da literatura se voltou sobretudo para questões de ordem histórica, sendo investigadas as obras do passado de um país, para que fosse escrita a história da literatura daquela nação. As primeiras histórias da literatura nasceram entre o final do século XVIII e o início do século XIX, na Inglaterra e na Alemanha principalmente. Ao lado da história da literatura, se desenvolveu igualmente a literatura comparada, sobretudo na França da segunda metade do século XIX, voltada para o estabelecimento das semelhanças e diferenças entre as produções literárias de diferentes países. Se a história da literatura separava as obras conforme a nacionalidade dos autores, a literatura comparada procurava aproximá-las. Para isso, examinava as ascendências de uns escritores sobre os outros a fim de constituir uma rede de interlocução entre eles.
2.2 Teoria literária: uma visão geral
Como objeto de estudo, a literatura é analisada com vistas a delimitar elementos que a particularizam enquanto manifestação da linguagem e representação universal.
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Nessa perspectiva, é necessária a identificação do que é ou não considerado literatura com base em investigações acerca de características comuns, distintas, traços que estabelecem relações com gêneros literários, etc. Como manifestação artística, a obra deve possuir um valor que possa ser identificado em todas as obras literárias ou em alguns grupos específicos pertencentes aos gêneros literários, sendo uma das funções da teoria da literatura justamente definir quais são esses elementos conforme os seus modos de manifestação. (LIMA, 2018)
As contribuições para esse campo do saber por meio das concepções gregas apontam como objetos de estudos literários a preocupação em diferenciar o que é ou não considerado literatura. Secundariamente, voltaram o seu olhar para a formulação de um conjunto de preceitos que deveriam ser seguidos pelos escritores para que as suas construções literárias atingissem a perfeição no que tange aos recursos expressivos quanto às regras estabelecidas para cada gênero literário compreendido como tendência na época (AMORA, 2004).
Na Renascença, entre os séculos XVI e XVIII, a teoria da literatura se desenvolveu como um esforço para dedicar-se ao estudo formal da literatura greco- latina, adotando princípios advindos das tendências presentes no período clássico. Mais tarde, já no século XIX, marcada pelo Romantismo e pela sua crítica ao Classicismo, a teoria literária “deixou de ter finalidade preceptística e didática e passou a visar os conhecimentos dos fatos literários” (AMORA, 2004, p. 25).
No fim do século XIX, a teoria é influenciada pelo cientificismo, que favoreceu a ampliação do campo de investigação em uma ciência com foco no saber positivo (positivismo científico) dos fenômenos literários. No decorrerdos séculos subsequentes, realizando um panorama das histórias das teorias da literatura, podemos refletir sobre três questões, nas palavras de Amora (2004, p. 27):
· O estudo dos aspectos e problemas gerais da literatura se fez, durante vários séculos, em mais de uma disciplina — na Poética, na Retórica, na Estética e na História Literária — e dado este fato, difícil se torna, aos principiantes, acompanhar a evolução desse estudo.
· Se quisermos reduzir essa evolução a ideias essenciais podemos dizer que os teóricos da literatura visaram, nos séculos clássicos (antigos e modernos), sobretudo a indicar, aos escritores, um caminho para atingir o
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que não se idealizava como perfeição literária; e que no século XIX visaram a demonstrar que cada civilização produz um tipo de literatura e que as literaturas, em suas formas, nos seus gêneros, evoluem através do tempo, e daí não se poderem tomar as teorias clássicas como absolutas e universais.
· No fim do século XIX começou a revisão das ideias de seus teóricos e com essa revisão teve início uma nova época da Teoria da Literatura.
Fonte: www.letrando.webnode.com
Segundo Amora (2004), posto esse panorama das principais tendências da história da teoria da literatura, a seguir verificaremos em que estado se encontra esse campo do Estado atual da teoria literária “saber humano” atualmente. Antes de avançarmos, devemos assumir como premissa que o fato de nos aprofundarmos sobre o estado atual da teoria da literatura não significa que chegamos ao ápice da sua trajetória, pois o conhecimento está em constante desenvolvimento, sendo passível de reformulações no que tange aos seus princípios, às suas metodologias e aos seus objetos de investigação. Partindo desse pressuposto, relembramos que, no século passado, a teoria literária se dividiu em correntes de caráter filosófico e científico: a primeira considerou o fenômeno literário como possuidor de uma essência abstrata analisada no campo das ideias, já a corrente científica considerava que não havia outros fenômenos literários que não pudessem ser analisados senão pelo seu
caráter objetivo e científico inerente à realidade concreta. Após a primeira metade do século XX, essas duas correntes enfim se conciliaram, motivando especialistas a concluir que, para refletirmos sobre questões tais como o que é a literatura e quais as razões para existirem distintos gêneros literários, era essencial a investigação de dados concretos com base em metodologias científicas que partissem de hipóteses e especulações determinadas. Assim, houve a junção de elementos filosóficos e científicos que formularam a disciplina a que denominamos teoria da literatura. Outra notória evolução foi a individualização no que tange às demais áreas de estudos literários, como a análise, a crítica e a historiografia literárias. Esse processo de desvinculação, no entanto, não atrasou o seu processo evolutivo, pois novas investigações, problematizações, pesquisas e reflexões trouxeram-nos novas contribuições.
Assim, no estado atual, os críticos modernos defendem o entendimento de que a obra literária é simultaneamente geral e particular, distinguindo “individualidade” de “particularidade e unidade”. (LIMA, 2018)
De acordo com Wellek e Warren (2003, p. 9) “cada obra de Literatura tem as suas características individuais, mas também compartilha propriedades com outras obras de arte”.
2.3 Alguns pontos importantes da teoria literária
O processo de leitura de uma obra por um especialista é cheio de informações diferenciadas e simultâneas. É como se o estudioso usasse óculos multifocais para não perder de vista as relações do tempo presente com o presente, do presente com o passado e do passado com sua própria época. Uma obra literária não se limita a exprimir um aspecto da vida social, nem se restringe a características formais. É
fundamental que a estrutura da obra seja consequência da transformação dos aspectos externos (como a sociedade) em elementos internos da estrutura textual. As normas estéticas consideradas em uma obra literária correspondem aos critérios estabelecidos pela sociedade para determinar o que é e o que não é considerado arte literária. Trata-se de um código preexistente a partir do qual as obras individuais se enquadram ou não no universo da literatura. (GERCKE, 2016)
Fonte: www.socialbauru.com.br
A obra literária, por meio de seus padrões estéticos, produz o efeito de estudo da história, da crítica e da teoria literária, estranhamento ao se apresentar como objeto desconhecido e inovador que leva o leitor a ver o mundo de modo diferente. É o leitor que assegura o que é ou não considerado um clássico da literatura, por demonstrar (por meio dos seus hábitos e preferências literárias) que as obras do passado continuam a ser lidas no presente (historicidade).
Conheça alguns princípios que segundo GERCKE (2016), a teoria literária utiliza para analisar uma obra:
· O estudo de uma obra literária, o ato criador do artista, ou as reações do leitor diante de uma obra, não podem se confundir com crítica literária, ou com o estudo apenas dentro do contexto histórico.
· O estudo teórico de uma obra literária pode ser feito em um nível científico e filosófico. No científico, a produção literária é considerada apenas nos seus critérios mais objetivos: a forma ou estrutura da obra literária, o comportamento do leitor ou de um público específico influenciado pela obra. No nível filosófico, a obra literária pode ser avaliada segundo aspectos não tão objetivos,
aspectos que devem ser admitidos como “reais”; por exemplo: a vocação literária, o ideal literário, o estado emocional provocado por uma obra. No nível filosófico, as conclusões teóricas podem ser um pouco especulativas e ir muito além.
· Nos níveis científico e filosófico, é indispensável partir da análise dos aspectos objetivos do mesmo fato. Até mesmo as especulações filosóficas sobre as realidades abstratas da obra literária têm que estar fundamentadas em conhecimentos científicos. Um exemplo: para refletir sobre a vocação literária de um autor, que é um dom inexplicável, é necessária uma rigorosa análise da psicologia artística; já para analisar o belo literário, a “obra-prima”, você deve recorrer aos termos da filosofia, da estética, que analisa as qualidades das obras consideradas belas.
