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Unidade 1 - Responsabilidade Social e Ambiental

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DO HOLOCENO AO ANTROPOCENO
O Holoceno é o período geológico que começou há 11.700 anos e se caracterizou pela estabilidade do clima. Esse fato permitiu gradualmente a evolução das atividades humanas por meio do cultivo de plantas, isto é, pelo desenvolvimento da agricultura e pela domesticação de animais. Soma-se a isso as migrações humanas, a constituição de sociedades complexas e a criação dos aglomerados urbanos, como vilarejos, vilas e cidades (VEIGA, 2019; COSTA, 2022). O Holoceno se constituiu no período de desenvolvimento do homem e de seus atributos na Terra.
Para um número significativo de cientistas, esse período se esgotou e estamos vivendo o início de um novo período geológico: o Antropoceno. A palavra “Antropoceno” foi cunhada pelo biólogo Eugene F. Stoermer, em 1980, e significa antropo (homem) + ceno (novo) (VEIGA, 2019). Já a hipótese de um novo tempo geológico foi levantada originalmente pelo cientista Paul Crutzen, ganhador do Prêmio Nobel de Química, em 1995, e Eugene F. Stoermer, durante uma reunião do Programa Internacional de Geosfera-Biosfera (IGBP) em Cuernavaca, México, no mês de fevereiro do ano de 2000. Para eles, o uso do termo Antropoceno é o mais adequado para “[...] enfatizar o papel central da humanidade na geologia e na ecologia” (CRUTZEN; STOERMER, 2000, p. 17).
O que identifica o Antropoceno são as profundas transformações das atividades humanas sobre os processos de regulação biofísicos do planeta, isto é, o homem passou a ser uma força geológica capaz de modificar as condições estruturantes do sistema terrestre. Portanto, Antropoceno significa a época da dominação humana sobre o planeta (ALVES, 2020).
Não há consenso sobre o início do Antropoceno, mas os especialistas escolheram uma data simbólica como marco temporal: o ano de 1784, data do aperfeiçoamento da máquina a vapor por James Watt. Esse é o período que marca o uso intensivo de combustíveis fósseis, no caso, o carvão, e o início da Revolução Industrial e do sistema de produção capitalista. Desse período em diante, que podemos chamar de modernidade, temos um conjunto de elementos decisivos para definir a intervenção das forças humanas sobre o planeta. 
Um exemplo imediato é a questão demográfica: em 1800, a população mundial era de 1 bilhão de pessoas; hoje, somos 7,5 bilhões, e as estimativas falam em 10 bilhões no ano de 2050. Esse aumento populacional esteve ligado à urbanização, que se intensificou nos últimos 200 anos, ou seja, o mundo se tornou urbano, com mais de 50% da população mundial vivendo em cidades. No Brasil, por exemplo, esses índices são superiores a 80% da população (IPEA, 2006). Esses processos foram lastreados pelo uso intensivo de combustíveis fósseis – carvão, petróleo e gás – e pela definição de uma sociedade de consumo nos países centrais. Com esse cenário, temos os fatores de pressão para a extração de recursos naturais, como a ascensão de uma agricultura industrial, o desmatamento de florestas tropicais e a perda de biodiversidade. Da mesma forma, entre os problemas ocasionados, estão a poluição em todos os sistemas planetários – ar, oceanos, solo etc. – e a configuração de sociedades com desigualdades socioeconômicas em nível global. Outros dados e variáveis poderiam ser agregados, mas os enumerados demonstram os impactos das atividades humanas sobre os processos de sustentação dos alicerces planetários.
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Figura 1 | Crescimento da economia da população e da renda per capita mundial: 1768-2018 - Fonte: Angus Maddison, Historical Statistics of the World Economy e FMI apud A dinâmica... (2019, [s. p.]).
A expressão Antropoceno é objeto de questionamentos. O geógrafo norte-americano Jason Moore prefere o vocábulo Capitoloceno, porque, segundo ele, não é possível atribuir à espécie humana a condição de força geológica, mas, sim, ao sistema capitalista que, por seu caráter expansionista, é o causador da mudança de era geológica (MOORE, 2016). Outros usam o termo Ocidentaloceno, porque a responsabilidade pelos desdobramentos atuais é dos países ricos do norte global, e esses não podem ser atribuídos às nações mais pobres (UNESCO, 2018; COSTA, 2022); ou ainda Tecnoceno, porque as mudanças em curso e suas consequências foram a partir do desenvolvimento tecnológico e tem o poder de alcançar todas as condições de vida para as gerações futuras (COSTA, 2021).
Apesar dos questionamentos, a expressão Antropoceno se popularizou e tornou-se não só a designação de um novo tempo geológico mas também uma metáfora dos novos tempos em curso. Em uma ou em outra perspectiva, o Antropoceno traz a discussão sobre os limites de um planeta finito, tanto de espaço quanto de recursos naturais. Além disso, se sistemas econômicos e sociais continuarem na mesma sistemática, passaremos de um cenário de crise para uma provável e desafiadora emergência ecológica, afetando a vida como um todo
A GRANDE ACELERAÇÃO
Da Revolução Industrial até o final da primeira metade do século XX, temos o primeiro estágio do Antropoceno, que é definido como era industrial. A partir de 1950, no século passado, temos um novo e perigoso estágio com a intensificação dos efeitos antropogênicos sobre o Sistema Terra, que os cientistas têm denominado como a “Grande Aceleração”. 
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, uma época de significativa expansão das atividades econômicas em uma sociedade de consumo e baseada em combustíveis fósseis foi responsável por recordes sucessivos na emissão de gases antropogênicos. Para exemplificar, nos últimos 50 anos, a economia mundial multiplicou por quase quatro vezes, enquanto o comércio global aumentou em dez vezes (IPBES, 2019). Para contemplar as demandas desse crescimento econômico, nós, seres humanos, passamos a exercer uma pressão excessiva sobre os ciclos de regulação do planeta com o aumento da poluição, desmatamentos, perda de biodiversidade, acidificação de oceanos, entre outros fatores.
Alguns estudos científicos nos ajudam a compreender os desafios impostos pela Grande Aceleração das últimas décadas. O relatório A Avaliação Global da Natureza, lançado em 2019 pela Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, na sigla em inglês), é a mais extensa análise sobre a perda da biodiversidade no planeta e afirma que “[...] o ritmo das mudanças globais na natureza nos últimos 50 (cinquenta) anos não tem precedentes na história da humanidade” (IPBES, 2019, p. 12). Elencamos outros dados sensíveis desse documento (IPBES, 2019):
75% da superfície da Terra sofreu alterações consideráveis e já se perdeu mais de 85% de áreas de zonas úmidas.
66% da superfície dos oceanos estão experimentando efeitos crescentes de deterioração.
Em média, cerca de 25% das espécies em grupos de animais e plantas estão ameaçados, o que sugere que cerca de um milhão de espécies já estão em perigo de extinção, muitas em apenas algumas décadas.
Em 2016, 559 das 6.190 raças de mamíferos domesticados usados ​​para alimentação e agricultura (mais de 9%) foram extintas e pelo menos 1.000 outras foram ameaçadas de extinção.
O relatório Planeta Vivo, do ano de 2020, elaborado pela entidade WWF, traz os mesmos dados sobre a perda da biodiversidade. Os fatores responsáveis por essa perda são: o uso da terra, com a conversão de áreas intocadas em setores agrícolas, e, no caso dos oceanos, o aumento excessivo da pesca. O ponto fundamental do relatório é que “a perda de biodiversidade não é apenas um problema ambiental. Ela também afeta o desenvolvimento, a economia, a segurança global, a ética e a moral” (WWF, 2020). Recentemente, um novo relatório do IPBES (2022) alertou que cerca de um milhão de espécies da fauna e da flora estão ameaçadas de extinção.
