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04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 1/37 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios o que você procura? o que você procura? aa aa 2 https://www.instagram.com/rodrigo.foureaux/ http://facebook.com/profrodrigo.foureaux https://twitter.com/FoureauxRodrigo https://atividadepolicial.com.br/ https://www.instagram.com/rodrigo.foureaux/ http://facebook.com/profrodrigo.foureaux https://twitter.com/FoureauxRodrigo https://atividadepolicial.com.br/ 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 2/37 Compartilhe! A perturbação do trabalho ou do sossego alheios é uma contravenção penal prevista no art. 42 do Decreto- Lei n. 3.688/41. Art. 42. Perturbar alguem o trabalho ou o sossego alheios: I – com gritaria ou algazarra; II – exercendo pro�ssão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda: Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis. a) Bem jurídico tutelado A �nalidade deste tipo contravencional é tutelar a paz pública, a tranquilidade e o direito ao sossego. O direito ao sossego entre vizinhos encontra previsão no art. 1.277 do Código Civil. Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha. O direito à paz e a viver livre de perturbações encontra, inclusive, previsão constitucional, em razão do disposto no art. 144 da Constituição Federal, que assegura o direito à preservação da ordem pública. A ordem pública subdivide-se em salubridade, tranquilidade e segurança pública. A tranquilidade pública, por sua vez, abrange o direito ao sossego e à possibilidade de viver em paz em seu sentido mais amplo, sem que haja perturbações de ordem criminal ou cível. Nesse sentido, o art. 42 da Lei de Contravenções Penais tutela um direito assegurado constitucionalmente, que é a tranquilidade, a paz pública, o sossego. b) Sujeitos da contravenção penal O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, enquanto que o sujeito passivo é primariamente, a sociedade, a coletividade e, secundariamente, os indivíduos que forem diretamente afetados. A vítima pode ser somente a sociedade composta por pessoas físicas, por seres humanos. Não abrange animais, que são protegidos pelo art. 54 da Lei n. 9.605/98. Não abrange, também, pessoa jurídica, pelo simples fato desta não sofrer perturbação, dada a inexistência de vida própria. Não é possível que qualquer contravenção penal seja praticada por pessoa jurídica, uma vez que no Brasil a pessoa jurídica, atualmente, só pode ser responsabilizada por crimes ambientais (art. 225, § 3º, da CF c/c art. 3º da Lei n. 9.605/98). por Rodrigo Foureaux | 20 maio 2020 | Atividade Policial 2 https://www.facebook.com/sharer/sharer.php?u=https%3A%2F%2Fatividadepolicial.com.br%2F2020%2F05%2F20%2Fa-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios%2F https://twitter.com/intent/tweet?text=A%20perturba%C3%A7%C3%A3o%20do%20trabalho%20ou%20do%20sossego%20alheios&url=https%3A%2F%2Fatividadepolicial.com.br%2F2020%2F05%2F20%2Fa-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios%2F https://www.linkedin.com/shareArticle?mini=true&url=https%3A%2F%2Fatividadepolicial.com.br%2F2020%2F05%2F20%2Fa-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios%2F&title=A%20perturba%C3%A7%C3%A3o%20do%20trabalho%20ou%20do%20sossego%20alheios https://api.whatsapp.com/send?text=A%20perturba%C3%A7%C3%A3o%20do%20trabalho%20ou%20do%20sossego%20alheios%20https%3A%2F%2Fatividadepolicial.com.br%2F2020%2F05%2F20%2Fa-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios%2F https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ https://atividadepolicial.com.br/author/rodrigo-foureaux/ https://atividadepolicial.com.br/categoria/atividade-policial/ 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 3/37 A Constituição Federal autoriza no art. 173, § 5º, a responsabilização penal da pessoa jurídica nos atos praticados contra a ordem econômica e �nanceira e contra a economia popular, todavia, inexiste lei que trate que trata dessa responsabilidade criminal. c) Elemento subjetivo Exige-se que o agente atue de forma dolosa. Basta o dolo genérico. Admite-se o dolo direto ou eventual. Não admite-se a forma culposa, por ausência de previsão legal. d) Análise das condutas do tipo penal Para que esteja caracterizada a contravenção penal não é su�ciente que esteja presente a perturbação do trabalho ou do sossego alheios, sendo necessário que esta perturbação seja realizada mediante uma das formas de�nidas nos incisos do art.42 da Lei de Contravenções Penais. Art. 42. Perturbar alguem o trabalho ou o sossego alheios: I – com gritaria ou algazarra; II – exercendo pro�ssão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda: Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis. Perturbar signi�ca atrapalhar, incomodar, aprontar, embaraçar, causar desordem. Alguém refere-se ao autor da contravenção penal, termo que foi empregado de forma completamente desnecessária, além de gerar confusões interpretativas, por possibilitar interpretação de que o “alguém” refere-se a determinada pessoa como vítima, o que não é verdade, pois trata-se de uma contravenção penal inserida no capítulo IV, que trata das contravenções penais referentes à paz pública. Além do mais, uma leitura atenta, possibilita concluir que o “perturbar alguém” refere-se ao autor do tipo contravencional. Trabalho refere-se à atividade pro�ssional, ao emprego, ao serviço. Sossego trata da tranquilidade, do estado de paz, da possibilidade de uma pessoa �car em um ambiente sereno, calmo. O termo “alheios” refere-se a terceiras pessoas. Repare que o termo é emprego no plural, o que permite a�rmar que é necessário mais de uma pessoa. Por se tratar de contravenção penal que visa tutelar a paz pública, são necessárias várias pessoas para a sua caracterização. d.1) Perturbação mediante gritaria ou algazarra; Gritar é falar em voz alta. Gritaria é o tom de voz alto do ser humano, que extrapola a naturalidade das conversas no dia a dia. Algazarra é o som alto, o barulho, produzido por ser humano, desde que não seja a voz. Um grupo de pessoas que anda pela rua chutando garrafas e arrastando objetos que provocam um barulho alto, está a praticar algazarra. Não caracteriza a contravenção penal cantar parabéns em tom alto ou um dar um grito de alegria de forma isolada ao assistir a um jogo de futebol e o seu time do coração fazer o gol da vitória aos 45 do segundo 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 4/37 tempo, pois a lei visa coibir a perturbação de sossego intencional e não gritarias isoladas de alegria. Nesse sentido, “o simples cantar, manifestação de saúde e felicidade do cidadão, ainda que por vezes um tanto alto, não con�gura a infração do art. 42 da LCP” (TACrim – RT 224/370). A lei proíbe a perturbação com gritaria ou algazarra e não a simples manifestação de alegria ou falar um pouco alto (TJSC – RT, 491/352). O Supremo Tribunal Federal já decidiuque a pessoa que no afã de agredir determinada servidora de um posto de saúde, adentra ao recinto e, com gritaria e algazarra, perturba a todos que ali se encontravam, pratica a contravenção penal de perturbação do sossego. A perturbação do trabalho de uma funcionária e de um médico no hospital, mediante gritaria e algazarras, con�gura a contravenção penal de perturbação do sossego. A realização de festa com gritaria e algazarras, bem como a execução de som em volume alto, viola a tranquilidade dos vizinhos e caracteriza a contravenção penal de perturbação do sossego. Algumas lojas mantêm seus funcionários na calçada com microfone anunciando os produtos com o �m de atrair clientes, o que é mais comum nos centros das cidades. Caso o som seja compatível com o barulho local, não haverá contravenção penal de perturbação de sossego, em que pese esta ocorrer, mas não a ponto de merecer a tutela penal., em razão do barulho razoável e normal no dia a dia ser comum à vida. d.2) Perturbação mediante o exercício de pro�ssão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; Trata-se de norma penal em branco, isto é, exige-se para a sua con�guração a presença de outra lei (norma penal em branco homogênea) ou norma administrativa (norma penal em branco heterogênea) que limite ou de�na as condições para o funcionamento da atividade pro�ssional que ao ser infringida e perturbar o trabalho ou sossego alheios, caracterizará a contravenção penal em análise. Pro�ssão incômoda é aquela cujo o seu exercício importuna ou causa algum tipo de desconforto, como a construção civil. Pro�ssão ruidosa é aquela que causa ruídos, sons ou barulhos que incomodam, como uma indústria em funcionamento que faz alto barulho. Quando o tipo contravencional diz “prescrições legais” utiliza o termo “legais” de forma genérica, o que permite abranger abrange toda a legislação (leis e normas) Ricardo Andreucci ensina que: (…) para a caracterização dessa contravenção, é necessário que haja um diploma disciplinado das atividades laboriosas, emanado do poder público competente, estabelecendo o horário de funcionamento de indústrias, fábricas, igrejas, bares, restaurantes, e quaisquer outros estabelecimentos comerciais. Jurisprudência (TACrimSP – RT, 671/349): “Em tema de conduta contravencional consistente em perturbação do trabalho ou do sossego alheios pelo exercício de pro�ssão incômoda ou ruidosa, em desacordo coma as prescrições