· 	Para a análise objetiva de uma obra literária, você sempre tem que se orientar por métodos de trabalho. Esses métodos variam de acordo com a obra a ser analisada (os fatores psicológicos que deram origem à obra, as tendências literárias do momento, entre outros fatores, podem dar a direção aos estudos). Os métodos também variam na medida em que você aprofunda seu conhecimento sobre a obra. Esses métodos compõem o que se conhece como análise literária.
· A teoria da literatura é uma área de estudo em permanente evolução. Você deve considerar e tentar compreender essa evolução, seu estado atual e, na medida do possível, suas perspectivas.
Segundo GERCKE (2016), a teoria literária não é um método teórico limitado e rígido. Há a estrutura básica, mas existem várias linhas de estudo dentro da teoria da literatura. As indispensáveis são as seguintes:
· Teorias interpretativas: a teoria da literatura exige um modelo básico para a interpretação de cada um dos textos literários;
· Construção de modelos: cada teoria oferece um método mais ou menos padronizado a partir do qual é possível interpretar textos ainda desconhecidos;
· Terminologia: os resultados obtidos a partir do método padronizado devem ser analisados segundo uma lista de outros conceitos gerais. A teoria literária está o tempo todo buscando conceitos que sejam válidos para todos os textos.
Como está configurada neste momento, ela só é válida até que apareça um texto literário que já não se enquadre nos seus modelos, métodos e conceitos gerais. Ao surgirem textos que fogem ao que já é conhecido e consagrado, a teoria tem de ser adaptada. O objetivo fundamental da teoria da literatura é fazer com que uma obra literáriadeixe de ser apenas um texto encantador e comovente. A obra deve passar a ser considerada uma produção cultural embasada na realidade, na vida, revelando aspectos que, em um primeiro momento, fogem à compreensão.
Por meio da teoria literária, você pode apurar seu senso crítico. Além disso, ela objetiva um estudo sistemático e metódico de cada obra. Veja alguns objetivos que se destacam:
· Estabelecer um sistema de fundamentos, conceitos e métodos comuns aos estudiosos da literatura;
· Articular e relacionar os conhecimentos literários em um conjunto mais abrangente, conforme questionamentos políticos, sociais e culturais;
· Ir além dos conhecimentos obtidos em uma primeira leitura das obras literárias;
· Diferenciar os elementos de generalidade e particularidade da obra para que não sejam confundidos com individualidade (aspectos subjetivos) e singularidade absoluta;
· Investigar os princípios gerais da literatura;
· 	Definir conceitos para que os estudos literários não sejam apenas atos individuais de leitura. O processo de análise tem como objetivo a leitura crítica dentro de um panorama em constante transformação e expansão;
· 	Estudar a literatura como um todo; com uma análise linguística, semântica, temática, histórica, dentro de um âmbito internacional. A literatura ultrapassa barreiras linguísticas e deve ser pensada também nos termos da literatura universal;
· 	Dentro da universalidade, buscar o que é específico em cada obra, único. Buscar o que pode determinar a condição artística do texto.
A ciência da literatura e a filosofia da literatura são, portanto, dois níveis de trabalho que se completam e formam uma só disciplina, que é a sua conhecida e atual
teoria da literatura. Não só essa conciliação da ciência da literatura com a filosofia da literatura foi importante, mas também a individualização da teoria literária em relação aos demais campos de estudos literários, a análise, a crítica e a historiografia literária. (WELLEK, 2003)
2.4 A estética da recepção e o fenômeno literário
Segundo Eagleton (2006), é possível pensar na história da moderna teoria literária como apresentando três períodos: um primeiro que se preocupa com o autor, durante o Romantismo e o século XIX; o segundo, que olha exclusivamente para o texto literário, na Nova Crítica; e, por último, uma grande atenção ao leitor, no final do século XX.
Fonte: www.portaldoenvelhecimento.com.br
A estética da recepção ou teoria da recepção encontra-se neste último período, que coloca o leitor como centro privilegiado. Sempre o menos privilegiado dos três aspectos, sem o leitor, não existiria literatura, pois é o receptor do texto que transforma as letras, palavras em frases dentro de um livro em um texto com um significado. Assim, para a literatura existir, o leitor é tão fundamental quanto o autor. Dentre os principais nomes dessa teoria, pode-se citar os alemães Wolfgang Iser e Hans Robert Jauss e o americano Stanley Fish. Para eles, é a dinâmica da leitura o que importa: a relação entre autor, obra e leitor. Produção, recepção e comunicação são três palavras fundamentais, e a literatura só existe quando existem todos esses elementos — nesse sentido, o texto de um autor que fica guardado na gaveta e nunca é publicado não
pode ser considerado como literatura propriamente dita, mas ele pode se tornar literatura no momento em que for descoberto e começar a ser lido.
Eagleton (2006, p. 116) diz que, durante a leitura:
[...] o leitor estabelece conexões implícitas, preenche lacunas, faz deduções e comprova suposições – e tudo isso significa o uso de um conhecimento tácito do mundo em geral e das convenções literárias em particular. O texto, em si, realmente não passa de uma série de ‘dicas’ para o leitor, convites para que ele dê sentido a um trecho de linguagem. Na terminologia da teoria da recepção, o leitor ‘concretiza’ a obra literária, que em si mesma não passa de uma cadeia de marcas negras organizadas numa página. Sem essa constante participação do leitor, não haveria obra literária.
A fim de elucidar essa explicação, analisaremos um pequeno conto do escritor gaúcho Noll (1999, documento on-line), chamado Grêmio:
Quando minha mãe morreu, eu acordava em Florianópolis. Na rodoviária de Porto Alegre pedi ao taxista que me levasse depressa. A viagem atrasara. Ele disse que, como o cemitério ficava perto do campo do Grêmio e tinha jogo naquela noite, o trânsito não estaria fácil. Passamos pelo clarão do estádio. O motorista ostentava quase um desconsolo, embora eu não tivesse confessado a qualidade íntima do velório. O padre soube observar meu suor. Horas depois forcei a chave para entrar no apartamento dela. Por que não tentar desde logo o que eu não ousara formular até ali? Virei-me. O cão rosnava. Preparava sua fúria para me atacar.
Alguns elementos do texto podem parecer segundo Sadanha (2019), em um primeiro momento, um pouco misteriosos, e cabe ao leitor preencher as lacunas e dar sentido a essas frases. Em primeiro lugar, o narrador diz: “eu acordava em Florianópolis”. Aqui, o leitor deve acionar os conhecimentos sobre os sentidos dos tempos verbais: o pretérito imperfeito indica uma ação que se repetiu no passado. Assim, concluímos que ele vivia em Santa Catarina e precisou realizar uma viagem, a fim de ir ao velório da mãe, em Porto Alegre, pois, na frase seguinte, ele já indica a rodoviária da capital do Rio Grande do Sul. Outro elemento interessante são as elipses temporais: como a narrativa é extremamente curta, o narrador deixa de contar inúmeros fatos e de indicar o tempo que passou. Na primeira frase, por exemplo, ele diz que vivia em Florianópolis. Na segunda, ele já está na rodoviária de Porto Alegre. Entre um e outro momento, ele pegou um ônibus e passou algumas horas viajando até chegar. Ele fala que estava no táxi e, a seguir, já afirma que “o padre soube observar meu suor”. Ele não explica que o táxi chegou ao cemitério, que ele desembarcou e que se dirigiu ao local do velório. Todas essas informações devem ser
preenchidas pelo leitor, que desempenha uma função ativa na hora da leitura. As últimas frases também são bastante enigmáticas: “Horas depois forcei a chave para entrar no apartamento dela. Por que não tentar desde logo o que eu não ousara formular até ali? Virei-me. O cão rosnava. Preparava sua fúria para me atacar”. Por que o cão rosnou para ele? Talvez porque ele não visitasse regularmente a sua mãe, e, portanto, o cachorro não estava familiarizado à sua presença. E o que ele não ousara formular até então? A ausência da mãe denunciada por todos os seus pertences sem ela por perto? Ou será que o cão é, na verdade, um animal metafórico que representa a dor da perda? Cabe ao leitor formular hipóteses e deduções e definir as suas preferidas. Quando terminamos o conto, podemos voltar ao seu início e ler de forma diferente as primeiras frases, já que a leitura e a interpretação não são atos cumulativos, e o que vem depois pode alterar nossa percepção do que veio antes: “lemos simultaneamente para trás e para frente, prevendo e recordando, talvez conscientes de outras concretizações possíveis do texto que a nossa leitura negou.
