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SolidaoMulheres-Braz-2020

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1 
 
 
 
 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES 
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS 
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
 
ANNE CAROLINE BRAZ 
 
 
 
A SOLIDÃO DAS MULHERES NO SISTEMA CARCERÁRIO: 
uma questão estrutural 
 
 
 
 
 
 
NATAL 
2020 
2 
 
 
 
 
ANNE CAROLINE BRAZ 
 
 
 
A SOLIDÃO DAS MULHERES NO SISTEMA CARCERÁRIO: 
uma questão estrutural 
 
 
 
 Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado ao Curso de Ciências Sociais 
– Licenciatura, da Universidade Federal do 
Rio Grande do Norte como requisito parcial 
para a obtenção do título de licenciatura 
em Ciências Sociais. 
 
ORIENTADORA: Prof. Drª. Ana Gretel 
Echazú Böschemeier. 
 
 
 
 
 
NATAL-RN 
2020 
3 
 
 
 
 
ANNE CAROLINE BRAZ 
 
A SOLIDÃO DAS MULHERES NO SISTEMA CARCERÁRIO: 
uma questão estrutural 
 
 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado 
ao Curso de Ciências Sociais – Licenciatura, 
da Universidade Federal do Rio Grande do 
Norte como requisito parcial para a obtenção 
do título de licenciatura em Ciências Sociais. 
Aprovada em: 17/12/2020 
BANCA EXAMINADORA: 
________________________________ 
PROFA. Dra. ANA GRETEL ECHAZÚ BӦSCHEMEIER 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
ORIENTADORA 
_________________________________________________________ 
PROF. DRA. JULIANA GONÇALVES MELO 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
MEMBRO DA BANCA 
_________________________________________________________ 
PROF. DR. OSWALDO GOMES CORRÊA NEGRÃO 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
MEMBRO DA BANCA 
_________________________________________________________ 
PROF. DRA. ELISETE SCHWADE 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
MEMBRO SUPLENTE 
4 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
A minha orientadora Dra. Ana Gretel Echazú por toda ajuda, contatos, 
competência, paciência, empatia, que sempre esteve presente em todos os momentos 
tensos e tranquilos referente ao campo da pesquisa. 
A Preta Vidal, pois sem ela a entrada no campo seria muito mais difícil, e a sua 
ajuda foi essencial. 
Ao Paulo da COEAPE, que me ajudou e passou todos os passos para 
conseguir a autorização para a realização da pesquisa. 
Ao meu companheiro Marciell Felipe Sousa de Medeiros pelo apoio e toda a 
força para a conclusão e do curso e por escutar e dar força nas dificuldades que 
surgiram durante a pesquisa de campo. 
A todas as mulheres que participaram da pesquisa, pois sem elas não teria 
pesquisa, uma vez que elas são o centro do estudo. 
A minha família que sempre apoiou incondicionalmente apesar de tudo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
 
 
 
RESUMO 
Este estudo tem como objetivo analisar fragmentos da história de vidas de 
mulheres aprisionadas no Complexo Penal Dr. João Chaves. Para contextualizar a 
pesquisa, se fez necessário fazer uma breve explanação sobre o histórico da prisão, 
das formas de penas e da criminalidade feminina, que afirma a orientação e ótica 
masculinas como norteadoras das ações de instituições de controle de 
androcentrismo. O estudo etnográfico, que traz o princípio da dignidade humana como 
uma categoria analítica dos direitos humanos, focaliza nas ações da instituição 
analisada referente a área da saúde, o direito sexual, a execução da pena, a 
assistência jurídica e social das mulheres que estão presas. A pesquisa foi realizada 
por meio de observações etnográficas registradas por meio da experiência 
participante da autora no campo de estudo. Foram realizadas entrevistas em 
profundidade e análise bibliográfica de textos que se referem à temática abordada. 
Como resultado, encontrei na maioria dos itinerários de vida analisados o fator comum 
e o tipo de delito cometido, que em sua maioria são tráfico de drogas ilícitas. A 
experiência comum de ter seus direitos negados pelo Estado/Instituições/sociedade, 
como o direito a exercer a maternagem, à saúde, à educação e a profunda vivência 
de uma solidão sustentada por uma estrutura social racista, classista e misógina. 
Palavras-chave: Prisão, Mulher, Direitos humanos, Androcentrismo, Drogas. 
 
ABSTRACT 
 This study aims to analyze fragments of the life histories of women imprisoned 
in the Dr. João Chaves Penal Complex. In order to contextualize a research, it was 
necessary to make a brief explanation about the history of imprisonment of penalties 
and the problem of female criminality, which affirms an androcentric orientation guiding 
the actions of repressive institutions. The ethnographic study, which brings up the 
principle of human dignity as an analytical category of human rights, focuses on the 
actions of the analyzed institution in the area of health, sexual law, execution of 
sentences and the legal and social assistance of women who are imprisoned. The 
research was carried out through ethnographic analysis, obtained through the author's 
participant experience in the field of study. In-depth and bibliographic analysis of texts 
that identify with the issue were incorporated. As a result, I found in most of the 
analyzed life itineraries the common factor the type of crime committed, which in most 
cases are illicit drug trafficking, their common experience of having their rights denied 
by the State/ Institutions/society, such as the right to maternity, health, education and 
the deep experience of a loneliness based on a social structure which is racist, classist 
and misogynist. 
Keywords: Prison, Women, Human rights, Androcentrism, Drugs. 
6 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
EUA – Estados Unidos da América do Norte 
ICPR – International Center for Policy Research 
WPB – World Prison Brief 
DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional 
HUOL - Hospital Universitário Onofre Lopes 
UERN - Universidade Estadual do Rio Grande do Norte 
CPJC - Complexo Penal Dr. João Chaves 
CNPCP - Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária 
PNSSP - Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário 
SUS - Sistema Único de Saúde 
LEP - Lei de Execução Penal Brasileira 
ONU - Organização das Nações Unidas 
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. 
 
 
 
7 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 8 
2 MULHERES NO SISTEMA CARCERÁRIO ........................................................................ 11 
2.1. APROXIMAÇÃO HISTÓRICA À ATRIBUIÇÃO DAS PENAS 11 
2.2 ATRIBUIÇÃO DAS PENAS NO BRASIL 13 
2.3 MULHERES PRIVADAS DE LIBERDADE 20 
3 COMPLEXO JOÃO CHAVES ............................................................................................. 27 
3.1 BREVE HISTÓRICO DO SISTEMA CARCERÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE 27 
3.2 CARACTERIZAÇÃO DO COMPLEXO PENAL DR. JOÃO CHAVES 30 
4 COMPREENDENDO O MUNDO DAS MULHERES NA PRISÃO, POR UMA ANÁLISE DE 
ITINERÁRIOS DE VIDA .......................................................................................................... 42 
4.1 UM DIREITO NEGADO 43 
4.1.2 Insufiencia da Assistência à Saúde 45 
4.1.3 Ausência de Assistência 49 
4.2 A CHAPA 53 
5. DO CRIME À SOLIDÃO ..................................................................................................... 55 
5.1 MULHERES E DROGAS ILÍCITAS 55 
5.2 MATERNAGEM 56 
5.2.1 Ruptura Familiar 58 
5.3 ESTIGMA LADO A LADO COM A SOLIDÃO 62 
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 65 
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 68 
ANEXOS .................................................................................................................................. 74 
 
8 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
O presente trabalho tem como objetivo analisar itinerários de vida de algumas 
mulheres que se encontram aprisionadasno Complexo Penal Dr. João Chaves. O 
intuito é entender, embora que parcialmente, como elas vivem na unidade prisional, 
do que sentem falta, como elas lidam com as condições de vida que enfrentam. 
Analisaremos o sistema penitenciário do Estado do Rio Grande do Norte, a sua 
origem, a unidade João Chaves e o dia a dia das mulheres que se encontram presas 
nela. 
No Brasil, as unidades penais em sua maioria se encontram com as instalações 
precárias para a utilização permanente, com um atendimento à saúde precário ou 
inexistente, bem como também o atendimento jurídico que em sua maioria também é 
insuficiente. Todos esses problemas relatados estão presentes na vida daqueles que 
estão vivendo em presídios, e seria impossível tentar entender como as mulheres 
presas lidam com a vida na prisão sem falar desses assuntos. 
O interesse nesse estudo nasceu devido a uma inquietação própria, referente 
à observação da diferença do tamanho das filas de visitas entre o presídio feminino e 
o presídio masculino quando estava no sexto período do curso. Uma vez que, indo 
para o trabalho, cujo na época era de telemarketing, passava pela avenida João 
Medeiros Filho e a avenida Itapetinga para pegar o ônibus na parada que fica próxima 
as unidades, sempre que passava pela Cadeia Pública de Natal - Raimundo Nonato 
masculino podia observar uma fila imensa, mas já não conseguia ver essa mesma fila 
no Complexo Penal Doutor João Chaves, a unidade feminina. 
Para a compreensão do funcionamento do sistema carcerário no Rio Grande 
do Norte, bem como se deu o surgimento do Complexo Penal Dr. João Chaves a 
monografia do Leonardo Santos e a dissertação de Aldenise Silva foi fundamental 
para o desenvolvimento deste trabalho. Além das análises do Leonardo Santos do 
CPJC enquanto pesquisador que foi essencial para o trabalho. 
A dissertação da Santa Rita foi importante no tocante do surgimento das 
prisões femininas, bem como a igreja católica tem um papel fundamental para 
construção e no julgamento dos delitos cometidos, além de retratar o papel previsto 
para as mulheres pela sociedade patriarcal. 
9 
 