Esse conjunto de dados traz uma constatação fundamental: a necessidade de estabelecer limites planetários, em uma perspectiva que permita conjugar as atividades socioeconômicas de nossas sociedades com a capacidade de suporte do planeta. Para tanto, será necessário compreender quais são os limites planetários.Um importante estudo liderado pela equipe do cientista sueco Johan Rockström, do Centro de Resiliência de Estocolmo, caracterizou os nove processos que regulam a estabilidade e a resiliência do planeta, estabelecendo os limites para o que é denominado “espaço operacional seguro para a humanidade”, isto é, em que é possível a manutenção das atividades sem colocar em risco a vida terrestre (VEIGA, 2019; COSTA, 2022).
Os nove processos que precisam ser regulados para a garantia da estabilidade planetária são (VEIGA, 2019; COSTA, 2022):
Mudanças climáticas.
Perda da integridade da biosfera (perda da biodiversidade).
Dispersão de químicos e novas substâncias. 
Acidificação do oceano.
Uso da água doce.
Mudanças do uso da terra.
Fluxos biogeoquímicos (alterações nos ciclos do nitrogênio e do fósforo).
Carga de aerossóis de origem antropogênica presentes na atmosfera.
Introdução de novas entidades (microplásticos, poluentes orgânicos, nanomateriais etc.).
Esses processos que estabelecem os limites planetários podem ser sintetizados na figura a seguir.
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Figura 2 | Os nove limites planetários - Fonte: Pais (2021, [s. p.]).
Na figura, podemos visualizar que a parte em verde são as chamadas zonas seguras, em que temos o “espaço operacional seguro”; em laranja, as “zonas de risco crescente”, com alto potencial de efeitos prejudiciais; em vermelho, as “zonas de risco alto”, em que os limites foram ultrapassados e estamos sujeitos às consequências imprevisíveis. Percebemos que a humanidade já ultrapassou quatro dos limites estabelecidos: mudanças climáticas, integridade da biosfera (perda de biodiversidade), fluxos bioquímicos de nitrogênio e fósforo e, mais recentemente, as mudanças no uso da terra (solo). Esses são desafios que estão postos no tabuleiro global, a demandar a atuação de todas as instituições internacionais e nacionais.
Nota-se, assim, que a observância dos limites planetários é uma das exigências para que as crises provocadas pela Grande Aceleração não conduzam o Sistema Terra a uma situação de irreversibilidade.
A ERA DA RESPONSABILIDADE
Para o enfrentamento das questões que se apresentam no Antropoceno, será imprescindível repensar os meios de produção e os padrões de consumo em sociedade, que afetam decisivamente os processos ambientais e, por consequência, as dinâmicas de regulação do Sistema Terra. Se, em sentido amplo, é essencial uma conjugação de políticas e estratégias por diversos atores globais – instituições governamentais, setores empresariais e organismos multilaterais –, na escala da proximidade (quotidiano) é preciso destacar o exercício de uma ética da responsabilidade, por meio da conscientização ecológica para a compreensão da finitude dos recursos naturais e o repensar das relações de consumo. Não há dúvidas que dispomos de tecnologias cada vez mais avançadas e que podem ser muito importantes no contexto das crises. No entanto, as tecnologias, sem a mudança de consciência pública e individual e sem a percepção do próprio ser humano de que ele e a natureza constituem um todo, podem não ser suficientes para lidar com a questão demográfica e o aumento da poluição (ODUM, 2001).
Um dos intentos que contribui no processo de tomada de consciência é um indicador criado que nos permite conhecer os impactos das nossas atividades sobre o planeta. Trata-se do conceito de “pegada ecológica” – elaborado pela entidade Global Footprint Network –, que é uma unidade métrica que estabelece uma equação entre a demanda de recursos utilizados por pessoas, empresas e governos e a capacidade de regeneração biológica do planeta. A pegada ecológica mede o quanto de área de terra e água são requeridos para o consumo e para a absorção dos resíduos sólidos gerados (WWF, 2020). A pegada ecológica é representada em hectares – unidade que é equivalente a 10.000 metros quadrados – e, no caso de pessoas, mensura-se quantos hectares são demandados para configurar a pegada ecológica individual. 
Para ficar mais claro, a pegada ecológica de uma pessoa que vive no Brasil é de 2,6 hectares, o que significa que essa é a área necessária para atender ao consumo de cada brasileiro (GLOBAL FOOTPRINT NETWORK, 2022). No caso de um cidadão dos Estados Unidos, a pegada ecológica é de 8,1 hectares; de um alemão, é de 4,7 hectares; de um inglês, de 4,2 hectares; de um chinês, de 3,6 hectares; e assim as pegadas são calculadas para os habitantes de mais de 200 países. A título de curiosidade, as maiores pegadas ecológicas são do Catar (14,3 hectares) e de Luxemburgo (13 hectares) (GLOBAL FOOTPRINT NETWORK, 2022). Já as menores pegadas ecológicas estão em nações, como o Iêmen (0,5 hectares), Timor-Leste (0,6 hectares) e Haiti (0,6 hectares) (GLOBAL FOOTPRINT NETWORK, 2022).
Muitos países estão em situação de déficit ecológico, isto é, usam mais recursos naturais – pegada ecológica – que seus ecossistemas podem regenerar – biocapacidade –, como é o caso dos Estados Unidos, da China, da Índia, de Israel, do Japão e da União Europeia. Com o aumento desse déficit em nível global, temos o que é chamado de “capacidade de carga” do planeta, que é a sobrecarga no consumo de seus recursos. Desde a década de 1970, a capacidade de carga do planeta tem sido ultrapassada com sérios riscos para a dinâmica ambiental. Uma das representações usadas para demonstrar o limite da capacidade de carga do planeta é determinar o dia em que ele ocorre em cada ano. No ano de 2022, ela foi atingida no dia 28 de julho (WWF, 2022), a partir de então estamos em déficit. Em uma analogia, entramos no “vermelho”, consumindo mais do que o planeta pode suportar. Por esse parâmetro, para atender aos níveis de utilização dos recursos ambientais atuais, é demandado o equivalente a 1,75 planeta (WWF, 2022). Essa capacidade de carga pode ser medida em termos de países, já que cada um deles possui a sua pegada nacional. No caso do Brasil, a capacidade de carga foi atingida em 12 de agosto de 2022 (WWF, 2022). Isso se dá, em boa medida, pelo aumento do desmatamento na Floresta Amazônica e das queimadas nesse e em outros biomas brasileiros, como o Cerrado e o Pantanal.
De tudo que foi estudado, faz-se necessário compreender que a era do Antropoceno é uma realidade e que devemos estar preparados para o enfrentamento de seus efeitos em nossas atividades econômicas e cotidianas. Ainda que a atuação no nível individual ou de pequenos grupos seja restrita, isso não é um obstáculo para que possamos compreender o imperativo do exercício da ética da reponsabilidade em todos os campos da atividade humana, tanto profissional quanto cidadã, porque não há dissociação entre eles. Afinal, o que está em risco é a construção da sociedade e dos predicados da vida. Esse é o desafio do nosso tempo.
AULA 2 - MUDANÇAS CLIMÁTICAS 
MUDANÇA NO CLIMA, GASES DE EFEITO ESTUFA E AQUECIMENTO GLOBAL
A mudança do clima é o maior desafio do mundo contemporâneo. Nenhuma política ou perspectiva de desenvolvimento social e econômico prescinde dessa temática, e sua compreensão é fundamental para o futuro de nossas sociedades.
Há um conjunto de conceitos ligados às questões climáticas, como mudança do clima, aquecimento global, gases de efeito estufa e outros. Conhecê-los permitirá o entendimento do contexto e dos desafios que as alterações climáticas impõem nos sistemas naturais e humanos.