Além do mais, toda essa complicada atividade é realizada em muitos níveis ao mesmo tempo, pois o texto tem ‘[...] segundos e primeiro planos’, diferentes pontos de vista narrativos, camadas alternativas de significado, entre as quais nos movemos constantemente [...]” (EAGLETON, 2006, p. 118).
Em sua obra O ato de leitura, de 1978, Wolfgang Iser explana sobre a necessidade de o leitor dominar certas técnicas e convenções literárias para o entendimento de cada obra. Cada gênero possui suas marcas e precisamos estar mais ou menos familiarizados com elas, a fim de compreender um texto. No entanto, nunca deve haver, na literatura, uma adequação total entre os códigos das obras literárias e os conhecimentos e códigos do leitor, pois uma das funções do texto literário é o de constantemente desacomodar o leitor e suas crenças. “Para Iser, a obra literária mais eficiente éaquela que força o leitor a uma nova consciência crítica de seus códigos e expectativas habituais [...]” (EAGLETON, 2006, p. 119).
Quando a obra literária tem valor, ela deve violentar e transgredir o leitor e suas crenças. Assim, Iser afirma que, durante a leitura, o leitor deve ser flexível e manter a mente aberta, caso contrário, a literatura não poderá cumprir seu maior objetivo, que é modificar as crenças. Portanto, um leitor com fortes e rígidas convicções será um leitor inadequado.
Já para Hans Robert Jauss, o panorama histórico é muito importante para entendermos um texto literário e deve ser levado sempre em consideração: tanto o período histórico em que uma obra foi escrita quanto aquele em que é lido por cada leitor (EAGLETON, 2006).
Isso porque o leitor é aquele que finalizará a escrita de um texto, pois é apenas após a sua interpretação que o texto fica completo, e, sendo assim, as especificidades do leitor e do período em que ele vive modificarão a leitura. A forma como uma obra é recebida em diferentes épocas é chamada de recepção histórica. Eagleton (2006, p, 126) explica: “[...] as obras literárias, em si mesmas, não permanecem constantes, enquanto as suas interpretações se modificam; os próprios textos e tradições literárias sofrem modificações ativas, de acordo com os vários horizontes históricos nos quais elas são recebidas [...]”. Por fim, o crítico americano Stanley Fish afirma que não existem textos literários de forma objetiva, já que é apenas quando leitor lê o texto que ele é completado. Nesse sentido, para Fish, o leitor é o verdadeiro autor, pois não há nada “dentro” da obra literária, e é o leitor que dá vida a ela, ou seja, é ele que atribui sentidos a ela. Entretanto, é importante frisar que nem todas as interpretações de um leitor em relação ao texto literário são válidas, na medida em que o autor cita algumas “estratégias de interpretação” que os leitores possuem em comum e que determinarão as suas leituras. Por isso, nossas interpretações não são completamente livres, apesar de conterem uma grande liberdade. A interpretação da literatura é muito mais livre do que a interpretação de textos não literários, que são textos com a tendência de serem objetivos ou, pelo menos, mais objetivos do que os literários (EAGLETON, 2006, p. 121).
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Fonte: www.super.abril.com.br
O que devemos reter dessas teorias é a importância conferida por elas ao leitor, elemento que comumente ficava de fora dos estudos da literatura, mas que é fundamental para compreendermos a literatura enquanto fenômeno social.
2.5 Novos rumos da teoria da Literatura
Como você viu, na primeira metade do século XX, a teoria literária acabou ficando dividida entre duas linhas de trabalho: uma de caráter científico e a outra de caráter filosófico. A corrente filosófica partiu do princípio de que o fenômeno literário deveria ser pensado apenas no plano das ideias, pois uma obra, sendo uma realidade (um livro impresso, algo material), tem, no entanto, uma essência abstrata (o seu conteúdo). Essa essência, sendo abstrata, não poderia ser analisada objetivamente. Ao se considerar o conteúdo de uma obra, bem como seus valores artísticos, como abstratos, a essência do ato de criação dessa obra também é abstrata. O escritor é uma pessoa real, com sua biografia, com suas escolhas. Mas o processo criativo que produziu sua obra estava no seu interior, foi algo subjetivo com uma imensa complexidade psicológica e com infinitas incógnitas de toda espécie, sobre as quais só se pode pensar em termos filosóficos. Ao se definir, segundo a corrente filosófica, que a essência da obra e do autor são abstratas e, portanto, passíveis apenas de especulações, também se pode dizer isso de outros fatos literários. (WELLEK, 2003)
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Por exemplo:
· O leitor (dentro do qual se processa o ato recreativo e também subjetivo da obra),
· O ambiente cultural de uma obra (constituído de sentimentos e de ideias);
· E, por fim, a história literária (que é uma evolução desses sentimentos e ideias). Partindo de todos esses princípios, se definiu e se impôs a corrente da teoria literária chamada de filosofia da literatura. Em contrapartida a essa corrente filosófica surgiu, na mesma época, a corrente de estudos conhecida como ciência da literatura. Ela nasceu com o seguinte princípio: não há nada nos fatos literários que possa escapar a uma análise objetiva e científica.
Partindo de todos esses princípios, se definiu e se impôs a corrente da teoria literária chamada de filosofia da literatura. Em contrapartida a essa corrente filosófica surgiu, na mesma época, a corrente de estudos conhecida como ciência da literatura. Ela nasceu com o seguinte princípio: não há nada nos fatos literários que possa escapar a uma análise objetiva e científica. (GERCKE, 2016).
Fonte: www.avozdaserra.com.br
3 TEORIA DA LÍRICA
3.1 Gênero Lírico
O adjetivo “lírico” vem do nome da lira, instrumento musical utilizado pelos gregos para acompanhar seus cantos. Daí surgem também as expressões “poema lírico”, “poesia lírica”. Até o final da Idade Média, os poemas eram cantados, mas pouco a pouco foram afastando-se do acompanhamento musical, e o texto passou a ser mais trabalhado formalmente através da divisão estrófica, da medida dos versos e do esquema rímico. A rima vai surgir na literatura cristã e, segundo Emil Staiger (1974, p. 38), com o objetivo de substituir “a variedade métrica da lírica antiga, que vai aos poucos desaparecendo”.
Fonte : www.provasdiscursivas.com.br
Em relação ao conteúdo, a poesia lírica traz sempre um eu confessando suas emoções, seu estado de espírito. O lírico está associado ao emotivo, ao subjetivo. Hegel em sua Estética diz que o que se faz presente na poesia lírica é o sujeito a partir de suas experiências individuais. Dessa forma – continua pensando ele – o conteúdo da poesia lírica vem dos juízos subjetivos, das emoções, das alegrias, das dores, das angústias que, em determinado momento, ocupam lugar na consciência do poeta e em outro momento ocupam lugar na poesia que ele compõe.
O gênero lírico, diferentemente do narrativo, convida imediatamente o leitor a participar e mesmo a assumir o ato enunciativo, pois o uso da primeira pessoa do discurso é típico de grande parte das criações poéticas. Essa forma discursiva é responsável, muitas vezes, pela indistinção entre autor e sujeito lírico. (MELLO, 2001)
Quando a voz lírica produz um enunciado de tendência descritiva ou narrativa em relação a algo que interessa ou diz respeito ao universo infantil, sem se assumir como criança ou seu porta-voz, fica mais difícil distinguir o destinatário do poema, podendo-se inferi-lo pelo tipo de percepção ou de avaliação que destila do discurso poético. (MEIRELLES, 1994, p. 723)
O tempo do lírico é o da recordação, conforme Staiger, do sentir de novo uma emoção passada ou mesmo de sentir antecipadamente, no presente, algo que está para ocorrer. Recordar, como a própria etimologia da palavra indica - cor, cordis - alude ao reviver algo, no presente, com o sentimento do já vivido ou do por viver (STAIGER, 1970).
