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Ida-unB  ■   Programa de Pós-graduação em arte  ■ janeIro/junho de 2009  ■  v. 8  n.o 1  ■ 33
Narrativas são manifestações orais, escritas, sonoras e visuais que se organizam a par-
tir de uma sucessão de episódios ou ocorrências 
de interesse humano que integram uma mesma 
ação. Uma sequência de idéias articulada através 
de palavras faladas ou escritas, e/ou através de sons 
e imagens é condição para que uma manifesta-
ção seja reconhecida como narrativa. Sequência e 
organização são elementos que dão algum tipo de 
unidade a idéias, falas, frases, sons e imagens que 
se complementam como narrativa.
Desse modo, podemos dizer que narrar é contar 
algo sobre o mundo, sobre a existência, sobre o 
outro ou sobre si mesmo. É uma maneira de des-
crever cenários, reinventar a vida, recriar histórias, 
mas, sobretudo, de recontar eventos, realidades, 
conflitos, problemas, dúvidas e sentimentos que 
revelam diferentes versões e perspectivas dos seres 
humanos. Romances, crônicas, novelas televisivas, 
ensaios, histórias em quadrinhos, tirinhas, fotogra-
fias de família, filmes, canções, piadas e até mesmo 
fatos nas páginas policiais são maneiras de contar, 
são ações ou acontecimentos que o narrador, ao 
registrá-los, pode torná-los focos de interesse para 
a posteridade. 
NARRATIVAS VISUAIS: IMAGENS, VISUALIDADES 
E ExPERIêNCIA EDUCATIVA
R a i m u n d o M a r t i n s
Resumo
Este texto tem como foco o conceito de narrativa e a análise de uma narrativa visual como experiência educativa. 
Na primeira parte, examina de maneira sucinta as transformações deste conceito nas últimas décadas e sua 
predominância na cultura contemporânea. Em seguida, analisa a relação entre visualidades e experiência visual 
ressaltando o modo como imagens criam associações, evocam contextos e são moldadas por práticas subjetivas 
e culturais. A interação entre imagem, narrativa e ação é discutida na terceira parte através da análise da narrativa 
visual de uma aluna do curso de Licenciatura em Artes Visuais da Faculdade de Artes Visuais da Universidade 
Federal de Goiás. O texto conclui colocando em perspectiva algumas implicações para a utilização desse recurso 
pedagógico e enfatizando sua relevância no sentido de aproximar os alunos do conhecimento e dos problemas 
relacionados ao contexto social e cultural em que vivem. 
Palavras-chave: Narrativa. Imagem. Visualidades. Experiência Educativa.
Abstract
This paper has its focus on the concept of narrative and in the analysis of a visual narrative as educative experience. In 
the first part, it examines in a succinct way the transformations of this concept in the last decades and its predominance 
in contemporary culture. Following it analyses the relation between visualities and visual experience emphasizing the 
way images create associations, evoke contexts and are shaped by subjective and cultural practices. The interaction 
between image, narrative and action is discussed in the third part of the paper through the analyses of a visual narrative 
of a student of the Visual Arts Teacher Training Course from the Visual Arts College of the Federal University of Goiás - 
brazil. The paper concludes pointing to some implications for the utilization of this pedagogical resource emphasizing 
its relevance in order to approximate students to knowledge and to problems related to the social and cultural context 
where they live. 
Keywords: Narratives. Image. Visualities. Educative Experience.
RAIMUNDO MARTINS é Professor Titular e docente do 
Programa de Pós-Graduação em cultura visual da Facul-
dade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás. 
