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ResponsabilidadeCivilExtracontratual-Mascarenhas-2017


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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO 
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO ADMINISTRATIVO 
 
 
 
 
 
 
 
 
JASMINNE FERNANDES MASCARENHAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO NOS 
CASOS DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA OCORRIDOS NO SERVIÇO PÚBLICO 
DE SAÚDE: UM CHECK UP JURISPRUDENCIAL 
 
 
Orientadora: Prof. Msc. Catarina Cardoso Sousa França 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2017 
 
 
 
JASMINNE FERNANDES MASCARENHAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO NOS 
CASOS DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA OCORRIDOS NO SERVIÇO PÚBLICO 
DE SAÚDE: UM CHECK UP JURISPRUDENCIAL 
 
 
Monografia apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em Direito da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, como pré-
requisito para obtenção de título de 
Especialista em Direito Administrativo. 
 
Orientadora: Prof. Msc. Catarina Cardoso 
Sousa França 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2017 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN 
Sistema de Bibliotecas - SISBI 
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Elaborado por Shirley de Carvalho Guedes - CRB-15 - 404 
 
 
 
 
 
Mascarenhas, Jasminne Fernandes. 
A responsabilidade civil extracontratual do estado nos casos de violência 
obstétrica ocorridos no serviço público de saúde: um check up jurisprudencial 
/ Jasminne Fernandes Mascarenhas. - 2017. 
65f.: il. 
 
Monografia (Especialização em Direito Administrativo) - Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, 
Programa de Pós-Graduação em Direito. Natal, RN, 2017. 
Orientador: Prof. Me. Catarina Cardoso Sousa França. 
 
1. Direito administrativo – Monografia. 2. Responsabilidade civil - 
Monografia. 3. Violência obstétrica - Monografia. 4. Serviço Público de 
Saúde – Monografia. I. França, Catarina Cardoso Sousa. II. Título. 
 
RN/BS/CCSA CDU 343.62-055.26 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À todas as mulheres vítimas de violência 
que tiveram seu parto roubado e seus 
corpos violados. Que suas histórias e 
cicatrizes não sejam ignoradas tampouco 
esquecidas. 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
À Deus, minha maior gratidão, pela oportunidade e benção de estar concluindo 
mais um ciclo importante da minha vida. 
À minha amada mams, Bete, ao meu pai, Gilvan, às melhores irmãs, Brisa e Gigi, 
e aos demais familiares, pelo amor, incentivo e apoio incondicionais. 
Ao Bufa, príncipe da casa, por todo o afeto felino e sincero. 
Às queridas amigas e amigos que caminharam junto comigo ao longo do curso de 
especialização, Magno Catão, Lara Marcelino, Lorena Rêgo, Camila Gurgel, Lizandra 
Diniz, Raiano Tavares e Julliana Lins, por tornarem as aulas do curso de especialização tão 
mais leves e prazerosas. O nosso grupinho, carinhosamente chamado de “lençol freático”, 
sempre estará no meu coração. 
Ao meu amuletinho da sorte, Isolda Amorim, por toda a força e palavras de 
carinho, durante a elaboração desse trabalho. 
Por fim, à minha orientadora, professora Catarina França, cujas aulas me 
mostraram um pouco mais da realidade do setor obstétrico no país e me inspiraram a 
escrever sobre esse tema. Tenho muito a agradecer pelo suporte no pouco tempo que lhe 
coube e contribuição para a elaboração dessa monografia. 
E a todas e todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, 
igualmente, o meu muitíssimo obrigada! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Na hora que você estava fazendo, você não tava gritando desse jeito, né?” 
 
“Não chora não, porque ano que vem você tá aqui de novo.” 
 
“Se você continuar com essa frescura, eu não vou te atender.” 
 
“Na hora de fazer, você gostou, né? 
 
“Cala a boca! Fica quieta, senão vou te furar todinha.” 
 
(Frases repetidamente relatadas por mulheres que deram à luz em várias cidades do Brasil, 
no Dossiê da Violência Obstétrica “Parirás com dor”). 
 
 
 
RESUMO 
 
O presente trabalho apresenta como temática principal a responsabilidade civil 
extracontratual do Estado nos casos de violência obstétrica praticada no serviço público de 
saúde, de modo a dar uma visibilidade maior ao assunto na comunidade acadêmica, sob a 
perspectiva da humanização do serviço de saúde como dever estatal. Para elucidar as ideias 
dessa pesquisa, é realizada, inicialmente, uma breve abordagem do que consiste esse tipo 
de violência institucional, com destaque para a importância de se reconhecer o dever do 
Estado em assegurar um parto e um nascimento humanizado, em atenção ao princípio da 
dignidade da pessoa humana e do direito fundamental social à saúde da mulher, 
salvaguardados na Constituição Federal brasileira, sendo apresentados, ainda, Projetos de 
Lei em tramitação atinentes ao tema. Na sequência, são vistas noções gerais a respeito da 
responsabilidade civil extracontratual do Estado, passando-se pela evolução de suas teorias 
no ordenamento jurídico do país, até os seus pressupostos, com enfoque posterior à sua 
aplicação em matéria de saúde pública. Mais adiante, expõem-se julgados do Tribunal de 
Justiça do Rio Grande do Norte que manifestam o entendimento da Corte sobre o assunto, 
a fim de se demonstrar de que modo o ente estatal tem sido responsabilizado nesses casos, 
e como tem sido dado o tratamento da violência obstétrica pelo Poder Judiciário de 
maneira geral. O objetivo, ao final, consiste em defender a responsabilização do Estado 
pelos danos advindos desse tipo de prestação de serviço público desumano e cruel com o 
corpo da mulher, em atenção à teoria do risco administrativo adotada pelo ordenamento 
jurídico brasileiro, haja a vista a ausência de reconhecimento formal da violência 
obstétrica, a qual acarreta dificuldades em considerá-la como fonte geradora de danos 
morais, patrimoniais e/ou estéticos. A metodologia empregada no estudo em apreço baseia-
se na pesquisa bibliográfica e documental, sendo a abordagem eminentemente qualitativa, 
haja vista a finalidade de se realizar uma análise jurídica e jurisprudencial, em caráter 
explicativo e exploratório, acerca das problemáticas desenvolvidas. 
 
Palavras-chave: Direito Administrativo. Responsabilidade civil do Estado. Saúde Pública. 
Violência obstétrica. Humanização do Parto e Nascimento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
This monography presents as main theme the State's extracontractual civil responsibility in 
cases of obstetric violence practiced in the public health service, in order to give a greater 
visibility to the subject in the academic community, from the perspective of the 
humanization of the health service as a state duty. In order to elucidate the ideas of this 
research, a brief analysis is initially made of what constitutes this type of institutional 
violence, with emphasis on the importance of recognizing the State's duty to ensure a 
childbirth and a humanized birth, in accordance with the principle of dignity of the human 
person and the fundamental social right to women's health, safeguarded in the Brazilian 
Federal Constitution, and two bills submitted by the National Congress and the City 
Council on the subject are presented. As a result, general notions regarding non-contractual 
civil liability of the State are observed, with the evolution of its theories in the legal system 
of the country, to its presuppositions, with a focus after itsapplication in the field of public 
health. Subsequently, they are tried by the Court of Justice of Rio Grande do Norte, which 
expresses the Court's understanding of the matter, in order to demonstrate how the state 
entity has been held responsible in such cases, and how the treatment has been given of 
obstetric violence by the Judiciary in general. The purpose, in the end, is to defend the 
State's responsibility for the damages resulting from this kind of inhuman and cruel public 
service with the woman's body, in view of the administrative risk theory adopted by the 
Brazilian legal system, given the absence of formal recognition of obstetric violence, 
which entails difficulties in considering it as a source of moral, patrimonial and aesthetic 
damages. The methodology used in this study is based on bibliographical and documentary 
research. The approach is eminently qualitative, considering the purpose of carrying out a 
juridical and jurisprudential analysis, in an explicative and exploratory, about the problems 
developed. 
 
