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© 2010 by Janine Marta Coelho Rodrigues e Eric Spencer Gerente Editorial: Alan Kardec Pereira Editor: Waldir Pedro Revisão Gramatical: Lucíola Medeiros Brasil Capa e Projeto Gráfico: 2ébom Design Capa: Eduardo Cardoso Diagramação: Flávio Lecorny Este livro foi revisado por duplo parecer, mas a editora tem a política de reservar a privacidade. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) R611c Rodrigues, Janine Marta Coelho A criança autista: um estudo psicopedagogico/Janine Marta Coelho Rodrigues, Eric Spencer - 2 ed. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2015. 132p.: 21cm Inclui bibliografia ISBN 978-85-7854-113-2 1. Crianças autistas - Educação. 2. Autismo. 3. Psicologia educacional. 4. Educação especial. I. Spencer, II. Título. 10-3577. CDD 371.94 CDU 376.43 2015 Direitos desta edição reservados à Wak Editora Proibida a reprodução total e parcial. WAK EDITORA Av. N. Sra. de Copacabana 945 – sala 107 – Copacabana Rio de Janeiro – CEP 22060-001 – RJ Tels.: (21) 3208-6095 e 3208-6113 Fax (21) 3208-3918 wakeditora@uol.com.br www.wakeditora.com.br mailto:wakeditora@uol.com.br http://www.wakeditora.com.br/ Aos profissionais que buscam na seriedade do estudo, na curiosidade acadêmica e na singeleza da pesquisa caminhos para compreender os problemas, dividir as preocupações e socializar os resultados. Agradecemos a todos aqueles que colaboraram com a pesquisa e com os relatos aqui apresentados. PRIMEIRAS PALAVRAS SEGUNDAS PALAVRAS 1 – INTRODUZINDO A DISCUSSÃO 2 – COMPREENDENDO O AUTISMO 2.1 – Construindo uma caracterização 2.2 – A importância da observação individual para organização de elementos para uma intervenção pedagógica 2.3 – Etiologias 2.3.1 – A Teoria Psicodinâmica 2.3.2 – A Teoria Genética 2.3.3 – A Teoria Orgânica 3 – ALGUNS CASOS ILUSTRATIVOS 4 – PROGNÓSTICOS 5 – AUTISMO E OUTRAS SÍNDROMES 6 – MODELOS DE ATENDIMENTO 6.1 – Educação Especial: construindo uma educação inclusiva 7 – INTERVENÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS NO TRABALHO COM O AUTISTA 7.1 – TEACCH 7.2 – ABA – Análise Aplicada do Comportamento 7.3 – Sistema de comunicação por meio da troca de figuras 7.4 – Son-Rise 7.5 – Ambientes estruturantes 8 – TERAPIA DE LINGUAGEM 9 – PSICOTERAPIA E AUTISMO 10 – TRATAMENTO MEDICAMENTOSO 11 – ESTUDO DE CASO NO CONTEXTO DAS PRÁTICAS PSICOPEDAGÓGICAS CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS O presente estudo objetiva proporcionar àqueles pais e profissionais que lidam com o autista a oportunidade de conhecer algumas experiências, relatos e sugestões de atividades que certamente orientarão de forma sistematizada, o atendimento especializado do indivíduo autista. As pesquisas teóricas, os depoimentos colhidos e as experiências vividas foram aqui relatados com o mais possível rigor. Esperamos, com esta publicação, estimular outros estudos e pesquisas sobre um tema ainda pouco estudado e de tão complexas discussões. Suponho que o sucesso da primeira edição deste singelo livro, que esgotou-se em tempo surpresa, deu-se pelo fato de que os temas foram aqui tratados com rigor científico, mas de modo descomplicado, com palavras simples e precisas que ajudaram pais e profissionais a entender melhor as questões do Autismo. Esta segunda edição revisada em alguns pontos reafirma aqui nosso compromisso pessoal e profissional com aqueles que precisam ser acolhidos, para serem compreendidos e adequadamente atendidos. Atualizamos alguns índices, revisamos alguns assuntos e introduzimos uma rápida apresentação de métodos que, na edição anterior, não foram tratados. Esperamos com esta nova edição estar contribuindo para a discussão do tema Autismo. Tema complexo, difícil de ser entendido e explicado. Contudo, temos a certeza de que antes de discutir níveis, denominações, causas do Autismo, melhor será interagir com os considerados autistas, conviver com eles, vislumbrando sempre as potencialidades que precisam ser reveladas e as capacidades que precisam ser desenvolvidas. A questão sobre o tema do Autismo permeia o discurso da Educação Especial Inclusiva, quando se propõe a valorização do ser humano portador de deficiência. Tal discurso é gerado à luz de princípios universais, ancorados nos direitos humanos difundidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem e na Convenção Sobre os Direitos da Criança. O Autismo bem como outras síndromes e deficiências ainda são cercados por atitudes de discriminação e preconceito que envolvem o desconhecido e a desinformação. Neste sentido, o pesquisador ou o estudioso do Autismo tem como compromisso primeiro desvendar um imenso espaço do conhecimento sobre o Autismo e dar a conhecer, caminhando em vagarosos e atenciosos passos, ultrapassando quadros estreitados por um diagnóstico, descrevendo o universo do autista como tal, desenvolvendo estudos e divulgando achados compreendidos nas interações das especificidades de cada sujeito autista que se estuda. Levar em conta o meio circundante do contexto sociofamiliar em que o autista vive e em quais condições é educado conduz o pesquisador a duas atividades: a primeira consiste em indagar e a segunda em transformar. O propósito deste estudo é levar os leitores a se questionarem, refletirem e, consequentemente, transformarem-se, mudarem de atitude em relação ao autista. A síndrome do Autismo é um distúrbio do desenvolvimento, embora os sintomas tornem-se mais evidentes aos três anos de idade. A pessoa autista apresenta dificuldades de compreensão dos significados atribuídos, não se sabe se seu pensamento é do tipo puramente figurativo, sem conservações, o que lhes dificulta a possibilidade de realizar algumas habilidades que impliquem mudanças. Mas percebemos que, na elaboração do pensamento, as crianças autistas não utilizam a reversibilidade lógica ou fazem evocações mentais. São capazes de refazer por imitação inicialmente e, mais tarde, por transformação, quando se trabalham precocemente o espaço, a casualidade e a generalização em suas ações. Daí os pais e os professores não experimentarem pedir à criança autista que relate o que fez, por exemplo. Parece que, por ele não haver desenvolvido a capacidade de ordenamento, de organização e, assim, a evocação de cenas, de situações que supõem a construção e a reconstrução de esquemas reversíveis apresentam muitas dificuldades de serem adquiridas. Explica-se, então, a necessidade do autista em estabelecer rotinas quanto à sua comunicação e às reações comportamentais. O distanciamento das relações, uma eventual agressividade quando seu ambiente é modificado, as condutas de birra e a difícil participação nas atividades de interação social para nós, estudiosos do Autismo, são tentativas diferentes de se comunicar com a realidade social. A proposta desta pesquisa foi conhecer a Psicopatologia autística e a pessoa portadora da síndrome, identificando particularidades no comportamento (uma fixação, gosto, habilidade, limitações), que indicassem possibilidades, que poderiam vir a se tornar canais de comunicação. O estudo tenta apontar caminhos para ajudar a pessoa autista e sua família por meio de práticas psicopedagógicas capazes de reduzir os problemas e modificar o comportamento autístico para uma conduta mais autônoma com base em teorias científicas de estudiosos que, há muito, vêm estudando e pesquisando o Autismo, como Rivière (1999, p. 286), quando diz: “Desenvolver ao máximo suas potencialidades e competências, favorecer um equilíbrio pessoal o mais harmonioso possível, fomentar o bem- estar emocional e aproximar as crianças autistas do mundo humano de relações significativas”. Assim como Rivière, pensamos que a criança autista tem os mesmos direitos e precisa das mesmas oportunidades para educar-se como uma criança considerada normal. Os primeiros estudos sobre o Autismo foram iniciados pelo psiquiatra Leo Kanner, em 1943, quando estudou um grupo de crianças com características clínicas específicas, que assumiam comportamentosdiferentes daqueles já conhecidos pela literatura das síndromes psiquiátricas. Foram 11 casos estudados desde os primeiros meses de vida da criança e descritos, em 1943, em um artigo sobre um quadro descritivo intitulado “Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo”. Este trabalho apresentava casos de 11 crianças com faixa etária entre dois anos e meio e oito anos onde ele distinguiu as mesmas características clínicas. Mais tarde, apresentando mais 38 casos, publica o “Tratado de Psiquiatria Infantil”, edição de 1950. O aspecto mais marcante nos estudos iniciais de Kanner descrevia uma anormalidade inata no comportamento social, “o isolamento ou o afastamento social”, que denominou retraimento autístico, notável desde os primeiros períodos do desenvolvimento. Prosseguindo nos estudos sobre os distúrbios decorrentes desse estado patológico, Kanner, em 1949, refere-se ao quadro com o nome de Autismo Infantil Precoce, evidenciando sérias dificuldades de contato com as pessoas, ideia fixa em manter os objetos e as situações sem variá-los, fisionomia inteligente, alterações na linguagem do tipo inversão pronominal, neologismos e metáforas. A contínua análise dos problemas leva Kanner a acreditar que o Autismo devesse ser separado da Esquizofrenia Infantil, embora continuasse colocando o Autismo Infantil no grupo das psicoses infantis até o fim de seus trabalhos. Durante o processo de pesquisa, ressalta a importância da verificação do Autismo como sintoma primário, afastando o distúrbio autístico de outros quadros orgânicos (Afasia Sensorial Congênita) e psíquicos (Demência de Heller). Com o passar dos anos, observa diferenças na evolução dos casos estudados e propõe que pesquisas bioquímicas poderiam abrir novos caminhos no estudo do Autismo Infantil. Em 1956, há uma reestruturação da concepção quanto à idade de aparecimento das características. Kanner e Eisenberg constatam que a síndrome pode apresentar- se após um desenvolvimento supostamente normal. Os valiosos trabalhos de Kanner foram complementados pelas investigações de Chapman, B. Rimbaud, Bettelheim, Ajuriaguerra, Diatkine, Spitz, L. Bender, entre outros. Entre Leo Kanner e Eugene Bleuler, um psiquiatra da época, que também se preocupava com a explicação destes casos, provocou-se uma divergência que dividiu a comunidade científica, causando uma dificuldade em diferenciar claramente os diagnósticos de Esquizofrenia Infantil, Psicose Infantil e Autismo. Kanner admite no Autismo uma “inaptidão” em estabelecer relações socias normais com as pessoas e em reagir diante de situações da realidade. Já Bleuler propõe uma “ausência da realidade”, com visível ênfase à vida interior, e, consequentemente, impedimento ou impossibilidade de comunicar-se com o mundo externo, demonstrando atos de um proceder muito reservado. Para Bleuler, o autista mergulha ativamente no seu imaginário. Kanner discorda e sugere uma falta de imaginação. Encontramos na literatura alguns conceitos sobre Autismo, visto ora como um transtorno orgânico resultante de uma patologia de sistema nervoso central e, por isso, compreende implicações neurobiológicas, neurofisiológicas e neuroanatômicas, ora como uma doença incapacitante e crônica que provoca sérios comprometimentos no campo cognitivo, no desenvolvimento da motilidade e da linguagem, apresentando deficit ou alterações na codificação e na decodificação dos significados das palavras, ora, ainda, como um impedimento neurofuncional que não permite ao seu portador o desenvolvimento funcional eficaz no processo de comunicação. São distúrbios que variam desde um mutismo (silêncio voluntário) até a ecolalia, a inversão pronominal e os neologismos. Os estudiosos também evidenciam perturbações quanto ao comportamento social. Alguns deles afirmam que alguns autistas até chegam a manter um contato social, porém demonstram uma forma de relacionamento bastante subjetiva, talvez até atípica aos padrões normais de relacionamento. Percebemos em nossas observações no campo de estudo que alguns autistas podem fixar-se apenas em uma parte do corpo ou em um detalhe da roupa de quem se aproxima dele. Expressam gestos repetitivos e um conjunto variado de manias, acendem e apagam uma lâmpada continuamente, fazem questão de colocar um objeto sempre na mesma posição, frequentemente apelam para movimentos com as mãos antes de pegar em um material qualquer ou mesmo na ausência deste. Existem outros traços marcantes, resultados de descrições clínicas mais recentes, como tipos de afetos inadequados, como, por exemplo, dificuldade de perceber intenções e de externar os sentimentos, distúrbios do sono (insônia precoce) e da alimentação, problemas digestivos nos primeiros meses do nascimento, anomalias congênitas e hiporrespostas ou hiper-respostas aos estímulos sensoriais, como analisaremos em detalhes mais adiante. A aparência física dos autistas, a princípio, não expõe a dimensão exata da gravidade do problema, cujos sintomas iniciais surgem antes dos dois anos e seis meses de nascimento do bebê. Em geral, são crianças de traços singelos e de feições bonitas. O diagnóstico depende de uma combinação de vários critérios determinados. No DS – IV, é preciso estabelecer critérios (seis itens em cada grupo de avaliação: interação social, comunicação e comportamento) para diagnóstico. Já circula, entre os profissionais interessados, o DSM–V, com componentes mais sintetizados de informações, objetivando agilizar o diagnóstico. Para viabilizar um atendimento mais eficaz, sugerimos trabalhar com os dois. A prevalência varia em uma taxa de dois a cinco casos por 10.000 crianças nascidas vivas. Se forem consideradas algumas características do retardo mental severo semelhantes ao Autismo, a taxa sobe para 20 casos por 10.000 nascidos. É mais comum em crianças do sexo masculino, e a proporção atinge de três a cinco vezes mais meninos do que meninas. Nas meninas autistas, a manifestação da síndrome é mais intensa quando comparada aos meninos autistas, isto se deve a questões de ordem genética. Segundo dados da literatura psiquiátrica, cerca de 70% a 80% dos autistas possuem comprometimento intelectual. 2.1 – Construindo uma caracterização Na literatura pesquisada (veja o item Referências no final do estudo), o diagnóstico do autista é elaborado a partir de alguns parâmetros: a classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde, CID-10, na décima versão, e o Manual de Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais da Academia Americana de Psiquiatria, DSM-IV. No Reino Unido, utiliza-se o CHAT (Checklist de Autismo em Bebês, desenvolvido por Baron-Cohen, Allen e Gilberg). As características observadas na síndrome do Autismo variam na forma de exteriorização dos desvios de relações interpessoais, linguagem, motricidade, percepção e patologias associadas ao distúrbio. A intensidade destes desvios, os estados mais determinantes, também é diversificada. As alterações do comportamento social são marcadas pela acentuada inaptidão de desenvolver relações com outras pessoas, pois os autistas preferem permanecer isolados do grupo social. Investigações recentes confirmam que as relações dos autistas com os objetos inanimados seguem um entendimento incomum ou se apegam em demasia ou os abandonam. Existe em alguns autistas um comportamento obsessivo expressado pela fixação de parte de um brinquedo ou partes do corpo de alguém que está próximo, como, por exemplo, no contato com pessoas, interessa-se em uma parte do pé, da mão, cheira o cabelo, e, por vezes, é atraído por algum detalhe do vestuário. Por sua vez, os pais nos relatam que, nos primeiros anos de vida do bebê autista, percebem um atraso de expressão facial, direcionamento de atividades, e constatam certa passividade do bebê (bebê hipotônico). A mãe de L, autista, sexo masculino, hoje com 12 anos, nos relata que sempre percebeu que, em seu colo, L ficava rígido, e nãotinha nem seis meses de vida, e parecia que não gostava de ser pego (sic). Já o pai de J, hoje com cinco anos, diz que sempre via que o filho era diferente das outras crianças, ficava sempre inquieto, afastado e movia o corpo para frente e para trás, abrindo e fechando as mãos (sic). A mãe de L lembra que seu filho nunca deu os braços para ser carregado (sic). A ausência do comportamento que represente dor, perigo e medo nas crianças autistas é despercebida. O desenvolvimento emocional é confuso, surgem sorrisos inesperados. Parecem ter uma capacidade restrita para exprimir afetos e entender emoções. Certa vez, no momento da recreação, G. de O. L., um adolescente autista, de 17 anos, sem razão notável para os profissionais que o observaram, corre velozmente pelo pátio, passa por um espaço estreito do portão entreaberto, atravessa a rua e vai parar dentro de uma casa próxima à escola, de onde fugiu. Para ele, inexistem a noção de perigo, o sentido do acontecimento e as consequências. Jogos lúdicos de socialização não os atraem, quase não participam de atividades para desenvolver amizades e brincar em grupo, somente quando estimulados, sendo um tipo de envolvimento rápido e desordenado. Todos estes desvios de comportamento precisam ter considerações, caso a caso, individuais, afinal, o universo clínico de cada indivíduo é diversificado, no entanto um fator comum é o surgimento dos sintomas na primeira infância, e é importante salientar a probabilidade de diminuição dos sintomas, principalmente quando a criança autista, logo cedo, é inserida em um ambiente que propicie a estimulação da interação social. Quando a pessoa autista permanece muito tempo em um espaço social limitado, convivendo exclusivamente com as pessoas da família, sem uma estimulação psicopedagógica adequada, seu comportamento pode apresentar comprometimentos bem mais complicados referentes às manias, aos movimentos ritualísticos, à excitação emocional, aproximando-se de possíveis reações agressivas e regressivas. Em relação à capacidade de comunicações verbais e não verbais, acontecem alguns desvios marcados por distúrbios da comunicação: atrasos de aquisição da linguagem, afasia, distúrbios articulatórios, desvio fonológico, gagueira, disfonia, perdas auditivas, disartria, distúrbio de leitura e escrita. Alguns autistas não desenvolvem a fala por implicações na compreensão dos códigos linguísticos e demonstram retardo na apreensão da linguagem e, ainda, notáveis desvios qualitativos no processo de expressão e recepção de ideias. Isto os impede de fazer uma leitura de mundo que possam compreender os significados das representações, criando obstáculos de comunicação na vida diária. O entendimento funcional que acontece normalmente na comunicação entre emissor da fala e receptor da mensagem é no Autismo muito limitado e patológico, caracterizado por uma feição estereotipada na fala, que consiste na repetição imediata ou retardada de frases e palavras ditas anteriormente, e chama-se esse desvio de ecolalia. Apresentamos alguns casos que são ilustrativos, como a extensão peculiar dos problemas na área da linguagem, em relação à repetição de expressões sem nenhum sentido, de uma criança autista que parecia satisfazer-se em emitir, de forma descontrolada, palavras do tipo “dália”, “vinhatrombeta”, “negócios”, “o direito sim”, “o esquerdo não”, que são expressões ditas sem conexão lógica e mostram a especificidade da natureza do problema. Presenciamos casos em que falam seu próprio nome: Paulo... Lopau... Paulo... Lopau... Como se ecoasse seu próprio nome, repetindo-o de trás para frente continuamente, até ser estimulado para outras situações. As inversões pronominais, problemas relativos à utilização do pronome “tu” em situações que pedem o uso do pronome “eu”, ou repetir J pinte, J pinte ou J quer água? J quer água? Isto denuncia uma desorganização parcial, às vezes total, do seu reconhecimento como pessoa e como ser dotado de personalidade própria. No primeiro caso estudado por Leo Kanner, o garoto Donald T., quando queria tomar banho, perguntava: “Você quer tomar banho?”