3.2 O que é poesia lírica?
Em diferentes contextos e situações, todo e qualquer indivíduo, letrado ou não letrado, produz e lê textos. Os textos são produzidos com diferentes intencionalidades e circulam entre interlocutores distintos. Eles assumem uma forma, uma finalidade e uma intencionalidade para compor o processo de comunicação. Ou seja, quando estão em jogo manifestações da linguagem e quando se concretiza uma mensagem, o que representa tal mensagem concretizada é o texto. O texto pode ser oral ou escrito. Também pode ser verbal, não verbal ou misto. Um texto não verbal, por exemplo, corresponde a uma pintura, a uma fotografia ou, até mesmo, ao tom de voz e aos gestos. (SPESSATO, 2019)
Fonte: www.mosqueteirasliterarias.comunidades.net
Um texto misto é a fala humana. Nela, juntamente com a mensagem, há gestos e tom de voz. Outro exemplo é uma charge, em que figuras se conjugam com a escrita.Dentro das inúmeras possibilidades textuais, é interessante subdividir os textos em literários e não literários (ou informativos). Os textos literários correspondem à literatura, a obras ficcionais e ao uso de uma linguagem poética. Já os não literários têm uma finalidade bem específica: informar. Gonzaga (2007) simplifica essa dicotomia entre os dois tipos de texto com um exemplo bastante simples, porém esclarecedor: quando se resume o texto literário, perde-se o essencial; em contraponto, quando se resume o texto não literário, sobra o essencial.
As obras literárias, assim como as não literárias, são classificadas em diferentes grupos, os quais correspondem à sua forma e à sua finalidade. Todo texto literário se encaixa em um grupo específico, em um gênero textual. A abordagem sobre gênero corresponde à finalidade e à forma de determinado texto. Convencionalmente, na literatura, há três grupos ou gêneros: o gênero épico, o gênero lírico e o gênero dramático. Segundo Reis (2014), essa é a tripartição tradicional dos gêneros desde a Antiguidade, mas recentemente (na Modernidade), fala-se também em modos do discurso, que são o modo narrativo, o modo lírico e o modo dramático. Assim, o modo narrativo pode incluir o gênero épico (as epopeias) e outros gêneros que envolvem tipos textuais narrativos, como romance, conto, etc. Já o modo lírico pode incluir
poemas, como sonetos, e o modo dramático pode incluir dramas, comédias, etc., ou seja, está relacionado ao teatro.
O modo narrativo engloba as obras literárias que apresentam uma narrativa com narrador, enredo, personagens, tempo e espaço. Elas podem se apresentar em forma de poema, ou seja, ser escritas em verso, como Ilíada e Odisseia, ou em forma de prosa, como em contos ou romances. Já o modo dramático é aquele que imita a realidade ou que cria mundos possíveis a partir do real por meio de personagens em ação, ou seja, trata-se de peças de teatro, por exemplo. A representação desse gênero se manifesta tanto em tragédias quanto em comédias e, mais moderadamente, em dramas. As peças de William Shakespeare são exemplos. No modo lírico, o eu lírico registra, principalmente, a sua subjetividade, seus pensamentos e as suas emoções. A poesia lírica ou poema lírico é a forma como a obra se apresenta. Na concepção clássica, enquanto textos em prosa ou em verso possuem estruturas textuais distintas ligadas à literatura, a poesia pode se apresentar em outros tipos de manifestações artísticas (como poemas, pinturas, fotografias, etc.), chamadas, então, de poéticas. A concepção de poesia se resume à representação do sentido, e a do poema, à representação da forma. A poesia representa a esfera abstrata da arte, enquanto o poema é apenas uma de suas manifestações. Assim como uma pintura ou uma fotografia são manifestações poéticas, o poema também o é. Atualmente, na esfera literária, é possível fazer referência a poema lírico e poesia lírica como sinônimos. (SPESSATO, 2019)
A poesia lírica é organizada em versos e estrofes. O seu conteúdo carrega um caráter subjetivo bastante marcante. Esse tipo de gênero, portanto, apresenta obras com marcas salientes de subjetividade, com uma intensidade emotiva bastante significativa. Os versos se caracterizam, normalmente, por efeitos rítmicos e sonoros, e a linguagem é original e sugestiva. Todas essas características possuem como principal objetivo despertar a emoção no receptor. Na poesia infantil, o receptor deve ser visto como o principal motivador da forma e do sentido de um poema. Ou seja, uma boa poesia infantil deve fazer sentido, ter um significado para os seus leitores. No Quadro 1, veja a divisão clássica dos gêneros literários a partir da Antiguidade. Atualmente, em geral, não se vê mais o romance ou o conto como subgêneros, por exemplo, mas como gêneros.
3.3 Subjetividade
Como você viu, uma das definições mais pontuais da poesia lírica — que não abrange tanto a forma, e sim o conteúdo — é a subjetividade. A subjetividade é algo que depende da visão de cada pessoa, é a interpretação que cada indivíduo tem sobre determinado aspecto. Ou seja, é inquestionável que o poeta lírico expressa o seu mundo subjetivo. O poema lírico, para Gonzaga (2007), se constitui pelo extravasamento da alma. Portanto, o que acentua a diferença entre ele e as outras manifestações é o seu objetivo e a sua emoção: a poesia lírica centra-se no registro das emoções.
Fonte: www.revistacult.uol.com.br
No entanto, é importante ressaltar que a subjetividade em si não é suficiente para caracterizar uma poesia lírica. Por mais que se saiba da importância da marca do “eu”, ela sozinha não caracteriza um gênero. Caso caracterizasse, todos os dias, quando alguém expressasse os seus sentimentos, estaria fazendo um poema. Dessa forma, ao caracterizar uma poesia lírica, você deve atentar não somente ao sentido do poema, mas também à sua forma e à sua linguagem. Ou seja, a expressão poética perpassa o sentido literário, pois carrega consigo a beleza e a criatividade formal. (SPESSATO, 2019)
3.4 Lírica Moderna
Há diferenças pelo que se entende por poesia, se considerada a partir de escolas tradicionais ou mais recentes. Há também uma divisão que ocorre entre a poesia chamada “moderna” e a contemporânea. (FERREIRA, 2017)
Segundo Ferreira (2017), a poesia é um gênero textual rico na produção de sentidos. Atualmente, não é necessário o uso de rimas, de métrica, de linguagem rebuscada na sua construção. Essas características começaram a ser modificadas no Romantismo e passaram quase a ser mais visíveis no século XX.
Com o romantismo, os temas do EU, da consciência, do sonho, e do símbolo passam a ser objetos da escrita literária. A obra de arte romântica mantém o foco em uma parte secreta do EU, é voltada para o íntimo. Entre o Romantismo e a poesia da primeira metade do século XX, mais do que a retomada de temas e ideias, existe uma abordagem espiritual. A lírica moderna tem suas raízes no Romantismo, momento em que os poetas tomam consciência de que a vida não poderia ser explicada por meio de mecanismos racionais, pois o universo é algo muito mais misterioso e imprevisível, mas encontrou sua plenitude com o Simbolismo. (FERREIRA, 2017)
Um dos principais nomes do Simbolismo foi o de Charles Baudelaire (1985), que escreveu obras como As Flores do Mal em 1857. Esta trata de temas avessos ao clássico belo, buscado pelos poetas parnasianos, e se debruça sobre a melancolia, o feio, a hipocrisia, entre outros. Os poetas simbolistas consideram o símbolo como recurso para expressar o vago e multiforme mundo interno do ser humano, e suas indagações sobre os mistérios cósmicos. A linguagem simbólica na lírica moderna é o recurso que estabelece, ao mesmo tempo, como presença e ausência, algo que não é possível captar, o mistério, cuja realidade só pode ser pressentida. Para os românticos e para os simbolistas, o símbolo está conectado ao mistério. (REIS, 1999)
Fonte: www.atoresnomercado.com.br
Uma das possibilidades do símbolo, nesse movimento, é que pode conectar, por meio da palavra, a realidade concreta com um sentido mais abstrato. Assim, é possível dizer muito, ou deixar muito implícito, a partir de poucas palavras. Essa prática pode ser vista na obra do poeta Stéphane Mallarmé, conhecido por textos como Lance de dados, de 1897. Em sua obra mais tardia, também explora a relação entre forma e conteúdo, liberando o poema de sua disposição tradicional (vertical, em versos) e distribuindo-o diferentemente no espaço da página. (FERREIRA, 2017)
A partir dessas características, é possível identificar uma espécie de meditação nas duas principais correntes da poesia moderna da primeira metade do século XX:
· Uma poesia de introspecção que privilegia o fechamento do texto, convivendo e problematizando com a ideia de uma dimensão transcendente, inacessível pelas vias racionais;
· E uma poesia mais voltada para a realidade exterior, itinerário de interpretação do eu e do mundo, marcada pela abertura do texto.