Considera-se mudança do clima as transformações nos padrões de temperatura e clima ao longo do tempo. Embora possa ser de origem natural, o fator decisivo para a mudança do clima é atribuído, direta ou indiretamente, às atividades humanas, já que elas induzem a alteração de composição da atmosfera. O principal elemento humano que desencadeou a mudança do clima é o uso dos combustíveis fósseis – petróleo, carvão, gás – desde o início da modernidade, com o advento da Revolução Industrial. Nesse contexto, temos a emissão dos gases de efeito estufa (GEE), que são aqueles “[...] constituintes gasosos, naturais ou antrópicos, que, na atmosfera, absorvem e reemitem radiação infravermelha”(BRASIL, 2009, [s. p.]). São exemplos desses GEE o dióxido de carbono, o metano e o óxido nitroso, que são utilizados ou resultantes de atividades da indústria, transporte, agricultura, pecuária etc. Além disso, o desmatamento de florestas tropicais, a substituição no uso do solo e outras atividades contribuem para a emissão desses gases. Os principais emissores de dióxido de carbono são: a China, os Estados Unidos e a União Europeia.
A emissão de gases de efeito estufa é diretamente responsável pelo aumento da temperatura planetária. Desde 1880, quando se iniciaram as medições globais, até o ano de 2020, a temperatura da Terra aumentou mais de 1,2 °C acima do nível pré-industrial (1850-1900), e a última década foi a mais quente da história (OMM, 2022). Temos, aqui, o que é chamado de aquecimento global. Esse aumento da temperatura global afeta diretamente os sistemas de sustentação da vida no planeta, que são interconectados às mais variadas atividades humanas.
Nesse sentido, há estudos sobre os impactos do aquecimento global sobre o Ártico, a Antártica e o permafrost (material orgânico congelado); com o derretimento das geleiras e calotas polares, há o aumento no nível do mar (IPBES, 2019). Ademais, nota-se o aumento dos extremos climáticos e meteorológicos, com oscilações significativas de calor e frio em todo o planeta. Chuvas, enchentes, tempestades, ciclones e secas são cada vez mais comuns e intensos, prejudicando as atividades agropecuárias, em especial, a segurança alimentar das populações mundiais. Os ecossistemas, por sua vez, são afetados pelo aquecimento global com a perda da biodiversidade, com ameaças e a extinção de componentes da flora e da fauna. Nos oceanos, os recifes de corais são atingidos com a acidificação.
Todos os elementos delineados possuem impacto imediato para os seres humanos com efeitos na saúde, na disseminação de vetores de transmissão de doenças, e, em última análise, na própria existência da vida como conhecemos. Para exemplificar, a pandemia da Covid-19 e outras questões epidemiológicas estão associadas às consequências da perda da biodiversidade causada pelos desmatamentos e pelas queimadas das florestas tropicais em todo o mundo.
Por esse conjunto, nota-se que será necessário um compromisso global para enfrentar os efeitos negativos da mudança do clima.
O REGIME JURÍDICO CLIMÁTICO
Há um conjunto de negociações e proposições em nível global – envolvendo países, entidades internacionais, cientistas e sociedade civil – para o enfrentamento da mudança do clima. A Organização das Nações Unidas (ONU) tem um papel central nesse processo. Ela é uma das responsáveis pela criação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês) em 1988. Formado por cientistas de todo o mundo, o IPCC é a principal autoridade mundial sobre o aquecimento global e produz periodicamente relatórios científicos sobre a mudança do clima, com a formulação de estratégicas de enfrentamento e respostas aos impactos. Até o ano de 2022, o IPCC tinha produzido seis relatórios de avaliação e estratégias de enfrentamento à mudança do clima.
No que se refere à arquitetura normativa internacional, o principal documento sobre a mudança climática é a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, sigla em inglês), adotada em Nova Iorque em 9 de maio de 1992 e aberta para assinatura em junho de 1992, durante a Rio-92, com entrada em vigor em 21 de março de 1994. 
A Convenção-Quadro tem como principal objetivo a “[...] estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático” (BRASIL, 1998, [s. p.]). Ela pretende evitar os chamados efeitos negativos da mudança do clima, que são:
[...] as mudanças no meio ambiente físico ou biota resultantes da mudança do clima que tenham efeitos deletérios significativos sobre a composição, resiliência ou produtividade de ecossistemas naturais e administrados, sobre o funcionamento de sistemas socioeconômicos ou sobre a saúde e o bem-estar humanos. (BRASIL, 1998, [s. p.])
Portanto, a Convenção-Quadro tem como foco o compromisso dos países no processo de estabilização da emissão de gases de efeito estufa, no sistema climático, decorrentes de atividades antrópicas, para que não se potencializem os efeitos do aquecimento global (BRASIL, 1998).
Com a adoção da Convenção-Quadro e como forma de manter a discussão sobre o clima, as partes (países) se reúnem periodicamente para discutir as questões climáticas. Essas reuniões são chamadas de COP (Conferência das Partes), órgão supremo da Convenção-Quadro. A primeira COP ocorreu no ano de 1995, em Berlim, na Alemanha (MELO, 2017).
Uma das principais deliberações desse órgão ocorreu durante a COP 3, em 1997, com a aprovação do Protocolo de Kyoto, como componente da Convenção-Quadro, que estabeleceu metas de redução de emissões para os países desenvolvidos. Após oito anos de negociações, o Protocolo entrou em vigor em 16 de fevereiro de 2005, com a ratificação por, no mínimo, 55% do total de países-membros da Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima. Esses deveriam ser responsáveis por, pelo menos, 55% do total das emissões de gases de efeito estufa, tendo como referência o ano de 1990 (MELO, 2017). Mesmo com o Protocolo de Kyoto, as emissões de gases de efeito estufa não cessaram, ao contrário, registraram sensível aumento, e um dos fatores foi a crise econômica de 2008. 
Para substituir o Protocolo de Kyoto, durante a 21ª Conferência das Partes (COP 21), realizada em Paris, na França, no mês de dezembro de 2015, celebrou-se um novo acordo para enfrentar as ameaças da mudança climática, denominado Acordo de Paris. Esse contou com a assinatura dos representantes de 196 países da Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima.
O Acordo de Paris visa reforçar a resposta mundial à ameaça da mudança climática no contexto do desenvolvimento sustentável e erradicar a pobreza. São três os objetivos do Acordo de Paris (BRASIL, 2017):
Manter o aumento da temperatura média global bem abaixo dos 2 °C acima dos níveis pré-industriais e buscar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais, reconhecendo que isso reduziria significativamente os riscos e impactos das mudanças climáticas.
Aumentar a capacidade de adaptação aos impactos adversos das mudanças climáticas e fomentar a resiliência ao clima e o desenvolvimento de baixas emissões de gases de efeito estufa, de uma forma que não ameace a produção de alimentos.
Promover fluxos financeiros consistentes com um caminho de baixas emissões de gases de efeito estufa e de desenvolvimento resiliente ao clima.
O Acordo de Paris procura respeitar os diferentes estágios de desenvolvimento de cada país e, para tanto, “[...] será implementado para refletir a igualdade e o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, e respectivas capacidades, à luz das diferentes circunstâncias nacionais” (BRASIL, 2017, [s. p.]).
Em 22 de abril de 2016, o Acordo de Paris foi aberto para o período oficial de assinaturas na Sede das Nações Unidas em Nova Iorque, com extensão até 21 de abril de 2017. Contudo, menos de um ano antes de sua celebração na COP 21, já contava com a assinatura de quase 100 países e, em especial, dos Estados Unidos e da China – dois dos maiores emissores de gases de efeito estufa. Esses dois países ratificaram o Acordo em setembro de 2016, assim, no dia 4 de novembro de 2016, o Acordo de Paris entrou em vigor oficialmente (MELO, 2017).