. Eventualmente, usam neologismos, inventam sons de modulação variável, têm uma comunicação inexpressiva, supostamente desprovida de emoção, e demonstram uma maneira particular de falar as palavras (idiossincrasia). O autista S, sexo masculino, com 11 anos, quando encaminhado para o banho, repetia continuamente: “S vai tomar banho, vai, S vai tomar banho, vai...” E continua repetindo a frase, mesmo depois do banho, até que se desenvolva com ele outra atividade. Em outro caso analisado, de J. N., 13 anos, sexo masculino, percebia-se que emitia um som vocal de baixo nível, com razoável entoação harmoniosa enquanto pintava formas geométricas traçadas na folha de cartolina. A capacidade de simbolização é comprometida, e as atividades de natureza abstrata possivelmente não darão nenhum resultado caso sejam aplicadas na terapia pedagógica. Uma criança em condições normais anima as coisas inanimadas, pois cria personagens, histórias e conversas, dando vida aos bonecos, aos carrinhos e aos demais objetos sem demonstrar alguma fixação. Quanto à comunicação não verbal, motivada pelos gestos e pelas mímicas, vemos que, no Autismo, é restrita, até em momentos nos quais a criança autista sente necessidades orgânicas (sede, fome) e não pede nem aponta para o que pode atendê-la. Na maioria dessas circunstâncias, a criança faz uso da mão, do punho ou do antebraço da pessoa mais próxima, usando a pessoa como ferramenta. A despedida gestual indicada pelo aceno de mão talvez seja retribuída apenas como imitação, pois é difícil classificar que tal gesto seja intencional. Mas, sempre, enfatizamos que é necessário observar o contexto sociofamiliar de cada caso, pois não há uma regra fixa. Salientamos que cada criança, como qualquer outra criança, é mais ou menos desenvolvida de acordo com o meio, os estímulos e a atenção que recebe. Com o autista, isso não é diferente. Em uma escola da capital, onde algumas observações foram feitas, encontramos um aluno autista condicionado a apertar a mão das pessoas, porém o detalhe pouco comum é que, ao largar a mão da pessoa, olhava para essa parte do seu corpo, levando-a ao nariz como se quisesse inalar algo. Os estímulos feitos na escola e no ambiente familiar a partir de solicitações simples, como pegar um brinquedo localizado à sua frente, no lado esquerdo, direito, embaixo da mesa, em compartimentos da estante, são maneiras de trabalhar favoravelmente na extinção desses comportamentos. Alguns comportamentos dos autistas seguem uma rotina que, quando quebrada, torna-se um problema para a família, os professores ou os técnicos que lidam com eles. Como referência a essa questão, apresentamos o caso de G. de O. L. que, diariamente, ao passar pela sala dos professores, para defronte a uma cadeira colocada no canto esquerdo da sala e pega nela, deslocando-a a uma curta distância. O movimento que faz arrastando a cadeira é rápido, acompanhado por um sorriso discreto. Quando a cadeira não está lá, ele fica parado à espera que alguém a coloque para realizar o movimento. Nota-se, nos autistas, uma demonstração de resistência às mudanças no ambiente. Querer sentar na mesma cadeira durante as refeições, beber em um único copo, comer no mesmo prato, não tolerar visitas, repetir os percursos de caminhos, passando por locais sempre idênticos, até o ponto de interferir nos hábitos das pessoas com que convive, para manter suas práticas repetitivas e rotineiras quase imutáveis, são rotinas para eles, mas, muitas vezes, constituem problemas para a família que precisa de ajuda para resolvê-los. A exemplo disso, a mãe de L nos diz que, no dia da faxina, quando a faxineira chega, ela passa o dia fora com a criança, pois já aconteceu que, quando as coisas, os móveis, as cortinas e os tapetes começaram a sair do lugar, a criançaentrou em crise por estressar-se com a “desarrumação” da casa para a limpeza. As mudanças podem provocar reações agressivas ou de imobilidade. As experiências vivenciadas demonstraram que, durante a realização de uma atividade pedagógica, de repente, um adolescente autista sentou na cadeira, ficou inerte e deixou de reagir. Intencionalmente, a professora buscou um brinquedo, e a aproximação deste, que usualmente parecia despertar sua atenção, fez com que ele reagisse e voltasse à atividade com o brinquedo entre as mãos. É comum grande parte dos autistas conseguir progredir na interpretação da linguagem verbal e insistir na elaboração de perguntas que esperam respostas precisas e parecidas com as respostas dadas anteriormente. Neste sentido, a preparação daquele profissional que lida com o autista deve, inclusive, caminhar para estar atento ao que irá responder, pois há a memorização das respostas e, quando as mesmas perguntas são feitas, eles esperam as mesmas respostas. Perguntas estereotipadas relativas às datas históricas, aos personagens da literatura, da política, das artes, aos números de edições de revistas, aos horários, aos itinerários, à sequência de filmes são questões que, às vezes, até surpreendem quem lida com eles, pois nem percebeu as situações sobre as quais está sendo interrogado. Nas atividades de encaixe com peças de plástico, os autistas rotineiramente as encaixam sem variações de posição e cor, exceto quando o educador intervém, encorajando o aluno autista a modificar aquilo que realiza. Os autistas podem também desenvolver no cotidiano temporárias fixações por assuntos e caracteres específicos, tonalidade de instrumento musical, formas diversas de corpos no espaço. O mundo interior do autista apresenta à realidade externa as distorcidas e inesperadas representações do pensamento. Podem aparecer nos desenhos, por exemplo, traços curtos e uniformes, círculos, garatujas, demasiada valorização por temas subjetivos e reações compulsivas momentâneas. Na literatura pesquisada, encontramos casos como esse: A mãe de Frederick W., de seis anos de idade, relatara que o menino, quando conduzido ao consultório do psiquiatra no Harriet Lane Home, em 27 de maio de 1942, sentou-se no sofá emitindo sons incompreensíveis quando, abruptamente, se deitou exibindo um escandaloso sorriso. Dando continuidade, conforme informações contidas nos casos estudados e publicados por Leo Kanner e equipe, havia o de Bárbara K, recebida no Johns Hopkins Hospital, em fevereiro de 1942, que evidenciara em uma das avaliações caligrafia legível, desenhava homem, casa, gato sentado com seis pernas, máquinas, porém eram desenhos desprovidos de imaginação, rabiscava palavras do tipo: laranjas, bananas, panelas, suco de melancia, uvas; era comum que as palavras se precipitassem umas sobre as outras e, obviamente, ficavam confusas ao entendimento coerente. Frequentemente demonstram apego excessivo por objetos, associando-os a atitudes sem valor simbólico, impróprias para o nível de idade cronológica. Podem, por exemplo, cheirar o material que está sob sua posse, encostá-lo na boca, jogá-lo com força em qualquer direção ou guardá-lo por tempo indeterminado. E típico serem atraídos por coisas em movimento, principalmente rotativos, como ventiladores, água, rodinhas dos carrinhos de brinquedo, objetos diversos que giram e rolam. Registramos as atividades de E. D. S., do sexo masculino, com 12 anos, que, quando vê uma torneira, desperta o impulso de se aproximar, abrir a torneira e mergulhar as mãos na água, admira o acontecimento durante minutos e, às vezes, é preciso chamar sua atenção, pois o barulho da água, o movimento do fluido contínuo derramando sobre ele ou alguma coisa que colocou embaixo da água parece o fascinar. Outro autista como J, do sexo masculino, com 10 anos, enrola e desenrola uma mangueira de jardim, inúmeras vezes, até abrir a torneira e ficar sentado, molhando-se, mesmo se estiver chovendo. A família nos relata que, muitas vezes, é preciso desligar a torneira geral de entrada de água da residência para conseguir tirá-lo do jardim. Autistas dão provas de que são detentores de uma notável memória operacional: memória associada à reprodução de atos ligados a trabalhos elaborados em circunstâncias passadas, à execução de procedimentos relativos a exercícios escolares, às listas de nomes, aos trechos de poemas e aos números. Estudos comprovam que as informações armazenadas não serão analisadas e, dificilmente, reestruturadas. “Na memorização imediata, os autistas utilizam pouco a estratégia de codificação semântica ainda que a codificação acústica seja relativamente boa”. (LEBOYER, 2003, v.4, p.148) J. N. lembra-se dos passos e das movimentações dados durante o exercício de música aplicado meses anteriores ao dia em que reproduziu os mesmos movimentos ritmados do corpo ao escutar outro gênero musical. Outra criança autista, também realizando uma atividade gráfica com um bastão de giz de cera, geralmente utilizava cores, como azul escuro e verde. Ouvíamos que cantava durante a atividade uma música de propaganda, que caracterizava uma soletração, de uma loja de calçados para crianças da cidade. Parece ser comum entre os autistas que existe um considerável comprometimento nos movimentos das mãos, dos membros inferiores, do tronco e no jeito de sentar, ficar de pé, caminhar. Executam manobras estranhas e complexas com as mãos antes de pegarem objetos ou quando os seguram. É característico caminhar na ponta dos pés e, repentinamente, dar saltos. Alguns inclinam o corpo para os lados, para frente, balançam a cabeça no ar ou giram em torno de si mesmos. Estes movimentos não são caracterizados como deslocamentos físicos voluntários. Daí a importância de estudar e planejar os exercícios pedagógicos direcionados ao autista e, depois, avaliar o desempenho dos indivíduos quando envolvidos nestas atividades. Os transtornos na motilidade (capacidade de mover-se) podem aparecer de modo contínuo em um horário regular do dia ou possuírem uma frequência variada no dia e até chegarem a desaparecer. As causas são atribuídas a disfunções na fisiologia do sistema vestibular, responsável pelo equilíbrio e pela estabilidade do globo ocular e “por modelar as entradas sensoriais e a excitação motora”. (LEBOYER, 2003, p.136) De acordo com o entendimento de Leboyer, a idade de início dos sintomas faz parte integrante dos critérios de diagnóstico do Autismo. Michael Rutter, Gauderer e demais teóricos também admitem que a idade de surgimento dos sintomas é uma característica clínica fundamental para o diagnóstico. Nota-se que o começo dos sintomas no Autismo é desenvolvido antes dos dois anos e seis meses (30 meses) de idade. Ornitz e Ritvo (2001) descrevem características resultantes de estudos sensoriais e do desenvolvimento, que objetivam contribuir para o esclarecimento da evolução do Autismo ao longo da história, desde sua descoberta até tempos posteriores. Comumente, dependendo da intensidade das instigações geradas no ambiente, o autista gira a cabeça com movimentos rápidos e balança o corpo para os lados. Isto evidencia um tipo de defesa orgânica diante das dificuldades de compreensão sensorial. Constatam-se irregularidades no ritmo normal do desenvolvimento motor, social e cognitivo. O retardo é típico nessas três dimensões da formação humana. Conforme pesquisas sobre a insônia no Autismo, são observadas insônias agitadas acompanhadas por excitação motora (contração muscular, movimentações repentinas de braços e pernas). Interrupções no sono implicam uma diminuição do tempo de sono, a criança acorda e pode ficar passiva ou agitada. Estudos apontam a existência de perturbações digestivas, como diarreia ou redução do número de evacuações, por causa de uma retenção anormalmente prolongada das fezes no intestino, verificadas com frequência no decorrer dos primeiros meses. A literaturaestudada informa que, após o sexto mês de vida, o bebê autista tende a rejeitar a ingestão de alimentos sólidos, dando preferência a alimentos pastosos. De acordo com as informações pormenorizadas escritas pelos pais de Donald. T., caso estudado por Leo Kanner, a criança fora amamentada com alimentação suplementar até o oitavo mês e acometida por periódicas mudanças de dieta. O relatório dos pais afirmava que comer foi sempre um problema para ele. 2.2 – A importância da observação individual para organização de elementos para uma intervenção pedagógica Enfatizamos aqui que, antes de se estabelecer um diagnóstico, a estimulação, o carinho e a atenção voltada à criança autista, para que se desenvolva, interaja e sinta-se parte daquela família e daquele grupo, são mais importantes do que lhe chamar portadora disso ou daquilo. Neste estudo, a discussão sobre diagnóstico foi utilizada muito mais como um parâmetro para estudar, planejar e desenvolver atividades pedagógicas capazes de ajudar os autistas do que para rotulá-los. Salientamos, então, a importância em considerar a dimensão social na singularidade da criança autista. É essencialmente mobilizadora, pois o grau de desenvolvimento do autista está diretamente ligado às questões de estimulação, atendimento especializado e conhecimento adequado de como lidar com as situações do seu cotidiano. Tais questões, certamente, implicam as condições econômicas e culturais da família de cada um. Os desdobramentos das interfaces no social e no cultural estão também fundamentados na Psicologia e na psicodinâmica do atendimento aos autistas nos dias atuais. Ao falarmos do social, do econômico e do cultural, estamos falando também da escola, que, em sua função educadora e socializadora, precisa responder a um ideal de educação que traga consigo a melhoria do desenvolvimento e das condições de trabalho que possa oferecer a esta demanda. Com base nestas considerações, estudamos alguns comprometimentos associados que os autistas podem apresentar, apontando, desde já, que as incursões na literatura apontam que os casos devem ser individualmente analisados. A criança autista não está livre do aparecimento de patologias associadas e, por isso, quem trabalha com ela deve conhecer e acompanhar esses problemas associados inseridos no diagnóstico. O retardo mental, os desvios de desenvolvimento da linguagem, os desvios de comportamento observados conforme a idade cronológica, mental e verbal bem e as condições psiquiátricas que possam afetar o comportamento fazem parte do conjunto de sintomas verificados no Autismo. a) Retardo Mental Apesar da ideia de que os autistas têm retardo mental, é necessário diferenciar os comportamentos do autista e do deficiente mental, diagnosticando-os conforme a especificidade de cada caso. A criança, o adolescente e o adulto com retardo mental podem externar características próprias do transtorno autista, mas não, necessariamente, apresentar o diagnóstico de autismo, afinal, são os critérios de diagnóstico aplicados individualmente que determinarão o estado geral da personalidade do paciente. Uma diferença visível é a capacidade do deficiente mental em buscar aproximações com as outras pessoas para estabelecer relações de conversação, o que dificilmente acontece com pessoas autistas, salvo um número reduzido de autistas que possuem níveis intelectuais e de desenvolvimento da linguagem receptiva e expressiva elevados, que, ainda assim, mantêm o desenvolvimento social irregular. Crianças mentalmente retardadas assumem um comportamento homogêneo de retardo, enquanto, nos autistas, as reações e as aprendizagens são muitas vezes inesperadas, mas se percebem também uma descrição mais heterogênea, respostas comportamentais precoces, estagnação do desenvolvimento. Gilberg (2005), por exemplo, aponta o caso de uma menina de quatro anos e meio com transtorno autista que podia ler. Assim não há inflexibilidade nas afirmativas, como sempre destacamos, são casos diferentes que implicam famílias e estímulos diferentes. b) Esquizofrenia A história familiar é um critério frequentemente aceito em pacientes esquizofrênicos, e a literatura também é associada a pessoas de baixo nível socioeconômico. Infelizmente, nem sempre, a genealogia do autista é analisada e, segundo Kanner, os resultados intelectuais dos esquizofrênicos no período da infância não são deficitários, registram-se distúrbios comportamentais e transtornos do