As bases da Modernidade encontram-seno movimento romântico que, na sua reação ao Classicismo, opõem à rigidez da delimitação dos gêneros literários. A maior liberdade no tratamento dos gêneros leva a uma profunda mudança no conceito de lírica. (FERREIRA, 2017)
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3.5 Mudanças no conceito de lírica
Há muito que a lira, instrumento musical de cordas, deixou de acompanhar as composições poéticas, mas o gênero lírico, dentro das configurações clássicas, perdura. Pode-se dizer que os ensinamentos aristotélicos preconizados pela célebre e milenar Poética só sofreram uma ruptura realmente significativa no século XX, quando se estabeleceu o que se convencionou classificar como lirismo moderno com o seu distanciamento da subjetividade. (FERREIRA, 2017)
A despersonalização é um dado fundamental a compreensão da nova lírica: a linguagem poética assume um caráter experimental, pois o “eu-lírico”, representante maior dos sentimentos, entra em conflito com um outro “eu” que se mostra mais racional, mesmo frente à poesia. (CAMPOS, 1977)
Segundo FERREIRA (2017), o poema passa a ser visto não mais como fruto de uma inspiração, mas como resultado de uma atitude consciente aliada a sensibilidade do poeta. Essas mudanças geram reflexões sobre o próprio fazer poético e refletem- se no caráter metalinguístico da poesia moderna.
Haroldo de Campos (1977) diz que essa metalinguagem pode manifestar-se de dois modos:
· O “sério-estético”, como em Mallarmé;
· E o paródico, humorístico e irônico.
Nos dois modos a estrutura da obra é revelada, desautomatizando a percepção do leitor, que passa a recorrer a uma leitura ativa. Outro aspecto da lírica moderna é a dissonância, percebida por traços de tensões formais que querem ser entendidos como tais. Essa tensão dissonante pode levar a uma multiplicidade de significações no poema, o que, novamente, cobra do leitor uma postura ativa. Também é uma das responsáveis pela constante presença do insólito na licenciatura moderna. (CAMPOS, 1977)
Outra manifestação da dissonância está no fato das grandes metrópoles representarem para o poeta a decadência do homem e também uma beleza fascinante e misteriosa. Na lírica moderna a transcendência da realidade é indefinida, uma espécie de fantasia vazia. (FERREIRA, 2017)
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A rejeição do tradicional leva o poeta moderno a procurar a beleza na surpresa, no inesperado, no feio. A modernidade em si é paradoxal: em alguns casos manifesta- se em uma poesia hermética, beirando o incompreensível, e em outros apresenta-se com despojamento e simplicidade, trazendo, com frequência, elementos da linguagem prosaica. (FERREIRA, 2017)
Fonte: www.estadodaarte.estadao.com.br
Hugo Friedrich (1978), em seu livro Estrutura da lírica moderna, tece interpretações sobre a obra dos poetas que, para ele, constituem a base da lírica moderna (Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé). A partir deles, enumera-se as principais características de um novo lirismo que, de fato, afasta-se das qualidades clássicas da lírica, entre as quais estão a despersonalização, a desumanização e a obscuridade. Essas qualidades distanciam o conceito moderno do conceito clássico por desprende- lo da subjetividade e expressividade.
3.6 Características da lírica moderna
Ainda na segunda metade do século XIX, com os poetas simbolistas Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé, a poesia moderna passa por uma transformação, em que algumas regras de convenção são rompidas. (FERREIRA, 2017)
A poesia acontece pela recriação contínua da linguagem, o que equivale a um rompimento da composição tradicional, das regras gramaticais e da ordem do discurso. Ocorre uma renovação, uma ruptura com o antigo. Quanto ao ritmo na poesia, este passou a ser libertado com a instituição dos versos livres com a revolução na linguagem poética. O ritmo passou a ser mais adequado a fluidez dos sentidos representados, fugindo não apenas dos métodos convencionais de metrificação, mas também aderindo ao propósito de motivar o discurso poético de forma imprevisível e inteiramente livre. (REIS, 1999, p.331)
Segundo FERREIRA (2017), a lírica moderna contrasta a simplicidade da exposição daquilo que é exposto, trazendo uma incompreensibilidade que causará tensão naquele que a lê, pois, à medida que sua obscuridade fascina o leitor, o fato de não compreender o desconcerta. Por isso a dissonância, como você viu, é uma das características da lírica moderna.
Na poesia moderna, a realidade é transformada e, como a realidade do mundo é constituída pela linguagem, é esta que sofre transformações. Das três maneiras possíveis de comportamento da composição lírica – sentir, observar, transformar – é esta última que domina na poesia moderna, tanto no que diz respeito ao mundo como a língua. (FRIEDRICH, 1978, P. 17)
Assim, podemos citar três tendências da lírica moderna:
· A poetização do não – poético;
· O processo de despersonalização;
· E o hibridismo dos gêneros literários.
Baudelaire é considerado um dos precursores da modernidade, pois foi o primeiro a cantar a paisagem moderna do século XX, as cidades na fase inicial da modernização, a multidão, os pobres, os excluídos e as prostitutas, o tédio da chuva e os becos ao amanhecer, e decadência e a corrupção que assolam o homem
moderno. A poetização do apoético, de temas cotidianos, provoca um efeito de choque no leitor acostumado a uma poesia de moldes românticos e parnasianos. (FERREIRA, 2017)
O leitor da poesia moderna não está acostumado com as inovações temáticas e expressivas que caracterizam a lírica do século XX, produzida um uma sociedade pós- segunda guerra mundial. (FRIEDRICH, 1978, P. 17)
A lírica moderna se faz no que a sociedade despreza. Como o heroísmo épico não encontra lugar na sociedade moderna, o poeta busca seu heroísmo no obscuro das metrópoles, poetizando aquilo que até então não foi poetizado, isto é, o material apoético. (FERREIRA, 2017)
Fonte: www.revistacult.uol.com.br
O poeta moderno exalta o que é feio, troca o que é belo pelo que causa estranhamento. O feio que se encontra nos becos, na periferia da metrópole é a matéria prima da lírica moderna. O poeta traz para o âmbito da poesia o grotesco ao invés do que é considerado belo pela sociedade. A nova “beleza”, que pode ser coincidir com o feio, inquieta porque “[...] absorve o banal e deforma em bizarro [...]”, o espantoso com o doido [...]” (FRIEDRICH, 1978, P. 17).
