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DA CULTURA DO ARROZ. 6° MANUAL AGRÍCOLA MANDADO PUBLICAR PELA SOCIEDADE AMíLíADORA DA íNDÜSTRiA NACíONAL PELO Dr. Frederico Leopoldo César Burlamaqui SECRETARIO PERPETUO HONORÁRIO DA MESMA SOCIEDADE. O arroz nutre as duas terças partes da espécie humana. (?) Riü BE JANEI-RÜ. TypocRAPHiA do Imperial Instituto Artístico Largo de S. Francisco de Paula n. 16. 1864. I «TO/AL DA CULTURA DO ARROZ. Historia do arroz.—Suas espécies e variedades.—Do terreno e da situação que convém ao arroz. — Prepa- ração do terreno. — Cultura e colheita. — Cuidados que exige o arrosal. — Composição do arroz e seus usos, — Insalubridade dos arrosaes e dos meios de os sanificar. — Estatística. historia. —espécies e variedades de arroz. O arroz (Oriza), da familia dosgramineas, daHexan- dria dygina de Linneu, constitue um único gênero e só- mente quatro espécies, subdivididas em um grande nu- mero de variedades. Destas quatro espécies, somente uma é que se cultiva para alimentação do homem, mas que comprebende muitas variedades. Desvaux (1) classifica o arroz, cul- tivado em differentes regiões do globo, em 6 variedades (1) Jornal de Botânica, vol. TTT, pag. 76. manual da cultura botânicas, que podem ser consideradas como outras tantas raças, nas quaes se incluem naturalmente todas as subvariedades distinctas na cultura, e cujo numero é tal, que Lechenault de Latourt (2) menciona 30 culti- vadas nas vizinhanças de Pondichery. e Heyne cita 21 cultivadas em Mysore. As variedades por structura externa podem divi- dir-se em duas classes: arroz barbado (Oriza sativa), e arroz sem barba (Oriza mutica). Entre as variedades barbadas, Desvaux menciona como as mais notáveis a Oriza sativa pubescens, culti- vada na Itália ; a Oriza sativa rubribarbis, culti- vada na America Septentrional; a Oriza S. mar- ginata, cultivada na índia : e a O. S. elongata, cul- tivada no Brasil. Entrs as não barbadas, distingue-se a Oriza mutica denudata, cultivada na Itália ; e a Oriza mutica sorghoidea, cultivada na índia. Quanto as cores, em ambas as classes se encontrão arroz branco, amarello. côr de rosa, vermelho, tri- gueiro, etc. O celebre Poivre introduzio na Ilha de França a cul- tura de uma variedade de arroz da Cochinchina culti- vavel nos terrenos seccos, e ao qual se deu o nome de arroz perenne, ou de arroz de montanha. Mas esta _ es- pecie que requer, como as outras, um terreno humido, não exige todavia a submersão como as espécies geral- mente cultivadas ; basta que na localidade as chuvas sejão regulares, ou que se possa irrigar artificialmente os arrosaes, não exigindo a sua cultura senão terrenos análogos aos dos outros cereaes. Esta espécie divide-se em duas variedades, uma longa, outra redonda. A primeira tem uma pellicula vermelha que communicà uma parte de sua côr ao grão, sem to- davia communicar-lhe nenhum máo gosto. A segunda produz sobre as montanhas e collinas, mas somente nos paizes onde as chuvas sâo regulares e abundantes. Falia- remos outra vez nesta variedade. (2) Cultura do arroz na índia. Memoria.s do Museum, vol. VI. DO ARROZ. 5 As variedades as mais estimadas da índia são as de- nominadas benapeli e gundoli. O arroz imperial, culti- vado na China, parece ser o mais temporão de todos, porque exige para amadurecer menos a terça parte do tempo do que as outras variedades de arroz. No Japão existe uma variedade de grão mui pequeno e mui branco, que dizem ser a melhor espécie conhecida. # O trigo por excellencia, o trigo sarraceno, o centeio, a avêa, o milho, a mandioca, o arroz, e pode-se accres- centar — as batatas, são as principaes plantas alimen- tares, o pão do gênero humano. O arroz sustenta talvez mais das duas terças par- tes das raças humanas disseminadas em todos os pon- tos do globo, e existem povos que quasi exclusiva- mente se nutrem com arroz, ou pelo menos que com elle formão a base principal da alimentação, taes como os chins, a maior parte dos habitantes da índia, do Ja- pão, etc. Durante muito tempo considerou-se o arroz como uma nlanta originaria da índia ou da China ; mas sa- be-se" agora que em diversos pontos da America e da África existem variedades de arroz indígena no estado selvagem, susceptível de melhorar muito pela cultura. Pouco a pouco a cultura deste cereal se propagou nao somente nas regiões tropicaes, como também em muitos paizes temperados, na Hespanha, na Itália, em França, e ultimamente em Portugal e mesmo em algumas partes da Allemanha, e póde-se dizer que ella prospera nas re- o-iões Sul das quatro partes do mundo.& Sabe-se que a cultura do arroz na America Septem- trional, que apenas começou no fim do 17° século, to- mou umimmenso desenvolvimento. Os Estados data- rolina do Sul e do Norte, da União Americana, cultivão particularmente uma variedade considerada como de qualidade superior a todas as outras, excepto a do Japão, que acima mencionamos. DO TERRENO E SITUAÇÃO QUE CCNVEM AO ARROZ. O arroz é uma planta pouco voraz, consome pouco, e manual da cultura prospera por pouco que o terreno seja soffrivel. Encon- trão-se excellentes arrosaes em terras de qualidades as mais diversas: em terrenos de seixos quasi estéreis, em areaes, em terras argilosas de difíerentes tenacida- des, calcareas, etc. A experiência dos chinezes prova que essa planta prospera até nos terrenos saliferos, ex- periencia que á pouco tempo foi confirmada em França. Todavia ella escolhe de preferencia as terras leves, mas com a condição de que as camadas inferiores não dei- xem escapar os principios de vegetação que as águas dissolvem. Em uma palavra, a natureza da terra é indifferente, o essencial é a quantidade e a qualidade da água, ao menos para as variedades sativas ou barbadas de arroz. Para estas variedades, a água é tanto melhor quanto mais estiver sobrecarregada de principios orgânicos e com maior calor. Calcula-se, termo médio, ser necessa- ria uma corrente d'água de um metro cúbico por mi- rfuto para a irrigação de 1,300 geiras de arrosaes. O terreno destinado para um arrosal pôde ser secco, ou naturalmente pantanoso, quer por defeito de esgoto, quer pela existência de fontes permanentes. No pri- meiro caso póde-se ter um arrosal alternado com outras culturas, ou arrosaes de rotação ; no segundo caso, pôde formar-se um arrosal permanente. O terreno pantanoso não pôde tornar-se bom arrosal senão quando houver meio de produzir-se um certo mo- vimento, que faça esgotar as águas de irrigação. Obtida essa condição indispensável, convém dar-lhe sufficiente solidez pítra que nelle possão trabalhar os animaes, os homens e os instrumentos, o que se alcança dividindo o terreno por meio de vallas. Se isto não fôr possível, é forçoso lavral-o com a pá. Os melhores terrenos para a cultura do arroz sativo ou huraido, são : em Io lugar, os terrenos alagados das margens dos rios perto de suas embocaduras com o mai, sobretudo nos logares onde a maré represa as águas dos rios e produz innundações ; 2o, as margens dos rios inundados durante as enchentes : 3o, os terrenos enchar- cados. Nos outros terrenos não naturalmente humidos, DO ARROZ. / é necessário arranjar as cousas de modo a ter sempre a água necessária para inundar os arrosaes ; para isso pre- ferem-se as planícies junto ás montanhas, e procura-se por meio de diques e parapeitos reunir as águas que vem de suas vertentes. Estes diques tem comportas ou adufas de distancia em distancia, afim de soltar a água quando se quer inundar o arrosal. A melhor água para regar é a dos próprios arrosaes, depois segue-se a dos rios e torrentes, as peiores são as dos alagadiços e pântanos. Se não houver outra senão dos poços e fontes, convém fazel-as passar por um canal onde se lancem estrumes, taes como os estéreos de ca- vallo, de carneiro ou de cabra, o lodo dos rios e dos canos, etc. (1) Os arrosaes devem estar bem expostos aos raios do sol, porque sem isto as plantas são fracas e dão pouco grão, e esse mesmo é tão duro que dificilmente se co- sinha. Quanto ao arroz secco, elle pode vegetai* nas plani- cies,nas inclinações das montanhas e mesmo em gran- des elevações nos paizes onde as chuvas são regulares. Mas convém colhêl-o apenas maduro, porque senão per- de-se muito, sobretudo quando sopra grandes ventos. PREPARAÇÃO DO TERRENO. Quer para os arrosaes permanentes, quer para os arro • saes alternos, o primeiro cuidado a tomar é formar uma ou muitas superficies planas para que a água de irriga- ção não deixe nenhum logar secco, nem fique estagnada em outros. No primeiro caso, elle não germina; no se- gundo, elanguece e fica sujeito á ferrugem. Começar- se-ha portanto por nivelar o terreno; se esse terreno fôr julgado muito vasto, póde-se dividil-o em muitas porções, porém cada uma dellas bem plana. Estas por- ções são espécies de canteiros cercados de pequenos mu- (1) Veja a — Voyage autour du Monde sur Ia corvete ia Bo- nite — P. A. de Ia Salle, Tomo III pag. 125. - manual da cultura ros de terra, altos de palmo e meio a dous palmos e com a espessumde tres palmos. O seu fim é reter as águas de iírieaeao, e bastantemente fortes para nao deixar es- capar a a«mà, e para que os trabalhadores possão passar. Mas estes"diques devem ser construídos de modo que de um lado formem uma barreira longitudinal a qual deve durar tanto como o arrosal, e outros transversaes cor- tando ammlarmente a direcção das correntes d agua, o-uardando-se uma tal symetria que. depois de acaba- dos o arrosal fique dividido em polygonos mais ou me- nos' regulares. A grandeza destes polygonos deve ser principalmente regulada pela differença de nível dos Planos de cima para baixo, multiplicando-os quando o terreno for inclinado, sem o que, haveria muito trabalho em reduzil-os a um só plano horisontel. A extensão destas subdivisões é também subordinada a considera- ção de que quanto maiores forem, maior impressão tara as ventanias, sobretudo quando os pés ainda se achao fracos e apenas seguros na terra por tenras radiculas. Finalmente esta extensão também deve ser