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JanielyBG-Monografia

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS 
DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL 
CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL 
 
 
 
 
 
JANIELY BATISTA GALVÃO 
 
 
 
VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: “SE PARIR FAZ PARTE DA NATUREZA, 
QUE ESTA FORÇA SEJA RESPEITADA” 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL 
2014
 
 
JANIELY BATISTA GALVÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: “SE PARIR FAZ PARTE DA NATUREZA, 
QUE ESTA FORÇA SEJA RESPEITADA” 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado 
ao Departamento de Serviço Social da 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
– UFRN, como requisito parcial para a 
obtenção do título de Bacharel em Serviço 
Social. 
 
Orientadora Profª Ms. Alane Karina Dantas 
Pereira 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL 
2014
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Catalogação da Publicação na Fonte. 
UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Galvão, Janiely Batista. 
Violência obstétrica: “se parir faz parte da natureza, que esta força seja 
respeitada” / Janiely Batista Galvão. - Natal, RN, 2014. 
70f. 
 
Orientadora: Profa. Dra. Alane Karine Dantas Pereira. 
 
Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade Federal do Rio 
Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Departamento de 
Serviço social. 
 
 
JANIELY BATISTA GALVÃO 
 
 
 
 
VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: “SE PARIR FAZ PARTE DA NATUREZA, 
QUE ESTA FORÇA SEJA RESPEITADA” 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado 
ao Departamento de Serviço Social da 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
– UFRN, como requisito parcial para a 
obtenção do título de Bacharel em Serviço 
Social. 
 
 
 
Aprovado em: _26_/ 11_/_2014__ 
 
 
 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA: 
 
 
___________________________________________________________________ 
Profª. MS. Alane Karine Dantas Pereira – UFRN/DESSO 
(Orientadora) 
 
 
 
___________________________________________________________________ 
Profª Maria de Fátima Jerônimo Marques – UERN/FASSO 
(Profª Ms./ Membro Titular Externo) 
 
 
 
___________________________________________________________________ 
Felipe dos Santos Galvão - Mestrando em Serviço Social (UFRN/PPGSS) 
(Membro Titular externo) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Do ventre nasce um novo coração! 
(Cássia Ellen) 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Primeiramente quero agradecer ao meu Deus, pela oportunidade de estudo e 
concretização de um sonho. Agradeço a Deus por tudo que Ele tem me proporcionado, e 
mostrado o quanto é fiel em minha vida. 
A minha família que é a minha base, meus país por todo sentimento de confiança 
depositado em minha pessoa. A minha mãe Maria Lúcia Batista Galvão que apesar de toda 
dificuldade financeira em manter-me na faculdade, sempre buscava uma maneira de prover a 
minha permanência na faculdade. Ao meu pai João Batista Galvão, por todo esforço para 
continuidade dos meus estudos, em suma, aos meus pais, pessoas guerreiras, amorosas, 
corajosas, exemplos de vida a ser seguido. Aos meus irmãos que de maneira diferente 
contribuíram com minha formação. As minhas tias, Marliete e Marinéz por ter se alegrado e 
contribuído com minha formação, a vocês minhas tias “o meu muito obrigado”. 
Ao meu amigo, companheiro e futuro esposo por toda compreensão e paciência nos 
momentos de crise, insegurança, estresse e desânimo ter me apoiado e acreditado em meu 
potencial. Obrigada meu amor, pelo ombro amigo e pelo abraço tão caloroso nos momentos 
em que mais precisei. 
As minhas amigas e colegas de faculdade, Fabíola, Analice e Laysa pelos momentos 
de alegrias, tristezas e estresses estarmos sempre juntas. Apesar de nossas diferenças sempre 
nós entediamos e acredito em amizade para além dos muros da Universidade. Obrigada 
meninas pela amizade e companheirismo. 
 As professoras Carla Montefusco e Regina Avila, que sempre auxiliaram na 
construção de conhecimentos. Vocês realmente marcaram o período de minha formação, 
mostrando um exemplo de profissional em que posso me espelhar e ter como exemplo para a 
minha vida profissional. 
A minha orientadora Alane Dantas pela paciência e dedicação. Obrigada por todo 
esforço e estímulo em momentos de grande insegurança. Sua contribuição foi muito 
importante para a realização deste trabalho. 
Meus sinceros agradecimentos a Maternidade Escola Januário Cicco, instituição a 
qual, desenvolvi o estágio obrigatório durante um ano e trabalhei como bolsistas de apoio 
técnico. Apesar de toda dificuldade, os três anos e três meses de permanência na Instituição, 
me despertou para a compreensão na problemática estudada por essa pesquisa. Além, de ter 
 
 
auxiliado financeiramente aos meus estudos, a instituição possibilitou o aprendizado que 
levarei como experiência para minha vida profissional e pessoal. 
Em memória eterna aos meus avós, Sebastião Galvão, Cícero Serafim e Maria Serafim 
que não estão presentes fisicamente, mas sim dentro do meu coração. Sei que onde eles 
estiverem estão muito felizes com mais essa conquista em minha vida. Obrigado meus 
amores, por tudo que me ensinaram e por estarem se alegrando junto comigo pela realização 
de um sonho. 
E por fim, agradeço a minha avó, Francisca Rodrigues Galvão por me ensinar o amor 
e respeito. Obrigada pelo exemplo de honestidade e por ter contribuído de maneira 
significativa por essa vitória. “Obrigada vó”! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Discute-se nesta pesquisa, as formas mais recorrentes de violência obstétrica presentes na 
contemporaneidade, e o enfretamento a essa questão. Esse problema tem suas raízes nas 
relações desiguais entre homens e mulheres, que foram construídas ao longo dos tempos, e 
que avançam em tempos de reestruturação da economia. As mulheres vêm sendo alvos de 
diversas formas de violências, entre essas violências estão às inúmeras violações de direitos 
das parturientes, que se caracteriza como violência institucional, tendo em vista que suas 
expressões estão presentes nas instituições de saúde públicas e privadas. Como forma de 
enfrentamento a essa questão, o Estado tem idealizado políticas que visem mudanças na 
assistência ao parto no Brasil, porém a humanização no parto, que é o modelo proposto e 
melhor indicado, por se tratar de um projeto contra hegemônico, que em sua estrutura tem 
princípios adversos ao projeto neoliberal, tem sofrido rebatimentos no que se refere à atenção 
à saúde de forma humanizada. No presente trabalho, optou-se pela pesquisa bibliográfica, 
documental e observação participativa, pois para apreender a dinâmica do trabalho, recorreu-
se a autores teóricos que discutem a problemática para assim, fornecer um aporte teórico a 
pesquisa, bem como analisar dados retirados de documentos que revelaram como está à 
assistência ao parto no Brasil. E por fim, a observação participativa que diz respeito à 
investigação na prática como essa realidade se apresenta. O estudo buscou analisar os casos 
de Adelir e a mulher considerada “comedora de placenta”. Esses casos simbolizaram tipos de 
violência obstétrica que foi de grande repercussão na mídia e redes sociais. Perante esses 
casos, podem-se compreender as contradições inerentes às políticas de humanização que não 
são condizentes com a prática obstétrica. Os resultados da pesquisa apontaram que a 
assistência ao parto no Brasil está muito distante do que preconiza a Política de humanização 
ao parto, uma vez que os traços da medicina tradicional na assistência ao parto ainda são 
muito presentes na política de saúde. Todas essas questões têm relações intrínsecas com as 
desigualdades sociais de gênero, pois se verificou que, mesmo quando as mulheres conhecem, 
reivindicam e tencionam as instituiçõespelos seus direitos, estes não são respeitados e as 
parturientes ainda são julgadas como “exageradas” e “loucas”. 
 
Palavras-chave: Violência obstétrica, assistência ao parto, humanização, políticas de saúde. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
The discussion in this research concerns the most recurrent forms of obstetrical violence in 
the conteporary days and the ways to prevent it. This problem has its roots on unlike 
differences between men and women. These roots, which go on based on the re-structuring of 
economy, have been constructed through the time. Women have been target of many forms of 
violence such as: Violation of Mother's right, which is characterized as institutional violence, 
considering its expressions are present on public and private health institutions. As a solution 
to this problem, the government has idealized politics which have the objective to change the 
birth assistence in Brazil. Nevertheless, Birth Humanization is the best model proposed and 
advised for it's a counter hegemonic projec as its structure holds principles which go against 
the neo-liberal model. Birth humanization hasn't had the proper attention. In this essay, we 
used bibliographical, documental and participative observation. In order to learn dynamic of 
the article, we appealed to theorical authors which discuss the problematic adding,thus, a 
theorical support to the research and also analyses data taken from documents which revealed 
how is the Birth assistence is Brazil. In the end, the participative observation concerns the 
practical investigation on how this reality is presented. The essay analyses the cases of Adelir 
and the woman which is considered a “placenta eater”. These cases symbolize types of 
obstetrical violence which were very spread on the medias and social networks. Before these 
cases, we can comprehend the ineherent contradictions of the politics of humanization which 
do not correspond the practical obstetric. The results of the research show that Birth assistence 
in Brazil is very distant from what the Politics of humanization advocates in relation to birth, 
considering the tracts of traditional medicine in assistence to birth are still very present in 
Helth Politics. All of these themes have intrisic realtions with the social differences of this 
kind, for we found out that even when women know and press intitutions for theirs rights, the 
right aren't respected and the mothers are still judged as “exagerated” and “crazy” 
 
