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O Império Português no Século XVII

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1 
Os nomes do Império no século XVII em Portugal 
Luís Filipe Silvério Lima 
UFPR 
ProDoc/Capes 
 
O conceito de Império tem sido rediscutido nos últimos tempos a partir das 
chamadas “crise do Estado” e crise do “paradigma estadualista”1, e, por conseqüência, 
das críticas às teorias explicativas da formação dos Estados nacionais no período 
moderno. Com a evidência das instituições e instâncias supranacionais e globalizadas, 
houve uma busca por explicá-las olhando para trás, identificando no passado, em 
especial, no período moderno, os antecedentes da globalização/mundialização2 e da 
circulação entre nações. A tendência historiográfica atual, especialmente no campo da 
política, das idéias e da cultura, remete àquela que tentou anteriormente identificar na 
Renascença e no Barroco o espaço de invenção e surgimento do Estado e das esferas 
pública e privada, inclusive, por vezes, na busca de armar justificativas e legitimações 
às nações contemporâneas. Mudou-se, porém, radicalmente a dimensão e o vetor: ao 
invés de identificar os processos de centralização nos espaços dos Estados existentes as 
pesquisas hoje se debruçam sobre as relações estabelecidas mundialmente entre as mais 
diversas partes. Se nas décadas de 1950 e 1960, começara-se a criticar as noções de 
Estado Absolutista e Absolutismo, mais recentemente têm se atacado a própria idéia de 
Estado Moderno. Se antes a emergência do Estado e do poder estatal era dita como sinal 
da Modernidade e característica do Período Moderno, alguns historiadores têm inclusive 
negado a existência de qualquer instituição próxima à idéia contemporânea de Estado 
antes do final do séc. XVIII3. 
Junto a isso, com a emergência da idéia de um “novo” Império em uma “nova” 
ordem mundial, marcada pela América do Norte e pelo capitalismo como modelo de 
 
1 Sobre isso ver HESPANHA, A.M. “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime” In: 
Poder e Instituições na Europa do Antigo Regime. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1984, p. 31 
e segs.. 
2 GRUZINSKI, S. “Les mondes mêlés de la Monarchie catholique et autres ‘connected histories’ ” 
Annales ESS, 56, 1, 2001, p. 85-100. Versões desse artigo saíram em português, por conta de palestras 
dadas em universidades brasileiras: GRUZINSKI, Serge. “Os mundos misturados da Monarquia 
Católica e outras ‘connected histories’.” Topoi, 2, mar/2001; GRUZINSKI, Serge. “O historiador, o 
macaco e a centaura: a ‘história cultural’ no novo milênio”. Estudos Avançados. Set./Dec. 2003, 
vol.17, no.49, p.321-342. 
3 CARDIM, P. ”Religião e ordem social. Em torno dos fundamentos católicos do sistema político do 
Antigo Regime”, Revista de História das Ideias (Coimbra) 22 (2001) p. 33-175. 
 
 2 
soberania e império4, muitos historiadores têm retomado criticamente trabalhos e 
acepções clássicas sobre o Império e a Expansão Européia5 e, sob perspectivas 
renovadas, investigado o papel e o significado da ideologia dos Impérios sobretudo ao 
longo do período Moderno. Sob esse viés, o tema tem aparecido com alguma freqüência 
em dossiês, artigos e resenhas nos periódicos da área de humanas6. 
No Brasil, e em Portugal, esse debate tem ganhado força em torno da polêmica 
entre a proposição de um Antigo Regime nos Trópicos e as propostas de atualização e 
sobrevida do Antigo Sistema Colonial. A partir desse debate, o entendimento do espaço 
colonial e ultramarino como um Império tem sido rediscutido, em particular, em torno 
da linha dada por Charles Boxer n’O império marítimo português7 (distanciando-se da 
idéia de “império colonial português” construída na primeira metade do séc. XX a partir 
de uma compreensão colonialista e “imperialista” formulada pela historiografia 
salazarista). 
Entre os historiadores que se dedicam à história das idéias, da linguagem e do 
pensamento político, esses debates têm levado a um longo levantamento das variadas 
acepções de império8, que vai além das posições que identificavam na noção de império 
uma idéia medieval, abstrata, cristã, de paz e organização entre reinos, que sobrevivera 
no período moderno9, ou uma idéia de políticas imperialistas baseadas em Reinos e 
 