regulada pela abundância ou escassez da agua de que se pode dispor • porém ellas devem ser o menos numerosas que fôr possivel, pela difficuldade de conservar a agua no nível conveniente, pela grande despeza e trabalho, e ainda pela perda de muito terreno oecupado com os muros ou diques de terra. Emfim, estes diques devem ser construídos de modo, que cada uma das repartições possão ser regadas, conservando as águas o nível neces- sario, sem que se extravase, e se conserve como em um tanque. Faz-se passar essa agua de um a outro ^ogar, por meio de pequenas aberturas, que se abrem e íecnao á vontade. Depois de regar os espaços plantados a ao-ua deve entrar toda em uma valia que tem sahida para o exterior do arrosal, afim de renoval-a todas as vezes que se quizer, cu para seccar o terreno. Mas, antes de construir esses diques, convém lavrar bem o terreno : quanto mais movei elle estiver, tanto melhor vegetará o arroz. Na oceasião de cavar o terreno convém estrumal-o com o estéreo ordinário e com as palhas que resultarão do descascamento do arroz. DO ARROZ. y Todavia, como o arroz teme as terras muito ricas ou muito estrumadas, não é necessário estrumal-o senão de tres em tres annos, salvo se a magreza da terra e das águas indicarem a necessidade de o fazer com mais ire- quencia. Na Lombardia a dose de estéreo é de 152 quintaes por geira. Se os arrosaes são permanentes, quando se quer lazer uma nova sementeira é necessário preparar de novo o terreno. Para isso se arrasão os diques ou muros trans- versaes, lavra-se e estruma-se de novo ; levantão-se outra vez muros transversaes, enchem-se os canteiros ou tanques d'água, e no fim de dous ou tres dias, se faz esgotar o excesso d'água, e semea-se então. CULTURA E COLHEITA DO ARROZ. Os methodos de cultura do arroz varião de um a outro paiz senão quanto á sua marcha geral, ao menos quanto a seus detalhes. Mas como esses detalhes dependem ge- ralmente da natureza do terreno e do clima, é interes- sante conhecêl-os, pois que o cultivador de arroz pode aproveitar as praticas dos paizes em circumstancias ana- logas quando julgar que ellas são preferíveis ás que em- prega Não é portanto inútil referir esses diversos me- thodos ainda que dahi resultem algumas repetições. Na China, onde a cultura desta graminea se faz em grandiosa escala, o arroz destinado a ser semeado é posto em saccos dentro d;agua onde o deixão durante alguns dias ; esta operação preliminar tem por resultado apressar a germinação. A terra, depois da sementeira, é super abundantemente regada a ponto de ficar quasi reduzida á consistência de lama ; depois disto ella é la- vrada por meio de uma charrua ligeira arrastada por um bufalo. Passa-se depois uma grade grosseira, cujo fim é partir os torrões de terra e unir a superfície. Ii- rão-se cuidadosamente as pedras e arrancão-se as ervas inúteis; introduz-se de novo água no campo, e passa-se de novo uma grade com muitas ordens de dentes de ferro para completara preparação da terra. A sementeira se faz unicamente com os grãos de arroz que começarão a ger- 10 MANUAL DA CULTURA minar na agua, e somente em uma porção do campo. São suficientes 24 horas para que as plantas comecem a mostrar o vértice de sua primeira folha fóra da terra, e logo que isto acontece rega-se com agua de cal, afim de destruir ou de afugentar os insectos. Os chins dão uma grande importância a esta operação, a qual nao somente faz desapparecer os insectos, como tambem destróe as ervas inúteis e preserva as plantas da fer- rugem. Se as plantas estão muito juntas, elles arrancão os pés superabundantes com muito cuidado, e o replan- tão nas partes do campo que para isso se deixarão de propósito sem sementes. Logo que esta operação está terminada, introduzem agua nos diques, tendo o cui- dado de elevar gradualmente o seu nivel á medida que as plantas vão crescendo, sem que entretanto fiquem submergidas. Para obter este resultado, dispõem oterre- no em canteiros divididos por muros de terra, o que torna o campo ou cada porção delle em seu verdadeiro tanque. Concebe-se facilmente que a cultura por este modo não pôde ter logar senão ao longo ou nas vizinhanças das correntes e dos canaes. Quando o nivel das águas é in- ferior ao dos canaes e correntes, basta abrir as compor- tas ou adufas para inundar os arrosaes ; no caso contra- rio os chins empregão machinas hydraulicas grosseiras ou simples baldes. Emquanto não se faz a colheita, arrancão cuidadosamente as ervas, operação mui pe- nosa, pois que o trabalhador é obrigado a estar enter- rado até o joelho em agua e lodo. A colheita do arroz se faz na China cortando as espigas com a fouce do sega- dor, fôrma feixes que transporta para baixo de paiho- ças, e alli as bate com o mangoal afim de separar os grãos. Para descascar o arroz os chins empregão o bo- cardo ou machinas de pilões inteiramente semelhante ao que se emprega para descascar o café. A parte mais importante e a mais difficil da cultura do arroz é a das irrigações, e para isso na índia e na China se construem grandes canaes que recebem toda a agua aproveitável, a qual corre para outros canaes que a levão directamente para os arrosaes. Em algumas partes da Itália, assim como na China DO ARROZ. 11 e no Egypto, esperão que os rios transbordem, ou juntão agua em grandes tanques ou depósitos, que reservão para quando fôr necessário. Na Itália arão e gradão a terra, a embebem em pouca agua e semeião á mão, sem nunca mais deixar sahir a agua até que o arroz esteja em estado de ser colhido ; por conseguinte, todas as operações se fazem como na China, tendo o trabalhador as pernas mettidas n'agua até aos tornozellos. Os terra- plenos ao pé dos declives das montanhas se abastecem com a agua que vem das mesmas montanhas, ou dos terrenos cujo nivel é mais alto do que o dos rios ou dos canaes, e se regão por meio da Noria ou de outras machinas. Na Carolina do Sul, no meiado de Março, se divide a terra em regos espaçados entre si, de 10 a 12 pollega- das, no fundo dos quaes se semeião os grãosá mão, porém de modo que não fiquem muito juntos. Innun- da-se depois o terreno na altura de uma pollegada pou- co mais ou menos, e conserva-se neste nivel durante cinco dias, no fim dos quaes se faz correr esta agua até que a terra fique descoberta, e assim se conserva, em quanto as plantas não tem chegado a tres ou quatro pollegadas de altura, o que de ordinário tem logar um mez depois da sementeira. Então innunda-se de novo o arrosal, e deixa-se a agua em repouso durante 15 dias, afim de fazer morrer as ervas inúteis e favorecer a ve- getação do arroz. Esgota-se de novo a agua, a terra fica a descoberto durante dous mezes, e capina-se muitas vezes; torna-se a introduzir a agua, que se deixa no cam- po até o momento da colheita,que tem logar desde o fim de Agosto até Outubro. Este modo de cultura, deixando alternativamente a terra innundada e a descoberto, cau- sa tal insalubridade, que os negros cultivadores são an- nualmente disimados. Na Hespanha e norte da Itália, a agua fica constan- temente nos arrosaes, até o tempo da colheita. No reino de Valencia, a mesma colheita se faz com os arrosaes cheios, de sorte que os segadores têm agoa até os joelhos. Ha poucos annos, começou-se a introduzir a cultura do arroz no delta do Rhodano e nas terras salgadas e 12 MANUAL da cultura pantanosas que se estendem em uma considerável su- perficie, ao longo do Mediterrâneo. Uma dupla vanta- gem parece dever resultar destas tentativas ; principal- mente a de tirar partido de terras até agora quasi in- teiramente improduetivas ; e em segundo logar, a de converter essas superfícies em terras susceptíveis de cultura de outros cereaes. Nas Antilhas, prepara-se o terreno depois das gran- des chuvas de Junho a Setembro, estação que corres- ponde no hemispherio sul á do quartel de Novembro a Março. Abrem-se valletas separadas entre si cie 14 a 16 pollegadas em cujo fundo se deposita com cuidado a se- mente, a qual depois se cobre com duas pollegadas de terra. As tres quartas partes de um alqueire basta para semear uma geira. Terminada esta operação, abrem-se as portas dos diques, e derrama-se água até que cubra o terreno ; logo que se percebe a germi- nação do arroz, fechão-se as portas dos diques, e não se torna a regar senão no fim de 4 ou 8 dias. Logo que a planta se levanta, supprime-se a rega até que ella cresça á altura de algumas pollegadas, e então limpa-se a terra das ervas inúteis, e revolve-se os espaços intermediários, deixando os sulcos seccos du- rante 2 ou 3 dias, para que essas ervas morrão pela força do sol. Depois disto faz-se correr a agaa pela ter- ceira vez, e deixa-se o terreno innundado durante uma semana ou dez dias, porém de sorte que a altura da agoa nunca exceda de 3 ou 4 pollegadas. No fim deste tempo, torna-se a deixar sahir a água, e depois que a terra se acha bem secca, cava-se de novo nos intervallos das valletas, limpando bem as ervas. Limpo deste modo o terreno, recebe água pela quarta vez, e se conserva por 3 ou 4 dias, no fim dos quaes se faz a colheita no mo- mento em que se nota que os grãos mais baixos das es- pigas começão a dourar-se. O tempo decorrido desde a sementeira até a colheita varia entre quatro mezes e meio a cinco, termo médio ; algumas variedades exigem até oito mezes para amadu- recer, entretanto que outras apenas exigem tres mezes, I DO ARROZ. 