pensamento. Por outro lado, é identificado nos autistas de QI baixo um estado comportamental mais parecido com aqueles que têm retardo mental grave. Os autistas de QI elevado têm como traço de diferença a ausência de alucinações e delírios. Um dos aspectos relevantes de diferenciação seria a idade na qual aparecem os sintomas. No transtorno autista, aparecem antes dos 36 meses, já nas manifestações típicas da Esquizofrenia, começam durante ou após a puberdade, e é muito raro surgir em crianças com menos de cinco anos. No Autismo, a relação entre os sexos (M/F) tende a acometer os meninos (3 – 4/1), com uma incidência de duas a cinco crianças afetadas em cada 10.000, enquanto os dados relativos à Esquizofrenia são bem diferentes, há uma incidência provavelmente inferior a 1/1000, a uma razão entre os sexos de 1,67/1, com leve predomínio em homens. Existem algumas descrições muito pontuais, em torno da possibilidade de que Esquizofrenia e Autismo poderiam ocorrer sobrepostos, por haver relatos de tais combinações raras e semelhanças comportamentais momentâneas, como o referido caso descrito por Ornitz e Ritvo (apud LIPPI, 1987). Um garoto de quatro anos exibe todas as características de Autismo (atraso no desenvolvimento, distúrbio na modulação da percepção, no comportamento, na linguagem e na motilidade). Analisado novamente pela equipe aos nove anos de idade, perguntaram-lhe por que se balançava e punha as mãos em frente ao rosto, ao que respondeu: “O chão está vindo em minha direção”; “As paredes estão se movendo para dentro e para fora”. c) Deficiências Sensoriais (Surdez e Cegueira) A ausente ou limitada quantidade de respostas aos estímulos auditivos leva a pensar sobre o possível diagnóstico de surdez na criança autista. Há sinais de reação a sons intensos por parte da criança autista, e, ainda, exames indicam perda significativa de audição. Percebemos em autistas alguns comportamentos extremamente ansiosos que são impulsos reativos a sons bruscos e repentinos ou à música muito alta. Em contrapartida, as crianças autistas podem também reagir a sons de menor intensidade e responder a sons fracos e músicas. No geral, as respostas positivas nos contínuos trabalhos lúdicos com música sempre aparecem com espaços de investigação. Se a criança tiver surdez congênita, desenvolverá algum comportamento semelhante a um traço autístico (estereotipias, caráter introvertido, resistência à mudança), que vai sendo modificado à medida que aprende a se comunicar socialmente. Também, nas crianças com cegueira, são vistos comportamentos semelhantes às expressões autísticas. Quando desenvolve a capacidade de autonomia em locomoção, orientação e mobilidade, é comum que a criança cega realize movimentos de braços e gesticulação da mão em frente da face. Mas, as diferenças vão ficando nítidas quando se percebe o interesse da criança deficiente visual, ao procurar interação normal com pessoas e objetos no ambiente, quando desenvolve um comportamento afetivo e interativo. d) Distúrbios de Desenvolvimento da Linguagem Não é fácil distinguir crianças autistas de crianças portadoras de Distúrbios do Desenvolvimento da Linguagem Receptivo- Expressiva. Alguns critérios são fundamentais na observação. As crianças com transtornos da linguagem são capazes de utilizar a comunicação não verbal para estabelecer relações no convívio social e desenvolvem brincadeiras com jogos imaginativos, demonstram interesse na participação ecoerência nas conversas. Ao contrário das crianças autistas, mesmo aquelas capazes de falar, possuem um padrão de uso funcional da linguagem com características específicas, como ecolalia retardada, frases estereotipadas fora do contexto lógico de conversação, emitem sons de tonalidade alta e baixa inesperadamente. e) Privação Psicossocial Graves transtornos no ambiente físico e emocional causam marcas profundas, às vezes, irremediáveis no desenvolvimento da personalidade de uma criança. Falta de interação afetiva com adultos, privação materna, escassez de estímulos sensoriais, vestibulares e cinestésicos, carência de proteção, contato físico, reciprocidade de sentimentos, durante longos períodos de hospitalizações ou por desestruturação familiar, podem gerar atrasos na criança, talvez distúrbios na aquisição e no desenvolvimento da linguagem e nas habilidades motoras, alterações no curso dos relacionamentos como apatia ou isolamento. A diferença fundamental nestas crianças é o avanço progressivo quando inseridas em um ambiente harmonioso e rico em estímulos, o que não ocorre com os autistas que levam mais tempo para responder aos estímulos e às reações ao ambiente. 2.3 – Etiologias Alguns estudiosos atribuem as causas do Autismo às anormalidades orgânicas, neurológicas e biológicas que descrevem várias patologias manifestadas em associação com o Autismo nas fases pré-natais, perinatais e neonatais, fatores genéticos, achados neuroanatômicos e achados bioquímicos. Outros autores apontam fatores de origem psicogênica, bastante discutidos nas primeiras décadas, desde o descobrimento do Autismo por volta de 1940. Esses fatores parecem refutados como etiologia preponderante do Autismo, conforme afirma Gauderer (1992): “... esta teoria caiu totalmente em desuso, devido à enorme gama de estudos científicos, documentado um comprometimento orgânico neurológico central”. Estudaremos, a seguir, algumas teorias que apontam as causas do nascimento de uma criança autista na tentativa de melhor estudar didaticamente e compreender como se originam. 2.3.1 – A Teoria Psicodinâmica Ainda na década de 40, Kanner identifica fatores comuns às famílias dos 11 primeiros pacientes por ele analisados: autistas oriundos de famílias com padrão socioeconômico elevado, pais com nível de inteligência superior à média, obsessivos, dedicados a assuntos de teor abstrato, pouco afetuosos e emotivos e introvertidos. A partir destes grupos, Kanner elaborou três hipóteses: a primeira enfatiza fundamentos de natureza psicogênica, os pais possuem uma estrutura psíquica patológica que pode provocar o nascimento de filhos com condições autísticas; a segunda sugere dois tipos de autismo: o orgânico, ligado a patologias neurológicas, e o anorgânico, que destaca fatores psicogênicos; por fim, a terceira hipótese defendida por Kanner, em 1955, traz no bojo a possibilidade de um acidente orgânico inato e de estresse psicogênico. Surgiram, a partir daí, estudos que apresentaram uma gama de novas hipóteses: ou argumentavam que o nascimento de um autista seria provocado por possíveis situações de estresse no ambiente familiar, ou a criança autista nasceria das patologias psiquiátricas nos pais. E, ainda, estudos de caráter sociológico relacionaram o nível de rendimento intelectual à classe social elevada dos pais, o que levou Kanner a organizar uma estatística das famílias dos autistas, destacando o padrão socioeconômico alto. Apesar de os argumentos dessas teorias não consolidarem os fatores psicogênicos como causa maior do Autismo, é válido sempre correlacionar situações do cotidiano do autista ao repertório de reações diferentes desprendidas repentinamente e com frequência. 2.3.2 – A Teoria Genética Destaca-se, nesta teoria, a importância do estudo das famílias dos autistas. Foram estudados os riscos nos grupos familiares de nascerem filhos da mesma família com Autismo. Primos, irmãos, irmãos gêmeos, sobrinhos, familiares em diferentes graus de parentesco entre membros afetados pelo Autismo. Quanto à metodologia do estudo de famílias, Roubertoux (apud LEBOYER, 2003), durante a década de 80, aponta para o aumento do risco de desenvolvimento do Autismo entre irmãos e irmãs de autistas. Tratando-se dos estudos com gêmeos, os dados revelam que a concordância para o Autismo em gêmeos monozigóticos (gêmeos idênticos univitelinos) varia de 36% a 90%, e, em gêmeos dizigóticos (gêmeos não idênticos afetados), a concordância é nula ou baixa. Quando são consideradas as anormalidades cognitivas e sociais, o nível de concordância aumenta para 92% entre os monozigóticos e 10% entre os dizigóticos. A Equação Biológica (Fenótipo = Genótipo + ambiente) pode nos ajudar a examinar possibilidades de haver alterações patológicas no genótipo e da influência de complicações exógenas (apneia perinatal, nascimento retardado, convulsões neonatais) de natureza não genética responsável por lesões cerebrais. Afinal, vêm sendo descritos fenótipos diversificados que podem resultar da soma determinada pela equação biológica: Autismos de autofuncionamento no qual o indivíduo consegue um desempenho normal ou acima da média em uma área de conhecimento específica e em um inesperado momento de sua vida, autistas apresentando ausência de comunicação verbal, com grande habilidade nos desenhos, e autistas com sérios comprometimentos na sociabilidade, porém possuem a fala funcional e a inteligência normal. Enfim, são variados e bem notáveis os traços ligados ao fenótipo, todavia, ainda, há muita contestação concernente ao modelo genético. No contexto atual, são sugeridos indícios comprovados da presença de uma transmissão heterogênea de componentes genéticos no Autismo, uma interação entre múltiplos genes lesados em certos cromossomos. Deste modo, é aceita a existência de três a mais de dez genes relacionados com o Autismo. Genes de desenvolvimento relacionados ao sistema nervoso central, genes do sistema serotoninérgico e de demais sistemas de regulação das funções neurais, identificados em pacientes autistas, têm aberto significativos caminhos de estudo nessa área. 2.3.3 – A Teoria Orgânica Pesquisas vêm revelando a importância de se investigar a influência das lesões neurológicas na alteração do desenvolvimento do sistema nervoso central. Um dado útil em nível de confrontação teórica reporta-se à amplitude do conjunto de doenças orgânicas relacionadas não apenas às condições neurológicas mas também às anormalidades metabólicas, hereditárias e às infecções virais neonatais constituídas em momentos distintos de formação do bebê. No período pré-natal, as ocorrências patológicas mais frequentes são a rubéola congênita e as hemorragias do primeiro trimestre. Complicações perinatais são bastante evidentes, com um quantitativo mais relevante nos casos de síndrome de Aflição Respiratória e Baixo Apgar, além de outras patologias manifestadas nos três primeiros anos de vida, a exemplo da Fenilcetonúria, Esclerose Tuberosa e Convulsões apresentadas sem tanta frequência, somando-se ainda ao aparecimento de patologias posteriores à primeira infância. Em estudo recente, foi identificado um aumento no volume cerebral dos autistas entre 8 e 12 anos de idade, mas não naqueles com mais de 12 anos. Foram observados anormalidades no lobo temporal, região do cérebro que, quando afetada, ocasiona modificações nos comportamentos motor e social; perda de interesse e dificuldade no reconhecimento de pessoas próximas e fatos do cotidiano; problemas de dispersão no iniciar, continuar e concluir uma atividade; e comportamento motor repetitivo. Em cerebelos estudados, observou-se a diminuição de células de Purkinje, o que tende a originar transtornos de atenção, excitação motora e processos sensoriais anormais. São identificadas anormalidades eletroencefalográficas (EEG) em 13% a 83% das crianças autistas, entretanto, em métodos distintos de obtenção e interpretaçãodos exames, em diferentes critérios usados para o diagnóstico clínico, por existirem patologias associadas, identifica- se uma variabilidade em relação aos resultados desses trabalhos científicos, afirmando-se apenas indicações de falha de lateralização cerebral. Um dos achados mais consistentes está atribuído às vias serotoninérgicas. A serotonina, neurotransmissor que atua nos processos fisiológicos do organismo, quando apresentada em níveis normais, regula o sono, controla a temperatura do corpo, a dor, a agressividade e o comportamento sexual e, em condições patológicas, provoca perturbação na modulação de estados afetivos, retardo mental e hiperatividade. Cerca de um terço dos pacientes autistas tem elevação da taxa de serotonina plasmática. Os resultados das pesquisas sugerem que as elevadas taxas de serotonina em autistas não são constantes e nem sequer todos são hiperserotoninêmicos. Aproximadamente, 30% estão classificados no subgrupo de serotonina elevada, supondo inclusive a possibilidade de uma heterogeneidade clínica de casos patológicos em crianças e adolescentes tanto na Neurologia quanto na Psiquiatria no que concerne às pesquisas neurobiológicas. M. J. T. Naturalidade: João Pessoa/PB. Internada desde 1990, foi trazida por uma ativista dos Direitos Humanos, após denúncia dos vizinhos de que a mesma vivia trancada em um quarto há 10 anos. Vivia com o irmão, também portador de transtornos mentais, e encontrava-se em estado de desnutrição. Segundo registro de internação, “paciente com deficit intelectual, humor instável, desorientada no tempo e no espaço, risos imotivados, atitude pueril, deambulação excessiva, descuido pessoal, rapport prejudicado”. Apresentava também um quadro de mutismo, tricolomania e enurese. Quadro atual: conserva o mutismo. Dá mostras de entender o que se fala, já estabelece laços e participa das atividades, demonstrando interesse, segundo suas limitações. Ainda apresenta o sintoma maníaco (tricotilomania) com frequência bem menor. Faz sua própria higiene. Vai para as atividades voluntariamente, realiza algumas tarefas da vida diária (como lavar copos, limpar mesas e cadeiras, guardar os materiais utilizados nas atividades). Sono e apetite são preservados. Recebe visitas esporádicas do irmão, onde ambos permanecem calados, sem comunicação. “Pequeno” Internado desde l995. Não se tem conhecimento de dados pessoais. Foi trazido ao hospital pela Polícia. Consta no registro de internação que encontrava-se na rua despido, em estado de agitação psicomotora. Apresenta também mutismo, o gestual é limitado a acenos de cabeça, e a aproximação ou o afastamento das pessoas ocorre segundo suas necessidades: aproxima-se quando quer solicitar algo (comida, roupa etc.) e afasta-se quando não necessita de cuidados. Não aceita a medicação que lhe é ministrada e, portanto, ela é diluída na comida. Raramente toma banho sem ajuda. Algumas vezes, resiste ao banho. Permanece a maior parte do tempo na enfermaria. Costuma guardar pequenos objetos, sem valor aparente, retirados do lixo, os quais conserva com zelo. Não apresenta evolução do seu quadro psicopatológico e apresenta crises convulsivas. L. T. L. Hoje, com 12 anos, desde muito pequeno, relata a mãe, parecia que não gostava de ninguém. Não olhava as pessoas, não gostava de beijo ou de abraço. Chorava quando ouvia sons muito alto, principalmente no carro. Ficava agitado. Conduz sempre na mão direita ou debaixo do braço direito um tecido azul, que torce e estica como se passasse a ferro. Fala sozinho, diz palavras soltas ou que ouviu há pouco tempo. Não responde verbalmente, mas é capaz de ir ao banheiro com supervisão, beber água e realizar pequenas atividades domésticas como pegar objetos quando solicitado ou abrir e fechar portas. J. M. de S. Menino com cinco anos. A família só soube do diagnóstico de autista quando ele tinha quatro anos. Apesar de ser um bebê arredio e sem linguagem, a família nunca esperou que fosse tão grave (sic). Pensavam que ele era diferente, mas que, com o crescimento e com a convivência com os outros irmãos, melhorasse. Tem constantes crises de agressividade, se autoagride, chegando a se machucar. A mãe é que cuida e leva-o para escola. Ele estuda em uma escola particular e, contrariamente ao que se esperava, fica na escola sem problemas. Parece gostar do ambiente colorido e dos brinquedos. Atualmente frequenta sessões de Fonoaudiologia, mas responde pouco à estimulação. Embora tenha uma boa coordenação motora, não é sempre que realiza as atividades solicitadas. No acompanhamento dos prognósticos, é importante refletir sobre a situação crônica e a probabilidade de acontecer variação discreta ou mais intensa nas características previsíveis à síndrome no decorrer da vida do autista. A maioria atinge a velhice, porém conserva os problemas básicos de desvio na linguagem e no comportamento (rotinas e manias), além de problemas secundários, como transtornos de personalidade, afetivos, sociais e catatonia. Percebe-se que alguns comportamentos vão surgindo e outros desaparecendo na trajetória de vida do autista. A literatura demonstra que o nível mental e a estimulação precoce, combinados com o desenvolvimento das habilidades de comunicação por volta dos cinco aos sete anos de idade, são fatores bastante positivos para os melhores prognósticos. Mesmo havendo desenvolvimento da linguagem funcional, é provável que aconteçam anormalidades no uso da linguagem e na ação de se expressar com as palavras. Fala monótona sem modulações, fala em staccato (emitida com intervalos), linguagem que substitui o significado compreensível de uma palavra por outras palavras com significado incomum; nos adolescentes, a linguagem é constituída por questões obsessivas, quase sempre associadas a preocupações momentâneas. O entendimento do valor funcional e da aplicabilidade de cada símbolo percebido na realidade cotidiana depende do nível intelectual no qual a criança se situa. Expressar com habilidade por meio da fala os símbolos apreendidos proporciona a criança a fazer uso das mais variadas funções do cérebro, logo uma criança autista com um sutil desvio no funcionamento deste órgão restringe a sua aptidão no desempenho de atividades da vida diária. Tanto é que os prognósticos menos otimistas no Autismo são atribuídos às crianças com funcionamento intelectual inferior a 70. Durante a vida adulta, são introvertidos e passivos, é possível que um número bastante reduzido possa levar uma vida social independente, exercendo uma profissão, pois, à proporção que as crianças autistas se desenvolvem, vão evidenciando avanços tímidos e incertos nos padrões qualitativos de comportamento, o que não quer dizer cura. Segundo Gauderer (1992), algumas