É necessário ressaltar que uma das características da lírica moderna é a miscigenação dos gêneros, havendo a predominância de traços estilísticos de um determinado gênero sobre outro. Para classificar uma obra segundos suas
características formais, utilizam-se termos como “Épica”, “Lírica” e “Drama”. Já os adjetivos “líricos”, “épico” e “dramático” são termos que designam as qualidades das quais uma obra pode ou não se apropriar. Designa, desse modo, a essência, os fenômenos estilísticos do lírico, do épico e do dramático. (REIS, 1999, p.331)
A partir desse movimento, na literatura, ocorre uma intercomunicação dos gêneros. Como isso, a teoria clássica dos gêneros literários passa a ser contestada. Segundo alguns estudiosos, não há nenhum gênero “puro” (puramente lírico, por exemplo), mas uma interação, uma inter-relação entre os gêneros literários. Assim, as obras poéticas podem apresentar características de todos os gêneros. A partir, da predominância de um sobre os outros é que será compreendida como lírica, épica ou dramática. (FERREIRA, 2017)
4 TEORIA DA NARRATIVA
4.1 Gênero Narrativo
Desde o surgimento da humanidade, as histórias são contadas sob a forma de narrativas, que são práticas linguísticas e culturais presentes no cotidiano de todas as populações. É por meio das histórias que o ser humano se representa e constrói sua memória. Nos dias atuais, o processo de contação de histórias é midiatizado, ou seja, é transmitido, distribuído ou recebido pelos meios de comunicação. Com o surgimento da escrita, o que antes era função exclusiva da oralidade, passou a ser eternizado e construído para ser consumido por muitos. (JUSKI, 2020)
O processo narrativonão é algo exclusivo da literatura; áreas como o jornalismo e a publicidade se apropriam das estruturas narrativas para desenvolver suas atividades e se aproximar do público, seja leitor ou consumidor. (JUSKI, 2020)
Segundo Reis e Lopes (1988), não existe um consenso sobre a definição de narrativa; ela pode ser compreendida como um enunciado, como um conjunto de conteúdos representados por esses enunciados ou como o ato de relatar e contar histórias. Segundo o Dicionário Aurélio, referindo-se ao gênero narrativo, em especial na literatura, que compreende as modalidades lírico, narrativo e dramático, a narrativa é definida como a “exposição de um acontecimento ou de uma série de acontecimentos mais ou menos encadeados, reais ou imaginários, por meio de palavras ou de imagens”.
Para que se estude mais a fundo o conceito de narrativa e os elementos que a compõem, cabe mais uma vez retornar à Arte Poética de Aristóteles (1995). Lá, o filósofo afirma que a “arte poética” (as artes em geral) é realizada por meio da
disposição do ritmo, da linguagem e da harmonia. Ele distingue diferentes gêneros que exploravam, cada um a seu modo, certos elementos. Alguns gêneros abordados por Aristóteles não são mais praticados, como o ditirambo (um canto coral entusiástico e exuberante dirigido aos deuses), mas outros gêneros, como a epopeia e o teatro, ainda hoje podem ser estudados segundo os critérios aristotélicos. Assim, é possível afirmar que o filósofo deu muitas contribuições para as teorias das artes que você estuda atualmente. É dele, por exemplo, o conceito de catarse e a divisão dos gêneros miméticos em função dos meios narrativo e dramático.
A narração é um tipo textual que se constitui a partir de uma história. Nela, alguém conta um fato, fictício ou não, que ocorreu em determinado tempo e lugar e envolveu dadas personagens (MARCUSCHI, 2003).
Na concepção de Travaglia (2002), o tipo narrativo objetiva contar, dizer os fatos, os acontecimentos, entendidos como os episódios, a ação em sua ocorrência. Uma de suas marcas linguísticas de destaque é, de acordo com o estudioso, ter o interlocutor como o assistente, o espectador não participante, que apenas toma conhecimento, se inteira do(s) episódio(s) ocorrido(s). Pode haver ou não coincidência entre o tempo da enunciação e o referencial, podendo o da enunciação ser posterior, simultâneo ou anterior.
4.2 Caracterização do gênero narrativo
O hábito de contar histórias acompanha o ser humano há muitos séculos. Nesse contexto, se pode afirmar que a narrativa surgiu da necessidade de criar uma certa
unidade para essas histórias. Assim, as narrativas desempenham a função de oferecer um certo ordenamento, uma forma no tumulto da experiência humana. (HOFF, 2017)
A narrativa literária, por sua vez, é caracterizada pela dinamicidade, pela objetividade e por vezes pela subjetividade, mescladas às ações que se apresentam. O texto narrativo é um sistema complexo e imprevisível de possibilidades interpretativas, que trabalha continuamente com o real e o imaginário. A partir das situações vividas pelas personagens, a narrativa aproxima realidade e representação de fatos, lidando continuamente com o possível e o impossível. Assim, a narrativa tem por objetivos, além de relatar, produzir informação, aprendizado e/ou entretenimento. Nesse sentido, o leitor pode se apropriar dos sentidos que ecoam da narrativa até se identificar com o que está lendo. (HOFF, 2017)
Segundo HOFF (2017), A narrativa se estrutura conforme uma rede de relações entre os seguintes elementos essenciais:
· Enredo: aqui se fundamentam e se desenvolvem as ações da estrutura da narrativa.
· Personagens: executam as ações. Dividem-se em protagonista (personagem principal), coadjuvantes (personagens secundárias) e antagonista (personagem que se opõe à personagem principal).
· Narrador: relata os fatos. Existem vários tipos de narradores: narrador- - personagem, narrador-observador, narrador onisciente, entre outros. A identificação do narrador depende da perspectiva adotada perante os fatos narrados: basicamente, ou o narrador participa da história ou é somente um espectador.
· Tempo: momento ou época em que acontecem os fatos. O tempo poderá ser cronológico (linear) ou psicológico (não linear).
· Espaço: local ou cenário onde se desenrolam os fatos narrados.
4.3 Tipos de narrativa
Você já viu que o gênero narrativo serve para contar histórias e é estruturado conforme alguns elementos. Segundo HOFF (2017), as definições de alguns dos principais tipos de narrativa.
· Epopeia: longo poema narrativo, de tom solene e elevado. O tema da epopeia, ao contrário daqueles dos demais tipos de narrativa, é limitado, tratando sempre de um assunto heroico e nacional. Constitui a primeira modalidade narrativa criada e é escrita em verso. Seus exemplos máximos são Ilíada e Odisseia, de Homero.
· Romance: narrativa longa que envolve um número considerável de personagens (em relação à novela e ao conto), bem como um maior número de conflitos e tempo e espaço mais dilatados. Embora haja romances que datem do século XVI (D. Quixote de La Mancha, de Cervantes, por exemplo), esse tipo de narrativa se consagrou sobretudo no século 19, assumindo o papel de refletir a sociedade burguesa, e vem se renovando desde então.
· Novela: tipo mais curto de romance, ou seja, tem um número menor de personagens, conflitos e espaços, ou os tem em igual número ao romance, com a diferença de que na novela a ação no tempo é mais veloz. Um exemplo de novela seria Max e os felinos, de Moacyr Scliar, na qual o personagem central, Max, vive muitas aventuras.
· Conto: narrativa mais curta que tem como característica central condensar conflito, tempo e espaço, bem como reduzir o número de personagens. O conto é um tipo de narrativa tradicional, isto é, já adotada por muitos autores nos séculos XVI e XVII, como Cervantes e Voltaire. Atualmente tem adquirido atributos diferentes, como deixar de lado a intenção moralizante e adotar o fantástico ou o psicológico para elaborar o enredo.
· Crônica: texto curto, leve, que geralmente aborda temas do cotidiano. É um texto híbrido, que pode ter diferentes funções além de narrar, como contar, comentar, descrever e analisar.
4.4 Foco narrativo
Analisar os tipos de narrador, embora essencial para os estudos literários, não se trata de uma tarefa simples. O estudo do foco narrativo pode ser definido como um problema técnico da ficção que supõe fazer algumas perguntas fundamentais, sintetizadas por Lígia Chiappini em O foco narrativo (LEITE, 1985):
1. Quem conta a história? Trata-se de um narrador em primeira ou em terceira pessoa; de uma personagem em primeira pessoa; ou não há ninguém narrando?
2. De que posição ou ângulo em relação à história o narrador conta (por cima, na periferia, no centro, de frente, ou mudando)?
3. Que canais de informação o narrador usa para comunicar a história ao leitor? (Palavras? Pensamentos? Percepções? Sentimentos? Do autor? Da personagem? Ações? Falas do autor? Da personagem? Ou uma combinação disso tudo?)