 
Este trabalho tem como proposta analisar, desde uma perspectiva etnográfica, 
narrativas das vidas de mulheres que estão dentro de uma prisão a partir de um ponto 
de vista etnográfico. Em termos metodológicos, realizado incursões a campo e 
entrevistas em profundidade, onde realizamos a prática da observação participante, 
onde a oralidade se revela como uma dimensão muito importante, já que me permitiu 
ter acesso às questões que marcam a vida dessas mulheres. 
Cabe ressaltar que o meu primeiro contato com o campo foi graças a Preta 
Vidal, que foi um contato passado por Ana Gretel, a minha orientadora, onde a Preta 
Vidal tinha feito um trabalho na unidade, ela que me passou o contato da diretora da 
unidade, a Agente Jacinta, onde no início me deu todas as orientações para conseguir 
a permissão da pesquisa junto a COEAPE. Chegando lá, tive ajuda de funcionários 
que deram entrada no requerimento da pesquisa. No dia 18 de outubro de 2019, com 
a autorização em mãos para entrar no presídio e com a carta da minha orientadora 
definindo os motivos e condições propostas para a pesquisa, tive que enfrentar novas 
dificuldades, pois apesar da secretaria liberar a entrada para realizar a pesquisa e de 
ter combinado os dias com a administração previamente, na minha primeira chegada 
à unidade me deparei com a notícia que a pesquisa não poderia ocorrer. Nesse dia, 
os motivos apresentados foram que não havia pessoal suficiente, e que já existiam 
outros projetos no local, como cursos, missa/culto; e também não ter um local 
apropriado para fazer a pesquisa. 
Os percalços foram resolvidos posteriormente. A pesquisa se desenvolveu 
através da observação participante, onde fiz anotações no diário de campo, para 
registro dos dados etnográficos obtidos. Realizei entrevistas com 15 mulheres que 
foram escolhidas pela direção para participar da pesquisa, onde efetuei as entrevistas 
com o auxílio de um roteiro semiestruturado. Me foi permitido gravar as conversas, 
desde que as mulheres autorizassem. Posteriormente, todas as conversas gravadas 
foram transcritas e estarão disponíveis nos anexos. Também realizei fotografias da 
unidade para ilustrar os espaços da instituição de acordo com as orientações da 
direção da unidade, em que me informou quais eram os locais nos quais eu poderia 
tirar fotos e também a restrição de não tirar nenhuma fotografia de alguma interna. O 
Estado não tem direito de utilizar as imagens das mulheres e essas mulheres têm o 
direito da preservação da sua imagem. 
10 
 
 
Ressalto que a pesquisa no campo ela precisou ser interrompida devido a 
realizações de alguns cursos que o IEL e SENAI estavam oferecendo, e seria 
retomada as entrevistas nesse ano de 2020, porém, a pandemia impossibilitou que 
fosse retomada as entrevistas com as mulheres. 
Nesta monografia, além da introdução, possui mais quatro capítulos além da 
conclusão. Na introdução tem o principal motivo que levou a escolha do tema e a 
metodologia utilizada. 
O segundo capítulo contempla o surgimento das penas, que a princípio tinha a 
sua pena é o suplicio com base em castigos corporais, como se deu as penas no 
Brasil, além do fator principal para o aprisionamento em massa no brasil está ligado 
a delitos cometidos em relação a drogas ilícitas. Além de retratar o surgimento das 
penas e prisões voltadas para as mulheres no Brasil. 
 O capítulo terceiro traz especificamente o histórico do sistema carcerário do 
Rio Grande do Norte, como sendo o primeiro presídio o Forte dos Reis Magos, bem 
como se deu início ao Complexo Penal Dr. João Chaves, a etnografia do local e 
também a apresentação da história de vida das mulheres que estão aprisionadas na 
instituição e que foram entrevistadas. 
No quarto e quinto capítulo analisamos o cotidiano e a história de vida das 
mulheres entrevistadas buscando entender o seu mundo e seu sentimento referente 
a solidão. Nas considerações finais sobre a pesquisa, cabendo notar que devido à 
complexidade que envolvem o tema, merece um aprofundamento posterior e no 
anexo, apresentamos alguns documentos que foram necessários para a realização 
da pesquisa, assim como o roteiro de entrevista e as transcrições das entrevistas. 
 
 
 
11 
 
 
2 MULHERES NO SISTEMA CARCERÁRIO 
 
2.1. APROXIMAÇÃO HISTÓRICA À ATRIBUIÇÃO DAS PENAS 
 
Diferente do que se pensa da prisão, a familiaridade ao método penal no que 
diz respeito é um tanto recente. O aprisionamento sempre fez parte da história. Como 
na Roma Antiga, onde não tinha um local de cumprimento de pena, as sanções para 
quem cometiam algum delito era restrito apenas aos castigos corporais. Já na 
Antiguidade, o método usado era para guardar o acusado em locais de custódia 
enquanto aguardava pelo julgamento ou sentença de morte. 
 O Direito Penal e a pena se dão originalmente devido às constantes 
necessidades sociais por se ter sanções/punições penais. Visando na resolução de 
várias questões que pretende controlar a sociedade e promover a paz social, essa 
solução que por sua vez o Estado fornece contra os delitos cometidos que por lei são 
considerados crimes que irão trazer a penalidade a ser atribuída ao indivíduo 
transgressor da lei, ou seja, o Estado só faz dá a pena um facilitador e um 
regulamentador para a convivência dos homens em sociedade. Gomes (2011). 
Conforme aponta Foucault (1987, p. 8) diante da principal igreja de Paris em 
1757, Damiens foi condenado e levado nu, vestido apenas por uma camisola, 
carregando uma tocha acesa e segurando o objeto que foi utilizado no crime, 
posteriormente o seu corpo era puxado e desmembrado por cavalos, e o que restava 
de seu corpo era consumido pelas chamas e reduzidos a cinzas, já as suas cinzas 
eram jogadas ao vento. 
Essa barbárie é a descrição de uma pena chamadasuplício. Foucault detalha: 
Uma pena, para ser um suplício, deve obedecer a três critérios principais: em 
primeiro lugar, produzir uma certa quantidade de sofrimento que se possa, 
se não medir exatamente, ao menos apreciar, comparar e hierarquizar; a 
morte é um suplício na medida em que ela não é simplesmente privação do 
direito de viver, mas a ocasião e o termo final de uma graduação calculada 
de sofrimentos: desde a decapitação — que reduz todos os sofrimentos a um 
só gesto e num só instante: o grau zero do suplício — até o esquartejamento 
que os leva quase ao infinito, através do enforcamento, da fogueira e da roda, 
na qual se agoniza muito tempo; a mortesuplício é a arte de reter a vida no 
sofrimento, subdividindo-a em “mil mortes” e obtendo, antes de cessar a 
existência, the most exquisite agonies.6 O suplício repousa na arte 
12 
 
 
quantitativa do sofrimento. Mas não é só: esta produção é regulada. O 
suplício faz correlacionar o tipo de ferimento físico, a qualidade, a 
intensidade, o tempo dos sofrimentos com a gravidade do crime, a pessoa do 
criminoso, o nível social de suas vítimas. (FOUCAULT, 1987, p. 36) 
 Em 1787 é possível presenciar o surgimento de uma nova pena, 
realizado por Leon Faucher para a “Casa dos jovens detentos em Paris”, onde nela 
consta uma relação dos afazeres e delimitando o tempo de cada tarefa a ser realizada 
e o tempo que será realizada. No século XVIII, teve vários protestos contra a prática 
dos suplícios, e era necessário punir de uma outra forma, que não fosse a violência, 
a vingança e aquele espetáculo em praça pública. Tinha que se ter uma justiça 
criminal penal no sentido de educar, ao invés da vingança. 
E devido a essas mudanças de pensamentos, de códigos e comportamentos, 
que começa o “desaparecimento dos suplícios”, não temos mais o corpo exposto vivo 
ou morto na rua como se fosse um espetáculo; o corpo do criminoso como principal 
alvo da repressão penal; da humilhação que era desumana e degradante. 
Então, surge a condenação que marcará o infrator; a prisão; a reclusão; os 
trabalhos forçados; a interdição do domicílio; a deportação e a multa. No entanto, caso 
tenha que tocar no corpo dos réus, será feito sob distância, seguindo regras e evitando 
alardes. Já no final do século XVIII, a prisão era uma antessala de suplícios, pois 
funciona apenas de contenção e guarda de pessoas a serem condenadas ou 
executadas, era um local conhecido como de custódia e tortura. A partir do século 
XIX, tinha-se em mente que a prisão seria o meio certo para conseguir realizar a 
reforma dos réus, e naquele período parecia uma ótima solução e durante anos esse 
pensamento continuou como a prisão sendo a melhor forma para realizar a 
reabilitação de um preso. Porém, o controle estatal na função de julgar e penitenciar 
se mostrou seletivo e discriminatório. 
O cárcere é contrário a todo moderno ideal educativo, porque este promove 
a individualidade, o auto-respeito do indivíduo, alimentado pelo respeito que 
o educador tem dele. As cerimônias de degradação no início da detenção, 
com os quais o encarcerado é despojado até dos símbolos exteriores da 
própria autonomia (vestuários e objetos pessoais), são o oposto de tudo isso. 
A educação promove o sentimento de liberdade e de espontaneidade do 
indivíduo: a vida no cárcere, como universo disciplinar, tem um caráter 
repressivo e uniformizante (BARATTA, 2002, p. 183). 
 Dentro do contexto que acredita que a prisão coloca um ajuste a subcultura 
prisional, ligada a efeitos como: ociosidade, más condições de habitação, 
13 
 
 
superlotação, promiscuidade. A partir da concepção de instituição total, colocada por 
Goffman (1974), onde a prisão atinge o preso em sua integridade física e moral: 
podendo levar a uma submissão passiva, de aceitação das regras, com a 
interiorização de normas e valores ou a uma situação de clandestinidade ou revolta 
entreposto pelo uso da violência. 
A contradição na ideologia penal de reinserção social sobre quem “exclui” 
(sociedade) e quem é excluído (preso) que Baratta (2002) traz a existência de uma 
relação própria de poder nessa cultura, esta que por sua vez está inserida nas 
relações de desigualdades típicas da sociedade capitalista. 
As relações sociais e de poder da subcultura carcerária têm uma série de 
características que a distinguem da sociedade externa, e que dependem da 
particular função do universo carcerário, mas na sua estrutura mais 
elementar elas não são mais do que a ampliação, em forma menos 
mistificadora e mais “pura”, das características típicas da sociedade 
capitalista: são relações sociais baseadas no egoísmo e na violência ilegal, 
no interior das quais os indivíduos socialmente mais débeis são 
constrangidos a papéis de submissão e de exploração. Antes de falar de 
educação e de reinserção é necessário, portanto, fazer um exame do sistema 
de valores e dos modelos de comportamento presentes na sociedade em que 
se quer reinserir o preso. Um tal exame não pode senão levar à conclusão, 
pensamos, de que a verdadeira reeducação deveria começar pela sociedade, 
antes que pelo condenado: antes de querer modificar os excluídos, é preciso 
modificar a sociedade excludente, atingindo, assim, a raiz do mecanismo de 
exclusão (BARATTA, 2002, p. 186). 
Essas perspectivas revelam aspectos dos objetivos colocados pela pena da 
prisão, que são a seletividade e a exclusão de grupos sociais para as pessoas mais 
fragilizadas e vulnerabilizadas pelo estreitamento da pirâmide socioeconômica. 
 
