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FUNDAMENTOS-BÁSICOS-E-TEORIA-EM-SAÚDE-MENTAL-4

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Prévia do material em texto

1 
1 SUMÁRIO 
2 INTRODUÇÃO ..................................................................................... 3 
3 SAÚDE MENTAL ................................................................................. 4 
4 SOFRIMENTO MENTAL ...................................................................... 5 
4.1 Sofrimento Mental e Vulnerabilidade .................................................... 6 
4.2 Loucura na Grécia antiga: a desrazão valorizada ................................ 9 
4.3 Antiguidade clássica: o rompimento entre o místico e o racional ......... 9 
4.4 Idade média: sai o leproso, entre o louco ........................................... 12 
4.5 Século XVIII: a loucura como objeto do saber médico ....................... 13 
4.6 Pós-guerra: momento propício para reformas .................................... 14 
5 A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA E A POLÍTICA DE SAÚDE 
MENTAL ..................................................................................................... 16 
5.1 A regulamentação da atenção psicossocial em saúde mental no Brasil
 20 
5.2 O papel estratégico dos CAPS na atenção à saúde mental no Brasil 23 
6 A NOVA CLASSIFICAÇÃO AMERICANA PARA OS TRANSTORNOS 
MENTAIS – O DSM-5 ................................................................................. 29 
6.1 A história dos sistemas de classificação ............................................ 31 
6.2 A história do DSM .............................................................................. 32 
7 O DSM-5 ............................................................................................ 33 
7.1 Transtornos do neurodesenvolvimento .............................................. 34 
7.2 Gama da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos ..................... 35 
7.3 Transtorno bipolar e outros transtornos relacionados ........................ 36 
7.4 Transtornos depressivos .................................................................... 37 
7.5 Transtornos de ansiedade .................................................................. 38 
7.6 Transtorno obsessivo-compulsivo e outros transtornos relacionados 39 
7.7 Trauma e transtornos relacionados ao estresse ................................ 40 
 
2 
7.8 Alimentação e transtornos alimentares .............................................. 43 
7.9 Disfunções sexuais ............................................................................ 45 
7.10 Disforia de gênero ........................................................................... 46 
7.11 Transtornos parafílicos .................................................................... 47 
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................... 48 
 
 
 
3 
2 INTRODUÇÃO 
Prezado aluno! 
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante 
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - 
um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma 
pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum 
é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a 
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas 
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em 
tempo hábil. 
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa 
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das 
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que 
lhe convier para isso. 
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser 
seguida e prazos definidos para as atividades. 
 
Bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
3 SAÚDE MENTAL 
 
Fonte: pixabay.com 
Saúde Mental é o equilíbrio emocional entre o patrimônio interno e as 
exigências ou vivências externas. É a capacidade de administrar a própria vida e as 
suas emoções dentro de um amplo espectro de variações sem, contudo, perder o 
valor do real e do precioso. É ser capaz de ser sujeito de suas próprias ações sem 
perder a noção de tempo e espaço. É buscar viver a vida na sua plenitude máxima, 
respeitando o legal e o outro, é estar de bem consigo e com os outros, aceitar as 
exigências da vida, saber lidar com as boas emoções e também com as 
desagradáveis: alegria/tristeza; coragem/medo; amor/ódio; serenidade/raiva; ciúmes; 
culpa; frustrações, reconhecer seus limites e buscar ajuda, quando necessário 
(CARVALHO, 2010). 
Certo que os conceitos de saúde e doença mudam conforme mudam também 
as sociedades. Os avanços tecnológicos, científicos e até a economia influenciam 
nesta definição e na forma como as pessoas são tratadas. Houve um tempo em que 
as pessoas eram consideradas saudáveis ou doentes somente por se medir sua 
capacidade de trabalho. Dizia-se que era saudável aquele que conseguia trabalhar 
mais; já aquele que não conseguia era considerado doente (PRATTA; SANTOS, 
2009). 
Hoje, sabe-se que saúde não é coisa simples. A constituição da OMS afirma: 
“saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a 
mera ausência de doença ou enfermidade”. Uma implicação importante dessa 
 
5 
definição é que a saúde mental é mais do que a ausência de transtornos mentais ou 
deficiências (NAÇÕES UNIDAS BRASIL, 2016). 
A saúde mental é mais do que a ausência de transtornos mentais, vale lembrar 
que; 
✓ A saúde mental é uma parte integrante da saúde; na verdade, não há 
saúde sem saúde mental; 
✓ A saúde mental é determinada por uma série de fatores 
socioeconômicos, biológicos e ambientais; 
✓ Estratégias e intervenções custo-efetivas de saúde pública e 
intersetoriais existem para promover, proteger e restaurar a saúde 
mental. 
Ser saudável não significa apenas não ter doenças, depende de muitos fatores 
como boa alimentação, uma moradia adequada, contar com água e esgoto na 
comunidade. Também é condição de saúde ter trabalho e renda, educação, 
segurança, acesso aos serviços de saúde, lazer e acesso a bens e serviços 
disponíveis na comunidade. Assim, só se tem saúde integral quando se tem saúde 
mental, equilíbrio social e boas condições de vida. (PRATTA; SANTOS, 2009). 
 
4 SOFRIMENTO MENTAL 
 
Fonte: pixabay.com 
 
6 
No decorrer da história das sociedades humanas, já se ouviu falar de 
sofrimento mental de várias formas diferentes. O louco já foi considerado possuído 
pelo diabo e a loucura já foi considerada castigo de Deus, preguiça de trabalhar, 
desculpa de malandro, coisa de gente ruim, doença contagiosa e sem cura e até já se 
acreditou que a pessoa ficava louca por vontade própria. Hoje se tem uma visão 
diferente da loucura (MLLANI; VALENTE, 2008). 
 Segundo os referidos autores, ao olhar um sujeito em sofrimento mental, não 
destaca nele somente suas fragilidades e limitações, procura-se destacar também seu 
lado saudável, suas potencialidades e capacidades. Ninguém está em sofrimento 
mental o tempo todo e ninguém é completamente doente. 
Há muitos aspectos saudáveis preservados e é através deles que as pessoas 
podem ser resgatadas para uma vida o mais normal possível. Neste contexto, 
entende-se a importância de se respeitar os modos diferentes de ser e de viver que 
cada pessoa tem, seu jeito de ver o mundo e de se relacionar com ele e com as 
pessoas. (MLLANI; VALENTE, 2008). 
4.1 Sofrimento Mental e Vulnerabilidade 
O sofrimento psíquico tem sido compreendido pela sociedade como objeto de 
intervenção da ciência médica. Nesse sentido, tal sofrimento tem recebido o rótulo de 
“doença mental”, merecendo diferentes nomenclaturas: loucura, alienação, doença 
mental, transtorno mental, sofrimento psíquico, que têm sido utilizados em diferentes 
momentos da história. Fato é que a convivência social da pessoacom sofrimento 
mental é restrita ou ocorre de forma precária, de modo que aquelas que apresentam 
transtornos graves ou gravíssimos são excluídas de qualquer convivência e, por isso, 
apresentam condição especial de vulnerabilidade, isto é, pode ser facilmente 
ofendido, atacado ou ferido, conforme refere a origem latina da palavra vulnerabilis, 
que causa lesão (DEL’OLMO; CERVI, 2017). 
De acordo com os autores supracitados, o conceito de vulnerabilidade surgiu 
nos debates bioéticos nos anos 1990 com o susto provocado pelo amplo crescimento 
da epidemia causada pelo vírus HIV. A partir de então, percebeu-se que, mesmo 
pessoas economicamente privilegiadas seriam também vulneráveis e passíveis de 
serem contaminadas. Então, a vulnerabilidade passa a ser identificada por dois 
 
7 
modos: como caracterização de situação de fragilidade particular por algumas 
pessoas e como condição humana universal. 
Historicamente, os vulneráveis são compreendidos como as crianças, os 
senis e os institucionalizados de qualquer ordem, sobretudo os deficientes 
mentais e físicos que apresentam elevado grau de vulnerabilidade 
(BARCHIFONTAINE, 2007, apud DEL’OLMO, 2017, p.199). 
Entretanto, a “desrazão” nem sempre foi vislumbrada como motivo de exclusão, 
não sendo considerado algo negativo. Na Grécia antiga, ela chegou a ser considerada 
até mesmo um privilégio. Note-se que filósofos, como Sócrates e Platão, destacaram 
o aspecto místico da loucura referindo a existência de uma loucura tida como divina, 
fazendo uso da palavra manikê para designar tanto o “divino” como “delirante”. Nesse 
aspecto, homens privilegiados poderiam acessar as verdades divinas. Aos poucos a 
loucura se distancia do místico e na antiguidade clássica, a partir da Renascença, 
passa a ser vista como representante do mal (DEL’OLMO; CERVI, 2017). 
 