legais, não se tendo produzido nenhum elemento de convicção acerca da existência ou vigência de lei, postura, ou ato administrativo ou regulamentação municipal disciplinadores das atividades públicas suscetíveis de gerar atribulações 1 2 3 4 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 5/37 sonoras ou ruidosas, descabe cogitar de capitular o evento no inciso II do art. 42 do Dec-Lei nº 3.688/41, norma penal em branco”. Em Belo Horizonte, a Lei n. 9.505/08 dispõe que são tolerados os ruídos e sons provenientes dos serviços de construção civil no período compreendido entre 10:00 h e 17:00 h (art. 10, I). Portanto, caso haja perturbação decorrente da construção civil fora desse intervalo de tempo, haverá a prática de contravenção penal de perturbação de sossego decorrente do exercício de pro�ssão incômoda. Caso uma fábrica barulhenta tenha autorização para funcionar até as 18:00 horas, mas exceda esse horário e provoque pertubação do trabalho ou do sossego alheios, haverá a prática da contravenção penal prevista no art. 42, II, do Decreto-Lei n. 3.688/1941. Em Belo Horizonte, a Lei n. 9.505/08 dispõe que são tolerados os ruídos e sons provenientes dos serviços de construção civil no período compreendido entre 10:00 h e 17:00 h (art. 10, I). Portanto, caso haja perturbação decorrente da construção civil fora desse intervalo de tempo, haverá a prática de contravenção penal de perturbação de sossego decorrente do exercício de pro�ssão incômoda. Na hipótese em que inexistir qualquer lei ou norma que limite ou imponha condições para o exercício da pro�ssão que está a gerar incômodo ou ruídos, não há que se falar em contravenção penal de perturbação de sossego. d.3) Perturbação mediante abuso de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; Abuso consiste em excesso. É aquilo que extrapola, é o que foge do razoável, do bom senso. Instrumentos sonoros são os que emitem som, como os aparelhos de música (violão, guitarra, teclado, piano). Sinais acústicos são os aparelhos de som, como as caixas de som, as televisões, aparelhos de rádio, o som do carro. Os sinais acústicos emitidos por viaturas policiais, por ambulâncias e por outros veículos o�ciais, quando devidamente empregados, não caracterizam perturbação do trabalho ou do sossego alheios, uma vez que a atuação decorrerá do estrito cumprimento do dever legal, podendo-se, ainda, considerar o fato como atípico em razão da ausência de antinormatividade (teoria da tipicidade conglobante). O proprietário de um estabelecimento comercial que perturba a vizinhança de modo signi�cativo com a manutenção de som alto e algazarras em seu bar, pratica o ilícito descrito no art. 42, inc. III, da LCP. Uma pessoa que realiza festa particular com excessivo volume de som e incomoda vizinhos, pratica a contravenção penal em estudo. O dono de bar que realiza apresentações e músicas ao vivo e causa barulho acima dos limites tolerado, em horário avançado, pratica contravenção penal de perturbação de sossego, sendo irrelevantes a autorização para funcionamento do estabelecimento ou a mudança posterior da conduta. d.3.1) Perturbação do trabalho e do sossego alheios em razão do carnaval e de eventos festivos; Em épocas festivas, como o carnaval que ocorre em todo o Brasil, ocasião em que é utilizado som alto decorrente do uso de instrumentos sonoros, sinais acústicos, além da gritaria e algazarra, pelas ruas da cidade, deve haver uma maior tolerância, em razão dos costumes, da adequação social e do direito ao lazer 5 6 7 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 6/37 (art. 4º do Decreto-Lei n. 4.657/42; art. 6º da CF). Deve-se levar em consideração também que eventos festivos ocorrem periodicamente, como o carnaval que é realizado uma vez por ano e em todo o país. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já autorizou a realização de carnaval de rua em razão do direito ao lazer e pela impossibilidade de se assegurar a imposição absoluta do direito ao sossego. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO AMBIENTAL AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALEGAÇÕES DE POLUIÇÃO SONORA E PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. CARNAVAL DE RUA DO MUNICÍPIO DE CASCA. LIMINAR DE PROIBIÇÃO. DESCABIMENTO. Diante da existência de diversos valores em exame, dentre os quais os direitos ao sossego e ao meio-ambiente saudável, bem como o direito ao lazer, diante do contexto probatório e não havendo como concluir pela preponderância absoluta dos primeiros a ponto de proibir a realização do carnaval de rua no Município de Casca, evento comemorado em todo o País, sob pena de impor excessiva limitação ao lazer, ensejando o indeferimento da liminar. Hipótese em que a Municipalidade, em audiência de justi�cação prévia com a presença de representantes de vários setores da comunidade, comprometeu-se à realização de diversas medidas, a �m de preservar os interesses da coletividade, no exercício do poder de polícia. (TJ-RS – AG: 70041364522 RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Data de Julgamento: 23/02/2011, Vigésima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 02/03/2011) O Tribunal de Justiça de Minas Gerais já decidiu pela manutenção do carnaval de rua em razão da proteção ao patrimônio histórico, dos direitos culturais, do lazer, do turismoe da tradição em se realizar o evento. (…) 2- Concessão de antecipação de tutela, em ação civil pública, no sentido de proibição de realização de festividades de carnaval, na área central de município, ao fundamento de vulneração da segurança e sossego público, bem como de danos ao patrimônio arquitetônico e histórico. 3 – Direitos do cidadão, constitucionalmente garantidos, de segurança e de sossego públicos, da mesma forma que é dever do Poder Público, e da Comunidade, a proteção e preservação do patrimônio histórico, como preceitua o § 1º, do art. 216, da CF\88. 4- Contrapartida, pela consideração da previsão constitucional ao pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, bem como ao direito constitucionalmente garantido ao lazer, além do fomento ao turismo e economia locais, como forma do poder, que possui o ente público municipal, de propulsão da comunidade local. 5- Necessidade, para a disciplina da medida antecipatória concedida, de ponderação dos interesses e princípios constitucionais envolvidos. 6- Presença, na legislação estadual e municipal, de exceção de posturas. Razoabilidade, em razão da natureza anual e isolada do evento. 7- Eventual responsabilização por ato ilícito, se ocorrente, que ser buscada na via adequada, contra os devidos causadores, ausente motivo su�cientemente razoável para privar a comunidade de comemorar o carnaval em sua cidade. 8– Poder Público Municipal que é dotado de meios para garantir a segurança e o sossego públicos, através da requisição de policiamento e segurança pública, a �m de coibir os eventuais excessos dos foliões, retiradas de veículos de locais de estacionamento proibido, etc., sem que tenha de se impedir a realização da tradicional festividade. 9- Elementos probatórios colacionados aos autos, que indicam a impossibilidade de realização das festividades em outro local da cidade. 10 – Tradicional realização das festividades carnavalescas no centro da cidade, aliada à impossibilidade, até então demonstrada, de realização dos eventos em outro local do Município, que induz a necessidade de manutenção provisória da realização das festividades nos espaços públicos onde é 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 7/37 tradicionalmente comemorada, não sendo razoável o abrupto impedimento. (…) (TJ-MG – AI: 10028140026270001 MG, Relator: Sandra Fonseca, Data de Julgamento: 16/12/2015, Câmaras Cíveis / 6ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/12/2015) Não se quer dizer que nesses períodos não possa ocorrer a contravenção penal de perturbação de sossego, todavia a veri�cação desta contravenção durante o carnaval deve ter parâmetros que se adaptem à realidade do momento, podendo, para tanto, ser utilizado os horários de autorização para o funcionamento do carnaval de rua, o horário limite do uso do som e os locais autorizados a utilizarem o som. Tome como exemplo um palco instalado na praça de uma cidade, autorizado pela prefeitura a ter música até as 02:00. Passado o horário, o som continua no palco, em volume alto, e incomoda os moradores locais. Haverá a prática de contravenção penal de perturbação de sossego. Não se trata de criar um horário para de�nir quando será perturbação de sossego ou não, pois o direito ao sossego e tranquilidade não tem horário. Ocorre que se trata de uma excepcionalidade decorrente de um evento festivo periódico, aceito socialmente, o que legitima uma maior tolerância pelos moradores que residam nas proximidades do local que emite som alto. Caso haja a instalação de palco em local não autorizado, o incômodo decorrente do som alto caracterizará a contravenção penal de perturbação de sossego, pois não há que se falar em aplicação da adequação social e do costume para a realização de um evento não autorizado legalmente, pois o Poder Público, em tese, estuda e analisa os pontos de foco e concentração para autorizar as festividades de acordo com a realidade local. O princípio da adequação social, concebido por Hans Welzel, exclui a tipicidade material. O fato será atípico. Carnaval não é uma pro�ssão incômoda ou ruidosa. É um evento cultural, razão pela qual não há que se falar em perturbação de sossego mediante o exercício de pro�ssão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais. d.4) Perturbação provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda; Provocar é dar causa, é originar. Não procurar impedir é não evitar, não fazer cessar ou pelo menos tentar fazer cessar. O barulho pode ser emitido por qualquer animal (cachorro, gatos, pássaros). Ter a guarda signi�ca ter sob sua responsabilidade, seja o dono do animal ou não. O agente que atua “provocando” estimula o animal a fazer barulho, enquanto que o agente que atua “não procurando impedir”, tem ciência do barulho emitido pelo animal, mas nada faz para cessá-lo ou diminuí-lo. Um morador que possui cães que latem muito durante o dia, o que incomoda vizinhos, e nada faz para cessar a perturbação, pratica a contravenção penal de perturbação de sossego por omissão. Neste caso o morador deve adotar meios para manter a paz e o sossego, como instalar isolamento acústico ou cuidar dos cães para que façam menos barulho, no limite do tolerável, como eventuais latidos durante o dia. Caso o morador estimule os cães a latirem em sua casa, o que incomoda vizinhos, também praticará contravenção penal de perturbação de sossego, dessa vez por ação. 