é pós-doutor pela Universidade de Barcelona (Espanha), 
doutor pela Universidade de Southern Illinois e Mestre 
pela Andrews University (EUA). é membro do Grupo de 
Pesquisa Educação e Visualidade da FAV/UFG, da Associa-
ção Nacional de Pesquisa em Artes Plásticas (ANPAP) e da 
Federação Brasileira de Arte Educadores (FAEB).
raimarmartins@uol.com.br
34     ■ janeIro/junho de 2009  ■  v. 8  n.o 1  ■  Programa de Pós-graduação em arte  ■  Ida-unB
Seção 1 – Cultura e viSualidade: queStõeS em CurSo
A partir da segunda metade do século XX, mas 
em especial nas últimas três décadas, as narrativas 
transformaram-se em espaço dinâmico de discussão 
intelectual e reflexão teórica, ganhando predomi-
nância na cultura contemporânea. Fonte de inte-
resse e provocação, elas desestabilizaram o sistema 
literário ao mesmo tempo em que geraram ruídos 
em relação às classificações genéricas desse sistema. 
As narrativas desafiaram, também, os limites con-
vencionais da literatura por caracterizar-se como um 
tipo de manifestação ao alcance de gente comum que 
aspira contar aspectos da sua trajetória desenhando 
percursos e rupturas de sua história particular. Nesse 
sentido, pode-se dizer que as narrativas criaram 
uma nova estética, uma maneira peculiar para os 
indivíduos se expressarem sobre a vida, a memória, 
a intimidade. 
As narrativas não obedecem um formato, não se 
submetem à uma única perspectiva crítica, tam pouco 
se acomodam a modelos estabelecidos, situação que, 
muitas vezes, inquieta e intriga os indiví duos intera-
tores. Paradoxais, as narrativas mobilizam a sensibili-
dade intelectual, ideológica e psicológica das pessoas, 
interpelando-as e impelindo-as a refletir ou experi-
mentar múltiplas maneiras de perceber e interpretar. 
Têm potencial para provocar fissuras semânticas nos 
modos de organizar e interpretar discursos/textos/sig-
nos e imagens, rompendo os limites das “linguagens” 
e desestabilizando convenções, ao mesticizar figura-
ções da voz, do corpo, da vida ou da morte. 
Fazendo uma analogia com as idéias de Maristany 
(2005) e tendo como foco as imagens como maté-
ria-prima de narrativas visuais, pode-se dizer que 
“[...] as [imagens] não se lêem, se recortam como se 
fossem figuras, se reconhece sua materialidade, sua 
‘beleza aparente” (p. 67). Ainda segundo Maristany, 
é necessário tratar as palavras – e, no caso da minha 
analogia, as imagens - com uma sensibilidade que 
valorize a “proeminência da sua materialidade 
[...] até despojá-las de seu significado [atávico] para 
abordá-las como meras peças de um jogo de dese-
nhos” [ou rabiscos] (p. 67). Assim, talvez consigamos 
fugir da armadilha e do “erro de crer na [imagem] 
em si” (ibid.) para construir uma reflexão deslocada 
– multicêntrica – e crítica. 
Das iMaGens às VisUaLiDaDes
Na cultura pós-moderna se intensifica a distân-
cia entre a riqueza e a amplitude da experiência 
visual e a habilidade ou recursos para compreen-
der essa experiência. A velocidade e o volume de 
imagens que nos invadem e interpelam diaria-
mente constituem uma espécie de avalanche que 
nos encharca e nos consome sem que tenhamos 
tempo para refletir, analisar ou exercer algum 
tipo de avaliação crítica sobre elas. 
Alem disso, a tecnologia digital contribuiu de 
maneira significativa não apenas para ampliar a 
produção de imagens, mas, principalmente, para 
transportá-las em tempo real por meio de câmeras 
de celulares, câmeras fotográficas, computadores, 
criando links e tornando-as públicas na internet 
em sites como o Youtube, em portais, blogs, Orkuts 
etc. Achutti (2004) detalha com muita proprieda-
de implicações deste processo ao comentar que na 
era digital 
qualquer pessoa deixa de ser um mero consumidor de 
imagens para se tornar um realizador/criador de imagens 
e se consagrar a reproduzir a vida cotidiana em vídeo ou 
em fotografia, por um preço módico, sem ter conhecimen-
tos técnicos muito avançados. (p. 101)
Então, quando falamos de visualidades, nos 
referimos a um processo de sedução, rejeição 
e cooptação que se desenvolve a partir de ima-
gens. Esse processo tem sua origem na experi-
ência visual. Podemos caracterizar a experiência 
visual como uma espécie de cosmos imagético 
que nos envolve ao mesmo tempo em que nos 
assedia, sugerindo e até mesmo gerando links 
com nossos repertórios individuais. Esses reper-
tórios individuais incluem imagensde infância, 
de família, de amores, conflitos, acasos, azares 
e dissabores. Enfim, são imagens associadas a 
situações marcantes que, por razões diversas, 
preservamos para nos proteger das emoções que 
elas acionam ou, ainda, imagens que guardamos 
com afeto – e nos reservamos o direito de reviver 
as emoções que elas desencadeiam apenas em 
épocas ou momentos especiais. A experiência 
visual e seus repertórios são responsáveis por 
sinapses entre conhecimentos objetivos e subje-
tivos configurados por referências culturais que, 
de alguma maneira, influenciam os modos e as 
práticas de ver dos indivíduos. 