4. A que distância ele coloca o leitor da história? (Próximo? Distante? Mudando?) Após coletar tais propriedades da narração, você pode adotar uma tipologia básica de narradores para caracterizar o foco narrativo empregado. Uma tipologia interessante é a de Norman Friedman (2002), apresentada no famoso ensaio O ponto de vista na ficção.
Friedman (2002) vai elencar as seguintes classificações:
Autor onisciente intruso: esse tipo de narrador tem a liberdade de narrar à vontade, de se colocar acima ou atrás, adotando um ponto de vista divino para além dos limites de tempo e espaço. Pode também narrar da periferia dos acontecimentos, ou do centro deles, ou ainda se limitar a narrar como se estivesse de fora, ou de frente, podendo, inclusive, mudar e adotar sucessivamente várias posições. Como canais de informação, predominam suas próprias palavras e seus pensamentos e percepções. Seu traço característico é a intrusão, ou seja, seus comentários sobre a vida, os costumes,os caracteres, a moral, que podem ou não estar entrosados com a história narrada.
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Narrador onisciente neutro: narrador em terceira pessoa que, embora semelhante no modo de narrar (ângulo, distância, canais) ao autor onisciente intruso, se distingue pela ausência de instruções e comentários sobre temas gerais ou mesmo sobre o comportamento das personagens. Apesar disso, sua presença, se interpondo entre o leitor e a história, é sempre muito clara.
“Eu” como testemunha: narra em primeira pessoa, mas é um “eu” já interno à narrativa. Ele vive os acontecimentos aí descritos como personagem secundária que pode observar, desde dentro, os acontecimentos. Portanto, os oferece ao leitor de modo mais direto, mais verossímil. No caso do “eu” como testemunha, o ângulo de visão é, necessariamente, mais limitado. Como personagem secundária, ele narra da periferia dos acontecimentos, sem conseguir saber o que se passa na cabeça dos outros; ele pode apenas inferir, lançar hipóteses, se servindo também de informações, de coisas que viu ou ouviu e, até mesmo, de cartas ou outros documentos secretos que tenham caído em suas mãos. Quanto à distância em que o leitor é colocado, pode ser próxima ou remota, ou ambas, porque esse narrador tanto sintetiza a narrativa quanto a apresenta em cenas. Nesse caso, sempre narra as cenas como as vê.
Narrador-protagonista: O narrador, personagem central, não tem acesso ao estado mental das demais personagens. Narra de um centro fixo, limitado quase que exclusivamente às suas percepções e aos seus pensamentos e sentimentos.
Onisciência seletiva múltipla: não há propriamente narrador. A história vem diretamente da mente das personagens, das impressões que fatos e pessoas deixam nelas. Difere da onisciência neutra porque agora o autor traduz detalhadamente os pensamentos, percepções e sentimentos, filtrados pela mente das personagens – enquanto o narrador onisciente os resume depois de terem ocorrido. O que predomina no caso da onisciência múltipla, como no caso da onisciência seletiva que vem logo a seguir, é o estilo indireto livre, ao passo que na onisciência neutra o predomínio é do estilo indireto. Os canais de informação e os ângulos de visão podem ser vários, nesse caso.
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Onisciência seletiva: Essa é uma categoria semelhante à anterior, mas que recai sobre uma só personagem, e não muitas. É, como no caso do narrador- protagonista, a limitação a um centro fixo. O ângulo é central, e os canais são limitados aos sentimentos, pensamentos e percepções da personagem central, sendo mostrados diretamente. Além desses, Friedman aponta para tipos de narração que acontecem com a exclusão tanto do autor quanto do narrador. Isso ocorre quando se eliminam os estados mentais e se limita a informação ao que as personagens falam ou fazem – como no teatro –, com breves notações de cena amarrando os diálogos. Assim, surgem os tipos modo dramático e câmera.
Modo dramático: Em virtude da eliminação da figura presente do narrador ou da voz narrativa, nesse tipo narrativo cabe ao leitor deduzir as significações a partir dos movimentos e das palavras das personagens. O ângulo é frontal e fixo, e a distância entre a história e o leitor, pequena, já que o texto se faz por uma sucessão de cenas. Trata-se de uma técnica dificilmente sustentável em textos longos.
Câmera: Significa o máximo em matéria de “exclusão do autor”. Essa categoria serve àquelas narrativas que tentam transmitir flashes da realidade como se fossem apanhados por uma câmera, de modo arbitrário e mecânico.
4.5 A narratologia e seus pressupostos fundamentais
A narratologia, tal como definida por Mieke Bal (1977, p. 4), teórica cultural holandesa, é “[...] a ciência que procura formular a teoria dos textos narrativos na sua narratividade”. Assim, a narratologia, ou teoria da narrativa, é a área de estudo que busca explicar o funcionamento dos textos narrativos. Mas o que são textos narrativos? Para chegarmos a essa resposta, podemos primeiro pensar nas narrativas existentes no mundo, que são inúmeras. O mito, a lenda, a fábula, o romance, o conto, a novela, as histórias em quadrinhos, os filmes cinematográficos são todos exemplos de textos narrativos.
O conceito de texto aqui é entendido como discurso, um exemplo empiricamente atestado de linguagem, conforme a definição do linguista Émile Benveniste (1995): o discurso é expressão da língua como instrumento de
comunicação. Então, o que todos esses textos têm em comum que os torna textos narrativos? A sua narratividade e a sua forma de veiculação da informação, da história, entre quem conta a história e quem a lê, ouve ou vê. Todos esses textos narrativos citados fazem parte da tipologia textual narrativa, que tem características discursivas bem marcantes. Nas narrativas, necessariamente transmite-se uma mensagem, que está inserida em um tempo específico, elaborada de modo que o receptor consiga entendê-la. Essa mensagem possui um estado inicial e progride até o desfecho, ainda que nem todas as narrativas comecem de forma cronológica pelo primeiro acontecimento. Algumas narrativas são feitas “in medias res”, isto é, começam pelo meio da história, por um acontecimento importante, como a morte de alguém, e o narrador volta ao início de tudo, quando o personagem ainda não havia morrido, para contar como a história se desenrolou.
Fonte: www.aberje.com.br
A mensagem do texto narrativo é emitida pelo narrador, que conta a história, e captada pelo receptor do texto, o narratário, mas só é compreendida e interpretada pelo leitor real, a pessoa que faz a interpretação dessa mensagem olhando o todo: o que foi enunciado e como foi enunciado. A narratologia, então, é a teoria que busca sistematizar as técnicas, os métodos e os modos de transmissão e recepção dos
textos narrativos, e busca explicar teoricamente as maneiras como nós, receptores, entendemos narrativas literárias e não literárias. Segundo Reis e Lopes (1988), a narratologia não se limita à análise de textos narrativos literários, pois estuda a narrativa de um modo geral, englobando a análise de textos narrativos não literários, ainda que os textos literários tenham sido privilegiados ao longo da construção da teoria da narrativa.
Além da ficcionalidade, outra característica primordial da linguagem literária é estética, preocupada com efeitos de sentido. Ela é selecionada pelo autor, que pode utilizar metáforas e outras figuras de linguagem, e pode ter como um de seus objetivos a fruição do texto pelo leitor. Apesar de poderem ser de ficção e sobre mundos alternativos, inventados, as obras literárias precisam ter verossimilhança. Não necessariamente o que está sendo contado, declamado ou lido necessita existir no mundo real, mas a história inventada requer verossimilhança, isto é, lógica interna: o que ocorre no interior da história deve fazer sentido naquele mundo interno ao texto. Em resumo, a narrativa literária é um tipo de texto específico que faz parte do conjunto de textos literários. Aqui, o termo texto é entendido como discurso, segundo Bakhtin (1992, p. 279): “[...] tipos relativamente estáveis de enunciados produzidos nas diferentes esferas da atividade humana”. Assim, um texto, seja literário ou não, é entendido como uma maneira pela qual a linguagem pode ser posta em prática nas relações humanas. Ambos tipos de textos, literários e não literários, podem ser escritos ou não. Um poema declamado, por exemplo, é um texto literário oral. Apesar do termo literalidade ser uma hipótese válida para distinguir a literatura de outras formas de discurso, é possível argumentar que ela varia de época para época e de leitor para leitor. Assim, o que é considerado linguagem literária varia e, por isso, surgem disputas relativas à classificação de certos textos como literatura. Não há uma regra única que determine se um texto é ou não literário, porque essa decisão depende da sua recepção (pelo público, pela crítica, em manuais, etc.). Seja como for, o Quadro 1 nos ajuda a visualizar e a entender possíveisdiferenças entre textos literários e textos não literários.