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 8/37 Em condomínios não é possível proibir de maneira absoluta que os moradores tenham animais, desde que não perturbe o sossego, a segurança, a saúde e a higiene. e) Classi�cação da infração penal A perturbação de sossego é uma infração penal comum, pois pode ser praticada por qualquer pessoa; pode ser praticada mediante ação ou omissão, neste caso quando o responsável por animal não toma as medidas necessárias para que este cesse os barulhos; é uma contravenção penal material, isto é, exige-se a ocorrência de efetiva perturbação, é necessário que haja várias pessoas que se sintam incomodadas; a sua prática é de forma vinculada, pois somente pode ser praticada nas formas indicadas pelos incisos I a V do art. 42 da Lei de Contravenções Penais; é unissubjetivo, pois pode ser praticado somente por uma pessoa ou por várias; é plurissubsistente, pois a perturbação do sossego ocorre mediante a prática de vários atos e não de um só. Em tese, as infrações penais plurissubsistentes admitem tentativa, ocorre que nas contravenções penais a tentativa não é punível (art. 4° do Decreto-Lei n. 3.688/41). No plano fático é possível que haja tentativa em uma contravenção penal, todavia esta não é punível por opção legislativa. f) Consumação. Como comprovar a consumação da perturbação de sossego? É possível que haja perturbação de sossego em razão de uma denúncia anônima ou reclamação de somente uma pessoa? A consumação ocorre a partir do momento em que é perturbado o trabalho ou o sossego de várias pessoas. Nota-se que o caput do art. 42 da Lei de Contravenções Penais diz: perturbar o trabalho ou o sossego alheios (alheios, no plural, o que indica uma pluralidade de pessoas, uma vez que esta contravenção penal está no capítulo das contravenções que tutelam a paz pública). Não há que se falar em paz pública de duas pessoas. Não é possível de�nir um mínimo de pessoas para que seja possível a ocorrência da perturbação de sossego, devendo-se, no entanto, considerar pelo menos três pessoas, o que deve ser aferido caso a caso, pois essas três pessoas podem ser moradores de uma mesma casa, dormirem no mesmo quarto, o que não é su�ciente para caracterizar a contravenção penal, pois mais importantedo que atingir um número mínimo de pessoas é a perturbação atingir locais diversos, casas diversas, pois a paz pública é violada quando o incômodo atinge uma coletividade e, naturalmente, ao perturbar um morador de uma casa perturbará outros moradores dessa mesma casa, o que não demonstra que a paz pública foi violada. É possível que a contravenção penal de perturbação de sossego esteja consumada, ainda que somente uma pessoa tenha ligado para o 190 e não se identi�que, pois a exigência da presença de vítimas/testemunhas visa provar a ocorrência da contravenção penal e não con�gurar a sua existência, já que a vítima é a coletividade. Quem reclama do som alto não é obrigado a comparecer ao local para que a polícia tome providências, mas será obrigado a fornecer os dados para ser arrolado como vítima/testemunha (arts. 201, 202 e 206, todos do CPP). É possível que haja denúncia anônima de perturbação de sossego ou que somente uma pessoa acione a polícia, todavia os policiais que atenderem a ocorrência deverão constatar a prática da perturbação. A prova da perturbação de sossego pode ocorrer por qualquer meio idôneo, como gravação do barulho em uma distância que possa dizer objetivamente que está havendo perturbação de sossego, como gravar em 8 9 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 9/37 imagem e som a uma distância de alguns quarteirões do local dos fatos, somado às diversas ligações recebidas via 190, que poderão ser comprovadas por registro das gravações que ocorrem no 190. Nesse sentido, “não se exige, para a con�guração da contravenção penal do art. 42, III, embora recomendável, que sejam perfeitamente identi�cadas e nominadas, tampouco inquiridas, as vítimas da perturbação do sossego. Su�ciente é a prova de que o som excessivo tenha provocado perturbação ao sossego dos vizinhos, que, em mais de uma ocasião, acionaram os policiais militares à residência do acusado. Se a contravenção penal está comprovada pelo depoimento de policiais militares, acionados por vizinhos perturbados com o barulho de som mecânico, os quais constataram o excessivo volume do som produzido pela festa particular, está con�gurada a contravenção penal. Sabe-se que a contravenção penal de perturbação de sossego alheio não é delito que deixa vestígios, a ponto de se exigir que sua comprovação se dê somente por exame pericial, ou que seja necessário medir, por equipamento próprio, o barulho provocado pelo aparelho de som.” Caso não haja identi�cação do que representaria a coletividade atingida, como a ausência de qualquer vítima ou testemunha ou de �lmagens ou de qualquer prova, não há que se falar em pertubação de sossego. Na hipótese em que não houver perturbação à paz social, o fato é atípico, pois exige-se para a consumação da perturbação de sossego que haja um incômodo coletivo, plural e não somente de uma única pessoa. Nesse sentido, já decidiu o Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus. 2. Contravenção Penal. 3. Perturbação do Trabalho ou Sossego Alheios. 4. Atipicidade da conduta. 5. Ausência de perturbação à paz social. 6. Falta de justa causa. 7. Ordem concedida. (STF – HC: 85032 RJ, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 17/05/2005, Segunda Turma, Data de Publicação: DJ 10-06-2005 PP-00060 EMENT VOL-02195-02 PP-00288 RTJ VOL-00193-03 PP-01069 RJSP v. 53, n. 333, 2005, p. 139-141 RMDPPP v. 2, n. 7, 2005, p. 110-113) O relator Ministro Gilmar Mendes fundamentou em seu voto no HC n. 85032 que: Conforme a orientação doutrinária, o bem jurídico tutelado é a paz pública, a tranqüilidade da coletividade, não existindo a contravenção quando o fato atinge uma única pessoa. A objetividade aí não se refere ao repouso individual, mas ao da coletividade: A simples susceptibilidade de um individuo, a sua maior intolerância ou a irritabilidade de um neurastênico não é gradua a responsabilidade. A excitação auditiva, a percepção dolorosa de sons agudos, a hiperacusia de alguém não é o que justi�ca a repressão. No caso, a denúncia (�. 45) descreve um fato que atingiria apenas o morador do apartamento do andar inferior, donde a não tipi�cação da contravenção do art. 42. Nem é o caso de se cogitar de enquadramento na contravenção do art. 65 pois, para tanto, além da ofensa à tranqüilidade pessoal, seria necessária, também, a descrição dos elementos subjetivos do tipo, acinte ou motivo reprovável.” (�s. 129-131) Com efeito, o interesse tutelado pelo tipo contravencional se refere às pessoas “in genere”. Tal como a�rma Marcello Jardim Linhares, “o sujeito passivo da contravenção é a coletividade indistinta que em realidade concreta se identi�ca numa pluralidade de pessoas vivas em determinado ambiente, embora mais restrito, porque não ocorre a identi�cação das pessoas singulares que tenham sofrido a 10 11 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 10/37 perturbação.” (LINHARES, Marcello Jardim. Contravenções Penais. São Paulo: Saraiva, 1980, v.1, p. 363) Sobre este tema, vale destacar os seguintes comentários ao art. 42 da Lei de Contravencoes Penais: “A excitação auditiva, a percepção dolorosa de sons agudos, a hipercusia de alguém não é que justi�ca a repressão. A perturbação deve, assim, ser incômoda aos que habitam um quarteirão, residem em uma vila, se recolhem a um hospital, freqüentam uma biblioteca.” (DUARTE, José. Comentários a Lei das Contravenções Penais. São Paulo: Forense, 1958, v.2, p. 179) “Já tem a jurisprudência decidido que �cará a critério do juiz a apreciação de cada caso de perturbação, quer do trabalho, quer do sossego, não se devendo levar em conta o excesso de suscetibilidade do queixoso, mas sim a sensibilidade média dos cidadãos. Não bastará, para a integração da contravenção, a perturbação que só