key words: obstetrical violence, birth assistence, humannization, health politics. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
ANS - AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE COMPLEMENTAR 
CES - CENTRO DE EDUCAÇÃO E SAÚDE 
CLT - CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS 
CPN - CENTRO DE PARTO NORMAL 
DATASUS -DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE 
FHC - FERNANDO HENRIQUE CARDOSO 
HIV - HUMAN IMMUNODEFICIENCY VIRUS 
MARE - MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO E REFORMA DO ESTADO 
MEJC - MATERNIDADE ESCOLA JANUÁRIO CICCO 
MHPNA - MOVIMENTO PELA HUMANIZAÇÃO NO PARTO E NASCIMENTO EM 
NATAL 
MS - MINISTÉRIO DA SAÚDE 
OMS - ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE 
ONG - ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL 
PEP - PROJETO ÉTICO POLÍTICO DO SERVIÇO SOCIAL 
PNAON - POLITICA NACIONAL DE ATENÇÃO OBSTÉTRICA E NEONATAL 
PNH - POLITICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO 
PNHAH - PROGRAMA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO DO ATENDIMENTO 
HOSPITALAR 
PPP‟S - PARCERIAS POLÍTICO-PRIVADO 
PT - PARTIDO DOS TRABALHADORES 
SESAP- SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE PÚBLICA 
SMS - SECRETÁRIA MUNICIPAL DE SAÚDE 
SUS - SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE 
USP - UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10 
2 VIOLÊNCIA DE GÊNERO: ELEMENTOS PARA COMPREENDER AS 
RELAÇÕES DE PODER NA CONTEMPORANEIDADE............................................... 17 
2.1 AS RELAÇÕES DE DESIGUALDADE ENTRE HOMENS E MULHERES: UMA 
ANÁLISE A PARTIR DAS RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO ....................................... 17 
2. 1.1 Violência de gênero: um enfoque sobre as expressões da violência institucional .. 23 
2.1.2 Violência obstétrica: as relações de poder presentes no âmbito hospitalar............. 25 
3 A ASSISTÊNCIA AO PARTO NO BRASIL: OS LIMITES QUE PERPASSAM A 
VIDA DAS PARTURIENTEs ............................................................................................... 34 
3.1 HUMANIZAÇÃO NO PARTO: LUTAS E RESISTÊNCIAS POR UM NOVO 
MODELO DE ATENÇÃO ...................................................................................................... 42 
3. 1. 1 Uma análise sobre o caso de Adelir e a “comedora de placenta” ........................... 57 
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 64 
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 67 
 
 
 
 
 
 
10 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
A temática proposta neste trabalho surgiu a partir da experiência do estágio 
acadêmico desenvolvido na Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC), e de instigadas 
observações às formas como as mulheres gestantes são assistidas por profissionais de saúde 
nesse espaço. Conforme nossa vivência na instituição durante o período de estágio podemos 
constatar através de relatos das gestantes que estavam internadas de que alguns direitos das 
parturientes
1
 não eram respeitados. A maioria das gestantes não era chamada pelo nome e 
muitas reclamavam que os médicos e enfermeiros não forneciam informações acerca de 
exames e procedimentos realizados, o que pode acarretar angustia e inquietações nas 
pacientes, por não saberem a que tipo de tratamento a parturiente estava submetida. 
 Na MEJC o direito ao acompanhante é restrito, tem que ser do sexo feminino com 
idade superior a 18 anos, o que impende a parturiente de escolher seu acompanhante, que em 
sua maioria preferem ter o esposo ao seu lado. Isso ocorre devido à estrutura da MEJC ser 
formada por enfermarias coletivas, o que de certa forma dificulta as outras pacientes de se 
sentirem a vontade, pois as parturientes necessitam amamentar, fazer curativos e outros 
procedimentos que com a presença de um homem na mesma enfermaria impossibilita a 
privacidade de outras pacientes. Desta forma, percebemos que a violência obstétrica é uma 
realidade presente na prática obstétrica da Maternidade Escola Januário Cicco. A experiência 
de estágio na MEJC foi um elemento propulsor para a escolha do objeto de pesquisa. 
De acordo com a Defensoria Pública de São Paulo, 2013 a violência obstétrica existe 
e caracteriza-se pelo tratamento desumanizado por parte dos profissionais de saúde, abuso de 
medicalização e patologização dos processos naturais, acarretando para mulher a perda da 
liberdade de escolha sobre seus corpos e sexualidade, causando-lhes pontos negativos na 
qualidade de vida destas mulheres. Os avanços tecnológicos na obstetrícia nas últimas 
décadas tem transformado o parto que é um processo fisiológico natural em um evento 
medicalizado e institucional, ultrapassando as recomendações cientificas para assistência ao 
pré-natal, parto e pós-parto por meio de uso abusivo da tecnologia, não respeitando o processo 
fisiológico, assim o parto passa a ser assistido como quase uma patologia
2
 e a parturiente 
como uma paciente, sendo negado o direito da mulher em participar do processo de 
nascimento. O parto está cada vez menos natural, tanto que atualmente no Brasil foi instituída 
 
1
 Mulher que está em trabalho de parto ou que acabou de dá a luz. Cf. http://www.dicio.com.br/parturiente/ 
2
 Ramo da medicina que estuda as doenças, suas causas e sintomas. Cf. http://www.dicio.com.br/parturiente/http://www.dicio.com.br/parturiente/
http://www.dicio.com.br/parturiente/
11 
 
uma Politica Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal no sentindo de humanizar a 
assistência obstétrica, a PNAON surgiu como resposta também aos Movimentos Sociais que 
lutam contra a violência obstétrica. 
Em outros países como Argentina e Venezuela a violência obstétrica é crime 
cometido contra as mulheres sujeito à punição, portanto sendo assegurado perante leis e 
normas a garantia às mulheres de sua liberdade sexual e reprodutiva, direito à saúde e 
dignidade. No Brasil a violência obstétrica não se configura como crime, porém as 
parturientes tem uma Politica Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal que estabelece 
como direito da gestante ter acesso a atendimento digno e de qualidade no decorrer tanto da 
gestação, como parto e puerpério
3
. 
 
A Atenção Obstétrica e Neonatal, prestada pelos serviços de saúde deve ter 
como características essenciais à qualidade e a humanização. É dever dos 
serviços e profissionais de saúde acolher com dignidade a mulher e o recém-
nascido, enfocando-os como sujeitos de direitos. (BEASIL, Portaria n° 
1.067/GM de 4 de Julho de 2005) 
 
Em contrapartida, o Brasil é o país que realiza mais cirurgias cesarianas no mundo. 
Segundo informações do DATASUS 2011, 52% das mães tiveram seus filhos por meio 
cirúrgico, o que é contrário às recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) que 
aconselha uma taxa de 15% cesáreas por país. Esses dados retratam a realidade das 
maternidades brasileiras em não respeitar o parto humanizado. Para Faundes (1991), 
 
O uso abusivo de cesarianas no Brasil tem contribuído para a desumanização 
da assistência, além de acarretar o aumento da mortalidade e morbidade 
materna e perinatal sem mencionar o desperdício dos escassos recursos do 
setor de saúde. (MATEI et, al. 2003, P. 17apud FAUNDES 1991) 
 
Nesse sentindo, a redução do alto índice de cesarianas no país é imprescindível para 
a melhoria nas taxas de morbimortalidade materna e infantil e essencial para humanizar a 
assistência obstétrica. 
Outras formas mais comuns de violência obstétrica são: negar ou criar dificuldades 
ao atendimento à mulher em relação ao acompanhamento pré-natal em unidades básicas de 
saúde; vedar a entrada de acompanhantes de escolha da parturiente; humilhar, falar mal, 
ofender, criar situações e comentários constrangedores à mulher ou sua família; negar 
atendimento à mulher, que fica peregrinando em busca por vaga em maternidades; uso de 
 
3
 Período pós-parto. Cf. http://www.dicio.com.br/parturiente/ 
http://www.dicio.com.br/parturiente/
12 
 
episiotomia
4
, cesariana ou outros procedimento sem indicações científicas e sem 
consentimento da parturiente, que causem dor ou dano físico ao corpo da mulher; falta de 
atenção ou informação à mulher, entre outras. (MATEI et, al. 2003) 
Diante desta tamanha violação dos direitos das parturientes, sentimos então a 
necessidade de conhecer, investigar e analisar esta problemática. O interesse pela temática 
apresentada neste trabalho também surgiu a partir do conhecimento de um fato verídico de 
violência obstétrica que tomou grandes proporções nos meios de comunicações e redes 
sociais. O caso de Adelir Carmén Lemos de Goes, da cidade de Torres – Rio Grande do Sul. 
Adelir foi obrigada por ordem judicial a ser submetida a uma cesariana no dia 01 de abril de 
2014, mesmo contra a sua vontade que desde o principio já desejava ter seu filho através do 
parto normal, mas o querer de Adelir não foi respeitado e durante a madrugada, com uso de 
força policial Adelir é levada para o Hospital Nossa Senhora dos Navegantes e a cesariana é 
realizada, sem o seu consentimento. Em face desse caso, tais questionamentos surgem: É o 
Estado que decidi sobre o corpo da mulher? Como a sociedade está lidando com o 
nascimento? 
Este acontecimento proporcionou inquietações, principalmente em mulheres que já 
foram vitimas da violência obstétrica. E em todo Brasil ativistas se mobilizaram contra este 
tipo de violência, e o movimento nas redes sociais denominado #SomosTodasAdelir foi se 
expandido, tanto que no município de Natal o “Movimento pela Humanização do Parto e do 
Nascimento em Natal” incorporou esta luta e através desse ativismo virtual pela humanização 
do parto e contra a violência obstétrica, essa temática se aproximou ainda mais da motivação 
pela escolha em discutir esse problema, que é tão recorrente em nossa realidade, mas por se 
tratar de uma violência “silenciosa” nem todos percebem a sua presença. 
Na cidade de Natal, manifestações em favor de Adelir foram realizadas por 
intermédio do “Movimento pela Humanização do Parto e do Nascimento em Natal”. Esse 
Movimento foi criado inicialmente por quatro mulheres que já sofreram algum tipo de 
violência obstétrica nas maternidades de Natal, e posteriormente mais integrantes foram se 
unindo ao movimento com o objetivo de buscar maneiras de mudança na assistência ao parto 
e nascimento em Natal. Na cidade de Natal também ocorreu um caso de grande repercussão 
em todo Brasil. A mulher que sofreu diversas violações em seu parto e por exigir que seu 
 