vezes, crianças com retardo mental grave são suscetíveis a convulsões. No Autismo, a idade de aparecimento das convulsões é diferente dos indivíduos não autistas, cujas crises de convulsão surgem no início da infância. As convulsões nos autistas, em geral, ocorrem a partir dos sete anos. Cerca de 25% apresentam convulsões entre 11 e 19 anos. Consideramos que a definição do Autismo é um conceito sempre em construção. Independentemente da terminologia que se utilize, o mais importante é atendê-los. Identificam-se alguns estereótipos, percebem-se alguns comportamentos ritualísticos, encontram-se desempenhos de aprendizagem satisfatórios e, em algumas atividades, a linguagem expressiva está presente. Hoje, 2015, vem sendo utilizado o Transtorno do Espectro Autista – TEA, que envolve diferentes síndromes que afetam o desenvolvimento, e a palavra inglesa “spectrum” é usada por se tratar de diferentes situações, de diversas gradações de comprometimentos, mas sempre relacionadas às perturbações da comunicação e do relacionamento social. Para compreender a extensão do termo Autismo com as síndromes correlacionadas, inseridas no universo dos Transtornos Invasivosdo Desenvolvimento com base no DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), estão incluídos nesta categoria os transtornos de Rett, o transtorno desintegrativo da infância, o transtorno de Asperger e o transtorno autista. Na literatura pesquisada, a descrição de diversas doenças fundamentadas em aspectos metabólicos, neurológicos e genéticos, estudados paralelamente à sintomatologia autística, apresenta semelhança com a enunciação clínica do Autismo. Neste sentido, como o objetivo deste estudo é discutir pedagogicamente as questões do Autismo, serão estudados como correlacionamos o grupo dos Transtornos Invasivos de Desenvolvimento, terminologia que, nos últimos anos, tem sido substituída com o conceito de Espectro Autístico. Sugere-se ao leitor interessado em aprofundar o tema a leitura do estudo de Assumpção (1994) – veja o item Referências no final do trabalho – que aponta problemas de ordem genética, neurológica e metabólica que envolvem o Autismo: 1.Infecções pré-natais: rubéola congênita, sífilis congênita, toxoplamose, outras (citomegaloviroses) 2.Hipoxia neonatal 3.Infecções pós-natais: herpes simplex 4.Deficits sensoriais 5.Espamos infantis: síndrome de West 6.Doença de Tay-Sachs 7.Síndrome de Rett 8.Fenilcetonúria 9.Esclerose tuberosa 1 0.Neurofibromatose 1 1.Síndrome de Cornelia de Lange 1 2.Síndrome de Willians 1 3.Síndrome de Moebius 1 4.Mucopolissacaridoses 1 5.Síndrome de Turner 1 6.Síndrome do X Frágil 1 7.Outras alterações cromossômicas 1 8.Hipomelanose de Ito 1 9.Síndrome de Zunich 2 0.Intoxicações diversas Síndrome de Rett Como anteriormente esclarecemos, apenas algumas correlações serão apresentadas, a exemplo da síndrome de Rett. A síndrome de Rett (SR) é um distúrbio neurológico incapacitante com grau de severidade considerável, de início precoce, provoca a gradual regressão do desenvolvimento psicomotor de meninas previamente normais. No começo dos sintomas, o diagnóstico é complicado, pode ser confundido com demais transtornos invasivos. Percebe-se, contudo, sintomas mais específicos que repercutem no reconhecimento da síndrome. Foi relatada clinicamente por Andreas Rett em 1966. Um ano antes, foram percebidos comportamentos atípicos em 22 meninas. O desenvolvimento dessas meninas parecia se enquadrar em um nível normal, dentro de um espaço de tempo de, pelo menos, seis meses, verificando-se posteriormente um intenso agravamento evolutivo do estado clínico. Etiologia Pelas pesquisas, não existem parâmetros que provem com precisão a causa da síndrome de Rett, embora a deterioração progressiva, após um tempo normal inicial transcorrido, possa sugerir uma combinação com determinada desordem metabólica. Também é provável ter ligações de base genética, pois é diagnosticada somente em meninas. Os diversos relatos sinalizam para a aceitação completa em gêmeas monozigóticas. Sintomas e Sinais • comprometimento na evolução psicomotora, considerado após uma evolução normal das habilidades até, pelo menos, o sexto mês de vida. Ausência de registros anormais no desenvolvimento pré-natal e perinatal; • após o terceiro mês de vida, é notada uma desaceleração de crescimento da área craniana; • a capacidade de comunicação receptiva e expressiva sofre um decréscimo, atingindo certos níveis de danos estabelecidos entre seis meses e um ano de idade. Os efeitos vão desde a indiferença e a dispersão até o isolamento afetivo, pouco respondendo aos estímulos ambientais, traços comportamentais também vistos no Autismo; • diminuição da ação de agarrar, segurar ou apanhar objetos. O fato de pouco a pouco deixar de utilizar os movimentos dos membros superiores faz surgir as estereotipias manuais, tais como: retorcer as mãos, movimentos de esfregar e bater as mãos e, muitas vezes, parecem simular o gesto de lavar as mãos,.Isto vai acontecendo no intervalo de seis meses a dois anos de idade; • os distúrbios motores são considerados elementos importantes, porque marcam a existência de um transtorno neurológico em crescimento, diferenciando-se do Autismo. Fraca coordenação motora que implica uma marcha e posturas irregulares (instabilidade e rigidez); • ocorre retrocesso das funções intelectuais e graves problemas no desenvolvimento da linguagem; • convulsões em até 75% dos portadores da síndrome de Rett, problemas respiratórios, como apneia, hiperventilação e respiração irregular no que diz respeito à coordenação da expiração e inspiração. As escolioses severas são frequentes nestes pacientes. As pessoas portadoras desse transtorno podem apresentar, durante o passar dos anos, desgaste muscular, rigidez e suscetibilidade a nenhuma capacidade de linguagem, tornando-as dependentes em potencial. Crianças que trazem consigo as características da síndrome de Rett podem receber diagnósticos da síndrome autística, devido às deficiências nas relações sociais. Mas, ao analisar o curso dos dois transtornos, ficam definidas as diferenças... Os maneirismos no Autismo são mais acentuados. No transtorno de Rett, as crianças perdem por completo suas aptidões verbais, já os indivíduos autistas usam uma linguagem provida de desvios, a exemplo da ecolalia, inversão pronominal e neologismos. As anormalidades respiratórias e as convulsões observadas no transtorno de Rett não são vistas no Autismo, exceto possíveis convulsões que ocorrem na adolescência. Tratamento São orientadas intervenções medicamentosas, administrando anticonvulsivantes para o controle do acesso convulsivo e seções de fisioterapia aplicada à disfunção muscular. A terapia comportamental cuja função é reforçar estímulos positivos (aplaudir, abraçar, movimentar-se com a criança), de muita utilidade no Autismo, é direcionada ao controle de comportamento autodestrutivos dos portadores da síndrome de Rett. Em relação à escolarização pelo comprometimento geral, são poucos os progressos. Prognóstico Os problemas da síndrome são progressivos. Apesar de os prognósticos não serem totalmente conhecidos pela comunidade científica, estudos de casos mostram indivíduos que, quando chegam à idade adulta, mantêm características cognitivas equivalentes às dos primeiros anos de vida. Transtorno Desintegrativo da Infância Descrito em 1908 como uma deterioração lenta das funções intelectuais, sociais e da linguagem, os Transtornos Desintegrativos, conhecidos por síndrome de Heller ou por psicoses desintegrativas, envolvem um conjunto de problemas associados à evolução global do indivíduo. Percebe-se a presença do desenvolvimento normal nos primeiros anos de vida. No decorrer do tempo, o relacionamento social, o desenvolvimento da comunicação e as práticas comportamentais para a construção da elaboração do raciocínio e das emoções são significativamente reduzidas. O comprometimento intelectual é visto em uma quantidade expressiva de casos e discute-se a existência ou não de dano cerebral. Com a evolução destas complicações, é que a caracterização deste transtorno desintegrativo da criança aproxima-se da caracterização daquelas que possuem o Autismo. Etiologia De causa desconhecida, tem sido associado a estados neurológicos, abrangendo perturbações convulsivas, esclerose tuberosa e diversos transtornos metabólicos. Os dados epidemiológicos não são precisos, estima-se um caso em cada 10.000 meninos e a uma razão de quatro a oito meninos para uma menina Sintomas e Sinais A idade mínima para referência, conforme o DSM-IV, é de dois anos. Antes disso, é visto um desenvolvimento supostamente livre de traços anormais. A literatura admite um campo delimitador que varia entre um e nove e entre três e quatro anos de idade para o diagnóstico. Perda repentina ou sutil ao longo de vários meses das habilidades de comunicação verbal e não verbal, visível regressão nas interações com as pessoas, perturbações motoras, ansiedade, impulso à repetição de atos, diminuição do interesse nas práticasde jogos (brincadeiras de faz de conta, muito presente durante a infância) e problemas no controle esfincteriano são traços presentes. Existe a perda de habilidades em algumas áreas: linguagem, comportamento social, controle urinário ou intestinal, jogos (cognição) e motricidade. Há comprometimentos no desenvolvimento da interação social, na comunicação, nos padrões de conduta restritivos repetitivos e em alguns comportamentos estereotipados. O Transtorno Desintegrativo da Infância se distingue do Autismo inicialmente por apresentar perda na formação de habilidades adquiridas antes das manifestações dos sintomas e, posteriormente, na construção de frases, situação que não acontece nos indivíduos autistas. Tratamento Por causa da proximidade clínica com o Autismo, o tratamento defendido a favor do transtorno desintegrativo segue critérios de interferência similares aos dirigidos às crianças portadoras do transtorno autístico. Prognóstico Pessoas que apresentam declínios progressivos das funções cognitivas, motoras e de linguagem em geral são diagnosticadas com retardo mental considerado de grau moderado. Síndrome de Asperger O médico austríaco Hans Asperger, em 1944, relata uma síndrome a qual denomina “psicopatia autista”, considerando-a como um distúrbio do desenvolvimento associado a alterações orgânicas e enfatizava a hipótese de uma lesão de integração de informações. O relato original explicitava a existência de crianças com sérios comprometimentos de interação social recíproca, além de peculiaridades comportamentais diferentes, se comparadas ao conjunto de atitudes normais, inteligência em níveis aceitáveis e sem atrasos no desenvolvimento de linguagem. Sendo assim, pessoas com algum retardo mental e sem atrasos de linguagem têm sido diagnosticadas como portadoras do transtorno de Asperger ou síndrome de Asperger, definição contida na décima revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10). Na vida adulta, estes indivíduos são considerados excêntricos, diferentes e com comportamentos estranhos. Etiologia A causa da síndrome de Asperger é desconhecida. O que se sugere é uma semelhança com o Autismo, estudada à luz de hipóteses genéticas, metabólicas, infecciosas e perinatais (problemas transcorridos durante o parto). Sintomas e Sinais Comprometimentos qualitativos acentuados na relação social, como gestos comunicativos não verbais anormais, expressão facial, postura do corpo e contato visual com outras pessoas, são marcados por notáveis perturbações. Apresentam, muitas vezes, dificuldade para estabelecer relacionamentos com pessoas do seu grupo social, pois parecem não desenvolver uma disposição espontânea para compartilhar atividades, interesses ou realizações. Desenvolvem também padrões pessoais de comportamento restritos, repetitivos e aparentemente inflexíveis, conduzindo-os às rotinas e aos rituais específicos de natureza não funcional. Nota-se a presença de alguns maneirismos motores e insistente preocupação em seguir os mesmos roteiros de atitudes que interferem na vida ocupacional e social. Não existem atrasos significativos na linguagem nem no desenvolvimento cognitivo. Tratamento Os modelos de intervenção, como Educação Especial e Modificação de Comportamento, usados no tratamento do Autismo, tendem a exercer influência satisfatória na motivação das potencialidades intrínsecas dos portadores da síndrome de Asperger. Prognósticos Desenvolvem uma escolarização dentro da normalidade sem problemas expressivos de aprendizagem. As questões mais comprometidas referem-se ao comportamento e às relações sociais. Aconselha-se a adoção de uma programação individualizada, em duplas ou em pequenos grupos, dependendo da habilidade do educador em controlar as situações inesperadas e do grau de relacionamento estabelecido entre os indivíduos a serem atendidos, objetivando aproveitar, pedagogicamente, o máximo do atendimento. É importante estabelecer metas pedagógicas, objetivos a médio e longo prazo e metodologias especiais direcionadas ao autista. Tais questões devem estar norteadas pelas concepções e pelas abordagens estudadas pelo educador, o que lhe proporciona, além de uma segurança acadêmica, um leque de possibilidades no programa a ser desenvolvido. Sabemos que o processo de crescimento e funcionamento do cérebro é decisivo no desempenho das funções psicológicas e que a ligação dos neurônios entre si (sinapses) e a arborização dendrítica têm início na gestação e atingem níveis elevados de desenvolvimento até três ou cinco anos, diminuindo o ritmo após essa idade. Lesões no lóbulo frontal alteram a capacidade de organizar ações para se adaptar às mudanças do ambiente, são responsáveis por restrições de afetos, ausência de empatia, comprometimento do controle sobre a atenção. Esta complexa rede de formação do sistema nervoso central se justapõe desde o nascimento a vários níveis de funcionamento passíveis de interrupções, distorções, estagnação temporária e retrocessos em sua evolução e maturação, comprometendo o desenvolvimento normal do ser humano. A indicação de um planejamento pedagógico individual para o portador de Autismo se propõe exatamente pela individualidade dos casos, ideia esta que estamos apresentando durante todo o estudo, a importância dos contextos sociofamiliares, econômicos e culturais, que interferem no aprendizado. Tais interferências diferem de pessoa a pessoa no que concerne ao estágio de desenvolvimento, grau de comprometimento da patologia e a idade no período do tratamento. Uma segunda questão na importância do trabalho individualizado refere-se ao entendimento citado por Fernandes (2004): “atingir o nível real de desenvolvimento da criança e seu perfil de habilidades e dificuldades”. Da complexidade dos sujeitos, resultam implicações que interferem nos resultados de um único tratamento, daí a sugestão da interdisciplinaridade de abordagens terapêuticas, respeitando a fase de desenvolvimento e a intensidade dos comprometimentos. Os transtornos do Espectro Autístico apresentam diferenças baseadas na análise de variáveis, como etiologia, idade de manifestação das alterações comportamentais, características específicas dos desvios de desenvolvimento em cada transtorno do espectro avaliado, diagnóstico, funcionamento intelectual, perfil neuropsicológico e prognóstico. O conhecimento dessas variáveis também ajudará a possibilidade de combinar diferentes princípios de abordagens terapêuticas e educacionais, uma vez que não existe um tratamento específico indicado para influir em todas as áreas afetadas. A compreensão em nível de tratamento é heterogênea. Diferentes autistas podem beneficiar-se com um determinado tipo de atendimento orientado por métodos da Psicoterapia, enquanto outros autistas podem desenvolver-se a partir de atendimentos norteados por uma abordagem comportamental. O que se propõe neste estudo é atender os autistas viabilizando a redução dos traços autísticos no sentido das relações sociais, da aprendizagem e da escolarização, motivando permanentemente a expansão e possível maturação da capacidade das áreas comprometidas, a fim de obter resultados mais funcionais, na perspectiva de um desenvolvimento pessoal, por meio de oportunidades pedagógicas que os impulsionem a desenvolver e concretizar trabalhos que sejam úteis para atender às suas necessidades do cotidiano. Ensiná-los a lavar as mãos, tomar banho, vestir suas roupas, calçar os sapatos, desempenhar tarefas simples de organização do mobiliário do quarto, na cozinha, acompanhá-los guardando talheres, pratos, deixar que arrumem a mesa antes das refeições, enfim, tornando-os autônomos e independentes no trato das habilidades pessoais, são exercícios de valorização das experiências compartilhadas de contato social, da interação com o mundo externo e do sentimento de autorrealização. 