atinja um indivíduo ou um número muito restrito de pessoas.” (COSTA LEITE, Manoel Carlos. Lei das Contravencoes Penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976, p. 166) “Cabe considerar, inicialmente, que o simples fato de alguém, por qualquer motivo ou capricho, ou ainda ser portador de qualquer irritabilidade, se sentir perturbado em seu trabalho ou em sua tranqüilidade por fatos sem importância, pensamos, não ocorrer a �gura em estudo. Necessário, pois, que a perturbação seja analisada, devidamente considerados os seus elementos em concreto, para que se caracterize a �gura aqui estudada.” (FIDA, Orlando; GUIMARÃES, Carlos A. M.; BIASOLI, Ângelo. Comentários à Lei das Contravencoes Penais. São Paulo: Livraria Editora Universitária de Direito, 1974, p. 65) O fato de uma ou mais pessoas serem mais suscetíveis a se irritarem com barulho não caracteriza a perturbação de sossego. O barulho tem que ser aferido de tal forma que cause incômodo para o homem médio. É desnecessário que haja um número excessivo de vítimas, sendo su�ciente a prova de que a coletividade foi afetada, como comprovar o alto barulho a uma distância considerável do local do som ou que moradores de casas diferentes foram perturbados. Caso o som alto ocorra em local isolado, que não seja área residencial, como em um sítio, não há que se falar em perturbação de sossego, em razão da inexistência da coletividade para �gurar como vítima, o que caracteriza impropriedade absoluta do objeto (aplicação do instituto do crime impossível às contravenções penais). O som alto que limita-se a um espaço fechado, seja dentro de uma casa ou salão de festas, não caracteriza perturbação de sossego, pois esta caracteriza-se quando atinge a coletividade. Assim, o morador de uma casa que está com som alto, mas local, em razão de uma festa de outro morador, e que aciona a polícia com o �m de silenciar o barulho local, não deve ser atendido, mas somente orientado via 190 que não se trata de “casode polícia”, salvo se os ânimos locais estiverem a�orados e o caso puder evoluir para fatos graves. f.1) É necessário que haja a produção de prova técnica (perícia) para a comprovação da perturbação de sossego? Não é necessária a realização de perícia ou a utilização de um decibelímetro para aferir se há perturbação de sossego, pois o tipo contravencional exige somente a perturbação do trabalho ou do sossego alheios, o que pode ser comprovado por qualquer meio de prova admitido no direito. A jurisprudência é pací�ca pela desnecessidade de realização de perícia para comprovar a ocorrência de perturbação de sossego. 12 13 14 2 http://www.jusbrasil.com.br/topicos/11737484/artigo-42-do-decreto-lei-n-3688-de-03-de-outubro-de-1941 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/110062/lei-das-contravencoes-penais-decreto-lei-3688-41 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/110062/lei-das-contravencoes-penais-decreto-lei-3688-41 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/110062/lei-das-contravencoes-penais-decreto-lei-3688-41 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 11/37 Deve-se destacar, no entanto, que a perícia somente não será necessária quando houver outras provas que demonstrem a prática da contravenção penal de perturbação de sossego. g)A perturbação do sossego está condicionada a horário, local ou intensidade do som? Existe lei do silêncio? A crença popular de que a perturbação de sossego só pode ocorrer após as 22:00 horas ou qualquer outro horário não é verdadeira, uma vez que a Lei de Contravenções Penais não delimita horários para que haja perturbação de sossego, podendo esta ocorrer a qualquer hora do dia ou da noite e em qualquer local que haja a possibilidade de perturbação do sossego da coletividade. A intensidade do som deve ser su�ciente para provocar o desconforto e incômodo a outras pessoas, o que deve ser aferido de acordo com o homem médio. Isto é, o barulho é su�ciente para incomodar uma pessoa que esteja dentro dos padrões “de normalidade” da sociedade, no sentido de não ser sensível a barulhos, causador de problemas ou se irritar facilmente com os desconfortos do dia a dia? A conhecida “lei do silêncio” trata de leis municipais que versem sobre o controle de ruídos e sons nos municípios, sem que inter�ra na infração penal de perturbação de sossego prevista no art. 42 do Decreto-Lei n. 3.688/41. Geralmente, essas leis possuem previsão de sanções administrativas para as hipóteses de perturbação de sossego. Em Belo Horizonte, a Lei n. 9.505, de 23 de janeiro de 2008, é conhecida como Lei do Silêncio e proíbe a emissão de ruídos, sons e vibrações, produzidos de forma que: I – ponha em perigo ou prejudique a saúde individual ou coletiva; II – cause danos de qualquer natureza às propriedades públicas ou privadas; III – cause incômodo de qualquer natureza; IV – cause perturbação ao sossego ou ao bem-estar públicos; V – ultrapasse os níveis �xados nesta Lei (art. 2º). Os artigos 3º e 4º estipulam os horários e o limite de decibéis dentro do município de Belo Horizonte. Horário Níveis máximos de decibéis 07:01 às 19:00 70 19:01 às 22:00 60 22:01 às 23:59 50 00:00 às 07:00 45 Quando a propriedade em que se dá o suposto incômodo tratar-se de escola, creche, biblioteca pública, cemitério, hospital, ambulatório, casa de saúde ou similar, deverão ser atendidos os menores limites: a) em período diurno: 55 dB; b) em período vespertino: 50; c) em período noturno: 45 dB. A violação ao disposto na lei municipal de Belo Horizonte pode acarretar em advertência; multa; interdição parcial ou total da atividade, até a correção das irregularidades; cassação do Alvará de Localização e Funcionamento de Atividades ou de licença (art. 13). A �scalização do cumprimento do limite de decibéis em um município pode ocorrer por servidores do próprio município, pela Guarda Municipal ou pela Polícia Militar, contudo será necessário possuir equipamento técnico para aferir os decibéis. 15 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 12/37 O respeito ao quantitativo de decibéis limitado por um município afasta a prática da contravenção penal de perturbação de sossego, em razão da teoria da tipicidade conglobante (ausência de conduta antinormativa), pois não se tem como punir o que a própria lei autoriza. A interpretação da tipicidade exige a análise de todo emaranhado de normas, razão pela qual se a própria lei permite que durante o dia uma pessoa faça barulho até tantos decibéis, não há fundamento para permitir a sua punição, por estar “dentro dos limites da lei”. De qualquer forma, repita-se, o art. 42 da Lei de Contravenções Penais não exigiu quantitativos de decibéis para aferir se há perturbação de sossego, devendo-se avaliar pelo homem médio, o que possibilita, inclusive, que não seja constatada a prática de infração administrativa, mas se comprove a prática de infração penal, pois esta não exige avaliação técnica, aquela sim, já que tem que aferir os decibéis. Em síntese, para �ns de infração administrativa, por exigir quantitativo de decibéis, é necessária a produção de prova técnica; para �ns penais, não se exige a prova técnica, razão pela qual é possível admitir qualquer meio de prova admitido no direito. A Lei n. 9.505/08 (Lei do Silêncio de Belo Horizonte/MG) traz consequências administrativas (multa) para quem descumprir os limites de decibéis previstos na lei, mas não ressalva a possibilidade daquele que descumprir a Lei do Silêncio responder criminalmente. A jurisprudência é pací�ca que quando a própria lei já impõe consequências cíveis ou administrativas, sem ressalvar a possibilidade da responsabilização criminal, é porque o legislador já entendeu que aquelas punições, por si sós, são su�cientes para atingirem o caráter preventivo e sancionador da conduta ilícita, razão pela qual não se deve invocar o direito penal, que possui caráter subsidiário no tocante à aplicação de punições, por poder atingir um direito fundamental de elevada importância, a liberdade. Dessa forma, nos municípios que possuem Lei do Silêncio e imponha as sanções para o caso de descumprimento, é possível a prática de contravenção penal de perturbação de sossego? Entendo que sim, pois a Lei do Silêncio, como a de Belo Horizonte, impõe limites de decibéis, o que é desnecessário para a prática da contravenção penal de perturbação de sossego. Pode ocorrer de haver infração administrativa em razão do desrespeito ao limite previsto na Lei do Silêncio, mas não haver perturbação de sossego, por não ter ocorrido uma perturbação coletiva. Nota-se que são critérios distintos, razão pela qual é possível cumular a infração administrativa com a criminal, ainda que a lei que preveja a infração administrativa não tenha feito essa ressalva. Além do mais, é no mínimo questionável a possibilidade de uma lei municipal trazer uma infração administrativa e por via transversas impossibilitar a aplicação de uma lei de conteúdo criminal, já que a matéria de direito criminal compete à União legislar. h) E se a perturbação de sossego decorrer do exercício da liberdade religiosa? O art. 5º, VI, da Constituição Federal assegura o livre exercício dos cultos religiosos como um direito fundamental. O direito à paz e a viver livre de perturbações encontra previsão constitucional, em razão do disposto no art. 144 da Constituição Federal, que assegura o direito à