Keywords: Administrative law. Civil Responsibility of the State. Public health. Obstetric 
violence. Humanization of Childbirth and Birth. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 10 
2 RECONHECENDO A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E A RELEVÂNCIA DA 
HUMANIZAÇÃO DO PARTO E DO NASCIMENTO ................................................ 13 
2.1 A (IN)VISIBILIDADE DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA REFLETIDA NO 
COTIDIANO DOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO À SAÚDE REPRODUTIVA ............ 16 
2.2 A HUMANIZAÇÃO COMO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
 ......................................................................................................................................... 20 
2.3 O DIREITO À ASSISTÊNCIA HUMANIZADA AMPARADO PELO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ............................................................... 26 
2.4 OS PROJETOS DE LEI EM TRAMITAÇÃO .......................................................... 30 
3 A RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO E SUA 
APLICAÇÃO EM MATÉRIA DE SAÚDE PÚBLICA ................................................. 32 
3.1 AS TEORIAS DA RESPONSABILIDADE DO PODER PÚBLICO E SUA 
EVOLUÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO ................................................................... 35 
3.2 OS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL 
DO ESTADO ................................................................................................................... 39 
3.2.1 Conduta estatal .................................................................................................. 39 
3.2.2 Dano ao administrado ....................................................................................... 40 
3.2.3 Nexo de causalidade .......................................................................................... 41 
3.3 O DEVER ESTATAL DE REPARAR OS DANOS ADVINDOS DA PRESTAÇÃO 
DO SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE ........................................................................... 41 
4 A PULVERIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NA JURISPRUDÊNCIA 
PÁTRIA E SUA ANÁLISE A PARTIR DE CASOS JULGADOS PELO TJRN À 
LUZ DO §6º DO ART. 36 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ...................................... 45 
4.1 CASO I: ALEXANDRA CLÍVIA V. DE SOUZA VS. ASSOCIAÇÃO HOSPITAL 
CENTENÁRIO DE PAU DOS FERROS E ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
 ......................................................................................................................................... 47 
4.2 CASO II: WÉLICA MOURA DA SILVA VS. ESTADO DO RIO GRANDE DO 
NORTE ............................................................................................................................ 48 
4.3 CASO III: ACELIANA OLIVEIRA VS. MUNICÍPIO DE CEARÁ-MIRIM ......... 49 
4.4 CASO IV: MARIA DAS DORES S. DA SILVA BARROS VS. ESTADO DO RIO 
GRANDE DO NORTE .................................................................................................... 50 
4.5 CASO V: MARIA DAS GRAÇAS DOS SANTOS VS. MUNICÍPIO DE 
PARNAMIRIM ............................................................................................................... 51 
4.6 REFLEXÕES ACERCA DOS JULGADOS LEVANTADOS ................................. 53 
5 CONCLUSÕES ............................................................................................................... 57 
REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 58 
10 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
A presente monografia apresenta como temática principal a responsabilidade civil 
extracontratual do Estado nos casos de violência obstétrica praticada no serviço público de 
saúde, tendo em vista que essa prática, até então, velada, é marcada pela impunidade dos 
agentes públicos de saúde e silêncio das violentadas, e no Brasil, acomete uma entre quatro 
mulheres, segundo dados estatísticos. 
A escolha por esse mote foi fruto de recentes debates acontecidos esse ano, na cidade 
de Natal/RN, promovidos, sobretudo, pelo Movimento pela Humanização do Parto e 
Nascimento local e pela Associação Potiguar de Doulas, em parceria com profissionais da 
área médica e jurídica, que chamaram a atenção ao assunto, provocando a elaboração do 
Projeto de Lei nº 30/2017, de autoria da vereadora Natália Bonavides, que tramita na Câmara 
Municipal da capital, com o objetivo de regulamentar, no âmbito público e privado, a 
humanização da via de nascimento, os direitos da mulher relacionados ao parto, e as medidas 
de proteção contra a violência em questão. 
Dessa forma, além de ser um termo relativamente novo na seara jurídica, a violência 
obstétrica vem sendo alvo de constantes polêmicas a respeito da sua falta de regulamentação 
de forma específica, não havendo, no país, até o presente momento, nenhuma lei que tipifique 
tal conduta e facilite a busca da tutela jurisdicional de reparação dos danos advindos dessa 
violação, bem como a imposição de sanções aos agentes que cometam esse tipo de ato, como 
ocorre na Venezuela e Argentina. 
A mola propulsora dessa investigação científica, portanto, é justamente o fato de que 
a violência obstétrica ainda é uma questão pouco debatida e compreendida na Academia, 
especialmente nos estudos científicos relacionados à Administração Pública, mais 
propriamente à responsabilidade do Estado e sua aplicação na prestação dos serviços públicos 
de saúde. 
Nesse ínterim, é importante destacar a relevância social e jurídica do presente estudo 
na área do Direito Administrativo, porquanto é flagrante e preocupante a desídia dos agentes 
públicos no desempenho do atendimento às gestantes e parturientes, os quais, por meio de 
procedimentos invasivos e, por muitas vezes, desnecessários, violam princípios 
constitucionais e direitos fundamentais da mulher, afrontam normas e diretrizes estabelecidas 
pelo próprio Ministério da Saúde, e desobedecem a recomendações da Organização Mundial 
de Saúde (OMS). 
 
11 
 
Sem sombra de dúvidas, essa realidade se deve à evidente impunidade e 
naturalização desses tipos de conduta, decorrentes da concepção de que o parto é um 
momento de dor necessária, a qual se pretende, com a presente pesquisa, desmitificar, 
reconhecendo, para tanto, a violência obstétrica como espécie de violência de gênero, 
decorrente de uma cultura de medicalização e patologização do parto, fomentada por 
interesses lucrativos e/ou falta de conscientização por parte da classe médica. 
Nessa perspectiva, serão problematizadas as seguintes questões: i) Por quais motivos 
o Estado tem o dever de assegurar o parto e o nascimento humanizado? ii) Quais são as 
condutas caracterizadoras desse tipo de violência e que podem ser alvo de indenização por 
parte do Estado? iii) Qual o tratamento que a jurisprudêncianacional tem dado a esses casos 
que envolvem agentes públicos? 
Dito isso, ressalte-se que o objetivo geral desse trabalho é defender a 
responsabilização do Estado pelos danos advindos desse tipo de prestação de serviço público 
desumano e cruel com o corpo da mulher, em atenção à teoria do risco administrativo adotada 
pelo ordenamento jurídico brasileiro, haja a vista a ausência de reconhecimento formal da 
violência obstétrica, a qual acarreta dificuldades em considerá-la como fonte geradora de 
danos morais, patrimoniais e estéticos. 
Enquanto objetivos específicos, temos: i) descortinar as práticas mais comuns da 
violência obstétrica, muitas vezes invisibilizada pela sociedade e pelos agentes públicos, 
estabelecendo o conceito de parto humanizado, bem como sua tutela pela legislação brasileira; 
ii) identificar os requisitos ensejadores da responsabilidade civil extracontratual do Estado, 
bem como sua trajetória jurídica no Direito brasileiro, partindo-se de uma abordagem 
histórica acerca das teorias da responsabilidade do Poder Público; iii) verificar na 
jurisprudência pátria o uso do termo “violência obstétrica” pelos operadores do Direito e/ou 
pelas partes litigantes, bem como o modo com que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do 
Norte (TJRN) vem decidindo esses casos, quando ocorridos no sistema público de saúde. 
A metodologia empregada nessa monografia baseia-se, como procedimento de 
obtenção de informações, na pesquisa bibliográfica, considerando-se posicionamentos e 
considerações dos doutrinadores mais renomados da área do Direito Administrativo, como 
também de pesquisadores na área jurídica e da saúde. Assim, a pesquisa tem como alicerces 
livros, teses de doutorado, dissertações de mestrado, e monografias, que tratam não somente 
da violência obstétrica e da humanização do parto em si, como também da possibilidade de 
compor pretensão indenizatória contra o Estado na prestação dos serviços públicos de saúde. 
Cumpre destacar que a pesquisa documental também papel essencial na composição desse 
12 
 
trabalho, diante da existência de relevantes materiais sobre o assunto na internet, desde dados 
estatísticos, documentos oficiais, revistas, até documentários. 
No que tange à legislação, foram consultadas as Constituições Federais brasileiras 
desde 1934 até a atual de 1988, o Código Civil, o Código Penal, o Estatuto da Criança e do 
Adolescente, o Estatuto dos Portadores de Deficiência, as Leis 8.080/1990, 11.108/2005 e 
12.895/2013, as Leis da Venezuela e da Argentina que tratam da temática, bem como os 
Projetos de Lei que estão pendentes de aprovação no Brasil. Além disso, foram investigadas 
portarias do Ministério da Saúde e recomendações da OMS, que orientam o Estado brasileiro 
no sentido de garantir uma atenção humanizada na assistência ao processo gestacional. 
Assim sendo, o estudo tem uma abordagem eminentemente qualitativa, com caráter 
explicativo e exploratório, com vistas a buscar respostas às problemáticas abordadas, 
atingindo-se, dessa forma, os objetivos específicos delineados. 
Nesse sentido, o trabalho em tela buscará, no primeiro capítulo, tratar da 
(in)visibilidade da violência obstétrica refletida no cotidiano dos serviços de atenção à saúde 
reprodutiva, de modo a reconhecer suas práticas mais comuns, bem como apresentar a 
humanização como forma de enfrentar tais condutas, demonstrando, inclusive, o dever estatal 
de assegurar uma assistência humanizada ao parto e ao nascimento, e os Projetos de Lei que 
estão em tramitação atinentes ao tema. Mais adiante, no segundo capítulo, abordar-se-á o 
tema da responsabilidade civil extracontratual do Estado, trazendo-se à baila suas noções 
gerais, desenvolvimento histórico e pressupostos necessários à sua configuração, com 
fundamento nas principais correntes doutrinárias administrativistas brasileiras e enfoque na 
prestação dos serviços de saúde pública. Por fim, o terceiro e último capítulo tratará de 
realizar um check up jurisprudencial, com vistas a averiguar de que forma é reconhecida a 
violência obstétrica pelo Poder Judiciário, e como a Corte local tem se posicionado sobre a 
temática e o direito da vítima ao pagamento de indenização contra o ente estatal. 
A partir das conclusões do estudo em apreço, pretende-se corroborar com os estudos 
já produzidos na área de Direito Administrativo, em especial sobre a responsabilidade civil 
extracontratual do Estado na prestação dos serviços públicos de saúde reprodutiva, ampliando 
o conhecimento produzido no que se refere ao modo como essa violência tem sido concebida 
no meio jurídico, o que pode influenciar na forma com que os operadores de Direito vão lidar 
com tais causas, uma vez que se propõe a reflexão acerca da necessidade do Estado tomar 
urgentemente uma nova postura frente à violência obstétrica. 
13 
 
2 RECONHECENDO A VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E A RELEVÂNCIA DA 
HUMANIZAÇÃO DO PARTO E DO NASCIMENTO 
 
A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a 
Mulher
1
, também conhecida como “Convenção de Belém do Pará”, no seu artigo 1º, define a 
violência contra a mulher como “qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause 
morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública 
como na esfera privada”. 
Segundo a diretora executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, essa 
espécie de violência é a violação de direitos humanos mais tolerada no mundo
2
. E na área da 
saúde, no que tange aos serviços de assistência obstétrica, a situação não é diferente. 
Em diversas partes do planeta, a violência obstétrica, objeto de estudo desse trabalho, 
tem ocorrido de forma preocupante e silenciosa. Tanto é verdade que a Organização Mundial 
de Saúde (OMS), em 2014, preocupou-se em emitir uma declaração a respeito da necessidade 
de prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto em 
instituições de saúde, convocando maior ação, diálogo, pesquisa e mobilização sobre esse 
tema de saúde pública
3
. 
Podemos considerá-la uma violência de gênero, pois é baseada no controle da 
medicina e da ciência sobre o corpo da mulher, considerada como incapaz de parir de forma 
natural. Porém, como bem afirma RODRIGUES
4
, “a violência durante o ciclo gravídico-
puerperal é uma das faces menos conhecidas, porém mais dramáticas dentro da violência de 
gênero”, que acarreta sérias consequências para saúde da gestante, bem como do nascituro. 
 