Mas é importante ressaltar que esse rastrea-
mento, localização e recuperação de imagens da 
Ida-unB  ■   Programa de Pós-graduação em arte  ■ janeIro/junho de 2009  ■  v. 8  n.o 1  ■ 35
naRRatIVaSVISuaIS:ImagenS,VISualIdadeSeexPeRIêncIaeducatIVa RaImundomaRtInS
experiência visual nem sempre é algo espontâ-
neo ou corriqueiro. Muitas vezes esse rastreamen-
to se caracteriza como uma operação complexa, 
confi dencial e por isto mesmo um tanto nebulosa, 
protegida por receios, dúvidas, inseguranças e até 
mesmo ameaças que temos de nós mesmos e das 
emoções que tais imagens podem reativar. Além 
disso, as imagens e suas sinapses estão permea-
das por referências ou práticas culturais que nos 
ajudam a compreender o mundo social, ou seja, 
as formas de torná-lo inteligível (SILVA, 2003). 
Colocando de outra maneira, estamos falando de 
ações, atividades, experiências e outras formas de 
produzir sentido que constituem e instituem o que 
conhecemos como cultura. 
Do ponto de vista educacional, a dimensão visual 
vai além de um repertório de eventos ou objetos visí-
veis porque pressupõe uma compreensão dos seus 
processos, o modo como operam, suas implicações e, 
principalmente, seus contextos. Assim, podemos dizer 
que a experiência visual é um processo dinâmico e gra-
dual, em constante transformação e, consequentemen-
te, mais demorado e, portanto, mais abrangente do que 
a instantaneidade da experiência de ver. 
A experiência visual e seus repertórios tam-
bém incluem “as representações e as imagens [que] 
fluem pela vida diária valorizando as formas cultu-
rais como o cinema e a televisão, criando uma espé-
cie de névoa que encobre as regiões de fronteira 
entre as imagens de arte e de não-arte” (BECKER, 
2009, p. 26). Richard (2006), aprofunda a discussão 
proposta por Becker ao afirmar que a “[...] diferen-
ça entre arte e não-arte perdeu agora sua hierarquia 
de valor, ao cair submergida em uma nova cons-
telação expandida do visual que envolve todas as 
formas de ver, de ser visto e de se mostrar” (p. 98). 
Nesse processo de compreensão que se desenvolve 
a partir de imagens, as visualidades ganham sentido 
como representações que transitam e emergem de 
repertórios visuais criando associações, acionando 
referências e evocando contextos. Desse modo, 
podemos dizer que as representações visuais são 
moldadas por práticas subjetivas e culturais que as 
transformam em visualidades. 
De acordo com Rolnik (1997), a subjetividade é 
“um modo de ser – de pensar, de agir, de sonhar, 
de amar etc. – que recorta o espaço, formando um 
interior e um exterior” (p. 1). Esse modo de ser dá aos 
indivíduos a possibilidade de articular uma “prática 
subjetiva e intersubjetiva do processo de formação, 
a partir das experiências e aprendizagens construídas 
ao longo da vida [...], reunindo e articulando “expe-
riências diferentes e diversas, através das próprias 
escolhas, das dinâmicas e singularidades de cada 
vida” (SOUZA, 2006, p. 57). A aproximação entre 
prática subjetiva e intersubjetiva sinaliza uma inter-
dependência ou, dizendo de outra maneira, uma 
interação entre a cultura e as práticas culturais. Neste 
sentido, podemos considerar as subjetividades como 
impressões ou vestígios da cultura nos nossos modos 
de ser, pensar, agir e sentir (BECKER, 2009). 