2.2 ATRIBUIÇÃO DAS PENAS NO BRASIL 
 
Nas décadas de 1970 e 1980 conforme Lima e Ratton (2011) o Brasil começava 
com os primeiros passos para a redemocratização, que tinha como o objetivo alinhar-
se aos debates dos direitos fundamentais. Posteriormente a essas décadas tem vários 
estudos que tentam compreender o aumento da criminalidade e o sistema penal, bem 
como evidências de brutalidade do sistema prisional e policial, que resistem as 
normas regidas pelos direitos humanos conforme Taysa Santos (2016) o marco desse 
14 
 
 
período é o massacre do Carandiru de 1992, onde acarretou a morte de 111 homens 
aprisionados pela polícia militar. 
No brasil a cultura política pouco se compreende dos direitos humanos de uma 
pessoa aprisionada, pois poucos veem essas pessoas como sujeitos de direitos, e a 
maioria da sociedade acaba achando que os direitos de um/a preso/a são na verdade 
privilégios que são oferecidos, no entanto são direitos que lhe é assegurado enquanto 
pessoa. 
Conforme Taysa Santos (2016) os novos estudos também trazem à tona 
debate contemporâneo do poder punitivo do Estado as classes periféricas e a 
reinserção social das pessoas que cometeram algum delito. Essas pessoas que 
entraram o sistema prisional acabam por viverem em condições ultrajantes de 
existência, e ficam na invisibilidade social, mas ficam bem visíveis pelas instituições 
de controle social, devido a sua condição social ser subalterna. 
“O recorte moral do conjunto da população nos termos da guerra do bem contra 
o mal favorece a implementação de projetos político-econômicos específicos, mas se 
faz centralmente em nome da segurança pública ou segurança nacional” (SANJURJO 
e FELTRAN, 2015, p.1) 
Essa construção da sociedade acaba por justificar as medidas letais, legais ou 
ilegais do combatem ao crime, contra drogas, e a defesa nacional. Como Feltran 
coloca que os números em torno dos homicídios de jovens negros nas favelas de São 
Paulo eram maiores nos anos 1990 ao início dos anos 2000, no entanto era sempre 
marcada pela mobilização dos movimentos sociais, em prol de saúde, direito à 
moradia, transporte, e a morte violenta de vários jovens, que em boa parte eram 
trabalhadores de mercados ilegais voltado pra a venda de drogas ilícitas ou do roubo 
de carros. 
Os anos de etnografia foram tempos em que se solicitou nas rádios e 
televisões, nos comentários de notícias pela internet,progressivamente, e 
cada vez mais, que a repressão contra os pobres e seus territórios se 
radicalizasse: era preciso combater o crime que brotava de favelas e 
periferias. A justificação dessa premissa é moral, não precisa de argumentos. 
(SANJURJO e FELTRAN, 2015, p.3) 
Cabe ressaltar que os militantes que transformavam essas mortes em luta, 
eram acusados de “defender bandido” e essa expressão perdura até os dias de hoje. 
15 
 
 
Nos anos de 2000 o Primeiro Comando da Capital (PCC) implementava um sistema 
de justiça em todos os presídios e nas favelas. Essa implementação acaba por reduzir 
os números de homicídios de jovens das favelas, pois eles que vão intermediar 
debates locais, para conhecer as versões e julgar os culpados, esse homicídio não 
vai ser investigado pela polícia no caso Estado. Assim como qualquer outra 
intercorrência que seja necessário que vai decidir vai ser o PCC. 
O extermínio, a criminalização de pessoas da periferia resultou em um luto 
coletivo, que foi vivido de forma intensa, e foi se legitimando devido a violência do 
Estado contra a favela e periferias, no entanto as grandes medidas de controle policial 
dos anos 2000, foram realizadas pelo PCC conforme Liliana SanjurjoI e Gabriel 
Feltran. 
O Brasil coloca em prática o modelo de “tolerância zero às drogas”, trazido dos 
Estados Unidos da América do Norte (EUA), com combate agressivo ao uso e ao 
porte de drogas. O racismo no Brasil também tem grave determinação nas escolhas 
das autoridades no implemento das determinações das normas e do direito. Os 
policiais sobem nas favelas e matam sem restrição, tanto traficantes como residentes 
inocentes que não possuem envolvimento com a venda/uso de drogas, apenas 
moram no local, e esse modelo perdura até hoje. E com isso as pessoas que moram 
nos morros marginalizados acabam por temer mais a polícia, do que os traficantes, já 
que esses traficantes acabam por atuar como líderes das favelas, prestando 
assistências as pessoas que moram ali. 
No entanto, boa parte da sociedade ainda acredita, conforme Cláudio Filho, 
(1999), que para se ter a eficácia no combate à criminalidade tem que ter o aumento 
do contingente policial e grande número de prisões. Porém, o modelo não apresenta 
resultados significativos do uso da repressão com uso da violência com a diminuição 
da criminalidade, conforme o IPEA: 
A tendência de crescimento dos mercados legais e ilegais explorados pelas 
organizações criminosas, assim como o aumento da atuação das milícias, 
ampliação das atividades exploradas por organizações criminosas; 
manutenção de domínio de territórios por esses grupos; manutenção da 
expansão da atuação das facções nos presídios e interiorização dessas 
facções. (IPEA, 2016) 
 Cabe ressaltar que a maioria dos/as presos/as, são pessoas que podem ser 
substituídas por outra, acaba por não mudar a engrenagem, uma vez que os 
16 
 
 
traficantes de grande porte saem impunes, já que as pessoas que trabalham para eles 
é que são presas, e quando são presas eles colocam outra pessoa no lugar. 
Conforme esse aumento de encarceramento, hoje ocupamos o 3º lugar na lista 
de países que têm a maior população carcerária, com o número de 755.274.000 
pessoas presas ficando apenas atrás dos EUA que ocupa o 1º, onde possui 2.121.600 
pessoas encarceradas e a China com a 2º com 1.700.00 pessoas presas, conforme 
World Prison Brief (WPB) e International Center for Policy Research (ICPR) informa: 
Ranking Title Prison Population Total 
1 United States of America 2094000 
2 China 1710000 
3 Brazil 755274 
4 Russian Federation 491650 
5 India 478600 
6 Thailand 358369 
7 Turkey 281094 
Fonte: ICPR e WPB. 
 
Esse tipo de política de tolerância zero às drogas acabou por se fazer um dos 
principais motivos de prisões no Brasil, como podemos ver hoje os delitos cometidos 
devido a drogas ilícitas é o segundo maior tipo penal, que leva a privação da liberdade 
dos indivíduos. 
17 
 
 
 
 Fonte: DEPEN – junho 2020 
34%
41%
16%
6%
0%
2%1%0%
0%
Quantidade de Incidências por Tipo 
Penal: Período de Janeiro a Junho de 
2020
Drogas
Crimes Contra o Patrimônio
Crimes Contra a Pessoa
Outros
Crimes Contra a Dignidade Sexual
Crimes Contra a Paz
Crimes Contra a Fé Pública
Particular Contra a Adm. Pública
Contra a Administração Pública
18 
 
 
Conforme colocado anteriormente, nas últimas duas décadas presenciamos 
um aumento desenfreado da quantidade de pessoas encarceradas, e esse 
encarceramento em massa por sua vez acaba por termos como resultados cadeias 
superlotadas, temos presídios que em sua grande maioria são de péssimas 
qualidades, e temos o aumento dos números de pessoas privados da liberdade. 
 
Fonte: DEPEN – DEZEMBRO 2019 
Podemos ver um aumento muito significativo se compararmos com os anos de 
1990 até os últimos dados fornecido pelo DEPEN, conseguimos ter um aumento de 
367,91% durante o lapso de quase 30 anos, conforme ainda o DEPEN hoje temos um 
déficit de vagas nas unidades prisionais de 312.115.00, esse déficit já é de 
conhecimento de todos a algum tempo. 
 Conforme a fala de Jefferson de Almeida, o então diretor geral do DEPEN em 
2017, para a Agência Brasil (08/12/2017): “Temos dois presos para cada vaga no 
sistema prisional [...] Houve um pequeno acréscimo nas unidades prisionais, muito 
embora não seja suficiente para abrigar a massa carcerária que vem aumentando no 
Brasil”. Isso só nos mostra a inércia das instituições e de seus respectivos gestores. 
2
3
2
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POPULAÇÃO PRISIONAL POR ANO:PERIODO 
DE JULHO A DEZEMBRO DE 2019
Dados anuais
19 
 
 
Esse encarceramento não interfere apenas na vida das pessoas que estão 
presas, vai interferir também nas práticas de cuidado ao interior da vida das famílias, 
que acabam por viver aprisionados nos círculos da justiça criminal e limitados no 
acesso os seus afetos que estão encarcerados. 
Também é importante ressaltar que o Brasil é um dos países em que mais se 
mata, em 2016 teve 62.517 mortes violenta intencionais e acabou por superar o 
estágio de 30 homicídio a cada 100 mil habitantes e em sua maioria são jovens 
negros/as de comunidades conforme: 
Em 2016, por exemplo, a taxa de homicídios de negros foi duas vezes e meia 
superior à de não negros (16,0% contra 40,2%). Em um período de uma 
década, entre 2006 e 2016, a taxa de homicídios de negros cresceu 23,1%. 
No mesmo período, a taxa entre os não negros teve uma redução de 6,8%. 
Cabe também comentar que a taxa de homicídios de mulheres negras foi 
71% superior à de mulheres não negras. (IPEA. Atlas da violência. 2018. p. 
40). 
O Atlas da violência também revela que as maiores taxas de homicídios de 
negros ocorrem nos estados de Sergipe com 79,0% e no Rio Grande do Norte com 
70,5%. No período de 2006-2016 esses estados apresentaram um crescimento de 
172,3% e 321,1% respectivamente nas taxas de homicídios de negros/as. 
Quando verificamos os índices no estado do Rio Grande do Norte no tocante 
ao aumento da população carcerária, podemos ver que o estado também acompanha 
o crescimento dos dados do país, onde em 2007 tinha cerca de 2.976 pessoas presas 
e segundo o último censo de 2019 do DEPEN a população carcerária no estado já 
atinge 10.155 pessoas privadas de liberdade. 
20 
 
 
 
Fonte: DEPEN. Junho de 2019. 
 