6.1 – Educação Especial: construindo uma educação inclusivaEducação Especial é uma modalidade terapêutica norteada por concepções, metodologias e técnicas fundamentadas na Psicologia, na Pedagogia, na modificação de comportamento e na terapia de linguagem. Entendemos que o modo de atendimento educacional precisa ser visto em uma expectativa conceitual ampla, concentrada no estudo teórico-cientifíco das disfunções neurológicas, dos desvios nas funções psicológicas e cognitivas que alteram o funcionamento comportamental do portador de transtornos do Espectro Autístico. Como consequência desse prévio juízo em nível de senso científico, virão as intervenções de aplicação pedagógica, pelas quais o professor confrontará na práxis as realidades dele, sujeito pesquisador e construtor, sujeito dirigido por suas intenções de minimizar sintomatologias, maximizando potencialidades. Ainda agregando-se neste conjunto, virá a própria realidade evolutiva do educando deficiente no espaço terapêutico, a qual o educador avaliará respaldado por critérios psicopedagógicos, sugerindo mudanças nos planos de aula de acordo com as especificidades dos comportamentos do educando. O PEP-R (Perfil Psicoeducacional Revisado) é uma proposta de avaliação que consiste no teste do coeficiente de desenvolvimento do aluno autista, evidenciando a idade cronológica adequada ao nível de desenvolvimento. A aplicação deste método avaliativo enfatiza a comunicação visual, pois considera que a dificuldade de compreensão do aluno interfere na eficácia dos resultados. São sete áreas de desenvolvimento avaliadas pelo PEP-R – imitação, performance cognitiva, cognitiva verbal, coordenação olho-mão, coordenação motora ampla, coordenação motora fina e percepção. A Educação Especial para autistas, na perspectiva inclusiva, segue a ideia de uma política de ensino estruturado, que é indiscutivelmente eficiente e eficaz no tratamento dos transtornos autísticos, mas pode flexibilizar-se no sentido de conceber aspectos metodológicos centrados em um modelo de pensamento relativo, que envolve experiências construídas em um espaço terapêutico mais maleável. Na perspectiva do ensino estruturado, concepção que, segundo Gutstein (apud FERNANDES, 2004), obedece a um modelo de pensamento absoluto no qual a sala de aula é organizada em espaços divididos, visando atender ao ensino individual, ao trabalho independente, ou seja, em uma mesa, o aluno executa atividades aprendidas anteriormente com o professor, e conta-se também um espaço de descanso, que inclui atividades livres, mas com postura adequada. O problema é saber se esta postura é adequada ao desenvolvimento do ser humano autista ou ao aprendizado condicionante de uma ideia de educação mecanicista. Outras ideias de destaque no âmbito da Educação de autistas tratam da funcionalidade dos programas de atividades e do uso de um sistema visual (os autistas demonstram bom desempenho nas habilidades visório-especiais), cuja finalidade é orientar o aluno no espaço escolar, por meio de cartões com instruções simples. Por exemplo, uma sequência de representações – símbolos – para ajudá-los no caminho ao banheiro ou construir uma agenda contendo fotos das atividades facilitará a realização dos trabalhos. Cada atitude concretizada pelo aluno nas rotinas de trabalho deve ser percebida por ele como útil para sua vida. A execução de experiências concretas vivenciadas no ambiente sociointeracionista, integrando as práticas de desenvolvimento cognitivo indispensáveis, passa a assumir grande valor educativo na relação entre ensino e aprendizagem, é nestes instantes que a ação participativa do professor-mediador representa o diferencial positivo para ajudar o aluno autista na organização da consciência sobre si mesmo, a ter a percepção do corpo ocupando espaços na realidade externa e, posteriormente, a ter a consciência de que existem pessoas interagindo. A proposta inclusiva da Educação (um direito assegurado) tem por fim conscientizar os(as) professores(as) sobre as bases filosóficas, político-educacionais, jurídicas, éticas, responsáveis pela formação de competências do profissional que participa ativamente dos processos de integração, desenvolvimento e inserção da pessoa deficiente na vida produtiva em sociedade; evidenciar o direito legal mediante dever do Estado com a educação; e garantir, conforme determina a Constituição da República Federativa do Brasil no seu artigo 208, inciso III, o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. O conteúdo do citado dispositivo constitucional encontra redação quase idêntica no capítulo V, da Educação Especial, artigo 58 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Já na óptica do conceber filosófico, a Educação Especial baseia-se no intento da valorização plena da dignidade humana, independentemente da situação socioeconômica na qual a pessoa se encontra. São documentos essenciais à universalização da formação de uma consciência igualitária, includente e solidária: a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a Convenção Sobre os Direitos da Criança e as declarações das Nações Unidas (Declaração de Salamanca) culminadas no documento Regras Padrões Sobre a Equalização de Oportunidades para Pessoas com Deficiências. No parecer da ação pedagógica, a preocupação da Educação Geral deve ser o desenvolvimento integral – corpo, psiquismo, espírito – do ser humano, preparando-o já nas primeiras infâncias para a vida produtiva, fundada no equilíbrio das intenções individuais e dos interesses normativos voltados à regulação da vida coletiva. Respeito ao educando e ao direito à educação de qualidade são características assinaladas no ideal do Estado Democrático de Direitos. Nesta visão universal da educação, aparece como parte integrante a Educação Especial, cuja efetiva materialização acontece quando se identificam atrasos ou alterações no desenvolvimento global da criança, estendendo-se ao longo da vida do cidadão, com o firme propósito ético-moral de valorizar suas potencialidades, gerando oportunidades sociais, educacionais e profissionais, isentas de quaisquer resquícios segregacionais. Afinal, todo ser humano é valioso e, independentemente da forma física ou psicológica pela qual se apresenta ao mundo, deve desfrutar de uma vida plena e decente em condições que lhe garantam sua qualidade moral, favoreçam sua autonomia e facilitem sua participação ativa na comunidade, de maneira que as pessoas do grupo social acolham a pessoa deficiente, sentindo-a presente e participante nas atividades de trabalho e lazer, conscientes da necessidade de respeitar as limitações físicas, orgânicas e psíquicas da pessoa portadora de deficiência. Ratificar perante pais, profissionais e comunidade científica a possibilidade de discutir políticas educacionais a favor da melhoria na qualidade de ensino dos portadores de Autismo e síndromes correlatas, trazendo informações relevantes, é parte da ação profissional, encontra-se escrito em uma das laudas produzidas no I Encontro Brasileiro de Práticas Terapêuticas, ocorrido em março do ano de 1994, em Minas Gerais, cujo texto informa à sociedade civil que o programa TEACCH (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Deficiências Relacionadas à Comunicação) é atualmente na Carolina do Norte um Programa de Estado, sendo utilizado nos sistemas locais de ensino. No Brasil, esse programa é referência em algumas escolas, sendo citado também pela Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE como proposta de intervenção educacional. Fundamentando-me nestes documentos, busco respaldo no princípio do ajuste econômico com a dimensão humana e no princípio de legitimidade, garantidos no documento Subsídios para a Organização e Funcionamento de Serviços de Educação Especial – Área da Deficiência Mental, do Ministério da Educação e do Desporto – MEC, e no artigo 208 da Constituiçãoda República Federativa do Brasil para defender a viabilização de uma discussão a respeito da necessidade de implementar uma política de ampliação da qualidade do ensino nos estabelecimentos públicos e privados de assistência ao portador de Transtornos Abrangentes do Desenvolvimento, contemplando a formação especializada e contínua do professor, no conhecimento e na aplicação do programa de intervenção TEACCH, ajustado a outras concepções científicas que abranjam recursos técnico- metodológicos aprovados. Do conjunto de dados gravados em entrevistas com profissionais da Psiquiatria, da Neuropediatria e da Fonoaudiologia, obtivemos declarações positivas adicionadas a críticas construtivas referentes à assistência terapêutica educacional, quando perguntara sobre os efeitos da Terapia Ambiental ou Educação Especial no atendimento da sintomatologia autística. Vejamos as opiniões: “A terapia pedagógica é no atual contexto recomendada como terapia de primeira linha para o tratamento da criança autista, no sentido de impulsionar a socialização, ensinando-lhe o significado do seu modo de viver e, por meio desse processo de terapia pedagógica de convivência, de escolaridade, poder-se-ia também trabalhar a questão afetiva. A terapia pedagógica defendida na visão da Psicopatologia é uma Pedagogia em que a criança aprende vagarosamente, não é uma Pedagogia curricular, pois eu não posso estabelecer que, no final do ano, esta criança seja aprovada da 1ª para a 2ª série. Os processos de desenvolvimento são lentos, e o professor deve avaliar muito mais o trabalho pedagógico do que a capacidade do próprio autista, porque o processo em termos de avaliação e recuperação é irregular, mas sabemos que há absorção”. (Dr. Genário Alves Barbosa, Psiquiatra Infantil) “A Pedagogia educa e, quando o faz, controla os instintos e os impulsos, condicionando o indivíduo autista ou deficiente a uma rotina de conduta. A Pedagogia também ensina comportamentos por imitação”. (Drª Sônia Maia Farias, neuropediatra e professora de Neuropediatria da Universidade Federal da Paraíba) Trabalhar naquilo que o autista direciona a atenção significa motivá-lo a estabelecer vínculos de convivência entre pessoas, mesmo que seja em escala de avanços e retrocessos. Quando Kanner, psiquiatra austríaco que deu início à descrição do Autismo, acompanhou seus 11 casos originais, havia dois casos que se sobressaíam. Um deles transformou a fixação que tinha por números em um bem-sucedido trabalho em um banco. O outro, quando criança, um fazendeiro encontrou um alvo para sua fixação. Ele disse que o menino poderia contar as fileiras de pés de milho ao arar a terra. Apresentamos o caso de um jovem autista fascinado por água, sua conduta diante do mundo objetal é imatura se for comparada à idade cronológica. Por exemplo, relaciona-se com brinquedos pondo-os na boca, mas, mesmo assim, mostra notável interesse durante as brincadeiras com água. Entraremos em detalhes sobre as atividades lúdicas, os procedimentos, os resultados e outras evidências no capítulo do Estudo de Caso no Contexto das Práticas Psicopedagógicas. 7.1 – TEACCH O método TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Related Communication Handicapped Children), que traduzido em português significa Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Deficiências Relacionadas à Comunicação, é um programa de intervenção terapêutica educacional e clínico. Teve como marco preponderante a formulação do conceito de Autismo a partir da compreensão dos distúrbios do desenvolvimento relacionados à comunicação, à intervenção social e à cognição. Baseado neste raciocínio, o Dr. Eric Schopler e sua equipe de pesquisadores desenvolveram na Universidade da Carolina do Norte (1966) os pressupostos científicos do método TEACCH, cuja metodologia de trabalho consistiu-se em uma intensa observação comportamental das crianças autistas, em variadas situações e diante de diferentes estímulos. Dos estudos criteriosos do Dr. Eric Schopler e dos autores, resultam conclusões sobre o comportamento das crianças autistas. Analisemos: os distúrbios de comportamento do autista podem ser modificados à proporção que ele consegue entender o êxito de suas expressões verbal ou gestual no ambiente, bem como o que se espera dele em certas circunstâncias. A criança autista exprime melhor a percepção visual do que a percepção auditiva durante as estimulações, responde a ela positivamente quando estimulada em ambientes organizados, ou seja, o funcionamento comportamental adaptativo do autista é consideravelmente melhor em condições estruturadas. A programação das atividades (tempo, duração, material), da previsibilidade e das rotinas organizadas em quadros, painéis ou agendas é uma das características dos princípios metodológicos dirigidos ao aprendizado do aluno autista. Para cada sequência de trabalho, existe um local recomendado: espaços para a realização de atividades individuais com a presença do terapeuta, para as atividades em grupo; outro local destinado ao momento do lanche; e mais um local delimitado chamado de tempo livre, onde são selecionados materiais e atividades direcionados aos interesses das crianças. Tais interesses são descobertos na realidade familiar, informados pelos pais nas entrevistas com a equipe de profissionais. Princípios norteadores do método TEACCH: 1.busca do entendimento exaustivo de como é, como pensa, como age a criança e o adolescente autista; 2.determinação de objetivos específicos e claramente definidos com relação ao programa terapêutico; 3.especificação dos repertórios de comportamento que o autista pode ou não realizar, sem ênfase a rótulos, categorizações e suposições de caráter interpretativo; 4.elaboração de planos terapêuticos individuais dirigidos aos comportamentos-alvo com especificação das respostas; 5.adaptação dos métodos terapêuticos à problemática específica da criança ou do adolescente; 6.atenção constante naquilo que vemos a criança ou o adolescente fazer, registrando os acontecimentos; 7.seleção cuidadosa de comportamentos que sejam realmente relevantes; 8.seleção criteriosa de comportamentos que respeitem e mantenham alguma semelhança com aquilo que a criança já saiba fazer ou esteja fazendo; 9.divisão do comportamento final esperado em informações que serão apresentadas em pequenas quantidades em uma sequência progressiva e repetida; 1 0.utilização de esquemas de reforçadores e de estímulos de preparação produzindo um condicionamento secundário. A filosofia do método TEACCH está fundamentada na máxima behaviorista de que só é possível teorizar e agir sobre o que é cientificamente observável. O TEACCH consolida-se como uma linha de pensamento indutivo, mensurável e determinista e enfatiza a objetividade, suprimindo análises subjetivas. O trabalho de intervenção do terapeuta é baseado na determinação de objetivos bem definidos e direcionados aos comportamentos que se pretende mudar, com o propósito de extinguir ou amenizar comportamentos indesejáveis, reforçando, positivamente, os estímulos que aumentam a probabilidade das condutas entendidas como adequadas e, negativamente, todo estímulo que produza condutas inadequadas à convivência social. É bom salientar que o Behaviorismo envolveu fortemente o pensamento e a prática da Psicologia adotada em escolas e consultórios até 1950. Um segundo ponto de reflexão se refere à afirmação de Gauderer (1993), ao dizer que os psicanalistas nunca fizeram estudos comparativos quanto às suas técnicas terapêuticas. Ele responde às pesquisas do método TEACCH realizadas com estudos comparativos, concedendo-nos subsídios para, na medida do possível, desenvolver propostas diferentes. Tais pesquisas revelam que crianças autistas detêm maior capacidade de absorver aprendizados em uma proposta de trabalho estruturado, contra-argumentando a ideia de intervenção mais livre e interpretativa. A linguagemé uma capacidade geneticamente determinada na espécie humana, isto é, o que diferencia o ser humano das demais espécies. Com base nesta marca natural, o esperado em condições normais é que haja desenvolvimento regular aliado à maturação das partes constituintes do principal órgão ligado ao funcionamento da linguagem, o cérebro. Quando acontece algum acidente no percurso, há uma desestruturação em termos de apreensão sensorial, processamento mental de recuperação e encadeamento de imagens introjetadas, além de falhas na exteriorização de ações que vão atribuir significado às coisas presentes no mundo objetal, fazendo com que as pessoas não reconheçam as intenções do indivíduo com problema e sintam dificuldade em transmitir informações para a pessoa deficiente. O problema no Autismo é um acentuado comprometimento na aptidão de assimilar e expressar o significado abstrato existente nos signos e nos símbolos que são representações criadas e nomeadas culturalmente. Daí o fato de o autista reagir com hostilidade a determinadas situações, mostrar comportamento introvertido, se utilizar do outro como instrumento para alcançar um objeto. Devido à dificuldade de comunicação, usa a mão do adulto, levando-a à torneira, à geladeira, à garrafa ou ao copo, tentando transmitir uma mensagem de necessidade orgânica. A teoria da Psicologia da linguagem ou Psicolinguística atua nos Distúrbios Abrangentes do Desenvolvimento como terapêutica psicopedagógica e juntamente com a terapia comportamental fundamentam o método TEACCH. Os aspectos metodológicos psicolinguísticos do TEACCH convergem para a importância atribuída à funcionalidade dos conteúdos ensinados e ao sentido pragmático aplicado no espaço de vivência da pessoa autista. Para cumprir com os objetivos pedagógicos planejados, são utilizados estímulos visuais, fotos, figuras, cartões que orientam o autista na escola e nos ambientes de sua casa. Estímulos corporais, linguagem não verbal que enfatiza gestos, movimentos do corpo, aplausos, apontar um objeto pretendido. Estímulos audiocinestésico-visuais, sons e movimentos são associados às fotos. O apoio visual de cartões com fotos, desenhos, símbolos, palavras escritas, materiais concretos sequenciados favorece o trabalho em nível de nome, objeto e ação ensinado, para que a comunicação tenha significado. Após a criança demonstrar desenvoltura na atividade ensinada, a conduta adquirida passa a fazer parte da rotina de trabalho do aluno. O método TEACCH recebe críticas porque aplica uma abordagem determinista. No pensamento determinista, não é considerado o espaço para motivação de livre escolha. Nesta concepção, há uma reduzida confiança na vivência de ações espontâneas, entendidas por teóricos da Psicologia humanista como expressão da potência humana que acontece independentemente de uma exaustiva prática educacional condicionante. 