4 cf. NEGRI, A. Cinco lições sobre o Império. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, ver em especial “Premissa” e 
“Soberania”; NEGRI, A; HARDT, T. Império. Rio de Janeiro: Record, 2004. Anthony Pagden critica 
as posições de Antonio Negri e de seu colega Michael Hardt como uma “recente, exagerada e histérica 
expressão desse medo” de um império “mais ameaçador”, fundado em um conceito de ultra soberania 
e poder radical (ao que se contraporia a categoria de multidão) e no capitalismo sem concorrência. 
PAGDEN, A. Povos e Impérios. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002, p. 219, 245 n.11. Para outras críticas 
das proposições de Hardt e Negri, ver para uma perspectiva marxista: CASANOVA, P.G. “O 
Imperialismo, hoje” Tempo, 18, 2005, p. 65-75; para uma leitura mais multicultural: POMPER, P. 
“The history and theory of empires” History and Theory, 44, December 2005, p. 1-27. 
5 Ver sobre isso, a proposta de Diogo Ramada Curto: “The European Expansion and the Early Modern 
Period. A research proposal” Mare Liberum, 20, Dezembro 2000. 
6 Entre outros: o número 20 da Mare liberum fruto do seminário no convento da Árrabida sobre 
“Historiography and Empire” (Dezembro, 2000); os três números da Common Knowledge dedicados 
ao dossiê “Imperial Trauma” (vol. 11, n. 2 e 3, 2005, vol. 12, n. 1, 2006); o dossiê “Império e 
Imperialismo” da Tempo, n. 44, 2005; a sessão de comptes-rendus “Empire et Monarchies” dos 
Annales HSS, 60e année, 5, sep-out/2005; . 
7 BOXER, C. O império marítimo português, São Paulo: Companhia das Letras, 2002. 
8 Entre outros: PAGDEN, A. Spanish Imperialism and the Political Imagination. New Haven: Yale 
University Press, 1990; PAGDEN, A. Lords of all the world: ideologies of empire in Spain, Britain, 
and France, 1500-1800. Yale University Press, 1995; MULDOON, J. Empire and Order. The concept 
of Empire, 800-1800. Londres, Nova Iorque: Macmillan Press, 1999; POCOCK, “Império, Estado e 
Confederação. A Guerra de Independência Americana como um crise da Monarquia Múltipla” In: 
Linguagens do ideário político. São Paulo: Edusp, 2003, p. 289-322. 
9 cf. MENENDEZ-PIDAL, R. Idea imperial de Carlos V. 6ª ed., Madri: Espasa-Calpe, 1971; 
WESTPHALEN, C.M. Carlos Quinto: seu império universal. 1500-1558. Curitiba: [s.n], 1955. 
 