4
 É um corte feito na região do períneo, área muscular entre a vagina e ânus. Cf. 
http://www.senado.gov.br/comissoes/documentos/SSCEPI/DOC%20VCM%20367.pdf 
13 
 
plano de parto fosse realizado, a mesma foi julgada de “surtada” e “comedora de placenta”
5
 
pelos médicos que a atenderam. Logo, toda a cidade tomou conhecimento do fato e como só a 
versão do médico foi divulgada, a mulher sofreu grandes repressões das pessoas na cidade. 
O interesse pelo tema consolidou-se a partir de uma reflexão a respeito dos direitos 
das parturientes estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS). De acordo com a 
OMS 2000, se constituem como direitos da mulher, 
 
Estar acompanhada durante o trabalho de parto e o parto, por alguém de sua 
escolha; conhecer a identidade do profissional; ser informada pelos 
profissionais sobre os procedimentos que serão realizados com ela e o bebê; 
receber líquidos e alimentos durante o trabalho de parto, sem excessos; 
caminhar e fazer movimentos durante o trabalho de parto; receber massagens 
ou outras técnicas relaxantes; tomar banhos mornos; adotar a posição que 
desejar no momento da expulsão; receber o bebê para mamar, imediatamente 
após o parto; ser chamada pelo nome. (MATEI et, al. 2003, P. 18 apud 
OMS, 2000) 
 
Desta forma, a partir dessas questões, entendemos que o referente trabalho pode 
contribuir para certa visibilidade a esta questão, problematizando esta forma de violação de 
direitos. Para transforma a realidade da violência obstétrica, se faz necessário compreendê-la, 
pois nem todas as mulheres se reconhecem como vitimas deste tipo de violência, em muitos 
casos por desconhecer seus direitos. Assim, este trabalho pode colaborar para que estas 
mulheres percebam que seus direitos foram violados e se reconheçam como sujeitos de 
direitos. 
O trabalho se configura como de suma importância, por constatar que no âmbito do 
Serviço Social existem poucas produções teóricas acerca da temática. Com isso, pode 
contribuir para a profissão perceber criticamente esta realidade, com a expectativa de 
estimular debates sobre este assunto entre os profissionais da área e acadêmicos. Enquanto 
profissão inserida no campo da saúde, precisamos refletir, entender e questionar essa 
realidade. Já que o projeto profissional do Serviço Social está relacionado diretamente com a 
defesa intransigente dos direitos humanos e se posiciona contra a quaisquer tipos de 
arbitrariedades, considerando como principio norteador a liberdade dos indivíduos sociais. 
Para a sociedade, acreditamos que esse trabalho monográfico é de grande relevância, 
pois pretende proporcionar uma reflexãoem relação ao objeto de estudo proposto neste 
 
5
 A mulher foi considerada “comedora de placenta” pelo fato de ter solicitado ao médico sua placenta, logo o 
profissional precipitadamente conclui-o que a mulher iria comer sua placenta, assim ao narrar toda a confusão 
o médico a chamou de “comedora de placenta”. Cf. http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-
norte/noticia/2014/07/sem-tempero-diz-obstetra-sobre-mulher-que-comeu-placenta-em-natal.html 
http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2014/07/sem-tempero-diz-obstetra-sobre-mulher-que-comeu-placenta-em-natal.html
http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2014/07/sem-tempero-diz-obstetra-sobre-mulher-que-comeu-placenta-em-natal.html
14 
 
trabalho. Pois, para que mulheres tenham a oportunidade de viver e participar do nascimento 
de seus filhos de forma humanizada, digna, segura e respeitosa é necessário avançar nas 
discussões a respeito da violência obstétrica divulgando e denunciando esta problemática a 
fim de buscar a promoção dos direitos humanos na gravidez e no parto. 
O objetivo geral da pesquisa é: Analisar as formas mais recorrentes de violência 
obstétrica e o enfrentamento do Estado a essa questão, uma ênfase nos casos de Adelir e da 
“comedora de placenta”. Dentre os objetivos específicos estão os seguintes: Identificar quais 
os tipos de violência obstétrica mais recorrentes no cenário atual; Contribuir para uma 
reflexão sobre a violência obstétrica; Analisar as Políticas e Programas previstos pelo 
Ministério da Saúde para humanização do parto e do nascimento; Analisar a forma como o 
Estado se colocou no caso de Adelir. 
Para compreender o objeto de estudo, optamos pelo método critico dialético com a 
finalidade de analisar a violação dos direitos das parturientes em sua totalidade. 
Aprofundamos nossas análises a partir dos questionamentos que nortearam a pesquisa, 
as questões são as seguintes: 
O Estado e a Medicina tem o poder de decidir sobre o corpo da mulher? 
Por que essa violação de direitos das parturientes é tão recorrente? 
Como o Estado, se organiza no enfrentamento a essa questão? 
Nesse sentido, entendemos que só o materialismo critico dialético pode proporcionar 
a análise das questões citadas, pois infere-se que a metodologia adotada se aproxima do real, 
sendo o método que possibilita ver além do que a problemática nos apresenta, analisando 
outras questões que de certa forma estão implícitas, reforçando a análise da totalidade. De 
acordo com NETTO (2009, p. 8): 
 
O objetivo do pesquisador, indo além da aparência fenomênica, imediata e 
empírica – por onde necessariamente se inicia o conhecimento, sendo essa 
aparência um nível da realidade e, portanto, algo importante e não 
descartável –, é apreender a essência (ou seja: a estrutura e a dinâmica) do 
objeto. 
 
Para que a pesquisa se concretizasse foi essencial à apreensão do contexto histórico 
da assistência ao parto no Brasil e categorias teóricas que estão relacionadas à temática, quais 
sejam: A violência de gênero e institucional; o neoliberalismo e a contrarreforma do Estado; 
cultura machista; questões essas, que devem ser entendidas relacionando com as 
determinações do capitalismo em sua atual fase, especificamente na realidade brasileira. 
15 
 
Definida a natureza do objeto, à pesquisa se baseou em outras fontes secundárias, a 
partir da pesquisa bibliográfica, observação participativa e documental (os documentos que 
foram analisados: o manifesto do Movimento pela Humanização do Parto e Nascimento em 
Natal; a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal; o Dossiê – Rede Parto do 
Princípio). 
A pesquisa bibliográfica ajudou na compreensão dos conceitos e categorias teóricas 
do objeto de estudo. Esse tipo de pesquisa nos permite analisar o contexto histórico para além 
do que a problemática nos apresenta. “A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside 
no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla 
do que aquela que poderia pesquisar diretamente”. (Gil, 1989, p. 73) 
A pesquisa documental oportunizou ter acesso a dados relevantes para o 
desenvolvimento da pesquisa, bem como analisa-los com auxilio de outras fontes, na 
dimensão da totalidade do objeto de estudo. Esse método é formado por materiais, que se 
diferenciam da pesquisa bibliográfica, pelo fato de em seus documentos os dados não 
fornecerem uma analise analítica. 
 
A pesquisa documental assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica. A única 
diferença entre ambas está na natureza das fontes. Enquanto a pesquisa 
bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos 
autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de 
materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda 
podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa. (GIL, 1989, 
P. 73) 
 
Destaca-se também o período de observação participativa, realizado durante o 
estágio na Maternidade Escola Januário Cicco. A pesquisa com base na observação 
participativa é no sentido de perceber e investigar situações e questões que não são facilmente 
perceptíveis ou que passem despercebidas, ou seja, a observação participativa pode ajudar a 
compreender questões que não são apresentadas teoricamente, mas sim na prática cotidiana. 
O Recorte do período da pesquisa transcorreu durante o ano de 2014. Ao longo desse 
trabalho nos esforçamos para compreender, através das análises dos documentos e do 
levantamento bibliográfico, quais os direitos que estão previstos no âmbito das políticas e dos 
programas do Ministério da Saúde, além das diretrizes dos usuários, para as mulheres 
grávidas, e se, de fato, o Estado vem garantindo esses direitos. Debruçamos-nos sobre o caso 
de Adelir a fim de identificar como o Estado se posicionou em relação ao caso de negar a 
ordem de uma médica em tentar forçar Adelir a se submeter a uma cesariana. Lembrando que 
16 
 
o caso de Adelir não representa a totalidade dos casos de mulheres que sofrem esse tipo de 
violência, mas pela repercussão nacional que o caso obteve diante da postura do Estado, esse 
fato merece ser discutido e analisado na pesquisa, pelo motivo de caracterizar parte das 
contradições inerentes entre as políticas de saúde estabelecidas pelo Ministério da Saúde e o 
projeto neoliberal. 
A pesquisa presente foi dividida em dois capítulos. O primeiro busca discutir as 
formas mais recorrentes de violência obstétrica no cenário atual, bem como a conjuntura 
histórica que antecede a questão das violações de direitos das parturientes. Levantamentos 
acerca das questões dos tipos de violências contra as mulheres (violência de gênero, violência 
institucional, violência obstétrica) que de certa maneira interferem e norteiam essa 
problemática, a fim de compreendê-la melhor, são apresentadas e discutidas. 
No segundo capítulo a assistência ao parto é apresentada de forma inicial para 
apreender da melhor forma as políticas de humanização que o Estado adota como 
enfrentamento ao problema da violência obstétrica. Outras formas de resistência e lutas para a 
erradicação deste tipo de violência são colocados em práticas através das mobilizações e 
ativismo. O caso de Adelir e da mulher considerada “comedora de placenta” são relatados 
com a finalidade de analisar por meio desses casos, partes das contradições pertencentes às 
politicas de humanização formuladas pelo Ministério de Saúde e a prática obstétrica do Brasil. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
17 
 