1
 CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, PUNIR, ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA 
A MULHER, “CONVENÇÃO BELÉM DO PARÁ”. Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 
1994, no Vigésimo Quarto Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral. Disponível em: 
<http://www.cidh.org/basicos/portugues/m.belem.do.para.htm>. Acesso em 22 set. 2017. 
2
 ONUBR NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. ‘Violência contra a mulher é a violação de direitos humanos 
mais tolerada no mundo’, afirma ONU. 25 nov. 2015. Disponível em: <http://nacoesunidas.org/violencia-
contra-a-mulher-e-a-violacao-de-direitos-humanos-mais-tolerada-no-mundo-afirma-onu/>. Acesso em: 10 set. 
2017. 
3
 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos 
durante o parto em instituições de saúde. Disponível em: 
<http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/134588/3/WHO_RHR_14.23_por.pdf>. Acesso em: 10 out. 2017. 
4
 RODRIGUES. Heloisa Correia. O direito à assistência humanizada à mulher: entre uma conquista 
legislativa e a realidade das práticas de atenção ao parto no Brasil, 2016. Cacoal, Trabalho de Conclusão de 
Curso (Graduação em Direito) – Universidade Federal de Rondônia, p. 41. Disponível em: 
<http://www.ri.unir.br/jspui/bitstream/123456789/1817/1/MONOGRAFIA%20HELOISA.pdf>. Acesso em: 10 
out. 2017. 
14 
 
De fato, essa violação às mulheres muitas vezes é inserida no cotidianoda assistência 
médica, e até pouco tempo atrás, antes do debate em relação à violência obstétrica, sequer 
causavam estranhamento. Não há nem mesmo lei vigente no Brasil que tipifique tal conduta. 
O primeiro país latino-americano a utilizar em sua legislação o termo “violência 
obstétrica” foi a Venezuela, em 2007, fruto dos movimentos feministas locais e do processo 
de reconhecimento institucional da violência contra a mulher como um problema social, 
político e público
5
. 
A Ley organica sobre el derecho de las mujeres a una vida libre de violencia, no 
item 13 do artigo 15, entende por violência obstétrica a apropriação do corpo e do processo 
reprodutivo feminino pelos profissionais da saúde, consistente no tratamento desumanizado, 
uso abusivo de medicação e conversão do processo natural de nascimento em patologia, com 
consequente perda da autonomia feminina e impossibilidade de decidir livremente sobre seus 
corpos e sua sexualidade, o que impactaria negativamente na qualidade de vida da mulher
6
. 
Ressalte-se que a própria Lei estabelece, em seu artigo 51
7
, como sanção aos 
profissionais que cometeram algum dos atos de violência obstétrica uma multa (entre 250 
U.T. e 500 U.T., sem prejuízo de condenação pela responsabilidade civil – indenização ou 
reparação). Porém, a legislação, como ressalta PEREIRA
8
, possui uma fragilidade, pois falta a 
normatização sobre o que se compreende como humanização do atendimento ao parto. 
 
5
 SENA, Ligia Moreiras; TESSER, Charles Dalcanale. Violência obstétrica no Brasil e o ciberativismo de 
mulheres mães: relato de duas experiências. Interface (Botucatu). 2017, vol.21. n. 60, p. 211. Disponível em: 
<http://www.scielo.br/pdf/icse/v21n60/1807-5762-icse-1807-576220150896.pdf>. Acesso em: 15 out. 2017. 
6
 “Artículo 15. Se consideran formas de violencia de género em contra de las mujeres, las seguientes: [...] 13. 
Violencia obstétrica: Se entiende por violencia obstétrica la apropiación del cuerpo y procesos reproductivos de 
las mujeres por personal de salud, que se expresa en un trato deshumanizador, en un abuso de medicalización y 
patologización de los procesos naturales, trayendo consigo pérdida de autonomía y capacidad de decidir 
libremente sobre sus cuerpos y sexualidad, impactando negativamente en la calidad de vida de las mujeres”. 
(VENEZUELA. Ley organica sobre el derecho de las mujeres a una vida libre de violencia. Disponível em: 
<http://www.derechos.org.ve/pw/wp-content/uploads/11.-Ley-Org%C3%A1nica-sobre-el-Derecho-de-las-
Mujeres-a-una-Vida-Libre-de-Violencia.pdf>. Acesso em: 10 out. 2017). 
7
 “Artículo 51. Se considerarán actos constitutivos de violencia obstétrica los ejecutados por el personal de salud, 
consistentes en: 
1. No atender oportuna y eficazmente las emergencias obstétricas. 2. Obligar a la mujer a parir en posición 
supina y con las piernas levantadas, existiendo los medios necesarios para la realización del parto vertical. 3. 
Obstaculizar el apego precoz del niño o niña con su madre, sin causa médica justificada, negándole la posibilidad 
de cargarlo o cargarla y amamantarlo o amamantarla inmediatamente al nacer. 4. Alterar el proceso natural del 
parto de bajo riesgo, mediante el uso de técnicas de aceleración, sin obtener el consentimiento voluntario, 
expreso e informado de la mujer. 5. Practicar el parto por vía de cesárea, existiendo condiciones para el parto 
natural, sin obtener el consentimiento voluntario, expreso e informado de la mujer. 
En tales supuestos, el tribunal impondrá al responsable o la responsable, una multa de doscientas cincuenta (250 
U.T.) a quinientas unidades tributarias (500 U.T.), debiendo remitir copia certificada de la sentencia 
condenatoria definitivamente firme al respectivo colegio profesional o institución gremial, a los fines del 
procedimiento disciplinario que corresponda”. (Idem). 
8
 PEREIRA, Desirée Marques. Violação ao direito à saúde das mulheres no parto: uma análise do perfil dos 
processos judiciais em obstetrícia do TJDFT sob a ótica da violência obstétrica, 2015. Trabalho de Conclusão de 
15 
 
A Argentina, por sua vez, promulgou a Lei do Parto Humanizado (Lei Nacional nº 
25.929 de 2004)
9
, garantindo vários direitos às mulheres durante a gestação, trabalho de parto, 
parto, pós-parto, como o direito à informação sobre as possíveis intervenções, ao tratamento 
com respeito, individual e personalizado ao parto natural, de modo a respeitar os tempos 
biológicos e psicológicos evitando práticas invasivas, entre outros. Em seguida, o país ainda 
sancionou a Lei nº 26.485/2009 (Ley de protección integral para prevenir, sancionar y 
erradicar la violencia contra las mujeres en los âmbitos em que desarollen sus relaciones 
interpersonales)
10
, na qual a violência obstétrica foi tipificada como violência contra a 
mulher, mas não foi criminalizada, tal qual fez a lei venezuelana. 
Embora as condutas violentas da assistência ao parto já estivessem sendo discutidas 
no Brasil desde as décadas de 1980 e 1990, por grupos de profissionais da saúde e defensores 
dos direitos humanos e reprodutivos das mulheres, impulsionados por uma parcela do 
movimento feminista, foi só nos anos 2000 que o assuntou passou a ser, realmente, objeto de 
estudos científicos no país, ainda permanecendo, contudo, em grande invisibilidade e/ou 
sendo naturalizadas por grande parte das gestantes, profissionais da saúde, gestores e 
população em geral
11
. 
Acerca de tal questão, SENA e TESSER
12
 fazem uma observação interessante, no 
sentido de destacar os fatores que ensejam essa invisibilidade, quais sejam, a banalização de 
condutas pautadas em estereótipos de classe e gênero, vistas como “uma brincadeira” pelo 
sujeitos envolvidos e até esperadas pela paciente; a aceitação e banalização, por parte dos 
profissionais, de intervenções já consideradas comprovadamente despiciendas; e a dificuldade 
que a maioria das usuárias têm de criticar o serviço de saúde e os profissionais que as 
atenderam, principalmente no que tange à assistência perinatal, onde as mulheres geralmente, 
após o nascimento de um bebê saudável, se sentem aliviadas e agradecidas, o que, para elas 
compensaria qualquer mau tratamento durante o procedimento médico. 
 