 3 
Monarquias nacionais, ante-sala dos Estados Nacionais10. Os estudos têm se atido não 
só ao Império propriamente dito: o Sacro-império, mas também aos impérios francês e 
inglês, às vezes em contraposição ao norte-americano (por conta da sua atuação 
imperialista nos séculos XVIII e XIX, como Impérios Contemporâneos) e espanhol 
(tanto pelas suas Conquistas, como exemplo de Império Moderno, quanto pela 
sobreposição com o império dos Áustrias, em especial com Carlos V, como “rescaldo” 
do Império Medieval). Para o mundo português, porém, são poucos os estudos que 
fazem uma história da idéia ou do conceito de império. 
Os trabalhos de Luís Filipe Thomaz, além de realizarem uma descrição do 
funcionamento do Estado da Índia no século XVI, a partir de um império polimórfico e 
estabelecido pelas relações entre as praças e portos no Oriente, discutem as idéias 
imperiais que sustentaram essa estrutura, em especial no período manuelino11. Em 
diálogo com a obra de Thomaz, António Saldanha estudou os argumentos jurídicos que, 
tendo por base o Direito das Gentes, fundamentavam o Iustum Imperium Asiático dos 
portugueses12. Em paralelo a esse trabalho, sua tese de doutorado apresenta um estudo 
sobre a idéia de império no pensamento do padre Antônio Vieira, na qual recompõe as 
discussões jurídicas sobre monarquia universal para compreender o projeto do Quinto 
Império do jesuíta13. O trabalho desses autores, bem como trabalhos sobreoutros 
Impérios, coloniais ou não, apontam alguns grupos de questões que mereceriam ser 
enfrentadas, num espectro mais amplo, ao se pensar o que chamamos de Império 
Português. 
Pretendo aqui pontuar algumas dessas questões para suscitar debate, mais do que 
apontar conclusões sobre elas. Em especial, num tom algo que ensaístico, tentarei 
propor alguns questionamentos para se pensar a periodização das idéias e usos de 
Império entre os séculos XVI e XVII. 
As primeiras questões suscitadas estão ligadas à tensão entre modelos 
centralizadores e descerebrados, ou polissinodais. Na historiografia essa tensão se dá, 
 
10 MARAVALL, J.A. “El concepto de Monarquia en la Edad Media española” In: Estúdios de historia del 
pensamento español. 3ª ed., Madri: Cultura Hispanica, 1983, v. 1, p. 65-8. 
11 THOMAZ, L.F. "L'Idée Impériale Manuéline", In: Actes du Coloque "La Découverte, Le Portugal et 
L'Europe" (Paris, 1988), Paris: FCG-CCP, 1990, 35-104. 
12 SALDANHA, António Vasconcelos de. Iustum imperium: dos tratados como fundamento do império 
dos portugueses no Oriente; estudo de história do direito internacional e do direito português. Lisboa: 
Fundação Oriente, 1997 
13 SALDANHA, António Vasconcelos de. Da idéia de “império na obra do Padre António Vieira. Roma: 
Consiglio Nazionale delle Ricerche, [1992?] (Ricerche Giuriche e Politiche. Celebrazione Colombiani 
– Materiale I/2). 
 
 4 
muitas vezes, na relação estabelecida entre o pensamento político moderno e a idéia de 
Estado, e concepções medievais de poder e Império. Nesse caso, emerge a questão de 
compreender, entre outros, como se deu a apropriação, nos Reinos, de símbolos, 
emblemas e mesmo expressões imperiais (como por exemplo, “majestade”), e se isso 
constituiu somente o uso de expressões medievais para legitimar um poder 
centralizador, como propõe Maravall14, ou se há, por trás, uma concepção imperial 
fundada na busca da atualização dessa concepção de poder e no diálogo com outros 
poderes, como na proposta de monarquias compósitas15. Complementar a isso, deve-se 
perguntar sobre as “ideologias imperiais” existentes na época e até que ponto elas 
indicam tendências à centralização ou a polissinodia. Colocado de outra forma, será que 
ao se postular uma idéia de império, no caso da Expansão, por exemplo, estava se, 
necessariamente, sintetizando ou evocando propostas medievais como um espírito 
cruzadístico, mitos como Preste João, desejos milenaristas de fartura e paraíso terreal? 
Para Thomaz, ao pensar o reinado de D. Manuel, sim, algo que seria o sinal medieval de 
uma estratégia inovadora no campo das conquistas, característica moderna e paradoxal 
da concepção imperial do rei Venturoso16. Se assumir como eficaz essa interpretação, 
ainda fica a pergunta: isso vale para todos os períodos da história ultramarina moderna 
de Portugal? 
Um segundo campo está na convergência da compreensão do Império como rede 
de relações descerebradas e a representação do poder desse Império, pois junto a essa 
pluraridade e complexidade do funcionamento da monarquia e de seus domínios havia 
um discurso majestático do poder capital que daria ordem às suas partes diferentes e 
compósitas. Em outras palavras, qual o papel da representação do poder como cabeça, 
como sol, como centro, presente nos discursos textuais e pictóricos da época, nesse 
sistema descrito como sem centro? Seguindo Pedro Cardim17, a idéia de Amor (ou de 
 