O Brasil, por sua vez, aprovou o texto do Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, em agosto de 2016, por meio do Decreto Legislativo nº 140/2016, com ratificação pelo Presidente da República em 12 de setembro de 2016 (MELO, 2017).
Após a entrada em vigor, realizou-se em Marrakesh, Marrocos, no mês de novembro de 2016, a 22ª Conferência das Partes (COP 22), em que as discussões se centraram no estabelecimento de um planopara implementar e monitorar o Acordo de Paris até dezembro de 2018. A 24ª Conferência das Partes (COP 24), ocorrida em Katowice, Polônia, em dezembro de 2018, adotou um manual de instruções (livro de regras) para os países implementarem os seus esforços nacionais no Acordo de Paris, chamado de “Contribuição Nacionalmente Determinada” (NDC), que é a contribuição voluntária de cada país para a redução de suas emissões de gases de efeito estufa.
LIDANDO COM AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Para o enfrentamento do cenário da mudança do clima, faz-se necessário um conjunto de compromissos e obrigações por todos os atores do tabuleiro global, governos, setor empresarial e sociedade civil. 
De imediato, é preciso reconhecer que vivemos em um cenário de vulnerabilidades, conceito que está associado ao grau de suscetibilidade de uma sociedade, de acordo com suas capacidades para enfrentar os efeitos adversos da mudança do clima (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). Isso significa que todos seremos impactados pela mudança do clima. Reconhecer as vulnerabilidades é identificar os possíveis impactos negativos da mudança do clima sobre as atividades econômicas, a segurança alimentar e a vida das pessoas em um país ou região. Há países mais e outros menos vulneráveis. No nosso caso, o Brasil, com um território de dimensão continental, as vulnerabilidades são distintas, a depender da região. Vamos exemplificar: fenômenos meteorológicos extremos, como secas e enchentes, podem ter efeitos distintos na região Sul ou no Nordeste brasileiro. Por isso, conhecer as nossas vulnerabilidades enseja a adoção de medidas para conter os efeitos adversos da mudança climática e, com isso, fortalecer os mecanismos para a resiliência. Logo, é preciso estarmos preparados para o enfrentamento e a minimização dos efeitos da mudança do clima sobre regiões, cidades e lugares. 
Nesse sentido, duas estratégias são fundamentais: a mitigação e a adaptação aos efeitos adversos da mudança do clima. Ambas devem ser conjugadas, sendo que a mitigação se preocupa com a redução das causas, e a adaptação assenta-se em lidar com as consequências da mudança do clima (PFEIFFER, [s. d.]).
Em um primeiro momento, o objetivo assenta-se na mitigação por meio da imediata redução das emissões de gases de efeito estufa. Esse compromisso foi assumido em documentos oficiais no âmbito internacional e nacional. 
Em nível internacional, ao ratificar o Acordo de Paris, cada país assumiu o que é denominado de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), que é o compromisso internacional na redução das emissões de gases de efeito estufa. A NDC brasileira, revista no ano de 2020, tem os seguintes compromissos: reduzir as emissões líquidas totais de gases de efeito estufa em 37% em 2025 e assumir compromisso de reduzir em 43% as emissões brasileiras até 2030 (BRASIL, 2020). A NDC brasileira enuncia, ademais, “[...] o objetivo indicativo de atingirmos a neutralidade climática – ou seja, emissões líquidas nulas – em 2060” (BRASIL, 2020, [s. p.]). Nota-se que os compromissos do governo brasileiro podem ser revistos no curso do cumprimento das metas. Esses são de responsabilidade conjunta do poder público, do setor privado e da sociedade civil para o cumprimento das metas para a redução das emissões de gases de efeito estufa. 
O compromisso internacional assumido pelo Brasil no Acordo de Paris dialoga diretamente com a Política Nacional de Mudanças do Clima (PNMC), aprovada pela Lei Federal nº 12.187/2009, que estabelece, entre outros pontos, que “[...] todos têm o dever de atuar, em benefício das presentes e futuras gerações, para a redução dos impactos decorrentes das interferências antrópicas sobre o sistema climático” (BRASL, 2009, [s. p.]). Ademais, na execução de políticas públicas relativas à mudança do clima, a PNMC estimula o apoio e a participação “[...] dos governos federal, estadual, distrital e municipal, assim como do setor produtivo, do meio acadêmico e da sociedade civil organizada” (BRASL, 2009, [s. p.]). No que se refere à mitigação, a PNMC visa à redução das emissões antrópicas de gases de efeito estufa em relação às suas diferentes fontes e prescreve que as ações de mitigação devem estar em consonância com o desenvolvimento sustentável (BRASIL, 2009). 
Em termos práticos, podemos conferir alguns exemplos de medidas de mitigação que auxiliam na redução das emissões de gases de efeito estufa: (i) melhoria da eficiência energética e uso de energias renováveis, em substituição imediata no uso dos combustíveis fósseis; (ii) promover a agricultura e a pecuária ecológicas; (iii) reduzir o consumo e a adoção da gestão de resíduos sólidos (reciclagem, reaproveitamento etc.); (iv) adotar a gestão eficiente dos recursos hídricos; (v) adotar sistema de mobilidade urbana com transportes coletivos e eficiência energética; (vi) adotar processos assentados na ecoeficiência, ou seja, no fornecimento de produtos equivalentes  à capacidade de sustentação do planeta.
Além da mitigação das emissões de gases de efeito estufa, há a necessidade da adaptação, que consiste em iniciativas e medidas para reduzir os impactos adversos da mudança climática. As medidas de adaptação são necessárias porque as mudanças já estão em curso. Nesse ponto, é importante a adaptação das economias nacionais, isto é, ter “[...] iniciativas e medidas para reduzir a vulnerabilidade dos sistemas naturais e humanos frente aos efeitos atuais e esperados da mudança do clima” (BRASIL, 2009, [s. p.]). É por meio das iniciativas de adaptação que se tem a proteção de vidas em face dos efeitos adversos. Entre os exemplos de medidas de adaptação, temos: (i) reflorestamento de florestas e recuperação de ecossistemas afetados; (ii) desenvolver o cultivo de plantas e culturas mais adaptáveis à mudança do clima; (iii) adotar sistemas de prevenção, monitoramento e preparação em caso de catástrofes naturais e eventos climáticos; (iv) garantir infraestruturas e políticas públicas urbanas para enfrentar as dinâmicas do clima sobre as cidades.
Em qualquer perspectiva, é preciso atentar que, tanto em nível global quanto local, o que está subjacente a esses compromissos é reduzir a emissão de carbono o mais próximo de zero. Uma economia de baixo carbono permitirá o que o IPCC chama de desenvolvimento resiliente: “[...] viabilizado quando os governos, a sociedade civil e o setor privado fazem escolhas de desenvolvimento inclusivas que priorizam a redução de riscos, a equidade e a justiça [...] (IPCC, 2022, [s. p.]).
De modo mais imediato, no contexto corporativo e individual, será preciso a tomada de consciência sobre a nossa atuação no mundo no contexto atual. Para tanto, um elemento que pode auxiliar é o uso de métricas que nos ajudam a compreender o papel de cada um de nós, pessoas físicas e jurídicas, no contexto climático. Uma delas é a chamada pegada de carbono, ou seja, o cálculo dos impactos das atividades humanas sobre o ambiente. A pegada de carbono é, hoje, um indicador que contribui no cálculo dos impactos de pessoas, empresas e países nas emissões dos gases de efeito estufa. Por esse cálculo podemos conhecer e identificar quanto cada ação ou como o nosso modo de vida impacta na emissão de gases de efeito estufa. Por evidente, reduzir a pegada de carbono é uma medida essencial para todos – governos, setor corporativo e sociedade civil.
Em qualquer das perspectivas enumeradas, de governos a cada um de nós, será preciso não só a tomada de consciência mas também o compromisso político e ético com as estratégias para a redução das vulnerabilidades no contexto climático.