7.2 – ABA – Análise Aplicada do Comportamento No atendimento comportamental analítico do Autismo, é feita uma análise da criança ou do adolescente autista, tendo como finalidade identificar habilidades já assimiladas pela pessoa, daí, então, são ensinadas habilidades que o autista ainda não domina. Cada habilidade ensinada por etapas obedece a uma organização de atendimento individual. Os trabalhos de estimulação ao aprendizado de novas aptidões são apresentados ao aluno por auxílio de uma indicação ou instrução. Caso o aluno necessite de apoio para começar e prosseguir na atividade, o terapeuta intervém agindo como mediador, sua ajuda é concedida até que o autista consiga executar a tarefa com autonomia, evitando o reforço à dependência. As respostas positivas de mudança do comportamento, em decorrência das ações pedagógicas favoráveis, dão provas ao terapeuta de que o aprendizado está fluindo. Logo, é observado na lógica comportamental, que, quando um evento particular de Estímulo-Resposta é reforçado (recompensado), o indivíduo é fisiologicamente condicionado a reagir, tendendo a repetir as respostas positivas ou agradáveis referentes ao processo de aprendizagem e sociabilização. Respostas problemáticas e inadequadas (birras, fugas repentinas) não são reforçadas. Vale lembrar que o Reforço é uma das bases fundamentais na teoria Estímulo-Resposta de Skinner. Quanto aos procedimentos de avaliação no método ABA, eles consistem na análise detalhada de dados e fatos ocorridos na relação entre ensino e aprendizagem, registrando todas as tentativas e os resultados, com o objetivo de descobrir quais são os eventos que funcionam como reforço positivo ou negativo. Nesta intervenção, é aplicada mais uma ideia da teoria de Skinner – o condicionamento operante – mecanismo de aprendizagem que introduz novas condutas, reforçando-as a partir do processo de modelagem. Os métodos TEACCH e ABA estão consolidados na Psicologia behaviorista, que parte da premissa básica de que o comportamento do ser humano é controlado pelo ambiente e pelos genes. Portanto, a principal crítica dirigida a tais métodos reside na prática de uma concepção de educação mecanicista, adestradora, mais inclinada a robotizar do que a promover as genuínas potencialidades humanas. Outra crítica ao ABA diz respeito ao custo elevado de treinamento e implantação. 7.3 – Sistema de comunicação por meio da troca de figuras A ideia do Sistema de Comunicação por meio da Troca de Figuras (PECS), originalmente conhecido como Picture Exchange Communications System, é ajudar crianças e adultos portadores da síndrome autística ou portadores de outros distúrbios de desenvolvimento a adquirir habilidades de comunicação. A habilidade de comunicação fundamental envolve a capacidade de enviar e receber informações do ambiente onde a pessoa estabelece relações, saber expressar o que deseja para obter algo e satisfazer necessidades (comunicação expressiva). Ora, quando o autista pede verbal ou gestualmente uma coisa a alguém, naquele instante, ele percebe a existência da pessoa, mantendo pelo menos uma instantânea interação que também ocorre com objetos. Apoiar-se naquilo que o autista tem como aptidão, para estimular nele a assimilação de informações recebidas por outrem, ensinando-o a perceber a função contida nos elementos concretos (signos/símbolos) da cultura em que vive, é o que caracteriza a comunicação receptiva. O PECS utiliza esse mecanismo expressivo e receptivo da comunicação para ensinar a pessoa autista a perceber que, pela comunicação, se alcança a realização de desejos. Manipular um objeto (brinquedo), saciar a vontade de comer ou beber são alguns exemplos da necessidade de comunicação intrínseca pertencente ao ser humano. Um dos pressupostos da metodologia do PECS é descobrir o que motiva a pessoa com Autismo ou com síndromes correlatas a querer se comunicar, que elementos da realidade são mais atraentes e qual razão (o porquê) o induz à vontade de comunicar- se. Esta é uma dimensão da comunicação funcional que marca qualquer sistema de comunicação, provocar sentidos funcionais de comunicação. Outro passo é ensinar a criança ou o adolescente os meios que possibilitarão condições de ela ou ele se expressar, evitando dependência constante das pessoas, para atender às suas necessidades básicas (comer, beber, lavar-se). Os meios, a forma ou o como a pessoa se comunica são: • comunicação motora e gestual (deslocar-se em direção a algo ou apontar); • fazer uso de objetos; • usar figuras para indicar alguma vontade; • expressar sons relacionados à determinada coisa percebida; • usar palavras; • comunicar-se por linguagem de sinais; • fazer uso de sentenças ou de palavras escritas. Ainda estão inseridos na comunicação funcional o contexto e o conteúdo. O contexto trata dos momentos nos quais a pessoa expressou atos comunicativos e para quem foram direcionados. No conteúdo, é avaliado o teor da mensagem e o que é que o emissor da fala quer dizer naquela situação. Antes do PECS estimular o aprendizadode habilidades de comunicação, o método avalia capacidades e habilidades da pessoa portadora de deficiência. Este método de intervenção promove a aquisição e o desenvolvimento da linguagem, baseando-se nos estudos da moderna Psicologia da linguagem ou Psicolinguística. 7.4 – Son-Rise Apresentando algumas boas ideias do programa Son-Rise. Trata-se de um método educacional para crianças autistas, desenvolvido pelo The Autism Treatment Center, em Massachusetts, nos Estados Unidos. No início dos anos 1970, o casal Kaufman, por meio de uma abordagem afetiva e criativa, associada a uma atitude positiva de participação e com a elaboração e aplicação de atividades direcionadas ao desenvolvimento de habilidades e informações do mundo exterior ao cotidiano do autista. Esses pais criaram também atalhos comunicacionais verbais ou não verbais onde qualquer sinalização de interação é aproveitada e transformada em aprendizagens. O Programa Son-Rise, de base domiciliar, necessita, para obter sucesso, da disponibilidade dos pais, do envolvimento da família, de uma equipe multiprofissional, para que as sessões individuais, de caráter lúdico, social, emocional e cognitivo aconteçam com experiências pedagógicas otimizadoras. 7.5 – Ambientes estruturantes Muitos materiais do cotidiano dos lares das famílias de autistas podem servir de espaços de aprendizagens. A configuração das coisas da casa pode e deve ser aproveitada como pistas para formação de conceitos ou fixação da sonoridade e grafia da palavra. Aprender e saber guardar adequadamente seus pertences, ajudar nas atividades domésticas, dar a localização dos objetos, a partir das palavras escritas e fixadas na estante, no armário, nos objetos da casa ou nos espaços onde a família circula. Em muitos momentos, os ambientes estruturantes podem ajudar a construção da autonomia da criança e do adolescente autista, dando segurança pela identificação das coisas, dos fazeres e das atividades da casa. Um dos maiores ganhos dos ambientes estruturantes é a identificação das letras, do som e da grafia das palavras que, no reconhecimento do significado delas, servem de elementos fundamentais nos processos de alfabetização. Antes denominada de terapia da palavra, atualmente as correntes mais avançadas da Fonoaudiologia dão preferência ao uso da denominação Terapia de Linguagem. Os estudiosos desta área entendem que o conceito de terapia da palavra, da forma como estava sendo aplicado, precisaria de uma reformulação. Um dos argumentos citados aponta para a tendência de uma prática profissional limitada de somente ensinar a criança a dizer algumas palavras e usar as palavras em resposta a determinados estímulos. A Terapia de Linguagem ultrapassa tal pretensão, não refuta por completo a terapia da palavra, contudo insere-lhe a compreensão do amplo conhecimento de todo o processo de aquisição e desenvolvimento da linguagem, é tão necessária quanto às demais intervenções, pelo motivo da gravidade na deficiência de comunicação da criança autista. Uma das finalidades principais dela é desenvolver o processo de formação da linguagem em uma direção de experiências pragmáticas. Não é um processo apenas de correção, esta linha de terapia propõe ajudar o autista a organizar e estruturar a linguagem. A questão básica no atendimento das alterações de uma linguagem desorganizada não se resume somente a corrigir e ensinar palavras, a ênfase está em despertar a criança para pronunciar palavras, relacionando-as ao objeto: bola para bola, casa para casa, talheres na mesa que quer dizer uso nas refeições, isto significa ensinar a associar. A criança autista pode até dizer “asa” para “casa”, mas o que vale é aprender a falar, relacionando o nome à representação concreta, ou seja, assimilar o objeto em si motiva o autista ao desenvolvimento funcional. Os estudos na intervenção terapêutica em linguagem, na última década, revelam, segundo Fernanda Dreux (et al.), que a intervenção na comunicação é um recurso essencial na inclusão educacional de crianças com distúrbios abrangentes do desenvolvimento, visto a grande dificuldade encontrada por educadores em manter relacionamentos de comunicação. Com base nestas pesquisas, reuniu-se aqui, os principais pontos de vista identificados nos trabalhos dos teóricos: • o progresso da criança se faz em um contexto de flexibilidade do uso dos meios comunicativos. Métodos mais disciplinadores de trabalho e organização do ambiente, métodos comportamentais que introduzem habilidades que a criança não possui, reforçando-as positivamente, sistemas de estimulação das habilidades de comunicação por meio da troca de figuras. O direcionamento dado no tratamento depende do funcionamento orgânico de cada autista e da evolução dos sintomas; • aquisição de habilidades comunicativas flexíveis e uso social e pragmático da linguagem apreendida são objetivos imprescindíveis na elaboração do programa de atendimento; • melhoria na qualidade de vida das crianças e suas famílias. A participação da família contribui para a continuidade e a avaliação mais efetiva dos trabalhos de intervenção; • a criação de situações que reforçam as habilidades de atenção compartilhada e de jogo compartilhado. Dinâmicas lúdicas para despertar atenção e o interesse pelas pessoas mostram- se benéficas na mudança positiva do comportamento autístico; • estimulação do desempenho sociocognitivo. Interação pragmática, aprender o objeto e sua aplicabilidade, combinado às tarefas em nível de domínio cognitivo (atenção, memorização, sequência, diferenças); • observar e motivar tendências de bom desempenho, delineando qual área (cognitiva, motora, sensorial, linguagem) encontra-se menos ou mais afetada; • aplicação de programas terapêuticos desde a infância até a vida adulta, logo após diagnóstico preciso, favorece um perfil social mais adaptado; • uso de brinquedos, atividades lúdicas, esportivas e construtivas (oficinas), em um ambiente ativo de interação; • presença de resultados eficazes na produção de situações de superação e resolução de problemas no processo de terapia de linguagem, auxiliado por atividades dialógicas com reduzido grupo de crianças; • Fernandes (2004) sugere um mediador adulto participando das oficinas de linguagem. Nestas oficinas, são realizadas atividades de interação verbal e não verbal em pequenos grupos. Uma das ideias é valorizar o grupo, vendo-o como centro das intenções do terapeuta. Alexander e Wolfe (apud FERNANDES, 2004) trazem o seguinte argumento: “O fato de se saber que essas crianças têm dificuldades em lidar com mudanças no ambiente não deve conduzir à rigidez ambiental, pois isso ampliaria a interferência dessa dificuldade”. Tive a impressão, após interpretar o conteúdo das ideias desta linha de terapia, que o cerne de suas propostas tende a contestar, em parte, o Método de Intervenção TEACCH (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Deficits Relacionados com a Comunicação). Analisar continuamente as particularidades evolutivas do comportamento de pessoas do Espectro Autístico no espaço de práticas, a fim de inserir trabalhos mais dinâmicos, observando a heterogeneidade dos desvios comportamentais e, caso seja necessário, redimensionar os elementos estruturantes (conteúdos, objetivos, métodos, técnicas) dos planos de aulas, parece obedecer à lógica de um procedimento válido. Vejamos a experiência. Se, em um dia, o aluno pega um giz de cera verde para rabiscar a folha, em outro dia, damos a ele três, quatro, cinco gizes de cera azul, vermelho, roxo dispersos sobre a mesa, ou colocados debaixo de um copo transparente. Cria- se um espaço de incentivos diversificados, e a equipe avalia reações anormais e constrói estratégias mais convenientes àquele aluno. Proporcione, pelo menos, em alguma situação as iniciativas do aluno autista, motivar o proceder autônomo o induz a sentir-se capaz de atingir um objetivo, superandoobstáculos com suas capacidades. A Psicoterapia traz em si um universo de procedimentos cientificamente aceitos, que consolidam-se nas diversificadas ideias enunciadas nas teorias. Tais ideias expressarão ao longo da existência humana o interesse do homem em conhecer e controlar a fértil, fascinante e paradoxal vida interior. É difícil escrever algo sobre Psicoterapia sem sequer citar as grandes concepções de investigação desta área, que vão desde a Psicanálise de Sigmund Freud e Carl Gustav Jung, passando pelo Behaviorismo clássico de John Broadus Watson e pelo célebre behaviorista norte- americano Burrhus Frederic Skinner, até a Gestalt-terapia dos Perls, todos buscando desvelar os mistérios da mente humana, seja na direção subjetiva do inconsciente, seja na direção do categórico objetivismo behaviorista ou na crença gestáltica da exteriorização da genuína potência humana, que, reprimida por padrões de condutas desejadas pela sociedade, cede lugar a um tipo de ethos humano artificial. Pouco a pouco, surge no ser humano uma crosta ou couraça que anestesia a essência autêntica do Ser, fazendo-nos exteriorizar personalidades fictícias e de voláteis aparências. Com tal conduta, o homem vive fantasias em um estado de pseudofelicidade. Bom, voltemos ao estudo do autêntico modo de ser autístico. Apesar das contestações, a Psicoterapia pode beneficiar a criança autista. Agora, há de se examinar qual técnica, dentre as várias existentes na Psicoterapia, ajudará a criança atendida, pois a aplicação de uma delas depende da avaliação das diferenças clínicas de cada caso estudado, sendo necessário apreciar o grau de retardo das funções cognitivas, o nível de desenvolvimento, a capacidade da fala, a capacidade da comunicação expressiva, receptiva e funcional. Crianças autistas possuindo elevado grau de comprometimento das funções cognitivas e da capacidade de comunicação expressivo-receptiva, muito provavelmente, não se beneficiarão com a intervenção de recursos da ludoterapia, tenderão a apresentar alguns resultados positivos com as técnicas da teoria comportamentalista. Inspirados nas ideias da dialógica psicoterapêutica para construção e composição das relações com outros sujeitos históricos e sociais, a partir das vivências nestes cenários existenciais onde são necessárias experiências compartilhadas, o aprendizado servirá de força propulsora na elaboração de contribuições que trabalhos iguais a este atuam como facilitadores para outras experiências pedagógicas. Cito Martin Buber para complementar minha crença no potencial humano solidário. Quando, seguindo nosso caminho, encontramos um homem que, seguindo o seu caminho, vem ao nosso encontro, temos conhecimento somente de nossa parte do caminho, e não da sua, pois esta nós vivenciamos somente no encontro. (BUBER, 1979, p.88) Realmente, eu me realizo com o outro, que se faz em mim pela convergência de desejos, conjugados em um determinado espaço de circunstâncias. Descreverei, sob o formato de conversação, as questões partilhadas nos encontros com duas pessoas, uma delas mãe de um autista. – Diga-me: Quais as principais abordagens psicoterápicas aplicadas no atendimento do portador de Distúrbios Abrangentes do Desenvolvimento no contexto atual? – (Eliana Lima – psicóloga) Faço menção a José Raimundo Facion, a fim de justificar que, segundo este autor, “o trabalho interdisciplinar de forma integrada se faz sempre necessário. Os profissionais devem usar procedimentos e técnicas em comum, discutindo com os pais sobre as necessidades da criança e sobre o que ela consegue entender e executar. Para isso sugere-se um profissional de apoio, com o objetivo de organizar e orientar o tratamento, assim como, analisar a evolução do quadro do paciente” (FACION, p.62). Destaco a Terapia Comportamental. Incluímos sob o nome Terapia Comportamental qualquer uma das várias técnicas específicas que utilizam princípios de aprendizado para adquirir, mudar ou transformar o comportamento humano. – Adentrando nas questões práticas, comente sobre os métodos utilizados para o diagnóstico e o atendimento da criança ou do adolescente. – (Rivalina Macêdo – psicóloga especialista e mãe de um adolescente autista) Avaliar a capacidade auditiva, realizar exames do tipo eletroencefalograma, imagens por tomografia computadorizada e por ressonância magnética. Avaliar a criança em termos de seu desenvolvimento, de modo que se identifique como se apresentam suas habilidades emocionais, sociais, cognitivas e comunicativas por meio da observação direta da criança no seu ambiente natural – em casa, na escola –, realização de entrevistas com os pais, os professores ou outros responsáveis. Podem-se utilizar instrumentos padronizados para fins de avaliação, como SAB-2 (aplicado antes de dois anos de idade), IBSE (de 6 a 48 meses), CHAT (18 meses a 36 meses), CARS (indivíduos de todas as idades) e ADI-R (usado a partir dos 18 meses). A partir dessas informações, será possível estabelecer metas e objetivos, necessários e adequados para o atendimento. – Pergunto agora: Quais as perspectivas sobre os prognósticos? – (Eliana Lima) Se o tratamento utilizar abordagens estruturadas, planejadas e comprovadas cientificamente, as perspectivas serão positivas. – Diante da sua experiência, que comportamentos autísticos podem ser modificados durante os períodos de intervenção? – (Eliana Lima) Melhoram no relacionamento com outras pessoas e nas situações (referência ao isolacionismo), surgimento e manutenção de contato visual, minimização de conduta autoagressiva, redução da repetição de movimentos e atividades (estereotipias). – Finalizando esse fecundo encontro, pergunto: Qual sua opinião a respeito da educação especial no âmbito das discussões de inclusão social? – (Eliana Lima) Positiva. Acredito que a inclusão