Hernández (2007), ao mesmo tempo em que 
escrutina, também detalha esta discussão ressal-
tando diferenças entre subjetividade e identidade. 
Segundo o autor,
Cada indivíduo tem uma percepção de si que pode ou não 
ser coincidente com a que outros indivíduos ou diferentes 
grupos têm a seu respeito. As discrepâncias entre a própria 
subjetividade e a identidade grupal é a causa de preocu-
pação e ansiedade nos jovens. O que leva com frequência 
a que a identidade do grupo prevaleça sobre a experiên-
cia individual. Por isso, rapazes e moças dedicam muito 
tempo, muita energia e muito esforço procurando ver e 
agir de forma igual ao restante dos membros do grupo. 
[...] Tal concepção defende que a construção da identidade 
se articula, não de modo determinista e natural, mas a 
partir de múltiplos compromissos, alianças, lealdades e 
rejeições, que cada um constrói mediante uma série de 
estratégias. (p. 73) 
Silva (2001), faz uma síntese contundente da 
relação subjetividade-identidade ao argumentar 
que quem detém o conhecimento detém o poder 
de representar, porque “é na representação, entre-
tanto, que o poder do olhar e o olhar do poder se 
materializam” (p. 61). Assim, fica evidente que as 
visualidades são construções culturais que operam 
como imã, como pontos de referência para onde 
convergem diferentes olhares que se encontram e se 
entrecruzam atraindo o
olhar de quem representa, de quem tem o poder de repre-
sentar; o olhar de quem é representado, cuja falta de 
poder impede que se represente a si mesmo; o olhar de 
quem olha a representação; os olhares, eles mesmos cru-
zados, das pessoas situadas, na representação, em posi-
ções diferentes de poder. (SILVA, 2001, pp. 61-62)
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Seção 1 – Cultura e viSualidade: queStõeS em CurSo
No mundo ocidental, a partir da premissa de 
Descartes - penso, logo existo – “pensar” passou 
a ser a marca que distingue os seres humanos dos 
outros animais. Todavia, acompanho a ousadia de 
Kehl (2005) de opor-se ao dualismo cientificista/
cartesiano corpo/mente, preceito que durante três 
séculos se tornou consenso epistemológico no oci-
dente. A autora argumenta que 
não é o pensamento que distingue, primordialmente, um 
ser humano do outro. A certeza subjetiva que nos garante, 
muito precocemente, que “eu sou”, não provém da nossa 
capacidade de pensar, mas da nossa identificação à uma 
imagem. A imagem corporal. Não é o pensamento que 
garante a singularidade do ser; [...] O que garante o ser, para 
um sujeito, é sua visibilidade – para outro sujeito. (p. 148)
Com base neste argumento podemos dizer que 
existir é, antes de tudo, fazer-se presente e ser 
reconhecido numa instância pública e simbólica 
que tem como pressuposto a interação entre ima-
gem, narrativa e ação (ARENDT, 2005). É parti-
lhar e compartilhar imagens e visualidades como 
práticas sociais e culturais que se estabelecem e se 
desestabilizam na teia de relações e significações 
humanas onde cada indivíduo se insere e participa 
a seu modo.
inTeRaçãO enTRe iMaGeM, naRRaTiVa e açãO
Todo conhecimento humano é, de alguma manei-
ra, um tipo de interpretação. Na cultura, pratica-
mente tudo tem um aspecto narrativo e, portanto, 
pode ser percebido e interpretado como narrativa. 