AULA 3 – DESIGUALDADES SOCIOAMBIENTAIS
O CONTEXTO DAS DESIGUALDADES
Nos últimos anos, a desigualdade tornou-se uma temática prioritária em qualquer discussão de instituições governamentais em nível global ou nacional. Isso porque estamos acompanhando a escalada da desigualdade em todo o planeta e, como tal, reduzi-la é um pressuposto fundamental para mitigar os impactos deletérios que ela causa em nossas sociedades. Esse é um objetivo compartilhado porgovernos e por organismos multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial. Mas, como compreender a desigualdade e as suas variações?
Com efeito, a desigualdade se estabelece a partir dos processos estruturais em sociedade, em que ela “[...] condiciona, limita ou prejudica o status e a classe social de uma pessoa ou um grupo e, consequentemente, interfere em requisitos primários para a qualidade de vida” (OXFAM, 2021, [s. p.]). A desigualdade é multidimensional, mas vamos nos concentrar em duas delas: a econômica e a social. A desigualdade econômica se dá por meio da concentração de renda em um número reduzido de pessoas em uma sociedade, ou seja, a maior parte da riqueza produzida e acumulada encontra-se nas mãos de poucos. A desigualdade social, por sua vez, está diretamente ligada à estratificação de pessoas em uma sociedade por critérios, como gênero, raça, origem social, entre outras variantes, identificando-se, geralmente, com os grupos mais vulneráveis de uma sociedade. Tanto a desigualdade econômica quanto a social caminham associadas. Esse é caso do Brasil, com suas desigualdades múltiplas, colocando o país como um dos mais desiguais do mundo e o 84º no índice de desenvolvimento humano global entre 189 países (ONU, 2020).
Apesar da relevância e do compromisso dos atores com a redução da desigualdade, os estudos e as estatísticas sinalizam em sentido contrário, tanto na concentração de renda quanto no aumento da pobreza. Segundo o relatório da OXFAM, a questão da concentração de renda é um problema mundial. A plutocracia, o segmento que inclui o 1% mais rico, detém a riqueza dos outros 99% da população mundial; apenas oito bilionários possuem a riqueza da metade mais pobre do planeta (OXFAM, 2017a). Mesmo com a pandemia da Covid-19, a desigualdade não deixou de aumentar. Um nível alto de desigualdade reduz a competitividade e afeta a economia de um país, por gerar uma estagnação na dinâmica social. Os resultados desses dados são preocupantes, porque a desigualdade “[...] aumenta a criminalidade e a insegurança e gera mais pessoas vivendo com medo do que com esperança” (OXFAM BRASIL, 2017a, [s. p.]).
Com os níveis de concentração de renda, temos o efeito imediato do aumento da pobreza, agora agravada pelas implicações da Covid-19 em nível global. No caso do Brasil, em especial, após ter saído do Mapa da Fome em 2014, os índices de pobreza cresceram nos últimos anos (OXFAM, 2017b). Trata-se do retorno de uma questão estrutural da sociedade brasileira aos debates políticos e econômicos. E não podemos nos esquecer de que o compromisso de não retroceder no combate à fome não é somente político, mas um objetivo expresso no art. 3º, III, da Constituição Federal de 1988, de “[...] erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (BRASIL, 1988, [s. p.]).
É por meio do combate e da superação dos altos índices de desigualdade, em qualquer de seus enfoques, que podemos traçar um compromisso efetivo para a construção de uma sociedade igualitária e democrática, requisito fundamental para o enfrentamento das crises contemporâneas.
AS DESIGUALDADES E OS EFEITOS SOBRE A PROTEÇÃO AMBIENTAL
De imediato, uma pergunta fundamental: qual a relação entre a desigualdade – econômica e social – com as questões ambientais? A resposta é: são faces de um mesmo problema. Isso porque, como alertou o filósofo francês François Ost (1997, p. 390), “a injustiça das relações sociais gera a injustiça das relações com a natureza”. Nessa perspectiva, a desigualdade econômica e a social resultam na desigualdade ambiental que, por sua vez, pode se manifestar em duas dimensões: no acesso e no uso privilegiado dos recursos naturais, a partir de um padrão de consumo privilegiado para poucos; na ausência de participação e proteção ambiental para os grupos mais vulneráveis, que sofrem com a distribuição desigual dos efeitos deletérios no meio em que vivem e estão inseridos.
Em primeiro lugar, a compreensão sobre os processos de apropriação dos recursos naturais, notadamente nas disparidades de consumo entre ricos e pobres – interpretados nos contrastes entre países e classes sociais. Ricardo Abramovay (2012) confere um dado significativo em um mundo com mais de 7 bilhões de pessoas: metade das emissões globais de gases de efeito estufa provém dos 500 milhões de habitantes mais ricos do planeta. Percebe-se que as populações dos países do norte global, ricos, possuem padrões de consumo insustentáveis e, como tal, é fato de que estão pressionando os limites de sustentação planetária, não os pobres do mundo (MATTEI; NADER, 2013). Esses dados mostram que, se de um lado os países ricos conseguiram atingir os benefícios do crescimento econômico, de outro lado, a maioria dos países em desenvolvimento não conseguiu os padrões mínimos de uma existência digna. E isso é uma questão particularmente sensível, porque reciprocamente será necessário frear a “pegada ecológica” nos países centrais, do norte global, e ao mesmo tempo possibilitar condições de vida com dignidade para pessoas de outras regiões do planeta. Dito de forma direta: não é possível enfrentar os desafios impostos pela dinâmica da mudança do clima e os riscos sobre a disponibilidade dos recursos naturais sem questionar a pressão que o atual modelo de produção, comercialização e consumo impõe em nossas sociedades. Do contrário, serão mantidas as disparidades no acesso e uso dos recursos naturais e, por evidente, a desigualdade econômica e social em nível global. E para esse cenário, temos o alerta do economista Tim Jackson (2013, p. 17) de que “[...] a prosperidade para poucos, baseada na destruição ecológica e na persistente injustiça social, não é um pilar para uma sociedade civilizada”. O que se tem nessa perspectiva são sociedades disfuncionais, em que os conflitos e confrontos serão cada vez mais intensos, retroalimentando a insustentabilidade ambiental.
Uma outra dimensão da desigualdade ambiental é que as políticas e os problemas ecológicos não são democráticos. Os projetos e as iniciativas dos processos produtivos são decididos e alocados em países e/ou em territórios de grupos vulneráveis que, além de não participarem dos efeitos positivos desses investimentos, estão mais sujeitos aos efeitos nocivos da poluição e dos danos ambientais. Como exemplo, temos a situação dos povos originários e tradicionais, que são expulsos ou têm os seus territórios diretamente afetados pela implementação de grandes projetos de infraestrutura – barragens, mineração etc. –, sem terem benefícios diretos e arcando com o passivo dessas iniciativas. Esses projetos, na maioria das vezes apoiados pelo Poder Público, são geradores de externalidades negativas, tanto nos efeitos sobre os grupos afetados quanto no meio ambiente comum, ou seja, prejudicam outras atividades econômicas existentes. No mesmo sentido, nas cidades, essas populações vivem em áreas frágeis ambientalmente (morros, encostas, beiras de rios etc.) ou próximas de lixões e terrenos poluídos e sofrem as mazelas da segregação socioespacial, isto é, a ausência de políticas públicas que conjuguem uma existência digna.
É preciso pontuar que o problema de alocação dos passivos ambientais ultrapassa, por vezes, os limites territoriais de um país. Esse é o caso das tentativas dos países ricos de exportarem lixo para os países em desenvolvimento. No que se refere ao Brasil, a União Europeia tentou exportar pneus usados, cujos rejeitos ficariam em nosso país. O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal, que, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 101, em 2009, proibiu essa espécie de importação, assentando que ela afrontaria os preceitos constitucionais de saúde e do meio ambiente ecologicamente equilibrado (BRASIL, 2009).