2.3 MULHERES PRIVADAS DE LIBERDADE 
 
No decorrer da história da nossa sociedade vimos que temos uma mudança 
em relação aos direitos das mulheres.Hoje as mulheres têm direito ao voto, estão 
inseridas no mercado de trabalho, no entanto no passado as mulheres não 
trabalhavam fora de casa, não votavam, não precisavam estudar, uma vez que a única 
necessidade era realizar um bom casamento, cuidar da casa e dos filhos. 
Cabe ressaltar que as mulheres negras não tiveram os mesmos avanços 
referente aos igualdade, como Ângela Davis coloca em sua obra Mulheres, Raça e 
Classe, pois o proporcional das mulheres negras que trabalhavam fora de casa é 
maior do que as mulheres brancas, e as mulheres negras quando consegue emprego 
em sua grande maioria são por meio de trabalhos braçais e doméstico, além da 
opressão sofrida que ainda permanece hoje em dia. É importante observar que as 
mulheres negras foram intensamente afetadas pela vivência durante o período da 
escravidão como os castigos sofridos por elas não eram apenas o açoitamento e a 
mutilação, mas também, eram estupradas. 
A equiparação ocupacional das mulheres negras com o serviço doméstico 
não era, entretanto, um simples vestígio da escravidão destinado a 
desaparecer com o tempo. Por quase um século, um número significativo de 
ex-escravas foi incapaz de escapar às tarefas domésticas.(DAVIS, 2016, p. 
106) 
21 
 
 
 
A Ângela Davis também traz à tona em seu livro as dificuldades para que as 
mulheres negras conseguissem empregos que não fossem braçais, devido a 
discriminação racial, pois no livro ela relata que algumas mulheres negras chegaram 
a lecionar, no entanto foram demitidas devido ao preconceito racial, e tiveram que 
retornar aos serviços considerados de serviçais. 
 Conforme Santa Rita, a origem das prisões femininas no Brasil tem o cunho 
do discurso moral e religioso nas configurações de aprisionamento da mulher. 
Dessa forma, nota-se que a ótica central àquela época, no que se refere à 
questão do encarceramento feminino, era permeada por uma atitude moral, 
na qual ensinamentos religiosos se tornaram basilares para o novo 
estabelecimento prisional destinado às mulheres. Veiculava-se a ideia de 
separação das mulheres “criminosas” para um ambiente isolado de 
“purificação”, numa visão de discriminação de gênero assumida pela 
construção do papel da mulher como sexo frágil, dócil e delicada. (SANTA 
RITA, 2006, p. 35) 
A intenção da pena de prisão para mulheres era de reproduzir os papéis 
femininos socialmente construídos, ou seja, uma prisão feminina voltada para a 
domesticação das mulheres criminosas e a sua sexualidade sob vigilância, além da 
transformação de “mulheres pecadoras e criminosas” e ditas “mulheres perfeitas”, 
assim apresentando a perspectiva da moral e dos bons costumes dominante da época 
de 1942, cujo o papel da mulher seria associado apenas ao mundo doméstico, 
caridade, pacífica e dócil. 
Dedicadas às prendas domésticas de todo tipo (bordado, costura, cozinha, 
cuidado da casa e dos filhos e marido), elas estariam aptas a retornar ao 
convívio social e da família, ou, caso fossem solteiras, idosas ou sem 
vocação para o casamento, estariam preparadas para a vida religiosa 
(SOARES e ILGENFRITZ, 2002, p. 58). 
A igreja tem um papel muito marcante para a construção dessas “mulheres 
perfeitas”, uma vez que é a igreja quem cria a prisão de mulheres, para forçá-las a 
reproduzir os papeis que eram esperados para mulheres e sempre o delito cometido 
era cunho moral e não por um delito propriamente dito. 
No entanto é importante ressaltar que no decorrer do tempo o projeto de 
“domesticação” teve o seu declínio, haja visto a generalização da violência e a 
indisciplina na unidade prisional, e que na prática tornaram as mulheres mais duras e 
22 
 
 
ferozes. O histórico das unidades prisionais femininas brasileiras legitima a 
discriminação das mulheres e as características de dominação que existem no âmbito 
da privação de liberdade até a atualidade. A respeito da sua transgressão, acaba 
tendo uma dupla discriminação: uma por ser criminosa e outra por ser mulher, devido 
ao sistema punitivo de controle e de poder, além da representação social do papel 
feminino. 
As formas de controle e o mecanismo legal foram feitos dentro do panorama 
masculino, exercendo a violência patriarcal e as desigualdades de gênero, já que as 
mulheres que não se comportavam como era esperado e acabavam criminalizadas 
por ligações sexuais e morais, discriminadas devido não seguir com o sistema 
patriarcal imposto pela sociedade. Como Andrade (1997) coloca que o sistema 
seletivo de controle social acaba por duplicar a violência feminina reproduzindo por 
sua vez a violência estrutural: 
Pois além da violência sexual representada por diversas condutas 
masculinas (estupro, assédio) a mulher torna-se vítima da violência 
institucional (plurifacetada) do sistema penal que expressa e reproduz a 
violência estrutural das relações sociais capitalistas (a desigualdade de 
classe) e patriarcais (a desigualdade de gênero) de nossas sociedades e os 
estereótipos que elas criam e se recriam no sistema penal e são 
especialmente visíveis no campo da moral sexual dominante (ANDRADE, 
1997, p. 108). 
Sabemos que o número de mulheres presas é expressivamente menor do que 
o dos homens. É notório que a mulher ao longo dos tempos foi discriminada por razões 
biológicas, cujo papel era atribuído apenas a vida doméstica, sempre pautado na 
questão de gênero e que o ideal seria uma mulher dócil e não violenta, ao homem 
ficava incumbido a dominação da agressividade e a força. A entrada do movimento 
feminista, junto a questão de gênero, a compreensão das diferenças entre as 
mulheres e os homens, acabam acarretando uma mudança cultural, conforme Scott 
(1989). 
O gênero é igualmente utilizado para designar as relações sociais entre os 
sexos. Seu uso rejeita explicitamente explicações biológicas como aquelas 
que encontram um denominador comum, para diversas formas de 
subordinação, no fato de que as mulheres têm as crianças e que os homens 
têm na força muscular superior. O uso de “gênero” põe a ênfase sobre todo 
um sistema de relações que pode incluir o sexo, mas ele não é diretamente 
determinado pelo sexo, nem determina diretamente a sexualidade (SCOTT 
1989, p. 3). 
23 
 
 
Cabe ressaltar a importância de apontar os aspectos culturais e sociais da 
mulher no tocante a questão da temática do gênero, devido aos processos históricos 
de opressão e discriminação em que a mulher era submetida e esses é um dos 
motivos por se tornar ainda mais grave a vulnerabilidade da mulher presa, que em 
sua maioria das vezes é pobre, tem baixa escolaridade e geralmente não possui 
profissão conforme o DEPEN: 
 
Fonte: DEPEN – junho 2019 
24 
 
 
No entanto, o aumento de pessoas privados da liberdade é uma realidade que 
observamos tanto no cenário internacional como também no nacional. Esses dados 
também refletem quando falamos do crescimento do número de mulheres que estão 
presas, quando proferimos que a população carcerária feminina triplicou em dez anos, 
conforme o DEPEN. 
 Fonte: DEPEN – junho 2019 
Conforme o gráfico abaixo com os dados do DEPEN, podemos ver que a 
maioria das mulheres presas até junho de 2019, 58% foram presas devido a algum 
delito cometido em relação a drogas, pode ser por tráfico ou porte de drogas: 
25 
 
 
 
 Fonte: DEPEN – junho 2020 
Embora os dados sejam bem nítidos em relação aos delitos cometidos pelas 
presas, é necessário que tenhamos cautela para interpretar os dados e a posição 
ocupada por essa mulher no tráfico de drogas, embora tenha vários estudos que 
retratam a mulher em uma situação subalterna aos homens e tem outros que não. 
Como o autor Soares e Ilgenfritz (2002) na obra Prisioneiras: vida e violência atrás 
das grades, onde fala que a mulher é um alvo fácil para o sistema penitenciário, devido 
ao pífio poder de manobra diante da justiça criminal. 
Quando perguntadas sobre o lugar que ocupavam no tráfico, 78,4% das 
presascondenadas por esse delito referiram-se a funções subsidiárias ou a 
situações equívocas que por infortúnio, as teriam levado à prisão (SOARES 
e ILGENFRITZ, 2002, p. 86). 
Seguindo nessa mesma linha de pensamento, Breitman (1999) constatou em 
um de seus estudos que na maioria das transgressões realizadas por mulheres eram 
decorrentes de uma pequena venda de entorpecentes e/ou a conjunção do crime junto 
ao seu companheiro: 
O índice de ocorrências ligadas ao tráfico aumentou drasticamente no Rio 
Grande do Sul e no Brasil. Aqui é onde o incremento proporcional de presas 
foi maior: de 10% em 1988 a 40/45% em 1998. Em 1988, de cinco detentas 
por este delito, duas possuíam formação universitária e provinham de 
camadas médias da população. Das 65 detentas enquadradas nesta lei em 
Delitos Cometidos por Mulheres Aprisionadas
Drogas Crimes Contra o Patrimônio
Crimes Contra a Pessoa Crimes Contra a Paz Pública
Crimes Contra a Fé Pública Crimes Contra a Dignidade Sexual
Legislação Especifica Crimes Contra a Administração Pública
26 
 