13 e ás vezes menos. Afíirma-se, porém, que esta ultima variedade prematura produz arroz de qualidade inferior. Em alguns logares planta-se o arroz em covas aber- tas com a enxada, ou em buracos feitos com um páo ponteagudo. Este ultimo modo de semear tem logar quando a terra está muito cheia de raizes, que não con- sente o trabalho com a enxada ; deita-se em cada bu- raco tres, quatro ou cinco sementes que se cobrem dei- tando sobre ellas a terra das bordas do buraco. Quando no fim de muitos annos, as chuvas, os orvalhos e o calor têm feito apodrecer as raizes, póde-se então lavrar a terra á enxada e semear em buracos feitos com o páo ponteagudo ou plantador. A quantidade de sementes varia segundo as condições em que se acha o arrosal. Já vimos qual era a quanti- dade de sementes empregada nas Antilhas. Em vários logares da Europa onde se cultiva o arroz, se a terra é tenaz e o arrosal novo, emprega-se meio alqueire de se- mente por geira ; se o arrosal é velho e foi recentemente estrumado, emprega-se pouco mais de tres quartos de alqueire. Esta quantidade é sempre necessária nos terre- nos molles que se cultivão á mão. Antes de semear, põe-se o arroz de molho durante 8 ou 10 horas mettido em saccos, tirão-se depois estes saccos e deixa-se escorrer a água. Diante do semeador marcha um cavallo arrastando um pesado pranchão que aplana o terreno, e o arroz se espalha á mão. Não se co- bre a pemente com terra, mas como a operação é feita em um terreno muito humido, ella fica coberta com o lodo que se deposita logo que a água cessa de ser agi- tada. Para dar calor á água e ao terreno, e favorecer a pri- meira germinação, dous ou tres dias depois da sêmen- teira, faz-se sahir toda a água do arrosal. Quando appa- recém as primeiras folhas das plantas, introduz-se nova água, porém nunca de modo que ellas fiquem submersas. Entretanto se as novas plantas são atacadas por insectos, põe-se o arrosal a secco para os fazer morrer; porém, em geral, eleva-se gradualmente o nivel da água desde a apparição das primeiras folhas e á medida que as plan- 14 manual da cultura tas vão crescendo, até mais de metade de sua altura. Se durante este tempo soprão grandes ventos, abaixa-se subitamente o nivel d'agua, não se deixando senão uma camada pouco espessa, para que a grande agitação das águas não deite as plantas por terra. As más ervas não tardão em apparecer á superfície d'agua : a mais freqüente e nociva é o pé de gallo (pa- nicum crus g alli), denominado pelos Italianos giovani, porque cresce com o arroz e se assemelha tanto que custa a distinguir. Então é necessário capinar-se com muito cuidado e á mão. operação muito custosa e insa- lubre, que quasi sempre é feita na Itália por mulheres. Todavia um arrosal bem capinado fica livre de más ervas durante muitos annos. Na época da vegetação mais vigorosa, vê-se algumas vezes que o arroz se torna débil e amarellado ; tira-se então a água afim de restituir-lhe o vigor pela acção di- recta e immediata do sol. Outras vezes elle superabunda em folhas que tomão grande desenvolvimento e uma côr verde escura. Os agricultores não estão cie accordo sobre o tratamento que convém applicar a este excesso de ve- getação herbacea cujo effeito é comprometter a forma- ção do grão: uns dão um curso mais rápido á água para que ella não tenha tempo de augmentar ; outros, pelo contrario, fazem parar a circulação para que ella se es- quente fortemente e enfraqueça as plantas. E' provável que situações diversas recommendão um ou outro destes meios. Passado este momento, se se pôde dispor de uma cor- rente continua, deve-se sustentar a inundação em toda a sua altura por uma introducção regular. Em certos logares da Itália, sobretudo na Lombardia e no Pie- monte, onde não se recebe as águas dos canaes senão de 6, 8, ou de 10 em 10 dias, innunda-se o arrosal nessas épocas, e fecha-se bem todas as sahidas para fazer parara água nos canteiros pelo maior tempo possível. A ex- periencia ensina que o arroz se conserva e cresce bem, ainda que banhado unicamente por irrigações periódicasainda que o arrosal fique a secco durante 5, 6 ou 8 dias do arroz. 15 de intervallo de uma a outra innundação, sobretudo se o terreno é argiloso e tenaz. Se antes do arroz começar a formar os seus paniculos, o arrosal começa a encher-se de ervas, sobretudo do pé de gallo, é preciso capinar dc novo. Para isto se faz pas- sar pelos sulcos muitos trabalhadores que, com os ins- trumentos próprios, cortão ao nivel dos pés de arroz essas más ervas, tendo o cuidado de não pisar o arroz, que é frágil e nunca mais se restabelece. Em alguns paizes costuma-se cortar as grandes folhas na época em que o arroz se approximada sua madureza, com o fim de retardar a fructificação das plantas mais adiantadas. Quando os paniculos de arroz se inclinão e tomão uma côr amarella avermelhada, reconhece-se que elle chegou á sua perfeita madureza : então o grão se parte facilmente com a unha sem deitar licor leitoso, e as has- tes e folhas amarellão. Porém como todas as plantas do mesmo canteiro não amadurecem simultaneamente, deve-se escolher o momento em que a maior parte do arroz do canteiro está bem maduro para fazer a colheita. Os arrosaes de culturas alternas amadurecem mais cedo do que aquelles que são perpétuos ; aquelles cujas águas são mais quentes, do que aquelles que não tem uma temperatura tão elevada. O arroz se corta com a fouce do segador, como o tri- go ; os trabalhadores fazem feixes de espigas, que são expostos em terreiros aos pés de cavallos, para separar o grão da palha ; também se servem do mangoal ou da machina de bater, usada para o mesmo fim com o trigo. Uma machina deste gênero, modificada por Morosi e Colli, se acha muito vulgarisada ua Itália, onde presta grandes serviços, poupando muitas fadigas aos traba- lhadores. Os americanos usão de machinas mui vanta- josas,tanto para separar como para descascar o arroz (1). (1) Consulte-se o Manual de machinas, instrumentos e mo- tores agrícolas. Os moinhos d'Evans, de Philadclphia são os mais completos possíveis. Desde o lançamento do grão (trigo, milho, arroz, etc.) no moinho até o seu ensacamento, tudo é feito sem soecorro de forca humana. IQ MANUAL DA CULTURA Uma vez separado da palha e bem secco, o arroz pó- de-se guardar por muitos annos, sem temer o ataque dos insectos e sem se alterar. Perde pelo descascamento 39 por cento, e rende, com casca, de 2 a 4 alqueires por o-eira, conforme a situação e qualidade das terras. As menores tem logar nos arrosaes regados pelas águas das fontes ; as mais fortes são devidas ás irrigações das ao-uas dos rios, dos canaes e dos próprios arrosaes.°0 afolhamento dos arrosaes alternos varia muito ; por exemplo depois de ter semeado tres annos consecutivos o campo com arroz, desseca-se, estruma-se e semea-se de milho, ao qual se segue o trigo e depois o centeio. Se não é possivel estrumul-o, põe-se em alqueive, ou então semea-se trigo, depois trevo, e volta-se ao arroz depois da colheita dessa forragem, etc. Qualquer que seja a combinação cultural, a do arroz dura tanto como como a dos outros vegetaes em terreno secco. Os arrosaes alternos dão mais produetos do que os ar- rosaes perennes, porém tambem oceasionão maiores des- pezas, por quanto é sempre necessário dispor de cada vez o terreno, destruir e tornar a levantar os diques em cada rotação. A colheita se faz, cortando o pé na distancia de 3 a 4 pollegadas acima do chão. Depois de cortado o arroz, rebenta de novo e produz uma excellente forragem para os animaes. Em alguns logares o deixão produzir segunda vez, mas nesta segunda vez elle dá muita palha e pouco grão ; entretanto em certas localidades póde-se fazer tres colheitas suecessivas no mesmo terreno. O arroz lança uma espiga em fôrma de cacho, de 3 a 4 pollegadas de comprimento, que contém de 30 até 50 grãos ; e como cada semente lança muitos tubos, caleu- Ia, termo médio, que o arroz rende cem por um. Cem libras de espigas dão ordinariamente 75 libras de arroz descascado ; porém o mais commum é obter-se de 40 a 50 libras. Nas duas Carolinas, avalia-se o producto de uma geira de terra em 500 libras de espigas, que dão 20 al- queires de arroz em casca e 8 de arroz descascado. Nos districtos do Friul (Austríaco) tem-se vulga- DO ARROZ. 17 risado tanto a cultura de uma variedade de arroz sem barba (Oriza mutica denudata), que alli se não encon- trão mais arrosaes do arroz sativo commum. O arroz mutica não está tão sujeito a moléstias como o arroz sativo, e amadurece mais cedo. O primeiro chega a amadurecer completamente naquelles climas no fim de Agosto ou no principio de Setembro, entretanto qne o arroz commum não amadurece senão em Outubro, sendo semeado na primeira metade do mez de Maio. A preciosa propriedade de amadurecer tão depressa o livra de ser arrancado pela geada, pelas innundações e borrascas, que muitas vezes apparecem no mez de Se- tembro e destroem o arroz commum. Além disto, como no mez de Agosto chove menos do que no de Setembro, pôde debulhar-se o arroz com tempo enchuto, e dar-se a palha aos animaes para comer, em logar de servir-lhes de cama. O arroz mutica excede muito ao sativo em fecundi- dade, de maneira que, de dous campos semeados um com arroz commum, e o outro com o arroz mutica, o pri- meiro dará dez alqueires e o segundo quinze ; havendo ainda uma notável differença de peso entre o alqueire de um e de outro, em favor do arroz mutica. Um alqueire deste ultimo pesa cerca de 12o libras, quando do com- mum pesa cerca de 100. (1) Uma tão notável differença no peso das duas espécies provém de não serem os grãos igualmente conformados. Os do arroz commum têm na parte de uma de suas ex- tremidades um pellosinho que não se acha no mutica. O arroz mutica tem uma côr mais escura do que o commum, e por isso tem no mercado um preço inferior a este ultimo ; mas é tão pequena a differença de valor quando se confrontão todas as outras vantagens que concorrem no primeiro, que essa mesma differença de valor desapparecerá quando os consumidores se ccnven- cerem que o arroz mutica não cede nada em sabor ao (1) A Sociedade fez distribuir em 1857 sementes da Oriza mu- ti.i.i cultivada no Friul. 18 manual ua CULTUP.A arroz commivin, tendo de mais a vantagem de augmon- tar de volume quando é cozinhado, epor isso mais eco- nomico do qne o arroz commum. O arroz mutica pôde cultivar-se na mesma qualidade de terreno que o commum, e precisa de muito menor quantidade d'agua. Quando, depois de quatro a seis annos, o arrosal já não produz, costumão deixal-o em repouso por tres ou mais annos, podendo-se neste intervallo semear milho, trigo, aveia e plantas forrageiras. Eis o systema de afo- lhamento usado no Friul: Io armo.