Além das dimensões principais, há uma nova faceta da desigualdade ambiental, que se constitui pela intensificação dos efeitos adversos do clima, em que milhões de pessoas deverão deixar seus lares e países e se mudarem paraoutros lugares, configurando o que tem sido denominado de deslocados ambientais ou, como tem sido utilizado por alguns, de refugiados ambientais. O relatório World Disaster Report, do ano de 2018, elaborado pela Cruz Vermelha Internacional (2018), consignou que, entre os anos de 2006-2016, mais de 771 mil mortes foram atribuídas a desastres, com quase dois bilhões de pessoas afetadas por eventos dessa natureza, das quais cerca de 95% delas em ocorrências por questões climáticas. Ainda que as questões sobre clima sejam produzidas pelos setores mais ricos da sociedade, os seus efeitos são sentidos, sobretudo, pelos povos mais vulneráveis no mundo. Afinal, como expõe Sergio Margulis (2020, p. 120), são as pessoas de baixa renda as mais afetadas pela mudança do clima, porque “[...] tendem a viver e trabalhar em locais mais expostos a riscos climáticos, sem infraestrutura que os reduzam, em casas e bairros que enfrentam os maiores problemas quando impactados [...]”.
Por essa conjugação de variantes da desigualdade ambiental, é possível constatar a imbricada e correspondente relação entre desigualdade e o futuro da vida no planeta. Afinal, a persistência da desigualdade ambiental é um fator desagregador de toda a construção moderna de Estado e sociedade. Lutar por uma maior igualdade, ao reverso, pode nos ajudar a um compromisso comum dos problemas que ameaçam a todos nós (PICKETT; WILKINSON, 2015).
A JUSTIÇA AMBIENTAL
Diante do contexto da desigualdade ambiental, uma das principais proposições para o enfrentamento em sentido crítico é o movimento de Justiça Ambiental. Trata-se de um movimento que surgiu originalmente nos Estados Unidos na década de 1980 e procura demonstrar que os efeitos prejudiciais recaem, sobretudo, em grupos mais vulneráveis da sociedade, em demonstração do racismo ambiental naquele país. As pautas e os princípios norteadores do movimento de Justiça Ambiental daquele país se espalharam pelo mundo e chegaram ao Brasil no final da década de 1990, conjugando as especificidades das lutas e pautas ambientais em nosso país.
Segundo Acselrad, Mello e Bezerra (2009), o movimento de Justiça Ambiental articula suas proposições em duas dimensões de atuação: (i) a discussão sobre os processos decisórios de participação na formulação das políticas ambientais, em especial por parte das populações afetadas; (ii) os efeitos sobre a distribuição dos benefícios e encargos das intervenções sobre o ambiente.
Em primeiro lugar, os processos decisórios são invariavelmente estabelecidos numa relação de verticalização imposta por empresas e governos, de cima para baixo, sem os protocolos de consulta, ou quando ocorrem são realizados com mecanismos de pressão sobre as comunidades e os grupos do entorno, impedindo a livre manifestação pelo peso de retaliações econômicas, sociais, físicas e políticas no âmbito local. Isso é particularmente sensível pela conjugação de fatores ou justificativas de que a falta de empregos e investimentos em um local justificaria a aceitação de projetos e empreendimentos que causam danos ambientais e sanitários, prejudicando a qualidade de vida das populações para um objetivo imediato que, na maioria das vezes, tem uma proposição exclusivamente econômica, ou seja, o lucro imediato para as empresas.
Esses processos decisórios estão em uma dinâmica dissonante aos mais elementares princípios estruturantes do Direito Ambiental. Isso porque os documentos internacionais de proteção ao meio ambiente destacam a necessidade de participação comunitária na formulação e execução de políticas ambientais. A Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, consigna, em seu art. 10, que “[...] o melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados [...]” (ONU, 1992, [s. p.]). E continua deixando claro que o acesso adequado à informação sobre o meio ambiente “[...] inclui a informação sobre os materiais e as atividades que oferecem perigo a suas comunidades, assim como a oportunidade de participar dos processos de adoção de decisões” (ONU, 1992, [s. p.]). No mesmo sentido, fundamentado no Princípio 10 ora delineado, recentemente foi aprovado no âmbito das Nações Unidas o Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe, conhecido como Acordo de Escazú (ONU, 2018), que garante os “direitos de acesso”, compreendendo o direito à informação, à participação pública nos processos de tomada de decisões em questões ambientais e o direito de acesso à justiça. A legislação brasileira, no mesmo sentido, estabelece a participação em vários diplomas legais, prevendo a audiência pública no licenciamento ambiental de atividades efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental (CONAMA, 1986; 1987; 2020). Por esses elementos, evidencia-se que as políticas públicas que afetam pessoas, populações, cidades e regiões devem ser fruto de uma construção dialógica entre os atores envolvidos, e não a sobreposição de uma única interpretação.
Como decorrência dos obstáculos dos direitos de acesso aos processos decisórios, temos a segunda dimensão da Justiça Ambiental, acerca da distribuição dos encargos das intervenções sobre o meio ambiente, que recairão justamente nas populações, nos grupos e nas pessoas mais vulneráveis em sociedades desiguais – como é o caso do Brasil. Portanto, são esses grupos que, ora são privados do acesso aos recursos naturais para viverem, ora “são expulsos de seus locais de moradia para a instalação de grandes projetos hidroviários, agropecuários ou de exploração madeireira ou mineral” (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2009, p. 42). Esse é o caso, por exemplo, dos projetos de desenvolvimento que são impostos e implicam a expulsão de grupos e populações. Dois são os exemplos. O primeiro são expulsões ligadas ao mercado global de terras, com aquisição de grandes áreas produtivas por corporações para a produção de biocombustíveis ou para o extrativismo, forçando milhares de agricultores a venderem ou deixarem suas terras, inclusive, por contaminações, porque o nosso país é o campeão mundial no uso de agrotóxicos. O segundo exemplo são os projetos de infraestrutura, como o caso da Usina de Belo Monte, no Pará, em que milhares de pessoas foram expulsas de suas casas com o alagamento de amplas faixas de terras, com a perda dos laços sociais e de pertencimento ancestrais, além dos impactos ambientais, em que o mais evidente foi a perda da biodiversidade da região. Na mesma perspectiva, pessoas e grupos são atingidos pela implantação de projetos de hidrelétricas, um dos pontos mais críticos na agenda ambiental brasileira, com movimentos em todo o país em questionamento ao modelo de implementação dessas iniciativas.
Nessa conjugação, nota-se que o movimento de Justiça Ambiental é fundamentalmente uma rede que estabelece um contraponto e uma resistência aos mecanismos de imposição e verticalização dos processos decisórios que saem prontos de gabinetes governamentais, sem interface ou diálogo com a realidade dos territórios e lugares. O que está em pautas nessas reivindicações é, sobretudo, o compromisso com a participação comunitária em uma sociedade democrática e dialógica, princípio e condição fundamental para um combate efetivo ao crescimento da desigualdade ambiental e suas consequências.
 
AULA 4 – MOVIMENTOS DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE
GÊNESE DO AMBIENTALISMO
O movimento ambiental tem origem na segunda metade do século XIX, com os grupos protecionistas criados na Europa, que estavam preocupados com os efeitos das transformações advindas da Revolução Industrial, como a perda de áreas selvagens e a poluição em cidades que se tornaram insalubres. Nessa perspectiva, a primeira sociedade ambientalista privada foi criada na Inglaterra em 1863, chamada de Commons, Foot-paths and Open Spaces Preservation Society (MCCORMICK, 1992).
