AULA 03 DIDATICA MAGNA DE COMENIUS

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Relação dos fundamentos 
comenianos na prática atual 
 
 
Prof. Me José Paulo Neves
Aula 03
Jan Amos Komensky
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A Didática, entendida como a arte de ensinar, vem sendo recriada e adaptada às novas situações ao longo da história da educação, porém sua sistematização concreta se deu no século XVII com o pensador morávio João Amós Comenius. Partindo do pressuposto de que é possível a Didática comeniana propor temas que ultrapassam os séculos e se manifestam na contemporaneidade, 
Vamos verificar como certas características sociais, econômicas e culturais de uma dada época promovem as condições de permanência ou a possibilidade da mudança de certos traços da didática outrora apontada por Comenius. 
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Antes, é importante contextualizar o autor em questão. João Amós Comenius nasceu em 1592 de família pertencente à União de Irmãos Morávios, comunidade protestante, perdeu os pais aos 12 anos, entra no ginásio de Prerov aos 16 anos. Aos 19 anos é admitido na Academia de Herbon e aos 20 anos apresenta suas teses de doutorado. Em 1616 publicou sua primeira obra intitulada Grammaticae facilioris praecepta. Em 1618 é chamado ao pastorado de Fulnek, o mais importante da Morávia e encarregado da reitoria da escola dos Irmãos. 
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Nesta ocasião, escreve Listové do nebe, uma tentativa de resolver problemas sociais por meio da aplicação de princípios cristãos e prepara o manuscrito do Theatrum universitatis Rerum. Comenius perdeu esposa e seus dois filhos, além de perder também seus manuscritos e livros quando a cidade de Fulnek é tomada, saqueada e queimada em 1621. Em 1627 o catolicismo se torna religião oficial do reino boêmio. Em seis meses, quem não se convertesse deveria deixar o país, Comenius foi exilado.
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No ano de 1628 começa a escrever suas teorias didáticas, interessa-se pelo ensino de línguas. Em 1632 Comenius é consagrado Sênior da União para os Irmãos boêmios e morávios que estão na Polônia. Sua principal missão é assumir a orientação dos estudos e a organização dos jovens teólogos no exterior. Emprega as folgas, que lhe atormentam, em escrever obras pedagógicas, filosóficas e teológicas. E continua a publicar obras no decorrer de sua vida e após ela. São ao todo mais de 200 obras incluindo a Didática Magna. Quando, em 1648, o tratado de Westfália* sobrevém sem dar a ele alternativa a não ser continuar perambulando pelo mundo, é quando vai para Amsterdã, onde morre em 15 de novembro de 1670. 
* A Paz de Westfália foi um acontecimento histórico marcado pela assinatura de dois tratados de paz nas cidades alemãs de Münster e Osnabrück, em 1648, e que colocou fim a Guerra dos Trinta Anos (1618 – 1648)
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É necessário também, pensar em qual realidade o autor estava inserido. Durante o feudalismo, a Igreja foi a maior detentora de propriedades em vários países da Europa, que eram obrigados a pagar altos impostos para Roma. Quando da formação das monarquias nacionais, a Igreja passou a ser considerada um empecilho ao desenvolvimento econômico, além de personificar a própria estrutura feudal decadente. Entende-se por meio de estudo feito por Vicentino “o desenvolvimento dos Estados Nacionais e a consequente formação de uma consciência nacional colocavam em antagonismo o poder político dos reis e do poder da Igreja” (1997 p.196). 
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No âmbito socioeconômico, o progresso do capitalismo comercial era prejudicado pela doutrina de São Tomás de Aquino – tomismo, que recomendava o ‘justo-preço’ e condenava a usura, impossibilitando o progresso burguês e mercantil. Vendendo as mercadorias pelo valor da matéria-prima acrescido somente a mão-de-obra, (justo-preço), desarmava-se a mola mestra do sistema comercial: o lucro. Assim, os ideais dos novos grupos que surgiam e se dedicavam às atividades produtivas capitalistas se chocavam com as teorias religiosas católicas, abrindo espaço para o surgimento de uma nova religião mais condizente com o novo modo de pensar. 