preservação da ordem pública que subdivide-se em salubridade, tranquilidade e segurança pública. A tranquilidade pública, por sua vez, abrange o direito ao sossego e à possibilidade de viver em paz em seu sentido mais amplo, sem que haja perturbações de ordem criminal ou cível. O direito ao sossego entre vizinhos encontra previsão no art. 1.277 do Código Civil.16 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 13/37 Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha. Luciano Casaroti leciona que: A liberdade de culto garantida pelo art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal, não serve para excluir a tipicidade dos responsáveis, pois o sossego e a tranquilidade alheia são bens jurídicos tutelados pelo ordenamento jurídico, de sorte que não é permitido a ninguém perturbar o trabalho ou sossego alheio com exercício de atividade ruinosa mesmo em se tratando de cultos religiosos. A propósito: Incorre nas sanções do art. 42, I e III, da LCP, os agentes que, durante cultos religiosos realizados durante a noite nos dias de semana e sábados, perturbam os vizinhos da sede da Igreja, utilizando-se de microfones e guitarras elétricas em volume alto, promovendo gritarias, lamentações e cânticos” (TACRIM-SP – RJD27/174) Ricardo Andreucci cita julgado em que um pastor foi absolvido da prática da contravenção penal de perturbação de sossego pelo fato de inexistir limites previstos em lei ou em ato municipal em relação aos cultos religiosos. Embora normalmente ruidosas, pelo clamor dos �éis e pelo uso de guitarras, ampli�cadores e alto-falantes, as reuniões de oração da igreja Pentecostal Deus é Amor só tipi�cariam a contravenção do art. 42 da lei especí�ca se violassem os limites eventualmente previstos em lei ou ato municipal disciplinadores das práticas públicas desse culto religioso. Logo, inexistindo prova da existência de norma ou medida nesse sentido, impõe-se a absolvição do pastor responsável por tais atividade” (TACrimSP – RT, 624/324) Ocorre que ainda que não exista nenhum ato normativo que limite os decibéis ou a forma de exercício do culto religioso, este não pode causar grandes incômodos aos vizinhos, pois o direito ao sossego dos vizinhos encontra-se previsto no art. 1.277 do Código Civil, além de também ser um direito constitucional. Deve haver uma ponderação de valores de forma que se permita a realização de cultos com os barulhos naturais de um evento religioso, sem excessos e incômodos excessivos. Para tanto, os locais que realizam cultos (igrejas ou até mesmo em residências) devem moderar a intensidade do som ou realizar obras necessárias para que haja isolamento acústico. Nesse sentido, já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo “Vizinhança. Obrigação de fazer e indenização. Preliminar rejeitada. Barulho excessivo decorrente dos cultos da igreja ré. Comprovação. De rigor a condenação da ré a promover obras necessárias para a contenção do som. Liberdade religiosa que não autoriza ignorar a perturbação do sossego alheio. Precedentes da jurisprudência. Danos morais constatados. Valor da indenização que não comporta redução” (Ap. 0000786-74.2014.8.26.0480, 36ª Câm. Dir. Privado do TJSP, j. 03.03.16, rel. Milton Carvalho). “Direito de vizinhança. Ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos materiais e morais. Imóvel utilizado para culto religioso. Barulho excessivo. Perturbação do sossego. Uso nocivo da propriedade. Inteligência dos artigos 1.277 e 187 do Código Civil. Sentença de parcial procedência mantida.” (Ap. 017810-06.2016.8.26.0003, 34ª Câm. Dir. Privado do TJSP, j. 14.03.18, rel. L. G. Costa Wagner) 17 18 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 14/37 Por óbvio as pessoas devem saber conviver harmoniosamente em sociedade e os barulhos do dia a dia devem ser toleráveis, como a da realização de uma construção civil; de uma igreja; de uma escola, no intervalo; de um estádio de futebol no dia de jogo; do trânsito; de um bar e restaurante com música ambiente, dentre outros. O exercício da atividade religiosa (art. 5º, VI, da CF) não permite barulhos estrondosos e perturbações excessivas, como se o som estivesse dentro da casa vizinha, pois todos direitos fundamentais possuem limites para o seu exercício e a convivência social em paz deve, igualmente, ser protegida (art. 144 da CF c/c art. 1.277 do CC). i) Competência e natureza da ação penal A Súmula n. 38 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que “Compete à Justiça Estadual Comum, na vigência da Constituição de 1988, o processo por contravenção penal, ainda que praticada em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades.” A referida súmula encontra-se em consonância com o art. 109, IV, da Constituição Federal. Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; Caso haja a perturbação de um trabalho da União, ainda assim, a competência para processar e julgar a contravenção penal será da Justiça Estadual. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que ainda que haja “conexão probatória entre contravenção penal e crime de competência da Justiça Comum Federal, aquela deverá ser julgada na Justiça Comum Estadual. Nessa hipótese, não incide o entendimento de que compete à Justiça Federal processar e julgar, uni�cadamente, os crimes conexos de competência federal e estadual (súmula n.º 122 desta Corte), pois tal determinação, de índole legal, não pode se sobrepor ao dispositivo de extração constitucional que veda o julgamento de contravenções por Juiz Federal (art. 109, inciso IV, da Constituição da República).” Nas hipóteses em que houver foro por prerrogativa de função, por decorrer de previsão constitucional, a contravenção penal deverá ser julgada pelo tribunal competente – e não pela justiça comum -, como a hipótese em que um Juiz Federal ou Procurador da República pratica contravenção penal, o que remete a competência para o processo e julgamento ao tribunal regional federal (art. 108, I, “a”, da CF). As contravenções penais praticadas pelas autoridades que possuem foro por prerrogativa de função nos tribunais superiores (STF e STJ), são por eles julgados. Não é possível que as contravenções penais sejam consideradas de natureza militar, pois o art. 9º, II, do Código Penal Militar prevê a possibilidade de haver infração penal militar prevista fora do Código Penal Militar somente se for crime. Logo, uma perturbação de sossego praticada em local sujeito à administração militar, por militares em serviço, será competência da Justiça Comum. 19 20 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 15/37 A ação penal das contravenções penais é de natureza pública incondicionada, nos termos do art. 17 da Lei de Contravenções Penais. Art. 17. A ação penal é pública, devendo a autoridade proceder de ofício. Em que pese não mencionar expressamente que a ação é pública incondicionada, o simples fato de dizer que é pública, sem especi�car se é condicionada ou incondicionada, deve ser interpretado como pública incondicionada, pois a regra das ações na esfera penal é que somente serão condicionadas ou privadas quando a lei disser expressamente (art. 107 do CP). O silêncio ou a simples menção à natureza pública deve ser interpretado como pública incondicionada. Art. 100 – A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Pelo fato da ação penal ser de natureza pública incondicionada, obrigatoriamente, o estado deve tomar todas as providências legais, independentemente,de pedido ou autorização do ofendido. Ainda que não haja qualquer solicitação, a polícia deve adotar providências, desde que seja possível constatar que há perturbação de sossego, o que, na prática, resta, praticamente, inviabilizado se não houver pelo menos uma pessoa para relatar a perturbação, ainda que as demais não demonstrem interesse. O Memorando n. 32.276.3/09 da Polícia Militar de Minas Gerais trata da atuação da Polícia Militar nas ocorrências de perturbação de sossego e no item “k” assegura que: Argumenta-se, em alguns círculos, que o art. 17 da Lei de Contravenções Penais estabelece que todas contravenções são de ação penal pública incondicionada e que assim a Polícia Ostensiva deveria agir de ofício, independentemente de haver um solicitante que se sinta perturbado, ou seja, uma vítima do delito. Entretanto, salienta-se que a ação penal é o direito ou o poder-dever de provocar o Poder Judiciário para que decida o con�ito nascido com a prática de conduta de�nida em lei como crime. A ação policial não confunde-se com a ação penal; Com efeito, a ação policial não se confunde com a ação penal. Ocorre que determinadas ações policiais somente são possíveis de serem executadas se houver autorização da vítima, pois a ação penal, em que pese ser o direito ou o poder-dever de provocar o Poder Judiciário, irradia efeitos desde a prática da infração penal, pois a investigação criminal sequer pode se iniciar se não houver autorização da vítima quando a ação for de natureza pública condicionada ou incondicionada e o delegado não deve lavrar o auto de prisão em �agrante se a vítima não autorizar, ainda que informalmente, a tomada de providências (art. 5º, §§ 4º e 5º, do CPP). Além do mais, nas ações penais de natureza pública incondicionada, o policial tem a obrigação de levar o agente capturado à presença do Delegado de Polícia para a adoção das providências de polícia judiciária. Isto é, ação