14 MARAVALL, J.A. Estado Moderno y mentalidad social. Siglos XV a XVII. Madri: Revista de 
Occidente, 1972, v. 1, p. 254 e ss. 
15 ELLIOT, J.H. “A Europe of Composite Monarchies”, Past and Present, no. 137 (Nov. 1992), 49 
(número especial dedicado à “The Cultural and Political Construction of Europe”). 
16 THOMAZ, L.F., op. cit., p. 98 ss. 
17 CARDIM, P. O Poder dos afectos: ordem amorosa e dinâmica política no Portugal do Antigo Regime. 
Tese de doutoramento em História, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de 
Lisboa, 2000. 
 
 
 5 
Concórdia) entre desiguais (como pais e filhos, esposo e esposa)18 responde a essa 
articulação no reino. Porém, se não devidamente entendidas suas diferenças para com as 
idéias atuais de amor e concórdia (que pressupõem, respectivamente, uma relativa 
igualdade e uma superação das diferenças), corre-se o risco de apaziguar a violência 
explícita e necessária às proposições amorosas e concordantes do Antigo Regime e de 
uma concepção hierárquica de corpo civil. E se a representação hierárquica funcionava 
para o reino e para os vassalos do rei, ela ganhava dimensão aguda ao se pensar os 
domínios ultramarinos e os povos gentios, que não eram vassalos e estavam submetidos 
de modo mais violento ao poder, lembrando o “homem nu” diante do poder soberano 
descrito por Agambem19. Para dar somente um exemplo, os escravos (sobretudo, o 
africano) nas Américas eram os pés do corpo do reino e deveriam suportar os seus 
sofrimentos de modo obsequioso para cumprir o que a cabeça (o rei) indicava e que 
seria o futuro glorioso do Império, como pregou Vieira no sermão do Rosário. 
Somado a isso, ao se assumir a descrição de Thomaz (e de Saldanha) do domínio 
quinhentista no Oriente como uma rede complexa e de heterogeneidade jurídica para 
descrever outros espaços do chamado Império Colonial Português, em particular no 
Atlântico Sul nos séculos XVII e XVIII20, talvez fosse importante a preocupação em 
qualificar os ideais imperiais (e suas contradições) construídos na época para a 
formulação da monarquia portuguesa como um Império. 
Há ainda uma terceira esfera de questões, pois, a rigor, trata-se de um Império 
que não podia se intitular como império, como notam Thomaz, Saldanha e Hespanha, 
pois esta denominação era restrita ao Sacro Império. Ou ainda, já tendo em vista os 
domínios ultramarinos e um tipo de imperium que excedia os limites do mediterrâneo e 
da Europa, D. Manuel não teria quisto adotar o título de “Imperador das Índias”, indo ao 
encontro de suas pretensões ultramarinas, por respeito às profecias de Daniel que 
 
18 No caso da concórdia, o tópico da “concordia discors” aponta na sua própria enunciação a 
possibilidade de uma harmonia na discórdia, ou seja, uma concórdia que não necessitava de 
concordância. 
19 AGAMBEN, G. Homo sacer I – o poder soberano e a vida nua. Belo Horizonte: ed. da UFMG, 2004. 
20 Para essa apropriação, ver os recentes artigos e conferências de António Manuel Hespanha: 
HESPANHA, A.M. “Estruturas político administrativas do Império português”, em Romero de 
Magalhães (ed.), Outro mundo novo vimos. Catálogo, Lisboa: CNCDP, 2001; HESPANHA, A.M. “A 
Constituição do Império português. Revisão de alguns enviesamentos correntes”, In: BICALHO, M.F 
et alii, O Antigo Regime nos trópicos. A dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII), Rio de 
Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, 163-188; HESPANHA, A.M. "Porque é que foi portuguesa a 
expansão portuguesa?". Paper presented to the International Conference of the Centro de História do 
Além Mar, Fac. Ciências Soc. e Humanas, UNL, Lisboa. On-line: 
http://www.hespanha.net/papers/2005_porque-foi-portuguesa-a-expansao-portuguesa.PDF. 
 