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Na religião havia confronto entre dois polos: tomismo e teologia agostiniana. A Igreja Católica baseava-se no tomismo, teologia do final da Idade Média, fundamentada no livre-arbítrio e nas boas obras. A teologia agostiniana, por apreciar a predestinação e a fé, serviu de base para os protestantes contrários ao domínio cristão romano.
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E esse conflito entre a burguesia e a religião tradicional unido ao conflito político entre reis e papa, desencadeou uma crise dentro da Igreja. No século XVII os abusos eclesiásticos ultrapassaram os limites admissíveis pelos cristãos, e a crise política por que passava a Igreja precipitou o movimento reformista protestante. Então, conforme Vicentino pode-se concluir que a causa da Reforma Protestante foi a crise moral da Igreja, cujo poder e abusos contrastavam com suas pregações. 
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Em suma, a vida desregrada, a opulência e o luxo do alto clero, a venda de cargos escolásticos, os conflitos em Roma, a venda de relíquias sagradas e de indulgências, transformaram a Igreja em alvo de contundentes contestações. E iniciada como um confronto interno se deu a Reforma. Um de seus principais líderes foi Martinho Lutero (1483-1546), que acreditava na teoria da predestinação e a fatalidade da salvação e os encaminhamentos dados pela Igreja Católica. 
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Em resposta a essas manifestações a Igreja realizou a Contra-Reforma, que foi violenta, inclusive nos métodos. Esse processo não erradicou o protestantismo, mas conseguiu contê-lo, anulando as principais causas do movimento reformista e ainda propagou a fé católica por causa das navegações e o colonialismo por parte de alguns países da Europa. Diante desse quadro pode se notar, segundo estudos de Garcia (2008) que, Comenius viveu em uma sociedade conturbada, tendo presenciado muitas transformações, em todos os aspectos: político, social, cultural e religioso. 
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Conforme Comenius relata na introdução da Didática Magna, pediu aprovação de sua obra a seu colaborador Hübener, mas este lhe deu parecer negativo, julgando a obra como audaciosa pelo título, e disse que o autor morávio deveria ser mais modesto e Comenius ainda é criticado nas instruções e por se basear em preceitos religiosos. Contudo, Comenius não se incomodou e ousou em uma observação aos leitores afirmando: “nós ousamos prometer uma Didática Magna, ou seja, uma arte de ensinar tudo a todos” (2006, p.13). 
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O autor faz uma crítica à escolástica, criada por Tomás de Aquino, na qual tudo deveria estar subordinado aos valores ditados pela Igreja Católica. Mesmo se contrapondo à escolástica, de acordo com os estudos de Larroyo, Comenius tinha uma teoria para educação baseada nos princípios da fé, mas não dominado pela Igreja Católica, “embora sustentasse Comenius tão profundo sentido prático da educação, não se afastou dos fins teológico e religioso da formação humana” (p.419). 
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Para Comenius piedade e virtude (religião e moral) não tinham fins isolados, vinculou-os substancialmente com a ciência numa relação lógica: “temos em nós por natureza as sementes da instrução, das virtudes e da religião” (COMENIUS, 2006, p.57). Esse nexo se expressa na idéia de pansofia, ou seja, o programa de uma ciência universal em sentido cristão, porém de forma alguma confessional. 
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Suas ideias (Comenius) eram, sem dúvida, audaciosas para seu tempo, devido à estrutura da sociedade da qual participava, não puderam ser postas em prática em sua época, devido à religião e a organização socioeconômica, era, portanto, inconcebível que essas ideias de poder “ensinar tudo a todos” a sistematizar a ideia de didática, (COMENIUS, 2006, p.95). De acordo com Garcia (2008), o método de ensino de Comenius é um instrumento de “Revelação Divina. Por isso não pode excluir ninguém, pois todo ser humano possuía dentro de si a capacidade de chegar à glória de Deus” e esse pensamento se justifica por Comenius acreditar que todos os seres humanos eram pecadores e se salvariam por meio da educação e era direito de todos essa salvação. 