2 VIOLÊNCIA DE GÊNERO: ELEMENTOS PARA COMPREENDER AS 
RELAÇÕES DE PODER NA CONTEMPORANEIDADE. 
 
 Neste capítulo iremos discutir as formas mais recorrentes de violência obstétrica no 
cenário atual, mas para compreender esse tipo de violência em sua totalidade, recorreremos a 
uma breve fundamentação histórica das dimensões que envolvemessa conjuntura de violência 
no ambiente hospitalar para com as mulheres. 
2.1 AS RELAÇÕES DE DESIGUALDADE ENTRE HOMENS E MULHERES: UMA 
ANÁLISE A PARTIR DAS RELAÇÕES SOCIAIS DE GÊNERO 
Conforme Saffioti em “O Poder do Macho” de1987, a identidade social quer seja da 
mulher ou do homem são construídas socialmente mediante diferentes atribuições em que a 
sociedade sujeita-os a cumprirem. E assim, delimitando qual é o papel da mulher e do 
homem. A primeira sempre lhe é esperado a atividade doméstica, pois sobre a mulher está à 
capacidade de ser mãe e consequentemente o dever de ser uma “boa dona de casa”. O 
segundo é responsável em prover o sustento da família, com isso é destinado ao homem 
trabalhar fora do lar em troca de dinheiro para assim suprir as necessidades da família. 
(SAFFIOTI, 1987) 
Essa lógica domina as relações durante décadas e ainda predomina até os dias de 
hoje, mesmo com as mudanças ocorridas na sociedade contemporânea, as quais as mulheres 
têm conquistado espaços distintos para além do âmbito doméstico, a resistência a essa 
transformação tem sido bastante difícil, pois por mais que a mulher se “profissionalize” e 
trabalhe fora de casa, ainda parece ser naturalizado a esfera doméstica como espaço feminino, 
desta maneira, esses ensinamentos vêm sendo passado de geração a geração, de que os 
afazeres domésticos não devem ser são realizados pelos homens e sim pelas mulheres, o papel 
de educar os filhos e ser uma dona de casa exemplar é exclusivo da mulher. 
 
A sociedade investe muito na naturalização deste processo. Isto é, tenta fazer 
crer que a atribuição do espaço doméstico a mulher decorre de sua 
capacidade de ser mãe. De acordo com este pensamento, é natural que a 
mulher se dedique aos afazeres domésticos, ai compreendida a socialização 
dos filhos, como é natural sua capacidade de conceber e dar a luz. 
(SAFFIOTI, 1987, p. 8) 
 
O trabalho doméstico tão pouco tem sido valorizado pela sociedade, atribuindo à 
mulher está função, consequentemente desvalorizando o papel social que lhe é imposto. A 
18 
 
sociedade investe na idealização de que o espaço doméstico sempre foi separado para a 
mulher e que isso é natural. Desta forma a autora Saffioti questiona: 
 
Desta forma, a ideologia cumpre uma de suas mais importantes finalidades, 
ou seja, a de mascarar a realidade Como falar em uma "natureza feminina" 
ou em uma "natureza masculina" se a sociedade condiciona inclusive o 
metabolismo das pessoas? Diferentemente dos outros animais, os seres 
humanos fazem história. (SAFFIOTI, 1987, p.10) 
 
Sendo assim, os papeis mais importantes da sociedade como; ciência, arte, política, 
entre outros, ficam para os homens, sendo negada em muitos casos, a oportunidade desse 
espaço a mulher, condicionando assim a inferioridade intelectual da mulher. O fato é que 
grande parte das posições consideradas mais importantes na sociedade são sempre ocupadas 
por homens. Com isso, questiona-se a inferioridade intelectual da mulher, não obstante 
esquecesse-se de indagar se foram oferecidas oportunidades iguais tanto para as mulheres 
quanto para os homens, pois como a responsabilidade do cuidado dos filhos e casa pairam 
sobre as mulheres, as mesmas ficam impedidas em muitos casos de desenvolverem suas 
potencialidades de que certamente são portadoras. (SAFFIOTI, 1987) 
As próprias mulheres naturalizam esse processo, aceitando a sua “inferioridade”. 
Podemos perceber isso, quando a mulher necessita trabalhar para auxiliar o cônjuge nas 
despesas do lar, o trabalho fora de casa realizado pela mulher é visto como uma “ajuda”, 
então a mulher não necessariamente precisa ganhar mais ou igual ao homem, pois não é 
função dela trabalhar, sendo necessário só quando o esposo não consegue suprir todas as 
necessidades da família, diante disso a mulher sujeita-se a receber salários inferiores mesmo 
quando desempenha a mesma função, cargo e trabalha no mesmo local que o 
homem.(SAFFIOTI, 1987) 
Segundo Saffioti, essa questão interessa aos grandes empresários, pois se o 
proprietário paga um baixo salário a mulher, (esse salário torna-se mais inferior quando a 
mulher é negra, mostrando uma discriminação racial incluído nesse processo) isso gera mais 
lucro ao dono da empresa, e o esposo e a esposa entendem como algo natural sem perceber 
que isso trará prejuízos a ambos, pois eles poderiam obter uma renda maior para a família. 
 
A classe patronal tem o maior interesse na existência de categorias sociais 
discriminadas: mulheres, negros, homossexuais. Quanto mais discriminada 
uma categoria social, tanto mais facilmente ela se sujeitara a trabalhar em 
más condições e por baixos salários. (SAFFIOTI. 1987, p.23) 
 
19 
 
Nesse caso é interessante ao empresário que está lógica machista de que a mulher 
teria que ganhar salário inferior ao do homem se reproduza, pois assim o proprietário explora 
mais trabalho obtendo um maior lucro. Desta forma, a discriminação contra a mulher e racial 
é socialmente construída a fim de favorecer a classe dominante, detentor do poder político e 
econômico. Assim o poder se concentra nas mãos do homem branco. Saffioti afirma que todo 
esse processo da ideologia dominante tem sua base no patriarcado, capitalismo e racismo. “o 
poder esta concentrado em mãos masculinas há milênios. E os homens temem perder 
privilégios que asseguram sua supremacia sobre as mulheres”. (SAFFIOTI, 2004, p.16) 
 
Do exposto pode-se facilmente concluir que a inferioridade feminina e 
exclusivamente social. E não e senão pela igualdade social que se luta: entre 
homens e mulheres, entre brancos e não-brancos, entre católicos e não-
católicos, entre conservadores e progressistas. Afinal, travam-se, 
cotidianamente, lutas para fazer cumprir um preceito já consagrado na 
Constituição Brasileira. Efetivamente, desde a primeira Constituição 
republicana, de 24 de fevereiro de 1891, "Todos são iguais perante a lei" (§ 
2.° do artigo 72). Esta igualdade legal, que passou a ser minuciosamente 
especificada a partir da Constituição de 1934, assim consta da Constituição 
vigente desde 17 de outubro de 1969: "Todos são iguais perante a lei, sem 
distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas" (§ 
1.0 do artigo 153). (SAFFIOTI, 1987. p.15) 
 
De acordo com a autora Safiotti (1987), além da posição de poder do homem no 
ambiente de trabalho em relação à mulher, e a função de ser um marido que garanti a ordem e 
o sustento da família. Ainda cabe-lhe, segundo a ideologia dominante, a função de caçador. 
Isso decorre de que o homem deve ir à busca de satisfazer seus desejos sexuais, 
independentemente se a mulher sente desejo ou não, o que importa para o homem é atender 
suas necessidades sexuais. Então, na análise da autora a mulher passa a ser objeto de desejo e 
o homem sujeito desejante, sem considerar se a mulher sente prazer ou não. Um exemplo que 
Saffioti cita, é um dos casos mais cruéis de opressão do homem em relação à mulher, o 
estupro. A violência sexual é uma realidade bárbara, em que pode gerar traumas terríveis que 
a vitima poderá levar para o resto da vida. Esse tipo de violência apesar da sua brutalidade 
acontece com diversas vitimas cotidianamente, e em sua maioria são acometidos por homens. 
O que nos leva a concluir que os homens por considerarem mais poderosos que as mulheres, 
se acham no direito de usar as suas vitimas como instrumento para satisfazer seus desejos 
sexuais. Isso acontece também pelo fato das mulheres serem consideradas mais fracas 
fisicamente em relação ao homem, desta maneira facilitando o ataque e a obrigação da mulher 
a realizar práticas sexuais mesmo contra sua vontade. (SAFFIOTI, 1987) 
20 
 
Nas análises de Saffioti, a vida sexual do homem deixa muito a desejar, pois 
culturalmente o homem foi conduzido a concentrar a sua sexualidade nos órgãos genitais, 
limitando seu prazer sexual no pênis, sem se quer saberque existem outras partes do corpo 
que o mesmo pode sentir desejo. Como a manipulação dessas partes é ignorada, o homem 
deixa de aproveitar outras partes de seu corpo para despertar seu desejo sexual e assim 
desfrutar de mais prazer na sua vida sexual. Desse modo, pode-se inferir que o homem paga 
um alto preço pelo poder que a sociedade lhe confere. (SAFFIOTI, 1987) 
 
Desta concentração da sexualidade na genitália deriva a expressão falocracia 
(falo = pênis), ou seja, o poder do macho. Pode-se também inverter o 
raciocínio e afirmar que a consolidação da supremacia masculina, ao longo 
de milênios de história, conduziu ao endeusamento do pênis, anulando ou 
pelo menos reduzindo o prazer que o homem pode sentir em outras áreas de 
seu corpo. Desta sorte, o homem paga um preço pelo poder de que desfruta. 
(SAFIOTTI, 1987. p; 19) 
 