 6 
anunciavam que haveria um último e derradeiro reino que seria soberano sobre o 
mundo, após os reinos dos assírios, persas, gregos e romanos (àquele momento, 
representados no Sacro-Império). Como aponta Pagden, na esteira de Maravall, para o 
Império Espanhol se preferia, por vezes, propor uma Monarquia de todo o orbe, para se 
diferenciar do Sacro-Império, visto, em muitas partes, a partir de uma perspectiva 
negativa após Carlos V21. Contudo, o termo Império enquanto um título, assim como os 
emblemas a ele associados aparecem em diversas fontes da época das monarquias 
ibéricas22. 
Somado a isso, desde D. Manuel à regênciade D. João VI, o título dos reis 
lusitanos era “rei de Portugal, dos Algarves, daquem e dalem mar em Africa Senhor da 
Guine e da Conquista, navegaçam, e Comercio de Ethiopia, Arabia, Persia, e India”. 
Portugal seria pelo título régio, para usar a expressão de Boxer, um “império marítimo” 
e não “territorial” 23 como se pensavam seja as Monarquias Universais seja o Sacro 
Império ou mesmo sua vizinha Espanha, aspecto esse do senhoria marítimo que 
resultou, entre outras razões, numa disputa sobre o “Justo império” dos portugueses 
sobre o mar24. 
O título dos monarcas espanhóis sempre marcava o domínio territorial mesmo 
quando se referia às possessões ultramarinas: “Don Phelipe, por la gracia de Dios, Rey 
de Castilla, de Leon, de Aragon, de las Dos Sicilias, de Jerusalen, de Portugal, de 
Navarra, de Granada, de Toledo, de Valencia, de Galicia, de Mallorcas, de Sevilla, de 
Cerdeña, de Córdoua, de Córcega, de Murcia, de Jahen, de los Algarues, de Algecira, de 
Gibraltar, de las islas de Canaria, de las Indias orientales y occidentales, Islas y tierra 
firme del mar Oceano (…)”. Essa formulação espanhola-castelhana existe desde o 
início do século XVI, mas o título de soberania sobre as Índias “orientales y 
occidentales” foi incluído somente com a União das coroas ibéricas, com Filipe II, e 
 
21 PAGDEN, A. Lords of all the world: ideologies of empire in Spain, Britain, and France, 1500-1800. 
Yale University Press, 1995. 
22 TRINDADE, J.B. “Vieira, o Império e a arte: emblemática e ornamentação barroca” In: ALMASA, 
J.M. et. al. (ed.) Actas del III Congreso Internacional del Barroco Americano. Sevilha, 2001, URL: 
http://www.upo.es/depa/webdhuma/areas/arte/actas/3cibi/documentos/019f.pdf. [site visitado em 6 de 
outtubro de 2006]. 
23 BRAUDEL, Fernand. El mediterráneo y el mundo mediterráneo en la época de Felipe II. México: 
Fondo de Cultura Económica, 1995, v. 1, cap. “Imperios”, cf. DUVERGER, M. “Le concept d’empire” 
In: DUVERGER, M. (ed.) Le concept d’empire. Paris: PUF, 1980. 
24 FREITAS, Frei Serafim de. Do Justo Império Asiático dos Portugueses. De Iusto Imperio Lusitanorum 
Asiático. Lisboa: Instituto de Altos Estudos, 1953. Sobre a disputa entre Serafim de Freitas e Hugo 
Grotius acerca do Mare liberum, ver: PAGDEN, Anthony, “Commerce and Conquest: Hugo Grotius 
and Serafim de Freitas on the freedom of the sea”, Mare Liberum, 20, 2000, p.33-55. 
 