4.6 Pressupostos fundamentais — as narrativas e a narratividade
A narratologia nasceu da relação com duas outras abordagens teóricas e metodológicas: o estruturalismo e a semiótica. Embora seja uma área de estudo da literatura, teve seu ponto de início gerado devido à necessidade de contraponto à linguística estruturalista. (TEIXEIRA, 2011)
Roland Barthes, em 1966, em seu artigo publicado no número 8 da revista Communications, número que inaugurou as discussões sobre a teoria da narrativa, aponta a necessidade de reconhecimento de níveis de análise da linguagem acima da frase, o nível do discurso, como uma unidade que demanda estudo sistemático. Segundo a crítica de Barthes, a linguística estruturalista se concentrava na explicação de objetos linguísticos menores, como fonemas e morfemas, e não avançava do nível da frase. Assim, desse confronto e desejo de expansão surgiu a análise da narrativa, da narrativa como discurso, texto complexo, com características particulares.
Em 1969, Tzvetan Todorov, ao publicar seu livro Grammaire du Décameron, utiliza pela primeira vez o termo “narratologia” quando afirma que sua obra literária é uma narrativa e sua análise faz parte de uma ciência chamada narratologia. Vinda,
portanto, da linguística estruturalista, corrente teórica vigente na época, a narratologia analisa a estrutura subjacente aos textos narrativos e traz conceitos comuns a todas as narrativas, conforme veremos mais adiante neste capítulo. Antes disso, examinemos os pressupostos fundamentais de um texto narrativo segundo a narratologia. O termo narrativa tem concepções diversas, mas duas em especial são sempre confrontadas na teoria da narrativa.
Fonte: www.conceptodefinicion.de.com.br
A primeira concepção é da narrativa como um processo de enunciação, como o ato de relatar algo, e a segunda concepção é da narrativa como resultado dessa enunciação, como produto do que foi narrado (REIS; LOPES, 1988). A primeira concepção é mais utilizada pela narratologia e tem consequências para a análise dos diferentes tipos de estrutura e operações que podem emergir nas narrativas.
Assim, a narrativa é entendida como algo que não é estático, como uma “[...] prática interativa (relação narrador/narratário), uma comunicação narrativa” (REIS; LOPES, 1988, p. 66). Essa primeira concepção abre espaço para a consideração de Reis e Lopes (1988) sobre a narrativa não ser imune a atitudes de valoração, como ideologias e comportamentos éticos, que surgem principalmente da subjetividade do
narrador, evidenciado, segundo os autores, “[...] o caráter pluridiscursivo da enunciação narrativa” (REIS; LOPES, 1988, p. 60).
Por outro lado, a segunda definição também é utilizada para se analisar os textos narrativos, que são histórias com tempo e espaço definidos, nas quais eventos e ações de personagens acontecem. Essa história, então, chega ao leitor por meio de um código, uma linguagem específica. Desse modo, tanto a relação comunicativa entre quem conta a história e quem a lê/ouve/vê (conforme a primeira definição) quanto o próprio produto dessa comunicação, o texto em si (conforme a segunda definição), são objetos de análise da narratologia. Antes de descrevermos as estruturas e operações formuladas pela narratologia para analisar os diferentes tipos de narrativas existentes, vamos contrapor o significado de texto narrativo a seus pares, para entendê-lo melhor. A narração, a descrição e a dissertação são três tipos de textos diferentes. A narração, que estudamos aqui, é o ato de contar uma história para alguém; a descrição é o ato de caracterizar/descrever um ambiente ou um personagem; já a dissertação é o ato de argumentar. (TEIXEIRA, 2011)
Na dissertação predomina o argumento do escritor, a fim de provocar o leitor e o seu posicionamento. Se levamos em conta o texto narrativo literário, em particular, podemos contrapô-lo ao texto lírico e ao texto dramático. O exemplo clássico de texto lírico é o poema, texto essencialmente subjetivo, que traz marcas do sentimento e do lirismo do sujeito. O exemplo clássico do texto dramático é o teatro, o drama, que é escrito para ser representado e encenado, e pressupõe o uso de outras linguagens, como a linguagem gestual. (TEIXEIRA, 2011)
Por sua vez, um exemplo clássico de texto narrativo literário é o romance, um texto escrito que conta uma história mediante uma sequência de acontecimentos e ações dos personagens, podendo essa história ser baseada na realidade (extratextual) ou ficcional. Ao contrário do que acontece com o texto lírico e com o texto dramático, a narrativa não se concretiza apenas no plano dos textos literários. A narrativa se encontra em diversas situações funcionais e contextos comunicativos — como em relatórios, em piadas e anedotas contadas —, na historiografia, na história contada da humanidade e também, muitas vezes, aparece na mídia. Da mesma maneira que os contextos comunicacionais das narrativas são diversos, ultrapassando o texto narrativo literário, os suportes também são variados. As narrativas acontecem também em suportes multimodais, como histórias em quadrinhos, por exemplo, que
misturam imagem e linguagem verbal, e o cinema, que também é uma modalidade mista verbo-icônica (linguagem verbal, imagem, sequência de cenas, vídeo e áudio). (REIS; LOPES, 1988).
As narrativas apresentam contextos interativos e sociais diversos — imprensa, literatura, relatório —, e também acontecem em suportes diferentes — verbal, imagético, sequência de cenas (filme) —, como vimos. Mas o que todas essas narrativas têm em comum, então, que as torna narrativas? A narratividade, ou seja, a qualidade nuclear do texto narrativo. É por meio dela que nós, leitores/receptores, entendemos a história que nos é contada. A narratividade é definida teoricamente como “[...] o fenômeno de sucessão de estados e de transformações, inscrito no discurso, que é responsável pela produção de sentido” (GROUPE D'ENTREVERNES, 1979, p. 14).
Isto é, a narratividade é a qualidade do texto narrativo de contar uma sequência de eventos, de fatos, narrados na construção de uma história. Assim, a narratividade é o que possibilita a decodificação da narrativa pelo receptor, aquele que ouve, lê ou vê a narrativa. Na teoria semiótica, o conceito de narratividade foi ampliado e dá papel central ao receptor da história, que, no processo de leitura, atualiza e identifica os acontecimentos, o desenrolar da narrativa (REIS; LOPES, 1988).
Uma vez que a narrativa representa uma reconstrução do universo, de histórias reais e ficcionais possíveis, a narratividade deve ser entendida como uma característica própria do discurso narrativo, que é o reconstrutor desse universo contado, e deve ser atualizado no processo de leitura pelo leitor/receptor da narrativa. Desse modo, a narratividade existe para possibilitar ao receptor o acesso às ações de dimensão temporal e sequencial dos textos narrativos. Além de ter acesso à narrativa pela narratividade, outras características constituem um texto como narrativa. As diferentes estruturas dos textos narrativos e operações utilizadas na criação das narrativas levam a textos narrativos diferentes entre si, como o romance e o cinema, por exemplo. (TEIXEIRA, 2011)
Fonte: www.espaciolibros.com
5 TEORIA DO DRAMA
5.1 Gênero Dramático
Para tratar do texto dramático, é imprescindível que façamos referência à sua origem, o que ajuda a explicar traços característicos que se mantêm até hoje. Segundo Berthold (2001, p. 1), “[...] o teatro é tão velho quanto a humanidade [...]” e, portanto, universal. Claro que formas primitivas de apresentação pública podem ser relacionadas ao drama. No entanto, interessa-nos aqui a elaboração artística dessa forma de expressão. É por meio dos gregos que temos notícias das primeiras manifestações dramáticas na Europa e também das primeiras noções teóricas sobre o gênero. Sua gênese está nos rituais e nas festas em homenagem a Dionísio, Deus do vinho e da agricultura. Os

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