social é possível, mas, como todo processo de mudança, é passível de sofrer oscilações, nem sempre com resultados desejados, contudo, estas oscilações atuam como pontos fortalecedores e questionadores, ocorrendo aprendizagem nas partes envolvidas. Definimos como responsabilidade ética toda atitude daquele que lida com pacientes inclusos no Espectro Autístico, que busca diligentemente averiguar as causas associadas aos sintomas dos distúrbios, avaliando a Psicopatologia da pessoa e a extensão da toxidade da droga no organismo. A sinceridade na relação do profissional com os pais ou os responsáveis, explicando por meio de palavras acessíveis a necessidade do uso de algum medicamento, suas particularidades e possíveis efeitos, com a devida cautela, levando em consideração condições emocionais e culturais, ainda é o caminho viável para evitar reações temerosas motivadas pelo desconhecimento. O tratamento farmacológico é administrado em casos especiais e por períodos não muito longos e objetiva diminuir comportamentos mal adaptativos (crises de agitação, agressividade, comportamento autodestrutivo), com o propósito de proteger a integridade física do paciente, ajudando-o a permanecer em uma condição de saúde que lhe permita progredir nas outras propostas terapêuticas. A Academia Americana de Psiquiatria notifica oficialmente, em 1979, que as drogas neurolépticas (conhecidas como antipsicóticos) não têm influência favorável na pessoa portadora de retardo mental e raramente ajuda o autista. A indicação dessa droga bastante tóxica do ponto de vista farmacológico é para o tratamento de esquizofrênicos. Um dos problemas das drogas neurolépticas está na redução das capacidades mnêmicas e de aprendizagem, no entanto estudos provam que o efeito de embotamento cognitivo tem origem nas dosagens administradas em níveis desproporcionais. Nestas pesquisas, houve a comprovação de que, em certos pacientes autistas e sob condições muito particulares, há melhoras na aprendizagem porque diminuem os sintomas, como hiperatividade, inquietação, irritabilidade, afeto instável e estereotipias.Segundo a opinião do pesquisador Carl King, professor de farmacologia, da Universidade de Tulane, recomenda-se usar neurolépticos em uma duração média de dois a três meses no máximo, em casos muito bem selecionados. Os principais efeitos colaterais das drogas neurolépticas são: disforia e sensação de mal-estar; depressão; sedação profunda; discinesia tardia, reação que pode demorar a desaparecer e consiste em movimentos involuntários, distúrbios psíquicos refletidos na motilidade, na contração de músculos, nos tremores de mãos e em uma sensação difusa de querer saltar para fora do próprio corpo. O caso que descreveremos é resultado das experiências educacionais vividas nos encontros com dois autistas adultos, porém jovens, em um período de dois anos e meio, alunos da Associação Pestalozzi da Paraíba, uma escola de educação especial, entidade filantrópica, considerada de utilidade pública pela Lei Municipal n.º 2.256, de 17 de fevereiro de 1978, e pela Lei Estadual de n.º 4.074/79, registrada na vara privativa da infância e da juventude, em 29 de novembro de 1991, e no conselho Nacional de Serviço Social, sob n.º 167/97, campo de obtenção de dados e desenvolvimento sistematizado de estudos sobre a Psicopatologia autística, onde também ocorreram às intervenções fundamentadas em certos princípios behavioristas e gestálticos, aplicados por meio das atividades de natureza psicopedagógica, orientadas à estimulação cognitiva, psicomotora, sensorial e afetiva, sendo criteriosamente planejadas conforme as características clínicas (laudo médico analisado), as limitações e as potencialidades individuais, específicas a cada ser humano, sempre objetivando ajudar o educando autista a expressar suas capacidades, potencializando, por meio dos recursos lúdico- pedagógicos, os caminhos de aprendizagem pelos quais o aluno, em algum instante imprevisto, demonstrará que quer e pode se comunicar com a realidade na qual está inserido, seja por gestos, sons ou movimentos corporais, o que significa a resposta para continuar estimulando e reforçando as habilidades cognitivistas e sociointeracionistas, na busca da melhora dos problemas comportamentais relacionados aos distúrbios da síndrome do Autismo. A despeito de a pesquisa ter focalizado dois autistas, apresentaremos somente o estudo daquele com um quadro de características mais intensas, para que tenhamos conhecimento de maior abrangência acerca das manifestações sintomáticas de um autista clássico, bem como dos efeitos da terapia educacional em um comportamento autístico de considerável comprometimento. Por questões éticas, faremos alusão ao autista citando as iniciais do seu nome e sobrenome. G. de O. L. nasceu de parto cesariano em 8 de maio de 1987. A mãe conta que não ouviu o choro do bebê e, ainda, relata sérias complicações de ordem física e psicológica que a envolveu durante o pré-natal. No oitavo mês de gravidez, sente intensas dores, e o bebê deixa de mexer, fato que preocupa a mãe, fazendo-a procurar orientação médica. O médico que a atendeu reconhece ser uma situação atípica, recomendando-lhe fazer exercícios de estimulação. A mãe menciona acontecimentos marcantes. Entre o terceiro e o quarto mês de gestação, discute violentamente com o marido, sendo agredida fisicamente. Ela diz que o período pré-natal foi caracterizado por perturbações emocionais e carência alimentar. Segundo o laudo médico expedido em 16 de maio de 1995, sob a responsabilidade da Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência (FUNAD), G. de O. L. foi avaliado pela equipe multidisciplinar desta fundação, concluindo que o mesmo é portador de Deficiência Mental e Autismo, necessitando acompanhamento especializado de reabilitação. Após o diagnóstico, os pais recebem orientação de apoio para encaminhamento e, por razões de conveniência, a família decide matricular G. de O. L. na Associação Pestalozzi, escola de educação especial, próxima ao local em que reside. Na instituição Pestalozzi, a equipe de profissionais avalia o paciente, entrevista os pais com a finalidade de conhecer a estrutura familiar, no tocante aos aspectos sociais, econômicos e afetivos, além do modo de vida diário do autista. Tal procedimento possibilita a construção de um planejamento educacional de acordo com as reais necessidades do aluno. Consta no histórico do aluno G. de O. L. um conjunto variado de acentuadas alterações comportamentais, principalmente nos primeiros períodos do atendimento: Isolacionismo; apatia (mesmo permanecendo perto das pessoas, mantém ausência de ação expressiva); resistência à participação nas atividades (birra, enrijecimento do corpo, ficando temporariamente estático); reações agressivas (empurrou a professora uma única vez durante a aula); comportamento repetitivo, ritualístico (passa um objeto entre os dedos da mão, põe a cadeira mais de uma vez em uma mesma posição); insistente desejo por água; risos aparentemente sem motivos; só um registro de fuga repentina correndo pelo pátio da escola; emite sons com frequência irregular; abre a boca e parece dizer a vogal “a”; atende por comunicação gestual aos pedidos simples, tipo: pare, venha, pegue; leve agitação psicomotora durante as estimulações; defasagem na coordenação motora fina e ampla (equilíbrio); interesse por partes da roupa ou do corpo daquele que se aproxima dele; relaciona-se com os objetos cheirando-os e levando-os à boca; traços fisionômicos diferentes (caretas); movimento oscilatório do corpo; gira bruscamente a cabeça; com frequência, pressiona o ouvido com o polegar; evita contato visual direto; prefere olhar as pessoas de lado; esquiva-se no contato com o corpo de outra pessoa. De acordo com informações da família, registradas nos documentos de controle individual do aluno, o mesmo, ao ingressar na escola em 2 de fevereiro do ano de 2000, encontrava- se sob o uso dos medicamentos Diazepan e Ampliquitil. O encontro com G. de O. L. aconteceu em novembro do ano de 2003. Fora dito que este jovem, na época com 15 anos de idade, tinha interesse por água: abria a torneira e punha as mãos na água, o que causava nele risos. Passamos então a observar o modo como esse adolescente se relacionava com as coisas à sua volta. Dia após dia, a lógica dos acontecimentos confirmara que o caminho seria descobrir nele o ponto de partida para começar a organizar os trabalhos de intervenção. Outra referência articulada aos fatos examinados com bastante atenção dizia respeito à consolidação da certeza de que a primeira iniciativa de interação, utilizando o recurso da água, seria o meio mais viável para estabelecer um vínculo, afinal, o querer participar de atividades com água estava partindo da vontade emanada de sua vida interior e não apenas de modelos prontos padronizados. Vale lembrar que eu, ainda, não tinha a resposta dessa conjectura, contudo, acredito na potência realizadora atemporal do ser autista, creio na vivência do possível e da superação. Mesmo assim, buscamos validar com mais precisão a referida intuição racional, indagando ao renomado psiquiatra infantil Genário Alves se uma fixação autística pode indicar um canal de comunicação, facilitando o desenvolvimento da ideia de construir atividades pedagógicas. Em uma entrevista realizada no dia 4 de agosto do ano de 2003, gravada em fita k-7, ele respondeu que o fato de o autista expressar certa afeição pela água pode ser o começo para estimular a própria afetividade a partir desse contato com a água e o terapeuta. Ainda disse: “Nós temos de identificar meios, mecanismos pelos quais permitam chegar até essas pessoas, tendo de valorizar aquilo que o autista apresenta, então é correto explorar por meio dessa fixação uma relação com a criança ou o adolescente, tentando conhecê-la em todos os aspectos”. Durante semanas (dois dias em cada), explorou-se o uso do elemento água devido às respostas positivas de interação. Realizamos práticas simplesdo tipo encher uma garrafa de plástico e chocalhar a água dentro da garrafa. Repetia a tarefa, pondo menor quantidade de líquido e colorindo-o e, com isso, eu provoquei uma mudança na situação, trabalhando a percepção de cor, peso da garrafa, movimento dos braços, além da percepção auditiva ao ouvir o som do balançar da água no recipiente fechado. Enchia a garrafa, colocando-a perto dele. Utilizamos a comunicação gestual, apontando para o objeto. Às vezes, demorava a responder, mas tornava a direcionar a mão pegando a garrafa. Também fazíamos questão de que ele entregasse a garrafa em múltiplas direções (direta, esquerda, no alto, em baixo). Em outros momentos, G. de O. L. movia-se ora para molhar as mãos debaixo da torneira, ora para apertar bolas de sopro cheias d’água. Com a continuidade, começamos a exercer sucessivas práticas, visto que percebera a importância de produzir um espaço rico em estímulos. De certo que as intervenções por meio deste conjunto de experiências pedagógicas não podiam acontecer aleatoriamente, então organizo um planejamento de trabalho, especificando a sequência das tarefas para os respectivos dias, tempo de duração, objetivo a alcançar com o aluno, procedimentos, material utilizado e, ainda, resultados observados em cada área estimulada. Agrupou-se, a seguir, uma exposição detalhada, referente à composição estrutural das práticas registradas nestes roteiros de atividades, ilustrando com fotos que nos daria a visualização dos brinquedos, os trabalhos realizados e a forma como os alunos interagem com os materiais. Exercícios Aplicados em Nível de Cognição Os objetivos traçados para aquela aula consistiam na estimulação da coordenação olho-mão e da coordenação motora fina, por meio do encaixe das peças de plástico. Nesta atividade lúdica, os autistas são incentivados a construírem formas com peças de encaixe do brinquedo Lego. A princípio, faço uso de peças pintadas com uma única cor. Dando continuidade ao exercício lúdico, outras peças de cor oposta à cor inicial são colocadas sobre toda a área da mesa, propiciando ao aluno um ambiente diversificado de situações e alternativas. G. de O. L. necessita de apoio direto quando se trata de começar a interagir com as peças do brinquedo, também não impõe continuidade ao ritmo da atividade na qual se envolve, todavia, mesmo diante dos impedimentos, consegue concretizar parte das tarefas sem ajuda. Agora são entregues folhas de papel ofício em branco e lápis de cera de várias cores. Todas as folhas são pintadas. Depois, sem o auxílio de tesoura, usando a força das mãos e a movimentação dos punhos, o aluno rasga as folhas, colando os recortes das formas dos papéis rasgados nos espaços da cartolina. Novamente, é preciso ajudar G. de O. L., segurando sua mão para melhor apoio do lápis entre os dedos para inicialização dos rabiscos, para rasgar as folhas e para colar os pedaços na cartolina. Ora compreende que é para riscar a folha em branco, ora mostra-se apático, insiste em fazer círculos justapostos. Os objetivos contemplados buscam motivar o educando a perceber os limites de uma superfície plana, impulsionar a exteriorização de potencialidades estéticas, além de fortalecer o vínculo interpessoal nas relações entre ensino e aprendizagem. Utilizou-se nestas atividades peças plásticas rígidas de encaixe, lápis de cera, cola bastão não tóxica lavável, cartolina, folhas de papel ofício. A tarefa de empilhamento tem destaque na ação sobre os materiais concretos. Após o empilhamento completo dos objetos, antes espalhados na mesa, desconstroe-se a situação, reforçando a possibilidade de refazer e recriar a partir daquilo que é aparentemente estável. A intenção é fazer com que o aluno perceba a mudança das coisas, pois o tubo verde pode ficar em uma posição naquela montagem e, em outra, o mesmo tubo pode estar embaixo, ou lá no alto, no topo da torre, mas essa posição não é eterna. É parte integrante desse trabalho o estímulo à coordenação das ações construtivas, experimentadas com certa lógica de arrumação, sequência de formação e distância. Observamos em G. de O. L. a fixação em um único alvo de trabalho; a dificuldade em distribuir as quantidades de peças por cada torre levantada, para evitar o excesso e a consequente queda, o que mostra a presença de um deficit na organização lógica das ações; que os ruídos despertam grande interesse nele; que gosta de produzir sons, barulhos; e que bate objetos na mesa ou contra outros objetos. Respondeu muito bem aos comandos de comunicação, pois eles facilitaram a execução do encadeamento das ações para conclusão da atividade, sendo um dos principais objetivos gerar mecanismos que permitissem a comunicação expressivo-receptiva por comandos curtos, como pare, siga, em cima, tirar, reforçados gestualmente. O indicado nesta tarefa é sentar olhando de frente, posição do rosto na mesma altura do aluno. Outro recurso necessário ao atendimento tem por fim oferecer ao aluno um intervalo de descanso entre as atividades, você pode colocar uma música suave e deitar-se ao lado dele. Aqui o trabalho lúdico motiva o educando a pôr e retirar formas geométricas, que serão encaixadas nos espaços de uma folha de madeira vazada com corte idêntico às peças geométricas. Os objetos foram entregues em ordem crescente, facilmente dispostos perto do aluno, depois dificultou-se (criação de situações- problema), pondo uma ou mais peças na parte de baixo da mesa, por exemplo. Mais uma vez, enfatizou-se o ato de interagir com o concreto, até porque, a função simbólica é uma aptidão seriamente comprometida na síndrome do Autismo. G. de O. L. evidencia dificuldade em compreender as orientações, prefere iniciar o encaixe sem seguir instruções e, de repente, interrompe a atividade, necessitando de ajuda para dar continuidade e conclusão, muito embora, é na atividade de encaixe, enfileiramento, empilhamento que ele demonstra desempenho com maior número de êxito. Exercícios Aplicados em Nível de Psicomotricidade Objetivos Esperados: motivar a percepção corporal, a relação entre corpo e espaço, trabalhar a coordenação global, estimulando o equilíbrio, a orientação do corpo e o fortalecimento da musculatura ampla. A atividade psicomotora é caracterizada pelo uso de uma corda flexível disposta no solo, formando linhas paralelas, compreendendo entre uma volta e outra um espaçamento próximo aos 30cm. A primeira etapa trabalhará com as linhas no sentido horizontal; na segunda etapa, monta-se um conjunto de linhas no sentido vertical. O aluno é incentivado a movimentar-se sem tocar nas linhas, ele deve, passo a passo, pisar na área demarcada pelas voltas da corda. As primeiras repetições constam de exercícios orientados e, em seguida, tenta-se provocar repostas autônomas. O trabalho segue uma série de repetições com pausa para relaxamento, entretanto considere tal sequência como referencial. Respeitar as limitações orgânicas é fundamental para uma harmoniosa evolução. G. de O. L. se mostra participativo, atendendo aos pedidos, mas, ainda assim, apresenta leves tremores musculares, comprometimento significativo quanto ao equilíbrio do corpo, gira a cabeça, demonstra instabilidade do olhar, presença de estereotipias, respostas com ritmo de marcha alterado. Deve-se dispor determinado número de arcos de plásticos (bambolês), organizados de modo que todos fiquem enfileirados. Prossegue-se motivando o aluno a repetir os movimentos do professor, que consistem em pular cada bambolê – dois pés juntos, pé direto sem o pé esquerdo, tocar no chão, depois inverte. A princípio, as atividades são livres, podendo acrescentar mais recursos de estimulação, a exemplo de o aluno pular segurando um bastão ou uma bola. Lembre-se de que é indispensável aplicar este ou aquele procedimento, obedecendo às particularidades próprias da pessoa autista. O ritmo e a complexidade do conjunto de atividades são graduais, dependem dasrespostas do comportamento individual analisadas detalhadamente. Não se esqueça do tempo de descanso entre os exercícios. A atividade também prevê que os arcos sejam