 7 
depois mantido. A partir da União Ibérica e com as possessões portuguesas no Oriente, 
portanto, os habsburgos espanhóis defendiam possuírem o domínio sobre todas as 
Índias – e se aproximar da noção de senhores de toda a terra, como lembra o título do 
livro de Pagden, um dos vários sentidos de Imperador. Quando apareciam como 
monarcas portugueses, contudo, os Filipes mantinham o título português – o que 
respeitava o estabelecido nas Cortes de Tomar e a idéia de que Portugal permanecia 
como reino autônomo com uma ordem jurídica específica. Se, por um lado, respeitavam 
a autonomia das monarquias sob a coroa dual, indicando um polimorfismo jurisdicional 
ao se dirigir aos vassalos portugueses (como o fizera antes Carlos V ao só usar o Carlos 
I quando em terras espanholas), por outro, ao se dignificarem, enquanto monarcas das 
Espanhas, como reis das Índias orientais e ocidentais (bem como dos Algarves) 
indicavam não só a inclusão do ultramar português nas possessões madrilenas, mas 
reafirmavam a idéia dos Áustria como “rei de reis” numa monarquia compósita e, ao 
mesmo tempo, senhores do mundo. 
Se no título dos Habsburgos houve mudança, adequando seu estado real à nova 
dimensão da sua soberania alcançada com a monarquia dual, os Bragança ao deporem 
Filipe IV e assumirem o trono com a Restauração mantiveram o título estabelecido por 
D. Manuel. Se faz algum sentido a frase atribuída supostamente a D. João IV de que o 
Brasil era a “vaca leiteira” de Portugal, a nova dinastia percebera a mudança na situação 
do ultramar. Contudo, mantiveram-se como reis “daquem e dalem mar em Africa 
Senhor da Guine e da Conquista, navegaçam, e Comercio de Ethiopia, Arabia, Persia, e 
India”. O Brasil virou prerrogativa do herdeiro ao trono, com D. Teodósio, nomeado 
Príncipe do Brasil em 1645. Portanto o senhorio sobre o Brasil estava presente na Casa 
Real, mas não centralizado no soberano. 
O que faz voltar à disputa sobre o “Justo império” dos portugueses sobre o mar. 
Vale pensar na construção de uma justificativa para o domínio/império (dominum, 
imperium) português sobre os mares e sobre as conquistas, não só no âmbito das 
polêmicas quatrocentistas e quinhentistas entre mare clausum e mare liberum, que 
ganharam outra dimensão com Hugo Grotius (e com a resposta de Serafim de Freitas) 
no início do seiscentos, mas também a partir das questões geradas com a disputa das 
praças e das rotas com os Holandeses, incluído aqui o próprio ataque de Grotius aos 
portugueses, ainda no âmbito da Monarquia Dual e, depois com a Restauração, a partir 
da mudança do eixo das conquistas para o Atlântico Sul e para uma ocupação mais 
 