7. PERCEPÇÃO E CONCEITUAÇÃO DA LOUCURA ATRAVÉS DOS TEMPOS 
 
 
Fonte: pixabay.com 
A sociedade ocidental contemporânea produz e naturaliza uma visão do 
sofrimento psíquico como objeto de intervenção da ciência, seja ela médica ou de 
outras práticas. Nesse paradigma, o sofrimento psíquico recebe o rótulo de “doença 
mental”, com quadros nosológicos claramente delimitados. O objetivo final, ou seja, a 
cura, pode até ser conceituado de maneiras diferentes, mas, raramente, escapa à 
 
8 
noção de (re) adaptação a um mundo do qual ele não faz parte ou ao qual se mostra 
estranho (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Sabe-se que essa visão de mundo se arvora em ser “A Verdadeira” e que já foi 
assimilada a tal ponto que se corre até mesmo o risco do ridículo se tentar apresentar 
os fatos sob outra ótica. Entretanto, a história mostra que nem sempre foi assim: 
loucura, alienação, doença mental, transtorno mental, sofrimento psíquico não foram 
pensados de maneira uniforme nem ao longo da história, nem no mesmo espaço 
temporal (PEREIRA, 2015). 
Vale destacar ainda que a forma como a experiência com a loucura vai sendo 
conceituada influencia diretamente os espaços e as práticas destinadas a ela. Sendo 
assim, essa reflexão visa reconstruir a trajetória da percepção da loucura desde a 
Grécia Antiga até os dias atuais, enfocando, principalmente, os períodos onde 
ocorreram mudanças significativas na forma de se perceber e atuar perante essa 
experiência (ARAUJO, et al. 2009). 
É delimitado o lugar da loucura na história a partir das considerações acerca 
da relação entre a lepra e a loucura. A lepra foi representada como um mal contagioso 
com forte conotação moral -religiosa, que deveria ser segregado da sociedade. Com 
o tempo, o foco sobre a lepra foi sendo substituído pelas doenças venéreas, as quais 
passam a ser objeto de interesse das estruturas morais e religiosas da época 
(SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Os referidos autores, afirma que apesar da exclusão social, os doentes 
acometidos de doenças venéreas vão se infiltrando nos hospitais, demonstrando 
resistências em sair. Este processo força a construção de casas especiais para esses 
doentes, não mais para sua exclusão, mas para o seu tratamento. As doenças 
venéreas tornam-se causa médica, inteiramente do âmbito do médico. Esta 
perspectiva de tratamento da doença venérea estabelece uma distinção entre a 
doença só moral, aquela que é associada à noção de pecado e de salvação, como a 
lepra, e a doença que pertence ao campo médico, aquela que merece tratamento com 
medicamentos. 
 
 
9 
4.2 Loucura na Grécia antiga: a desrazão valorizada 
A desrazão é entendida como tudo aquilo que uma sociedade enxerga como 
sendo seu outro: a estranheza, a ameaça, a alteridade radical. Essa dimensão pode 
ser identificada em diversas épocas e, inclusive, pode ser percebida como essencial 
nas mais variadas formações histórico-sociais. Entretanto, apesar desse lugar de 
exclusão sempre ter existido, nem sempre coube ao louco a tarefa de representar a 
desrazão (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Inicialmente, por mais que pareça estranho aos olhos de hoje, pode-se afirmar 
que a experiência com a loucura nem sempre foi considerada algo negativo, muito 
menos uma doença. Pelo contrário, na Grécia antiga ela já foi considerada até mesmo 
um privilégio. Filósofos como Sócrates e Platão ressaltaram a existência de uma forma 
de loucura tida como divina e, inclusive, utilizavam a mesma palavra (manikê) para 
designar tanto o divinatório como o delirante (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Segundo os autores supracitado, era através do delírio que alguns privilegiados 
podiam ter acesso a verdades divinas. Isso não quer dizer que essas pessoas fossem 
consideradas normais ou iguais, mas que eram portadoras de uma desrazão, a qual, 
apesar de habitar a vizinhança do homem e do seu discurso, precisava ser mantida 
numa distância, separando o sagrado das experiências terrenas: A loucura não é o 
Outro do homem (do qual ele possa se assenhorar), mas simplesmente o Outro. Este 
Outro ocupa o lugar de uma alteridade radical e exterior ao sujeito e alheia a qualquer 
tentativa de apropriação. 
 Não pode ser considerado como uma outra faceta do mesmo, mas encarna 
uma diferença impossível de ser apreendida. Essa relação entre experiência mística 
e consciência crítica vai prevalecer por muito tempo e, somente no período conhecido 
como Antiguidade Clássica, vai se dissolver (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
4.3 Antiguidade clássica: o rompimento entre o místico e o racional 
Paulatinamente, a loucura vai se afastando do seu papel de portadora da 
verdade e vai se encaminhando em uma direção completamente oposta. Na 
fascinante obra intitulada História da Loucura, pode-se perceber como esse corte 
entre misticismo e razão pode ser percebido em vários âmbitos da experiência 
humana. Um dos exemplos abordados na obra é a descrição de como se deu esse 
 
10 
rompimento no espaço das artes, através da crescente dissociação entre imagem e 
escrita, observada nesse período (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Com o fim do simbolismo gótico, a imagem é liberada da sabedoria e da lição 
que a ordenavam e começa a gravitar ao redor de sua própria loucura, através de 
abundância de significações, de multiplicação do sentido por ele mesmo: o sentido 
não é mais lido numa percepção imediata, a figura deixa de falar por si mesma. Entre 
o saber que a anima e a forma para qual se transpõe, estabelece-se um vazio. Ele 
está livre para o onirismo. Na pintura, pode-se destacar obras como a Nau dos Loucos, 
a Tentação de Lisboa e o Jardim das Delícias, as quais mostram animais, caras 
grotescas, pássaros de pescoço alongado. Esses elementos fascinam o espectador, 
encarnando a loucura em forma de tentação, expondo o mundo com tudo que nele 
existe de impossível, de fantástico, de inumano. (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Segundo os autores já referenciado as imagens, ainda que carregadas de 
fantasmas, exercem sobre o homem do século XV mais poderes de atração do que a 
realidade. Por outro lado, na produção escritado mesmo período, a loucura atrai, mas 
não fascina, enquanto Bosh, Brughel e Dürer eram espectadores terrivelmente 
terrestres, e implicados nessa loucura que viam brotar à sua volta, Erasmo observa-a 
a uma distância suficiente para estar fora de perigo; observa-a do alto do seu Olimpo, 
e se canta seus louvores é porque pode rir dela com o riso inextinguível dos deuses. 
Assim, essa brecha entre experiência mística e consciência crítica foi aberta durante 
a Renascença e nunca mais deixou de se abrir, acentuando um vazio entre o trágico 
e o crítico que nunca mais será preenchido. A loucura já não é mais porta-voz da 
verdade divina e em pouco tempo passará a ocupar o lugar de representante simbólico 
do mal. 
A Renascença (século XV ao XVII) evidenciou uma grande contradição. Por um 
lado, a segregação da loucura, por outro, a sua libertação, por meio da expressão das 
várias artes. Através dessa expressão, foi possível compreender as múltiplas formas 
de cuidar da loucura: como dominá-la, como exorcizá-la para que ocorra a remissão 
dos pecados, como extirpá-la da sociedade, enfim, como tratá-la. (SILVEIRA, BRAGA, 
2005). 
 Assim, se na Renascença evidenciava-se a representação da loucura, 
mediante a incerteza entre a razão e a desrazão, na Era Clássica, destacava-se a 
cisão entre a loucura e a razão. Essa delimitação favorece o início do domínio da 
loucura pela medicina, originando a fase dos internamentos. O fato mais marcante da 
 
11 
Era Clássica foi o internamento do louco. O objetivo do internamento ainda não estava 
atrelado à ideia de tratamento, mas ao de segregar. Além dos doentes venéreos e 
loucos, eram internados também devassos, dissipadores, homossexuais, 
blasfemadores. (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Assim, de acordo com os autores supracitado a grande internação foi marcada 
pela mistura indiscriminada, sem que houvesse preocupação em discernir os doentes 
dos não doentes, os criminosos dos alienados. Nos séculos XVII e XVIII, surgem as 
internações por tempo determinado em lugares reservados à loucura. Essas 
experiências marcam, mesmo que de forma rudimentar, a representação da loucura 
como doença. A Era Clássica também marca o nascimento do asilo implementado por 
Pinel que ressalta a necessidade de diferenciar os loucos dos criminosos comuns e 
mendigos. Pinel defende o tratamento do louco e critica as formas usadas naquele 
momento, a saber: o amontoado de doentes em lugares úmidos, frios e abafados. 
Propõe a quebra das correntes, a separação dos doentes e a sua colocação 
em lugares mais apropriados. Ao final do século XVIII, o personagem do médico, que 
até então ocupava uma posição secundária na vida do internamento, torna-se figura 
central do asilo. Este fato vai modificar o relacionamento entre a alienação e a 
medicina e comandará toda a experiência moderna da loucura. É nesse sentido que 
caminha a psiquiatria no século XIX, convergindo para Freud, que aceitou o par 
médico-paciente. Isto significa que Freud desmistificou todas as estruturas asilares, 
transferindo os poderes dos asilos, sobre a existência do louco, para o médico. 
(SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Pela situação psicanalítica, a alienação tornou-se desalienante, porque o louco 
passa a ser sujeito do médico. O pensamento moderno sobre a loucura é marcado 
pela ruptura das velhas formas de pensar, entre a antiguidade clássica e a 
modernidade. O século XIX é marcado pelo discurso da liberdade do louco. A 
liberdade proposta por Pinel era ambígua, pois só podia atuar no espaço fechado do 
internamento. (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
A associação direta da loucura com o crime e o mal se desfaz, mas o louco é 
inserido nos mecanismos rigorosos do determinismo: “retirando as correntes 
que impediam o uso de sua livre vontade, mas para despojá-lo dessa mesma 
vontade, transferida e alienada no querer do médico” (FOUCAULT, 1978, 
apud VELÔSO, 2016, p. 174). 
 
 
12 
 
A ideia de internamento é sofisticada, pois a internação visa à reprogramação 
do louco, mediante o ensino da disciplina e a retificação do pensar e do sentir. Na 
metade do referido século, procedeu-se a constatação de que os loucos não estavam 
obtendo a cura. Ao invés dela, muitas outras formas de loucura foram descobertas e 
registradas. Assim, à estrutura asilar, foi atribuída a fabricação da loucura. 
(CORBANEZ, 2015) 
Uma nova mudança, então, se opera na ideia asilar: os asilos passam a ser 
usados como depósitos de loucos incuráveis. O século XX surge trazendo consigo as 
incertezas do passado quanto à elucidação da loucura. Demonstra que não existem 
significados científicos hegemônicos e nem representações sociais fixas. Esta 
instabilidade resulta de múltiplos fatores decorrentes da cultura, das ideologias, das 
representações sociais. (CORBANEZ, 2015) 
Segundo o autor referenciado a loucura conserva o seu enigma, que impede a 
solução do problema da divisão entre teorias psicológicas e somáticas. O 
conhecimento da doença mental ainda não é o suficiente para deslindá-la. O momento 
atual mostra que os aparatos discursivos sobre a loucura se configuram como 
linguagem de poder do médico e do psicólogo sobre o louco. Entretanto, por suas 
características de ruptura e pulverização dos discursos científicos, pelo despontar das 
práticas interdisciplinares, pelo questionamento de tudo o que predominou até agora 
acerca da forma de ver o mundo dos fenômenos humanos e sociais, o 
desenvolvimento da ciência sinaliza para uma tomada de decisão cada vez mais 
sensível, exigente e atuante nas causas humanas e sociais. 
4.4 Idade média: sai o leproso, entre o louco 
Segundo Silveira e Braga, (2005) até o final da Idade Média, aquele espaço da 
alteridade radical, referido anteriormente no início do texto, era representada pelo 
leproso. Encarnando o mal e representando o castigo divino, a lepra se espalha 
rapidamente causando pavor e sentenciando seus portadores à exclusão. Entretanto, 
com o fim das Cruzadas e a ruptura com os focos orientais de infecção, a lepra retira-
se, deixando aberto um espaço que vai reivindicar um novo representante. 
[...] serão necessários quase dois séculos para que a loucura suceda a lepra 
em seus espaços de medos, reação de divisão, de exclusão e de purificação, 
 
13 
para incluí-la nas formas de tratamento médico (FOUCAULT, 1978, apud 
VELÔSO, 2016, p. 172). 
Alguns séculos depois, essas estruturas de exclusão social passam a ser 
ocupadas pela figura do louco. Apesar de se perceber que desde a Idade Média já 
existiam mecanismos de exclusão do louco, ainda não é aí que a loucura vai ser 
percebida como um fenômeno que requeira um saber específico, pois os primeiros 
estabelecimentos criados para circunscrever a loucura destinavam-se simplesmente 
a retirar do convívio social as pessoas que não se adaptavam a ele. Somente no 
próximo período histórico é que se transformará essa relação (SILVEIRA, BRAGA, 
2005). 
4.5 Século XVIII: a loucura como objeto do saber médico 
É o século XVIII que vem, definitivamente, marcar a apreensão do fenômeno 
da loucura como objeto do saber médico, caracterizando-o como doença mental e, 
portanto, passível de cura. É o Século das Luzes, onde a razão ocupa um lugar de 
destaque, pois é através dela que o homem pode conquistar a liberdade e a felicidade. 
Ocorre valorização do pensamento científico e é em meio a esse contexto que ocorre 
o surgimento do hospital como espaço terapêutico. Entretanto, deve-se ter cuidado ao 
imprimir a esse acontecimento uma ótica humanitária e altruísta, pois essa 
medicalização do hospital não se deu visando uma ação positiva sobre o doente ou a 
doença, mas simplesmente uma anulação dos efeitos negativos do hospital. 
(SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Para garantir seu funcionamento, o modelo hospitalar necessitava da 
instauração de medidas disciplinares que viessem garantir a nova ordem. Assim, 
surge uma arte de delimitação desse espaçofísico, onde são fundamentais os 
princípios de vigilância constante e registro contínuo, de forma a garantir que nenhum 
detalhe escape a esse sabe. Dentro desse espaço esquadrinhado, percebe-se uma 
institucionalização das relações lá exercidas, tornando-se um mundo à parte, 
afastando cada vez mais o indivíduo de suas relações exteriores. (SILVEIRA, BRAGA, 
2005). 
Segundo os autores supracitados o discurso que alimenta esse sistema 
percebe os loucos como seres perigosos e inconvenientes que, em função de sua 
doença, não conseguem conviver de acordo com as normas sociais. Retira-se, então, 
 
14 
desse sujeito todo o saber acerca de si próprio e daquilo que seria sua doença, ao 
mesmo tempo em que se delega esse saber ao especialista. 
4.6 Pós-guerra: momento propício para reformas 
Somente no período pós-guerra desponta um cenário propício para o 
surgimento dos movimentos reformistas da psiquiatria na contemporaneidade. 
Começam a surgir, em vários países, questionamentos quanto ao modelo 
hospitalocêntrico, apontando para a necessidade de reformulação. Alguns desses 
movimentos colocavam em questão o próprio dispositivo médico psiquiátrico e as 
instituições a ele relacionadas, como exemplo, a experiência de Franco Basaglia nas 
cidades italianas de Gorizia e Trieste, as quais tinham como principal referência a 
defesa da desinstitucionalização (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Ainda de acordo com os autores uma importante questão nessa concepção de 
reforma diz respeito ao conceito de doença mental, o qual passa a ser desconstruído 
para dar lugar a nova forma de perceber a loucura enquanto existência-sofrimento do 
sujeito em relação com o corpo social. A reforma psiquiátrica brasileira encontra seus 
principais fundamentos teóricos nessa concepção, propondo-se a seguir a visão 
teórica adotada na reforma italiana. 
Entretanto, vale ressaltar que o processo histórico do lidar com a loucura no 
Brasil teve peculiaridades que o distinguem bastante daquele observado na Europa. 
A atenção específica ao doente mental no Brasil teve início com a chegada da Família 
Real. Em virtude das várias mudanças sociais e econômicas ocorridas e para que se 
pudesse ordenar o crescimento das cidades e das populações, fez-se necessário o 
uso de medidas de controle, entre essas, a criação de um espaço que recolhesse das 
ruas aqueles que ameaçavam a paz e a ordem sociais (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Posteriormente, em 1852, é criado o primeiro hospício brasileiro. Tendo o 
hospital psiquiátrico como cenário e o isolamento como principal técnica, o psiquiatra 
passou a necessitar de um profissional que servisse de vigilante e, ao mesmo tempo, 
seguisse suas instruções quanto ao tratamento: o enfermeiro é um agente situado 
entre o guarda e o médico do hospício, devendo estabelecer entre aquele e o doente 
a corrente do olhar vigilante. (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
 
 
15 
Assim, no ano de 1890, foi criada a Escola Profissional de Enfermeiros e 
Enfermeiras visando sistematizar a formação de enfermeiros para atuarem no espaço 
asilar. Num país subdesenvolvido, com um modelo de assistência à saúde centrado 
na prática curativa e assistencialista, foi fácil transformar a doença mental em 
mercadoria rentável. Ao se associar a lógica do capital (lucro) à lógica do modelo 
manicomial (poder disciplinar), não fica difícil perceber que a assistência se limitava 
ao mínimo que fosse preciso para manter os loucos sob dominação, sem precisar 
gastar muito (SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Na década de 70, não suportando a busca desenfreada pelo lucro dos 
empresários da saúde, a previdência social entra em crise, mostrando a ineficiência 
desse modelo e apontando para a necessidade de reformulação. Vale ressaltar que 
esses questionamentos vieram à tona em meio a um quadro político e econômico 
específico, caracterizado pelo fim do milagre econômico. Ocorre abertura gradual 
após anos de ditadura, permitindo a entrada em cena de novos atores, dando vez à 
manifestação das críticas e denúncias dos trabalhadores de saúde mental e outros 
setores da sociedade civil contra a precária assistência prestada aos doentes mentais. 
(SILVEIRA, BRAGA, 2005). 
Em continuidade a esse processo, ainda de acordo com os autores foram 
realizadas em 1987, 1992 e 2001, as Conferências Nacionais de Saúde Mental, que 
possibilitaram a delimitação dos objetivos da reforma psiquiátrica brasileira atual e a 
proposição de serviços substitutivos ao modelo hospitalar. Dentre os marcos 
conceituais desse processo destacam-se o respeito à cidadania e a ênfase na atenção 
integral, onde o processo saúde/ doença mental é entendido dentro de uma relação 
com a qualidade de vida. Atualmente, observa-se significativo avanço na implantação 
das propostas da reforma psiquiátrica brasileira. 
Entretanto, essas conquistas não têm se dado de forma homogênea por todo 
país. Em vários espaços ainda se enfrentam fortes obstáculos como, por exemplo, a 
falta de decisão política de alguns gestores públicos e as resistências por parte dos 
donos de hospitais que não querem perder um negócio lucrativo. (SILVEIRA, BRAGA, 
2005). 
 
 
16 
5 A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA E A POLÍTICA DE SAÚDE 
MENTAL 
 
Fonte: e-sanar.com.br 
Segundo Barbosa, Neves e Tosoli (2017) a humanidade convive com a loucura 
há séculos e, antes de se tornar um tema essencialmente médico, o louco habitou o 
imaginário popular de diversas formas. De motivo de chacota e escárnio a possuído 
pelo demônio, até marginalizado por não se enquadrar nos preceitos morais vigentes, 
o louco é um enigma que ameaça os saberes constituídos sobre o homem. 
Na Renascença, a segregação dos loucos se dava pelo seu banimento dos 
muros das cidades europeias e o seu confinamento era um confinamento errante: 
eram condenados a andar de cidade em cidade ou colocados em navios que, na 
inquietude do mar, vagavam sem destino, chegando, ocasionalmente, a algum porto. 
No entanto, desde a Idade Média, os loucos são confinados em grandes asilos e 
hospitais destinados a toda sorte de indesejáveis – inválidos, portadores de doenças 
venéreas, mendigos e libertinos. Nessas instituições, os mais violentos eram 
acorrentados; a alguns era permitido sair para mendigar (BARBOSA, NEVES, 
TOSOLI, 2017) 
No século XVIII, Phillippe Pinel, considerado o pai da psiquiatria, propõe uma 
nova forma de tratamento aos loucos, libertando-os das correntes e transferindo-os 
aos manicômios, destinados somente aos doentes mentais. Várias experiências e 
tratamentos são desenvolvidos e difundidos pela Europa. 
http://www.ccs.saude.gov.br/memoria%20da%20loucura/Mostra/pinel.html
 
17 
O tratamento nos manicômios, defendido por Pinel, baseia-se principalmente 
na reeducação dos alienados, no respeito às normas e no desencorajamento das 
condutas inconvenientes. Para Pinel, a função disciplinadora do médico e do 
manicômio deve ser exercida com firmeza, porém com gentileza. Isso denota o caráter 
essencialmente moral com o qual a loucura passa a ser revestida (BARBOSA, 
NEVES, TOSOLI, 2017). 
No entanto, com o passar do tempo, ainda de acordo com os referidos autores 
o tratamento moral de Pinel vai se modificando e esvazia-se das ideias originais do 
método. Permanecem as ideias corretivas do comportamento e dos hábitos dos 
doentes, porém como recursos de imposição da ordem e da disciplina institucional. 
No século XIX, o tratamento ao doente mental incluía medidas físicas como duchas, 
banhos frios, chicotadas, máquinas giratórias e sangrias. 
Aos poucos, com o avanço das teorias organicistas, o que era considerado 
como doença moral passa a ser compreendido também como uma doença orgânica. 
No entanto, as técnicas de tratamento empregadas pelos organicistas eram as 
mesmas empregadas pelos adeptos do tratamento moral, o que significa que, mesmo 
com uma outra compreensão sobre a loucura, decorrente de descobertas 
experimentaisda neurofisiologia e da neuroanatomia, a submissão do louco 
permanece e adentra o século XX. (BARBOSA, NEVES, TOSOLI, 2017) 
A partir da segunda metade do século XX, impulsionada principalmente 
por Franco Basaglia, psiquiatra italiano, inicia-se uma radical crítica e transformação 
do saber, do tratamento e das instituições psiquiátricas. Esse movimento inicia-se na 
Itália, mas tem repercussões em todo o mundo e muito particularmente no Brasil. 
Nesse sentido é que se inicia o movimento da Luta Antimanicomial que nasce 
profundamente marcado pela ideia de defesa dos direitos humanos e de resgate da 
cidadania dos que carregam transtornos mentais. Aliado a essa luta, nasce o 
movimento da Reforma Psiquiátrica que, mais do que denunciar os manicômios como 
instituições de violências, propõe a construção de uma rede de serviços e estratégias 
territoriais e comunitárias, profundamente solidárias, inclusivas e libertárias. 
(BARBOSA, NEVES, TOSOLI, 2017). 
Segundo os autores supracitados, no Brasil, tal movimento inicia-se no final da 
década de 70 com a mobilização dos profissionais da saúde mental e dos familiares 
de pacientes com transtornos mentais. Esse movimento se inscreve no contexto de 
redemocratização do país e na mobilização político-social que ocorre na época. 
http://www.ccs.saude.gov.br/memoria%20da%20loucura/Mostra/basaglia.html
http://www.ccs.saude.gov.br/memoria%20da%20loucura/Mostra/reforma.html
 
18 
A reforma psiquiátrica no Brasil é um movimento histórico de caráter político, 
social e econômico influenciado pela ideologia de grupos dominantes. A 
influência da psiquiatria italiana, a partir de meados dos anos 80, ganhou 
força no país. Este movimento propunha o questionamento da suposta 
universalidade do racionalismo científico das psiquiatrias, desvelando sua 
pretensa neutralidade e a abertura de outras possibilidades de atenção, 
espaços e avanços técnicos. (DELGADO 1992, apud RIBEIRO 2009, p.21). 
Importantes acontecimentos como a intervenção e o fechamento da Clínica 
Anchieta, em Santos/SP, e a revisão legislativa proposta pelo então Deputado Paulo 
Delgado por meio do projeto de lei nº 3.657, ambos ocorridos em 1989, impulsionam 
a Reforma Psiquiátrica Brasileira. Em 1990, o Brasil torna-se signatário da Declaração 
de Caracas a qual propõe a reestruturação da assistência psiquiátrica, e, em 2001, é 
aprovada a Lei Federal 10.216 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas 
com transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental 
(TENÓRIO, 2002). 
Dessa lei origina-se a Política de Saúde Mental a qual, basicamente, visa 
garantir o cuidado ao paciente com transtorno mental em serviços substitutivos aos 
hospitais psiquiátricos, superando assim a lógica das internações de longa 
permanência que tratam o paciente isolando-o do convívio com a família e com a 
sociedade como um todo (TENÓRIO, 2002). 
De acordo com o referido autor a Política de Saúde Mental no Brasil promove 
a redução programada de leitos psiquiátricos de longa permanência, incentivando que 
as internações psiquiátricas, quando necessárias, se deem no âmbito dos hospitais 
gerais e que sejam de curta duração. Além disso, essa política visa à constituição de 
uma rede de dispositivos diferenciados que permitam a atenção a pessoa com 
sofrimento mental no seu território, a desinstitucionalização de pacientes de longa 
permanência em hospitais psiquiátricos e, ainda, ações que permitam a reabilitação 
psicossocial por meio da inserção pelo trabalho, da cultura e do lazer. 
O conceito de loucura é uma construção histórica, antes do século XIX não 
havia o conceito de doença mental nem uma divisão entre razão e loucura. O 
trajeto histórico do Renascimento até a atualidade tem o sentido da 
progressiva separação e exclusão da loucura do seio das experiências 
sociais (FERNANDES; MOURA, 2009, apud SOUZA, 2019. p. 13). 
A população que sofre de algum transtorno mental é reconhecida como uma das 
mais excluídas socialmente. Essas pessoas apresentam redes sociais menores do 
que a média das outras pessoas. A segregação não é apenas fisicamente, permeia o 
corpo social numa espécie de barreira invisível que impede a quebra de velhos 
http://www.paulodelgado.com.br/
http://www.paulodelgado.com.br/
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/cidadao/visualizar_texto.cfm?idtxt=24138&janela=1
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/cidadao/visualizar_texto.cfm?idtxt=24138&janela=1
http://www6.senado.gov.br/legislacao/DetalhaDocumento.action?id=232459&titulo=LEI%2010216%20de%2006/04/2001%20%20-%20LEI%20ORDIN%C3%81RIA
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/cidadao/visualizar_texto.cfm?idtxt=24134&janela=1
 
19 
paradigmas. Vários estudos demonstram que a pessoa que sofre de transtorno mental 
severo e persistente, quando inserido em redes fortes de troca e suporte apresentam 
maior probabilidade de êxitos positivos no tratamento (BARCELLOS, 2018). 
A rede de atenção à saúde mental brasileira é parte integrante do Sistema Único 
de Saúde (SUS), rede organizada de ações e serviços públicos de saúde, instituído 
no Brasil pelas Leis Federais 8080/1990 e 8142/90. Leis, Portarias e Resoluções do 
Ministério da Saúde priorizam o atendimento ao portador de transtorno mental em 
sistema comunitário (CARMO, 2013). 
Nos anos 70 segundo o referido autor, dá-se início do processo de Reforma 
Psiquiátrica no Brasil, um processo contemporâneo ao movimento sanitário, em favor 
da mudança dos modelos de atenção e gestão nas práticas de saúde, defesa da 
saúde coletiva, equidade na oferta dos serviços, e protagonismo dos trabalhadores e 
usuários dos serviços de saúde nos processos de gestão e produção de tecnologias 
de. 
O ano de 1978 marca o início efetivo do movimento social pelos direitos dos 
pacientes psiquiátricos no Brasil. O Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental 
(MTSM), formado por trabalhadores integrantes do movimento sanitário, associações 
de familiares, sindicalistas, membros de associações de profissionais e pessoas com 
longo histórico de internações psiquiátricas, surge neste ano (CARMO, 2013). 
É sobretudo este Movimento que passa a protagonizar e a construir a partir 
deste período a denúncia da violência dos manicômios, da mercantilização 
da loucura, da hegemonia de uma rede privada de assistência e a construir 
coletivamente uma crítica ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo 
hospitalocêntrico na assistência às pessoas com transtornos mentais 
(BRASIL, 2005, apud OLIVEIRA, 2011, p.11). 
Em 1987 foi inaugurado o primeiro CAPS do Brasil, na cidade de São Paulo: 
Centro de Atenção Psicossocial Professor Luiz da Rocha Cergueira, conhecido 
como CAPS da Rua Itapeva. Em 1987 aconteceu em Bauru, SP o II Congresso 
Nacional do MTSM que adotou o lema “Por uma sociedade sem manicômios”. Neste 
mesmo ano, é realizada a I Conferência Nacional de Saúde Mental no Rio de Janeiro. 
Em 1989 a Secretaria Municipal de Saúde de Santos (SP) deu início há um processo 
de intervenção em um hospital psiquiátrico, a Casa de Saúde Anchieta, local de maus-
tratos e mortes de pacientes. É esta intervenção, com repercussão nacional, que 
demonstrou a possibilidade de construção de uma rede de cuidados efetivamente 
substitutiva ao hospital psiquiátrico (BARCELLOS, 2018). 
 
20 
5.1 A regulamentação da atenção psicossocial em saúde mental no Brasil 
No ano de 1989, dá entrada no Congresso Nacional o Projeto de Lei do deputado 
Paulo Delgado (PT/MG), que propõe a regulamentação dos direitos da pessoa com 
transtornos mentais e a extinção progressiva dos manicômios no país. A partir do ano 
de 1992, os movimentos sociais, inspirados pelo Projeto de Lei Paulo Delgado, 
conseguem aprovar em vários estados brasileiros as primeiras leis que determinam a 
substituição progressiva dos leitos psiquiátricos por uma rede integrada de atenção à 
saúde mental. A partir deste período a política do Ministério da Saúde paraa saúde 
mental começa a ganhar contornos mais definidos (BRASIL, 2005). 
Na década de 90 é realizada a II Conferência Nacional de Saúde Mental e passam 
a entrar em vigor no país as primeiras normas federais regulamentando a implantação 
de serviços de atenção diária, fundadas nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS 
e Hospitais-dia, e as primeiras normas para fiscalização e classificação dos hospitais 
psiquiátricos (BRASIL, 2005). 
Os NAPS/CAPS foram criados oficialmente a partir da Portaria GM 224/92 que 
regulamentou o funcionamento de todos os serviços de saúde mental em acordo com 
as diretrizes de descentralização e hierarquização das Leis Orgânicas do Sistema 
Único de Saúde. Essa Portaria define os NAPS/CAPS como unidades de saúde 
locais/regionalizadas que contam com uma população definida pelo nível local e que 
oferecem atendimento de cuidados intermediários entre o regime ambulatorial e a 
internação hospitalar; podem constituir-se também em porta de entrada da rede de 
serviços para as ações relativas à saúde mental e atendem também a pacientes 
referenciados de outros serviços de saúde, dos serviços de urgência psiquiátrica ou 
egressos de internação hospitalar (BRASIL, 2005). 
A Portaria GM 224/92 proíbe a existência de espaços restritivos e exige que seja 
resguardada a inviolabilidade da correspondência dos pacientes internados e feito o 
registro adequado dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos efetuados nos 
pacientes. As novas normatizações do Ministério da Saúde de 1992, embora 
regulamentassem os novos serviços de atenção diária, não instituíam uma linha 
específica de financiamento para os CAPS e NAPS; e as normas para fiscalização e 
classificação dos hospitais psiquiátricos não previam mecanismos sistemáticos para 
a redução de leitos. O processo de redução de leitos em hospitais psiquiátricos e de 
desinstitucionalização de pessoas com longo histórico de internação ganha impulso 
 
21 
em 2002 com uma série de normatizações do Ministério da Saúde, que instituem 
mecanismos para a redução de leitos psiquiátricos a partir dos macros hospitais. 
(BRASIL, 2005). 
A Portaria/GM nº 106 de 11 de fevereiro de 2000 institui os Serviços Residenciais 
Terapêuticos definidos como moradias ou casas inseridas, preferencialmente, na 
comunidade, destinadas a cuidar dos portadores de transtornos mentais, egressos de 
internações psiquiátricas de longa permanência, que não possuam suporte social e 
laços familiares e, que viabilizem sua inserção social. (BRASIL, 2005). 
A Portaria 106 propõe as Residências Terapêuticas como uma modalidade 
assistencial substitutiva da internação psiquiátrica prolongada, sendo que a cada 
transferência de paciente do Hospital Especializado para o Serviço de Residência 
Terapêutica será reduzido ou descredenciado do SUS, igual n.º de leitos naquele 
hospital (BARCELLOS, 2018). 
É somente no ano de 2001 que a Lei Paulo Delgado (Lei 10.216) é sancionada 
no país. A aprovação, no entanto, é de um substitutivo do Projeto de Lei original, que 
traz modificações importantes no texto normativo. A Lei Federal 10.216 dispõe sobre 
a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona 
o modelo assistencial em saúde mental, privilegiando o oferecimento de tratamento 
em serviços de base comunitária, mas não institui mecanismos claros para a 
progressiva extinção dos manicômios. (BARCELLOS, 2018). 
Ao final do ano de 2001, em Brasília, é convocada logo após a promulgação da 
lei 10.216 a III Conferência Nacional de Saúde Mental, dispositivo fundamental de 
participação e de controle social.A promulgação da lei 10.216 impõe novo impulso e 
novo ritmo para o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil. É no contexto da 
promulgação da lei 10.216 e da realização da III Conferência Nacional de Saúde 
Mental, que a política de saúde mental do governo federal, alinhada com as diretrizes 
da Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se, ganhando maior sustentação e 
visibilidade (BARCELLOS, 2018). 
Linhas específicas de financiamento são criadas pelo Ministério da 
Saúde para os serviços abertos e substitutivos ao hospital psiquiátrico e 
novos mecanismos são criados para a fiscalização, gestão e redução 
programada de leitos psiquiátricos no país. (BRASIL, 2005, apud KOYAMA, 
2009, p. 5). 
 
22 
No Relatório Final da III Conferência é inequívoco o consenso em torno das 
propostas da Reforma Psiquiátrica, e são pactuados os princípios, diretrizes e 
estratégias para a mudança da atenção em saúde mental no Brasil. Desta forma, esse 
evento consolida a Reforma Psiquiátrica como política de governo, confere aos CAPS 
o valor estratégico para a mudança do modelo de assistência, defende a construção 
de uma política de saúde mental para os usuários de álcool e outras drogas, e 
estabelece o controle social como a garantia do avanço da Reforma Psiquiátrica no 
país. (BARCELLOS, 2018). 
A Portaria/GM 336 de 19 de fevereiro de 2002 estabeleceu as modalidades dos 
Centros de Atenção Psicossocial como CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPS AD E 
CAPSi, definindo-os por ordem crescente de porte/complexidade e abrangência 
populacional. A Portaria/GM nº 251 de 31 de janeiro de 2002 estabelece diretrizes e 
normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, reclassifica os hospitais 
psiquiátricos, define e estrutura a porta de entrada para as internações psiquiátricas 
na rede do SUS. Estabelece ainda que os hospitais psiquiátricos integrantes do SUS 
deverão ser avaliados por meio do PNASH – Programa Nacional de Avaliação do 
Sistema Hospitalar/Psiquiatria (BARCELLOS, 2018). 
A Lei Nº 10.708 de 31 de julho de 2003 institui o auxílio-reabilitação psicossocial 
para assistência, acompanhamento e integração social, fora de unidade hospitalar, de 
pacientes acometidos de transtornos mentais, internados em hospitais ou unidades 
psiquiátricas. O auxílio é parte integrante de um programa de ressocialização de 
pacientes internados em hospitais ou unidades psiquiátricas, denominado "De Volta 
Para Casa", sob coordenação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2005). 
A Portaria nº 52, de 20 de janeiro de 2004 institui o Programa Anual de 
Reestruturação da Assistência Psiquiátrica Hospitalar no SUS – 2004. Propõe que o 
processo de mudança do modelo assistencial deve ser conduzido de modo a garantir 
uma transição segura, onde a redução dos leitos hospitalares possa ser planificada e 
acompanhada da construção concomitante de alternativas de atenção no modelo 
comunitário (BRASIL, 2005). 
O Programa Nacional de Avaliação do Sistema Hospitalar/Psiquiatria 
(PNASH/Psiquiatria); o Programa Anual de Reestruturação da Assistência Hospitalar 
Psiquiátrica no SUS (PRH); a instituição do Programa de Volta para Casa e a 
expansão de serviços como os Centros de Atenção Psicossocial e as Residências 
 
23 
Terapêuticas, permitiram a redução de leitos psiquiátricos no país e o fechamento de 
vários hospitais psiquiátricos (BRASIL, 2005). 
Em 2004 foi realizado em São Paulo o primeiro Congresso Brasileiro de Centros 
de Atenção Psicossocial, reunindo dois mil trabalhadores e usuários de CAPS. Em 
fevereiro de 2005 a Portaria nº 245 destina incentivo financeiro para implantação de 
Centros de Atenção Psicossocial e a Portaria nº 246 destina incentivo financeiro para 
implantação de Serviços Residenciais Terapêuticos. (BRASIL, 2005). 
A Portaria nº 1.876 de 14 de agosto de 2006 instituiu Diretrizes Nacionais para 
Prevenção do Suicídio, a serem implantadas em todas as unidades federadas, 
respeitadas as competências das três esferas de gestão. E a Lei 11343 de 23 de 
agosto de 2006 institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - 
Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção 
social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à 
produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimese dá outras 
providências. (BRASIL, 2005). 
5.2 O papel estratégico dos CAPS na atenção à saúde mental no Brasil 
Os Centros de Atenção Psicossocial dentro da atual política de saúde mental do 
Ministério da Saúde são considerados dispositivos estratégicos para a organização 
da rede de atenção em saúde mental. Com a criação desses centros, possibilita-se a 
organização de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico no país (LEAL; 
ANTONI, 2013). 
Esses dispositivos foram criados para organizar a rede municipal de atenção a 
pessoas com transtornos mentais severos e persistentes. Os CAPS são serviços de 
saúde municipais, abertos, comunitários que oferecem atendimento diário. Eles 
devem ser territorializados, devem estar circunscritos no espaço de convívio social 
(família, escola, trabalho, igreja, etc.) daqueles usuários que os frequentam. Deve ser 
um serviço que resgate as potencialidades dos recursos comunitários à sua volta, pois 
todos estes recursos devem ser incluídos nos cuidados em saúde mental. A 
reinserção social pode se estruturar a partir do CAPS, mas sempre em direção à 
comunidade (LEAL; ANTONI, 2013) 
Seu objetivo segundo o referido autor é oferecer atendimento à população, 
realizar o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao 
 
24 
trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e 
comunitários. 
O CAPS, assumindo um papel estratégico na organização da rede 
comunitária de cuidados, farão o direcionamento local das políticas e 
programas de Saúde Mental desenvolvendo projetos terapêuticos e 
comunitários, dispensando medicamentos e acompanhando usuários que 
moram em residências terapêuticas, assessorando e sendo retaguarda para 
os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e para a Estratégia Saúde da 
Família (ESF) no cuidado familiar (BRASIL, 2004, apud KOYAMA, 2009, p.5). 
As práticas realizadas nos CAPS se caracterizam por ocorrerem em ambiente 
aberto, acolhedor e inserido na cidade, no bairro. Os projetos desses serviços, muitas 
vezes, ultrapassam a própria estrutura física, em busca da rede de suporte social, 
potencializadora de suas ações, preocupando-se com o sujeito e sua singularidade, 
sua história, sua cultura e sua vida quotidiana (BRASIL, 2005). 
Todo o trabalho desenvolvido no CAPS deverá ser realizado em um “meio 
terapêutico”, isto é, tanto as sessões individuais ou grupais como a convivência no 
serviço têm finalidade terapêutica. Isso é obtido através da construção permanente de 
um ambiente facilitador, estruturado e acolhedor, abrangendo várias modalidades de 
tratamento. Ao iniciar o acompanhamento no CAPS se traça um projeto terapêutico 
com o usuário e, em geral, o profissional que o acolheu no serviço passará a ser uma 
referência para ele (BRASIL, 2005). 
Cada usuário de CAPS deve ter um projeto terapêutico individual. Caracterizado 
como um conjunto de atendimentos que respeite a sua particularidade, que 
personalize o atendimento de cada pessoa na unidade e fora dela e proponha 
atividades durante a permanência diária no serviço, segundo suas necessidades, 
potencialidades e limitações (BRASIL, 2005). 
A depender do projeto terapêutico do usuário do serviço, o CAPS poderá 
oferecer, conforme as determinações da Portaria GM 336/02: atendimento Intensivo; 
atendimento Semi-Intensivo e atendimento Não-Intensivo. O processo de construção 
dos serviços de atenção psicossocial tem revelado outras realidades: as teorias e os 
modelos prontos de atendimento vão se tornando insuficientes frente às demandas 
das relações diárias com o sofrimento e a singularidade desse tipo de atenção. É 
preciso criar, observar, escutar, estar atento à complexidade da vida das pessoas, que 
é maior que a doença ou o transtorno (BRASIL, 2005). 
 
25 
Para tanto, é necessário que, ao definir atividades, como estratégias 
terapêuticas nos CAPS, se repensem os conceitos, as práticas e as relações 
que podem promover saúde entre as pessoas: técnicos, usuários, familiares 
e comunidade. Todos precisam estar envolvidos nessa estratégia, 
questionando e avaliando permanentemente os rumos da clínica e do serviço 
(BRASIL, 2004, apud GUSSI, 2017, p.1). 
Quando uma pessoa é atendida em um CAPS, ela tem acesso a vários recursos 
terapêuticos: atendimento individual; atendimento em grupo; atendimento para a 
família; atividades comunitárias; Assembleias ou Reuniões de Organização do 
Serviço. Dessa forma, o CAPS pode articular cuidado clínico e programas de 
reabilitação psicossocial. Os projetos terapêuticos devem incluir a construção de 
trabalhos de inserção social, respeitando as possibilidades individuais e os princípios 
de cidadania que minimizem o estigma e promovam o protagonismo de cada usuário 
frente à sua vida. Todas as ações e atividades realizadas no CAPS devem se 
estruturar de forma a promover as melhores oportunidades de trocas afetivas, 
simbólicas, materiais, capazes de favorecer vínculos e interação humana (LEAL; 
ANTONI,2013). 
O Conselho Federal de Psicologia (CFP) por meio do Centro de Referência 
Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP) em relatório sobre a atuação 
dos psicólogos nos Centros de Atenção Psicossocial fala sobre as principais 
dificuldades enfrentadas no trabalho nos CAPS (FILHO, SILVEIRA, 2018). 
Dentre os principais problemas apontados pela pesquisa estão: a ausência de 
políticas locais (estaduais e municipais) e de investimentos nos CAPS e nos 
equipamentos de saúde mental; dificuldades na articulação com o Ministério da 
Saúde; em algumas regiões os municípios ainda estão com muitas dificuldades em 
implantar e administrar os Centros; a falta de recursos; a permanência de um modelo 
de atenção centrado na figura do médico; resistência por parte de alguns psiquiatras, 
que se posicionam como contrários ao movimento da Reforma Psiquiátrica por medo 
de perder espaço; a dificuldade de realizar atividades extramuros (FILHO, SILVEIRA, 
2018). 
Em todos os relatos da pesquisa a questão da desarticulação ou mesmo 
inexistência de uma rede ampliada de atenção aos usuários dos CAPS foi apontada 
como uma das grandes dificuldades do trabalho neste contexto. Enfrenta-se a falta de 
integração entre os serviços existentes; dificuldades na atribuição das competências 
e atribuições de cada unidade de saúde; ausência de uma rede articulada (uma 
 
26 
estratégia utilizada para o encaminhamento é o uso das relações entre os 
profissionais das diferentes instituições). Os relatos indicam que o CAPS é referência 
para outros serviços, porém há muita dificuldade de que estes serviços funcionem 
como referência para os CAPS. (FILHO, SILVEIRA, 2018). 
A ausência de uma rede de serviços de atenção à saúde mental da criança foi 
apontada como uma das dificuldades do trabalho em CAPS infantil. Problemas 
também foram relatadas especificamente no atendimento a usuários de álcool e 
drogas, como por exemplo a falta de uma rede de suporte para internação dos casos 
que necessitam de internação para desintoxicação em hospital geral (FILHO, 
SILVEIRA, 2018). 
Em alguns CAPS falta estrutura física adequada, recursos materiais, recursos 
humanos. A falta de acessibilidade nos locais onde estão alguns CAPS, dificulta a 
locomoção de pessoas portadoras de algum tipo de necessidade especial. Além disso, 
há locais que não são adequados para garantir a qualidade dos atendimentos (FILHO, 
SILVEIRA, 2018). 
A não adesão ao tratamento e às atividades oferecidas pelo serviço aparece como 
um desafio que necessita ser superado. Existem ainda as dificuldades relativas aos 
familiares e à sociedade. É preciso orientar constantemente as famílias para que 
essas possam auxiliar na continuidade do tratamento. (FILHO, SILVEIRA, 2018). 
De acordo com os referidos autores há ainda a questão do estigma associado aos 
transtornos mentais e aos preconceitos que circulam na sociedade relacionadosaos 
portadores de problemas de saúde. A cultura “hospitalocêntrica” também é muito forte 
e se torna um desafio para os profissionais que atuam em CAPS. 
Os profissionais da saúde presentes nos serviços substitutivos ainda 
carregariam consigo os mesmos paradigmas das instituições psiquiátricas. 
Esse fato, segundo os autores, se expressaria em parte através das 
dificuldades apresentadas em referenciar os usuários para o serviço 
substitutivo demonstrando a possibilidade de um desejo de permanência por 
parte do hospital psiquiátrico na posição de poder historicamente construída. 
(PRAZERES, 2005, apud Moura, 2009, p.5). 
Os principais obstáculos verificados nessa passagem incluem dificuldades para 
superação do paternalismo, o recuperado tem dificuldades para encontrar emprego e 
geralmente há a volta para a mesma dinâmica familiar e social que o levou ao 
manicômio. As novas políticas em saúde mental devem objetivar bem mais que o 
 
27 
fechamento dos manicômios. Devem buscar visualizar e romper com as barreiras 
impostas pela própria sociedade (RODRIGUES, 2012). 
O doente mental, entretanto, enquanto inserido socialmente perderia suas 
características incompreensíveis à maioria da população na proporção em que sua 
própria enfermidade fosse parte de um contexto onde seriam respeitadas sua 
existência e suas razões. É preciso pensar na reforma psiquiátrica como um 
movimento social mais amplo, processo de desinstitucionalização do social onde é 
preciso produzir um olhar que abandona o modo de ver próprio da razão, abrir uma 
via de acesso à escuta qualificada da desrazão (RODRIGUES, 2012). 
A reforma deve buscar, antes de tudo, uma emancipação pessoal, social e 
cultural, que permita o não enclausuramentos de tantas formas de existência banidas 
do convívio social e que permita um olhar mais complexo que o generalizante olhar 
do igualitarismo de forma a buscar o convívio livre e tolerante com a diferença. 
Os primeiros passos para uma real reforma psiquiátrica implicam um 
imprescindível abandono do lugar de especialista ocupado por vários dos 
atores sociais envolvidos com a reforma. Este percurso requer atenção 
especial para as pequenas amarras responsáveis pela reprodução de 
valores, preconceitos, atrelados às ideias de controle, fixidez, identidade, 
normatização, subjugação. (ALVERGA, 2006, apud Moura, 2009, p.7). 
A pessoa com transtorno mental apresenta formas anticonvencionais de fazer-
estar no mundo, sendo parte de uma minoria. A declaração universal dos direitos 
humanos prevê a ampla e irrestrita aplicação de seus princípios, entretanto, existe 
ainda a necessidade da implantação de leis que assegurem direitos universais aos 
ditos loucos. (RODRIGUES, 2012). 
Requer-se antes de tudo um abandono do lugar de especialista ocupado por 
vários dos atores sociais envolvidos com a reforma. Este percurso exige atenção 
especial para as pequenas amarras responsáveis pela reprodução de valores, 
preconceitos, atrelados às ideias de controle, fixidez, identidade, normatização, 
subjugação. E a real mudança de postura se faz necessária para evitar a simples 
transposição de atitudes profissionais ligadas ao modelo hospitalar para o modelo de 
atenção primária (RODRIGUES, 2012). 
É preciso entender o processo histórico que invalidou a loucura como 
manifestação subjetiva humana. Deve-se caminhar no sentido de compreender a 
mesma como uma forma de subjetividade válida, onde o maior desafio da reforma é 
 
28 
sua despatologização. O processo de mudança de papéis se dá de forma lenta e 
gradual, mas os movimentos para tantos já foram iniciados (LEAL, ANTONI, 2013). 
A formação dos profissionais inseridos no campo da saúde mental deve ter 
como objetivo a transformação das práticas profissionais na perspectiva da 
desinstitucionalização. Os princípios do SUS e da reforma psiquiátrica foram 
construídos para superar um modelo desumano baseado em medidas excludentes, 
hospitalocêntricas. Isso implica na necessidade de um processo de formação 
profissional mais contextualizado, com ênfase em medidas de promoção, prevenção 
e reabilitação, levando em conta as dimensões sociais, econômicas e culturais da 
população (LEAL, ANTONI, 2013). 
Construir novas formas de atenção de lidar com a loucura e o sofrimento 
psíquico implica em romper com o modelo biomédico – influenciado pela abordagem 
biológica, individualista e a-histórica - e assumir o modelo psicossocial, que impele a 
uma abordagem mais complexa, incorporando a influência dos aspectos 
macrossociais ao fenômeno loucura e isso implica, obrigatoriamente, um repensar os 
processos de formação dos diferentes atores envolvidos nesse processo (LEAL, 
ANTONI, 2013). 
De modo geral, segundo Rodrigues (2012) as transformações propostas pelo 
complexo campo da Reforma Psiquiátrica brasileira apresentam grandes desafios, 
especialmente aos profissionais de saúde que cotidianamente têm a tarefa de 
expandir e consolidar essa mudança. Apesar dos avanços, na prática, os 
profissionais, nem sempre conseguem deixar de ter como foco principal o controle dos 
sintomas, dos corpos e das vontades de pessoas diagnosticadas como portadoras de 
transtornos mentais e a mudança de tal postura passa pela universidade, grande 
responsável pela formação profissional e que também precisa rever seu papel. 
 