Desse modo, pode-se inferir que o homem paga um alto preço pelo poder que a 
sociedade lhe confere. “Ambos seriam mais completos e, portanto, mais capazes de sentir e 
dar prazer. Das relações assimétricas, desiguais, entre homens e mulheres derivam prejuízos 
para ambos” (SAFFIOTI, 1987, p.20). 
Outro exemplo que pode ilustrar o assunto da qual estamos tratando, o poder do 
macho, é o fato de nas baladas os homens é que tem a função de caçador, se acontecer ao 
contrário, a atitude da mulher não é aprovada, pois é o homem que tem que ter a iniciativa de 
chamar a mulherada dançar e dá inicio a uma possível paquera, cabe-lhe ao homem decidir 
qual mulher é mais atraente para ele. Na Balada o homem também pode paquerar e conquistar 
várias mulheres, se assim o fizer, é considerado “o pegador”, “o gostosão” se ocorrer do 
mesmo modo com a mulher, ela é apontada como “piriguete” Outro caso é o de traição, o 
homem quando comete adultério ele é considerado “o garanhão”, já a mulher se fizer o 
mesmo é julgada como “safada”, a mulher é vista como um mau exemplo e para o homem é 
natural que isso aconteça. Portanto, percebemos o quão as relações entre mulheres e homens 
são desproporcionais, são pequenos detalhes e exemplos que muitos não percebem até casos 
extremos de violência contra a mulher, que geralmente tem raízes na subordinação e 
discriminação contra a mulher. 
Em consoante com Saffioti, o homem tem necessidade de ser “superior” a mulher, 
pelo motivo de que em alguns pontos as mulheres lhe causam inveja. Um exemplo é o fato de 
que o sexo feminino dispõe de diversas partes do corpo que podem despertar o desejo sexual, 
21 
 
diferentemente do homem que como já explanado concentra sua sexualidade no órgão genital. 
Ainda sobre esse assunto, segundo Freud assim como as mulheres sente inveja do pênis do 
homem que simboliza poder, o homem também é possuidor do mesmo sentimento pelo fato 
das mulheres darem a luz e conceber vida. (SAFFIOTI, 2004). Não obstante, a inveja dos 
homens da maternidade é pouco conhecida, pois os estudos que comprovam esse fenômeno 
dificilmente são divulgados e tão pouco são discutidos na sociedade. 
 
A inveja da maternidade é tão vigorosa que homens sexualmente impotentes 
pagam um preço mais alto a prostitutas grávidas, somente para conversar 
com elas e alisar-lhes a barriga. Contudo, a inveja da maternidade quase não 
se apresenta em livros e em artigos, vive na obscuridade. (SAFFIOTI, 2004. 
p.33) 
 
Em períodos anteriores, o individuo que gerava uma vida eram considerados mágicos 
seres poderosos e pessoas quase divinas de acordo com Saffioti. Por este motivo talvez às 
mulheres fossem admiradas pelos homens. Mas quando descobriu-se a participação do 
homem na fecundação, o sentimento de inveja permaneceu nos homens para com as mulheres. 
A capacidade de oferecer todos os nutrientes necessários para o desenvolvimento do feto e a 
possibilidade de produzir leite para alimentar os bebês, são elementos que causam inveja nos 
homens por não possuírem essa dádiva. (SAFFIOTI, 2004) 
 
No fundo, os homens sabem que o organismo feminino é diferenciado que o 
masculino, mais forte, embora tendo menos força física, capaz de suportar 
até mesmo as violências por eles perpetradas. Não ignoram a capacidade das 
mulheres de suportar sofrimentos de ordem psicológica, de modo invejável. 
Talvez por estas razões tenham necessidade de mostrar sua “superioridade”, 
denotando, assim, sua inferioridade. (SAFFIOTI, 2004, p.33) 
 
Diante dessa realidade, pode-se observar que assim como é destinado à mulher o 
trabalho doméstico, ao homem é taxado o papel de “homem provedor do sustento da família” 
como já explicado acima. Esses papeis já preestabelecidos, se tornam rigorosos tanto para a 
mulher como para o homem. Se o último desempenhar funções em seu lar, pode-se correr o 
risco de ser chamado de ”mulherzinha”, e sofrer diversos preconceitos. Se o homem não 
cometer adultério com uma mulher que está se insinuando para ele, os amigos podem julga-lo 
como “gay” e ser motivo de piadas em seu círculo de amizades. Desta forma, os homens 
também correm certo risco se não cumprir com o papel que foi designado a ele. (SAFFIOTI, 
2004) 
22 
 
Dessa discussão das relações entre homens e mulheres, a autora define gênero. 
Conforme Saffioti (2004), gênero é uma categoria ontológica caracterizada pelas relações 
entre homens e mulheres, não só destes, como também homens/homens e mulheres/mulheres. 
Desse modo, o estudo do ser social torna-se um complexo de totalidades em sua unidade e 
indivisibilidade, sendo assim, observamos que não é possível à separação, ou seja, a 
dicotomia entre o aspecto biológico e histórico do ser humano. “O gênero não é tão somente 
social, dele participando também o corpo” (SAFFIOTI, 2004, p. 125). 
Porém, para a autora o conceito de gênero é bem mais amplo, pois a questão 
“consiste em considerar sexo e gênero uma unidade, uma vez que não existe uma sexualidade 
biológica independente do contexto social em que é exercida.” (SAFFIOTI, 2004, p. 108-
109). Assim, as relações desenvolvidas entre homens e mulheres também são resultantes do 
contexto histórico em sua totalidade, de acordo com cada momento histórico. 
 
Sendo o gênero uma construção social ele não se apresenta sempre da 
mesma forma em todas as épocas e lugares, depende dos costumes, da 
experiência cotidiana das pessoas, variando de acordo com as leis, a religião, 
a maneira de organizar a vida familiar e a vida política de cada sociedade ao 
longo da história (CAMURÇA; GOUVEIA, 1997, p.8). 
 
Nesse sentindo o gênero não se configura como muitas pessoas pensam, na 
compreensão das relações de desigualdades entre homens e mulheres, este fenômeno está 
diretamente relacionado ao patriarcado. A concepção de patriarcado está ligada as relações de 
gênero levando em consideração a hierarquia e dominação-subordinação dos homens para 
com as mulheres. Embora os estudos mostrem que o patriarcado surgiu há cerca de 2.630-4 
anos atrás, para Saffioti este fenômeno é recente, pois se compararmos com o tempo da 
existência da humanidade entre 250 mil a 300 mil anos atrás, veremos que de fato o 
patriarcado está baseado em fontes recentes. (SAFFIOTI 2004 apud LERNER, 1986). 
Para que o patriarcado se desenvolvesse no período mais precisamente entre 
mudanças decorrentes das sociedades igualitárias para as desiguais, existem dois fatores que o 
fortalece: a produção do excedente econômico e a descoberta de que o homem participa na 
geração da vida (SAFFIOTI, 2004 apud JONHNSON 1997) Portanto, percebe-se que por 
falta de comprovação cientifica da existência ou não das sociedades igualitárias em relação ao 
gênero, podemos considerar que as relações de gêneros são dinâmicas no tocante do cenário 
histórico. Assim, se fizermos uma comparação no que se refere ao tempo ao estudo e 
existência de gênero e patriarcado, o primeiro tem suas referências desde a origem da 
humanidade, já o patriarcado está relacionado ao surgimento do capitalismo que tem sua 
23 
 
ideologia e fortalecimentonas relações de desigualdades e subordinação /discriminação da 
mulher. 
 
2.1.1Violência de gênero: um enfoque sobre as expressões da violência institucional 
 
Os primeiros estudos internacionais que tratam acerca da violência compactuam em 
estudos que se referem a “violência intrafamiliar” dos anos 1960. Neles eram analisados casos 
de violência contra a criança no seio familiar, o qual, a mãe era apontada como um dos 
agressores, sem ao menos contextualizar as circunstâncias em que aquela mulher vive. Nesse 
sentido, a mulher era culpabilizada sem se quer averiguar a condição dela também ser 
vitima. Foi esse contexto que impulsionou o movimento feminista internacional a criar a 
denominação “violência contra a mulher” nos anos de 1970. Essa designação cooperou para o 
entendimento de que a violência não acontece só na família, integrando-se outras situações 
como: o estupro, assédio sexual no trabalho, abuso sexual, tráfico de mulheres, prostituição 
forçada entre outras, assim, a violência passa a ser estudada como uma violação de direitos 
fundamentais para com as mulheres. (SCHRAIBER, et, al. 2005) 
Diante desse problema, inicialmente as instituições jurídico-policial é que são 
responsáveis em fornecer um suporte assistencial à mulher vitima da violência. Com isso, nos 
anos de 1980, as delegacias especiais para tratar diretamente dos casos de violência contra a 
mulher são criadas. No mesmo período, as questões relacionadas à saúde e a designação 
“Violência domestica” surge, E assim, há uma separação da violência de fato acometida 
contra a mulher e a intrafamiliar, e apesar da mulher sofrer violência em diversos contextos, é 
a familiar que os casos de violência são mais recorrentes. A vista disso emergem expressões 
como “mulheres espancadas”, “esposa abusada” ou “abusos conjugais”. Os estudos indicam 
os conflitos na família como uma conjuntura de violência, sendo a família agressora e violenta 
substituída pela terminologia violência domestica. (SCHRAIBER,. et, al. 2005) 
Enfim, nos anos 1990 a expressão “violência de gênero” aparece com o 
entendimento de que se a violência acontece no ambiente domestico entre familiares e é 
acometida diretamente contra as mulheres, os conflitos provavelmente são gerados por 
questões de gêneros. (SCHRAIBER, et, al. 2005) 
Perante esse recorte histórico, percebem-se as diferentes denominações que a 
violência adquiriu ao longo dos anos e as diversificações quando a questão da violência é 
tratada contra a mulher, dificultando a busca por um termo especifico e pertinente à 
problemática. (SCHRAIBER, et, al. 2005) 
24 
 