Já nos Estados Unidos, os primeiros grupos ambientalistas são da virada dos séculos XIXe XX, estabelecidos a partir de duas compreensões sobre as relações do homem com a natureza: os preservacionistas, que defendiam a manutenção de áreas virgens, intocadas, sem a interferências de atividades humanas; e os conservacionistas, centrados na racionalização e compatibilização do uso dos recursos naturais com a proteção ao ambiente (MCCORMICK, 1992). Essas leituras são reflexos das discussões da época, assentadas ora na proteção da vida selvagem, ora nos efeitos da industrialização e da urbanização. Apesar de históricas, essas duas visões, com variações e adequações – e, por vezes, em associação –, ainda são presentes na compreensão contemporânea da proteção ao meio ambiente.
No final da década de 1950 e início da década de 1960, começa a surgir uma nova articulação de grupos e entidades de proteção ao meio ambiente, influenciados pelos riscos da corrida nuclear, da explosão demográfica, do aumento da degradação ambiental; fatores esses que foram exteriorizados por meio de denúncias formuladas através da publicação de livros e artigos acadêmicos. Um caso emblemático é a obra Primavera Silenciosa, de autoria da bióloga Rachel Carson, em 1962, que demonstrou os efeitos nocivos da contaminação por pesticidas na agricultura e as consequências para o equilíbrio ecológico. Essa publicação teve enorme repercussão nos meios acadêmicos e políticos, influenciando decisivamente o movimento ambientalista e abrindo as discussões que levaram o governo norte-americano a criar a sua agência de proteção ao meio ambiente nos anos de 1970.
A década de 1960 foi um período de efervescência em nível global, com a emergência de novos movimentos sociais, pautados em reivindicações por direitos, inclusão, participação política e proteção ao ambiente, todos em afirmação de valores coletivos. Como exemplos, as exigências pelo exercício de direitos civis pela população afro-americana nos Estados Unidos, liberados por Martin Luther King, e os protestos de “maio de 1968”, que eclodiu com as demandas culturais dos estudantes franceses em face das estruturas vigentes na sociedade da época. Nesse período, o movimento ambientalista começa a se organizar não somente em concepções preservacionistas e conservacionistas, mas assume a perspectiva crítica, na proposição de uma ecologia política, conjugando aspectos materiais, como as implicações da poluição e da explosão demográfica sobre a natureza, com aqueles enfoques de orientação ética, preocupados com a sobrevivência da vida humana e não humana no planeta para as presentes e futuras gerações.
As décadas de 1970 e 1980 trouxeram uma nova configuração na estrutura do movimento ambientalista. Se, em um primeiro momento, os movimentos ambientalistas eram oriundos de pautas convergentes de determinados setores da sociedade, o avanço das questões ecológicas no tabuleiro político e econômico da governança global impuseram uma nova estruturação, em que começam a se organizar em nível institucional, por meio de pessoas jurídicas de caráter não governamental, ora em organizações de âmbito internacional, que traziam em seu bojo a premissa que os problemas ecológicos não eram somente locais, mas conjugavam aspectos transfronteiriços e globais; ora como entidades nacionais, orientadas por pautas regionais e locais, focadas nos projetos de desenvolvimento sustentável de acordo com a realidade em cada país. Em qualquer dessas perspectivas, teríamos doravante a expansão de organizações de caráter não governamental, estimuladas pelas Nações Unidas.
No início do século XXI, surgiram novas formas de atuação em face dos problemas ambientais por meio de ativismos impulsionados pelos avanços das novas tecnologias de informação e comunicação, especialmente a internet e suas redes sociais. Uma das formas é o ciberativismo, em que comunidades virtuais de pessoas com propósitos e pautas convergentes estimulam determinadas práticas. Um exemplo é o evento anual chamado “Hora do Planeta”, organizado pela organização WWF, a qual é responsável por conjugar centenas de cidades e quase 1 bilhão de pessoas em defesa das pautas patrocinadas pelo movimento, como a emergência climática e a perda da biodiversidade.
Um importante ativismo, recente, que conjuga a atuação virtual e real, é o movimento de jovens suecos iniciado pela jovem Greta Thunberg, que em maio de 2018 iniciou um protesto escolar às sextas-feiras em frente ao Parlamento sueco, cobrando medidas contra a mudança climática. A princípio, sozinha, e depois com a companhia de milhares de jovens que deixavam de participar das aulas para protestarem, Greta inspirou um movimento que se espalhou pelo mundo com o nome de “sextas-feiras pelo clima”. O movimento continua e é considerado um dos principais ativismos ambientais na contemporaneidade.
OS MOVIMENTOS AMBIENTAIS E AS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS
A compreensão dos movimentos ambientalistas, como conhecemos atualmente, está diretamente ligada à conversão de um número significativo deles em pessoas jurídicas denominadas “organizações não governamentais” – referenciadas pela sigla ONG –, com atuação destacada a partir da década de 1970. O conceito de ONG é para aquelas pessoas que não se enquadram como governamentais ou empresariais de fins lucrativos; portanto, em sentido amplo, estão incluídos conceitualmente os sindicatos, as organizações profissionais e as entidades com pautas específicas, como de consumidores, de questões identitárias e outras de promoção social. Entretanto, o conceito de ONGs na área ambiental é mais restrito, definidas como pessoas privadas, não governamentais, sem fins lucrativos, com propósitos de intervenção acerca de questões globais às locais em prol das iniciativas de proteção e promoçãona do meio ambiente. Outras expressões são utilizadas como equivalentes para caracterizar as ONGs ambientalistas, como “entidade do terceiro setor”, por não fazer parte do governo (primeiro setor) ou do segundo setor (empresas privadas), ou ainda “organizações da sociedade civil”.
As ONGs ambientalistas tiveram um forte estímulo e articulação a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, no ano de 1972. Diante das dinâmicas dos problemas ecológicos, que são transfronteiriços, algumas das principais entidades ambientalistas estão organizadas em nível internacional. Destacaremos algumas das principais organizações globais de proteção ambiental.
A primeira delas é o WWF, que é o Fundo Mundial para a Natureza, uma organização não governamental criada em 1961, na cidade de Gland, Suíça. Com mais de cinco milhões de associados em todo o mundo, o WWF tem “[...] como missão global conter a degradação do meio ambiente e construir um futuro no qual as pessoas vivam em harmonia com a natureza” (WWF, 2020, [s. p.]). Tem linha centrada em projetos que atuam na conservação da biodiversidade mundial, na garantia da sustentabilidade de recursos naturais renováveis e na redução da poluição e do desperdício. O WWF se estabelece de forma transnacional por meio de uma rede de entidades associadas e tem como símbolo um urso panda, uma vez que surgiu de uma ação para a arrecadação de fundos para a proteção dessa espécie. O WWF-Brasil foi criado em 1996 e atua por meio de projetos no contexto econômico e social brasileiro, em especial, nos biomas brasileiros, como a Amazônia, o Cerrado, a Mata Atlântica e o Pantanal, e nos ecossistemas marinhos. Suas iniciativas “[...] buscam proteger e restaurar a biodiversidade, fortalecer a agricultura familiar e a produção local, além de gerar estudos sobre o impacto do desmatamento e das queimadas” (WWF, 2020, [s. p.]).
A segunda organização é o Greenpeace, criado em Vancouver, Canadá, em 1971. Trata-se de uma das mais combativas organizações ambientalistas, que tem atuação por meio do ativismo ambiental e de mecanismos de pressão sobre governos e empresas. O Greenpeace é mantido exclusivamente por seus associados, recusando financiamento público ou empresarial. Entre as suas principais missões e valores, estão: (i) protegeros ecossistemas e a biodiversidade em todas as suas formas; (ii) promover a paz, o desarmamento global e a não violência; (iii) enfrentar as mudanças climáticas: (iv) promover soluções sustentáveis junto à sociedade (GREENPEACE, 2022). O Greenpeace possui escritório no Brasil desde 1992 e desenvolve ações ativistas em defesa da Amazônia e contra o desmatamento; na luta contra os agrotóxicos; no combate aos efeitos danosos da mineração; entre outras.