 
1998, sete são analfabetas e 30 possuem apenas o 1 grau incompleto, o que 
permite caracterizar o tráfico como uma ocupação ou uma estratégia de 
mulheres de baixa escolaridade e que permite supor, igualmente, serem 
mulheres de baixa renda, provenientes de famílias carentes (BREITMAN, 
1999, p. 209). 
Para entendermos o crescimento no número de mulheres nas prisões 
brasileiras, temos que compreender quem são essas mulheres. E para tentar perceber 
a razão teremos que refletir sobre processo de “feminização da pobreza” que nesse 
caso quer dizer: 
“A feminização da pobreza é uma mudança nos níveis de pobreza partindo 
de um viés desfavorável às mulheres ou aos domicílios chefiados por 
mulheres. Mais especificamente, é um aumento na diferença de níveis de 
pobreza entre as mulheres e os homens, ou por um lado, entre os domicílios 
chefiados por mulheres, e, por outro lado, aqueles chefiados por homens ou 
casais. O termo também pode ser usado para significar um aumento da 
pobreza devido às desigualdades entre homens e mulheres, embora prefiram 
chamar a isto a feminização das causas da pobreza.” (MEDEIROS, Marcelo; 
COSTA, Joana. 2008) 
Santa Rita (2006) retrata o perfil das mulheres presas, e ressalta que várias 
pesquisas apontam o quanto as mulheres integram as estatísticas de vulnerabilidade 
e exclusão social: a maioria é “chefa de família”, possuem em média dois filhos 
menores, têm idade entre 20 a 35 anos, possui baixa escolaridade e condutas 
criminais de menor gravidade. No decorrer das entrevistas realizadas também é 
possível compreender que em quase a sua totalidade de mulheres aprisionadas se 
caracterizam como de baixa renda e desenvolvia atividades de baixo prestígio, que 
em sua maioria eram empregadas domésticas. 
Então, a cidadania vulnerável tem uma relação direta entre a criminalidade e a 
exclusão social das mulheres presas, uma vez que envolve uma questão cultural, 
econômica e uma realidade social complexas que foram marcadas pelas 
desigualdades e por falta de oportunidades iguais, lembrando que somos um país que 
ainda é apontado pelos baixos níveis de acesso à educação de qualidade, além da 
falta de apoio e proteção de famílias pobres no que tange aos direitos humanos. 
 
27 
 
 
3 COMPLEXO JOÃO CHAVES 
 
3.1 BREVE HISTÓRICO DO SISTEMA CARCERÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE 
 
Nesse capítulo irei trabalhar com dois autores, o autor Câmara Cascudo que é 
um autor bem polêmico para se trabalhar, mas é umas das poucas fontes que 
consegui encontrar para falar acerca dos dados históricos do Rio Grande do Norte-
RN, e trago a autora Aldenise Silva para complementar os dados referentes a história 
do sistema carcerário do RN. 
 Conforme Câmara Cascudo (1999) a primeira prisão que tivemos no estado 
do Rio Grande do Norte foi a que ficava no Forte dos Reis Magos, onde a sua 
construção foi iniciada em 1598 pelo padre jesuíta Gaspar de Samperes e foi 
finalizada em 1614. Então, hoje conhecida como Fortaleza dos Reis Magos, havia 
dois tipos de prisões, que seria uma para militares inobediente e uma outra voltada 
para prisioneiros de guerra que ficavam na prisão subterrânea composta por três (03) 
recintos. 
Durante os séculos em que o Forte dos Reis Magos esteve aberto, na forma 
de prisão, o sistema punitivo que funcionava era o do suplício do criminoso, do qual 
já falamos no capítulo anterior. Os três lugares subterrâneos que foram 
construídos/projetados, eles foram pensados para se ter níveis de suplícios diferentes. 
Sendo o primeiro (1º) nível, o mais conhecido como Calabouço, onde o preso passava 
por chicotadas, queimaduras e outras torturas físicas que terminavam muitas vezes 
na quebra dos ossos e na desfiguração do indivíduo. O segundo (2º) nível, era um 
recinto sem entrada de qualquer luz, onde o preso ficava de quatro (04) a cinco (05) 
dias na “sala escura” e depois era levado e exposto à luz do sol, e muitos acabavam 
ficando cegos em decorrência desse processo. 
E o terceiro (3º) nível ficava a prisão bem como a casamata (abrigo subterrâneo 
que, numa construção fortificada, se destina ao alojamento de tropas ou ao 
armazenamento de munições), nessa sala tinha uma câmara inferior onde o preso era 
atirado, o chão era de recifes e caso o preso não morresse ao cair, ele iria morrer por 
28 
 
 
afogamento, quando a maré subisse e enchesse o recinto, já que o local era ligado 
ao mar. Basicamente todos os presos passavam pelos três processos. 
Em 1722 é fundada a Cadeia Pública (Imagem 1) que contava com um 
Pelourinho para a depreciação do preso que estavão ali detidos conforme Aldenise 
Silva (2015). As pessoas que ficavam na Cadeia Pública eram indivíduos que 
cometiam delitos simples, e como o sistema de punição da época, partia do suplício, 
tinha a chicotada em praça pública (para mostrar a todos a punição), uma vez que a 
cadeia ficava localizada próxima às igrejas e a praça pública. O edifício mudou a sua 
localização no decorrer dos anos, no entanto, ficou sempre aos arredores da atual 
Praça André de Albuquerque ao longo da Rua Pres. Passos, próximo a Igreja do 
Rosário, o seu funcionamento foi até 1890. 
Imagem 1 - Cadeia Pública do RN 
 
1Fonte: Memorial legislativo Câmara Municipal 
Já em 1911 a Cadeia Pública passou a funcionar no casarão de Petrópolis, 
agora sob o nome de Casa de Detenção de Natal. Que conforme Aldenise Silva: 
Nos relatórios oficiais e na imprensa, a superlotação e a insalubridade eram 
as principais características da Cadeia Pública de forma que a denominação 
penitenciária, dada à Casa de Detenção, enfatizava a oposição à Cadeia 
Pública, devido ao caráter “regenerador” que se esperava da pena de prisão 
naquele momento. [...] no discurso oficial do estado, um elemento de ruptura 
na história da prisão em Natal, implantando pela primeira vez na cidade a 
distribuição dos presos em celas. (SILVA, Aldenise. 2015. p. 25) 
A casa de detenção foi construída em um local de expansão de Natal, no bairro 
de Cidade Alta, que foi o terceiro de Natal, (esse que tinha sido planejado para a 
 
1 Imagem 1 - Disponível em: <http://memorial.cmnat.rn.gov.br/trajetoria/> Acesso em abril /2020 
http://memorial.cmnat.rn.gov.br/trajetoria/
29 
 
 
ocupação de pessoas influentes), fica onde hoje funciona o Centro de Turístico de 
Natal, próximo a três prédios: do Hospital de Caridade Juvino Barreto, hoje conhecido 
como o Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL); Orfanato Padre João Maria e o 
Asylo de Mendicidade, ou seja, ali iria ter o Monte Petrópolis que reuniria boa parte 
das instituições de controle social de doença e camadas populares, deveria ser um 
local da cidade para a cura física e moral para as pessoas atendidas ali. 
Não bastava aos governos estadual e municipal promover reformas urbanas. 
Seus administradores desejavam destinar espaços específicos para 
diferentes funções nacidade, por exemplo, o bairro “aprazível”, gradualmente 
ocupado pelas elites, mas também por camadas populares, dentro do qual 
estava o Monte Petrópolis, onde se situavam instituições de controle. (SILVA, 
Aldenise. 2015. p. 27) 
E pensando no não cumprimento dos ideais penitenciários da legislação da 
época (Código penal de 1890) referente ao trabalho prisional, não se tinha, pois, a 
Casa de Detenção só possuía presos distribuídos nas celas cumprindo a pena em 
regime fechado, pois não tinha ferramentas para exercer trabalhos. Então, em 1940 
temos a inauguração da Colônia Penal Agrícola Dr. João Chaves, agora não mais em 
Natal, e sim no município de Macaíba, sua principal finalidade era suprir a carência 
do trabalho prisional, que não era possível realizar na Casa de Detenção, já que lá 
poderia ter o trabalho agrícola, onde se acreditava ser essencial para a “regeneração 
do indivíduo” através do trabalho. 
No entanto, o poder público começa a se incomodar quando é fundada a Escola 
Prática de Agricultura ao lado da Colônia Penal Agrícola Dr. João Chaves, pois os 
sentenciados, ex-sentenciados, alunos e professores começam a interagir, e então 
governador Sylvio Pedroza decide construir uma outra unidade. 
Ainda em 1952, o governador destaca a “falta de meios e instalações 
adequadas”, ausência quase completa de viaturas –o que indica um 
problema de mobilidade que reduzia a capacidade de controle do estado 
sobre os apenados. Cogita, então, a transferência ou a extinção da 
Colônia Penal. Numa entrevista à imprensa, em novembro de 1953, 
Sylvio Pedroza manifesta o desejo de construir outra colônia penal 
agrícola “... cogitando de fazê-la em Igapó [distrito de características 
rurais, então sob jurisdição do município de Macaíba], retirando de Natal 
a cadeia e acabando com a Colônia de Jundiaí”. (SILVA, Aldenise. 2015. 
p 44) 
Começa a construção em 1954 e em 1955 a inauguração do primeiro (01º) 
pavilhão da Colônia penal Dr. João Chaves, cerca de três (03) quilômetros da então 
chamada vila de Igapó e cerca de três (03) quilômetros da redinha, temos a então a 
unidade prisional que conhecemos hoje. 
30 
 
 
 