Clandinin e Conelly (2000) explicitam esta com-
preensão ao explicar que 
[...] a vida – como chega a nós e aos outros – é construída 
por fragmentos narra tivos vividos em momentos conta-
dos no tempo e espaço, sobre os quais refletimos e com-
preendemos em termos de unidades e descontinuidades 
narrativas. (p. 17)
 Assim, podemos dizer que as narrativas podem 
mudar o modo de produção cultural e social por-
que, ao narrar imagens e visualidades, os indiví-
duos reorganizam sua experiência de modo que 
elas ganhem coerência e significado, dando senti-
dos a eventos/acontecimentos marcantes nas suas 
trajetórias.
As sutilezas do ver, olhar, espiar, espreitar, obser-
var, vigiar e, também, do prazer visual, são um 
problema tão profundoquanto as várias formas de 
leitura - decifração, decodificação, interpretação, 
etc. Essas sutilezas e especificidades apontam para a 
constatação de que a experiência visual não é expli-
cável apenas através do modelo da textualidade.
Expressão, sentido e interpretação estão sempre 
presentes nas narrativas, construídas a partir de 
quatro elementos: personagem, tempo, ação e espa-
ço. Assim, as narrativas visuais oferecem a possibi-
lidade de se trabalhar questões da experiência for-
madora dos indivíduos que, de maneira geral, são 
constituídas por imagens ou referências imagéticas 
isoladas, dispersas. Essas imagens são, de certa for-
ma, marcas da trajetória e das vivências dos indiví-
duos. Processadas culturalmente como visualidades 
e transformadas em experiências, essas imagens têm 
fortes componentes emocionais que expressam sen-
timentos de alegria, satisfação, medo, insegurança, 
vergonha, timidez, tristeza, decepção etc.
Por esta razão, a experiência de construir narra-
tivas visuais dá aos alunos a oportunidade de iden-
tificar situações significativas na sua trajetória de 
formação, de criar vínculos com questões subjetivas, 
mas, principalmente, de buscar uma compreensão 
de si mesmo tendo como referência as imagens e 
informações que escolheu como importantes e insti-
tuidoras da sua vivência pessoal e social. Ao constru-
írem narrativas visuais, os alunos dispõem de espaço 
para revisitar, retomar e rever criticamente aspectos, 
momentos de suas experiências narrando represen-
tações de suas trajetórias como indivíduos e alunos 
numa dimensão contextual. 
A disciplina Arte, Percepção e Aprendizagem I, 
oferecida no quinto período do curso de licenciatura 
em Artes Visuais da Faculdade de Artes Visuais da 
Universidade Federal de Goiás (UFG), culmina com 
a construção, apresentação e avaliação de uma narra-
tiva visual de duração mínima de três minutos. Cada 
aluno apresenta e comenta com os colegas a sua 
narrativa. As narrativas podem ser apresentadas em 
powerpoint, vídeo, filme, utilizando imagens fixas e/
ou em movimento. Os quatro momentos/cenas que 
serão apresentados e analisados a seguir são parte 
da narrativa visual Peça de água, realizada por uma 
aluna da turma de 2008* (Figura 1).
* Agradeço a aluna Aisha Terumi Kanda por dispor de sua nar-
rativa para a realização deste texto.
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naRRatIVaSVISuaIS:ImagenS,VISualIdadeSeexPeRIêncIaeducatIVa RaImundomaRtInS
O cenário da narrativa é simples e lúgubre (Figu-
ra 1). O espaço sugere um banheiro, pequeno e 
fechado, com iluminação tênue e azulada (detalhe 
não observável nas imagens neste texto). Pratica-
mente todo o lado esquerdo do cenário é ocupado 
por uma banheira de plástico, inflável, cheia de água. 
A foto da aluna, quando criança, está projetada na 
água de maneira que nos faz vê-la como se estivesse 
no fundo da banheira. À direita da banheira, sentada 
sobre as pernas, está a aluna, descalça, de bermuda 
escura e camiseta branca, cabelos soltos. Na sua mão, 
um balde de alumínio. O cenário parece anunciar 
sua intenção: desfazer-se da imagem, arremessá-la 
para fora da banheira junto com a água. A imagem, 
volátil e vulnerável é, ao mesmo tempo, persistente e 
inquiridora, porém, aparentemente passí-
vel de ser eliminada. 