 
Não há ainda formas de designar esses atos e comportamentos que sejam 
sensíveis para captar a ocorrência e torná-la prontamente enunciável e, com 
isso, de imediato visível. Se assim fosse, as mulheres que vivem ou viveram 
violências teriam maior facilidade de se reconhecer nessa situação, e também 
de contar o problema a outros: pessoas capazes de apoiar as mulheres em 
situação de violência sejam profissionais de instituições ou não. 
(SCHRAIBER, et, al,2005 p. 32) 
 
Nesse caso, o problema da violência contra a mulher enfrenta dificuldades pelo fato 
de existir diversos significados em relação à definição do termo violência, que em muitos 
casos são associados a assaltos, latrocínios e homicídios. Dessa forma a questão da violência 
de gênero passa quase que despercebida pela sociedade. “Estamos aqui diante de um dos 
maiores desafios quando se trata de violência de gênero: não parece ser uma violação como 
outras violências, daí sua invisibilidade como um problema”. (SCHRAIBER,et, al. 2005, 
p.33) 
A violência de gênero não vem sendo tratada como um problema social e de saúde, o 
problema é do individuo mulher e não da sociedade, o que dificulta as pessoas em 
reconhecerem situações de violência como um dano à saúde e transgressões de direitos e, por 
esse motivo não recebe a mesma atenção que as outras situações de violência. Outra 
dificuldade no enfrentamento a questão de gênero é a própria condição de subordinação da 
mulher na sociedade, em que as mesmas se põem nessa colocação de inferioridade pela 
cultura machista inserida na sociedade, ir de contra ao patriarcado não é uma tarefa fácil, pois 
valores tal como a superioridade masculina e o menor valor atribuído à mulher, tem raízes 
históricas.” A ausência dessa critica reforça a violência vivida por certas mulheres como 
problemas apenas delas próprias, ou pior: como problema nenhum.” (SCHRAIBER, et, al. 
2005, p.35) A questão da violência de gênero na sociedade atual é vista com naturalidade, 
algo do cotidiano e que sempre existirá, por este motivo a busca por uma solução definitiva 
não é prioridade por se tratar de um quesito corriqueiro. 
 
Essa questão tem sempre um caráter de gênero, isto é, está inserida em 
relações desiguais, assimétricas, em que, a um dos pares, estão conferidos 
maior poder e autoridade, atribuições constituídas pela cultura – modo de 
viver em sociedade – como identidade masculina. (SCHRAIBER, et, al. 
2005, p.28) 
 
25 
 
Logo, infere-se que a violência de gênero por se tornar tão frequente, acaba por 
contribuir para aludir a uma questão insignificante e comum, colaborando para a 
incompreensão da problemática e sua invisibilidade. 
2.1.2 Violência obstétrica: as relações de poder presentes no âmbito hospitalar 
 
A partir desses elementos discutidos até aqui sobre as expressões da violência de 
gênero, iremos nos debruçar agora na discussão da violência institucional, tendo em vista que 
esse estudo problematiza as formas de violência obstétrica a que se submetem essas mulheres 
nas instituições públicas e privadas. De acordo com Botti (2013),violência institucional é 
caracterizada por se tratar de uma violência acometida pelas instituições prestadoras de 
serviços públicos ou privados, que desrespeitam os direitos fundamentais das mulheres. 
Sendo atribuído a esse problema tanto a ação ou omissão que transgridam esses direitos. 
Nesse sentindo, podendo ser incluindo a este tipo de violência desde a falta de acesso à saúde, 
até a ausência de qualidades dos serviços prestados as usuárias do sistema de saúde em 
decorrência das relações de poder assimétricas entre usuárias e profissionais de saúde. 
Exemplos que podemos atribuir à violência instituição se referem a: discriminação 
no atendimento por motivos de raça, etnias, idade, sexualidade, gênero, geográfica, 
deficiência física, doença mental; preconceito a mulheres em situação de abortamento e em 
casos de (HIV); violência física; violência psicológica; utilizações de procedimentos 
desnecessários e sem saber em evidências cientificas; proibição de acompanhantes; restrição 
nos horários de visitas familiares; desprezar as experiências vivenciadas pelas usuárias em 
detrimento do saber científico; ausência de informações do estado de saúde da paciente; falta 
de esclarecimento de procedimentos que serão utilizados no tratamento ou prevenção; 
peregrinação em busca de atendimento; frieza; negligência e falta de atenção ao paciente; 
atendimento de má qualidade por parte dos profissionais de saúde e sistemas de saúde; 
prescrição de medicamentos impróprios ao tipo de tratamento, entre outros. (BOTTI, 2013 
apud BRASIL, 2013). 
Esses casos citados como exemplificações são os mais recorrentes tipos de violência 
causados as mulheres nos sistemas de saúde em seu período gestacional. Esse tipo de 
violência tem um caráter de dominação/subordinação das mulheres em relação às normas das 
instituições. Exemplo disso está o direito ao acompanhante, estabelecido pela Lei 11.108 que 
assegura à mulher o direito ao acompanhante de sua escolha. Porém, em algumas instituições 
26 
 
esse direito é negado às parturientes, por se tratar de normas da instituição, assim, sobrepondo 
às normas e regras da instituição a Lei Federal. 
 
A violência institucional desta formaé condicionada a violência de gênero. 
Para mulheres no ciclo gravídico ações de violência podem relacionar-se à 
condição feminina exposta pela gravidez, e as relações de poder tornam-se 
mais significativas nesta fase. (BOTTI, 2013, p.651) 
 
Outra realidade que desqualifica os direitos das mulheres em seu protagonismo e 
autonomia é o número elevados de cesarianas, que mesmo orientado pela OMS a taxa de 15% 
dos casos de partos cesarianos e os estudos científicos revelando procedimentos considerados 
desnecessários a assistência ao parto, às instituições não respeitam as taxas de cesarianas 
muito menos a própria ciência, sendo colocado em prática o regime da instituição e a conduta 
dos profissionais sem levar em consideração a base científica e as recomendações da OMS. 
A autora Maria Luciana Botti (2013) em sua análise referenciada em diversos artigos 
que tratam da mesma questão, violência institucional na assistência ao parto, destaca três 
fatores para a compreensão da problemática, dentre eles: o “des-empoderar” da mulher diante 
das relações de gênero; o “poder” atribuído ao profissional de saúde; a violência institucional. 
O primeiro fator diz respeito à compreensão do papel social da mulher, o qual, em 
um contexto anterior era destinado à mesma o ambiente doméstico e por sua vez as 
responsabilidades de gestar e parir. As parteiras tradicionais responsáveis pelo parto não eram 
detentoras dos conhecimentos científicos, mas sim de experiências e sabedoria em oferecer 
todo apoio emocional preciso, assim, embora a dor do parto fosse inevitável, o clima de 
compreensão favorecia no momento do parto. Não obstante, com a diminuição do espaço das 
parteiras, sendo substituídos pelos médicos, dois elementos propiciam para a perda do poder 
da mulher na parturição: o poder concentrado nas mãos masculina de tal forma que se observa 
a naturalização desse processo, passando despercebido, isso talvez ocorra pelo fato de ser 
atribuída a construção da supremacia masculina a um descontexto social, como se essa 
ideologia fosse deslocada da conjuntura histórica e social que a construí-o. O segundo 
elemento é a patologização do parto com o advento da obstetrícia. (BOTTI, 2013) Sobre este 
último, 
Vigora no Brasil um modelo de atenção ao parto em que este é definido 
como um evento médico, carregado de risco potencial. Nesse modelo, 
denominado médico ou tecnológico, a gestante é tratada como paciente, os 
partos ocorre, em sua maioria, em ambiente hospitalar, sendo o médico o 
profissional responsável pela assistência, com utilização intensiva de 
27 
 
intervenções obstétricas (BOTTI, 2013 p.655 apud DOMINGUES et, al, 
2004). 
 
O que antes era visto como um evento natural agora é tratado como doença, 
necessitando de intervenção hospitalar e médica. Segundo Botti (2013, p. 655). “O parto 
intervencionista representa dentro da área médica, a vitória da ciência positivista em relação à 
natureza, pois traz ao natural um caráter extremamente patológico”. A mulher está sujeita a 
ordens de um profissional que detém do conhecimento cientifico, e por este motivo deve 
entregar seu parto e seu corpo para a medicina e assim confiar que tais procedimentos são 
para o bem de sua saúde, que mesmo utilizando-se de tecnologias abusivas e desnecessárias, 
ainda assim é atribuído ao médico o ato heroíco de salvar vidas. 
 