—Colhido o arroz do ultimo anno no mez de Novembro, revolvem-se os canteiros do arrosal, tra- balha-se a terra com a charrua, e nos logares baixos se abrem vallas para o esgoto das águas. No principio do Maio, trabalha-se de novo com o arado, grada-se e piau- ta-se milho. 2o anno.—Colhe-se o milho, arraneão-se os pés, la- vra-se a terra com a charrua, grada-se e planta-se tri- go ; colhido este, repete-se o mesmo trabalho, e se- meão-se plantas forra geiras, que commumelite é o trevo. De ordinário semêa-se o trevo quando o trigo já está crescido, e quando o grão deste cereal está maduro, co- lhe-se, deixando somente o trevo. 3o e 4° annos.—Prados artificiais. ¦5* anno.—No inverno tornão-so a fazer os canteiros, enche-se cie novo as vallas, e na primavera faz-se lavrar a terra com a enxada, misturando-a com o próprio trevo ; terminada esta operação, aperfeiçoão-se os canteiros, de modo que possão sustentar a agua que se introduz no arrosal, e nos primeiros 15 dias do Maio semêa-se o arroz mutica. Este methodo fertilisa o terreno de novo, e durante 3, 4 e mesmo 5 annos elle dá boas colheitas como da pri- meira vez. O arroz secco ou de montanha, pertence á variedade mutica ; ao contrario do sativo e mesmo das outras va- riedíides de sua espécie, vegeta mal nos terrenos baixos e demasiadamente hum idos : affirnrt-so que elle só pro- ix i ar noz. 19 duz bem e dá bello grão nas eminências arenosas e es- tereis. A sua altura apenas excede de um palmo a pai- mo e meio. íSemêa-se geralmente,em pequenos buraco!., separados 18 pollegadas uns dos outros, que se cobrem logo á enxada ou com a pá. iías Àntilhas., o semeião durante o mez de Maio, e dá soca e ressoca de ordina- rio; para isto basta cortal-o raso corn a terra na oceasáião da colheita. Alguns preferem semear o arroz á mão e ao acaso, cobril-o com terra e depois recobrilro com as folhas velhas e cascas do mesmo arroz, até á altura de 2 pollega- das, porque assim se evita o crescimento cias más ervas e se nutreao mesmo tempo o grão, que se fertilisa com os seus próprios resíduos. A sétima parte de um sacco é sufficiente para semear uma geira de terra ; nas terras altas elle produz 1,000 libras por geira. O methodo usado na ilha de França e outras colo- nias Européas para separar o arroz de sua palha, con- siste em uma espécie de giráu formado por quatro es- taças fincadas no chão e com 2 ou 3 pés de altura e de duas varas amarradas á essas estacas. Por baixo desse giráu se estende um panno ou uma esteira, e um trabalhador bate successivamente as espigas sobre as varas, o que faz catar os grãos sobre a esteira ou panno. Por esta operação o arroz conserva a sua pellicula, e dão-lhe o nome cie arroz em palha ; neste estado é que elle é próprio para semear-se, contrariamente ao trigo que não nasceria se lhe conservassem a palha. Antes de o guardar, convém seccal-o bem ao sol, e pondo-o depois em logar seeco, conserva-se bem ate 20 annos, se todavia não é atacado por uma espécie de borboleta. Neste caso, é indispensável descascal-o, o que se faz em pilões ordinários, etc. Depois de pilado, é necessário pe- neiral-o por meio de peneiras ordinárias ou de venti- ladores, e obtém-se então, além dos gráos inteiros ou partidos, uma espécie de farinha, que é propriamente o germen do arroz. Diremos depois os usos desta farinha. . O arroz descascado pôde conservar-se muitos annos, tomando-se todavia o cuidado de o peneirar ao menos duas vezes por anno. sem o que elle tomaria um gosto 20 MANUAL DA CULTURA desagradável, e seria atacado, principalmente nos climas quentes, pelo pequeno insecto conhecido com o nome de g-orgulho. (1) cuidados que exige um arrosal. Um arrosal exige contínuos cuidados. E' necessário examinar os aterros, visitar o aqueducto e as comportas, evitar que a agua não se escape por fendas ou não falte, de modo que esteja sempre no nivel conveniente, e para isto é indispensável introduzir todos os dias nova agua afim de substituir aquella que a terra, o arroz e a evapo- ração consomem. O arroz não está livre das moléstias e acidentes que atacão os outros grãos. Apenas posto na terra lodosa onde deve vegetar, elle está ameaçado de destruição pelos animaes; se por ventura escapa dos pássaros, dos ratos e dos insectos, outros acidentes e moléstias o perseguem ; uma superabundancia de suecos nutritivos provoca a ferrugem ; os ventos o derrubão ; as chuvas acompanhadas de trovoadas durante a flores- cencia diluem e arrebatão os polens fecundantes ; as chuvas de pedra ou um grande sol, fendem os panicu- los ; as plantas parasitas o enervão ; em uma palavra, a espectativa do cultivador falha tantas vezes como na cultura dos outros grãos. 1NSALUBRIDADE DA CULTURA DO ARROZ E DOS MEIOS DE A REMEDIAR OU ATENUAR. Não obstante todos estes inconvenientes, e de outros ainda mais graves que resultão da grande insalubridade da cultura deste cereal, tal é a sua riqueza, diz Gaspa- rin, que uma vez introduzida em um Estado, todos os esforços da autoridade para limitar essa cultura naufra- gão contra a resistência do interesse privado. Tem sido em vão que os soberanos do Piemonte têm publicado erepetido por muitas vezes editos prohibindo ou restrin- (1) Veja-se o Auxiliador de 1839, pag. 163. 1)0 ARROZ. 21 gindo a cultura do arroz ; hoje, não podendo vencer as resistências, limitão-se a prohibir a cultura a certa dis- tancia da capital, das cidades e das praças fortes. O mesmo tem acontecido em outros paizes. Se a seguinte exposição da insalubridade da cultura do arroz, feita pelo acima citado agrônomo no seu curso de agricultura, fosse rigorosamente verdadeira, todos os governos deverião prohibir comas penas as mais severas semelhante cultura, e destruir a ferro e fogo os arrosaes por toda a parte." Os povos que se nutrem com arroz, diz elle, achão um alimento salubre á custa da saúde daqueiles que o cultivão ; e póde-se lastimar que a industria humana tenha achado o meio de cultivar terras pestilenciaès, muitas vezes mesmo de as crear, pois que não somente se conseguio fixar nelles homens cuja vicia é uma longa serie de enfermidades, como tambem attrahir. pelo en- godo do ganho, outros homens que deixão, na época da colheita, seus paizes saudáveis, para virem buscar os germens de febres perigosas-e obstinadas ; finalmente, os miasmas que escapão dessas terras vão ferir de morte os paizes circumvizinhoír'." Não somente a população se extingue nos paizes onde se cultiva o arroz e nâo existe senão por meio de uma renovação constante, porém as arvores perecem ao loiige, e a creação de novos arrosaes estende o circulo de seus estragos e destróe todas as outras culturas na distancia de muitas léguas, pelas infiltrações dágua que se formão no solo ; então é forçoso converter os terrenos invadidos subterraneamente em arrosaes permanentes, sob pena de os deixar sem producção, e é assim que a praga se estende progressivamente por toda a superfície do paiz." Basta ter percorrido esses paizes (o agrônomo se refere ao Piemonte), e nós temos tido oceasião de o co- nhecer a fundo, pela longa residência que fizemos em Novare e na Lumellina. para saber que os habitantes dos campos vivem com uma febre continua, a qual, não obstante ter perdido os seus mais perigosos caracteres dura por toda a vida, febre acompanhada ou seguida de •_>*2 MAMAI. OA i.'l'L'J.'L'líA obstruceòes de ligado, de cachexia e de hydropesia ; que seu rosto amarellado, sua falta de actividade, aununcia o mal que os mina, e que todo o estrangeiro, por pouco que se demore, compromette a sua saude e vida. "Não existe moças ile 16 annos nos paizes de arroz, dizia Samte-Martin-Lamotte ; apenas chegadas á puberdade alcanção a idade madura, e depois, por uma rápida pro- gressão, chegâo á velhice. '" Em Outubro de 1801, con- tavão-se 8,000 febricitantes no districto de Bielle sobre urna população de 80,000 almas." Oonvindo no abuso de pur em cultura d; arroz terras naturalmente sãs, reclama-se em favor d'aquellas que são pantanosas e onde os arrosaes contribuirião para sanear o terreno, procurando-se um escoamento regular ás águas e conservando no verão urna camada d'água corrente própria para prevenir maléficas exhalações. Mas não se percebe que essa cultura chama a habitar esses paizes uma população quo, sem ella, iria buscar ao longe outras occupações, e que, demais, ella attrahe, no momento o mais perigoso, que é o da colheita, um grande numero de robustos montanhezes que vêm, por um miserável salário, perder a saude e a vida. " Ha sem duvida grande exageração nesta horrível des- cripção. Se ella fosse exacta, o paiz examinado pelo illustre agrônomo, se acharia despovoado, e entretanto elle augmenta regularmente em população. O mesmo se pode dizer dos outros paizes onde se cultiva oarroz,,isto e, de grandes extensões de terreno em todas as partes do mundo. A Carolina do Sul, a índia, a China, não deve- rião ter mais habitantes, e entretanto a população mui- tiplica-se em todo o mundo como as formigas. As causas da insalubridade dos arrosaes são as mes- mas que tornão pestilenciaes os pântanos, os charcos, o, em geral as águas stagnadas. Os meios que hoje se empregão para sanear estes últimos, são igualmente applicaveis aos arrosaes. 1.° O perfuramento do terreno para dar sahida ás águas infectas ; 2.° A Drainaje subterrânea ; 3.° A Drainaje exterior, ou vai Ias de esgoto; DO ARROZ. 2M 4.