 
Curso (Graduação em Saúde Coletiva) – Universidade de Brasília, p. 22. Disponível em: 
<http://bdm.unb.br/handle/10483/12509>. Acesso em: 23 out. 2017. 
9
 ARGENTINA. Ley nacional nº 25.929. de Derechos de Padres e Hijos el proceso de nacimiento. Declaración 
de interes del Sistema Nacional de Información Mujer, por parte Del Senado de la Nación. Declaración sobre 
difusión del Parto Humanizado. Disponível em: 
<https://www.unicef.org/argentina/spanish/ley_de_parto_humanizado.pdf>. Acesso em: 24 out. 2017. 
10
 ARGENTINA. Ley 26. 485. Ley de protección integral para prevenir, sancionar y erradicar la violencia contra 
las mujeres en los âmbitos em que desarollen sus relaciones interpersonales. Disponível em: 
<http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/150000-154999/152155/norma.htm>. Acesso em: 24 out. 
2017. 
11
 SENA, Ligia Moreiras; TESSER, Charles Dalcanale, op. cit., p. 209-214. 
12
 Ibidem, p. 209. 
 
16 
 
Diante dessa constatação, faz-se imperioso, no presente trabalho, descortinar a 
violência obstétrica, haja vista que se encontra naturalizada como construção social. Para 
tanto, demonstrar-se-á, a seguir, alguns dados estatísticos e pesquisas que comprovam sua 
existência, bem como suas práticas mais comuns, as quais se mostram contrárias à qualidade 
de atenção, condição esta que assegura o respeito ao princípio da dignidade humana e do 
direito fundamental à saúde da mulher. 
 
2.1 A (IN)VISIBILIDADEDA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA REFLETIDA NO 
COTIDIANO DOS SERVIÇOS DE ATENÇÃO À SAÚDE REPRODUTIVA 
 
A violência obstétrica está diretamente relacionada à história do parto, e se fez 
presente, sobretudo, após a inserção da prática obstétrica na medicina em que o parto deixou 
de ser um episódio natural, compartilhado apenas no seio familiar, realizado por parteiras, 
para se tornar uma espécie de evento no ambiente hospitalar, prática dominada pela medicina 
e institucionalizada nos hospitais
13
. 
Resultado disso foi o surgimento de condutas inapropriadas praticadas pelas 
instituições hospitalares e pelos profissionais da saúde, que permanecem entranhadas e 
prevalecendo sobre a abordagem humanizada relacionada ao processo gestacional, fato que, 
muitas vezes, transforma uma ocasião que deveria ser um momento especial em verdadeira 
via crucis, porquanto a mulher se sente desrespeitada e violentada por aqueles que deveriam 
estar lhe prestando assistência
14
. 
Assim, diariamente, mulheres sofrem violência no parto de diversas maneiras, 
podendo ocorrer durante o pré-natal, no parto e inclusive em situações de abortamento. Dessa 
forma, além de violência de gênero, a violência obstétrica pode ser considerada uma violência 
institucional, pois esta é justamente aquela exercida nos/pelos próprios serviços públicos, por 
ação ou omissão, a qual inclui desde a dimensão mais ampla de falta de acesso à má qualidade 
dos serviços, e abrange abusos cometidos em virtude das relações de poder desiguais entre 
 
13
 VELOSO, Roberto Carvalho; SERRA, Maiane Cibele de Mesquita. Reflexos da responsabilidade civil e penal 
nos casos de violência obstétrica. Revista Brasileira de Direitos e Garantias Fundamentais. Brasília, v.2, n.1, 
jan/jun. 2016. p. 259. Disponível em: <http://www.indexlaw.org/index.php/revistagsd/article/view/1048/1043>. 
Acesso em: 27 set. 2017. 
14
 CORDINI, Sthefane Machado. A responsabilidade civil nos casos de violência obstétrica pratica na rede 
pública de saúde, 2015. Tubarão, Monografia (Bacharelado em Direito) – Universidade do Sul de Santa 
Catarina, p. 14. Disponível em: <https://riuni.unisul.br/handle/12345/1197>. Acesso em: 09 out. 2017. 
17 
 
usuários e profissionais dentro das instituições, até por uma noção mais restrita de dano físico 
intencional, segundo Ministério da Saúde
15
. 
Destaque-se que em 2010, uma pesquisa nacional elaborada pela Fundação Perseu 
Abramo demonstrou que 25% (vinte por cento) das mulheres que tiveram partos normais (nas 
redes pública e privada) relataram terem sofrido maus-tratos e desrespeitos durante o trabalho 
de parto e/ou pós-parto imediato
16
. 
Além disso, embora a comunidade médica internacional considere que a taxa ideal de 
cesárea seria entre 10% (dez por cento) e 15% (quinze por cento)
17
, a pesquisa Nascer no 
Brasil constatou que tal procedimento tem sido usado indiscriminadamente: no setor público, 
aproximadamente 52% (cinquenta e dois por cento) dos partos são cesárias, podendo chegar a 
88% (oitenta e oito por cento) no setor privado, contrariando as recomendações da OMS
18
. 
Em recente pesquisa divulgada na Revista Unesp Ciência
19
 , estima-se que cerca de 
um milhão de mulheres sejam anualmente submetidas a procedimentos cesarianos, sem 
indicação obstétrica adequada. Destas mulheres, aproximadamente 70% indicavam 
preferência pelo parto natural no início da gestação, mas desistiram de sua opção por falta de 
incentivo da rede de saúde. Ainda, segundo a pesquisa, mesmo em casos de gestações 
classificadas como de baixo risco para o parto natural, apenas 5,6% das mulheres assistiram 
ao nascimento de seus filhos sem qualquer intervenção institucionalizada. 
Em 2013, foi lançado o documentário “O Renascimento do Parto”
20
, financiado 
coletivamente e produzido de maneira independente pelo casal Érica de Paula, doula, e 
Eduardo Chauvet, diretor, que viajaram pelo Brasil entrevistando médicos, mães, parteiras, 
 
15
 BRASIL. Ministério da Saúde. Violência intrafamiliar: orientações para prática em serviço. Série Cadernos 
de Atenção Básica, n. 8. Brasília: Ministério da Saúde, 2001, p. 21. Disponível em: 
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd05_19.pdf>. Acesso em: 07 out. 2017. 
16
 FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO. Violência no parto: Na hora de fazer não gritou, 25 mar. 2013. 
Disponível em: <http://novo.fpabramo.org.br/content/violencia-no-parto-na-hora-de-fazer-nao-gritou>. Acesso 
em 22 mai. 2017. 
17
 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Declaração da OMS sobre Taxas de Cesáreas: Os esforços devem 
se concentrar em garantir que cesáreas sejam feitas nos casos em que são necessárias, em vez de buscar atingir 
uma taxa específica de cesáreas. Disponível em: 
<http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/161442/3/WHO_RHR_15.02_por.pdf>. Acesso em: 22 mai. 2017. 
18
 ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA SERGIO AROUCA. Projeto - Nascer no Brasil: Inquérito 
nacional sobre parto e nascimento. Disponível em: <http://www6.ensp.fiocruz.br/nascerbrasil/principais-
resultados2/>. Acesso em: 22 mai. 2017. 
19
PASTORE, Mariana; NOGUEIRA, Pablo. O parto em movimento: No país campeão mundial de cesárea, 
cresce a mobilização por novos modelos de atenção à gestação e ao nascimento, que usem menos intervenções 
médicas e respeitem mais as escolhas das parturientes mas mudanças ainda geram debate intenso entre 
profissionais de saúde. Revista Unesp Ciência, out/2014, ano 6, nº 57, p. 16-23. Disponível em: 
<http://www.unespciencia.com.br/pdf/uc57/UC57_01_bx.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2017. 
20
 O RENASCIMENTO DO PARTO. Brasil, 2013, 90 min. Disponível em: 
<https://www.youtube.com/watch?v=9-dHeTrWuQ0&list=PLgEfiEkzmQjWZY_MsrYy6-socm3aKcot3>. 
Acesso em: 10 out. 2017. 
18 
 
especialistas e gestores públicos, a fim de se expor situações que fazem parte da dinâmica do 
parto e do nascimento, que colocam em segundo plano a autodeterminação da mulher sobre o 
seu corpo e forma de parir. 
O filme ganhou vários prêmios pela sua inegável relevância social, ao apresentar o 
Brasil como o país com a maior taxa de cesarianas em todo o mundo, superando os 50% de 
todos os partos realizados no sistema de saúde, chegando a quase totalidade dos partos 
realizados nos hospitais privados, em decorrência da chamada “indústria do nascimento”, que 
criou diversos mitos (“circular de cordão”, “bebê grande demais”, “falta de passagem”, etc.) 
em relação ao processo gestacional, desencorajando, assim, mulheres que inicialmente 
desejavam parir de forma natural, e após ouvirem os próprios médicos, desistem, por serem 
levadas a acreditar que são incapazes de ter seus bebês sem uma intervenção cirúrgica. 
Vários profissionais da saúde são entrevistados no documentário a fim de 
desmitificar tais afirmações, que não tem base em evidências científicas e, consequentemente, 
não são indicadores à realização de uma cirurgia cesárea, mas sim, verdadeiros mitos criados 
sob a intenção de fazer crer que a maioria das mulheres tem gravidezes de risco, o que, de 
fato, não é a realidade. 
O longa-metragem é bastante sagaz ao mostrar que isso acontece por ser mais 
conveniente e lucrativo para os médicos e para o hospital ter uma paciente agendada para 
realização de uma cirurgia com hora e tempo de duração marcados, do que acompanhar 
mulheres em trabalho de parto que podem demorar horas e horas e não geram retornos 
financeiros com a utilização das tecnologias à disposição no hospital. 
No ano seguinte, em 2014, foi divulgada a referida pesquisa Nascer no Brasil, 
realizada em 266 instituições de saúde espalhadas por 191 municípios, abrangendo as capitais 
dos estados e também das cidades do interior das cinco regiões do país, coordenada pela 
Fundação Oswaldo Cruz. Constatou-se, que a maioria das 23.940 mulheres entrevistadas entre 
os anos de 2011/2012, que buscarama assistência médico-hospitalar no momento do parto, 
foram submetidas a intervenções inapropriadas não baseadas em evidências científicas, mas 
que são praticadas de forma abusiva tanto no âmbito da saúde pública quanto na particular. 
Práticas violentas e agressivas continuam presentes na assistência obstétrica, 
perpetuadas como “praxe” e justificadas, também pela legitimação do conhecimento médico 
hegemônico, sendo necessário tirar a expressão “violência obstétrica” do véu invisibilizador 
que o torna presença silenciosa, o que faz com que muitas mulheres, mesmo tendo sido 
vítimas, não as reconhecem como violência. 
19 
 