 8 
efetiva dos territórios americanos (ao contrário do império no oriente quase 
exclusivamente marítimo). Será que a União Ibérica, as reformas de Olivares, a perda 
do Oriente para os hereges holandeses, a Restauração, a criação de um Conselho 
Ultramarino, a concentração dos esforços na América e na costa ocidental da África, em 
suma, as mudanças ocorridas no ultramar e no reino português na primeira metade do 
XVII, não modificaram a conformação do Império ou, pelo menos, o discurso sobre ele? 
A contar pelo título régio, não – ainda que tenhamos a criação do “principado” do 
Brasil. Mas podemos pensar em outras acepções e construções, como por exemplo 
aquelas ligadas à proposta profético-política da Quinta Monarquia ou Quinto Império, 
que tomaram força e corpo nos tratados do século XVII, entre outros, de D. João de 
Castro e Pe. Antonio Vieira. Sem contar o caso mencionado da polêmica de Serafim de 
Freitas contra Grotius ou a refutação dos escritos anglicanos por Francisco Suarez, que 
reforçavam uma “Razão de Estado” católica e uma concepção de Império como não 
somente um domínio ou organização da instituição soberana mas inscritos num projeto 
católico e, portanto, universal de conquista, redução e conversão de todo o mundo. 
O que aponta, por fim, para uma questão da própria terminologia, de fundo mais 
nominalista. Se temos um problema de partida, como cientistas sociais, que é o das 
variadas definições e modelos de Império (e Imperialismo) construídos pelas Ciências 
Sociais e Humanas, em suma, o fato de não haver, nos estudos sociais, uma definição 
básica de Império25, ao olhar o período moderno (e mesmo o medievo) o investigador 
depara-se com um manancial de significações e, sobretudo, de usos do termo Império 
que complexificam não só uma abordagem centrífuga preocupada com o progresso de 
uma determinada estrutura, mas em especial uma leitura centrípeta, voltada para o 
entendimento das gramáticas internas de uma época. Portanto, falar de Império, menos 
do que uma solução como algumas vezes se pretende, apresenta-se como um desafio. 
Em especial, para os historiadores das idéias e da cultura política preocupados com uma 
abordagem mais historicista e menos anacrônica ou teleológica. 
Sendo vocábulo com muitas acepções, por vezes, eram usados sinônimos que 
tinham, em princípio, sentido diverso, se não oposto a alguns entendimentos do que 
seria Império, como na acepção de Monarquia Universal. James Muldoon26, tomando 
 
25 Para uma discussão sobre a indefinição do conceito de Império nas Ciências Sociais e Políticas e, por 
isso, sua dificuldade no estudo das estruturas políticas, ver: DUVERGER, M. “Le concept d’empire” 
In: DUVERGER, M. (ed.) Le concept d’empire. Paris: PUF, 1980 
26 MULDOON, J. Empire and Order:the concept of empire. 800-1800, op. cit. 
 
 9 
como balizas a duração do Sacro Império desde sua fundação com Carlos Magno até a 
sua extinção com Napoleão, identificou pelo menos oito sentidos mais recorrentes para 
as palavras Império e Imperador, que eram usados, muitas vezes, de modo indistinto: 
protetor do Papa e da Igreja; Senhor do Mundo (às vezes tendo como variação a 
expressão Monarquia Universal); Sacro Império; unidade construída a partir da 
conquista de outros territórios e povos, ou ainda, uma monarquia composta por vários 
reinos; sinônimo de soberania e poder; Império Universal Cristão, como congregação de 
todos os fiéis ou como ideal da Igreja; Império dos Últimos Dias, numa leitura 
apocalíptica, fundada sobretudo em Daniel; e mesmo, às vezes, no sentido sinônimo de 
tirania e corrupção, pela concentração excessiva de poder seja em defesa de uma 
república civil seja na defesa dos poderes do Papa. Muitos desses sentidos se fundavam 
a partir de uma imagem construída do Império Romano e de suas instituições (inclusive 
o entendimento do Império como tirania), da adaptação dessa Imagem ao mundo cristão 
e na tradução da Igreja como Roma, e foram gestados em conflitos entre o Imperador e 
o Papa, os reinos e o Imperador, os poderes locais e os poderes centrais, a Igreja e os 
reinos etc. Ou seja, ao se pensar em Império para o período moderno e o espaço lusitano 
e ibérico é preciso atentar a essa multiplicidade de significados e às relações que 
evocam nos discursos que utilizam a expressão. Além disso, é preciso se perguntar, 
como apontam Pagden e Subrahmanyan27, se essas acepções não assumiram contornos 
particulares nos reinos ibéricos por conta de seus domínios ultramarinos e a conquista, o 
contato e o confronto com outros povos nos novos mundos. 
Em relação ao Portugal do século XVII, cabe questionar se as concepções de 
monarquia que se construíram durante a União Ibérica e a Restauração, momento, 
segundo Hespanha e Eduardo Lourenço28, no qual se começou a perguntar sobre a 
identidade do ser português, não teriam relação com esses ideais imperiais, em suas 
variadas acepções, e até que ponto diferiam (ou não) da visão manuelina e quinhentista 
de Império construída no âmbito da expansão para o Oriente e da formação do Estado 
da Índia. 
 