penal e ação policial não se confundem, mas esta depende da natureza daquela, pois a vítima pode dispensar a tomada de providências pelo Estado e os policiais, nestes casos, devem se limitar a lavrar o Boletim de Ocorrência para futuros �ns. Caso os policiais veri�quem no local que os ânimos estejam a�orados, ainda que a vítima dispense a adoção de providências, nada tem de ilegal conduzir as partes para a 21 22 2 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art100 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 16/37 Delegacia de Polícia, com o �m de restabelecer a paz e garantir a tranquilidade social , que é missão dos órgãos de segurança pública (art. 144 da CF). j) Atuação policial na contravenção penal de perturbação de sossego. Cabe prisão em �agrante? É possível entrar na residência? É possível apreender o som? Onde a ocorrência deve ser encerrada? Não é incomum que a Polícia Militar seja acionada para atender a ocorrências de perturbação de sossego, sobretudo no período noturno. Por vezes as pessoas que acionam a Polícia Militar pretendem, somente, que os policiais compareçam ao local e peçam para a pessoa que está com som alto, diminuir ou desligar o som. Os policiais podem assim proceder? Entendo que sim. Explico. Em um primeiro momento a resposta tende a ser que a polícia deve conduzir o agente que está com som alto à Delegacia por perturbação de sossego e apreender som, uma vez que a ação penal é pública incondicionada e o Estado é obrigado a adotar as providências contra aqueles que praticam perturbação de sossego. Uma outra opção seria a própria Polícia Militar lavrar o termo circunstanciado de ocorrência nos estados que assim procedem. Esta solução não está errada e encontra amparo na lei (arts. 301 e 6º, II, ambos do CPP). Ocorre que a solução acima apontada pode não ser a melhor para o caso. A perturbação de sossego é contravenção penal, razão pela qual submete-se ao rito previsto na Lei n. 9.099/95 que não admite a prisão em �agrante quando o agente assume o compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal (art. 69, parágrafo único). Portanto, cabe a captura e condução do contraventor (aquele que pratica a contravenção penal), mas não cabe a prisão, desde que assuma o compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal. A doutrina costuma dividir a prisão em �agrante em 04 (quatro) fases: captura; condução à autoridade policial; lavratura do auto de prisão em �agrante e encarceramento. A Polícia Militar executa as duas primeiras fases, salvo quando a própria Polícia Militar lavra o termo circunstanciado de ocorrência, ocasião em que realiza somente a primeira fase. A situação caracterizadora de �agrante de contravenção penal de perturbação de sossego autoriza o ingresso em domicílio? Sim, pois a Constituição Federal autoriza no art. 5º, XI, o ingresso em casa na hipótese de �agrante delito e o art. 302, I e II, do Código de Processo Penal considera em �agrante delito quem está cometendo infração penal ou acaba de cometê-la. A infração penal subdivide-se em crime e contravenção penal, na forma do art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-Lei n. 3.914/41). Art 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. 22 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 17/37 Portanto, é perfeitamente possível o ingresso em domicílio em razão da prática de qualquer contravenção penal (art. 5º, XI, da CF c/c art. 302 do CPP c/c art. 1º da LICP). A Lei n. 9.505/08 de Belo Horizonte autoriza o ingresso de agentes públicos nas residências e em locais que emitem som alto em descumprimento à lei. Art. 7º Para o cumprimento do disposto nesta Lei, o Executivo poderá utilizar-se, além dos recursos técnicos e humanos de que dispõe, do concurso de outros órgãos ou entidades públicas ou privadas, mediante convênios, contratos e credenciamento de agentes. Parágrafo Único – Será franqueada aos agentes públicos e agentes credenciados pelo Executivo a entrada nas dependências das fontes poluidoras localizadas ou a se instalarem no Município, onde poderão permanecer pelo tempo que se �zer necessário, para as avaliações técnico-�scais do cumprimento dos dispositivos desta Lei. Tal previsão deve passar por uma leitura constitucional, com o �m de proteger o domicílio quando não houver a prática de infração penal que autorize o ingresso (art. 5º, XI, da CF). Portanto, na hipótese de ocorrência somente de infração administrativa, os agentes públicos não estão autorizados a entrarem nas dependências das fontes poluidoras quando estas constituírem um domicílio. Em que pese ser legalmente possível o ingresso em residência quando o agente praticar perturbação de sossego, é viável? Os policiais devem entrar na casa para fazer cessar o barulho de som alto? A regra é a inviolabilidade domiciliar, que é um direito fundamental (art. 5º, XI, da CF), sendo, inclusive, crime de abuso de autoridade o ingresso ilegal (art. 22 da Lei n. 13.869/2019), o que não ocorre na hipótese em que os policiais adentrem em razão da prática de contravenção penal (art. 22, § 2º, da Lei n. 13.869/2019). Ocorre que o policial deve atuar como um paci�cador de con�itos e um garantidor de direitos fundamentais, devendo, sempre que houver espaço para tanto, adotar a decisão mais razoável e proporcional, de forma que haja um equilíbrio na preservação do direito à paz pública e do direito à inviolabilidade domiciliar e a preservação da liberdade dos envolvidos. O art. 20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro– Decreto-Lei n. 4.657/42 -, com a redação dada pela Lei n. 13.655, de 2018, prevê que na esfera administrativa não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão, previsão esta que pode e deve ser aplicada ao policial na rua que poderá avaliar em uma ocorrência qual é a melhor solução a ser dada, sem que descumpra a lei e adote a melhor decisão prática que harmonize os direitos em con�ito. Deve-se observar, ainda, o princípio da paci�cação social de con�itos e a função social da lei, que é manter a paz social e a harmonia. A aplicação do direito penal é subsidiária, este é a ultima ratio, e deve ser aplicado quando as demais áreas de controle social não surtirem efeito. Salienta-se, ainda, que a perturbação de sossego é contravenção penal (um crime anão) e seria, su�cientemente, resolvida, na esfera administrativa. Nesse contexto, surge a �gura do “policial conciliador”, que é aquele ponderado e aplicador do direito, que não se limita a aplicar a letra fria da lei, sem se preocupar com os efeitos que isso pode causar em uma ocorrência. 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 18/37 O “policial conciliador” aplica a lei, mas vai além e resolve o con�ito social, pois a aplicação da lei pode colocar �m ao con�ito jurídico, mas não social. Dessa forma, o policial, ao se deslocar a uma ocorrência de perturbação de sossego poderá limitar-se a orientar (determinar) a pessoa que está com som alto dentro da residência a baixar o volume de forma que não incomode terceiros e registrar esta determinação em um registro interno (Boletim de Ocorrência Simpli�cado), para futuros �ns. As pessoas que acionam a polícia para uma ocorrência de perturbação de sossego pretendem que o barulho seja cessado e até preferem que esta seja a providência adotada para que não tenham que acompanhar o registro da ocorrência, nem fornecer maiores dados, pois o sossego e a tranquilidade que se busca ao acionar a polícia poderá ser interrompido de vez ao ter que acompanhar o registro da ocorrência. Há uma ampla aceitação social de que essa providência – somente mandar cessar o som alto – seja adotada nas ocorrências de perturbação social, sendo possível a aplicação do princípio da adequação social, o que excluirá a tipicidade material da contravenção penal de perturbação de sossego. O policial deve avaliar também o ambiente que contém o som alto, pois em festas e aglomeração de pessoas, sobretudo com bebidas alcoólicas, o ingresso da polícia na residência, que não será ilegal, pode tomar proporções catastró�cas, pois poderá haver briga generalizada, início de agressões e avanço dos presentes para cima dos policiais, com tentativa de tomada de arma e disparos, o que pode resultar em lesão corporal e em homicídio. Ou seja, uma simples ocorrência de perturbação de sossego pode se tornar em uma grave ocorrência de homicídio. Essa leitura de cenário cabe aos policiais que atenderem a ocorrência. Na hipótese em que a pessoa que esteja com som alto não atender à ordem do policial, seja para baixar o som no momento em que recebe a ordem, seja após baixar e quando os policiais se retirarem do local, aumentar o som, praticará o crime de desobediência (art. 330 do CP), sem prejuízo da contravenção penal de perturbação de sossego (art. 42 do Decreto-Lei n. 3.688/41). Portanto, uma situação que seria legalmente contornada, caso o agente tivesse atendido à ordem do policial, tomará proporções maiores, pois o agente responderá pelo crime de desobediência e contravenção penal de perturbação de sossego. O Memorando n. 32.276.3/09 da Polícia Militar de Minas Gerais trata da atuação da Polícia Militar nas ocorrências de perturbação de sossego e dispõe que: 4.1 Atender as reclamações a respeito de perturbação do sossego provocadas pelos estabelecimentos comerciais, residenciais e de som de veículos, tomando de imediato as providências necessárias a minimizar a situação e orientando o responsável a proceder o encerramento da perturbação, sob pena de prisão pelo cometimento do crime de desobediência, apreensão dos instrumentos do crime e lavratura do Boletim de Ocorrência; 4.2 No caso do delito de perturbação do sossego alheio cometido em residência particular, o policial militar deverá ADVERTIR o proprietário da residência sobre a perturbação causada por gritaria, algazarra, instrumentos sonoros ou sinais acústicos, fazendo com que cesse a perturbação. Persistindo a perturbação, o policial militar deverá efetuar a prisão do infrator pelo cometimento do crime de desobediência, LAVRAR o BO, efetuar a APREENSÃO do objeto causador da perturbação, se necessário; 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 19/37 Em que pese a perturbação de sossego ser de ação penal pública incondicionada, tem sido comum nos juizados especiais criminais a aplicação da composição civil e de acordos muitas vezes consistentes em um “pedido de desculpas”, em razão da necessária paci�cação social dos con�itos, princípio fundamental do processo penal, e informalidade que rege o Juizado Especial Criminal. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. COMPOSIÇÃO CIVIL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DA RÉ. POSSIBILIDADE. A �nalidade conciliadora dos Juizados Especiais Criminais torna incompatível a persecução penal nos casos em que as partes compõem voluntariamente o litígio, resultando na manifestação expressa da vontade da vítima em encerrar a lide. Assim, tratando-se de contravenção penal de perturbação do sossego e tendo o feito atingido a sua �nalidade, isto é, a paci�cação do con�ito, somado aos critérios norteadores da informalidade, previstos no art. 62 da Lei 9.099/95, a conseqüência é a desistência do direito de ação, não se justi�cando o prosseguimento do feito. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Crime Nº 71005772355, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Luis Gustavo Zanella Piccinin, Julgado em 04/07/2016). (TJ-RS – RC: 71005772355 RS, Relator: Luis Gustavo Zanella Piccinin, Data de Julgamento: 04/07/2016, Turma Recursal Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 13/07/2016. Na hipótese em que o policial limitar-se a determinar que a pessoa que esteja com som alto diminua o volume e a ordem seja devidamente cumprida, sem que haja maiores transtornos, é necessário registrar termo circunstanciado de ocorrência ou comunicar os fatos para polícia judiciária? Em razão do disposto no art. 69 da Lei n. 9.099/95, a resposta é sim, pois a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência de infração de menor potencial ofensivo, deverá lavrar o termo circunstanciado e encaminhá-lo ao juizado. Caso a Polícia Militar não lavre o TCO, deve encaminhar o agente à Delegacia de Polícia. Ocorre que em razão de todos os fundamentos ora expostos, sobretudo o princípio da adequação social, não se faz necessária a comunicação à polícia judiciária de advertência policial para que o agente abaixe o volume do som, sendo su�ciente que esta ocorrência seja documentada para �ns administrativos e de controle do próprio órgão policial. A aplicação do princípio da adequação social permite, em situações excepcionais, que a sua análise e aplicação ocorra diretamente pelo próprio policial, como é o caso da perturbação de sossego e do ato de perfurar a orelha de uma bebê para a colocação de brincos, o que caracterizaria lesão corporal, mas o policial ao visualizar essa prática em uma farmácia, por exemplo, não precisa tomar providências, sequer comunicar a polícia judiciária, dada a ampla aceitação social. O policial que assim procede não pratica nenhum crime, nem prevaricação, pois atua como um “policial conciliador” e paci�cador de con�itos sociais, dentro da lei, em razãode todos os argumentos expostos, e não visa satisfazer nenhum interesse ou sentimento pessoal. De qualquer forma, o tema é polêmico e o policial deve buscar orientação junto ao Comando de sua instituição que, por sua vez, poderá formalizar acordo com a Polícia Civil, Ministério Público e Judiciário locais a respeito de como proceder nessas situações de perturbação de sossego. Caso o som alto seja emitido de um bar ou local aberto ao público, obviamente, não precisará entrar em domicílio para fazer cessar o som, salvo se a caixa de som estiver instalada na parte interna do bar (do balcão 2 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/11306151/artigo-62-da-lei-n-9099-de-26-de-setembro-de-1995 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/103497/lei-dos-juizados-especiais-lei-9099-95 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 20/37 para dentro). Pode ocorrer de uma festa com som alto ter muitas pessoas que estejam consumindo bebida alcoólica e haver várias ligações para o 190 em razão da perturbação de sossego. O policial, ao chegar no local, pede para baixar o som de forma que �que restrito ao ambiente local, mas o organizador da festa ignora a ordem do policial. Neste caso terá praticado desobediência, além da contravenção penal de perturbação de sossego, contudo o agente está dentro da casa e não desliga o som. O ingresso da polícia na residência, nestas circunstâncias, não é ilegal, pois o agente está em �agrante delito, todavia, o ingresso da polícia é conveniente? A ocorrência poderá evoluir para uma briga generalizada e provocar lesão corporal e até mesmo homicídio? Será necessário reforço policial para o ingresso? O que fazer? Esse tipo de ocorrência não é tão simples de se resolver. Penso que o policial deva analisar o todo, o nível de incômodo do som, quem são os vizinhos (algum com problema de saúde que necessita descansar e não pode esperar), o nível de tolerância do barulho, se há hospital por perto, dentre outros fatores, para então decidir a providência a ser adotada, como entrar na residência à força ou somente registrar a ocorrência e encaminhar para a polícia judiciária. Imagine uma guarnição com dois policiais militares em atendimento a uma ocorrência de perturbação de sossego com grande aglomeração de pessoas que bebem álcool, durante a madrugada, momento em que não há a presença de outros policiais para apoiarem a ocorrência. Os ânimos estão exaltados e o som não é reduzido após a ordem do policial. Os policiais devem ou não entrar na casa sozinhos e enfrentarem uma grande quantidade de pessoas alteradas? Obviamente, que não. A segurança dos policiais está em risco, não há efetivo em condições de dar uma resposta e uma ocorrência que até então era simples poderá se agravar. Neste caso, é prudente que o policial registre a ocorrência e a encaminhe para a polícia judiciária. A ocorrência será encerrada sem que o som seja reduzido. Trata-se da aplicação da excludente de ilicitude do estado de necessidade em razão da omissão, pois o perigo deve ser enfrentado enquanto comportar enfrentamento. Uma solução equilibrada, se possível de ser adotada no local, é o corte de energia da residência que emite o som alto, o que pode ser feito mediante o acionamento da concessionária de energia. Feito o corte de energia, deve-se aguardar um tempo, no local ou não, a depender dos ânimos das pessoas presentes, para, então, religá-la. Os aparelhos de som utilizados na contravenção penal de perturbação de sossego devem ser apreendidos (art. 6º, II, do CPP) e restituídos quando não interessarem mais ao processo (art. 118 do CPP), o que pode ser feito pela autoridade policial ou pelo juiz, mediante termo nos autos, desde que não exista dúvida quanto ao direito do reclamante (art. 120 do CPP). Corrente em sentido diverso sustenta ser desproporcional a apreensão da aparelhagem sonora, dada a desnecessidade de realização de perícia para a comprovação da materialidade, que pode ser suprida pela prova testemunhal. Caso o aparelho de som seja um objeto lícito e adquirido licitamente pelo proprietário, este deverá ser restituído. Do contrário, eventual condenação poderá decretar a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé (art. 91, II, “a”, do CP). Na hipótese em que ocorrer transação penal ou suspensão condicional do processo, não é possível que o juiz determine o con�sco do bem apreendido com base no art. 91 do Código Penal, uma vez que a sentença é 23 24 25 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 21/37 homologatória, sem qualquer juízo sobre a responsabilidade criminal da parte. As consequências desses acordos previstos na Lei n. 9.099/95 são aqueles estipulados no próprio acordo. No tocante ao local de encerramento da ocorrência, a regra é que esta seja direcionada à Polícia Civil, por se tratar de contravenção penal, salvo nos casos em que a Polícia Militar lavrar o TCO, ocasião em que direciona a ocorrência diretamente para o Juizado Especial Criminal. Ocorre que é possível que a Polícia Federal investigue a prática de contravenção penal, uma vez que a justiça competente para julgar as infrações penais não implica, necessariamente, na polícia que possui atribuição para investigar. Em se tratando de contravenção penal, ainda que atente contra os interesses da União, a competência para julgar será da Justiça Comum Estadual (art. 109, IV, da CF). O art. 144, § 1º, I, da Constituição Federal especi�ca que cabe à Polícia Federal apurar as infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União. Art. 144 (…) § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) I – apurar INFRAÇÕES PENAIS contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; Infrações penais é o gênero que abrange crime e contravenção penal. Dessa forma, a Polícia Federal poderá investigar a prática de contravenção penal quando for praticada em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, como a hipótese em que uma pessoa �nge ser policial federal (art. 45 da Lei de Contravenções Penais) . A perturbação de sossego pode atrair o interesse da União? Sim, como a hipótese em que for praticada reiteradamente e prejudicar os serviços de órgãos da União, em razão do alto volume de som de um morador que seja vizinho de prédios da União em que ocorre a prestação de serviço público federal. Portanto, a ocorrência policial, caso a Polícia Militar não lavre o termo circunstanciado de ocorrência, poderá ser encerrada na Delegacia de Polícia Civil ou da Polícia Federal. k) Perturbação de sossego causada por veículo automotor A Resolução n. 624, de 19/10/2016, do CONTRAN, regulamenta a �scalização de sons produzidos por equipamentos utilizados em veículos, a que se refere o art. 228, do Código de Trânsito Brasileiro – CTB. Art. 228. Usar no veículo equipamento com som em volume ou freqüência que não sejam autorizados pelo CONTRAN: Infração – grave; Penalidade – multa; Medida administrativa – retenção do veículo para regularização. 26 27 2 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc19.htm#art19 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/22/37 O art. 1º veda a utilização por veículo de qualquer equipamento que produza som audível pelo lado de fora do carro. Art. 1º Fica proibida a utilização, em veículos de qualquer espécie, de equipamento que produza som audível pelo lado externo, independentemente do volume ou freqüência, que perturbe o sossego público, nas vias terrestres abertas à circulação. Parágrafo único. O agente de trânsito deverá registrar, no campo de observações do auto de infração, a forma de constatação do fato gerador da infração. As exceções encontram-se dispostas no art. 2º da Resolução n. 624/16 do CONTRAN. Art. 2º Excetuam-se do disposto no artigo 1º desta Resolução os ruídos produzidos por: I – buzinas, alarmes, sinalizadores de marcha-à-ré, sirenes, pelo motor e demais componentes obrigatórios do próprio veículo; lI – veículos prestadores de serviço com emissão sonora de publicidade, divulgação, entretenimento e comunicação, desde que estejam portando autorização emitida pelo órgão ou entidade local competente, e III – veículos de competição e os de entretenimento público, somente nos locais de competição ou de apresentação devidamente estabelecidos e permitidos pelas autoridades competentes. O art. 3º assevera que a inobservância do disposto na Resolução n. 624/16 do CONTRA caracteriza a infração de trânsito prevista no art. 228 do CTB. Isto é, basta descumprir a determinação contida na referida resolução no sentido do veículo utilizar de som audível pelo lado externo, independentemente do volume ou frequência, que perturbe o sossego público, para que esteja caracterizada a prática de infração de trânsito prevista no art. 228 do CTB. Com o advento da Resolução n. 624, de 19/10/2016, do CONTRAN não é mais necessária a utilização de decibelímetro para constatar a infração de trânsito prevista no art. 228 do CTB, uma vez que a Resolução n. 204/06 que limitava o som a 80 decibéis medido a 7 metros de distância do veículo foi revogada. Nota-se que é necessário que haja a perturbação do sossego público, ou seja, o incômodo causado em várias pessoas em razão do volume do som, ainda que estejam próximas ao veículo, pois o art. 1º da referida resolução é claro ao dizer que proíbe-se a utilização, em veículos de qualquer espécie, de equipamento que produza som audível pelo lado externo, independentemente do volume ou frequência, que perturbe o sossego público, nas vias terrestres abertas à circulação. Independentemente da origem do som no carro, seja o que vem embutido da fábrica, seja um som instalado no veículo, como as caixas de som colocadas no porta-malas, haverá a infração de trânsito prevista no art. 228 do Código de Trânsito Brasileiro, quando houver um som alto que perturba o sossego público, pois esta infração exige que seja utilizado no veículo “equipamento com som”, o que abrange qualquer equipamento que emita sons e seja instalado no veículo. A pessoa que utiliza o som do carro para colocar música em um volume alto em via pública, como na porta de um bar ou de sua residência, pratica infração de trânsito (art.228 do CTB), pois o art. 1º da Resolução n. 624, de 19/10/2016, do CONTRAN, proíbe a utilização de som que perturbe o sossego público nas vias terrestres 2 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 23/37 abertas à circulação. Logo, a pessoa que utiliza de seu carro para colocar uma música em um volume alto dentro de sua casa ou em seu sítio, não praticará infração de trânsito, sem prejuízo que pratique a contravenção penal prevista no art. 42, III, da Lei de Contravenções Penais, por abusar de sinais acústicos. O agente que utiliza o som do carro em um volume alto em via terrestre aberta à circulação, de forma que perturbe o sossego público, não pratica infração penal, uma vez que o art. 228 do Código de Trânsito Brasileiro, que é a infração de trânsito praticada pelo agente, não ressalva a possibilidade de responsabilização criminal, nem há previsão no CTB de que esta conduta con�gura infração penal. Quando a própria lei já impõe consequências cíveis ou administrativas, sem ressalvar a possibilidade da responsabilização criminal, é porque o legislador já entendeu que aquelas punições, por si sós, são su�cientes para atingirem o caráter preventivo e sancionador da conduta ilícita, razão pela qual não se deve invocar o direito penal, que possui caráter subsidiário no tocante à aplicação de punições, por poder atingir um direito fundamental de elevada importância, a liberdade. Trata-se de uma construção doutrinária e jurisprudencial. Nesse sentido a jurisprudência é pací�ca, devendo-se aplicar a mesma lógica do julgado abaixo, pois onde há as mesmas razões, deve haver a mesma aplicação do direito. Segundo jurisprudência deste Tribunal Superior, a desobediência de ordem de parada dada pela autoridade de trânsito ou por seus agentes, ou mesmo por policiais ou outros agentes públicos no exercício de atividades relacionadas ao trânsito, não constitui crime de desobediência, pois há previsão de sanção administrativa especí�ca no art. 195 do Código de Trânsito Brasileiro, o qual não estabelece a possibilidade de cumulação de sanção penal. Assim, em razão dos princípios da subsidiariedade do Direito Penal e da intervenção mínima, inviável a responsabilização da conduta na esfera criminal. (HC 369.082/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 01/08/2017) Salienta-se haver entendimento diverso, no sentido de ser possível responsabilizar o agente pela infração de trânsito (art.228 do CTB) e pela contravenção penal de perturbação de sossego (art. 42, III, do Decreto-Lei n. 3.688/41). O policial, no exercício da função de agente de trânsito, além de lavrar a multa, deverá ordenar que o responsável pelo veículo abaixe o som do carro quando este causar perturbação do sossego público, que é a medida administrativa cabível ao caso. Na hipótese em que a ordem de abaixar o som for descumprida, haverá a prática do crime de desobediência (art. 330 do CP). O som do veículo, quando for destacável do carro, ou o próprio veículo, não deve ser “apreendido” quando houver somente infração de trânsito, pois não há previsão dessa medida administrativa para a infração de trânsito prevista no art. 228 do CTB. O veículo poderá ser apreendido somente se for utilizado para a prática de infração penal, como a perturbação de sossego, cujo veículo seja o instrumento utilizado. A jurisprudência diverge a respeito da legalidade da apreensão de veículo e do som causador de perturbação de sossego. O entendimento favorável argumenta pela legalidade em razão de ser o objeto utilizado na prática da infração penal, enquanto que o entendimento contrário sustenta ser desproporcional a apreensão do veículo por não guardar relação direta e necessária com a conduta incriminada, o mesmo se aplicando à aparelhagem sonora, dada a desnecessidade de realização de perícia para a comprovação da materialidade, que pode ser suprida pela prova testemunhal. 28 29 30 31 2 https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10603975/artigo-195-da-lei-n-9503-de-23-de-setembro-de-1997 https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/91797/c%C3%B3digo-de-tr%C3%A2nsito-brasileiro-lei-9503-97 04/01/23, 11:59 A perturbação do trabalho ou do sossego alheios - Atividade Policial https://atividadepolicial.com.br/2020/05/20/a-perturbacao-do-trabalho-ou-do-sossego-alheios/ 24/37 l) Distinções entre a perturbação de sossego (art. 42 do LCP) e perturbação da tranquilidade (art. 65 da LCP) Perturbação de sossego Perturbação da tranquilidade Art. 42. Perturbar alguem o trabalho ou o sossego alheios: I – com gritaria ou algazarra; II – exercendo pro�ssão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por
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