Partindo dessa perspectiva, passa-se à análise das práticas mais rotineiras em nosso 
sistema de saúde. 
Reconhecendo o dever de elucidar o assunto da violência obstétrica para as cidadãs e 
cidadãos, para que informadas as pessoas possam exigir seus direitos e denunciar abusos, a 
Defensoria Pública do Estado de São Paulo lançou a cartilha “Violência obstétrica: você sabe 
o que é?”
21
, na qual, além das situações de violência obstétrica praticadas contra mulheres na 
gestação e nas ocasiões de abortamento, também estão elencadas as formas mais comuns de 
violência obstétrica. 
Convém verificar que as ações expostas na cartilha como violentas são semelhantes 
aos casos e testemunhos exibidos do documentário dirigido por Chauvet. 
De acordo com o documento, durante a gestação a violência obstétrica pode ser 
caracterizada por: negar atendimento à mulher ou ainda impor alguma dificuldade ao 
atendimento em postos de saúde onde são realizados o acompanhamento pré-natal; qualquer 
espécie de comentários constrangedores à mulher e relacionados à sua cor, raça, etnia, idade, 
escolaridade, religião ou crença, condição econômica, estado civil ou situação conjugal, 
orientação sexual, número de filhos, etc; ofender, humilhar ou xingar a mulher ou sua família; 
negligenciar atendimento de qualidade; agendar cesárea sem recomendação baseada em 
evidências científicas, atendendo simplesmente aos interesses e conveniência do médico. 
Durante o parto, as formas mais comuns deste tipo de violência são: a recusa de 
admissão em hospital ou maternidade, gerando a chamada peregrinação por leito; 
impedimento da entrada do acompanhante escolhido pela mulher; aplicação de soro com 
ocitocina para acelerar o trabalho de parto; episiotomia de rotina; manobra de Kristeller; 
cesáreas eletivas; restrição da posição do parto; violência psicológica; impedir ou retardar o 
contato do bebê com a mulher logo após o trabalho de parto; impedir o alojamento conjunto 
da mãe e o neonato; impedir ou dificultar o aleitamento materno; além de outros 
procedimentos dolorosos, desnecessários e humilhantes, tais como: uso rotineiro de lavagem 
intestinal (enema), retirada dos pelos pubianos (tricotomia), posição ginecológica com portas 
abertas, exames de toque sucessivos e por pessoas diferentes para verificar a dilatação, 
privação de alimentos e água, imobilização de braços e pernas, etc. 
Nos casos de abortamento, a violência caracteriza-se por: negativa ou demora no 
atendimento à mulher em situação de abortamento; questionamento à mulher quanto à causa 
 
21
 DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Violência obstétrica: você sabe o que é?. 
Disponível em < http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/41/Violencia%20Obstetrica.pdf>. Acesso 
em: 29 out. 2017. 
20 
 
do abortamento (se foi intencional ou não); realização de procedimentos predominantemente 
invasivos, sem explicação, consentimento e frequentemente sem anestesia; ameaças, acusação 
e culpabilização da mulher; coação com finalidade de confissão e denúncia. 
Uma prática prejudicial com características claras de violência obstétrica que deve 
ser ressaltada é a proibição do acompanhante, já que existe uma lei, desde 2005, que assegura 
tal direito às parturientes. A Lei Federal nº 11.108/2005
22
 instituiu aos serviços de saúde do 
SUS, rede própria ou conveniada, obrigatoriedade em permitir a presença, junto à parturiente, 
de um acompanhante durante todo o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, sendo, o 
acompanhante, indicado pela gestante. 
No ano de 2013, ainda foi publicada a Lei Federal nº 12.895/2013
23
, que tornou 
obrigatória a presença de avisos em hospitais do SUS ou conveniados, comunicando às 
gestantes o direito previsto na mencionada Lei n° 11.108/2005, contudo, o exercício ao direito 
à permanência do acompanhante junto à parturiente ainda continua sendo dificultado pelas 
instituições hospitalares, situação que se agrava pelo comum desconhecimento das mulheres 
usuárias do SUS acerca dessa prerrogativa. 
A mencionada pesquisa Nascer no Brasil, revelou que menos de 20% das mulheres 
se beneficiam da presença contínua do acompanhante durante todo o período de internação, 
sendo esse ainda um privilégio das mulheres com maior renda e escolaridade, brancas, 
usuárias do setor privado e que tiveram cesarianas como opção de parto. 
 
2.2 A HUMANIZAÇÃO COMO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA 
 
Antigamente, dar à luz era um fenômeno natural, que ocorria na casa das próprias 
gestantes, com a ajuda de parteiras, as quais eram pessoas de confiança da parturiente e da sua 
família. Contudo, a partir do século XX, o trabalho das parteiras foi sendo paulatinamente 
desvalorizado devido a interesses econômicos da classe médica
24
. Assim, viu-se a necessidade 
 
22
 BRASIL. Lei nº 11.108, de 7 de abril de 2005. Altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, para 
garantir às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto 
imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11108.htm>. Acesso em: 08 nov. 2017. 
23
 BRASIL. Lei nº 12.895, de 18 de dezembro de 2013. Altera a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, 
obrigando os hospitais de todo o País a manter, em local visível de suas dependências, aviso informando sobre o 
direito da parturiente a acompanhante. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2013/Lei/L12895.htm> Acesso em: 10 out. 2017. 
24
 NOGUEIRA, Beatriz Carvalho. Violência obstétrica: análise de decisões proferidas pelos Tribunais de 
Justiça da região sudeste, 2015. Ribeirão Preto, Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – 
Faculdade de Direito de Ribeirão Preto/USP, p. 29. Disponível em: 
21 
 
de institucionalizar o parto, passando este a ocorrer comumente em hospitais, o que tirou a 
privacidade que a gestante tinha no momento o parto com a sua família
25
, 
Aliado a isso, também surge a medicalização
26
, que não está necessariamente 
relacionada à melhora no atendimento no parto, e é responsável, inclusive, por danos físicos, 
psicológicos e sexuais às mulheres
27
. 
Na verdade, a invenção de aparelhos e técnicas de anestesia
28
, como também a 
entrada do médico obstetra na cena do parto, foram essenciais para o surgimento do fenômeno 
denominado de “industrialização do parto”, no qual o corpo passou a ser visto como uma 
máquina, e corpo feminino visto como imperfeito, anormal, exigindo constante controle e 
manipulação
29
. 
Dessa forma, o parto deixou de ser um evento natural, biológico e fisiológico, para 
ser um evento patológico que necessita de intervenção médica para não ter um desfecho 
tráfico
30
. A intervenção médica no nascimento foi se tornando cada vez mais excessiva, 
levando à crescente perda da autonomia e protagonismo da parturiente em relação ao parto, 
vez que esse momento se tornou desconhecido e amedrontador
31
 para as mulheres, e mais 
conveniente e asséptico para os profissionais de saúde
32
. 
Como crítica a esse modelo intervencionista e tecnocrático de assistênciaao parto, 
que desconsidera evidências científicas e os aspectos subjetivos concernentes à experiência do 
parto e nascimento, mulheres e profissionais da saúde passaram a se organizar para exigir a 
implementação de políticas públicas que estimulem e respeitem o parto humanizado, tanto de 
forma hospitalar, como domiciliar, inclusive com a valorização e com a capacitação de 
 
<http://www.tcc.sc.usp.br/tce/disponiveis/89/890010/tce-26082016-101211/?&lang=br>. Acesso em 10 out. 
2017. 
25
 RODRIGUES, Heloisa Correia, op. cit., p. 41. 
26
 Sobre o assunto, NOGUEIRA ressalta que a medicalização é explicada, por muitos sociológicos médicos, 
como uma “crescente forma de controle social das mulheres, tornando-as dependentes de equipes médicas e da 
indústria farmacêutica”. (NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit., p. 28). 
27
 NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit., p. 26. 
28
 Não se nega que os avanços da tecnologia podem ajudar a salvar vidas de muitas mulheres e dos seus filhos 
durante o trabalho de parto. Como afirma OLIVEIRA, “As intervenções, quando necessárias, são indispensáveis 
para uma assistência ao parto humanizado. O que tem se discutido são as intervenções de rotina, fundadas em 
um sistema de montagem e produção do parto, que violam direitos reprodutivos das mulheres”. (OLIVEIRA, 
Amanda Lima de. Violência obstétrica: uma análise de suas dimensões nas normativas brasileiras, 2016. 
Brasília, Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade de Brasília, p. 20. Disponível 
em: < http://bdm.unb.br/bitstream/10483/15883/1/2016_AmandaLimadeOliveira_tcc.pdf>. Acesso em: 17 out. 
2017). 
29
 NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit., p.27-28. 
30
 OLIVEIRA, Amanda Lima de, op. cit., p. 19. 
31
 NOGUEIRA aponta que há muitos estudos que relatam a incidência do fenômeno denominado de tocofobia 
nas parturientes, definida como o medo exacerbado do parto, causado pela representação midiática do parto, pela 
ausência de transmissão de informações baseadas em evidências pelos médicos às gestantes, bem como pela 
utilização de técnicas desnecessárias no parto normal. (NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit., p. 33). 
32
 Ibidem, p. 28. 
22 
 
parteiras profissionais e doulas nos períodos pré-parto, parto e pós-parto e com o consequente 
resgate do parto como atividade essencialmente da mulher
33
. 
Nesse sentido, adota-se o conceito de parto humanizado entendido por 
NOGUEIRA
34
: 
 
O parto humanizado possui uma vasta gama de interpretações. De modo 
geral, pode ser entendido como aquele realizado com a menor quantidade de 
intervenções médicas e farmacológicas possível, o qual respeita o tempo 
físico e psíquico de cada mulher para parir, ocorrido em um lugar respeitoso 
e aconchegante e com o consentimento informado para todos os 
procedimentos que possam ser realizados, sempre com observância da 
medicina baseada em evidências. 
 