° A maniajem, e ainda melhor a caldeajem das ter- ras destinadas a serem convertidas em arrosaes. O citado agrônomo parece desconhecer estes meios ; mas, na época em que escreveu o seu excellente curso de agricultura, (1) elle se congratulava e applaudia os esforços que já se fazião para diminuir osmalles causa- dos pelos arrosaes. Cí E' muito louvável, diz elle, pro- curar melhorar a hygiene dos habitantes, e dar-lhe uma melhor nutrição ; sobretudo parece que se obteve gran- des vantagens dando-lhes uma bebida sã e fresca, abrindo poços que não permitteni a infiltração cias águas dos arrosaes. " Cita a este respeito a obra de Giovanetti, intitulada:— Do regimen das águas, e termina deste modo : " Não duvidamos que seja possível produzir ai- gum bem por esses cuidados bem dirigidos, mas é pela cifra relativa da poptdação e das enfermidades que se deve decidir a questão da pretendida innocuidade dos arrosaes. " Esta questão cuja solução tem tão grande importan- cia em beneficio cia humanidade, pode resolver-se de uma maneira satisfactoria, sanificando os arrosaes pelos meios acima apontados e pela execução dos preceitos hygieuicos bem conhecidos. Não basta tornar os arro- saes inoffensivos á saúde ; é necessário ainda que, além da alimentação, do vestuário e da bebida, os trabalhado- res não estejão, sobretudo na época da colheita, sujeitos ás enfermidades que necessariamente devem resultar de estarem durante muitas horas com os pés dentro d'agua e a cabeça exposta a um sol ardente. Não se deve esperar do genio inventor, animado pelo amor da humanidade, uni invento que preserve o mi- se.ro trabalhador deste ultimo inconveniente ? C0?.ÍP0SIÇA0 DO ARROZ, SUAS PROPRIEDADES E USOS. No momento da colheita, o arroz se compõe de 100 (1) Em 1S4R. 24 MANUAL DA CULTURA partes de grãos e 130 de palha, em peso, além da parte que fica no chão. O grão do arroz se compõe de 80 partes sera casca, e 20 de cascas. Depois de perfeitamente secco, Payen achou no grão, dividido em 100 partes: Amido 8,0 Glúten e albumina 7,5 Matérias gordas ....... 6,8 Gomma e assucar 0,5 Parenchima linhosa 3,4 Phosphato de cal e chlorureto de po- tassa 0,9 A dosajem do azoto deu 1,39 fjor 100, e o arroz nor- mal contendo 13,4 d'agua, 1,20 por 100. A dosajem da palha para o uso que delia se faz no sustento dos animaes, é avaliada por Gasparin em 0,24 por 100 em azoto no estado normal. O arroz exige uma quantidade de estrumes menor do que qualquer outro cereal, e quando as águas de rega não são cruas, ellas sós [iodem alimentar os arrosaes. Comparando esta analyse com a do trigo por exem- plo,conclue-se que o primeiro cereal é menos nutritivo do que o segundo; e que além disto, pela pequena quantidade de glúten quo contém não serve para fazer pão. Para diminuir o preço do pão de trigo pretendeu- se misturar a farinha de trigo com a do arroz; mas o pão que resulta desta mistura, quaesquer que sejão as proporções, é sempre compacto, sem sabor, indigesto, e endurece promptamente (1). Porém são tantos os modos de empregar o arroz como alimento, que se pôde sem pezar perder a esperança de o fazer servir para este uso. (1) O põo de arroz rie Amai, com punha-se ile 12 liLr.is do. Hiriiilifi «le trigo. 2 de pó de arroz o ü. ile nt>u... DO ARROZ. 1l.) Os usos culinários do arroz sãp tão conhecidos, que, pelo menos, é ocios*o fazer uma resenha de seus varia- dos empregos como alimento; basta dizer que o arrozé um artigo de sustento universal a gosto de todos os homens, e que em muitos paizes elle constitue a nu- trição quasi exclusiva de numerosas populações. Todo o mundo sabe que o pilau dos orientaes con- siste em arroz pilado amollecido com água fervendo ou por vapor, só ou temperado de diversos modos, e, final- mente, misturado com outras substancias. Já vimos que, depois de pilado e peneirado, o arroz deixa uma espécie de farinha formada pelo gerrnen do mesmo arroz. Com esta farinha se faz um caldo mui delicado, de fácil digestão, excellente para as crianças e os doentes, sendo sobretudo aconselhada para os in- dividuos atacados de dysenterias ou fluxos de sangue,*¦ 7 para quem tem máo estômago, e para os convalesceu- tes. A farinha ou o seu grão, são empregados nas mes- mas circumstancias, A sua decocção, vulgarmente co- nhecida com o nome de água de arroz, é administrada quer só, quer misturada com gomma, adoçada com xa- ropes, como calmante, em tisana, em clysteres. etc. ; finalmente, o arroz reduzido a farinha e depois a massa, serve freqüentemente para cataplasmas, preferíveis em muitos casos, ás de farinha de linhaça, porque secção t. fermentão mais lentamente. Na índia e na China o arroz serve para fabricar cer- ias bebidas alcoólicas conhecidas com o nome d'arrack e defacki, e diversas preparações alimentares desconfie- cidas em outros paizes ; reduzindo a sua farinha a massa, cozinhando-a com água até ficar em consistência de gomma, logo que secca toma uma solidez sufficiente para fabricar objectos d'arte e de utilidade. A sua palha serve para fizer esses tecidos variados, taes como chapéos, bolsas, etc, conhecidas com o nome de palha de Itália. A sua casca, denominada pelos Piemontezes — bulla, so dá aos cavallos depois de a ter ligeiramente molhado ; c porém considerado como uni nlimento modiocre e in- ferior ao fiivlb» de tri^ro. 20 MANUAL DA CULTURA O papel de arroz é feito com as as.tes de Msçhyno- mena paludosa, planta da familia das leguminosas, que cresce nas planícies pantanosas da índia. ESTATÍSTICA DO ARROZ. Todas as provincias do império cultivão o arroz. Em algumas elle chega para o consumo ; n'outras, para snpprir a deficiência da cultura, recebem este cereal daquelles que o colhem além de suas necessidades. Pará e Maranhão são as duas províncias do império onde se cultiva o arroz em maior escala, e por cujos portos se exportão quantidades mais consideráveis para paizes estrangeiros. " Não obstante a grande concurrencia dos Estados- Unidos, que encontramos em todos os mercados exte- riores a respeito deste artigo, e a qualidade superior do arroz da Carolina, nossa producção não tem escas seado, e não só alimenta nosso mercado, e consumo in- terno, com exclusão dos produetos similares estrangei- ros, como que abastece algumas praças no exterior, talvez que este ramo de cultura nos collocasse nos mer- cados exteriores a par dos Estados-Unidos, se houvesse mais cuidado em melhorar as sementes de que usamos. A sua cultura é acommodada ao trabalho livre, e não pôde deixar entre nós de progredir e prosperar, attent; a qualidade do nosso terreno " (1). A exportpção, nos 11 annos decorridos de 1839 a 1850, foi, termo médio, de 217,852 alqueires, no va- lor cie 511:325^000. A maior exportação durante este período teve logar em 1848, em que ella se elevou a 546, 795 arrobas. A exportação por provincias, foi, tambem termo médio e no mesmo período: i (1) Extraindo do Relatório tia romniissão pnrarregfida da iwis.ii> da Tarifa. IMi VIM;» ... 27 Ilio de Janeiro . . 37,558 alqueires. ._ Pernambuco . . . 2,171 „ Rio Grande do Sul. 479 „ Santa-Cátharina . . 6,219 „ Espirito-Santò . . , 120 ., Ceará. . . . . ""'" 1,029 Bahia. ..... 3,155 ,, Maranhão .... 84/269 Pará 75.262 8. Paulo .... 7,840 [, Parahyba .... n 2 Alagoas ..... ,, Nada consta.do Rio-Grande do Norte e Sergipe. A exportação de umas para outras provinciais, de 1844 a 1849, regulou termo médio, durante esse pe- riodo de 4 annos, ern : Rio de Jaueiro Maranhão. (1). . Pará Alagoas .... Rio-Grande do Sul S. Paulo. . . . Pernambuco Bahia Ceará Sergipe .... Santa Catharina . Espirito-Santo. 3,1*24 alqueires. .5,924 3,287 1,282 2 3,202 1,482 1,680 64 592 883 426' ii i *i 15 11 11 11 11 . •n (1 ) Consta do Relatório da Presidência do Maranhão, uni 1856. (|iie forão importados na capital da provinciaotiü,.70alqueires de arroz no valor de 582:852,f0-U rs., no triennio de 1852 a 1855, Na capital existião nessa época quatro grande» estabelecimentos de descascar arroz, um cuja forca motriz é o vapor, dous de vento, um de água e outro de animaes, produzindo 170,0'0 arrobas, das quaes loO,000 forão exportadas e 4O,0lÜ consumidas na capital. 28 .MANUAL. 17 A (717 l/r 171! A lm AKHU/, Ob paizes productores de arroz são os Estados-Um- dos as Colônias Européas, os paizes do Oriente, o Eo-vpto e outras partes da África. Na Europa, cultiva-se o arroz na Hespanha, na Itália, e ultimamente começou á introduzir-se em Erança e Portugal. Os principaes paizes consumidores de arroz do brazil são Portugal e os Estados do Kio da Prata. A taxa que paga o arroz do Brasil em Portugal eqüivale quasi a uma prohibição. Keunidos todos os impostos e alçava- Ias que sofTre este gênero, .o arrozdo Brasil paga 4$240 rs. por quintal ! Em Buenos-Ayres a taxa re- jrula na razão de 10 por cento, e em Montevidéu ua de 24 e meio, ad-valorem. índice. Historia., espécies e variedades de arroz, pa*:. . o Do terreno e situação que convém ao atroz. . 5 Preparação do terreno 7 Cultura e colheita do arroz 9 Cuidados que exige um arrosal. . . . . • 20 1 nsalubridade da cultura do arroz e dos meios de a remedeiar ou attenuar 20 Composição chimica do arroz, suas propriedades 23e usos Estatística do arroz -" ¦MU IrKUTIUJU ou TRATADO DA CULTURA E TRATAMENTO'DAS" ABELHAS. 7» MANUAL D'AGRICULTURA. — 1» D'ECONOMIA AGRÍCOLA. MANDADO PUBLICAR PELA SGCiSBA&S AUXILIADORA M Í_ÍB_STRÍA NACIONAL PELO Dr. Frederico Leopoldo César Burlamaqui SECRETARIO PERPETUO HONORÁRIO DA MESMA SOCIEDADE, ETC. SuIcb communes natos, consortia tecta Urbis habent, magnisque agitant sub legibus cevum; Et patriam solce et certos novere penates, Georgicas,— Lib. IV. RiQ M JANEIRO. T ypographia do Imperial Instituto Artístico Largo de S. Francisco de Paula n. 16. 