3.2 CARACTERIZAÇÃO DO COMPLEXO PENAL DR. JOÃO CHAVES 
 
 
Fonte: GAMA e Silva chegará hoje para inauguração da nova penitenciária. Tribuna do Norte. 28 abr., 
1968, p. 12. 
Conforme Leonardo Santos durante muito tempo o Complexo Penal João 
Chaves (CPJC) se considerou com a principal unidade do Estado e a única de 
segurança máxima da capital até 1998, quando foi inaugurada a Penitenciária 
Estadual de Alcaçuz. 
Como o Estado tinha poucas unidades penais disponíveis a João Chaves 
estava lotada. Durante os anos 70, esta unidade prisional recebeu vários 
presos políticos. Nos anos de 1980 e 1990 abrigou mais de 800 presos 
quando sua capacidade era de apenas 380. Foi nessa época que a 
penitenciária ficou conhecida pela alcunha de “O Caldeirão do Diabo”. 
(SANTOS, 2011, p 39-40) 
 
O motivo de ser alcunhada por “O Caldeirão do Diabo” era devido a uma série 
de assassinatos e homicídios dentro da unidade prisional por três (03) homens, que 
ficaram afamados fora e dentro da prisão como a “Santíssima Trindade do Diabo” que 
era formada por Demir, Naldinho do Mereto e Paulo Queixada. Foram atribuídas a 
eles cerca de trinta mortes no decorrer de cinco (05) anos em que estiveram no local, 
e sempre chamava a atenção a maneira violenta como eles aniquilavam as vítimas, 
por meio de decapitações, esquartejamentos e esvisceramento conforme (BEZERRA, 
Bárbara; JESUS, Cláudio; SUASSUNA, Rodrigo. 2019). 
31 
 
 
A fama da unidade segundo Leonardo Santos (2011), acabou que levou para 
a sua reconfiguração devido ter várias doenças, fugas, rebeliões, suicídio, brigas e 
assassinatos com crueldade e violência em algumas mortes. A população em torno 
do presídio que foi crescendo no decorrer do tempo, não aguentava mais viver com a 
tensão das fugas e rebeliões e começaram a reclamar. Em 2003 laudos do ministério 
público determinaram que a Dr. João Chaves fosse demolida pois o presídio não tinha 
infraestrutura adequada para conter os presos. O regime fechado do masculino foi 
desativado, restando no local apenas a ala feminina para as internas do regime 
fechado e do semiaberto, onde ficava a parte que foi demolida hoje temos o novo 
prédio da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN). 
A ala feminina foi construída em 1992, no início possuía a capacidade para até 
40 mulheres conforme Leonardo Santos (2011). Hoje a sua capacidade é de 70 
internas, porém hoje comporta 134 mulheres presas (até a data da entrevista), 
podendo estar no regime aberto, semiaberto ou fechado, que são os regimes que a 
unidade trabalha. A unidade possui quatorze (14) celas que ficam situadas dentro do 
pátio conforme imagem abaixo, nessas celas tem em média onze (11) mulheres que 
“moram juntas”. Tem uma (01) especial do lado externo e mais três (03) celas para a 
triagem, também situadas na parte externa, onde as mulheres que acabam de chegar 
ficam por dez (10) dias, tem uma igreja, porém funciona como depósito e no momento 
é feita o culto/missa no pátio (figura 1), onde as mulheres permanecem dentro das 
celas apenas ouvindo o padre/pastor. 
 
 
 
 
 
 
 
32 
 
 
Figura 1 - Pátio do Complexo Penal João Chaves 
 
 Figura 1 - Pátio do Complexo Penal João Chaves. Referência: (Pátio da instituição, onde 
tem o banho de sol, as visitas e missas/cultos). Fotografia da autora, reproduzida com autorização da 
diretoria da instituição. 
33 
 
 
 A instituição conta com um (01) berçário que foi inaugurado em 2011, no 
entanto não funciona e só serve para depósito. Conforme a informação da 
administração da instituição, as mulheres têm direito ao banho de sol diário por duas 
horas no pátio, no entanto conforme nas entrevistas com as mulheres que estão 
privadas de liberdade ,o banho de sol não é diária, pois como a unidade é dividida em 
duas partes: o lado A e o lado B. Apesar de não ter divisão por pavilhão, é dividida 
entre o lado A e lado B, devido ter facção e “fica mais fácil de controlar”, então acaba 
em um dia tem banho de sol do lado A e apenas no outro dia vai ter banho de sol para 
o lado B. 
A unidade possui uma (01) sala de aula (figura 2), onde tem os cursos de 
padaria e também era para ter o EJA, porém a professora não está mais indo, nessa 
sala também é realizada a prova do ENEM, possui uma (01) sala de atendimento 
médico (figura 3), embora o médico não esteja sempre, pois só vai uma vez por 
semana, tem uma (01) sala para atendimento ao/à advogado/a (figura 4), uma (01) 
sala de revista e nessa sala tem um detector de metal (figura 5), porém a revista dos 
visitantes ainda é feita de forma manual, de forma arcaica, a pessoa tem que tirar a 
roupa, ficar de cócoras e ter a chamada “revista íntima”. A administração informa que 
está para receber o um equipamento denominado body scan, onde não vai ser mais 
necessária a utilização da revista manual. 
34 
 
 
Figura 2 - Sala de Aula 
Figura 2 - Sala de Aula. Referência: (Sala de aula, onde tem oficinas de sabão, terço, artesanato e 
curso de panificação). Fotografia da autora, reproduzida com autorização da diretoria da instituição. 
 
 
35 
 
 
Figura 3 - Sala de atendimento Médico 
 
Figura 3 - Sala de atendimento Médico. Referência: (Sala de atendimento médico). Fotografia da 
autora, reproduzida com autorização da diretoria da instituição. 
 
Figura 4 - Sala de atendimento ao/à advogado/a 
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Figura 4 - Sala de atendimento ao/à advogado/a. Referência: (Sala de atendimento ao/à advogado/a, 
onde as mulheres que possui advogados/as podem falar com eles através do telefone e os 
advogados/as ficam do outro lado falando com elas, atrás do vidro). Fotografia da autora, reproduzida 
com autorização da diretoria da instituição. 
 
Figura 5 - Sala de Revistas 
37 
 
 
 
Figura 5 - Sala de Revistas.Referência: (Sala de revistas, onde os visitantes da instituição e todas as 
mulheres que chegam para cumprir a pena tem de passar por uma inspeção, para poderem 
entrar/cumprir a sentença no presídio, a revista ocorre com o detector de metais e a revista íntima). 
Fotografia da autora, reproduzida com autorização da diretoria da instituição. 
 
38 
 
 
A unidade ainda possui uma (01) biblioteca (figura 6), tem três (03) alojamentos 
para os agentes penitenciários , sendo dois (02) femininos e um (01) masculino, uma 
(01) sala de armamento, dois (02) banheiros internos sendo um no alojamento e outro 
no corredor, além de ter um outro banheiro na parte externa para os visitantes, ou 
para alguma interna que faz deveres especiais poder utilizar, uma (01) cozinha (figura 
7), onde tem algumas mulheres presas que foram escolhidas pela direção por bom 
comportamento para realizar tarefas para o corpo administrativo, como cozinhar para 
os agentes, fazer algo que eles pedirem, limpar banheiros, pegar água, limpar o pátio, 
entregar a comida . 
39 
 
 
Figura 6 - Biblioteca 
Figura 6 – Biblioteca. Referência: (Biblioteca onde pode ter até duas presas, que podem ler dentro 
delas, e onde as mulheres podem pegar livros para ler em suas celas). Fotografia da autora, 
reproduzida com autorização da diretoria da instituição. 
 
40 
 
 
Figura 7 - Cozinha 
 
Figura 7 – Cozinha. Referência:(Cozinha onde algumas mulheres presas cozinham para os agentes 
penitenciários e administração). Fotografia da autora, reproduzida com autorização da diretoria da 
instituição. 
 
41 
 
 
Referente ao componente administrativo, hoje a instituição possui trinta e cinco 
(35) agentes penitenciários, sendo trinta e dois (32) pessoas exercendo função 
propriamente ditas de agentes penitenciários, um (01) agente administrativo, um (01) 
diretor e um (01) vice-diretor. 
Embora as informações fornecidas pela administração do presídio, ela informou 
que a unidade possui apenas 70 vagas, o DEPEN já nos traz um dado diferente, ele 
informa que possui 130 vagas no Complexo Penal Dr. João Chaves, e quando vamos 
ver o total da população carcerária na unidade temos a informação que possui 1.471 
pessoas na instituição nos três tipos de regime de sentença. 
 
 
42 
 
 
4 COMPREENDENDO O MUNDO DAS MULHERES NA PRISÃO, POR UMA 
ANÁLISE DE ITINERÁRIOS DE VIDA 
 
 No decorrer do processo da pesquisa e realizações de entrevistas, pude colher 
fragmentos das histórias de vidas de algumas mulheres presas do CPJC. E através 
desses relatos é possível ter acesso às narrativas autobiográficas destas mulheres, 
bem como é a vivência no sistema carcerário. Os nomes das mulheres que estão aqui 
presentes são pseudônimos visando resguardar as mulheres que me concederam as 
entrevistas, mantendo apenas os fatos contados por elas. Todas as conversas foram 
transcritas e estão disponíveis para a leitura na íntegra em anexos. 
Tento conhecimento do Complexo Penal Dr. João Chaves a partir da 
caracterização do presidio, que pode ser definido como uma Instituição total por 
Goffman (1999), cujo a sua definição é o seu ter diversos tipos de totalidade, mas nas 
questão de presídios são os muros altos, guaritas, arames para impedir que as 
pessoas que estão presas no local saiam do local, cabe ressaltar que geralmente os 
indivíduos acabam por serem estereotipados por estarem no local. 
A prisão acaba por refletir o cenário de desigualdades sociais, discriminação e 
seletividade do sistema penal, conforme Wacquant (2003) “se as prisões do século 
XVIII e XIX foram projetadas como fábricas de disciplina, hoje são planejadas como 
fábricas de exclusão” (p. 8). Essa exclusão/seletividade acaba que acarreta a punição 
de grupos sociais mais vulneráveis e as mulheres que estão inseridas nesse contexto, 
antes mesmo da fase processual. 
Embora os métodos de punição eram voltados para os homens, as mulheres 
também eram condenadas, porém os delitos cometidos eram contra a “moral”. Os 
ditos “crimes femininos” em meados do século XVIII eram “crimes” decorrentes de 
comportamentos que não eram esperados de um papel de mulher, seja, uma questão 
moral imposta pela sociedade ou pela política religiosa. A mulher acabava por ser 
punida por não se enquadrar no ideal pensado de família, de mulher e de cristão. A 
história da sexualidade aparece de uma forma mais tempestuosa em relação de poder 
imposta pela igreja católica, uma vez que a igreja ocupava forte influência nos 
indivíduos, ditando as regras de condutas morais. 
43 
 