Os gestos iniciais confirmam a intenção 
previamente anunciada. A aluna mergu lha 
o balde e, cuidadosamente, capta a imagem 
e uma quantidade da água onde a imagem 
está refletida, atirando-as, água e imagem, 
para fora da banheira. Por alguns instan-
tes tem-se uma per cepção dissimulada do 
desmembramento ou desaparecimento da 
imagem (Figura 2).
Mas, aos poucos, os deslocamentos 
ondulatórios gerados pelo movimento 
do balde vão cessando e, gradativamen-
te, fragmentos refratados da imagem se 
recompõem sobre a superfície liquida, 
refazendo novamente sua projeção. 
A ausência de uma materialidade 
palpável dá a imagem um caráter enig-
mático sugerindo um confronto aluna-
imagem, ou seja, a aluna e ela mesma, 
embora possamos reconhecer a fotogra-
fia apenas como um registro de infân-
cia. Mas é antes um registro que reativa 
outras imagens, momentos e circuns-
tâncias, pegadas simbólicas de experiên-
cias, significados e emoções vividas que 
balizam sua trajetória até este momento. 
É como se a imagem, em silêncio, gri-
tasse muitas questões: quem sou eu para 
você? O que você diz de mim, ou, ainda, 
o que você quer comigo?
A arte de evocar, narrar e de atribuir sentido às expe-
riências como uma estranheza de si permite ao sujeito 
interpretar suas recordações em duas dimensões. Primeiro 
como uma etapa vinculada à formação a partir da singula-
ridade de cada história de vida e, segundo, como um pro-
cesso de conhecimento sobre si que a narrativa favorece. 
O processo de formação e de conhecimento possibilita 
ao sujeito questionar-se sobre os saberes de si a partir do 
saber-ser – mergulho interior e o conhecimento de si – e o 
saber-fazer-pensar sobre o que a vida lhe ensinou. (p. 62)
Assim, podemos dizer que ao identificar, esco-
lher ou reconstruir experiências visuais significa-
tivas e formadoras, o aluno cria um espaço para 
interpretar momentos ou aspectos de sua trajetória 
buscando uma compreensão de si mesmo e de 
Figura 1. narrativa visual Peça de água, Terumi Kanda.
Figura 2. narrativa visual Peça de água, Terumi Kanda.
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Seção 1 – Cultura e viSualidade: queStõeS em CurSo
experiências vividas que, desafiadoras, sofridas ou 
decepcionantes/desagradáveis, podem ser transfor-
madas em aprendizagem.
O fluxo das imagens mantém a percepção visual 
do movimento e a narrativa continua. Personagem, 
espaço e ação continuam os mesmos. O tempo 
da ação conserva seu ritmo lento se arrastando 
intercalado por pausas que se repetem como que 
solicitando prudência e reflexão: água e imagem, 
recolhidas pelo balde, são atiradas fora da banheira; 
em seguida, um momento de pausa, de espera; gra-
dativamente os movimentos da água diminuem e, 
a imagem, de maneira vagarosa e astuta, reaparece, 
se reapresenta sobre a superfície líquida fitando e 
provocando a sua matriz, a sua origem - a aluna.
A obsessão pela imagem, ou, dizendo melhor, 
pela destruição da imagem, ganha um impulso dra-
mático. O confronto, aluna-imagem, proporciona-
do pela construção da narrativa visual, apresenta 
embates no decorrer da trajetória e de experiências 
vividas no seu itinerário como filha, mulher, irmã e 
aluna. Essas experiências, “marcadas por aspectos 
históricos”, desencadeiam um “continuo subjetivo 
frente às reflexões e análises construídas por cada 
sujeito sobre o ato de lembrar, narrar e escrever 
sobre si” (SOUZA, 2006, p. 79). 
Retornando à narrativa, o ritmo da ação se acele-
ra e o movimento do balde se intensifica na expec-
tativa de que imagem, água, ou ambos, se esgotem. 