27 PAGDEN, A. “Fellow citizens and imperial subjects: conquest and sovereignty in europe’s overseas 
empires”. History and Theory, Theme Issue 44 (December 2005), p. 28-46; Subrahmanyam, S. “A 
Tale of three Empires Mughals, Ottomans, And Habsburgs in a comparative context”. Common 
Knowledge 12:1, 2006. 
28 LOURENÇO, E. Labirinto da saudade. Psicanálise mítica do destino português. 3a. ed., Lisboa: Dom 
Quixote, 1988; SILVA, A.C.N. e HESPANHA, A. M. “A identidade portuguesa” In: HESPANHA, 
A.M. (coord.) História de Portugal. Quarto Volume: O Antigo regime (1620-1807) Lisboa: Estampa, 
s/d. 
 
 10 
Se, como diz Thomaz, a idéia imperial manuelina era uma síntese das 
concepções medievais em declínio e, em respeito a elas, não se nomeou como 
“Imperador das Índias”, algo que pode ser discutido, fica mais difícil postular isso na 
formulação dos discursos profético-políticos que fundamentaram a Restauração e a 
dinastia brigantina no séc. XVII, identificando nas cabeças coroadas dos Bragança a 
promessa de um Quinto Império. Ainda que haja a permanência do repertório medieval 
em autores como Padre Antonio Vieira que formularam nos seiscentos os tratados sobre 
o Quinto Império lusitano, ou melhor, que Vieira e seus contemporâneos estivessem em 
diálogo obsequioso com a auctoritas e partilhassem de lugares e figuras que chamamos 
de medievais, hoje parece ligeiro identificar essas formulações imperiais e messiânicas 
simplesmente como rescaldos de uma época anterior que Portugal se recusava deixar. 
Pelo contrário, suas formulações imperiais se davam a partir de monarquias definidas (e 
não de uma idéia geral de império), de um espaço de conquistas e expansão (e não de 
uma noção hipotética de orbe como espaço da comunidade cristã ou de reconquista de 
uma Jerusalém perdida), e mais importante, se afirmavam como execução (consumação) 
completa da soberania, ou seja, o ideal imperial (e o “horizonte de perspectiva” que 
tinham a partir de suas esperanças) estava ligado ao exercício absoluto e soberano do 
poder. 
O interessante – quiçá irônico – é que essa afirmação do império como soberania 
se fez quando o que chamamos de “Império Colonial” estava encolhendo em extensão, 
com a perda do Oriente e a concorrências pelo comércio dos holandeses e ingleses, e 
mesmo com a separação dos domínios ultramarinos das coroas ibéricas, que deixava 
manca a tópica do “reino onde o sol nunca se põe”. Talvez menos que irônico 
poderíamos pensar que foi um momento também de, seguindo Eduardo Lourenço, 
necessidade de reflexão sobre o que seria Portugal como reino. E, nesse sentido, a chave 
polissêmica do Império serviu para responder várias inquietações surgidas ao longo das 
conjunturas do século XVII. A construção de uma leitura portuguesa de Império teve 
grande eficiência menos do que por sua originalidade e mais pela adequação às 
esperanças e a uma idéia de destino comum. Nesse sentido, cabe destacar a longa 
permanência e vigência da proposta de um Quinto Império na cultura portuguesa (e 
brasileira). Ou mesmo, numa vertente menos profética, lembrar a opção feita, no séc. 
XIX, de nomear a recém-criada monarquia brasileira de Império. 
 
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Independente dessa longa vigência, para usar um termo de Ortega, ou duração, 
para remeter a Braudel, da idéia de Império, ao se debruçar sobre os nomes do Império 
no período moderno fica claro que não se fala de um, mas de muitos Impérios.

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