 
A sexualidade é marco que proporciona a sustentação do poder, ou seja, ela 
serve de meio de manutenção, de enraizamento do poder, fazendo com que 
as tentativas de se desprender sejam dificultadas pelos vínculos de 
repressão, principalmente a ideia paternalista de proteção à sexualidade 
feminina, a natureza dócil e submissa da mulher e a relação com a 
reprodução (FOUCAULT, 2003, p. 47). 
Pretendo realizar uma sucinta discussão referente à violação de direitos 
humanos que se mantém atrás dos muros do presídio feminino e os avanços da justiça 
penal voltada ao discurso de reintegração social, especificamente no Complexo Penal 
Dr. João Chaves. A situação das mulheres aprisionadas tem uma condição ideológica 
do papel feminino que é fruto da ideologia patriarcal existente em nossa sociedade, 
onde achasse em um plano institucional voltado para homens e que é falido em 
termos de reinserção social. Apesar das instalações femininas apresentarem 
similaridades, as que são destinadas a população carcerária masculina há a falta de 
manutenção na estrutura física; precariedade das condições de habitabilidade; falta 
de assistência jurídica e material; pouca oferta de atividades educacionais. 
Nesses locais de execução penal que abrigam mulheres presas, nota-se 
alguns agravantes relacionados à discriminação de gênero, a saber: a 
maioria das construções arquitetônicas é improvisada para abrigamento de 
mulheres, visto que a destinação original era abrigar homens em 
cumprimento de pena; em muitos Estados não há sequer um 
estabelecimento prisional específico para as mulheres, ficando estas em uma 
ala ou cela feminina inserida no interior de complexos prisionais masculinos; 
é ínfimo o número de espaços apropriados para a sua condição biogenética, 
de ser mãe, como, por exemplo, existência de berçário; o trabalho prisional 
se limita, na maioria dos casos, às atividades tipificadas do lar, como costura, 
limpeza, alimentação, entre outras podendo não favorecer uma atividade 
profissional que possibilite auferir renda adequada quando da saída da 
prisão. (SANTA RITA, 2006: 50) 
 
4.1 UM DIREITO NEGADO 
 
Uma questão discriminatória no campo da execução penal feminina é a 
sexualidade, pois em muitas instituições prisionais o direito sexual é visto como 
regalia, logo, não sendo permitido e quando é permitido se tem várias normas 
rigorosas, com tempo cronometrado e que não pode ser extrapolado sob penalidade 
de perde essa “regalia”, sem falar nos critérios com traços bastante excludentes. Já 
na prisão masculina o procedimento para conseguir a visita intima é mais informal e 
mais aceitável moralmente. 
44 
 
 
No fragmento da entrevista realizada com Simone, ela fala sobre como ocorrem 
as visitas: 
“A minha visita praticamente é do pessoal da cela. Principalmente dessa 
pessoa que eu faço a faxina dela, eu considero ela da minha visita, mas ela não traz 
nada para mim, só para a família dela, só visita assim, para dialogar, para conversar, 
só mesmo assim, e mesmo assim nem agora mas pode, por que a visita está sendo 
no meio do pátio, não está mais sendo nas celas.” 
“É de primeiro era na cela, tinha direito a visita íntima, aí foi tirado e segundo a 
diretora foi tirado em todos os presídios, aí mudaram os dias de visitas de 15 em 15 
dias, 15 dias de um lado e 15 dias depois o outro lado, o lado A e lado B. E da mesmaforma é o dia do ar (banho de sol) em um dia é o lado A e só no outro dia o lado B vai 
poder tirar o banho de Sol, depois do café, lá pelas 9 horas.” 
(Trechos da entrevista) 
No entanto a diretriz de política criminal, de 1999, o Conselho Nacional de 
Política Criminal - CNPCP, por meio da Resolução nº 01, de 30 de Março de 1999, 
recomendou aos departamentos penitenciários Estaduais ou congênere que fosse 
assegurado o direito da visita íntima aos presos de ambos sexos, recolhidos as 
unidades prisionais. Compreendendo que este é um direito constitucionalmente 
assegurado as pessoas que se encontram aprisionadas. 
Como vimos, apesar de ser um direito não só das mulheres, mas de todos que 
se encontram presos, a direção do CPJC informa que não é possível realizar a visita 
íntima, por uma decisão decorrente do massacre do presidio de Alcaçuz que ocorreu 
em 2017. 
No caso das mulheres presas percebe-se um protecionismo discriminatório 
quando se trata da sexualidade feminina, refletindo a expectativa social do 
devido comportamento da mulher. A mulher presa é desestimulada em sua 
vida sexual face a burocratização para o acesso à visita conjugal. A 
importância e atenção dirigida à reprodução, e por consequência à 
sexualidade e à moral feminina, são resultados de todo um processo histórico 
que tem na família, não apenas a raiz social, mas o meio naturalmente legal 
de transmissão da propriedade e dos bens (BUGLIONE, 2000, p. 3). 
Embora poucas unidades prisionais femininas permitam a visita íntima, talvez 
por uma questão de natalidade, para a evitar gravidez das mulheres, o que iria 
45 
 
 
acarretar custos e encargos adicionais ao trabalho dos servidores penitenciários além 
de medidas para adequação estrutural e administrativa, a pesar da unidade CPJC ter 
um local especifico para ter crianças com a sala denominada de berçário, porém é 
inutilizada para esse fim e sendo utilizada apenas como um deposito. No entanto, a 
mulher presa tem os direitos sexuais, reprodutivos e da garantia de acesso aos 
serviços de saúde a mulher. 
 
4.1.2 Insuficiência da Assistência à Saúde 
 
Antes de falar da falta de assistência à saúde na unidade CPJC, irei discorrer 
sobre o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário - PNSSP, irei apresentar 
sucintamente como foi o surgimento e suas características de suas diretrizes. 
Instituído pela Portaria Interministerial nº 1777, de 09 de Setembro de 2013, o 
Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário - PNSSP, foi resultado de 
consideráveis estratégias de mobilização e participação social de várias categorias 
voltada para a consolidação de uma política de saúde específica para pessoas que 
estão em situação de privação de sua liberdade, em que o propósito dessa política é 
voltado para à garantia do acesso das pessoas aprisionadas a ações e serviços de 
saúde, como sendo uma forma de inclusão desses indivíduos na política universal do 
Sistema Único de Saúde - SUS. 
Elaborado de acordo com as diretrizes do SUS que são a universalização do 
acesso, a integralidade da atenção, e equidade, a descentralização administrativa e 
financeira, a hierarquização e regionalização das ações e de sua participação social 
através do controle social. O Programa de Atenção Básica estabelece ações e 
serviços de atenção básica em saúde que seriam realizados nas unidades prisionais 
por meio de uma equipe interdisciplinares de saúde. Os demais níveis de atenção à 
saúde (alta e média complexidade) ficaria estipulado na esfera de cada unidade por 
meio das referências a atenção especializada ambulatorial e hospitalar. 
No PNSSP é voltado apenas para as pessoas aprisionadas em presídios, 
penitenciárias, colônias agrícolas e hospitais de custódia e tratamento, excluíndo os 
46 
 
 
presos e presas em regime provisório e inseridos no regime aberto. Suas principais 
funções da Atenção Básica são: o controle de tuberculose; o controle de hipertensão 
e diabetes; a dermatologia sanitária – hanseníase; a saúde bucal; a saúde da mulher. 
Para realizar essas ações as unidades passam em sua maioria por reformas, 
instrumentalização das unidades e contratação de uma equipe técnica composta por: 
profissionais de medicina, enfermagem, odontologia, psicólogo/a, assistente social, 
auxiliar de enfermagem e auxiliar de consultório dentário. 
Para garantir que o PNSSP chegasse a população carcerária, foi criado o 
incentivo para Atenção à Saúde no Sistema Penitenciário, que será compartilhado 
entre os gestores da saúde e justiça das esferas do governo, onde o Ministério da 
Saúde fica responsável por financiar o equivalente a 70% dos recursos e os demais 
30% é de responsabilidade do Ministério da Justiça. 
O incentivo é repassado conforme os Estados, de acordo com o número de 
equipe implantada na unidade, correspondendo da seguinte forma: em unidades que 
possuem mais de 100 pessoas presas, deverá ter uma equipe para cada grupo de até 
500 pessoas com uma carga horária de 20 horas semanais; e em unidades prisionais 
com até 100 pessoas presas a equipe deverá ter uma carga mínima de 4 horas 
semanais. 
Apesar do PNSSP estabelecer diretrizes para garantir o direito a saúde, quando 
trazemos para a realidade do CPJC, constatamos que a unidade está fora dessa 
teoria, uma vez que a única equipe técnica voltada para a área da saúde possui 
apenas um médico que vai uma vez por semana, e que no período em que foi 
realizado as entrevistas o mesmo estava de férias, no caso não foi encaminhado 
substituto, a equipe também é composta por um dentista que vai em uma van para 
realizar apenas 4 atendimentos uma vez por semana. 
Conforme o fragmento da conversa realizado com a Amélia podemos ver como 
é difícil ter o direito à saúde, já que quando questionado sobre a assistência médica 
ela respondeu: 
47 
 