Ressalte-se que as discussões em torno da humanização das práticas de atenção à 
saúde começaram a ganhar destaque, a nível internacional, somente na década de 1970, com 
um evento que debateu as práticas nos serviços e tentou identificar o que seria humanização e 
desumanização do cuidado em saúde. 
Esse encontro deu ensejo à produção e publicação do material Humanizing Health 
Care em 1975, organizado por Howard e Strauss, no qual foram caracterizadas práticas tidas 
como desumanizadoras, mencionadas por MORAIS
35
 como: 1) Tratar as pessoas como 
coisas; 2) Usar de modo inapropriado a tecnologia; 3) Usar de modo inapropriado a 
experimentação; 4) Ver a pessoa doente como problema; 5) Tratar certas pessoas como de 
menor valor; 6) Falta de interação/reciprocidade entre paciente e cuidador; 7) Cuidar 
subpadronizado para determinadas pessoas; 8) Visualizar as pessoas como sem escolhas, 
desconsiderando sua autonomia e liberdade; 9) Pessoas interagirem como icebergs; 10) 
Pessoas em ambientes estáticos e estéreis; 11) Desrespeito à vida. 
MORAIS
36
 também apresenta as oito práticas tidas como humanizadoras e 
necessárias, que foram divididas em três dimensões: 1) A dimensão ideológica reporta-se a 
três práticas humanizadoras: o reconhecimento do valor da vida humana, o respeito à 
integralidade das pessoas e a visualização do ser humano como único e insubstituível; 2) A 
dimensão estrutural, na qual as interações entre cuidadores e pacientes acontecem, também 
com três práticas: a necessidade de liberdade para o indivíduo, a oferta de ações de forma 
 
33
 NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit.,, p. 37. 
34
 Idem. 
35
 MORAIS, Fátima Raquel Rosado. A humanização no parto e no nascimento: os saberes e as práticas no 
contexto de uma maternidade pública brasileira, 2010. Natal, Tese (Doutorado em Psicologia Social) – 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, p. 76-77. Disponível em: 
<https://repositorio.ufrn.br/jspui/handle/123456789/17585>. Acesso em: 16 out. 2017. 
36
 Ibidem, p. 78. 
23 
 
igualitária, independentemente de classe e/ou de outra caracterização, e o compartilhamento 
do poder de decisão por todos, a fim de que possam fazer as melhores escolhas; 3) Por fim, na 
dimensão psicológica, estão inseridas duas práticas humanizadoras: a empatia e o afeto ao 
entender que na inter-relação entre paciente e cuidador é necessário que haja ao menos algum 
contato para favorecer a criação de vínculos positivos. 
Essa discussão acerca do processo de humanização se disseminou e deu destaque 
para essas premissas como ideais para a saúde, inclusive no Brasil. A partir daí, outros 
estudos se aprofundaram nessa temática e reforçaram que a desumanização nas práticas em 
saúde decorre da intensificação tecnológica e burocrática na medicina
37
. 
Foi nesse contexto que surgiu no Brasil, a partir do final do século XX, o movimento 
social pela humanização do parto e do nascimento, o qual tem como principal objetivo a 
atenção humanizada e respeitosa, com respaldo na chamada Medicina Baseada em Evidências 
(MBE), movimento internacional surgido na década de 1980, o qual afirma que a medicina é 
baseada em muitas pesquisas tendenciosas que, às vezes, acabam estimulado a prática de 
procedimento desnecessários e danosos
38
. 
No parto, temos, por exemplo, a prática reiterada da episiotomia sem que haja 
evidências sólidas de benefícios para mãe e para o bebê. Como aponta NOGUEIRA
39
, as 
pesquisas utilizadas pelos defensores do procedimento apenas eram relacionadas ao modo de 
realização do procedimento, e não à sua eficácia ou segurança. 
Porém, segundo PEREIRA
40
, a adequação do modelo de atenção ao parto e 
nascimento a esses cuidados baseados em evidências científicas tem acontecido de forma 
lenta, gradual e tem encontrado grande resistência. 
A Rede pela Humanização do Parto e do Nascimento (ReHuNa) surgiu em 1993 e 
teve como inspiração o trabalho de atenção mais humanizada ao parto realizado pelos 
médicos José Galba de Araújo, professor da Universidade Federal do Ceará, que implantou 
um sistema misto de atenção ao parto, com destaque às parteiras tradicionais, ao parto 
domiciliar e às casas de parto, e Moysés Paciornik e seu filho Cláudio Paciornik, que 
divulgaram o parto de cócoras com base nos costumes dos índios kaingangue
41
. 
 
37
 MORAIS, Fátima Raquel Rosado, op. cit., p. 78-79. 
38
 NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit.,, p. 38. 
39
 Idem. 
40
 PEREIRA, Desirée Marques. Violação ao direito à saúde das mulheres no parto: uma análise do perfil dos 
processos judiciais em obstetrícia do TJDFT sob a ótica da violência obstétrica, 2015. Trabalho de Conclusão de 
Curso (Bacharelado em Saúde Coletiva) – Universidade de Brasília, p. 11.Disponível em: 
<http://bdm.unb.br/handle/10483/12509>. Acesso em: 23 out. 2017. 
41
 NOGUEIRA, Beatriz Carvalho, op. cit., p. 38. 
24 
 
De acordo com o caderno do Ministério da Saúde “Humanização do parto e do 
nascimento” (2014), após mais de vinte anos de atuação da Rede, podem ser visualizadas 
diversas contribuições do movimento pelo parto humanizado, tais como a difusão de 
conhecimentos à sociedade, a contribuição para a formulação de políticas públicas, a 
resistência na imposição de procedimentos não humanizados à mulher e o estímulo na 
formação de profissionais para atenção humanizada ao parto. 
No sentido de buscar mudança no atual modelo de atenção obstétrica, o Ministério da 
Saúde adotou uma série de medidas que visam resguardar o direito das mulheres à saúde e à 
dignidade na gestação e parto, por meio de políticas públicas de saúde como o Programa de 
Humanização do Parto e Nascimento (2000), a Política de Humanização (2003), sendo mais 
recente a criação da rede de atenção, instituída pela Portaria nº 1.459 de 2011, Rede Cegonha, 
a qual visa à sistematização e institucionalização de um modelo de atenção ao parto e 
nascimento buscando garantir as mulheres, as usuárias do SUS atendimento adequado, seguro 
e humanizado desde a confirmação da gravidez, durante o pré-natal, parto e puerpério, 
planejamento reprodutivo, indo até os dois primeiros anos de vida da criança. 
Nesse sentido, destaque-se que essa Rede traz em seu art. 7º, inciso II, alínea c, que 
as práticas de atenção à saúde, no componente parto e nascimento devem ser baseadas em 
evidências científicas, de acordo com o documento da OMS de 1996: Boas Práticas de 
atenção ao parto e ao nascimento
42
. 
Nesse sentido também está o conceito utilizado pela Rede pela Humanização do 
Parto e do Nascimento (ReHuNa)
43
, baseado na evidência empírica e nas novas tendências 
nas relações entre profissionais e pacientes, em atenção aos direitos fundamentais. 
No entanto, as recomendações mencionadas não proporcionaram mudanças muito 
significativas. O Brasil ainda continua sendo um dos líderes do ranking mundial de 
cesarianas, fato que gera um efeito cascata: “mais internações, mais leitos ocupados, mais 
 