O foco da problemática da violência institucional no parto pode engendrar-se 
no discurso da violência de gênero, pois o subjulgo vivido no momento do 
parto representa a situação de vitimização da mulher em relação ao homem, 
representante, neste contexto da ciência que apóia a progressiva 
medicalização do corpo da mulher. (BOTTI, 2013, P.655) 
 
Em decorrência desse processo de adoecimento do parto, o poder do profissional 
sobre a mulher vem sendo exercido de forma natural e comum, assim o médico passa a 
dominar a prática na assistência ao parto e nascimento “A Medicina tem se caracterizado, 
historicamente, por ser uma profissão preocupada em obter benefícios, privilégios masculinos 
e controle sobre outras pessoas”. (BOTTI, 2013, p. 655 apud WOLFF; WALDOW, 2008). 
Assim, a medicina também passa a influenciar outras profissões da saúde a exercerem seu 
poder de forma autoritária aos usuários do sistema de saúde. 
Essa lógica de dominação das mulheres no momento do parto é ensinada nas 
faculdades de medicina. Os acadêmicos estão sendo ensinados a praticarem este tipo de 
violência, sem ao menos perceberem. Desta forma, reproduzem o que aprendem de forma 
acrítica e sem questionamentos. Os números de cesárias talvez estejam nesse patamar por 
causa da ausência de ensinamento de como proceder em tal situação recorrendo ao parto 
normal. Segundo a autora referenciando Rezende (1992), 
 
Essa visão desumanizada e mecanizada tem sido adotada acriticamente na 
academia, e os profissionais a incorporam ainda durante a sua formação, 
uma vez que um dos mais tradicionais livros-texto de obstetrícia utiliza a 
metáfora "motor-objeto-trajeto" para explicar os mecanismos do parto: o 
útero seria o motor, o feto seria o objeto e o canal vaginal se constituiria em 
trajeto (BOTTI, 2013. p. 656 apud REZENDE, 1992,) 
 
28 
 
Desta forma, ao transformar o parto em um evento medicalizado e institucional, os 
profissionais também incorporam a compreensão desse processo como algo reduzido ao saber 
cientifico com ausência de afeto. Assim, esses profissionais oferecem um atendimento não 
humanizado, reconhecendo a tecnologia como o único provedor do parto, o que importa é 
nascer, e não como ocorre esse processo. Betti (2013) afirma que essa insensibilidade por 
parte dos profissionais é um dos pontos que acarreta a violência institucional. A autora Betti, 
referenciando Figueiredo “A autoridade é sempre exercida sobre os menos fortes ou que não 
tem autoridade, entretanto, não implica necessariamente em violência. No entanto, mesmo a 
violência pode ocorrer num clima de extrema amabilidade e afeto”. (BETTI, 2013 apud 
FIGUEIREDO et al, 2004) 
Conforme Betti (2013), esse tipo de violência ainda apresenta uma discriminação em 
relação ao gênero e raça. Pois referenciando Cruz (2004), a taxa de mortalidade entre 
mulheres negras está em torno de 212,8 por 100.00 mil nascituros e 37.73 para as mulheres 
brancas. Assim, percebe-se uma diferenciação no tratamento entre ambas, o que só reforça 
que adentro da subordinação da mulher na assistência ao parto, à mulher negra ainda é mais 
prejudicado em relação à branca, o que podemos considerar discriminação racial incorporado 
na institucionalização do parto. 
Diante dos conceitos apreendidos dos tipos de violência contra as mulheres, e da 
discussão das relações de poder na sociedade, adentraremos na análise da violência obstétrica 
desde seu conceito até as formas mais recorrentes desta. Por considerarmos que este tipo de 
violência deve ser analisado em sua totalidade, assim incluído o entendimento que a violência 
obstétrica está atrelada a outros determinantes. 
Para Schhraiber. Et, al. “Entende-se por violência os comportamentos que 
desconhecem e transgridem os direitos das pessoas: direito ao respeito e à dignidade que cada 
um tem, homem ou mulher”.(SCHHRAIBER. Et, al. 2005, p.13) Saffioti sobre essa discussão 
reafirma que: o conceito de violência se baseia na “ruptura de qualquer forma de integridade 
da vitima: integridade física, integridade psíquica, integridade sexual, integridade moral”. 
(SAFFIOTI, 2004, p. 17) 
Sendo assim, a violência obstétrica pode ser considerada uma forma de violência 
contra a mulher, pois trata-se de uma série de violação dos direitos pertencentes as 
parturientes podendo atingir a integridade física, psicológica e sexual da mulher no período da 
gestação, parto e pós-parto. A Violência obstétrica é todo ato de violência cometido por 
profissionais da área da saúde contra a mulher no exercício de sua saúdesexual e reprodutiva. 
29 
 
(Dossiê - Rede Parto do Principio, 2012). É um tipo de violência que fere a autonomia da 
mulher, impossibilitando-as de escolherem a forma que gostariam de dá a luz, essa violência 
ocorre tanto nas maternidades públicas como nas particulares. 
Segundo estudos da faculdade de medicina da USP, no Brasil em cada quatro 
mulheres uma sofre violência obstétrica. Dados de um estudo realizado pela Fundação Perseu 
Abramo em 2011 constatou que 25% das brasileiras relataram ter sofrido algum tipo de abuso 
ou maus tratos durante a assistência ao parto (Fundação Perseu Abramo, 2011). Talvez o alto 
índice de violência obstétrica e de cesarianas desnecessárias que também é uma violência, 
esta nesse patamar porque no Brasil não há uma Legislação que defina esse tipo de violência 
como crime ou até mesmo como violência, o que dificulta reconhecer e erradicar com essa 
forma de violência que é tão recorrente na realidade brasileira. (Dossiê-Rede Parto do 
Principio, 2012). A introdução da Lei da Venezuela caracteriza a violência obstétrica como 
questão de gênero, 
 
A violência contra a mulher constitui um grave problema de saúde pública e 
de violação sistemática de seus direitos humanos, que mostra de forma 
dramática os efeitos da discriminação e subordinação da mulher por razões 
de gênero na sociedade. (Dossiê - Rede Parto do Principio, 2012, p.29) 
 
A raiz da violência de gênero na sociedade está diretamente relacionada com o 
patriarcado, que estabelecem relações sociais de subordinação e discriminação contra a 
mulher. São valores patriarcais que desqualificam a mulher e quase eximem suas opiniões e 
vontades. E o que agrava ainda mais a situação é que essa violência de gênero é vista como 
algo natural na sociedade machista, isso acontece, principalmente, devido à ausência de 
direitos fundamentais para com as mulheres, como respeito, dignidade, autonomia, liberdade, 
direito a saúde e à vida. (Dossiê – Rede Parto do Principio, 2012) 
O crescente número de cesáreas e as inúmeras violações de direitos acometidas 
contra as mulheres é uma típica violência de gênero, pois a parturiente perde o direito de 
participar do seu parto, de escolher o modo que ela planejou para o nascimento de seu filho 
pelo simples fato de ser mulher. E o que está por trás dessa questão é a cultura machista 
inserida na sociedade de tal forma que em alguns casos a própria mulher não se dá conta que 
faz parte dessa cultura, expressando sentimentos de medo e incapacidade de parir. De acordo 
com o obstétrico Ricardo Jones, um dos participantes do documentário “O Renascimento do 
Parto” (2013) o modelo contemporâneo de obstetrícia reproduz a ideia da incapacidade e 
incompetência da mulher em não dá conta do processo de nascimento por si mesma, assim 
30 
 
sendo necessárias intervenções para a parturição. E a culpa de índices tão elevados de 
cesáreas recai sobre a mulher, como se o problema e o defeito estivesse no corpo da mulher e 
não no sistema. 
Ricardo Jones em outro trecho do documentário relata que o ator principal do parto 
passa a ser o médico, a criança o produto e a mãe o subproduto secundário. Essa fala retrata 
bem o interesse econômico intercalado na assistência ao parto. E esse fato ainda demonstra a 
superioridade do médico e a decisão do mesmo que sobrepõe de quaisquer vontades. 
 Nesse sentindo, compreendemos que um dos motivos para que essa problemática 
ocorra estejam relacionados ao modelo de assistência médica que é bastante resistente à 
mudança e incongruente em relação ao entendimento da violência obstétrica, e assim, os 
profissionais da área médica se reconhecem em muitos casos como “donos dos corpos e da 
verdade”. Não obstante, não devemos culpabilizar exclusivamente os médicos, pois 
compreendemos que os mesmos são vitimas de um sistema que reproduz a lógica 
mercadológica e a cultura machista, os acadêmicos estão sendo ensinados a serem objetivos, 
imediatos, rápidos, ou seja, realizam o mesmo movimento da lógica capitalista e da cultura 
machista, sem ao menos perceberem e questionarem esse processo. 
Embora o alto índice de cesarianas se apresente de forma tão recorrente na realidade 
brasileira, a mulher mesmo que não seja submetida a uma cirurgia, e assim, passando pelo 
processo de parto natural, ainda corre o risco de ser cortada, como é o caso da episiotomia 
(corte na vagina). 
 
A episiotomia, ou pique, é uma cirurgia realizada na vulva, cortando a 
entrada da vagina com uma tesoura ou bisturi, algumas vezes sem anestesia. 
Afeta diversas estruturas do períneo, como músculos, vasos sanguíneos e 
tendões, que são responsáveis pela sustentação de alguns órgãos, pela 
continência urinária e fecal e ainda têm ligações importantes com o clitóris. 
(Dossiê, Rede do Parto, 2012. p.80). 
 
A medicina baseada em evidências já comprovou que o uso da episiotomia em 
muitos casos é desnecessário, sendo indicado em apenas 10% a 15%, mesmo assim é 
realizado corriqueiramente em mais de 90% dos partos naturais nas maternidades brasileiras, 
com o intuito de facilitar a passagem do bebê, sem ao menos levar em consideração as 
consequências graves que aquele procedimento pode gerar a mulher. Relatos de algumas 
vítimas da episiotomia no documentário “A voz das brasileiras” (2012) dão conta de que o 
uso da episiotomia pode causar problemas psicológicos e físicos, como inflamações, 
desconforto, dores constantes, sendo até comparado pelas vitimas como uma violência sexual, 
31 
 
ocasionando problemas e dores em futuras relações sexuais com o companheiro. (Dossiê – 
Rede Parto do Principio, 2012) 
A taxa de episiotomia no Brasil em partos fisiológicos chega a ser de 94% (Dossiê - 
Rede Parto do Principio 2012 apud BRASIL; CEBRAP, 2006). È um procedimento sem 
evidências cientificas, e que em muitos casos são realizados sem o consentimento da mulher, 
sem ao menos explicar a parturiente de seus riscos, benefícios ou mesmo como proceder após 
a cirurgia em relação aos cuidados na recuperação. 
 
Desde o inicio da década de 1980 há fortes indícios de que a episiotomia de 
rotina é prejudicial para a mãe e não oferece benefícios para o bebê 
(CARROLI; BELIZÁN, 1999). E foi contraindicada como procedimento 
rotineiro em 1985 pela Organização Mundial de Saúde (WHO, 1985). Diante 
dessas informações, constata-se que as mulheres estão sendo submetidas à 
episiotomia de forma rotineira, em uma relação de confiança com o 
profissional de saúde, em um momento de vulnerabilidade, muitas vezes sem 
aviso e sem informações cientificas, em uma situação na qual não é possível 
se defender - constitui violência obstétrica de caráter físico, sexual e 
psicológico. (Dossiê – Rede Parto do Principio, 2012, p. 82 – 83) 
 
A Vista disso, as mulheres podem acabar por optar pela cesárea com apreensão de 
obter uma experiência traumática e com inúmeras sequelas com o procedimento da 
episiotomia, ora, se a parturiente vai passar pelo procedimento de cirurgia tanto na cesárea 
como no parto normal, provavelmente a mulher vai preferir o método da cesárea por ser 
considerado “menos traumático e doloroso”, pois a mulher ainda pretende ter sua vida 
sexualmente ativa. Então, infere-se que mesmo quando a mulher escolhe passar pelo processo 
fisiológico, ainda corre-se o risco de ser vitima da episiotomia e tem seus direitos sexuais, 
reprodutivos e sua integridade física violada. (Dossiê – Rede Parto do Princípio, 2012.) 
Além de a episiotomia ser caracterizada como uma violência obstétrica, ainda 
envolve uma questão de raça e classe social, pois as mulheres de maior poder aquisitivo e 
brancas tem a opção de escolher a cesárea em seu plano de saúde. Porém, as mulheres de 
baixa renda e em sua maioria negras que dependem do SUS e sem escolhas, são submetidas 
ao parto natural e consequentemente a episiotomia. 
 
Como as mulheres negras têm características diferentes em termos decicatrização, pela maior tendência a formação de que loides (cicatrizes 
tumoriformes mais comuns nos indivíduos de raça negra) acreditamos que 
estão mais sujeitas a complicações cicatriciais da episiotomia. (Dossiê - 
Rede Parto do Principio, 2012, p.89) 
 
32 
 
A episiotomia ainda é utilizada com finalidades didáticas, em muitos casos a mulher 
não necessita passar por esse procedimento, mas o estudante de medicina precisa aprender 
epara isso, concretiza a episiotomia sem indicação cientifica, realizando seu treinamento em 
mulheres, fragilizadas e vulneráveis. 
 
Submeter uma mulher a procedimentos desnecessários, dolorosos, com 
exposição a mais riscos e complicações, com a única e exclusiva finalidade 
de antecipar o exercício da prática desse procedimento em detrimento do 
aprendizado do respeito  integridade física das pacientes, bem como seu 
direito inviolável à intimidade é considerado, no contexto dos direitos 
reprodutivos violência obstétrica de caráter institucional, físico e, não raro, 
sexual. (Dossiê – Rede Parto do Princípio, 2012.p. 93). 
 
Nas maternidades escolas isso se torna muito comum, pois os residentes e estagiários 
necessitam dessa prática para se formarem e apreenderem para assim, adquirir experiência na 
área. Não obstante, a equipe primeiramente precisa dialogar, orientar e informar a paciente de 
todo o procedimento que será realizado e que isso não traga consequências para a saúde da 
mesma, pois acima de tudo e não menos importante está a saúde da mulher e de sua família, o 
respeito e sua autonomia. Referenciando kettlle (2005) “Assim, antes de aprender a realizar a 
episiotomia, esses profissionais precisam aprender a respeitar a fisiologia do parto e o ritmo 
da mulher, medida que se mostra fundamental na preservação de integridade do períneo.” 
(Dossiê – Rede Parto do Princípio 2012, p. 93 apud KETTLE, 2005). 
Durante a experiência de estágio, percebemos o quão grande é a falta de privacidade 
da mulher em trabalho de parto, pois a mesma fica exposta em uma sala de parto 
“humanizado” aberta e com inúmeros estudantes visualizando o processo, e não só estudantes, 
mas estranhos também, pois as informações do setor são fornecidas pela equipe que se 
acomoda em uma mesa que fica entre as duas salas de partos, desta maneira qualquer pessoa, 
seja acompanhantes ou visitantes de outra paciente, enquanto busca informações a respeito da 
paciente que está dando assistência, pode assistir o parto da outra paciente que está parindo na 
sala ao lado. Isso já ocorreu diversas vezes na presença dos estagiários. A paciente está isenta 
de quaisquer privacidades. E ainda, as mulheres antes de parir estão sujeitas a numerosos 
exames de toque. Intervenções com finalidades didáticas também se configura como uma 
violência obstétrica, pois as mulheres estão sendo expostas em um momento de fragilidade 
em que muitas não se sentem bem pela existência de tantas pessoas estranhas em um 
momento de intimidade, então se faz necessário que questione a paciente se tal procedimento 
33 
 
pedagógico pode ser executado, respeitando a vontade da mulher e o direito de informa-la 
sobre todo o procedimento que será sucedido. 
Outra problemática bastante recorrente é o uso de ocitocina
6
 a fim de acelerar o 
trabalho de parto. Nas maternidades isso é habitual, mesmo obtendo conhecimento de que 
esse procedimento pode gerar complicações graves para a mãe e o bebê como sofrimento 
fetal, o uso da ocitocina é utilizado corriqueiramente, sem o consentimento da mulher e sem 
informações, e como nos outros casos, sem evidências cientificas, é apenas mais um 
procedimento com o objetivo de facilitar a vida da equipe, prejudicando a saúde da parturiente 
e do recém-nascido, podendo até provocar a morte da mulher e bebê. (Dossiê – Rede do Parto, 
2012.) 
 
Relatos de várias partes do Brasil referem-se â utilização rotineira de 
ocitocina, rompimento artificial da bolsa e a dilatação manual do colo para 
acelerar a dilatação, seguida de comandos de puxos, episiotomia, manobra 
de Kristeller e fórceps para acelerar o período expulsivo. Caso essas 
manobras não resultem na saída do bebê pela vagina, ou caso haja suspeita 
de sofrimento fetal, recorre-se à cesárea (que é realizada quando há anestesia 
disponível). (Dossiê – Rede Parto do Principio, 2012, p. 96) 
 
Como relatado na citação acima, a manobra de kristeller também é adotado na 
assistência ao parto, mesmo sabendo dos danos que pode provocar a mulher. “A compressão 
abdominal pelas mãos que envolvem o fundo do útero constitui a manobra de kristeller. Este 
recurso foi abandonado pelas graves consequências que lhe são inerentes”. (Dossiê – Rede 
Parto do Principio 2012, p. 103 apud Obstetrícia Normal, manual de BRIQUET) 
(DELASCIO; GUARIENTO, 1970; 329) A manobra de kristeller pode causar falta de 
oxigenação no bebê e acarretar problemas no andamento do parto, e ainda cria um incomodo 
e gera dores na paciente que tem sua barriga empurrada e apertada por um profissional que às 
vezes até sobe em cima da barriga com o intuito de empurra-la. Referenciando o autor Reis 
(2005) “A manobra de kristeller é reconhecidamente danosa â saúde e, ao mesmo tempo, 
ineficaz, causando a parturiente o desconforto da dor provocada e também o trauma que se 
seguirá indefinidamente”. (Dossiê – Rede Parto do Principio, 2012, p.105) 
Desta forma, podemos concluir que as violências obstétricas mais recorrentes no 
cenário atual só comprovam que a mulher está sendo sujeita a tais violências pelo fato das 
mudanças que estão ocorrendo na sociabilidade, ora, na sociedade capitalista as relações 
 
6
 Ocitocina ou oxitocina é um hormônio que tem a função de promover o aceleramento do parto. Cf. 
http://www.senado.gov.br/comissoes/documentos/SSCEPI/DOC%20VCM%20367.pdf 
34 
 
sociais tendem a serem rápidas e imediatas com o objetivo de se obter mais lucro e tempo, 
sem pensar no que o agravo desse tipo de violência pode acarretar para mulher e sua família. 
“O modelo tecnocrático caracterizado pela primazia da tecnologia sobre as relações humanas, 
e por sua suposta neutralidade de valores”. Portanto, o uso abusivo da tecnologia, a 
medicalização do parto e as intervenções desnecessárias só dão conta de facilitar e acelerar o 
processo do parto, sem levar em consideração a dignidade e o respeito aos direitos humanos 
fundamentais para com as mulheres. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
35 
 
3 A ASSISTÊNCIA AO PARTO NO BRASIL: OS LIMITES QUE PERPASSAM A 
VIDA DAS PARTURIENTES 
 
Neste capítulo iremos iniciar nossa discussão sobre a humanização no parto, 
recorrendo a um breve contexto histórico a respeito da assistência ao parto no Brasil, pois 
entendemos que um estudo que envolve a vida social, demanda necessariamente, uma 
compreensão sobre a conjuntura histórica que o antecede. 
O cenário histórico do parto no Brasil até o século XVI segundo Maldonado (1991) 
era visto como “assunto de mulher”. As duas figuras que representavam aquele momento de 
parturição, eram basicamente a mulher e a parteira. Nessa época existiam as receitas mágicas 
que ajudam a aliviar as dores das contrações. As orações também faziam parte desse momento 
a fim de favorecer um clima emocional positivo, esse momento era proporcionado pelas 
parteiras que auxiliavam na hora do parto. Aos poucos, com o advento das novas tecnologias 
na obstetrícia as mudanças foram ocorrendo no modelo de assistência ao parto, e entre o 
século XVI e XVII a figura do cirurgião é inserida no parto e como consequência as parteiras 
foram perdendo a prioridade. (MATEI, et. al,. 2003) 
Os avanços da tecnologia na obstétrica foram crescendo, consequentemente o 
número de cesarianas aumentavam, e com isso até a posição de decúbito dorsal (posição 
deitada) passa a ser utilizada com o objetivo de

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