 
Amélia – “Mulher é difícil aqui, firmar um médico é muito difícil não tem 
assistente social, eu acho que até porque não é todo mundo que quer vir trabalhar 
nesse lugar.” 
E quando questionada sobre os atendimentos/exames voltados para aos 
cuidados do corpo feminino a Amélia diz: 
 “Tem de vez em quando aparece, justamente por que nós não temos 
assistente social entendeu, a assistente social trabalharia em várias áreas para nós 
aqui dentro, como não tem então as vezes aqui aparece uma vez ou outra. Nós 
fizemos agora esse ano. ” 
“A última vez que teve aqui foi 2016 e 2017, a última vez que fiz foi em outubro 
2015 quando estava no presídio de Caicó, de lá para eu vim fazer agora, pois quando 
veio eu estava menstruada. ” 
(Trechos da entrevista) 
Além de conversas informais que tive com algumas internas, onde elas 
confirmaram que a última vez que teve o exame do preventivo foi em 2017, quando 
uma estagiária fez uma ação e trouxeram os exames, foi quando descobriu que tinha 
4 mulheres com sífilis onde elas fizeram o tratamento. Também informaram a 
dificuldade com a marcação de consulta, pois tem apenas um médico que estava de 
férias, mas quando ele vem a preferência é das grávidas, e ele atende apenas 6 
pessoas por dia. 
Conforme o PNSSP referente a Saúde da Mulher teriam os resultados 
esperados e metas nos seguintes indicadores de implantação em 100% das unidade 
penitenciárias: ações para detecção precoce do câncer cérvico-uterino e de mama; 
ações para diagnóstico e tratamento das DST/AIDS; ações de assistência à 
anticoncepção; ações de assistência ao pré-natal de baixo e alto risco no primeiro ano 
do Plano; ações de imunização das gestantes; ações de assistência ao puerpério; 
ações educativas sobre pré-natal, parto, puerpério, anticoncepção, controle de câncer 
cérvico-uterino e de mama e doenças sexualmente transmissíveis; ações que visam 
a garantia ao encaminhamento para tratamento das mulheres atendidas com câncer 
48 
 
 
cérvico-uterino e de mama e garantia do acesso das gestantes para atendimento de 
intercorrências e parto. 
Sabemosque o aprisionamento em massa agrava a possibilidade de 
disseminação de várias doenças físicas e mentais, devido ao ambiente ser propulsor 
de comportamentos de risco frente às DSTS, a baixa autoestima e da prática de sexo 
sem preservativo etc. 
Na entrevista realizada com a Ângela, onde podemos ver a sua indagação 
conforme o fragmento da entrevista, referente a falta de assistência médica e a falta 
de autoestima e problemas psicológicos: 
“Aqui não tem nada disso não aqui mulher têm é baixa estima e não autoestima. 
a comida é horrível e eu ainda tenho bronquite de vez em quando eu tenho crise.” 
“Fazem nebulização, elas ligam para minha tia. aí minha tia vem na carreira ou 
então eu vou para o hospital quase morrendo, mas eu vou, pois é crônica não tem 
cura. [...]” 
“Preciso de um psiquiatra!” 
A unidade não possui um profissional voltado para a área da psiquiatria, o 
atendimento fica por conta do médico da unidade, porém conforme Ângela diz: 
 “Tem um médico aí que faz a receita, mas as vezes ele nem vem, aí a pessoa 
fica sem o remédio certo que a pessoa precisa para tomar o antidepressivo que 
é a família que compra o remédio aí eu mando a minha tia comprar mas as 
vezes, a receita vence ai as vezes ele vem não vem, vem não vem... só que a 
gente precisa de alguém para conversar né, porque se…. tem que ter alguém 
para conversar com pessoa. A pessoa aqui a mais 14 anos numa cadeia. 
tirando, tem que ter alguém para conversar. Porque senão a pessoa pira, e 
aqui já tem duas piradas, eu estou vendo a hora ficar mais uma, aí vai ficar três 
piradas. [...]” 
"[...] Tudo é procedimento, tudo aqui é grito. Eu já tenho depressão, já tentei 
me matar, pois é 14 anos, não é 14 dias, só passei 10 dias na rua. Eu não 
49 
 
 
tenho um advogado, não tem ninguém que me ajude. E ainda tem as facções 
que querem mandar na gente.” 
(Trechos da entrevista) 
E conforme a Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal 
Brasileira - LEP (art. 11), o Estado tem a responsabilidade de prestar diversas formas 
de assistências: social, saúde, jurídica, educacional, material, religiosa ao indivíduo 
que se encontra aprisionado, sob a tutela do governo não consegue desempenhar os 
direitos da pessoa humana. Então, a direção da unidade não pode confundir a 
privação da liberdade com a exclusão de outros direitos e garantias do ser humano. 
E conforme a fala de Ângela podemos verificar que boa parte de seus direitos não 
estão sendo possíveis ter. 
 
4.1.3 Ausência de Assistência 
 
Apesar do Brasil ser signatário do documento onde estabelece as Regras 
Mínimas para Tratamento do Preso, que foi elaborado pela Organização das Nações 
Unidas - Regras Mínimas para Tratamento do Preso, em 1955, que por sinal é 
considerado o documento internacional com maior relevância já produzido na área 
penitenciária, que prevê o tratamento do apenado a uma pena de privação de sua 
liberdade que deve ter por objeto a ascensão do seu desenvolvimento, do respeito 
próprio e do sentido de responsabilidade. 
A constituição Brasileira de 1988, traz diversos incisos sobre a regulamentação 
da execução penal, que tange aos direitos humanos da pessoa aprisionada, como por 
exemplo que é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral. 
No entanto é possível ver que em todas as entrevistas que realizei, o 
descumprimento é notório, uma vez que quando o preso chega na unidade não 
recebem nada do Estado a não ser alimentação. Roupa, produtos de higiene são as 
famílias que tem que levar para as mulheres no dia de visita. No entanto, nem todas 
50 
 
 
têm contato com família, tem muitas mulheres que não recebem visitas, por tanto não 
recebem nada. 
Vamos ver alguns fragmentos de entrevistas realizadas com as mulheres: 
Simone - eu vivo é de doação, do que uma ou outra dar, ou do que a igreja der, 
às vezes a igreja manda absorventes, pasta de dentes, escova manda pra gente, as 
vezes mandar sabonete, a pasta de dente ajuda demais, agora eles dão prioridade 
para quem não recebe visita, pois antes dava para todo mundo, mas agora eles estão 
escolhendo quem não tem visita. Eu também faço faxina para uma menina lá da cela, 
ela me paga por semana R$ 20,00 aí quando chega aquele mês todinho eu mando 
depositar, para mim não, é para minhas duas filhas que moram com o pai. Porque 
para mim eles não vem deixar nada, mesmo se o dinheiro caia na conta eles não vem. 
O meu esposo não vem pois está tomando de conta de um irmão dele é que é 
deficiente e toma conta das duas meninas e ele também não tem como vir porque 
também deve a justiça. No tempo em que eu fui presa ele também foi, ele está agora 
no semiaberto. 
(Trechos da entrevista) 
Valentina - No início eu fazia muita faxina para as pessoas, aí as pessoas me 
davam os materiais em troca das faxinas (Valentina começa a chora), depois 
apareceram os projetos eu comecei com o dos terços e eu comecei a comprar meu 
próprio material de higiene, ai agora tem o projeto da ONG do sabão, onde eu continuo 
a comprar os meus matérias com esse dinheiro e fardamento também. Desculpa por 
está chorando. 
(Trechos da entrevista) 
Komako - As minhas colegas de cela doam, até as roupas, pois todo mês 
entram para elas aí ao invés delas retirarem elas nos dão, porque sempre que entra 
uma peça de roupa a outra tem que sair, aí ela doam para que não recebe visita. 
Autora - Você pode ficar com quantos pares de roupa? 
Komako - Com duas. 
51 
 
 
Autora - Aí você usa um dia e tem que lavar no outro? 
Komako - Isso, veste uma e já lava a outra. 
Autora - Você mesma que lava? 
Komako - Sim, você lava na cela e estende na cela, você põe para enxugar no 
ventilador. 
Autora - No caso você lava, aí tem que esperar o da outra secar para poder 
lavar? 
Komako - Sim, no caso da minha cela, moram 11 comigo, então cada uma tem 
o seu dia de faxina, aí que tem que fazer a faxina aí tem o direito de lavar toda a minha 
roupa, inclusive lençol, minha toalha, farda e estendo e no outro dia já é o dia de outra, 
mas por exemplo a noite você já pode lavar uma calcinha, ai todo mundo pode lavar 
a calcinha e estender no varal que a gente fez em cima da pedra de cimento e 
enxugar, mas de manhã bem cedinho tem que recolher tudo porque elas (as agentes) 
não querem entendeu? 
(Trechos da entrevista) 
A unidade prisional que serviria em sua teoria para ser regida por normas legais 
que garantem um tratamento humanitário aos apenados, na prática pude observar o 
oposto, que não se tem ações para o efetivo cumprimento desse objetivo. Conforme 
Foucault coloca: 
O sistema carcerário junta numa mesma figura discursos e arquitetos, 
regulamentos coercitivos e proposições científicas, efeitos sociais reais e 
utopias invencíveis, programas para corrigir a delinquência e mecanismos 
que solidificam a delinquência (FOUCAULT, 1987, p. 40). 
 
Na fala de Komako, ela comenta que se encontra sem documento, pois todos 
os documentos estavam com o seu companheiro, porém ele morreu e ela não tem 
mais a documentação: 
Komako - É tanto que os meus documentos estavam com ele e como eu não 
tenho contato com a família dele, então eu perdi. Fiquei sem nenhum documento, sem 
52 
 
 
documento nenhum, até sem registro. Sem nada, tem projeto aqui que precisa de 
CPF e eu não tenho aí não participo. 
Autora - Em nenhum de seus processos tem o CPF? 
Komako - Não sei, elas não dizem. Não tem como tirar, a não ser quando é 
assim uma pesquisa. Porque quando a gente leva grito. Eu sei que todos os projetos 
que têm eu não posso de nenhum, o único que eu posso é a escola, mas acabou a 
escola, para virar a padaria. Tai o quadro atrás de você, mas acabou a escola. 
Komako - [...]nenhum curso eu posso fazer aqui, porque todos que tem aqui 
precisa de documento. Até tinha, mas como o meu marido morreu e estava tudo com 
ele, ele morreu, como eu vou atrás se eu estou presa. Você pode me ajudar?

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