Mas o esforço se revela inútil. Tomada pelo cansaço 
e pela irritação, a aluna se lança à banheira, desta 
vez sem o balde e, com movimentos frenéticos das 
mãos e dos braços, faz sua última tentati-
va de livrar-se da água, da banheira e da 
imagem (Figura 3). 
Movimentos rápidos e bruscos des-
locam a banheira, agora quase vazia, ao 
mesmo tempo em que denunciam um 
sentimento de ânsia e ódio. A energia e o 
esforço despendidos se mostram inúteis 
e o sentimento de ânsia e ódio parecem 
gerar exaustão. Com cabelos e camise-
ta molhados, a aluna recorre ao último 
recurso que lhe resta: abrir a válvula e 
retirar o ar da banheira. A pressão do ar 
e o plástico escorregadio oferecem resis-
tência, dificultando a abertura da válvu-
la com a mão. Então, resta apenas um 
recurso, arrancar a tampa da válvula com a 
força dos dentes. A aluna mergulha a cabeça 
na banheira e abre a válvula de ar. Uma pequena 
quantidade de água escorre para fora da banheira. 
Com passos tímidos, a aluna sai, se retira do cená-rio da narrativa.
No pouco de água que ainda resta no fundo da 
banheira, como num passe de mágica, lentamente, 
mas de maneira audaciosa e surpreendente, a ima-
gem se recompõe e reconfigura. Na banheira quase 
vazia, a imagem pode ser vista parcialmente, fican-
do a metade inferior do rosto encoberta pela borda 
da banheira (Figura 4). 
iMaGeM, naRRaTiVa e eDUcaçãO
Narrativas visuais são uma forma de compreensão 
da experiência, um processo performativo de fazer 
ou contar uma história, ou seja, a narração de uma 
série de eventos visuais ou imagens em sequên-
cia. Como explica Tomm (1993), “[...] nós, como 
humanos, não apenas damos significado à nossa 
experiência ao narrar nossas vidas, mas também 
temos o poder de ‘representar’ nossos relatos graças 
ao conhecimento que temos deles” (p. 12). 
Nesse sentido, é importante ressaltar que a vali-
dade de um relato pode ser determinada por aquilo 
que a narrativa provoca ou evoca nos indivíduos, 
porque são eles que podem considerar uma experi-
ência autêntica, crível ou possível. Na sociedade em 
que vivemos as narrativas dominantes não apenas 
influenciam poderosamente, mas, muitas vezes, 
determinam o que é contado/historiado e como é 
contado ou historiado. 
Figura 3. narrativa visual Peça de água, Terumi Kanda.
Ida-unB  ■   Programa de Pós-graduação em arte  ■ janeIro/junho de 2009  ■  v. 8  n.o 1  ■ 39
naRRatIVaSVISuaIS:ImagenS,VISualIdadeSeexPeRIêncIaeducatIVa RaImundomaRtInS
Assim, compreender a formação 
de alunos como uma iniciação, mas, 
principalmente, como um processo 
de conhecimento, pressupõe criar 
vínculos/conexões com aspectos ou 
momentos de experiências significati-
vas que se constroem ao longo da vida 
e que podem se refletir de maneira 
surpreendente no seu percurso edu-
cativo. As narrativas visuais podem 
assinalar diferentes sentidos con-
feridos à formação educacional e à 
pesquisa aproximando os alunos do 
conhecimento e dos problemas rela-
cionados ao contexto social e cultural 
em que vivem.
Falando de uma perspectiva pós-
moderna e pós-estruturalista ouso 
dizer que é necessário assumir o compromisso de 
construir narrativas visuais sobre pessoas ou grupos 
que têm suas vidas em perigo ou que estão correndo 
risco em função do lugar onde estão no mundo ou 
daquilo que o mundo traz ou oferece para elas. Desse 
modo, não podemos perder de vista que aquilo que 
sabemos, aquilo que somos e aquilo que sonhamos 
são, de alguma maneira, as coisas que nos motivam e 
dão sentido à nossa vida, são as coisas que queremos 
compreender e interpretar. ■ 
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