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Esse grande pedagogo apresentou um novo método que chegou a ser o marco inicial da pedagogia do futuro, como já afirmava Larroyo (1982), contudo sofreu influências que de alguns pensadores dentre os quais: Bodin (1530-1596), Ratke (1571- 1635), Bacon (1561-1626), os jesuítas (1548-1762), Platão (427 a.C- 346 a.C). Mas em sua teoria, as ideias desses vão encontrando seu arranjo ao passo que um novo e mais fecundo intento vai se articulando. 
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Mas, o que interessa nesse trabalho é mostrar que Comenius foi o precursor na sistematização, não digo criação, da didática e influenciou muitos autores subsequentes. Neste sentido, é pertinente pensar com Piobetta (1978), quando afirma que :
“Certo, bem antes da sua, outras tentativas haviam sido feitas para dar às escolas, doutrina pedagógica coerente ou para esboçar, sob forma original, um sistema de educação... Mas não é menos certo por isso, que a Didática Magna é o primeiro ensaio importante de sistematização da pedagogia”. (p.118) 
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Um dos aspectos que mais chama a atenção na obra comeniana é o fato de ser pautada em textos bíblicos, ou seja, o autor tenta unir religiosidade e ciência o que alguns estudos chamam de perspectiva barroca de pensamento: “E vós pais, não provoqueis a ira de vossos filhos, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor”. Ou: “A lei do Senhor dará sabedoria às crianças... a palavra de Deus é o leite das crianças regeneradas de Deus... vinde filhos, escutai-me, ensinar-vos-ei o Temor a Deus”. E ainda: “nas Santas Escrituras há trechos profundos para o entendimento”. Com essas características a obra revelaria aceitabilidade nas academias educacionais e fazer parte dos currículos dentro das disciplinas pedagógicas.
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A disciplina, segundo Comenius “ninguém pode tornar-se homem sem disciplina”. Nota-se que seus influenciadores em algum momento de suas obras elegem essa disciplina como primordial na educação e Comenius a reafirma quando a torna um capítulo de seu livro. 
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Comenius ainda pensa que a educação deva ser dada na primeira infância, “se os espíritos não forem, desde o principio, suficientemente preparados para as circunstancias de toda a vida, não haverá mais nada a fazer” e continua ao dizer que “o cérebro na idade infantil é úmido, tenro, pronto para receber todas as imagens que lhe chegam; aos poucos vai secando e endurecendo, e por isso as coisas nele serão impressas e esculpidas com maior dificuldade”. 
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Esse morávio acreditava na instrução por base na natureza, na moralidade e piedade. “finalmente, serve-nos de exemplo a natureza, a mostrar-nos que as coisas, para crescerem em abundância devem ser geradas em local determinado”. 
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O autor percebe a necessidade da educação se dar de forma organizada por classes, da mesma forma que os jesuítas empregaram quando atuavam e também era visível sua preocupação com a questão do tempo que a criança passaria na escola, tal qual Ratke pensou, para Comenius o tempo maior da criança seria em casa e pouco se ficaria na escola, se aprenderia devagar e uma coisa de cada vez, unido ao pensamento que a educação deveria ser feito por etapas: do conhecido para o desconhecido, do fácil para o difícil e assim por diante, sempre partindo do concreto.
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Comenius propõem uma escola perfeita que ainda não foi alcançada, que as crianças aprendam com um método mais fácil, para se sentirem seduzidas por ele, para que encontrem nos estudos um prazer não menor do que o que sentem ao brincar. Comenius questiona “Onde está a escola para todos? Onde está esse método agradável?” Contudo esse autor diz que a maioria das escolas adota um método tão rígido como o dos jesuítas, por exemplo, na questão da agressão física, que a escola se torna uma tortura para a mente da criança. 
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Acredita que a escola possa ser reformada e melhorada, e para isso propõe uma organização escolar. Comenius, sobretudo, questiona a necessidade de ser posta em prática essa proposta para que acreditem na sua funcionalidade. 
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Comenius sistematizou como deveriam ser passados os conteúdos aos alunos de forma que ninguém fosse excluído, coloca a questão da confecção de livros, dos materiais escolares, dentre inúmeras outras contribuições que irão ser discutidas em seus pormenores analisados pelos holofotes de seus sucessores por ele influenciados possibilitando mudanças ou inovações segundo as condições que a historia e a sociedade oferecem, que pretendemos ainda explorar. 
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