ordenados em outras direções ao final das sequências de trabalho. Os bambolês devem estar dispostos da esquerda para a direita e, inversamente, em posição diagonal, utilizando os quatro cantos da sala. A meta pretendida a favor do aluno combina diferentes aspectos: fortalecimento da expressão corporal, promover o deslocamento do corpo em múltiplas direções (lateralidade e direcionalidade), favorecer o ordenamento das ações e estimular o equilíbrio do corpo. Os resultados observados em G. de O. L., ainda que inconstantes, foram a presença de movimentos desordenados: pisa nos bambolês e, em determinados momentos, direciona os passos para dentro do círculo com o pé direito reto, formando um ângulo próximo de 90º, enquanto o pé esquerdo fica em uma posição oposta, aproximadamente 130º; em outros momentos, sequer consegue coordenar o posicionamento do corpo dentro e fora do círculo. Necessita de intervenção direta para ordenar seus movimentos, mas o apoio não é contínuo. Há evidência de defasagens na atenção e no equilíbrio do corpo. Ele conclui as tarefas, respondendo com positividade ao chamado pelas instruções: pare, vem, dentro, fora. Foram utilizados materiais concretos geométricos (cubos, quadrados, retângulos, triângulos) de superfície lisa, colocando-os na mesa, ou fazendo com que a pessoa autista segure um a um separadamente. Ao trabalhar com o cubo, põe-se na mão dele e o ajuda a apertar o objeto, fechando sua mão. O procedimento é idêntico para a manipulação dos demais objetos. As respostas são avaliadas. Se for conveniente, o grau de complexidade será aumentado, entregando-lhe os objetos de dois em dois, simultaneamente. Após a série de repetições com cada material, não se esquecendo do necessário tempo de intervalo, vem a etapa posterior, referente à organização das peças geométricas em uma caixa de isopor. Nessa fase, o autista é estimulado a arrumar tais peças dentro da caixa, cuja área interna possui relevo irregular, assim o aluno é induzido a executar ações de maior domínio sobre as representações concretas. Isto implica distribuir e organizar os objetos, adequando-os às características físicas do local apresentado (ênfase no conhecimento lógico), trabalhando, desse modo, o binômio psiquismo-movimento versus movimento- psiquismo. Ao proporcionar essas práticas espera-se contribuir para o incentivo ao desenvolvimento da psicomotricidade fina, a redução do isolamento autístico, além do estímulo à percepção por meio da manipulação de objetos com formas variadas. Os resultados vistos expõem, de início, certa resistência à interação, pois o problema está na dificuldade em compreender as informações. Apesar disso, envolve-se no trabalho pedagógico, mantendo contato com a realidade sentida, agindo sobre os objetos projetados no ambiente social. Devem ser trabalhados os movimentos cinestésicos longitudinais e circulares, dando-lhe a oportunidade de assimilar a noção de limite em uma área de trabalho. O professor deverá ensiná-lo a rabiscar garatujas apenas no espaço das folhas, gerar um campo dinâmico de impressões, com o propósito de estimular os sentidos e a atividade mental e fazer com que o educando desenvolva um maior controle sobre o movimento do braço, a rotação do punho, o domínio de preensão de objetos entre os dedos e, por meio disso, haverá um favorecimento à maturação psicomotora em relação à linha imaginária que divide o corpo em duas partes simétricas (lei próximo-distal). Aqui o enfoque principal se baseia em conduzir a expressividade livre dos conhecimentos já adquiridos. O professor atua na função de mediador, conduzindo a prática até a efetivação dos objetivos lançados no plano de aula, porém aguarda as reações construtivas do aluno, diante das fontes geradoras de estímulos. Novamente, o que se deseja é ver a materialização de componentes relacionais inclusos no conceito do desenvolvimento psicomotor. Conforme afirmam Palácios e Mora (1995), tais componentes caracterizam “o fato de que por meio do movimento e das ações, o indivíduo entra em contato com pessoas e objetos”. Ora, atingindo este comportamento pretendido na intervenção, fica evidente a contribuição dada à redução dos problemas de distanciamento relacional, típicos na síndrome do Autismo, contando, ainda, com a aceitação ou uma maior tolerância por parte do autista às mudanças no ambiente. G. de O. L. responde às expectativas, rabisca traços e círculos, escolhe o giz de cera espontaneamente, dirige o olhar aos movimentos quando risca as folhas. Até então, são notados risos desconexos, discreta agitação motora, com movimentos estereotipados da cabeça e balanços do corpo. Até a finalização dessa pesquisa, considerando o diálogo com os pais e a convivência junto a G. de O. L., o mesmo não toma nenhuma medicação, participa de rotinas de trabalho, ajudando sua mãe a enxugar talheres, varre alguns cômodos da casa, põe a comida no seu prato, acompanha o padrasto nos momentos de lazer. Nem todas as solicitações feitas têm respostas, pois permanece o mutismo, emite sons parecidos com “a”, “ba”, “au au”, “hum”, existe risos inesperados sem sentido, tem apego a detalhes da roupa ou do corpo, leva os objetos à boca, possui algumas reações de resistência a alterações em objetos da casa, que insiste em colocá-los no mesmo local. As proposições deste estudo objetivaram potencializar a socialização do ser humano autista, desenvolvendo atividades psicopedagógicas de estimulação às capacidades cognitiva, psicomotora, sensorial e afetiva realizadas no espaço escolar e familiar, modificando o comportamento autístico para uma conduta mais autônoma, adaptada ao convívio na sociedade. A pesquisa também buscou conhecer as realidades da Psicopatologia e as realidades da vida do portador da síndrome, a partir da observação do comportamento de autistas, em mais de uma escola de educação especial, visitas às famílias com registro de informações, aplicação de enquetes e questionários aos professores e aos profissionais das áreas que convergem ao tema abordado. Como todo ser humano, o autista também pode ser sociável, embora apresente dificuldades de comunicação. As pessoas necessitam de motivação, porém os autistas respondem a ela positivamente quando interagem durante as atividades de estimulação. As repostas à atividade educacional progridem e regridem, variando e movimentando a qualidade e o ritmo da aprendizagem, principalmente quando o autista, se afasta por certo período, do ambiente que o motiva, daí a importância da continuidade do atendimento e da estimulação. Neste aspecto em particular, a colaboração da família é fundamental. Pelos estudos e pelas pesquisas ora realizadas, salientamos que o que a pessoa autista precisa é de um espaço de estímulos planejados individualmente, executados individual ou coletivamente, construído em uma concepção metodológica flexível, com traços cognitivistas e sociointeracionistas cuja tônica, antes de qualquer nomenclatura, seja o progresso do aluno, o respeito às suas diferenças e aos ritmos de desenvolvimento, sobretudo considerando seus contextos sociofamiliares e culturais, antes de rotulá-los com algum termo. Pretender estudar o Autismo é uma posição pedagógica e acadêmica que traz consigo a necessidade do desenvolvimento de uma atitude de investigação, de estímulo a continuar pesquisando, analisando, discutindo com outros estudiosos, pois muito ainda precisa ser descoberto sobre esta síndrome, uma vez que pouco ainda se sabe. É um trabalho repleto de possibilidades, e encontra-se um vasto campo de argumentações, hipóteses e metodologias, que constituem as correntes de estudiosos e pesquisadores ligados a diferentes escolas: francesas, inglesa e norte-americana, com concepções e proposiçõesque, em alguns momentos, divergem e, em outros momentos, se aproximam. A formação mais sólida, nas questões que atravessam o tema, depende da busca pelo diálogo interdisciplinar, com profissionais da Psiquiatria, Neurologia, Pediatria, Fonoaudiologia, Fisioterapia, Psicologia, Pedagogia, que tenham experiência e conhecimento específico, por meio de estudos, pesquisas, entrevistas, análise de casos, observação de comportamentos dos autistas na sala de aula e na vivência do contexto familiar. O conhecimento dos relatos da família, desde os estágios do desenvolvimento das crianças até as questões de aquisição de hábitos, habilidades, atitudes, fixações, manias ou quaisquer outras informações, constitui uma fonte ilustrativa de troca de experiências e referências para o planejamento das possíveis atividades pedagógicas e educacionais que podem ser desenvolvidas com eles. Depois de vivenciar e analisar a realidade do campo de pesquisa, constatamos que é importante para o progresso pessoal e social dos autistas, visando à sua inclusão socioeducacional, a participação dos pais, dos professores e daqueles que estudam e lidam com a temática, em grupos interessados, para possibilitar a troca de experiências e as reflexões das concepções das Psicopatologias inseridas nesta categoria de classificação, a noção de conceito, diagnósticos, etiologias, prognósticos, formas de atender e elaborar atividades de estimulação, ajudando a criança no próprio espaço familiar. Aprofundar o conhecimento das teorias psicológicas que fundamentam os métodos de intervenção propostos, questionar os paradigmas educacionais que influenciam a formação do professor, o que ele, cidadão construtor da história da educação, pensa sobre a educação especial, sua opinião nas questões das políticas curriculares e de inclusão faz parte da necessária articulação entre a família e a escola destas crianças. Outro aspecto importante é discutir com todos os segmentos sociais as políticas de atendimento, refletindo com os pares, se são apenas discursos ou constituem uma possibilidade de execução prática, de reconhecimento de direitos sociais por meio de uma política participativa. Estas reflexões certamente propiciarão aos grupos participantes a formação de uma consciência crítica. Desenvolver trabalhos pedagógicos direcionados às crianças e aos adolescentes portadores da síndrome do Autismo é aparentemente desafiador, mas, quando cada acontecimento se transforma em possibilidade tão real e envolvente, a sensação é de que as etapas estão sendo vencidas. A própria convivência motivada por atos construídos sobre bons sentimentos faz nascer uma genuína sensibilidade capaz de aguçar os sentidos à percepção daquele pedido tímido, às vezes, pronunciado por palavras ou gestos e, na ausência destes, expressado no olhar, ora discreto, ora tão profundo que nos impressiona. São essas realizações e a relação constante, fazendo-nos com o outro, que alimentam a disposição para doar um pouco de atenção àquela participação em uma brincadeira, quem sabe a paciência na medida certa naquele único instante, onde muitos chegam cheios de vontade, mostrando um objeto de uso pessoal ou algo que signifique para eles um elo com o mundo. No decorrer deste estudo, percebeu-se quanto é importante manter os autistas e as pessoas portadoras de outras síndromes sob um ambiente rico em estímulos, participando ativamente das situações familiares. Porém, para que isso ocorra conscientemente, os membros da família precisam conhecer seus filhos, devem ir a palestras, cursos de formação, se comunicar com outras famílias, com o objetivo de partilhar experiências e aprender diferentes maneiras de ajudar seus filhos. Evitem isolar a pessoa portadora de algum tipo de deficiência, tampouco se isolem com vergonha do mundo. Apareçam, criem organizações, formando grupos de estudo para conversar, ampliar conhecimentos e reivindicar direitos por meio de discussões políticas. O Autismo é um grave distúrbio do desenvolvimento, e tal verdade não pode ser omitida, mas não precisa ser agregada com tabus e preconceitos. A terapia ambiental ou pedagógica associada às intervenções terapêuticas de profissionais da Fonoaudiologia, da Fisioterapia, da Psicologia, da Psiquiatria e da Neurologia favorece a diminuição dos problemas e aumenta a socialização. A criança, o adolescente e o adulto autista aprendem, sim, e gostam de estar perto de pessoas que as abracem, mas o que acontece em certos casos é a dificuldade com relação à sensação tátil, devido às anormalidades neurológicas, então a aproximação deve acontecer gradualmente. Ficar perto dessas pessoas transforma-nos em seres mais humanos, quando estamos dispostos a compreendermos nós e eles. Abrace-os, ame-os. Nos primeiros contatos, talvez haja medo, vontade de se afastar, todavia reconheça esta pequenez, pois conhecendo-se fica mais fácil sobrepujar certas limitações. Sem dúvida, estes seres humanos portadores de amor poderão despertar muitos sentimentos adormecidos, dando um sentido divino ao nosso viver, mostrando-nos, por exemplo, que a essência das coisas reside na simplicidade, na humildade, na infinita riqueza de ser livre de atitudes preconceituosas. Sejamos normais o suficiente para assumir que somos humanos, gostamos de brincar, herdamos a riqueza da bondade, do amor solidário que existe na vida interior de cada pessoa desde o instante da concepção. Devemos resistir às influências que matam o ser humano em vida, apesar de sermos constantemente motivados, instigados a gostar muito mais daquilo que nos é conveniente ou adequado às regras de uma sociedade consumista, competitiva, egocêntrica, orientada pelo ideal de um hegemônico padrão de beleza ou de riqueza. É preciso compreender que a verdade que liberta é aquela que torna o homem livre, e a liberdade consiste na capacidade de discernir por si, reconhecendo que nada saberá se não tiver humildade para buscar em Deus a sabedoria do caminhar conforme os preceitos do amor e dos princípios de uma convivência social justa e democrática onde as diferenças não sejam motivos de discriminações e preconceitos. ALEXANDER, G. F.; SELESNICK, T. S. Contribuições de Fora da Escola Psicanalítica. In: História da Psiquiatria. 2ª ed. São Paulo: IBRASA, 1980. Cap. 17, pp. 332 – 334. AUBIN, Henry. Apresentação Clínica da Criança Psicótica. In: As psicoses da criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1976. Cap. 1, p. 23 – 52. BUBER, Martin. Eu e Tu; tradução de Newton Aquiles Von Zuben. 2ª ed. rev. São Paulo: Editora Moraes, 1979. CAMARA ZACHARIAS, Vera Lúcia. Skinner e o Behaviorismo. Centro de Referência Educacional [on-line]. Disponível em: http://www.centrorefeducacional.pro.br/skinner.htm. acessado em 01/11/06. 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Aprendizagem: Tempos e Espaço do Aprender – Fabiane Ortiz Portella e Fabiane Romano de Souza Bridi (orgs.) Aquisição da Leitura e Escrita – Mariângela Stampa Arteterapia – arquétipos e símbolos – Dulcinea da Mata Ribeiro Arteterapia – métodos, projetos e processos – Angela Philippini (org.) Arteterapia com Crianças – Vanessa Coutinho Arteterapia com Idosos – Vanessa Coutinho Arteterapia em Revista – Ângela Philippini (org.) Arteterapia: A transformação pessoal pelas imagens – Maria C. Urrutigaray Autismo e Inclusão – Eugênio Cunha Autismo, Linguagem e Educação – Sílvia E. Orrú Brincar e Viver – Projetos em Educação Infantil – Ivanise Meyer Brinquedoteca Hospitalar – org. Drauzio Viegas Ciclos em Revista 6 volumes – Andréa Rosana Fetzner (org.) Criança e a Arte, A – o dia a dia na sala de aula – Aurora Ferreira Crônicas Para Uma Nova Escola – Danilo Gandin Dificuldades de Aprendizagem em Leitura e Escrita – Geraldo Peçanha Distúrbios de Aprendizagem e de Comportamento – Lou de Olivier Educação Ambiental Consciente – Carly Machado (org.) Educação Ambiental Urbana – Vilson Carvalho Educação e Psicanálise – Jane Patrícia Haddad Fundamentos Biológicos da Educação – Marta Pires Relvas Gestão Democrática – Wendel Freire (org.) Gestão Educacional – José do Prado Martins Impressões Sonoras – Márcia Victorio Inclusão – Fátima Alves Mitologia e Vivências – Bosco Oliveira e Ingrid Oliveira Motivação no Ensino e na Aprendizagem – Fabiane Kauark e Iana Muniz Para Entender o Novo Acordo Ortográfico – Lucíola Medeiros Brasil Para Entender Psicopedagogia – João Beauclair Para Entender Síndrome de Down – Fátima Alves Psicopedagogia – Trabalhando Competências – João Beauclair Psicopedagogia e Arteterapia – Lou de Olivier Psicopedagogia Empresarial – Marília Maia Costa Quem não Cola Não Sai da Escola – José Abrantes Recrutamento e Seleção – Danielle Cocenza e Marília Maia Costa Reencantamentos – para libertar histórias – Angela Philippini Sou Professor – Trabalhando Autoestima e Motivação... – Serrano Freire Técnicas de Dinâmica – Eliane Porangaba Costa Tecnologia e Educação – Wendel Freire (org.) Temas atuais em Pedagogia Empresarial – Amélia Escotto A. Ribeiro Temas Interdisciplinares na Educação – Luiza Elena L. R. do Valle, Quézia Bombonatto e Maria Irene Maluf (orgs.) Teoria e Prática em Psicomotricidade – Geraldo Peçanha Terapia Familiar: Mitos, Símbolos e Arquétipos – Paula Boechat Valores – Marília Maia Costa Voo da Águia: uma autobiografia – Maria Dolores Fortes Alves Acesse o site: www.wakeditora.com.br e-mail: wakeditora@uol.com.br http://www.wakeditora.com.br/ mailto:wakeditora@uol.com.br PRIMEIRAS PALAVRAS SEGUNDAS PALAVRAS 1 INTRODUZINDO A DISCUSSÃO 2 COMPREENDENDO O AUTISMO 2.1 – Construindo uma caracterização 2.2 – A importância da observação individual para organização de elementos para uma intervenção pedagógica 2.3 – Etiologias 2.3.1 – A Teoria Psicodinâmica 2.3.2 – A Teoria Genética 2.3.3 – A Teoria Orgânica 3 ALGUNS CASOS ILUSTRATIVOS 4 PROGNÓSTICOS 5 AUTISMO E OUTRAS SÍNDROMES 6 MODELOS DE ATENDIMENTO 6.1 – Educação Especial: construindo uma educação inclusiva 7 INTERVENÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS NO TRABALHO COM O AUTISTA 7.1 – TEACCH 7.2 – ABA – Análise Aplicada do Comportamento 7.3 – Sistema de comunicação por meio da troca de figuras 7.4 – Son-Rise 7.5 – Ambientes estruturantes 8 TERAPIA DE LINGUAGEM 9 PSICOTERAPIA E AUTISMO 10 TRATAMENTO MEDICAMENTOSO 11 ESTUDO DE CASO NO CONTEXTO DAS PRÁTICAS PSICOPEDAGÓGICAS CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS