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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS MESTRADO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS FATORES FINANCEIROS DETERMINANTES DO STRESS FISCAL DOS ESTADOS BRASILEIROS Igor Thierry Silva Donato Orientador: Prof. Dr. Severino Cesário de Lima NATAL – RN 2020 IGOR THIERRY SILVA DONATO FATORES FINANCEIROS DETERMINANTES DO STRESS FISCAL DOS ESTADOS BRASILEIROS Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-graduação em Ciências Contábeis da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Ciências Contábeis. Orientador: Prof. Dr. Severino Cesário de Lima Área de concentração: Mensuração e Evidenciação contábil. Linha de Pesquisa: Estudo dos impactos da contabilidade nas organizações e na sociedade. NATAL – RN 2020 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Donato, Igor Thierry Silva. Fatores financeiros determinantes do stress fiscal dos estados brasileiros / Igor Thierry Silva Donato. - 2020. 108f.: il. Dissertação (Mestrado em Ciências Contábeis) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais e Aplicadas, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis. Orientador: Prof. Dr. Severino Cesário de Lima. 1. Condição Financeira - Dissertação. 2. Fatores Financeiros - Dissertação. 3. Stress Fiscal - Dissertação. I. Lima, Severino Cesário de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/Biblioteca CCSA CDU 351:657 Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355 IGOR THIERRY SILVA DONATO FATORES FINANCEIROS DETERMINANTES DO STRESS FISCAL DOS ESTADOS BRASILEIROS Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-graduação em Ciências Contábeis da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito para a obtenção do título de Mestre em Ciências Contábeis. _____________________________________________________ Prof. Dr. Severino Cesário de Lima Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN (Presidente da Comissão - Orientador) COMISSÃO AVALIADORA _____________________________________________________ Prof. Dr. Alexandro Barbosa - UFRN (Avaliador Interno) _____________________________________________________ Prof. Dr. Josedilton Alves Diniz - UFPB (Avaliador Externo) In Memorian Ao meu Avô José Djacir Alencar Silva I AGRADECIMENTOS Agradeço, primeiramente, a Deus e a Maria Auxiliadora por sempre estarem junto comigo nos momentos mais difíceis me ouvindo, me ajudando e me dando a força necessária para eu continuar trilhando o meu caminho. Agradeço aos meus pais pelo dom da vida e por todo o apoio que me deram nos momentos mais difíceis que já enfrentei. A eles, que nunca desistiram de mim, pelo contrário, sempre acreditaram que seria possível, que era necessário eu perseverar com a cabeça erguida, com coragem e determinação para concluir mais essa etapa de minha vida. Sem sombra de dúvidas, eles são os pilares de todas as minhas conquistas até aqui. Agradeço a minha noiva, Rayane Cavalcanti Alves da Silva e minha filha Letícia Cavalcanti Donato pelo apoio incondicional, por entender todas as vezes que precisei me ausentar dos momentos familiares para me dedicar inteiramente aos estudos e a pesquisa. O meu maior agradecimento ao meu professor orientador, Severino Cesário de Lima, por primeiramente acreditar em mim, por me aceitar no processo de mudança de orientação e me dar oportunidade de pesquisar na área governamental. Acredito que nada é por acaso. Nesse processo tive a oportunidade de conhecer um dos meus maiores exemplos de pessoa, de educador e profissional contábil. A amizade construída nestes anos é de valia para mim. Muito obrigado Professor pela dedicação de tempo e de paciência. O senhor me inspira. Agradeço também aos meus amigos e professores Raimundo Marciano Neto e Luis Manuel Vieira, que dedicaram grande parte do seu tempo para que eu pudesse concluir este trabalho. A amizade construída nos últimos meses é de suma importância para minha vida. Agradeço à Drª Luciana Ribeiro Campos e a Julianne da Nóbrega Vilela por me ajudarem nessa e em tantas outras Jornadas. A minha equipe do Ministério Público de Contas junto ao TCE-RN, meu muito obrigado! Vocês foram peças chave para a conclusão deste trabalho. Agradeço a todos os outros familiares, amigos e mestres que de alguma maneira contribuíram na minha construção profissional e também neste trabalho. Foi uma caminhada árdua, mas de grande aprendizado. Meu muito obrigado, em especial, aos meus amigos da turma IV do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis - PPGCcon. II “Tive coragem de sonhar e de encarar meus sonhos. Agradeço aos céus por não ter sonhado em vão” Johan Dalgas Frish III RESUMO Segundo Trussel e Patrick (2018), na literatura sobre stress fiscal há três questões metodológicas: definir a existência de dificuldades financeiras, identificar suas causas e prever a probabilidade de ocorrência. Desta forma, é de fundamental importância estudos que desenvolvam modelos explicativos e preditivos do stress fiscal. Nos últimos anos, observou-se que alguns estados passaram por problemas em suas finanças públicas, como por exemplo, falta de pagamento aos servidores efetivos, aposentados, fornecedores e credores de dívidas. Estes fatos foram responsáveis pela má condição financeira dos estados ao ponto de alguns declararem situação de calamidade financeira ou stress fiscal. Diante disso, a originalidade deste estudo centra-se, em especial, na introdução de inovações na forma de definir a existência de stress fiscal para, em seguida, identificar as suas causas a partir de fatores financeiros e, finalmente, prever a probabilidade de ocorrência. O estudo analisou dados dos 26 estados brasileiros e do Distrito federal nos períodos de 2016 a 2019, utilizando-se da técnica de regressão logística com dados em painel em um modelo econométrico do tipo pooled com a inclusão de clusters. A variável dependente do modelo, representativa do stress fiscal, é uma variável binária para demonstrar a presença ou não do evento de stress fiscal dos estados, construída a partir de análise de conteúdo de informações autodeclaradas nos decretos e leis de calamidade financeira, nos relatórios da Secretária do Tesouro Nacional (STN), nos relatórios financeiros anuais e nos orçamentos. As variáveis independentes do estudo são representadas por indicadores das solvências financeiras de caixa, orçamentária e de longo prazo. Os resultados encontrados demonstram que os fatores financeiros do exercício atual e do exercício anterior, representados pelos restos a pagar, pela dívida de longo prazo e pelo gasto com pessoal, provocam stress fiscal nos estados brasileiros. Por outro lado, fatores de receitas tributárias e receitas de transferências do Fundo de Participação dos Estados-FPE do exercício atual reduzem o stress fiscal dos estados brasileiros. Os resultados encontrados nesta pesquisa são corroborados por estudos já incorporados à literatura, como por exemplo, os trabalhos de Shamsube Akoto (2004), Trussel e Patrick (2009), Gregori e Marattin (2015), Gorina et al. (2018) e Dantas Jr. et al. (2019). Palavras-Chave: Condição Financeira; Fatores Financeiros; Stress Fiscal IV ABSTRACT According to Trussel and Patrick (2018), there are three methodological issues that surface in the literature on financial distress: defining the existence, identifying the causes of financial distress and predicting the likelihood of financial distress. Thus, studies that develop explanatory and predictive models of fiscal stress are of fundamental importance. In recent years, it has been observed that some states have experienced problems in their public finances, for example, lack of payment to permanent employees, retirees and debt creditors. These facts were responsible for the poor financial condition of the states to the point that some declared a situation of financial calamity or fiscal stress. In view of this, the originality of this study is centered, in particular, on the introduction of innovations in the way of defining the existence of fiscal stress, then identify the causes of financial distress and, finally, predict the likelihood of occurrence. The study has analyzed data from the 26 Brazilian states and the Federal District in the periods from 2016 to 2019, using the logistic regression technique with panel data in a pooled econometric model with the inclusion of clusters. The dependent variable of the representative model of fiscal stress is a binary variable to demonstrate the presence or not of the state's fiscal stress event. It was built from content analysis of self-reported information in financial calamity decrees and laws, in reports of the Secretary of the National Treasury (STN), in annual financial reports and budgets. The independent variables are represented by indicators of cash, budgetary and long-term financial solvencies. The results demonstrate that the financial factors for the current and previous years, represented by the unpaid financial obligations, long-term debt and personnel expenses cause fiscal stress in Brazilian states. On the other hand, tax revenue and intergovernmental fiscal transfers from the States Participation Fund (FPE) for the current fiscal year decrease the probability of fiscal stress of Brazilian states. The results found in this research are corroborated by studies already incorporated into the literature, such as Shamsub and Akoto (2004), Trussel and Patrick (2009), Gregori and Marattin (2015), Gorina et al. (2018) and Dantas Jr. et al. (2019). Key words: Financial condition; Financial factors; Fiscal Stress 1 SUMÁRIO LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ................................................................. 3 LISTA DE TABELA ................................................................................................... 4 LISTA DE FIGURAS .................................................................................................. 5 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 6 1.1 Contextualização ................................................................................. 6 1.2 Objetivos geral e específicos ............................................................. 10 1.3 Originalidade e justificativa do estudo .............................................. 10 1.4 Contribuições .................................................................................... 11 1.5 Estrutura da Dissertação .................................................................... 12 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ...................................................................... 13 2.1 Teoria da Condição Financeira ......................................................... 13 2.1.1 Definição da Condição Financeira ................................................ 13 2.1.2 Fatores determinantes da Condição Financeira ............................ 14 2.1.3 Modelos de mensuração da Condição Financeira ........................ 20 2.2 Stress fiscal dos governos ................................................................. 27 2.2.1 Surgimento e principais estudos seminais .................................... 27 2.2.2 Conceitos de stress fiscal .............................................................. 32 2.2.3 Medidas do stress fiscal ................................................................ 35 2.2.4 Determinantes do stress fiscal ...................................................... 41 2.2.5 Estudos empíricos ......................................................................... 45 2.3 Posição fiscal dos estados brasileiros ................................................ 49 2.3.1 Posição quanto às despesas com pessoal ...................................... 50 2.3.2 Posição quanto aos restos a pagar ................................................. 52 2.3.3 Posição quanto à dívida de longo prazo ....................................... 53 2.3.4 Posição quanto à estrutura da receita ............................................ 55 3 METODOLOGIA ................................................................................................ 58 3.1 População, amostra e coleta de dados ............................................... 58 3.2 Definição das variáveis de interesse.................................................. 59 3.2.1 Variável dependente – Stress Fiscal ............................................. 59 2 3.2.2 Variáveis independentes – fatores financeiros ............................. 63 3.3 Modelo econométrico ........................................................................ 67 4 ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................................................................ 69 4.1 Estatística Descritiva ......................................................................... 69 4.2 Resultados do modelo de regressão logística .................................... 74 4.2.1 Resultados dos modelos com defasagem no tempo ...................... 79 5 CONCLUSÕES ................................................................................................... 82 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 86 APÊNDICE I ............................................................................................................. 93 APÊNDICE II ............................................................................................................ 95 APÊNDICE III ........................................................................................................... 96 APÊNDICE IV .......................................................................................................... 97 APÊNDICE V ............................................................................................................ 98 APÊNDICE VI .......................................................................................................... 99 APÊNDICE VII ....................................................................................................... 100 APÊNDICE VIII ...................................................................................................... 101 APÊNDICE IX ........................................................................................................ 102 3 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CAPAG – Capacidade de Pagamento (Modelo STN) CICA – Canadian Institute of Chartered Accountants DC – Endividamento DCL – Dívida Consolidada Líquida FINBRA – base de dados Finanças do Brasil FPE – Fundo de Participação dos Estados FPM – Fundo de Participação dos Municípios FTMS – Financial Trend Monitorin System GASB – Governmental Accounting Standards BoardGE –Grau de Endividamento GP – Gasto com Pessoal HFI – Horizontal Fiscal Imbalance IASB – International Accounting Standards Board IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). ICMA - International City/County Managers Association’s IL – Índice de liquidez IPSASB – International Public Sector Accounting Standards Board LRF – Lei Responsabilidade Fiscal MF – Ministério da Fazenda PAF – Programa de Ajuste Fiscal PC – Poupança Corrente PIB – Produto Interno Bruto RCL – Receita Corrente Líquida RFB – Receita Federal do Brasil RP– Restos a Pagar RRF – Regime de Recuperação Fiscal SICONFI – Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro STN – Secretaria do Tesouro Nacional VFG – Vertical Fiscal Gap VFI – Vertical Fiscal Imbalance 4 LISTA DE TABELA Tabela 1 – Indicadores de fatores ambientais explicativos da Condição Financeira Tabela 2 – Tipos de solvências financeiras Tabela 3 – Indicadores de mensuração da Condição Financeira segundo os fatores financeiros Tabela 4 – Indicadores do modelo de Brown (1993) Tabela 5 – Escala de avaliação da Condição Financeira Tabela 6 – Indicadores do modelo de Kleine et al. (2003) Tabela 7 – Indicadores do modelo da STN (2017) Tabela 8– Classificação da CAPAG, modelo da STN (2017) Tabela 19 - Regras para a determinação de sinais de perigo da dívida Tabela 10 – Classificação da situação financeira dos governos segundo o indicador de stress test Tabela 11 – Causas do stress fiscal Tabela 12 – Limites do gasto com pessoal na LRF Tabela 13 – Medidas do governo central para restrições aos estados Tabela 14 – Característica da variável qualitativa Tabela 15 – Regime de Recuperação Fiscal Tabela 16 – Relatórios de contragarantias honradas pela União Tabela 17– População do estudo Tabela 18 – Variáveis independentes Tabela 19 – Variáveis de controle Tabela 20 – Estatística descritiva Tabela 21 – Estatísticas descritivas dos estados com stress fiscal Tabela 22 – Estatísticas descritivas dos estados sem ocorrência de stress fiscal Tabela 23 – Matriz de correlação Tabela 24 – Teste VIF Tabela 25 – Resultado do Modelo 1 Tabela 26 – Modelo logístico com defasagem de um exercício Tabela 27 – Modelo logístico com defasagem de dois exercícios 5 LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Modelo de Groves e Valente (2003) Figura 2 – Sistema de alerta da Condição Financeira dos governos com base no modelo de Kleine et al. (2003) Figura 3 – Modelo geral de tensão fiscal Figura 4 – Panorama dos gastos com pessoal em 2020 Figura 5 – Obrigações financeiras pendentes dos estados em relação à Receita Total Figura 6 – Relação entre a Dívida Consolidada e a Receita Corrente Líquida Figura 7– Grau de dependência às transferências fiscais 6 1 INTRODUÇÃO 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO Atualmente, alguns estados brasileiros estão em destaques no noticiário nacional devido à situação de calamidade fiscal ou crise financeira declarada em decorrências de episódios de stress fiscal enfrentados por esses entes governamentais, caracterizados por eventos de deterioração das suas finanças. As dificuldades financeiras enfrentadas pelos estados são motivos de grande preocupação dos gestores públicos na medida em que restringem a capacidade dos governos fornecerem bens e serviços para atenderem as necessidades da comunidade. Consoante a Secretária do Tesouro Nacional (STN), órgão responsável pelo controle das finanças dos entes subnacionais, os estados brasileiros vêm percorrendo uma intensa trajetória de dificuldades fiscais, verificada desde meados de 2015. Ao decorrer dos últimos exercícios verifica-se que alguns estados conseguiram aprimorar suas finanças, enquanto outros agravaram ainda mais suas posições financeiras. Nesse sentido, os dados dos boletins publicados anualmente pela STN apontam os seguintes eventos responsáveis pelas dificuldades financeiras apresentadas pelos estados: elevado gasto com pessoal, aumento no nível da dívida pública, aumento no estoque de restos a pagar e dependência financeira do governo federal (STN, 2017, 2018, 2019 e 2020). Uma breve análise dos estados que adeririam totalmente ou parcialmente ao Programa de Ajuste Fiscal (PAF), criado em 1995 pela Resolução 162 do Conselho Monetário Nacional, verifica-se que seus planos de adesão foram fundamentados em problemas financeiros relacionados a pelo menos um desses eventos. No geral, foram observados que os limites máximos estabelecidos por lei para os gastos com pessoal e para com a dívida pública foram ultrapassados, além de sucessivos aumentos no estoque de restos a pagar. Associados a esses eventos, observou-se elevação do grau de dependência financeira a recursos do governo central. Segundo a literatura da Condição Financeira Governamental, a ocorrência desses eventos financeiros são potenciais determinantes da situação de stress fiscal dos governos subnacionais (ACIR, 1985; Shamsub e Akoto, 2004; Trussel e Patrick, 2009; Gregori e Marattin, 2015; Gorina et al., 2018; Zhang et al., 2017; Dantas Jr. et al., 2019). Estudos seminais voltados à explicação e previsão deste fenômeno, por meio da elaboração de modelos que auxiliem na identificação dos fatores determinantes do stress 7 fiscal, bem como na detecção das suas principais causas, tiveram início por volta das décadas de 70 e 80, com destaque aos trabalhos pioneiros desenvolvidos pela Advisory Commission on Intergovernmental Relation (ACIR, 1973) e Groves e Valente (1980). A ACIR, agência americana instituída em 1959 para estudar as relações intergovernamentais entre o governo federal e os governos subnacionais, desenvolveu um estudo em 1973, denominado City financial emergencies: the intergovernmental dimension, contendo os principais fatores característicos de emergências financeiras dos governos subnacionais. Os pesquisadores Groves e Valente (1980), em parceria com a International City/County Managers Association’s (ICMA), desenvolveram um estudo contendo um conjunto de indicadores para medir e avaliar a Condição Financeira dos governos locais, conhecido como Financial Trend Monitorin System (FTMS). O stress fiscal, segundo Kloha et al. (2005), refere-se ao fracasso dos governos em se adequarem aos padrões esperados quanto à posição operacional, à dívida e às necessidades e recursos da comunidade ao longo dos sucessivos anos. As dificuldades relacionadas com a posição operacional podem manifestar-se pela incapacidade de os governos efetuarem, tempestivamente, o pagamento da folha de pagamento dos seus servidores e outras obrigações correntes. Com relação à dívida, o fracasso dos governos sobressai pela dificuldade de honrar o serviço da dívida nos prazos estabelecidos pelos credores. No que concerne aos recursos e necessidades da comunidade, o stress fiscal é observado, respectivamente, quando os cidadãos enfrentam problemas de pagamento dos seus tributos e os governos falham em oferecer bens e serviços públicos de qualidade a sociedade. No entendimento de Hendrick (2011), o termo stress fiscal geralmente é aplicado para representar governos com severos déficits econômicos e baixa capacidade fiscal, culminando em alto nível de dificuldade para honrar suas obrigações de curto prazo. O stress fiscal é, portanto, caracterizado por problemas fiscais ou, na concepção da ACIR (1973), por emergências financeiras. Esse organismo entende que uma emergência financeira surge quando observam-se os seguintes eventos: (i) aumento de impostos ou corte de serviços; (ii) incapacidade dos cidadãos em pagar impostos, ocasionando dificuldades do governo em pagar suas obrigações; (iii) baixa renda da população; e (iv) default do governo em relação à dívidacontraída. Deste modo, no entendimento de Gorina et al. (2018), o stress fiscal é um dos segmentos do espectro da Condição Financeira. Assim, devido à complexidade em identificar uma medida, ou um conjunto de medidas, que determine o posicionamento de 8 um governo no continuum da Condição Financeira vários estudos têm buscado desenvolver preditores para indicar o quão próximo ou distante um governo está do stress fiscal. Em resumo, o stress fiscal representa dificuldades financeiras dos governos que afetam a sua Condição Financeira, notadamente, fatores ligados a receita ou a despesa que podem gerar deficiências no fornecimento de alguns serviços à comunidade. Assim, depreende-se que uma Condição Financeira deficitária é apontada como stress fiscal. Estudos sobre a Condição Financeira dos governos ganharam destaque após situações de dificuldades financeiras nos grandes entes subnacionais dos Estados Unidos. Sobre esse aspecto, Kloha et al. (2005) explicam que o exame da Condição Financeira se intensificou após as graves crises fiscais enfrentadas pelas cidades de Nova York e Cleveland em meados da década de 70, perdurando-se durante os anos de 1980, 1990 e 2000. A partir dessas décadas, vários estudos acadêmicos foram desenvolvidos no sentido de produzir modelos e indicadores de mensuração da Condição Financeira governamental, como os trabalhos de Berne e Schramm (1986); Clark e Chan (1990); Brown (1993); CICA (1997); Mead (2001); Miller (2001); Groves e Valente (1986); Groves, Valente e Nollenberg (2003); Honadle (2003); Hendrick (2004); Kloha, Weissert e Kleine (2005); Wang, Dennis e Tu (2007), dentre outros. Dentre esses estudos, destaca-se o trabalho seminal de Groves, Valente e Nollenberg (2003), no qual definem Condição Financeira como sendo a capacidade dos governos: (i) manterem o nível de serviços existentes oferecidos à população; (ii) resistirem a rupturas na economia local e regional; e (iii) atenderem às demandas populacionais de crescimento, declínio e mudança. Mais especificamente, os autores fundamentam a Condição Financeira governamental sob quatro dimensões de solvência: solvência de caixa, solvência orçamentária, solvência de longo prazo e solvência do nível de serviços. Os autores definem a solvência de caixa como a capacidade de um ente governamental gerar recursos suficientes para pagar suas contas a vencer em 30 ou 60 dias, ou seja, no curtíssimo prazo; a solvência orçamentária como a capacidade do governo em gerar receita suficiente no seu período orçamentário normal (curto prazo) para atender suas despesas e não incorrer em déficit; a solvência de longo prazo como a capacidade para pagar todos os custos, incluindo-se os gastos normais dos orçamentos anuais e os específicos a cada ano, como os gastos com a previdência; e a solvência do 9 nível de serviços como a capacidade do governo para oferecer serviços de saúde, segurança e bem-estar a comunidade no nível e qualidade que seus cidadãos desejam. Em virtude dos constantes problemas fiscais enfrentados pelos governos, alguns estudiosos buscaram examinar a situação financeira dos entes subnacionais em nível de stress fiscal na tentativa de identificar fatores determinantes dessa situação fiscal negativa. Entre esses estudos destacam-se: García-Sánchez et al. (2012, 2014), Stone et al. (2015), Gorina et al., (2017), Bisogno et al. (2017), Zhang, Gibson e Schafer (2017), Gorina et al. (2018), Singla e Stone (2018) e Bisogno et al. (2019). Em síntese, Shamsub e Akoto (2004) verificaram que a maioria dos estudos na área dedicam-se às causas do stress fiscal focando em fatores da condição econômica, ciclo dos negócios, fatores políticos e fiscais que estão fora do controle dos gestores públicos. No Brasil, estudos sobre a Condição Financeira governamental iniciaram a partir da obra de Lima e Diniz (2016), tendo-se intensificados com as deficiências financeiras dos estados que se agravaram nos últimos anos. Nesse período, destacam-se os trabalhos de Dantas Junior (2018), Dantas Junior et al (2019), Dantas (2018), Lira (2019) e Vieira, (2019). Consoante Pereira (2016), a União e os demais entes federados começaram a passar por problemas financeiros nas contas públicas em meados de 2011, sendo, de fato, concretizados no ano de 2014, agravando-se nos exercícios subsequentes. Nessa direção, Lira et al. (2018) apontam que esses problemas surgiram com a crise econômica instalada em todo o país que impactou negativamente o nível de serviços básicos ofertado à população, que deve ser oferecido continuamente e com eficiência. Diante do exposto, e considerando a necessidade de os gestores conhecerem e acompanharem aspectos associados a eventos financeiros característicos da condição de stress fiscal, esta pesquisa busca responder o seguinte questionamento: quais os fatores financeiros determinantes do stress fiscal dos estados brasileiros? Assim, é importante destacar que o desenvolvimento de estudos voltados à explicação e previsão deste fenômeno são essenciais para auxiliar na identificação dos fatores determinantes do stress fiscal dos governos subnacionais. No Brasil, os estudos nessa área ainda são incipientes, destacando-se os trabalhos pioneiros de Dantas Junior (2018) e Dantas Junior et al. (2019). 10 1.2 OBJETIVOS GERAL E ESPECÍFICOS Objetivo Geral: • Analisar os fatores financeiros determinantes do stress fiscal dos estados brasileiros. Objetivos Específicos: • Identificar os estados que apresentaram status de stress fiscal nos períodos de 2016 a 2019; • Analisar a influência dos indicadores das solvências financeiras de caixa, orçamentária e longo prazo sobre o stress fiscal dos governos estaduais; e • Construir um modelo explicativo e preditivo do stress fiscal dos estados brasileiros ajustado à realidade do país. 1.3 ORIGINALIDADE E JUSTIFICATIVA DO ESTUDO Segundo Trussel e Patrick (2018), a literatura sobre stress fiscal trata de três questões metodológicas: definir a existência, identificar as causas e prever a probabilidade de ocorrência. Desta forma, é de fundamental importância estudos que desenvolvam modelos explicativos e preditivos do stress fiscal. Nesse sentido, a originalidade desta Dissertação centra-se na ampliação do debate sobre a análise da Condição Financeira governamental no Brasil, em especial, introduzindo inovações na forma de identificar os estados em situação de stress fiscal a partir de eventos autodeclarados em relatórios financeiros, orçamentos, leis e decretos, bem como identificar as suas causas a partir de fatores financeiros associados às solvências de caixa, orçamentária e longo prazo; e, finalmente, prever a probabilidade de ocorrência. Assim, diante dos problemas fiscais que alguns governos subnacionais brasileiros veem enfrentando nos últimos anos, especificamente, os governos estaduais em dificuldades financeiras que estão deteriorando a sua saúde fiscal, notadamente, na 11 deterioração da base da receita e na deficiência no fornecimento de alguns serviços básicos à comunidade, justifica-se o desenvolvimento deste estudo. Desta forma, a importância deste estudo reside no fato de que ao se analisar os fatores financeiros e sua relação com o stress fiscal, os gestores públicos podem tomar decisões orçamentárias, de investimentos e de suprimento de bens e serviços públicos de forma racional visando a atender às reais necessidades da população, bem como buscar formas para favorecer a boa saúde financeira dos entes governamentais e minimizar os efeitos negativos oriundos da deterioração das contas públicas ocorrida nos últimos anos no Brasil. 1.4 CONTRIBUIÇÕES Este estudo busca contribuir para o fortalecimento das pesquisas na área da contabilidade governamental, especificamente, na área deanálise financeira dos governos, visto que pesquisas sobre a Condição Financeira no setor público ainda são incipientes no Brasil. Neste sentido, as pesquisas sobre a Condição Financeira no Brasil buscam auxiliar na tomada de decisão dos gestores públicos, bem como suprir com informações os usuários externos, tais como: cidadãos em geral, autoridades legislativas e de controle, investidores e credores, visando a análise de desempenho e accountability dos gestores. Em resumo, sintetizam-se algumas das contribuições teóricas, metodológicas e empíricas. Como contribuições teóricas destacam-se: (i) revisão e análise crítica da literatura, trazendo o estado da arte internacional e nacional para que se possa dar base a fundamentação teórica do estudo; (ii) análise da Condição Financeira dos estados brasileiros sob o espectro do stress fiscal, especialmente, nos períodos de crise financeira; e (iii) maior compreensão dos fatores financeiros que influenciam o stress fiscal dos estados brasileiros. Como contribuições metodológicas, têm-se: (i) utilização de informações contábeis compreendendo um período de tempo de 4 anos (2016 a 2019), envolvendo períodos de dificuldades fiscais de alguns estados brasileiros, que podem auxiliar na análise dos principais fatores que conduziram esses entes federados a situação de stress fiscal; e (ii) construção de um modelo explicativo e preditivo do stress fiscal dos estados ajustado à realidade do país. 12 Quanto às principais contribuições empíricas, enumeram-se: (i) teste e comprovação da significância estatística de vários fatores financeiros na explicação do stress fiscal dos estados brasileiros; (ii) entendimento da evolução da situação de stress fiscal dos estados brasileiros ao longo do tempo; e (iii) embasamento dos gestores estaduais que desejem tomar ciência da situação de stress fiscal de seus governos e dos fatores que os afeta. 1.5 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO Esta Dissertação está estruturada em quatro capítulos, além desta introdução. No segundo capítulo encontra-se o referencial teórico, em que, inicialmente, apresenta-se a teoria da Condição Financeira, em seguida, discute-se o espectro do stress fiscal dos governos, ressaltando o surgimento e principais estudos seminais, os conceitos, as medidas, os determinantes e o relato dos principais estudos empíricos da área; e, finalmente, apresenta-se a posição fiscal dos estados brasileiros ressaltando as dificuldades financeiras ao longo do tempo. No terceiro capítulo têm-se a trajetória metodológica do estudo, demonstrando-se a população e a amostra temporal analisada, o processo de coleta e tratamento dos dados, bem como o modelo econométrico que permite o teste das hipóteses e o consequente entendimento dos fatores financeiros que determinam o stress fiscal dos estados. O quarto capitulo é destinado à análise e discussão dos resultados. Por fim, o último capítulo descreve as considerações finais, limitações do estudo e recomendações para futuras pesquisas. 13 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 TEORIA DA CONDIÇÃO FINANCEIRA O corpo teórico da Condição Financeira dos governos começou a se formar por volta dos anos de 1970 com a crise fiscal de grandes cidades americanas como Nova York e Cleveland (Clark, 1994). Contudo, somente no início da década de 1980 que as pesquisas foram fortemente incentivadas devido as dificuldades financeiras enfrentadas por Miami, Pittsburgh e Philadelphia (Kloha et al., 2005). Desde então, conforme relatam Lima e Diniz (2016), os pesquisadores começaram a desenvolver estudos voltados à criação de modelos e indicadores de mensuração da Condição Financeira dos governos, com destaque para os trabalhos de Berne e Schramm (1986), Berne (1992), Brown (1993), Bowman e Calia (1997) e CICA (1997), Mead (2001), Honadle (2003), Groves e Valente (2003), Dennis (2004), Hendrick (2004), Kloha et al. (2005), Wang, Dennis e Tu (2007). Com o passar de várias décadas de pesquisas a Condição Financeira evoluiu de uma área de conhecimento voltada exclusivamente para a mensuração e análise de indicadores financeiros para a caracterização de vários atributos dos fenômenos observados (definição de diferentes dimensões da Condição Financeira e seus fatores determinantes), criando frameworks que se tornaram modelos teóricos com relações de causa e efeito, os quais, atualmente, contribuem para explicar e prever a Condição Financeira dos governos. Este processo caracteriza essa área de conhecimento como típico de uma teoria em formação denominada de Teoria da Condição Financeira (Vieira 2019). 2.1.1 Definição da Condição Financeira Sobre a denominação atribuída a esse fenômeno, Cabaleiro et al. (2012) observaram que existe diferentes designações utilizadas de forma intercambiável, tais como: fiscal or financial health (saúde fiscal ou financeira); financial or fiscal condition (Condição Financeira ou fiscal); financial position (posição financeira); e fiscal or financial sustainability (sustentabilidade fiscal ou financeira). No Brasil, a denominação utilizada por Lima e Diniz (2016) é simplesmente Condição Financeira Governamental. Nos ensinamentos de Groves e Valente (2003), a Condição Financeira Governamental refere-se à capacidade dos governos financiarem, continuamente, os 14 serviços públicos, resistirem a rupturas nas economias local e regional e atenderem às demandas características da população. Miller (2001) conceitua a condição financeira como o equilíbrio entre recursos e obrigações financeiras de curto e longo prazo. O autor complementa destacando que a Condição Financeira é a probabilidade de o governo conseguir honrar suas obrigações financeiras e que essa probabilidade depende do nível da demanda por gastos em relação ao total dos recursos disponíveis. A condição Financeira, nessa concepção, é, portanto, o gap entre a demanda por gastos e os recursos disponíveis. Ante o exposto, enfatiza-se que avaliar e controlar as finanças governamentais constitui importante requisito para o fornecimento, de forma adequada e constante, de diferentes tipos de serviços públicos que satisfaçam as demandas da população, inclusive em épocas de abalos econômicos, como nos momentos de instabilidade econômica e crise fiscal (Dantas, 2018). Segundo Jacob e Hendrick (2013), a Condição Financeira não é um fenômeno estático, mas com características dinâmicas na medida em que para sua mensuração são reconhecidas dimensões temporais de curto e longo prazo e ações fiscais complexas. Estas características dinâmicas da Condição Financeira corroboram para que ela seja considerada um fenômeno complexo, sendo influenciada por vários fatores do ambiente econômico, social, organizacional, político e fiscal. Diversos autores (Hendrick, 2004; Kavanagh, 2007; Krishnakumar et al., 2010; Jacob e Hendrick, 2013) confirmam esta proposição teórica, entendendo que a Condição Financeira é simultaneamente influenciada por fatores internos e externos à organização, tais como: práticas fiscais e gerenciais, políticas locais e regionais, legislação, demografia, condições sociais e econômicas, desastres naturais, dentre outros. 2.1.2 Fatores determinantes da Condição Financeira Diante da complexidade que representa a Condição Financeira dos governos, Berne e Schramm (1986) buscaram esclarecê-la mediante 5 (cinco) características fundamentais: dimensão temporal, ambiente econômico, multidimensionalidade de conceito, envolvimento de obrigações financeiras implícitas e explícitas e mensuração por uma composição de variáveis. Na visão dos autores, essas características moldam o constructo da Condição Financeira sob os seguintes aspectos, conforme tradução apresentada por Lima e Diniz (2016): 15 1. Dimensão temporal: destaca quea Condição Financeira permeia um horizonte de tempo que vai do curtíssimo ao longo prazo, englobando a capacidade de um governo gerar caixa para atender as demandas imediatas, assim como, a capacidade de garantir recursos e gerenciar gastos no longo prazo. 2. Ambiente econômico: influencia a Condição Financeira quanto à disponibilidade de recursos e as necessidades das comunidades, refletidos pelas receitas e gastos, para os quais se busca o equilíbrio. 3. Multidimensionalidade de conceito: revela que a Condição Financeira é um construto complexo envolvendo vários interessados (como servidores, bancos e contribuintes) com perspectivas diferentes, não devendo ser mensurado por um único indicador, mas por um conjunto de dimensões condensadas em uma medida. 4. Envolvimento de obrigações financeiras implícitas e explícitas: destaca a importância de observar obrigações implícitas, que diferentemente das explicitas, não estão consideradas nos fluxos de caixa ou contratos, como demandas não atendidas ou estruturas precárias necessitando de investimento. 5. Mensuração por uma composição de variáveis: ressalta que a Condição Financeira não é uma medida unidimensional, mas uma composição de variáveis que abrangerá tanto aspectos da boa, como da má Condição Financeira. Tomando como base essas características fundamentais, Groves e Valente (2003) desenvolveram uma estrutura de análise da Condição Financeira propondo um conjunto de indicadores distribuídos em três fatores: ambientais, organizacionais e financeiros. Fatores ambientais Os fatores ambientais são aqueles sobre os quais o governo tem pouco ou nenhum controle, tais como: economia externa, restrições intergovernamentais, características socioeconômicas da comunidade, risco de desastre e cultura política. Groves et al. (2003) ressaltam que o principal questionamento que fundamenta a análise 16 dos fatores ambientais é se estes geram recursos suficientes para pagar as demandas que provocam. Nesse sentido, Lima e Diniz (2016) explicam que existem duas possibilidades dos fatores ambientais afetarem as finanças do governo: primeiro, o crescimento da população cria demandas que exigirá mais investimentos em áreas elementares como educação, saúde, segurança, dentre outras; segundo, o crescimento da população cria a possibilidade de geração de recursos econômicos, aumentando a arrecadação de impostos pelo governo. Diversos estudos utilizam indicadores de natureza econômica, demográfica e social como fatores ambientais explicativos da Condição Financeira. A Tabela 01 representa levantamento realizado por Lima e Diniz (2016) e Vieira (2019). Tabela 1 – Indicadores de fatores ambientais explicativos da Condição Financeira Grupo Indicador Sinal Autores Imóveis Aglomerados habitacionais subnormais - Berne e Schramm (1986) Percentual de pessoas com casa própria + Groves et al., (2003); Berne e Schramm (1986); Lima e Diniz (2016); Rodríguez-Bolívar et al. (2016); Gardini e Grossi (2018) Valor total dos imóveis tributáveis + População Densidade demográfica (hab/km²) +/– Índice de crescimento populacional + Razão de dependência (abaixo de 14 e acima de 65) - População total +/– Idade média da População +/– Lima e Diniz (2016) Renda Produto Interno Bruto (PIB) + Recebedores de assistência pública - Groves et al., (2003) Percentual de pessoas com até R$70 de rendimento - Groves et al., (2003); Berne e Schramm (1986); Lima e Diniz (2016); Rodríguez-Bolívar et al. (2016); Gardini e Grossi (2018) Renda per capita (ou renda anual da comunidade) + Taxa de desemprego (e de emprego) - Empresas Número de empresas atuantes + Lima e Diniz (2016) Escolaridade Percentual de pessoas com nível médio/nível superior + Taxa de analfabetismo (população com 15 anos ou mais) - Berne e Schramm (1986); Lima e Diniz (2016); Rodríguez-Bolívar et al. (2016) Criminalidade Número de homicídio para cada 10.000 habitantes - Berne e Schramm (1986); Lima e Diniz (2016); Gardini e Grossi (2018) Fonte: Levantamento realizado por Lima e Diniz (2016) e Vieira (2019). 17 Fatores organizacionais Os fatores organizacionais são responsáveis por mediar os efeitos dos fatores ambientais sobre os fatores financeiros, isto é, representam a resposta apropriada do governo às mudanças ambientais por meio de práticas gerenciais e politicas legislativas. Referem-se às peculiaridades estruturais das práticas gerenciais, sistema legal e demais costumes e práticas dos entes federativos. Podem ser considerados uma possível resposta dos governos aos fatores ambientais, buscando identificar se as práticas gerenciais e as políticas possibilitam ao governo responder apropriadamente às mudanças no ambiente. Nesse sentido, segundo Dantas (2018), quanto mais rápida e eficaz for a adaptação do governo aos acontecimentos inesperados, maiores serão as chances deste governo operar com uma boa condição financeira. Fatores financeiros Os fatores financeiros são os resultados das decisões organizacionais em relação aos recursos e oportunidades ambientais disponíveis. Manifestam-se como medidas de receitas, despesas, posição operacional, passivos de longo prazo e manutenção de ativos. Groves et al. (2003) assinalam que os fatores financeiros refletem a condição das finanças governamentais e representam o resultado da influência dos fatores ambiental e organizacional. Neste sentido, Wang, Dennis e Tu (2007) afirmam que a mensuração da Condição Financeira deve se fundamentar, exclusivamente, em indicadores financeiros, e não em medidas ambientais socioeconômicas não-financeiras. As medidas ambientais, sob essa concepção, constituem fatores explicativos da Condição Financeira. Deste modo, na visão de Groves e Valente (2003), os fatores financeiros refletem a condição das finanças governamentais segundo quatro tipos de solvência: solvência de caixa, solvência orçamentária, solvência de longo prazo e solvência do nível de serviço, cujas características são especificadas na Tabela 2 a seguir. 18 Tabela 2 – Tipos de solvências financeiras Fonte: Adaptado de Groves e Valente (2003) Pelo exposto, segundo Vieira (2019), as solvências de caixa, orçamentária e de longo prazo dizem respeito, respectivamente, aos aspectos financeiro-orçamentários de curtíssimo, curto e longo prazo relacionadas à capacidade do ente público cumprir suas obrigações financeiras. Por sua vez, a solvência do nível de serviços refere-se à capacidade do governo em conseguir preservar a qualidade na oferta de serviços públicos esperados pela população. Neste contexto, Ritonga (2014) aborda que as solvências podem ser demonstradas pela: (i) capacidade para cumprir obrigações financeiras no curto e longo prazos (solvência de caixa e solvência de longo prazo); (ii) capacidade para cobrir suas despesas operacionais (solvência orçamentaria); e (iii) capacidade para fornecer serviços no padrão e qualidade necessários e solicitados pela população (solvência do nível de serviços). É importante ressaltar, que a mensuração da solvência do nível de serviços, apesar de ser importante para o constructo da Condição Financeira, ainda é insipiente na prática. Wang et al. (2007), nesse sentido, utilizaram proxys para mensurar essa dimensão financeira. Por outro lado, autores como Gorina et al. (2018) apontaram fragilidades neste tipo de mensuração, deixando de incluir em seus estudos esta modalidade de solvência, alegando que apenas as solvências de caixa, orçamentária e longo prazo são efetivamente solvências financeiras e analisáveis na prática (Vieira, 2019). Com relação as medidas da Condição Financeira sob o enfoque das solvências, Lima e Diniz (2016), realizaram um levantamento em vários estudos da área, conformeconsolidação apresentada no Tabela 3. Solvências Características Solvência de caixa Capacidade de um ente governamental gerar caixa suficiente para pagar suas contas a vencer em 30 ou 60 dias. Solvência orçamentária Capacidade do governo para gerar receita suficiente no seu período orçamentário normal a fim de atender suas despesas e não incorrer em déficit. Solvência de longo prazo Capacidade do governo para pagar todos os custos, incluindo-se os gastos normais dos orçamentos anuais e os específicos a cada ano, como os da previdência. Solvência do nível de serviços Capacidade do governo para oferecer serviços de saúde, segurança e bem- estar da comunidade no nível e qualidade que seus cidadãos necessitam. 19 Tabela 3 – Indicadores de mensuração da Condição Financeira segundo os fatores financeiros Construto Indicadores Definição Operacional Autores Solvência de caixa Liquidez Corrente 𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒 𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐶𝑖𝑟𝑐𝑢𝑙𝑎𝑛𝑡𝑒 Groves et al. (2003); Lima e Diniz (2011) Superávit financeiro 𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝐹𝑖𝑛. − 𝑃𝑎𝑠𝑠𝑖𝑣𝑜 𝐹𝑖𝑛. 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎𝑠 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑖𝑠 Berne e Schramm (1986) Stress test 𝑉𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑆𝑢𝑝𝑒𝑟á𝑣𝑖𝑡 𝐹𝑖𝑛. 𝑉𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎𝑠 𝑂𝑝𝑒𝑟. Bowman e Calia (1997) Análise da receita Receita per capita 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑂𝑝𝑒𝑟𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 𝑃𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 Groves et al. (2003); Berne e Schramm (1986); Brown (1993,1996); Berne (1992); Mead (2001); Howell e Stamm (1979); Hendrick (2004); Miller (2001); Carmeli (2002). Esforço tributário 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑇𝑟𝑖𝑏𝑢𝑡á𝑟𝑖𝑎 𝑅𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑑𝑎 𝐶𝑜𝑚𝑢𝑛𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 Groves et al. (2003); Berne e Schramm (1986); Berne (1992); Ammar et. al. (2001); Peterson et al. (1978); Howell e Stamm (1979); Clark e Chan (1990); Hendrick (2004); Miller (2001) Diversificação da receita 𝑇𝑟𝑖𝑏𝑢𝑡𝑜 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑂𝑝𝑒𝑟𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 Brown (1993,1996); Hendrick (2004); Miller (2001); Clark e Ferguson (1983); Ammar et al. (2001, 2004); Carmeli (2002). Tendência da receita 𝑅𝑒𝑐. 𝑎𝑡𝑢𝑎𝑙 − 𝑅𝑒𝑐. 𝑎𝑛𝑡𝑒𝑟𝑖𝑜𝑟 𝑅𝑒𝑐. 𝑎𝑛𝑡𝑒𝑟𝑖𝑜𝑟 Groves et al. (2003), Berne e Schramm (1986). Análise dos gastos Tamanho do setor público 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑃𝐼𝐵 Musgrave e Musgrave (1980) Participação das despesas com pessoal 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝑐𝑜𝑚 𝑃𝑒𝑠𝑠𝑜𝑎𝑙 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 Alijarde (1995); Garcia (2003); Gómez e Fernández (2006); López e Conesa (2002); Martínez (1994); Peterson et al. (1978b). Participação das despesas operacionais 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎𝑠 𝑂𝑝𝑒𝑟𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑖𝑠 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 Brown (1993, 1996); Hendrick (2004); Peterson et al. (1978b) Prioridade dos gastos 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎𝑠 𝑝𝑜𝑟 𝐹𝑢𝑛çã𝑜 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝑇𝑜𝑡𝑎𝑙 Groves et al. (2003); Berne e Schramm (1986); Mead (2001); Howell e Stamm (1979); Clark e Ferguson (1983); Clark e Chan (1990); Peterson et al. (1978b) Solvência orçamentária Cobertura de custeio 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 Martínez (1994); Howell e Stamm (1979); Miller (2001) Capacidade de geração de poupança 𝑅𝑒𝑐. 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 − 𝐷𝑒𝑠𝑝. 𝐶𝑜𝑟. 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 Groves et al. (2003); Berne e Schramm (1986); Berne (1992); Mead (2001); Pagano (1993) Índice de cresc. de receitas e despesas 𝐶𝑟𝑒𝑠𝑐𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 𝑑𝑎 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑟𝑒𝑠𝑐𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 𝑑𝑎 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 Dearborn (1977); Peterson et al. (1978); Groves et al. (2003); Berne e Schramm (1986) Solvência de longo prazo (dívida e RPPS) Grau de endividamento 𝐷í𝑣𝑖𝑑𝑎 𝐶𝑜𝑛𝑠𝑜𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑎 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐿í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑎 Groves et al. (2003); Berne e Schramm (1986); Berne (1992); Mead (2001); García (2003); López e Conesa (2002); Alijarde e López (2001); Ingram et al. (1991); Gómez e Fernández (2006). Representatividade do serviço da dívida 𝐴𝑚𝑜𝑟𝑡. + 𝐽𝑢𝑟𝑜𝑠 𝐷í𝑣𝑖𝑑𝑎 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎𝑠 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑖𝑠 Alijarde (1995); García (2003); Dearborn (1977); Peterson et al. (1978); Clark e Chan (1990); Hendrick (2004); Miller (2001); Ammar et al. (2001, 2004) Solvência financeira do RPPS 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑑𝑒 𝐶𝑜𝑛𝑡𝑟𝑖𝑏𝑢𝑖çã𝑜 𝐵𝑒𝑛𝑒𝑓í𝑐𝑖𝑜𝑠 𝑎𝑛𝑢𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑎𝑔𝑜𝑠 Lima e Diniz (2016) Fonte: Organizado por Viera (2019) a partir de Lima e Diniz (2016). 20 2.1.3 Modelos de mensuração da Condição Financeira Desde a década de 1980, estudiosos da Condição Financeira Governamental buscam formular indicadores e modelos para mensurar e monitorar a Condição Financeira de entes subnacionais com duplo objetivo: aferir a saúde financeira (fiscal health) e prever crises fiscais (fiscal stress). Assim, convencionou-se que a medida da Condição Financeira é obtida em uma escala cujo continuum revela os níveis ou graus da situação financeira dos governos. Essa dualidade de objetivos é bem distinguida por Justice e Scorsone (2013) ao ressaltarem que do mesmo modo da saúde e da doença humana, a saúde e o stress fiscal dos governos são definidos de várias formas dependendo das preocupações particulares dos stakeholders ou de fatores situacionais. Relativamente à saúde fiscal, os autores assinalam que trata-se de um conceito normativo complexo que depende do ponto de vista de diferentes partes interessadas, por exemplo, os detentores de títulos de dívida julgam que um governo tem saúde fiscal quando oportunamente paga os juros e principal da dívida mesmo diante de política fiscal de corte de gastos; os gestores, políticos eleitos, membros de conselhos e os cidadãos estão preocupados com a capacidade do governo manter um nível adequado de serviços no curto e longo prazo; os fornecedores estão preocupados com a capacidade do governo pagar suas faturas nos prazos estipulados e o governo está preocupado em harmonizar todos esses interesses. Em suma, a saúde fiscal está relacionada com as quatro solvências financeiras de caixa, orçamentária, longo prazo e nível de serviços. Por seu turno, o stress fiscal significa a falência atual ou potencial do governo para cumprir uma ou mais solvências financeiras, bem como satisfazer as condições de sustentabilidade, flexibilidade e vulnerabilidade da saúde fiscal. Sob essas premissas os modelos de mensuração da Condição Financeira foram formulados. Por isso, segundo assinalam Lima e Diniz (2016), a literatura da Condição Financeira dispõe de diferentes abordagens para medir o status financeiro dos governos, combinando um conjunto de indicadores que representa características e fatores que influenciam a Condição Financeira, especialmente receitas, gastos, estrutura de endividamento e posição operacional. Essas diferentes abordagens são retratadas por modelos explicativos e preditivos da Condição Financeira que auxiliam os governos a monitorarem a saúde fiscal, bem como detectarem sinais de alerta para impedir a ocorrência de crises financeiras ou stress fiscal. 21 Há vários trabalhos na literatura que originaram importantes modelos para analisar e mensurar a Condição Financeira com o potencial de revelar o status financeiro do governo (saúde fiscal ou stress fiscal). A seguir serão brevemente demonstrados os modelos mais utilizados a nível internacional, tais como, os modelos de Groves e Valente (2003), Brown (1993) e Kloha et al (2005) e, a nível de Brasil, o modelo da STN (2017). Modelo de Groves e Valente (2003) O modelo proposto por Groves e Valente (2003), inicialmente apresentado em Groves e Godsey Valente (1980), conhecido por Financial Trend Monitoring System (FTMS), é composto por 11 fatores ambientais e financeiros, associados a 42 indicadores, sendo 27 financeiros e 15 ambientais, que mensuram 9 destes fatores. Há, também, o reconhecimento da influência das práticas gerenciais e políticas legislativas intermediando os impactos ambientaissobre o desempenho financeiro como se pode ver na Figura 1. Figura 1 – Modelo de Groves e Valente (2003) Fonte: Groves e Valente (2003), adaptado por Lima e Diniz (2016). O modelo de Groves e Valente (2003) é considerado o mais abrangente na prática para o monitoramento da Condição Financeira na medida em que reúne 22 informações econômicas, demográficas e financeiras por meio de indicadores que são demonstrados graficamente por meio de tendências ao longo de três a cinco anos, permitindo monitorar as mudanças ocorridas na Condição Financeira e alertar os gestores para futuros problemas (Lima e Diniz, 2016). Modelo de Brown (1993) A partir do modelo de Groves e Valente (2003) houve uma evolução na construção de novos modelos, especialmente aqueles com potencial de identificar o status financeiro dos governos ao longo do continuum da escala de mensuração da Condição Financeira. Nesse sentido, Brown (1993) desenvolveu um modelo denominado de “teste dos dez pontos da condição financeira” (ten-point test of financial condition). O modelo recebe essa denominação porque foi construído utilizando dez indicadores envolvendo os principais determinantes da condição financeira: receitas, despesas, estrutura de endividamento e posição operacional. Além de utilizar um método simples de operacionalização por requerer a mensuração de indicadores básicos, cujos dados, na sua totalidade, estão disponíveis nas demonstrações contábeis. A Tabela 4 a seguir apresenta os 10 indicadores utilizados no modelo de Brown (1993). O modelo assume que todos os indicadores têm o mesmo grau de importância, pois sem essa suposição os escores atribuídos deveriam estar associados a um peso que representasse o grau de importância de cada um. 23 Tabela 4 – Indicadores do modelo de Brown (1993) Indicador Dimensão Fórmula Receita per capita Receita 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑃𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 Representatividade da receita própria Receita 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 − 𝑇𝑟𝑎𝑛𝑠𝑓. 𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 Participação das receitas de transferências Receita 𝑇𝑟𝑎𝑛𝑠𝑓. 𝑐𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 Participação dos gastos operacionais Despesa 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 Cobertura de despesas Posição Operacional 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 Recursos para cobertura de queda de arrecadação Posição Operacional 𝑆𝑢𝑝𝑒𝑟á𝑣𝑖𝑡 𝑓𝑖𝑛𝑎𝑛𝑐𝑒𝑖𝑟𝑜 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 Recursos para cobertura de obrigações de CP Posição Operacional 𝐷𝑖𝑠𝑝𝑜𝑛𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒𝑠 𝑂𝑏𝑟𝑖𝑔𝑎çõ𝑒𝑠 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠 Comprometimento das receitas correntes com as obrigações de CP Dívida 𝑂𝑏𝑟𝑖𝑔𝑎çõ𝑒𝑠 𝑑𝑒 𝐶𝑃 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐿𝑖𝑞. Dívida per capita Dívida 𝐷í𝑣𝑖𝑑𝑎 𝐶𝑜𝑛𝑠𝑜𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑎 𝑃𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 Comprometimento das receitas correntes com o endividamento Obrigações não financiadas 𝐷í𝑣𝑖𝑑𝑎 𝐶𝑜𝑛𝑠𝑜𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑎 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐿𝑖𝑞. Fonte: Adaptado de Brown (1993), traduzido por Lima e Diniz (2016). O estudo realizado por Brown (1993) originou uma nova vertente de modelos. De acordo com Cuadrado-Ballesteros e Bisogno (2018) o modelo de Brown criou uma forma inovadora destacando o fato da criação de um critério de pontuação para classificar 750 cidades de menor porte nos Estados Unidos da América. Assim, para possibilitar a avaliação geral da Condição Financeira, o modelo estabelece a seguinte escala relativa para classificar cada governo local avaliado: Tabela 5 – Escala de avaliação da condição financeira Score Geral Condição Financeira 10 ou mais Entre as melhores 5 a 9 Melhor que a maioria 1 a 4 Na média 0 a -4 Pior que a maioria -5 ou menos Entre as piores Fonte: Brown (1993) Modelo de Kleine et al. (2003) Na construção do seu modelo, Monitoring local government fiscal health: Michigan’s new 10 point scale of fiscal distress, Kleine et al. (2003) seguiram a mesma vertente do modelo proposto por Brown (1993) com algumas adaptações. 24 Segundo Lima e Diniz (2016), os autores ao avaliaram o modelo de Brown (1993) concluíram que existem dificuldades práticas e teóricas que limitam sua utilidade, apesar de ser uma ferramenta útil para avaliar a Condição Financeira dos governos, destacando as seguintes limitações: (i) o modelo penaliza ou premia os governos em bases relativas, independentemente do mérito absoluto dos indicadores; (ii) os resultados não são comparáveis ao longo dos anos; (iii) ausência de indicadores econômicos e sociais; (iv) pelo menos três dos dez indicadores não são apropriados para avaliar o stress fiscal; e (v) os indicadores são computados sem que haja uma avaliação prévia sobre a saúde fiscal de cada unidade de análise. Visando suprimir essas limitações, Kleine et al. (2003) construíram um modelo alternativo composto de nove indicadores, o qual denominaram de escala dos 10 pontos do stress fiscal (10-point scale of fiscal stress). Posteriormente, os autores, encabeçados por Kloha et al. (2005), publicaram uma nova versão do modelo que funciona da seguinte forma: 1. cada indicador conta com uma ou duas variáveis para medir diretamente um conceito estabelecido na literatura de finanças públicas; 2. cada indicador dispõe de um padrão para distinguir o desempenho bom do desempenho ruim; 3. se o desempenho do governo em um indicador específico é bom será atribuído escore zero e se o desempenho é ruim será atribuído escore 1; 4. finalmente, os pontos atribuídos aos nove indicadores serão totalizados para cada ano em análise, resultando em um escore que varia de 0 a 10 (quanto maior o escore, pior o desempenho geral do governo). Os indicadores e os padrões de desempenho do modelo de Kleine et al. (2003) são apresentados na Tabela 6 a seguir. 25 Tabela 6 – Indicadores do modelo de Kleine et al. (2003) Indicadores Padrão de Desempenho Crescimento populacional (2 anos) Se o governo perder população, então ele será penalizado em 1 ponto. Crescimento real dos valores tributáveis (2 anos) Se o governo apresentar crescimento real negativo, então ele será penalizado em 1 ponto. Grande diminuição real dos valores tributáveis (2 anos) Se a redução é – 0.04, então o governo será penalizado em um ponto. Gastos do fundo geral/valores tributáveis Se o Município apresentar escore maior que 0,05, então o governo será penalizado em 1 ponto. Déficit operacional do fundo geral Esse indicador é calculado pela diferença entre receita e despesa do fundo geral, dividindo-se o resultado pela receita. Se o resultado for menor que 0,01, o governo será penalizado em 1 ponto. Déficit operacional de anos anteriores O governo será penalizado em 1 ponto para cada ano, até o máximo de 3, para cada ano em que apresentar déficit operacional. Fundo financeiro/receita Se esse indicador apresentar resultado menor que 0,13, então o governo será penalizado em 1 ponto. Déficit do ano anterior ou do ano corrente do maior fundo especial O governo será penalizado em 1 ponto se apresentar déficit do ano anterior ou do ano corrente para o maior fundo especial. Dívida de longo prazo/valor real tributável Se esse indicador apresentar resultado maior que 0,06, então o governo será penalizado em 1 ponto. Fonte: tradução de Lima e Diniz (2016). Com base no escore geral obtido com a aplicação do modelo de Kleine et al. (2003), os governos são classificados em uma das seguintes categorias da escala da Condição Financeira como mostra a Figura a seguir: saúde fiscal (0-4 pontos); observação fiscal (5 pontos); advertência fiscal (6-7 pontos); e stress fiscal (8-10 pontos). Figura 2 – Sistema de alerta da Condição Financeira dos governos combase no modelo de Kleine et al. (2003) Fonte: Adaptado de Kleine et al. (2005). 26 A praticidade do modelo de Kleine et al. (2003) está no fato de usar uma medida composta, pois facilita a compreensão do status financeiro do governo, ao invés de usar vários indicadores isoladamente como no modelo de Groves e Valente (2003). Ademais, consoante Ferreira da Cruz (2016), os gestores públicos precisam de diretrizes para avaliar a Condição Financeira de seus governos subnacionais, sendo que os indicadores isolados são apenas medidas “parciais” de um conceito mais amplo e complexo da Condição Financeira Governamental. Modelo da STN (2017) No Brasil, a iniciativa foi desenvolvida pelo governo federal, por meio da criação de um modelo para analisar a Capacidade de Pagamento (CAPAG) para subsidiar as decisões da União em oferecer contrapartida para a concessão de aval e garantia aos Estados, Distrito Federal e Municípios. O modelo brasileiro foi desenvolvido em 2012 pela Secretaria do Tesouro Nacional em conjunto com o Banco Mundial e modificado no ano de 2017 para melhor atender a realidade dos estados Brasileiros. No modelo inicial, aprovado pelas portarias MF n° 306, de 10 de setembro 2012 e STN n° 543, de 18 de setembro de 2012, contemplava oito indicadores. Posteriormente, com a edição da portaria MF nº 501 de 2017, o modelo foi simplificado passando a ser composto por apenas três indicadores financeiros: Endividamento (DC); Poupança Corrente (PC); e Liquidez (IL). O cálculo dos indicadores de Endividamento e Liquidez utiliza dados do ano corrente, dispostos no Relatório de Gestão Fiscal do 3º quadriênio. Porém, o indicador de Poupança Corrente é calculado com base na média ponderada dos três últimos exercícios, com pesos decrescentes: t-1, 50%; t-2, 30%; t-3, 20%. Após o cálculo dos indicadores, é atribuído a uma classificação parcial do CAPAG nas categorias “A”, ”B” ou “C”, para cada indicador dependendo dos valores obtidos, conforme o Tabela a seguir. Tabela 7 – Indicadores do modelo da STN (2017) Indicadores Fórmulas Classificações I - Endividamento (DC) 𝐷í𝑣𝑖𝑑𝑎 𝐶𝑜𝑛𝑠𝑜𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑎 𝐵𝑟𝑢𝑡𝑎 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑎 A B C DC < 60% 60% < DC < 150% DC > 150% II - Poupança Corrente (PC) 𝐷𝑒𝑠𝑝𝑒𝑠𝑎𝑠 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠 𝑅𝑒𝑐𝑒𝑖𝑡𝑎 𝐶𝑜𝑟𝑟𝑒𝑛𝑡𝑒 𝐴𝑗𝑢𝑠𝑡𝑎𝑑𝑎 A B C PC < 90% 90% < PC < 95% PC > 95% III - Índice de Liquidez (IL) 𝑂𝑏𝑟𝑖𝑔𝑎çõ𝑒𝑠 𝐹𝑖𝑛𝑎𝑛𝑐𝑒𝑖𝑟𝑎𝑠 𝐷𝑖𝑠𝑝. 𝑑𝑒 𝐶𝑎𝑖𝑥𝑎 𝐵𝑟𝑢𝑡𝑎 A C IL < 1 IL > 1 Fonte: Adaptado da STN (2017). 27 Por fim, a classificação final do ente subnacional é dada pela combinação das classificações parciais atribuídas a cada indicador, obtendo-se uma das classificações finais: “A”, “B”, ”C” ou “D”, para o governo subnacional analisado, conforme Tabela 8. Tabela 8 – Classificação da CAPAG, modelo da STN (2017) Classificação Parcial do Indicador Classificação Final da Capacidade de Pagamento Liquidez Poupança Corrente Endividamento A A A A A A B B A A C A B A A B B A B C C C C D Demais combinações C Fonte: STN (2017). Traçando um breve comparativo entre o modelo da STN de 2012 e o novo modelo propostos em 2017, observa-se que o modelo atual tornou-se mais compreensivo e fácil de ser calculado, haja vista a menor quantidade de indicadores e de informações necessárias para análise. É possível, também, relacionar os indicadores do modelo com as solvências financeiras propostas por Groves e Valente (2003) em que a liquidez se relaciona à solvência de caixa, a poupança corrente à solvência orçamentária e o endividamento à solvência de longo prazo. O presente estudo buscou identificar os fatores financeiros determinantes do stress fiscal dos governos estaduais brasileiros, utilizando indicadores propostos nos modelos aqui discutidos, especialmente o modelo da STN (2017), segundo as solvências de caixa, orçamentária, e de longo prazo. 2.2 STRESS FISCAL DOS GOVERNOS 2.2.1 Surgimento e principais estudos seminais Os desequilíbrios financeiros enfrentados pelos governos começaram a tornar- se evidentes a partir da grande recessão de 1930 e seus efeitos chegaram a perdurar pelos anos seguintes. Gorina et al. (2018) ao realizar um apanhado histórico da situação financeira, durante e após esse período, verificaram que muitos governos locais dos Estados Unidos declararam situação de emergência fiscal, sendo necessário demitir trabalhadores e cortar serviços básicos oferecidos à população. 28 Todavia, o fenômeno do stress fiscal somente começou a ser objeto de preocupação dos governos na década de 1960 quando as cidades mais antigas e industrializadas da região nordeste dos Estados Unidos começaram a experimentar declínio nas suas atividades econômicas, não conseguiram atrair novos investimentos de capital para suas operações e começaram a contrair endividamento de longo prazo para financiar gastos operacionais de curto prazo (Howell e Stamm, 1979). O stress fiscal continuou a ser objeto de preocupação na década de 1970 quando emergiu a alta da inflação e a crise do petróleo e da energia que contribuíram para o surgimento de problemas financeiros em diversas cidades americanas de grande porte, tais como, Nova York e Cleveland, Ohio, Parlier, California, Saco e Maine, devido à má gestão, déficits orçamentários e descontrole nos gastos de programas sociais (ACIR, 1973). Nesse período, segundo Clarck (1994), a crise fiscal da cidade de Nova York surpreendeu e chocou muitos observadores. Definir porque e como essa crise aconteceu tem sido controverso. Muitos analistas acreditam que o indicador mais visível para explicar o stress fiscal enfrentado pela cidade em 1975 está relacionado à insuficiência de caixa para pagar as obrigações correntes. O governo contraiu muitos empréstimos de curto prazo para pagar despesas de custeio, provocando o crescimento considerável da dívida de curto e longo prazo. Diante disto, os bancos negaram novos empréstimos e exigiram melhor gerenciamento das ações fiscais. Essas crises proporcionaram o desenvolvimento de substancial volume de pesquisas acadêmicas sobre as causas e consequências das dificuldades financeiras (Mitchell e Stansel, 2015), bem como estimularam os governos monitorarem suas finanças, mas somente a partir dos anos 90 as ações de intervenção foram mais ativas (Kloha et al., 2005). Dentre os principais estudos desenvolvidos na década de 70 e início da década de 80, destacam-se: ACIR (1973), Aronson e Schwartz (1976), Clark (1977), Barro (1978), Aronson e King (1978), Stanley (1980) e Levine (1980), cujos breves comentários são apresentados nos parágrafos a seguir. A Advisory Commission on Intergovernmental Relation (ACIR), agência americana instituída em 1959 para estudar as relações intergovernamentais entre o governo federal e os governos subnacionais, produziu uma série de estudos na década de 1970 e 1980 com foco na capacidade fiscal dos governos estaduais e locais. O estudo seminal dessa época, City financial emergencies: the intergovernmental dimension, 29 desenvolvido em 1973, teve por objetivo levantar a situação financeira de várias cidades americanas, possibilitando relacionar aquelas que se encontravam em emergência financeira mediante a identificação das seguintes ocorrências: (i) aumento de impostos ou corte de serviços municipais; (ii) incapacidade dos cidadãos em pagar impostos, ocasionando dificuldades do governo para atender suas obrigações; (iii) baixa renda da população; e (iv) default do governo em relação à dívida contraída. Essas ocorrências apresentaram determinadas características da gestão financeira dos governos locais que serviram de sinais de alerta para determinar se governos similares estavam em situação de emergênciafinanceira, a saber: 1. desequilíbrio do resultado orçamentário operacional, no qual as despesas correntes excedem, significativamente, às receitas correntes em um período fiscal; 2. padrão consistente de despesas correntes excedendo as receitas correntes em pequenos montantes por vários anos; 3. obrigações de curto prazo em montante superior aos ativos de curto prazo (déficit financeiro); 4. saldo de empréstimos de curto prazo a pagar no final do exercício; 5. elevado e crescente índice de imposto sobre a propriedade sem arrecadar; 6. redução substancial inesperada do valor das propriedades; 7. técnicas pobres de orçamento, contabilidade e demonstrações contábeis; 8. técnicas inadequadas de administração financeira. Aronson e Schwartz (1976) desenvolveram um estudo com o objetivo de responder o seguinte questionamento: como detectar sinais de perigo antes que uma unidade governamental alcance o ponto de crise financeira. Para responder essa questão, os autores analisaram o perfil da dívida de curto e longo prazo de várias cidades americanas no período de 1950-74, calculando indicadores da dívida em relação a receita própria, receita total, caixa, valor das propriedades, população e renda. Seguindo a tendência desses indicadores ao longo do período analisado foi possível identificar algumas regras de bolso, conforme destacadas na tabela a seguir. Com o desenvolvimento desse estudo, os autores concluíram que embora seja impossível determinar exatamente a quantidade ideal de dívida para uma cidade, longa experiência forneceu regras de gestão financeira prudente, permitindo sugerir diretrizes para o uso apropriado da dívida. 30 Tabela 9 – Regras para a determinação de sinais de perigo da dívida Indicadores Regras Dívida/valor das propriedades Menor que 5% é bom. Acima de 10% sinaliza problemas fiscais. Índice de crescimento da dívida Não deve exceder o crescimento da base tributária. Dívida per capita Menor que 400 dólares é bom. Acima de 1.000 dólares sinaliza possíveis problemas. Crescimento regional da renda total dos indivíduos Deve ter crescimento próximo ao crescimento do PIB nacional. Ativos líquidos (caixa + realizáveis)/dívida de curto prazo Quanto maior, melhor a posição financeira do governo, sendo 5 o valor médio. Dívida de curto prazo Deve ser liquidada até o fim do exercício fiscal. A rolagem dessa dívida ao longo dos anos sinaliza problemas. Serviço da dívida/receita própria Até 10% a 15% é considerado muito bom. Acima de 20% a 25% sinaliza preocupação. Serviço da dívida/receita total Acima de 10% sinaliza problemas fiscais. (Serviço da dívida + dívida de curto prazo)/receita própria Deve ser inferior a 40%. Fonte: Adaptado de Aronson e Schwartz (1976) Clark (1977), ao estudar os problemas financeiros dos governos locais orienta que para identificar dificuldades financeiras é preciso avaliar o assunto sob três abordagens: (i) perspectiva do investidor que relaciona-se à probabilidade de default do governo em atender aos pagamentos regulares do principal e juros dos bonds municipais emitidos; (ii) perspectiva da variação da população e da base econômica, revelando que um governo está em tensão fiscal quando essas duas dimensões declinam; e (iii) sinais de alerta para ajudar os líderes municipais a formularem políticas para enfrentar os problemas fiscais. Aronson e King (1978) ao estudarem a crise fiscal de Nova York em 1975 preocuparam-se em desenvolver medidas e sinais de alerta de perigo financeiro a fim de determinar se outras cidades e estados estavam enfrentando ou prestes a enfrentar problemas financeiros. Os autores também avaliaram indicadores da dívida em relação a receita própria, receita total, renda pessoal e caixa. Os principais indicadores desenvolvidos pelos autores serão demonstrados no tópico 2.2.2 a seguir. Barro (1978, p. 11), ao estudar os problemas fiscais dos governos apresentou características para classifica-los em três tipos ou níveis segundo o grau de dificuldade financeira em que se encontrava, a saber: 31 1. Desvantagem fiscal: um governo está em desvantagem fiscal se ele é menos capaz que outros governos similares para fornecer o mesmo nível de serviços públicos para seus residentes. A desvantagem fiscal surge das seguintes situações: baixa base tributária; alto custo dos serviços; larga responsabilidade fiscal e alta concentração da população dependente (pobres, crianças e idosos que exigem custos mais elevados para atendimento). 2. Declínio fiscal: um governo está em declínio fiscal quando apresenta opções orçamentárias menos favoráveis em relação ao exercício anterior, tais como corte de seus serviços e/ou aumento de carga tributária (declínio absoluto) e aumento mais rápido ou diminuição menos rápida de alíquotas tributárias em relação a outros governos similares (declínio relativo). 3. Crise fiscal aguda: um governo apresenta crise fiscal aguda quando suas restrições orçamentárias são muito severas e diferidas por muito tempo para serem ajustadas, normalmente, pelo mecanismo orçamentário. Os sinais de crise fiscal aguda são observados quando há o rompimento dos padrões de gastos e receitas e quando o governo fracassa em honrar as obrigações contraídas. Stanley (1980) ao estudar os problemas fiscais dos governos classificou-os em duas categorias: (i) crise fiscal para representar um problema financeiro de curto prazo no qual o governo não dispõe de caixa nem crédito para atender as despesas correntes com a folha de pessoal e pagamento de fornecedores; e (ii) declínio de longo prazo para representar a deterioração da economia, das condições sociais e da qualidade de vida de uma localidade. O autor assinala, ainda, que os sinais de uma crise fiscal e de um declínio fiscal podem ser identificados na medida em que se observa deficiência de receitas comparada com os gastos, déficit de caixa, saldo de empréstimo de curto prazo a pagar, rating de crédito muito pobre, alta emigração da população, alto índice de desemprego, baixa renda das famílias e crescimento per capita dos gastos públicos. O livro de Levine (1980), denominado de Managing fiscal stress: the crises in the public sector, é considerado uma obra pioneira nesse campo de investigação na medida em que reúne trabalhos de pesquisadores que examinam o stress fiscal dos governos em vários níveis. Segundo o autor, essa coletânea foi selecionada para explorar os problemas políticos e econômicos, restrições, alternativas e escolhas disponíveis para os gestores a fim de combater o stress fiscal. A obra é dividida em seis partes, sendo a 32 primeira dedicada aos conceitos de stress fiscal e cortes dos gastos orçamentários (cutback management), a segunda parte contém trabalhos relacionados às causas do stress fiscal, e as quatro partes restantes tratam dos principais tipos de ações gerenciais para lidar com o stress fiscal dos governos. 2.2.2 Conceitos de stress fiscal De acordo com Levine (1980), a combinação de um crescimento econômico lento com inflação de dois dígitos força os governos racionarem recursos, limitarem o nível de serviços públicos, cortarem programas, fazerem escolhas entre determinados programas e projetos, fecharem instalações públicas, cancelarem projetos, adiarem manutenções de equipamentos e obras públicas, abolirem contratações e demitirem servidores. Para complicar, esses problemas gerenciais precisam ser resolvidos em um ambiente político composto por usuários dos serviços públicos e servidores que esperam e necessitam de mais serviços, benefícios e salários, e que não são facilmente convencidos a reduzirem suas expectativas ou fazerem algum sacrifício. Assim, na concepção do autor, o gap entre essas necessidades e expectativas dos cidadãos e servidores, bem como a incapacidade da economia
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