A terceira organização internacional é a União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais – conhecida pela sigla em inglês IUCN –, criada na França, em 1948, com linha de influência acadêmica e na busca de soluções ecológicas. Trata-se da maior rede de sociedades ambientais em nível global, conjugando mais de 1.400 membros, entre órgãos governamentais e da sociedade civil (IUCN, 2019). A IUCN é reciprocamente um espaço de debates e de iniciativas para os projetos de conservação ambiental em todo o planeta, conjugando a atuação de especialistas e populações locais em busca do equilíbrio ecológico.
Além dessas estruturas ambientalistas internacionais, há aquelas de origem nacional, com atuação específica em áreas, regiões e povos na conjuntura brasileira. Relacionaremos três organizações do nosso país: S.O.S Mata Atlântica, criada para a conservação do bioma de mesmo nome; Instituto Socioambiental (ISA), com propósito de proteção aos povos originários; Instituto “O Direito por um Planeta Verde” (IDPV), de natureza acadêmica, destinado às temáticas jurídicas ambientais.
A Fundação S.O.S Mata Atlântica é uma ONG brasileira criada em 1986 e que atua no fomento de políticas públicas para a proteção e conservação da Mata Atlântica, um dos principais biomas brasileiros. Sua atuação se dá por meio de estudos e monitoramento das intervenções antrópicas sobre o bioma, conscientização pública e aprimoramento da legislação ambiental (SOS MATA ATLANTICA, 2021). Já o Instituto Socioambiental (ISA) é uma organização criada em 1994 e que atua na defesa da diversidade socioambiental brasileira, em especial, por projetos e iniciativas em conjunto com comunidades indígenas, quilombolas e extrativistas, de modo a preservar e fortalecer a cultura e os saberes tradicionais (ISA, 2021). Em associação com o acompanhamento de políticas públicas que influenciam direta e indiretamente os direitos das populações originárias e tradicionais, o ISA desenvolve projetos de economia e soluções sustentáveis para esses povos da sociodiversidade brasileira (ISA, 2021). Por fim, o Instituto “O Direito Por um Planeta Verde” (IDPV), pessoa jurídica sem fins lucrativos criada em 2005, reúne os principais especialistas na área do Direito Ambiental no Brasil. O IDPV, uma das entidades filiadas à IUCN, é o responsável pela edição anual do Congresso Brasileiro de Direito Ambiental, fórum de discussões com pesquisas e debates acadêmicos sobre os principais desafios e proposições sobre as demandas ecológicas em nível internacional e nacional.
AS ATUAÇÕES DAS ONG’S E A AGENDA AMBIENTAL
As organizações não governamentais (ONGs) possuem um papel fundamental nas instâncias deliberativas em nível internacional e nacional, em contribuição direta acerca da sensibilização sobre os problemas estruturais e no processo de formulação das políticas e estratégias de promoção e proteção ao meio ambiente. A arquitetura internacional de discussão sobre as temáticas ambientais estimula a participação comunitária e a atuação através dessas entidades, inclusive, em seus fóruns de discussões. Para exemplificar, a Declaração do Rio de Janeiro, elaborada em 1992 durante a Cúpula da Terra, destaca que “[...] o melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados, em vários níveis” (ONU, 1992, [s. p.]). E um dos níveis de participação é, sem dúvida, por meio das organizações ambientalistas.
No Brasil, a importância das ONGs ambientalistas está presente no seu reconhecimento pelo Poder Público. No âmbito federal, temos o Cadastro Nacional de Entidades Ambientalistas, com 673 delas inscritas e distribuídas em todas as regiões do país (BRASIL, 2019). Cadastros similares estão organizados no âmbito dos estados brasileiros. O papel desses cadastros é atestar a regularidade jurídica dessas pessoas jurídicas para os fins de participação nas estruturas governamentais dos entes federativos, como veremos.
Nesse sentido, é preciso destacar a função dessas entidades no desenho institucional brasileiro. Uma das principais formas de participação e atuação na formulação de políticas públicas ambientais ocorre por meio dos conselhos de meio ambiente. Eles são integrados pelos representantes do Poder Público, do setor empresarial e das organizações ambientalistas. Esses conselhos de meio ambiente são obrigatórios em todos os níveis federativos para aqueles que pretendem efetuar o licenciamento ambiental de atividades efetivas ou potencialmente poluidoras, ou seja, se um estado ou um município decidir por licenciar atividades, além de órgão ambiental capacitado, ele deverá possuir conselho de meio ambiente com caráter deliberativo. 
O mais relevante desses órgãos no país é o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, que conjuga integrantes eleitos entre as ONGs ambientalistas brasileiras inscritas no Cadastro Nacional de Entidades Ambientalistas. A estrutura jurídica brasileira prevê também a existência de conselhos com participação comunitária e/ou de pessoas jurídicas ambientalistas em casos de unidades de conservação e nos órgãos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos no Brasil, como os comitês de bacia hidrográfica, os conselhos estaduais e o nacional de recursos hídricos.
Outra forma de participação das ONGs ambientalistas em conjunto com o Poder Público é por meio de parcerias em projetos e programas para o desenvolvimento sustentável. Um dos exemplos de financiamento é através dos fundos de meio ambiente, com recursos financeiros destinados para projetos de soluções sustentáveis e para setores específicos, como biomas, populações tradicionais, combate à poluição, entre outros. O Fundo Nacional do Meio Ambiente, criado pelo governo brasileiro por meio da Lei nº 7.797, em 1989, é o mais antigo da América Latina e tem apoiado uma série de iniciativas nessa perspectiva (BRASIL, 1989). Há, ainda, fundos ambientais no âmbito de estados e municípios, assim como aqueles para áreas como a proteção da biodiversidade e das florestas públicas brasileiras.
Em geral, as entidades ambientalistas exercem mecanismos permanentes de acompanhamento e fiscalização sobre as intervenções e pressões que empresas e governos exercem sobre o meio ambiente. Duas formas podem ser destacadas: a atuação administrativa e a judicial. Na primeira delas, a administrativa, as ONGs costumam acionar e cobrar a fiscalização dos órgãos governamentais de proteção ao meio ambiente – como o IBAMA, na esfera federal – em caso de infrações ambientais praticadas por empresas privadas e pelo próprio Poder Público. A segunda forma é a intervenção na esfera judicial, em que as pessoas jurídicas ambientalistas criadas há mais de um ano e com finalidades institucionais ambientais possuem legitimidade processual para ajuizar ação civil pública para a defesa do meio ambiente, inclusive em casos de ocorrência de danos ambientais, conforme dispõe a Lei Federal nº 7.347/1985 (BRASIL, 1985). Por fim, podem acionar Ministério Público em caso de crimes ambientais cometidos por pessoas físicas ou jurídicas, para que ele faça a proposição da competente ação penal de responsabilização.
Além desse contexto de atuação em face das instituições públicas e setor empresarial, é importante destacar que muitas ONGs são criadas para projetos na escala da proximidade, ou seja, nos lugares em que vivem comunidades e pessoas que são beneficiadas ou atendidas pelas suas iniciativas e estratégias de melhoria das condições de vida e de preservação e conservação dos recursosnaturais. Outras ONGs atuam na produção de dados, estudos e pesquisas que subsidiarão um conjunto de proposições públicas e privadas em suas áreas institucionais, muitas vezes realizados em parceria com instituições de ensino. Da mesma forma, algumas ONGs estabelecem projetos de educação ambiental, para a formação de uma consciência pública sobre a importância da proteção ambiental, estimulando a participação comunitária e dos setores organizados da sociedade civil.

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