29 
6 A NOVA CLASSIFICAÇÃO AMERICANA PARA OS TRANSTORNOS MENTAIS 
– O DSM-5 
 
Fonte: dynamicinstitute.com 
Na contemporaneidade há um número exorbitante de pessoas diagnosticadas 
com transtornos mentais em todas as partes do mundo. 
A história contada para a sociedade é a de que a psiquiatria havia progredido 
no tratamento dos transtornos mentais, os pesquisadores estariam 
descobrindo as causas biológicas destes transtornos e a indústria 
farmacêutica havia desenvolvido medicamentos eficazes para o tratamento. 
(WHITAKER, 2011, apud MARTINHAGO, 2019, p. 74). 
Porém, ao fazer uma análise da incidência de transtornos mentais dos últimos 
50 anos, Whitaker (2011) constatou que há uma verdadeira epidemia de transtornos 
mentais. Esta epidemia instiga pesquisadores de diversas áreas do conhecimento a 
investigarem como chegamos a tal fenômeno no século XXI. Assim, buscamos 
delinear a trajetória histórica das classificações em psiquiatria, do século XIX até a 
atualidade. Desde a metade do século XIX, inicia-se uma nova forma de compreender 
e lidar com as doenças mentais. 
Os delírios, alucinações, atos violentos deixam de ser o foco da atenção e 
busca-se elaborar classificações de comportamentos e condutas que ocorrem na vida 
cotidiana dos sujeitos. Deste modo, vários comportamentos passam a ser 
considerados como desviantes e objeto de estudo e práticas médicas (CAPONI, 
2012). No período que corresponde a segunda metade do século XIX e início do 
 
30 
século XX, surgem as estratégias de intervenção e de gestão das populações 
relacionadas à teoria da degeneração de Morel, cuja proposta é criar uma 
classificação das doenças mentais. 
A ideia era “substituir uma classificação sintomática por uma classificação 
etiológica das doenças mentais, pois somente com a determinação das 
causas poderiam ser elaborados um sistema classificatório de patologias e 
uma terapêutica adequada” (CAPONI, 2012, apud MARTINHAGO, 2019, p. 
75). 
Emil Kraepelin, no fim do século XIX e início do século XX, foi considerado o 
grande sistematizador da psicopatologia descritiva, quem consolidou a propensão 
nosológica. No período de 30 anos, houve oito edições do seu Manual de psiquiatria, 
sendo que todas apresentaram alterações nosológicas. Na perspectiva de Kraepelin, 
tratava-se de distinguir os diversos modos de sofrimento mental com base na clínica, 
que assim teriam o mesmo estatuto das doenças físicas que a medicina tratava 
(CAPONI, 2014). 
O intuito de Kraepelin segundo o referido autor foi criar classificações de 
patologias psiquiátricas de modo que servissemcomo referência para a formação dos 
profissionais. As novas edições do Manual apresentavam ajustes, novos grupos de 
patologias, diagnósticos mais precisos, fundamentados nas descobertas científicas no 
campo da neurologia, das doenças cerebrais, da estatística médica, bem como 
estudos sobre herança. 
Nos Estados Unidos, o principal objetivo para desenvolver uma classificação 
de transtornos mentais era obter informações estatísticas. A primeira tentativa foi em 
1840 a partir da medição da frequência de duas categorias - idiotice e insanidade – 
com a finalidade de constituir o Censo (VIANA, 2011). 
Para o Censo do ano de 1880, haviam estabelecido sete categorias – mania, 
melancolia, monomania, paresia, demência, alcoolismo e epilepsia -, com o 
propósito de organizar o sistema asilar (APA, 2016, apud MARTINHAGO, 
2019, p. 76). 
A última classificação que antecede o primeiro Manual Diagnóstico e Estatístico 
de Transtornos Mentais (conhecido como DSM, devido ao título original em inglês 
Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) surge em 1918, no Manual 
Estatístico para o Uso de Instituições de Insanos, com 22 categorias, entre elas, 
destacam-se a Psicose, Melancolia, Demência Precoce, Paranoia, Psiconeuroses e 
Neuroses (VIANA, 2011). 
 
31 
Até a Segunda Guerra Mundial, a psicanálise e a psiquiatria perpetuaram um 
sistema de trocas, o qual promoveu o progresso da psicopatologia, abarcou 
importações conceituais, criou campos de confluência metodológica, mutualismos 
diagnósticos, derivações semiológicas e hipóteses etiológicas. No período entre os 
anos de 1900-1950, a psicanálise fundamentou a classificação norte-americana das 
doenças mentais, principalmente, com base nos conceitos de personalidade, estrutura 
e psicodinâmica (VIANA, 2011). 
6.1 A história dos sistemas de classificação 
Segundo Caponi (2014) a busca pelo conhecimento é uma característica 
fundamentalmente humana. Desde os tempos pré-históricos o homem tenta 
compreender, prever e controlar a natureza que o cerca. Hipócrates, quatro séculos 
antes de Cristo, é reconhecido no mundo ocidental como quem primeiro buscou 
descrever e categorizar quadros clínicos diagnosticáveis através da observação, 
prática que ficou conhecida como “método hipocrático”. Toda a história da Medicina é 
marcada por esse raciocínio clínico em que identificar e agrupar enfermidades que 
compartilham dos mesmos sinais e sintomas é a base para se buscar a origem desses 
males, prever sua evolução e buscar meios de tratamento. 
No campo da saúde mental, podemos atribuir ao psiquiatra alemão Emil Kraepelin 
(1856-1926) o desenvolvimento do primeiro sistema de classificação que, norteado 
por uma visão fenomenológica, considerava a origem orgânica das doenças 
psiquiátricas. Através de sua observação clínica, Kraepelin buscou identificar padrões 
de sintomas que permitissem a construção de diagnósticos sindrômicos. Em seu 
tratado, refutou a ideia de uma psicose única e apresentou o quadro de “Demência 
precoce”, distinguindo-o da “Psicose maníaco-depressiva” (CAPONI, 2014). 
Segundo o referido autor a aplicação de métodos de classificação tem utilidades 
distintas, de acordo com o foco que se dá ao objeto estudado. Na Medicina, as 
ferramentas de classificação podem ser empregadas com objetivo clínico, científico e 
estatístico. É fundamental que se tenha clareza sobre o tipo de informação que se 
pode obter com cada método, evitando assim a formulação de juízos distorcidos. 
 
32 
6.2 A história do DSM 
Em 1840, os EUA empreenderam um censo que contava com a categoria 
“idiotia/loucura”, procurando registrar a frequência de doenças mentais. Já no censo 
de 1880, as doenças mentais eram divididas em sete categorias distintas (mania, 
melancolia, monomania, paresia, demência, dipsomania e epilepsia). Observa-se 
assim que as primeiras classificações norte-americanas de transtornos mentais 
aplicadas em larga escala tinham objetivo primordialmente estatístico. No início do 
século XX o Exército norte-americano, juntamente com a Associação de Veteranos, 
desenvolveu uma das mais completas categorizações para aplicação nos 
ambulatórios que prestavam atendimento a ex-combatentes (VIANA, 2011). 
Em 1948, sob forte influência desse instrumento, a Organização Mundial da 
Saúde (OMS) incluiu pela primeira vez uma seção destinada aos Transtornos Mentais 
na sexta edição de seu sistema de Classificação Internacional de Doenças – cid-6. A 
primeira edição do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM) foi 
publicada pela Associação Psiquiátrica Americana (APA) em 1953, sendo o primeiro 
manual de transtornos mentais focado na aplicação clínica (CAPONI, 2014). 
Segundo o referido autor o DSM-I consistia basicamente em uma lista de 
diagnósticos categorizados, com um glossário que trazia a descrição clínica de cada 
categoria diagnóstica. Apesar de rudimentar, o manual serviu para motivar uma série 
de revisões sobre questões relacionadas às doenças mentais. O DSM-II, desenvolvido 
paralelamente com a cid-8, foi publicado em 1968 e era bastante similar ao DSM-I, 
trazendo discretas alterações na terminologia. 
Em 1980, a APA publicou a terceira edição do seu manual introduzindo 
importantes modificações metodológicas e estruturais que, em parte, se mantiveram 
até a recente edição. Sua publicação representou um importante avanço em termos 
do diagnóstico de transtornos mentais, além de facilitar a realização de pesquisas 
empíricas. O DSM-III apresentou um enfoque mais descritivo, com critérios explícitos 
de diagnóstico organizados em um sistema multiaxial, com o objetivo de oferecer 
ferramentas para clínicos e pesquisadores, além de facilitar a coleta de dados 
estatísticos. Revisões e correções foram promovidas sobre o manual, levando à 
publicação do DSM-III-R, em 1987 (CAPONI, 2014). 
A proliferação de pesquisas, revisões bibliográficas e testes de campo permitiu 
que, em 1994, a APA lançasse o DSM-IV. A evolução do manual representava um 
 
33 
aumento significativo de dados, com a inclusão de diversos novos diagnósticos 
descritos com critérios mais claros e precisos. Uma revisão dessa edição foi publicada 
em 2000 como DSM-IV-TR e foi formalmente utilizada até o início de 2013. (CAPONI, 
2014). 
7 O DSM-5 
Segundo Araújo e Neto (2013) o DSM-5, oficialmente publicado em 18 de maio 
de 2013, é a mais nova edição do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos 
mentais da Associação Psiquiátrica Americana. A publicação é o resultado de um 
processo de doze anos de estudos, revisões e pesquisas de campo realizados por 
centenas de profissionais divididos em diferentes grupos de trabalho. O objetivo final 
foi o de garantir que a nova classificação, com a inclusão, reformulação e exclusão de 
diagnósticos, fornecesse uma fonte segura e cientificamente embasada para sua 
aplicação em pesquisa e na prática clínica. Em seu aspecto estrutural o DSM-5 
rompeu com o modelo multiaxial introduzido na terceira edição do manual Os 
transtornos de personalidade e o retardo mental, anteriormente apontados como 
transtornos do Eixo II, deixaram de ser condições subjacentes e se uniram aos demais 
transtornos psiquiátricos no Eixo I. Outros diagnósticos médicos, costumeiramente 
listados no Eixo III, também receberam o mesmo tratamento. Conceitualmente não 
existem diferenças fundamentais que sustentem a divisão dos diagnósticos em Eixos 
I, II e III. 
O objetivo da distinção era apenas o de estimular uma avaliação completa e 
detalhada do paciente. Fatores psicossociais e ambientais (Eixo IV) continuam sendo 
foco de atenção, mas o DSM-5 recomendou que a codificação dessas condições fosse 
realizada com base no capítulo Fatores que Influenciam o Estado de Saúde e o 
Contato com os Serviços de Saúde (códigos Z00-Z99) da cid-10- cm. Por fim, a Escala 
de Avaliação Global do Funcionamento, anteriormente empregada noEixo V, foi 
retirada do manual. Por diversos motivos entendeu-se que a nota de uma única escala 
não transmite informações suficientes e adequadas para a compreensão global do 
paciente. A APA continua recomendando a aplicação das diversas escalas que 
possam contribuir com cada caso e apresenta algumas medidas de avaliação na 
Seção III do DSM-5 (ARAÚJO; NETO, 2014). 
 
34 
7.1 Transtornos do neurodesenvolvimento 
Seguindo a proposta de lançar um olhar longitudinal sobre o curso dos 
transtornos mentais, o DSM-5 excluiu o capítulo “Transtornos geralmente 
diagnosticados pela primeira vez na infância ou na adolescência”. Parte dos 
diagnósticos do extinto capítulo passou a compor os “Transtornos do 
neurodesenvolvimento”. Os critérios para Deficiência Intelectual enfatizaram que, 
além da avaliação cognitiva, é fundamental avaliar a capacidade funcional adaptativa. 
Os “Transtornos de comunicação” agrupam antigos diagnósticos com discretas 
alterações quanto à divisão e nomenclatura (ARAÚJO; NETO, 2014). 
Os Transtornos globais do desenvolvimento, que incluíam o Autismo, 
Transtorno desintegrativo da infância e as Síndromes de Asperger e Rett, foram 
absorvidos por um único diagnóstico, “Transtornos da gama do autismo”. A mudança 
refletiu a visão científica de que aqueles transtornos são na verdade uma mesma 
condição com gradações em dois grupos de sintomas: Déficit na comunicação e 
interação social; Padrão de comportamentos, interesses e atividades restritos e 
repetitivos (ARAÚJO; NETO, 2014). 
Segundo o autor supracitado, apesar da crítica de alguns clínicos que 
argumentam que existem diferenças significativas entre os transtornos, a APA 
entendeu que não há vantagens diagnósticas ou terapêuticas na divisão e observa 
que a dificuldade em subclassificar o transtorno poderia confundir o clínico dificultando 
um diagnóstico apropriado. Os critérios para o diagnóstico de Transtorno de déficit de 
atenção e hiperatividade (TDAH) são bastante similares aos do antigo manual. 
O DSM-5 manteve a mesma lista de dezoito sintomas divididos entre 
desatenção e hiperatividade/impulsividade. Os subtipos do transtorno foram 
substituídos por especificadores com o mesmo nome. Indivíduos até os dezessete 
anos de idade precisam apresentar seis dos sintomas listados, enquanto indivíduos 
mais velhos precisam de apenas cinco. A exigência de que os sintomas estivessem 
presentes até os sete anos de vida foi alterada. No novo manual, o limite é expandido 
para os doze anos de idade. Além disso, o DSM-5 permitiu que o TDAH e os 
Transtornos da Gama do Autismo sejam diagnosticados como transtornos 
comórbidos. Ambas as alterações provocam polêmica pelo risco de gerarem uma 
superestimativa com aumento da incidência de TDAH na população geral. No entanto, 
 
35 
a APA e outros diversos especialistas defendem a mudança como favorável. 
(ARAÚJO; NETO, 2014). 
Os Transtornos específicos da aprendizagem deixaram de ser subdivididos em 
transtornos de leitura, cálculo, escrita e outros, especialmente pelo fato de que 
indivíduos com esses transtornos frequentemente apresentam déficits em mais de 
uma esfera de aprendizagem. Encerrando o capítulo, tiques, movimentos 
estereotipados e Síndrome de Tourette foram organizados como Transtornos motores 
(ARAÚJO; NETO, 2014). 
7.2 Gama da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos 
Segundo Araújo e Neto (2014) o diagnóstico de Esquizofrenia sofreu alterações 
significativas nesta nova versão do DSM. O critério que define a sintomatologia 
característica (Critério A) continua requerendo a presença de no mínimo dois dos 
cinco sintomas para ser preenchido, mas a atual versão exige que ao menos um deles 
seja positivo (delírios, alucinações ou discurso desorganizado). Embora os sintomas 
listados sejam os mesmos, o DSM-IV permitia que o Critério A fosse preenchido com 
apenas um sintoma nos casos de delírios bizarros ou alucinações auditivas de 
primeira ordem/schneiderianas (exemplo: vozes conversando entre si) 
No DSM-5 essa exceção foi retirada por se considerar que a classificação de 
um delírio como bizarro é pouco confiável, especialmente por esbarrar em questões 
culturais, e a definição de sintomas schneiderianos é pouco específica. O DSM-5 
abandonou a divisão da esquizofrenia em subtipos: paranoide, desorganizada, 
catatônica indiferenciada e residual. Os subtipos apresentavam pouca validade e não 
refletiam diferenças quanto ao curso da doença ou resposta ao tratamento (ARAÚJO; 
NETO, 2014). 
O diagnóstico de Transtorno Esquizoafetivo sofreu uma pequena alteração em 
seu texto, sendo exigido que um episódio de alteração importante do humor 
(depressão ou mania) esteja presente durante a maior parte do curso da doença, após 
o preenchimento do Critério A de esquizofrenia. A mudança busca aumentar a 
confiabilidade do diagnóstico, apesar de reconhecer que ele ainda é um grande 
desafio para o clínico. Os critérios para o “Transtorno delirante” não exigem mais que 
os delírios apresentados não sejam bizarros. (ARAÚJO; NETO, 2014). 
 
 
36 
A demarcação entre o Transtorno Delirante e outras variantes psicóticas foi 
reforçada com a presença de critérios de exclusão que impedem que o diagnóstico 
seja efetuado na presença de quadros como o Transtorno obsessivo-compulsivo e o 
Transtorno dismórfico corporal. A catatonia não é mais apresentada como um subtipo 
da esquizofrenia ou uma classe independente. Na atual versão passa a ser dividida 
como: catatonia associada com outros transtornos mentais; catatonia associada com 
outras condições médicas; ou catatonia não-especificada (ARAÚJO; NETO, 2014). 
 Aceita-se que o quadro possa ocorrer em diversos contextos e o diagnóstico 
requer a presença de no mínimo três dos doze sintomas listados. O DSM-5 permite 
que a catatonia seja empregada como um especificador no Transtorno depressivo, 
“Transtorno bipolar e Transtornos psicóticos, ou diagnosticada de forma isolada no 
contexto de outras condições médicas (ARAÚJO; NETO, 2014). 
 
7.3 Transtorno bipolar e outros transtornos relacionados 
Os critérios diagnósticos para mania e hipomania no Transtorno bipolar passam 
a dar maior ênfase às mudanças no nível de atividades e na energia. O quadro misto 
deixa de ser um subtipo do Transtorno bipolar e se torna um especificador, com 
Características Mistas, que pode ser empregado inclusive na Depressão unipolar. O 
fato foi criticado por alguns especialistas como uma tentativa tendenciosa de conduzir 
o diagnóstico de qualquer transtorno de humor para o grupo bipolar(ARAÚJO; NETO, 
2014). 
No entanto, a APA argumenta que o objetivo da mudança é auxiliar o clínico 
para melhor adaptar seu tratamento, visto que os indivíduos com sintomas mistos 
podem apresentar diferenças no curso da doença e na resposta aos psicofármacos. 
O capítulo do DSM-5 incluiu outro novo especificador, com Ansiedade, empregado 
para descrever a presença de sintomas ansiosos que não fazem parte dos critérios 
diagnósticos do Transtorno bipolar. O especificador com Ansiedade também pode ser 
aplicado nos Transtornos Depressivos e descreve sintomas como tensão, inquietação, 
dificuldade de concentração devido a uma preocupação, medo de que algo terrível 
possa acontecer e sensação de perda de controle sobre si mesmo (ARAÚJO; NETO, 
2014). 
 
 
37 
7.4 Transtornos depressivos 
O capítulo dos Transtornos depressivos ganhou novos diagnósticos no DSM-
5, levantando discussões sobre a “patologização” de reações normais e a 
superestimativa do número de casos de depressão. O Transtorno disruptivo de 
desregulação do humor é um novo diagnóstico caracterizado por um temperamento 
explosivo com graves e recorrentes manifestações verbais ou físicas de agressividade 
desproporcionais, em intensidade ou duração, à situação ou provocação (ARAÚJO; 
NETO, 2014). 
Segundo os referidos autores os sintomas devem se manifestar ao menos três

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