1864. MANUAL PE APICULTÜRA OU TEATADO DA CULTURA E TRATAMENTO DAS ABELHAS. Introdução. Depois do bixo da seda, o insecto que merece mais chamar a attenção dos cultivadores em geral, é cer- tamente a abelha, qne antigamente representou um , grande papel na economia domestica, quando o as- sucar era ainda raro, e quando a arte de preparar o sebo e applical-o á illuminação era desconhecido (*). Se a abelha não é mais indispensável pelo seu mel, todavia esse mel ainda serve para condimento adoçante ou para regalo, podendo-se empregal-o na fabricação da agoardente, do vinagre, melhor ainda na do hydro- (*) As velas de sebo forão nos primeiros tempos de sua invenção, isto é no 13° secuio, pouco mais ou menos, um objecto de luxo; até então a illuminação era feita com ar- cbotes ou azeite. MANUAL DB apicultura. mel, a bebida favorita dos antigos, e que o é ainda hoje dos povos do norte da Europa, onde não cresce a vinha. Quanto á cera, não obstante a variedade de matérias de illuminação, sebo, espermacete, stearina, paraffina, óleos vegetaes e mineraes, e gaz, o seu uzo é tão extenso que o seu valor ainda não baixou conside- ravelmente, e o seu depreciamento não terá_ logar em quanto ella servir para a illuminação das igrejas e para as pompas fúnebres. O numero de espécies de abelhas é por assim dizer infinito; cada paiz contem espécies peculiares, que varião no mesmo continente, de continente a continente, de ilha a ilha. Muitos naturalistas, sobre tudo Latreille, nos tem dado excellentes trabalhos sobre estes insectos; mas a monographia das diversas espécies de abelhas está ainda mui longe de ser completa. Na Exposição Nacional de 1861, forão vistas mais de 50 espécies de abelhas, ou de ceras de diversas províncias, taes como Minas, Ceará, Amazonas, etc. Algumas destas abelhas produzem um mel delicioso, porém apenas uma espécie que fabrica o seu cortiço nas umbaubas ou embaybas, cecropias, arvores mui abundantes nas ilhas e margens do Amazonas, e seus confluentes, pro- duz cera branca, superior á da abelha domestica. A abelha domestica, que produz a cera de uso com- muni, nos veio da Europa. Alguns a suppõe oriunda da Azia e outros da África; é certo porém, que essas abelhas vivião e prosperavão nas vastas florestas da Germania, das Galias e da Scandinavia, e ainda vivem no estado selvagem nas florestas da Polônia e da Rússia; não fallando na abelha Liguriana, que occupa particularmente a Itália. Muitos escriptores. se tem oecupado com a questão da naturalisação das diversas espécies de abelhas. Não entro nesta questão. O trabalho da naturalisa- ção é mui difficil, sobre tudo, quando se trata da domesticação de um animal selvagem; portanto a cultura de um insecto já domesticado, é sempre pre- ferivel, por isso mesmo que é doméstico. MANUAL DE APICULTURA. A principal objecção que apresentão contra _ a abelha domestica é o seu ferrão; e julga-se de_ muita conveniência substituil-a por outras espécies ínoíten- sivas; deve porém reflectir-se que o homem tem meios de preservar-se do mal que causa essa arma, mas que se abelha a não tivesse ficaria impossibilitada de defen- der-se contra seus numerosos inimigos. A criação das abelhas é uma industria fácil e mui rendosa; todos os lavradores podem delia tirar muito proveito, sem que para isso se necessite do emprego de grandes quantias, nem de muitos braços. 0 capital necessário para exercer esta industria, mesmo em grande escala, consiste no que se gasta nas colmêas, e muitas dezenas destas podem ser tratadas por algumas mulheres ou inválidos. Importa mesmo que as abe- lhas sejão vigiadas e tratadas por indivíduos cujo sexo ou idade os torne naturalmente pacíficos e pacientes. A cultura das abelhas offerece duas faces interessan- tissimas. Em primeiro logar ella pode estabelecer-se em máos terrenos, e por seu meio obter-se lucros miportan- tes Mais de um logar que a natureza parecia ter con- demnado a uma esterilidade absoluta, se tem tornado rico e populoso depois que a cultura das abelhas come- çou a prosperar. _ Em secundo logar as abelhas não somente sao úteis pelo seu mel e sua cera, mas por uma outra circums- tancia geralmente desconhecida, e que tem grande im- portancia. Kemechendo sobre as flores, ellas favorecem a fecundação dos germens e firmão por conseqüência a colheita dos fructos. A natureza que nada fez em vao, quiz que a abelha, dilacerando as cápsulas que encerrao o pó fecundante, facilitasse a dispersão desse po (poi- len) e mesmo que o levasse para outras flores, tecun- dando assim, directa e indirectamente os vegetaes. Esta funccão é de tal importância para a agricultura, que ella só vale mil vezes mais, do que os produetos pro- prios da abelha. , Neste pequeno Manual procurei condensar tudo quanto pode interessar ao apicultor, e creio que, mesmo para aquelle que nunca exerceu esta industria, este tra- manual de apicultura. balho não será sem utilidade; mas antes de terminar esta pequena introducção, em geral dirigirei aos nossos lavradores a mesma admoestação que o marquez de Neufchateau dirigio aos lavradores Francezes, no seu Diccionario de Agricultura Pratica. 11 O apicultor que não tira de sua posição todo o produeto que pôde obter, faz prova de impericia ou de negligencia, falta aos seus deveres para com a sua fami- lia, da qual poderia facilmente augmentar a abastança, e não possue esse sentimento de interesse nacional que deve dirigir os esforços do homem, amigo de seu paiz, para todos os melhoramentos que o podem livrar de pa- gar tributos ao estrangeiro. " Historia natural das abelhas. Para o vulgo, a abelha é simplesmente uma mosca que produz mel e cera ; para o naturalista, a abelha é um insecto da ordem dos kyménopteros, isto é, daquelles que voão por meio de quatro azas nuas, membranosas e desiguaes. Latreille incluio este insecto na tribu dos melliferos ou apiarios, na segunda familia dos authophilos ou amigos das flores; porque é nas corollas das flores, queornão os bosques, os jardins e os prados, que estes hy- ménopteros vão buscar o pollen com que fabricão suas habitações e o mel com que se sustentão a si e a seus descendentes. As abelhas formão uma sociedade bem policiada,fundada todavia na desigualdade das condições, pois que tres castas e talvez mesmo quatro, são anatômica-mente caracterisadas*. manual de apicultura. 7 § 1.,—conhecimentos preliminares.—füncções de cada enxame que compõem uma família.—cons- trucção dos alveolos.—criação das larvas. Enxame, colônia ou familia de abelhas. Denomina-se enxame a uma familia reunida em uma só colmêa, e trabalhando em commum. Dá-se muitas vezes o nome do contendo ao conti- nente, chamando colmêa a uma colônia ou familia de abelhas. Diversidade das abelhas que compõem um enxame. Um enxame de abelhas se compõe de tres variedades de insectos : Io, uma fêmea, a que se dá o nome de rainha, de mãi ou de abelha-meslra ; 2o, de machos ou zangões ; 3o, de obreiras ou fêmeas estéreis, que formãoo povo dos enxames, e ás quaes se dá especialmente o nome de abelhas. O numero das obreiras varia muito, e pôde ser de 15,000 a 20,000 em uma colmêa ordinária. Quatro mil abelhas mal pesão uma libra. Funcções da abelha-mestra. A rainha ou abelha-mestra é mais grossa e alongada do que as obreiras (fig. Ia) ; distinguindo-se também por uma côr mais brilhante. As suas funcções são pôr ovos e servir de centro ao enxame, sobre o qual reina sem rival. Alguns dias depois do seu nascimento, ella se faz fe- cundar por um macho, e isto por uma só vez* em sua vida, que dura de 5 a 6 annos. Ella escolhe esse macho em uma excursão fora da colmêa. Dous dias depois co- meça a pôr ovos de obreiras nas cellulas mais pequenas e numerosas ; depois ovos de machos em cellulas maio- res ; e, finalmente, ovos destinados a outras abelhas- mestras em cellulas particulares e pouco numerosas, de 15 a 20 ao muito. Estas cellulas são alongadas, em MANUAL DE APICULTURA. fôrma de pêra, situadas verticalmente, tendo a abertura para a parte debaixo. As larvas fêmeas são sustentadas com melhores e mais abundantes alimentos. Quando as fêmeas não são fecundadas nos primeiros 15 dias de sua existência, a sua postura é defeituosa; sé o acto de fecundação não tem logar senão passados 16 dias, ellas põe tantos ovos de machos quantos de obreiras, e quando não copulão senão depois do vige- simo dia, ellas só põe ovos de machos. > As fêmeas estão armadas com um ferrão que só em- pregão contra os seus inimigos. A rainha é aquella que fica afinal, depois de um combate de morte. Emquanto ella não é fecundada, o enxame não lhe mostra grande consideração; porém, desde que recebeu essa faculdade, ella se torna o objecto dos maiores respeitos e homena- gens. Se corre algum perigo, todo o enxame combate para a salvar, e a cobre com a sua massa para prote- gel-a. O único ponto sobre o qual lhe resistem, é quando ella quer exterminar os vermes de rainha antes de tempo, ou quando recusa combater contra uma outra rainha. A sua fecundidade é prodigiosa, porque ella põe annualmente de 30 a 40,000 ovos, Funeções dos zangões. Os machos ou zangões (Fig. 2), são mais grossos e pretos do que as obreiras, menos compridos do que as abelhas mestras. A sua única funeção é fecundar a estas ultimas. Um único goza desta insigne e funesta honra, e depois é exterminado. Attribue-se, todavia, aos ma- chos a propriedade de conservar o calor no interior das colmêas, ao menos em certas circumstancias, e por isso, encontra-se algumas vezes de 1,500 a 1.800 zangões ; elles sahem algumas vezes, na oceasião do maior calor, para fazerem corridas vagabundas, o são inteiramente inoffensivos, porque não tem ferrão. Durante esses pas- seios é que tem logar o seu encontro com as fêmeas e o acto de fecundação. Como elles consomem sem traba- lhar logo que o enxame está formado, as abelhas os exterminão sem piedade. A sua existência não excede, portanto, de dous a tres mezes. MANUAL DE APICULTURA. 