42
 Ao longo do texto, a OMS destaca que diversas técnicas frequentemente utilizadas devem ser “consideradas 
desnecessárias, e somente serem realizadas a pedido da mulher”, como também, a partir de estudos 
desenvolvidos mundialmente com gestante e parturientes, enfatizam a necessidade de ações fundamentadas na 
Medicina Baseada em Evidências, o que tenderia a gerar um cuidado mais qualificado e seguro na atenção ao 
nascimento, a partir de práticas menos invasivas. (MORAIS, Fátima Raquel Rosado, op. cit., p.63-64) 
43
 “A ReHuNa - Rede pela Humanização do Parto e Nascimento - é uma organização da sociedade civil que vem 
atuando desde 1993 em forma de rede de associados em todo o Brasil. Seu objetivo principal é a divulgação de 
assistência e cuidados perinatais com base em evidências científicas e em conformidade com as recomendações 
da Organização Mundial de Saúde. Esta rede desempenhou um papel fundamental na estruturação de um 
movimento que hoje é denominado “humanização da assistência ao parto e nascimento”, que pretende diminuir 
as intervenções desnecessárias e promover um cuidado ao processo de gravidez parto-nascimento-amamentação 
baseado compreensão do processo natural e fisiológico”. Disponível em: 
<http://www.rehuna.org.br/index.php/quem-somos>. Acesso em: 10 nov. 2017. 
25 
 
gastos e menos eficiência”
44
. Sem contar que uma intervenção desnecessária ainda causa 
riscos à vida da mãe e da criança. 
DINIZ
45
 acompanhou por determinado período duas maternidades, a fim de verificar 
todo o contexto da humanização do atendimento, pelas pacientes, acompanhantes, e 
profissionais envolvidos, e se surpreendeu com os resultados obtidos, indicando que “as 
propostas de humanização da assistência ao parto vão ao encontro das necessidades 
institucionais de financiamento do setor público, o que parece ser um fator decisivo para seu 
apoio político”, pois significa, na prática, uma economia dos custos hospitalares. Isso porque, 
em um dos serviços (Santa Efigênia), calculou-se que a humanização da maternidade 
implicou em uma redução de custos na ordem de 25%. 
Em um modelo de assistência ao parto ideal, a gestante/parturiente deve ser ativa nas 
escolhas de quais procedimentos será submetida, deverá participar do planejamento do parto, 
deverá ser apoiada e ouvida pela equipe de saúde. 
No Brasil, o modelo padrão ainda é distante desse modelo ideal, somente uma pequena 
parcela da população feminina (mulheres majoritariamente brancas e de classe média e alta) 
encontrou autonomia em relação aos seus direitos reprodutivos, para buscar uma alternativa à 
cesariana eletiva e à má qualidade de assistência ao parto vaginal. Em contrapartida, a maioria das 
mulheres brasileiras continuam sendo submetidas ao modelo padrão violador de direitos no 
atendimento obstétrico, em especial mulheres não brancas.
46
 
Portanto, concorda-se com a conclusão de MORAIS
47
, no sentido de que a 
humanização “sugere uma transformação cultural, estrutural, política e econômica na 
medicina em que as mudanças pedem uma profunda transformação em toda a sociedade, 
inclusive na produção de teorias e práticas corriqueiras”. 
 
 
 
 
44
 RODRIGUES. Heloisa Correia, op. cit., p. 46. 
45 DINIZ, Carmen Simone Grilo. Entre a técnica e os direitos humanos: possibilidades e limites da 
humanização da assistência ao parto, 2001. São Paulo, Tese (Doutorado em Medicina Preventiva) – Faculdade 
de Medicina da Universidade de São Paulo, p. 159-160. Disponível em: 
<https://www.researchgate.net/profile/Simone_Diniz/publication/34010137_Entre_a_tecnica_e_os_direitos_hum
anos_possibilidades_e_limites_da_humanizacao_da_assitencia_ao_parto/links/0c96052438627d3e3f000000/Ent
re-a-tecnica-e-os-direitos-humanos-possibilidades-e-limites-da-humanizacao-da-assitencia-ao-parto.pdf>. 
Acesso em: 10 out. 2017. 
46
 OLIVEIRA, Amanda Lima de, op. cit., p. 33. 
47
 MORAIS, Fátima Raquel Rosado, op. cit., p. 118. 
26 
 
2.3 O DIREITO À ASSISTÊNCIA HUMANIZADA AMPARADO PELO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 
 
Como aduz RODRIGUES
48
, humanizar consiste em promover assistência de 
qualidade à parturiente através do alívio a dor, do conforto físico e emocional, da liberdade 
para escolher como deseja ter o bebê, dando-lhe suporte material, pessoal e psicológico 
necessário, a fim de que a parturiente e o nascituro, atores principais desse momento, 
vivenciem todo o processo da maneira mais segura e não traumática. 
Tal ideia, sem sombra de dúvida, coaduna com o que é tido como dever do Estado, 
de que se promova a proteção dos direitos fundamentais, no caso em específico, das 
parturientes, de que a ela seja dado o direito à liberdade de escolha das práticas de atenção ao 
parto que serão nela utilizadas, juntamente com o médico, em respeito ao direito à vida, à 
saúde, e à sua dignidade como pessoa humana. 
Logo, a noção dos direitos inerentes às mulheres, tanto pela condição de pessoa 
humana quanto pelo próprio gênero, é essencial para a compreensão da assistência 
humanizada. 
A parturiente, como sujeita de direitos, possui diversas prerrogativas: a dignidade da 
pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) como fundamento do Estado Democrático de Direito; o 
princípio da igualdade (art. 5º, I, CRFB/88) que a protege de todas as formas de 
discriminação; a inviolabilidade do direito à vida e à liberdade (art. 5º, caput, CRFB/88); o 
princípio da legalidade (art. 5º, II, CRFB/88) que assegura autonomia à mulher; e ainda a 
previsão de que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou 
degradante” (art. 5º, III, CRFB/88)
49
.Sobre a autonomia e a integridade física da mulher, o Código Civil
50
 estabelece, em 
seus artigos 15 e 21, respectivamente, que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se, 
com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica” e que “a vida privada da 
pessoa natural é inviolável”, garantindo, ainda, em seu artigo 949, que “no caso de lesão ou 
outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros 
cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove 
 
48
 RODRIGUES. Heloisa Correia, op. cit., p. 42. 
49
 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 02 out. 2017. 
50
 BRASIL, Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 02 out. 2017 
27 
 
haver sofrido”, opção esta reforçada pelo Código Penal
51
, que tipifica: “ofender a integridade 
corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano” (art. 129) e “se 
resulta: II – perigo de vida; [...] IV – aceleração do parto: Pena – reclusão, de um a cinco 
anos” (art. 129, §1º). 
Segundo a OMS
52
: 
 
Todas as mulheres têm direito ao mais alto padrão de saúde atingível, 
incluindo o direito a uma assistência digna e respeitosa durante toda a 
gravidez e o parto, assim como o direito de estar livre da violência e 
discriminação. Os abusos, os maus tratos, a negligência e o desrespeito 
durante o parto equivalem a uma violação dos direitos humanos 
fundamentais das mulheres, como descrevem as normas e princípios de 
direitos humanos adotados internacionalmente. Em especial, as mulheres 
grávidas têm o direito de serem iguais em dignidade, de serem livres para 
procurar, receber e dar informações, de não sofrerem discriminações e de 
usufruírem do mais alto padrão de saúde física e mental, incluindo a saúde 
sexual e reprodutiva. 
 
O diploma civil também assegura direitos quanto ao feto, por sua condição de 
nascituro, mas não lhe atribui condição de pessoa, pois, segundo seu art. 2º, “a personalidade 
civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo desde a concepção, os 
direitos do nascituro”. 
Além disso, observa-se que no ordenamento jurídico brasileiro há disposições 
esparsas a respeito do assunto, dentre os quais estão: a Lei nº 8.080/90
53
, que regulamenta o 
Sistema Único de Saúde (SUS); Portaria nº 569/2000 que instituiu o programa de 
humanização no pré-natal e nascimento
54
, Portaria nº 371/2014 que instituiu diretrizes para a 
organização da atenção integral e humanizada ao recém nascido no SUS
55
, Portaria 
n°11/2015
56
 que redefiniu as diretrizes de implantação e habilitação de centro de parto 
 
51
 BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 09 out. 2017. 
52
 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos 
durante o parto em instituições de saúde. Disponível em: 
<http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/134588/3/WHO_RHR_14.23_por.pdf>. Acesso em: 10 out. 2017. 
53
 BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e 
recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. 
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>. Acesso em: 22 out. 2017. 
54
 BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 569, de 1º de junho de 2000. Disponível em: 
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2000/prt0569_01_06_2000_rep.html>. Acesso em: 09 out. 2017. 
55
 BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 371, de 07 de maio de 2014. Institui diretrizes para a organização 
da atenção integral e humanizada ao recém nascido (RN) no Sistema Único de Saúde (SUS). Disponível em: 
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/sas/2014/prt0371_07_05_2014.html>. Acesso em: 09 out. 2017. 
56
 BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 11, de 7 de janeiro de 2015. Redefine as diretrizes para 
implantação e habilitação de Centro de Parto Normal (CPN), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), para 
o atendimento à mulher e ao recém-nascido no momento do parto e do nascimento, em conformidade com o 
28 
 
normal, Política Nacional de Humanização, Programa Nacional de humanização da 
assistência hospitalar, cartilhas de recomendações, resoluções do Ministério da Saúde, entre 
outros. 
Portanto, há dispositivos técnicos para a prestação de serviços baseados na 
humanização do atendimento à saúde. Porém, não há dúvidas que há diferenças entre o peso 
de uma lei e de portarias e resoluções para a sociedade. 
Um dos principais marcos legislativos brasileiros sobre os direitos maternos foi a 
mencionada Lei Federal nº 11.108/2005, conhecida como a lei do acompanhante. Contudo, 
vale salientar que, embora a normativa preconize a livre escolha do acompanhante, ela não 
prevê, por exemplo, uma solução para o caso das mulheres usuárias da rede pública de saúde, 
que são internadas em leitos coletivos, que inviabiliza o acompanhamento noturno de 
acompanhantes homens. 
Ainda, deve-se destacar o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei nº 
8.069/90)
57
. Apesar de ser uma lei voltada à proteção da criança e do adolescente, 
expressamente prevê como direito da mulher a atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao 
puerpério, senão vejamos: 
 
Art. 8º. É assegurado a todas as mulheres o acesso aos programas e às 
políticas de saúde da mulher e de planejamento reprodutivo e, às gestantes, 
nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao 
puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral no âmbito 
do Sistema Único de Saúde. (destaques acrescidos) 
[...] 
§ 8º A gestante tem direito a acompanhamento saudável durante toda a 
gestação e o parto natural cuidadoso, estabelecendo-se a aplicação de 
cesariana e outras intervenções cirúrgicas por motivos médicos. 
(Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016) (destaques acrescidos) 
 
 
O Estatuto da Primeira Infância (Lei nº 13.257/16)
58
, que alterou o ECA, ainda 
estabelece: 
 
Componente PARTO E NASCIMENTO da Rede Cegonha, e dispõe sobre os respectivos incentivos financeiros 
de investimento, custeio e custeio mensal.. Disponível em: 
<http://www.saude.am.gov.br/docs/servicos/cp_maternidades/Portaria_2015_11.pdf>. Acesso em: 09 out. 2017. 
57
 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá 
outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em 28 out. 
2017. 
58
 BRASIL. Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016. Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância e 
altera a Lei n
o
 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), o Decreto-Lei n
o
 3.689, de 
3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo 
Decreto-Lei n
o
5.452, de 1
o
 de maio de 1943, a Lei n
o
 11.770, de 9 de setembro de 2008, e a Lei n
o
 12.662, de 5 
de junho de 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm>. 
Acesso em: 13 out. 2017. 
29 
 
 
Art. 19. O art. 8º da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar com 
a seguinte redação: 
§ 2o Os profissionais de saúde de referência da gestante garantirão sua 
vinculação, noúltimo trimestre da gestação, ao estabelecimento em que será 
realizado o parto, garantido o direito de opção da mulher (destaques 
acrescidos). 
 
Veja-se que a nova Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016 legitimou o direito de 
escolha e autonomia da mulher, retirando do texto as assertivas que promovem uma assistência 
obstétrica hierarquizada e dominante e, por conseguinte, fomentando a mudança da assistência 
obstétrica tecnocrática para a humanizada. 
O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015)
59
 também resguardou, no 
que tange ao direito à saúde, a garantia do parto humanizado, in verbis: 
 
Art. 19. Compete ao SUS desenvolver ações destinadas à prevenção de 
deficiências por causas evitáveis, inclusive por meio de: 
I - acompanhamento da gravidez, do parto e do puerpério, com garantia 
de parto humanizado e seguro (destaques acrescidos). 
 
Não obstante a legislação existente, não há meio hábil, qual seja, uma legislação 
específica e organizada, que caracterize as necessidades de fato existentes, que regule os 
direitos a serem garantidos as gestantes no período gravídico-puerpérico e os princípios 
basilares deste movimento, que sistematize o modo como deve ocorrer o atendimento de 
forma mais humana, e que imponha as devidas sanções àqueles responsáveis pelo 
atendimento, seja os profissionais ou a instituição de saúde. 
Um projeto de lei não trará ao ordenamento, ineditismo quanto ao direito ao parto 
humanizado, mas normas que regulam seu exercício, que sob esse aspecto são sim inéditas. Isso 
porque se verificou a existência da garantia a humanização do atendimento ao parto no artigo 8° 
caput, e § 8° da Lei 8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente, e no artigo 19, da Lei 
13.146/2015 - Estatuto da Pessoa com Deficiência. 
Desse modo, o Projeto de Lei nº 7.633/2014a seguir exposto surge pela relevância de 
se assegurar direitos fundamentais às gestantes, quais sejam, a preservação e manutenção do 
direito à vida e à liberdade, no que tange à sua escolha quanto às praticas de atenção ao parto 
a serem utilizadas, garantindo, igualmente, o direito à saúde. 
 
 
59
 BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com 
Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm>. Acesso em: 29 out. 2017. 
30 
 
2.4 OS PROJETOS DE LEI EM TRAMITAÇÃO 
 
O Projeto de Lei nº 7.633/2014
60
, elaborado pela Artemis, assinado pelo Deputado 
Federal Jean Willys (PSOL/RJ), inspirado na legislação venezuelana, tem como principais 
objetivos a instituição do parto humanizado como regra e o combate à violência obstétrica, 
garantindo à mulher o direito à assistência humanizada durante a gestação, pré-parto, parto e 
puerpério, incluindo-se o abortamento, seja este espontâneo ou provocado, na rede de 
atendimento do SUS e em estabelecimento privado de saúde suplementar, segundo o art. 1º. 
Como princípios da assistência humanizada no parto e no nascimento, estabelece, em 
seu art. 3º, a mínima interferência por parte da equipe de saúde, a preferência pela utilização 
dos métodos menos invasivos e mais naturais, de escolha da parturiente, o fornecimento de 
informações adequadas e completas à mulher, assim como a(o) acompanhante, referente aos 
métodos e procedimentos disponíveis para o atendimento à gestação, pré-parto, parto e 
puerpério e a harmonização entre a segurança e o bem-estar da mulher e do concepto. 
Em seu art. 8º, o projeto ainda garante o cumprimento do plano individual de parto 
que, somente poderá ser alterado se, comprovadamente, durante o trabalho de parto, forem 
necessárias intervenções para garantir a saúde da mãe e/ou do concepto em condições de 
urgência ou emergência que indiquem risco de morte materna e/ou fetal, devendo somente ser 
realizadas após o consentimento da mulher. 
Assim, tal projeto coloca a pessoa da gestante essencialmente como sujeita de 
direitos, trazendo a necessidade de um tratamento personalizado e respeitoso, garantindo seu 
direito à liberdade, dignidade, autonomia e autoridade moral para decidir sobre seu parto. 
Diante disso, o legislador traz um rol exemplificativo de atitudes consideradas como 
violência obstétrica, atentando-se, inclusive, para os meios sancionatórios, in litteris: 
 
Art. 17 – Todos os casos de violência obstétrica praticados pelos 
profissionais da equipe de saúde serão relatados à ouvidoria dos serviços de 
saúde e às Comissões de Monitoramento dos Índices de Cesarianas e de 
Boas Práticas Obstétricas - CMICBPO, e constituem infração à legislação 
sanitária federal, implicando obrigatoriamente na aplicação das penalidades 
previstas nesta Lei ao estabelecimento de saúde. 
§ 1º - Os e as profissionais de saúde que praticarem atos de violência 
obstétrica ficam pessoalmente sujeitos à responsabilização civil e criminal 
decorrente de suas condutas. 
 
60
 BRASIL. Projeto de Lei nº 7.633/2014. Dispõe sobre a humanização da assistência à mulher e ao neonato 
durante o ciclo gravídico-puerperal e dá outras providências. Disponível em: 
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1257785>. Acesso em: 18 out. 2017. 
31 
 
§ 2º - Os casos de violência obstétrica serão também notificados aos 
Conselhos Regionais de Medicina e de Enfermagem, para os devidos 
encaminhamentos e aplicações de penalidades administrativas aos 
profissionais envolvidos. 
Art. 19 - Ficam as escolas e universidades que ministram curso de formação 
de profissionais da área de saúde, médicos(as), enfermeiros(as), obstetrizes e 
equipes administrativas hospitalares obrigadas a implementar em suas 
diretrizes curriculares conteúdos disciplinares relativos ao atendimento à 
saúde da mulher e do concepto, nos termos desta Lei. 
Art. 20 - Os direitos e a proteção à vida de mulheres no ciclo gravídico-
puerperal e de seus recém-nascidos de que trata esta Lei, mais 
especificamente de gestantes, parturientes, puérperas e seus neonatos, são 
assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, 
orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, 
recursos econômicos, grau de gravidade ou qualquer outra. 
Art. 21 – As disposições constantes desta Lei aplicam-se ao Sistema Único 
de Saúde e a toda a rede de saúde suplementar e filantrópica do país, bem 
como aos serviços de saúde prestados de forma autônoma (BRASIL, 2014). 
 
Por outro lado, também foi apresentado pelo Deputado Federal Marco Feliciano o 
Projeto de Lei nº 2589/15
61
, contudo, este apenas criminaliza a violência obstétrica, punindo 
individualmente o profissional, não apresentando nenhuma forma de humanizar a assistência 
ao parto e combater a violência na esfera institucional e estrutural.. 
Além de não enfrentar o problema institucional e estrutural da violência obstétrica, 
esse projeto não define quais são esses conjuntos de condutas condenáveis, por isso, segundo 
OLIVEIRA
62
, caso fosse aprovado, não teria nenhuma ou quase nenhuma efetividade. 
Por tais motivos, o Projeto de Lei nº 7.633/14 se mostra atualmente como o mais 
avançado texto legislativo sobre o assunto, sendo o único que trata a violência obstétrica 
como violência de gênero, e que apresenta o ensino e a prática da humanização do parto, nas 
instituições de saúde, como a melhor alternativa ao combate ao atual modelo de atendimento 
ao parto agressivo, por estar alicerçado no sistema atual de saúde
63
. 
Caso o Projeto de Lei seja convertido em lei, não haverá, necessariamente, uma 
inovação no ordenamento jurídico brasileiro quanto ao direito ao parto humanizado, visto que, 
mesmo que de maneira bem fragmentada, tal direito encontra-se positivado. Não obstante, a 
iniciativa

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