9 Funeções das obreiras. A abelha obreira (Fig. 3a), menos grossa e menos longa do que a abelha-mestra, está encarregada de todos os trabalhos exteriores e interiores da colônia, eos exe- cuta com a sua tromba, seu estômago, mandibulas e patas. Ella vai ao campo buscar o mel, o pollen e a cera, e construe no interior da colmêa os repartimentos necessários para guardarem esses productos e criar uma numerosa progenitura. A natureza a armou com um ferrão, mas não lhe concedeu senão um anno de vida. O órgão o mais importante da obreira é o seu duplo estômago (Fig. 4), do qual a primeira parte ab serve de reservatório ou sacco para receber o mel; a segunde digere a matéria que a abelha absorve para entreter a sua vitalidade e elaborar a cera ; e é o canal que leva os resíduos ou dejecções ao ânus. < As abelhas obreiras fazem com vigilância sentinella na porta da colmêa, para oppôr-se á entrada de tudo quanto não pertence á colônia. Entretanto, alguns mi- migos assaz astutos achão meios de introduzir-se impu- nemente, e viver á custa de seu trabalho. Trabalho das abelhas. Logo que um enxame de abelhas se introduzio em uma colmêa, grupa-se na parte superior onde se sus- pende formando uma espécie de cacho, e começa desde lo*o a construcção de seus edifícios. Emquanto uma parte das obreiras elaborão a cera, matéria gorda e une- tuosa que secretão d'entre os anneis de seu abdômen, e lançãó as primeiras bases dos favos, outras vão buscar o nectar das flores e a transpiração melliflua das tolhas, que accumulão no seu principal estômago e lhes serve de sustento, e uma matéria gommosa chamada propohs queapanhão com as patas posteriores, e com a qual ellas tapão as fendas e os buracos do local, excepto a passagem destinada para entrada e sahida. Com esta mesma matéria é que ellas ligão os favos, começando 10 manual de apicultura. pela parte superior, e continuando verticalmente des- cendo. . .. , , Os favos (Fig. 5a) são uma reunião de alveoios ou cellulas hexagonaes, que as abelhas começão a formar pelo fundo, e alongão gradualmente pelos lados. Fabri- cão muitos favos ao mesmo tempo, e sobre as duas faces destes constróem muitas cellulas. Quasi sempre os fa- vos são parallelos entre si (Fig. 6); a sua largura cor- responde á da colmêa: elles estão ligados pelos lados e continuados até em baixo, se a altura da habitação não é muito considerável (Fig. 7). Algumas vezes, em logar de estarem dispostos regular e parallelamente, os favos estão situados mui irregularmente. Construcção dos alveoios ou cellulas. Para começar a construcção de seus alveoios, a abelha tira com as ratas a cera contida em seus saccos abdo- minaes e a leva ás suas mandibulas, a amassa de mistura com um sueco particular, e faz uma espécie de fio molle que applica no ponto em que quer edificar. Muitas abelhas fazem o mesmo trabalho até que com- pleta construcção de um alveolo, compartimento ou cavidade, onde depositão o mel e opollen, e serve de berço a toda a família. Os alveoios tem seis faces planas e regulares, e terminão-se no fundo por ama pyramide tri-romboidal, excepto nos alveoios das fêmeas, que se assemelhão a extremidade de uma pêra. Oado um dos zhombaides que formão o fundo das callulas é commum a dous alveoios (fig. 8); o que indica que os favos das abelhas tem cellulas de ambos os lados (fig. 9). Os alveoios das obreiras e os do macho não estão no plano horisontal; a sua inclinação é' de 4 a 5 gráos, e essa inclinação é de cima para baixo e de fora para dentro. Os alveoios das obreiras estão ge- ralmente situados no alto e no meio da colmêa, os dos machos e em nos lados dos embaixo, e as das fêmeas, estão collocados verticularmente, quasi sempre sobre os lados dos favos. MANUAL DE APICULTÜRA. II O nemero de cellulas contidas em uma colrnêa cheia de favos é considerável, quarenta a cincoenta mil de ordinário: um raio de palmo e meio de compri- mento sobre pouco menos de tres quartos de largura encerra 4,000, que as abelhas constróem em menos de 24 hora; tal é a sua atividade. As abelhas trabalhão noite e dia na fabricação dos alveolos; mas ellas não sahem senão de dia para hirem apanhar o mel e a cera. A noite todas se empregão nos trabalhos interriores de dia, uma par- te vai buscar as provisões; outra e labora a cera outra finalmente se occupa com a guaada, o aceio e os cuidados da progenitura. Em tempo fresco, as abelhas voão do campo para a colrnêa, e da cçlmêa para o campo, desde a aurora até o crespusculo; na estação quente, ou -mesmo nos dias quentes, ellas se conservão no interior nas horas de maior calor. Criação das larvas. Quatro dias depois que um ovo foi posto e col- locado sahe um pequeno verme sem faltas, que se conserva enrolado sobre si mesmo no fnndo do seu alveolo. As obreiras lhe fornecem uma espécie de geléa composta de pollen e de mel, cuja quantidade nutritiva varia com a idade da lavra. No fim de 5 a 6 dias, o alveolo é coberto com uma tampa de cera, e a larva começa a fiar um^cazulo cuja seda é applicada sobre as\paredes; bastão-lhe 36 horas para terminareste trabalho, e 3 dias depois ella se metamorphosea em nymphas. No fim de 8 dias, o insecto está perfeito, fura a tampa do alveolo e pousa sobre o favo para secar. Esta serie de transformações dura 20 dias, a partir da postura do ovo. As abelhas ainda continuão a dar-lhe alimento, a lambem, e tratão desde logo de limpar a cellula onde a abelha mestra põe outro ovo. E' deste modo que a familia augmenta com prodigiosa fecundidade. Vejamos agora como a industria humana sabe tirar partido do frabalho das abelhas. X2 MANUAL DE APICULTURA. 6 II-Da abelheira;da sua collocaçao, colméas 3 TRANSPORTE DAS ABELHAS. A belheiras. Dá-se o nome de abelheiras ou de colméa ao logar onde s S ascolméas. Pode-se estabelecera.be- Sas em toda a parte, onde houverem flores cultr- vSoT espontâneas, árvores, arbustos ou plan as r^eU? cujas flores oi folhas possão dar os productos que as abelhas procurão. Collocaçao das abelheiras. As abelheiras não devem ser estabelecidas perto de fabricas, de fornos, em logares mui quentes ou em pontos elevados onde reinem ventos violentos. Convém- lhe os logares tranquillos e abrigados, perto das casas de morada, dos bosques, e sobre tudo entre as arvores sempre verdes e copadas. Nas localidades onde as chuvas e os ventos impe- tuosos são freqüentes, convém adoptar as abelheiras cobeitas (fig 10); porém nos logares onde isso nao aconteee, é preferível a abelheira em pleno ar (fig. 11;. Porém qualqner que seja a abelheira adoptada, é necessário oriental-a de maneira que a sua entrada se ache do lado opposto ás chuvas e aos ventos do- minantee. Outra recommendação mui essencial se deve fazer isto é que as colméas devem estar preservadas da acção directa dos raios do sol* e da humidade, As abelheiras ao ar livre devem estar cobertas ao menos com um tejadilho de palha que as preserve da chuva, do sol e do frio, e as colméas collocadas sobre espécie de mesas formadas por uma pequena taboa pregada sobre uma estaca, 3 ou 4 palmosacima do chão, e distancia das de modo que se possa circular á roda dellas. Acquisição das abelhas e seu transporte. A acquisição das abelhas se faz na oceasião da for- mação dos novos enxames. O seu transporte deve fa- MANUAL DE APICULTURA. 13 zer-se á boca da noute, tendo o cuidado de envolver as colmêas em sarapilheira, ou qualquer outro panno gros- seiro. Um homem a pé ou a cavallo, pôde transportar com cuidado uma colmêa ; quando o transporte se faz em carro, guarnece-se o fundo deste com uma camada de palhas, sobre a qual sé collocão as colmêas, voltan- do-se o orifício destas exteriormente e deitando-as de maneira que os favos fiquem no sentido vertical. Chega- das ao logar de seu destino, deixão-se as colmêas em repouso durante uma ou duas horas, depois tira-se o panno, e levão-se para onde devem ficar. Cuidados que se devem ter com as abelhas. As colmêas devem ser visitadas a miúdo, e por pessoa a que as abelhas estejão acostumadas a ver Nestas vi- sitas deve-se evitar andar apressadamente, fazer movi- mentos bruscos, gesticular e dar gritos; far-se-lia a menor bulha possível, e se uma abelha annunciar por seus movimentos e por um zumbido particular que ss prepara para atacar, o visitante deve agachar-se e con- servar-se nessa posição até que ella se vá embora Não se deve perturbar as abelhas em seus trabalhos, nem levantar ou abrir as colmêas senão quando houver necessidade e nunca bruscamente, Esta necessidade so é iustificavel quando se tem de mudar o enxame novo ou quando se percebe que as abelhas estão .macUvas, que as formigas e outros insectos, caramujos alsas traças, aranhas, etc, procurão dammficar as colmeab. Quando se nota que faltãp provisões as abelhas põe-se um pouco de mel aquecido em um favo vasio ou em um vaso que se cobre com um pe^ço de palha ou nanno ralo, e que se colloca á noite perto da colmea. Em falta de mel, pôde dat-se-lhe assucar mascavo dis- solvido em pouca água. Colmêas. As colmêas são feitas com palha, madeira sipós troncos de arvores, cortiça, etc, de formas diffeientes e grandezas variáveis, conforme, as localidades. 14 MANUAL DE APICUL-TURA. As colmêas de palha são as menos impressionáveis ao frio e ao calor, do que as de madeira. As melhores, são sem duvida as mais simples, e as que permittem colher facilmente o mel e a cera sem destruir as abelhas. As colmêas que melhor desempenhão estas condições são as das figuras 12 e 15. A colmêa de tampa, fig. 12, se compõe de um cone a b coberta com um disco (fig. 13) transparente, e de uma tampa c que se tira á vontade. A parte a & da colmêa está assentada sobre um pedaço de taboa e f b g. O orifício m esta aberto quando a colmêa tem a sua tampa, e fechado com uma rolha, quando esta se sus- pende. Esta suspensão tem logar na estação das flores e quando a colônia enxamou, ou por outra, quando se julgar que a colmêa está cheia de mel. Estas colmêas são feitas com rolos ou cordas de palha, apertados e ligadas entre si com a própria palha, linha grossa ou barbante. Devem ter o mesmo diâmetro, para que as tampas sirvão em todas. A altura do corpo da colmêa, assim como a tampa podem variar, afim de ter grandes colmêas para os grandes enxames e pe- quenas para os pequenos enxames. Esta colmêa foi modificada vantajosamente, substi- tuindo-se- o disco pela peça representada pelas letras abe d, na fig. 14. A fig. 15, representa a colmêa de alças, também de palha como a precedente. Compõe-se de dous cylindros mais ou menos altos abe d e d b ef, do mesmo diame- tro, e cobertos com uma tampa conica c a m, também do mesmo diâmetro. Cada uma das alças ou cylindros tem uma espécie de assoalho composto de taboinhas fixas, fazendo face á entrada da colmêa. Pode-se formar esta colmêa com tres ou quatro alças ou cylindros, porém, bastão duas quando tem tampa, como está representado na fig. 15; quando a não tem, então é necessário cobrir a parte superior com palhas oucom um pedaço de taboa que a tampe bem. Em alguns logares onde a madeira e a mão de obra MANUAL DE APIOULTtTRA. 15 são baratas, usão-se colmêas de madeiras de tres ou quatro alças, como está representado na fig. 16. Algu- mas vezes, em logar de estar em pé, deita-se est* eòl- mêa: tal é a colmêa árabe ; outras vezes, supprimem-se as divisões, e então a eolmêa é simplesmente uma caixa mais ou menos longa, á moda do Levante, e de alguns paizes da Allemanha. A colheita feita nas colmêas de alças se faz na mesma época e da mesma maneira que nas outras. Quando se suppõe que a parte superior está' bem guarnecida de mel, tira-se depois de a ter desgrudado, expellem-se as abelhas, e colhe-se. Se a colmêa tem capuz de palha, como na fig. 11, torna-se a pôr este em seu logar; mas se é uma alça ordinária, a collocão na parte inferior da colmêa, de maneira que a segunda fica então sendo a primeira; todavia, pôde tornar-se a pôr na parte supe- rior, se se tem tenção de a tirar segunda vez, um pouco mais tarde, e obter mel mui puro. As colmêas de alças se prestão vantajosamente a todas as operações de agricultura. Tem-se inventado um grande numero de colmêas que pelo seu preço e complicação, convém mais ao amador do que ao verdadeiro agricultor. Citaremos somente tres destas colmêas que em muitas circumstancias, podem ser empregadas com vantagens. As figuras 17 e 18 representão uma colmêa de alças oblíquas, que se compõe de tres repartimentos ou alças que se sobrepõe. A inferior repousa sobre uma taboa em fórma de estante de livros, como se vê na fig. 17, nas letras a 5 c d, e a ultima é fechada por uma taboa movei. As diversas partes estão fixadas por meio de grampos e, /, g, h; duas travessas postas por detraz de cada alça a retém sobre a que lhe é inferior. A fig. 26 mostra um abeac. A colheita se faz tirando alça por alça, e res- tituindo-as depois aos seus logares. A colmêa Polytrope, reúne as vantagens das colmêas ordinárias e das de alças. Compõe-se de duas partes reunidas por meio de trinques m, de uma cobertura ou capote, e de uma alça inferior. Esta ultima pôdeser supprimida á vontade, porque ella não serve senão na 16 manual de apicultura. occasião cm que o mel superabundaou quando se quer fazer uma colheita de mel mui puio. O modelo de colmêa representado na fig. 20 e de to- UmoaeiouL -u r melhor realisa todas asda%-mrr£ria Fomentada pelo general Mir- S'1'S dotmaisTstincls agricultores de França. Toda a colmêa é de madeira: a fig. 20 a representa de uma maneira tão elara, que é escusado qualquer descrição As letras ABC D designão o eorpo da col- S - «6 «ma porta de corrediça que tapa a abertura Td 'fql base ou mesa, sobre a qual repousa a colmêa. Como se vê na mesma figura, todas as partes sao fecha- das com tramellas lll. A base ou mesa (Fig. 21) consta de duas partes, a de cima que é a mais larga, repousa sobre duas travessas mKossas por detraz do que por diante afim de dar- Se uma leve inclinação que facilita a sahida dos va- pores. . .. A segunda parte fixada sobre a primeira é aquella sobre a qual repousa immediatamente a colmêa; a chan- fradura aberta sobre a dianteira serve de porta e esta ê guarnecida de pontas para impedir a entrada dos ratos e das borboletas nocturnas. A entrada se fecha ou se diminue por meio^ de um postigo, mui necessário na época em que os insectos mais atacão as colmêas. Querendo-se transportar uma colmêa e conservar _ as abelhas encerradas, será necessário substituir o postigo inteiriço por outro cheio de pequenos furos feitos com uma verruma. _ Os compartimentos ou alças, que também se chamao casas ou armazéns (Fig. 22) são octogonas no interior; a parte superior é aberta, como está representada na h- gura. As barras são feitas em fôrma de triângulo, para obrigar as abelhas a trabalhar no sentido das mesmas barras. O seu corte está representado na fig. 23. As casas ou alças estão munidas de travessas ver- ticaes e horisontaes, como se observa na figura 20. Estas peças se unem tão fortemente quanto se queira MANUAL DE APICULTURA. 17 por meio de chaufros e espécies de feixaduras e chaves. O tecto da colméa (fig. 24) é inclinado, e furado na parte superior com 3, 5 ou 7 pequenos orifícios que servem deJ ventiladores, e se guarnecem com tubos tapados com uma rolha, que se tira ou põe á vontade para arejar o interior da colméa. A figura 25 é uma taboa da mesma dimensão que as casas, e que serve para as tampar quando se quer colher o mel. No meio desta peça vê-se uma espécie de alçapão e que serve para introduzir fumaça no interior da colméa ; serve tambem para conse- guir-se que as abelhas construão favos em um vaso qualquer, collocando-o sobre a abertura. Uma só casa ou alça com o seu competente tecto constitue uma colméa simples, bastante para alojar um enxame de 20 a 22, ovo abelha, pesando de 4 a 4 1/2 libras. Se o enxame é mais numeroso ajuntar- se uma outra alça, e quando a alça inferior está cheia, ajunta-se uma outra na parte inferior. A colheita se faz por cima, tira-se primeiramente o tecto, e substitue-se a este pela cobertura, plano da figura 25. Tres semanas depois, tira-se a alça ou casa superior, e cobre-se de novo com o tecto (fig. 24). Continua-se a operar do mesmo modo, até que tudo se colha. Para obter enxames forçados com esta colméa, quando ella tem duas ou tres casas, prepara-se uma casa vazia ao lado da colméa que se quer enxamar artificialmente, collocando a casa nova sobre uma taboa. Bate-se sobre a colméa, até que uma parte das abelhas subão para a casa nova acompanhadas da rainha, tira-se então a casa superior com o seu tecto o colloca-se sobre a casa vazia preparada, e substitue-se sobre a colméa mãi, casa nova coberta com um tecto vazio, mas preparado. Esta preparação consiste em fixar um favo de cera nesse tecto, no sentido em que se quer que as abelhas trabalhem. Preconisa-se muito as colmêas de caixas de Nutt, conhecidas com o neme de colmêas inglezas, mas não 3 13 manual de apicultura. as descrevemos, porque são complicadas, e não melhores do que as ultimas. Qualquer que seja a colmêa empregada, nunca se deve matar as abelhas para apoderar-se de seus pro- duetos: ellas podem ser expellidas ou pelo transvasa- mento, ou por qualquer outra maneira, e fazêl-as entrar em novas habitações ou reunil-as aos enxa- mes fracos em outras colmêas. Vale mais fazer uma pequena colheita, do que fazer uma boa, destruindo as abelhas. Em verdade não é possivel multiplicar as colmêas alem dos recursos que fornece a localidade, ou por outra querer-se ter 200 colmêas onde não existe flores |senão para 100, porem póde-se sempre augmentar as'populações, fazendo com que as colmêas fracas em abelhas se tornem populosas. Duas popu- lações reunidas não consomem muito mais do que uma só isolada. A boa agricultura consiste principal- mente em ter fortes populações reunidas na mesma colmêa, e estas guarnecidas de paredes grossas e bem feixadas. Preenchidas estas condições a cultura das abelhas é sempre mui vantajosa, mesmo nos logares pouco favoráveis. § III. — moléstia e inimigos das abelhas. Doenças á que estão sujeitas as abelhas. Assim como todos os outros seres criados, as abe- lha estão sujeitas a differentes enfermidades durante o curso de sua limitada existência. A maior parte destas enfermidades são resultados da falta de cuidados da parte dos apicultores. A mais perigosa de todas é a dysenteria, que produz muitas vezes a perda de colmêas inteiras; ella resulta da má qualidade do mel, da excessvia humidade da falta de ar finalmente das más condições da localidade onde se scha a abe- lheira. Quando as abelhas se achão atacadas deste mal, lanção os seus excrementos sobre os favos, infec- cionão toda a colônia. O remédio consiste em dar-lhes manual de apicultura. 19 bom mel misturado com pouco vinho generoso, em tiraros favos sujos, e, sobre tudo em arejar a colmêa, porque a principal causa da dysenteria provem doar viciado. Ellas soffrem ás vezes do mal contrario, que é a constipação do ventre; o que acontece quando as abe- lhas não podem conservar o calor necessário no inte- rior da colmêa. Esta moléstia, commum nos paizes frios, rara nos paizes quentes, tem logar quando ellas não podem sahir da colmêa; então, os excrementos se solidificão em seu ventre, e ellas morrem. Este mal não tem remédio conhecido. A vertigem é uma moléstia que ataca individual- mente as abelhas em certas localidades. As que se achão atacadas do mal não podem voar, mas girão sobre si mesma, até cahirem. Também não se conhece remédio para este mal que, não sendo epidêmico, pouco darnno causa. Inimigos das abelhas. São mui numerosos os inimigos das abelhas, porem poucos são os temíveis. O maior de todos é o api- cultor ignorante, aquelle que não cuida nellas e as mata para colher seus produetos. Depois deste, o mais formidável é a falsa traça, e as larvas das borboletas. As borboletas esvoação em torno da colmêa, e fazem toda a deligencia para se introduzirem nella, e ahi porem os seus ovos. As abelhas são vigilantes, e matão todos os insectos que tentão evadir a sua casa; se a colônia é numerosa, esse mal não é de temer. Não assim a respeito da traça, que escapa a toda a vigilância e consegue quasi sempre introduzir-se. Tanto ellas como a sua prole minão os favos e se nutrem com a cera, sem que as abelhas se possão oppôr a isso. Conhece-se que esse inimigo está na colmêa, quando se vê, aqui e ali, uns grãos pretos, que são os seus 20 manual de apicultura. excrementes. E' necessário então apressar-se em cortar os favcs atacados. Certos insectos alados procurão igualmente intiodn- Zir-se nas colmêas. Quando elles affluem é necessário diminuir as entradas. Os ratos, os pássaros, e mesmo certos animaes grandes fazem a diligencia para roubar o mel. O remédio contra isto, é a vigilância. O mesmo remédio é applicavel a dous outros inimigos, as for- migas e as gallinhas. As abelhas de uma colmêa são algumas vezes inimi- gas declaradas das da visinha: ellas se roubão entre si! Eeconhece-se a guerra e o saque, quando grande nu- mero de abelhas, rodão em torno de uma
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