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EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Reconhecer o papel do psicomotricista e sua área de trabalho e intervenção. > Descrever os estágios do desenvolvimento da psicomotricidade do recém- -nascido até a criança de 4 anos. > Identificar a importância da psicomotricidade para o desenvolvimento integral da criança. Introdução A psicomotricidade é uma ciência holística que busca conectar os aspectos emo- cionais, cognitivos e motores nas diversas etapas da vida do ser humano. Para memorizar o conceito, pode-se separar a palavra da seguinte forma: “psi” (aspectos emocionais) + “co” (aspectos cognitivos) + “motric” (aspectos motores) + “idade” (etapas da vida do ser humano). Assim, será mais fácil você se recordar de que a área de trabalho e intervenção do psicomotricista não se restringe somente a um único público-alvo. Tão importante quanto o trabalho pedagógico na primeira infância é o trabalho multiprofissional da psicomotricidade na terceira idade. Neste capítulo, você conhecerá o papel do psicomotricista, bem com a sua área de trabalho e intervenção. Além disso, conhecerá a importância da psicomotri- cidade aplicada à educação infantil. Por fim, você verá como a psicomotricidade atua no desenvolvimento integral do indivíduo em diferentes faixas etárias da vida. Psicomotricidade aplicada à educação infantil Suziane Ungari Cayres Santos O papel da psicomotricidade e seu campo de prática profissional Quem é o psicomotricista? E qual é o seu papel na educação infantil? Esse, de fato, é um cenário de prática profissional que ainda passa por trans- formações estruturais. A psicomotricidade foi reconhecida como campo profissional somente em 2019 (BRASIL, 2019), comportando psicomotricistas de formação inicial (p. ex., graduação em psicomotricidade) ou continuada (p. ex., pós-graduação lato sensu). Desse modo, a psicomotricidade é uma área de intervenção que abarca diferentes perfis de profissionais com um amplo leque de intervenção, como médicos psiquiatras, pedagogos, profissionais de educação física, psicopedagogos, fonoaudiólogos, entre outros. Todavia, o foco da psicomotricidade no trabalho pedagógico na educação infantil é abordar a criança integralmente, não se restringindo apenas a aspec- tos emocionais, cognitivos ou motores. A aposta está na sinergia entre esses elementos, de modo que a prática docente — principalmente do profissional de educação física no ensino infantil — poderá valer-se da sistematização do ensino tanto dos elementos psicomotores quanto da cultura corporal de movimento, manifestada pela criança desde a mais tenra idade. De acordo com Cipriano e Moreira (2016), os precursores da psicomotri- cidade foram o neuropsiquiatra Dupré, em 1909, o médico e psicólogo Henry Wallon, em 1925, e o neurologista Edouard Guilmain, em 1935. Portanto, na década de 70, vários autores definiram a psicomotricidade como uma “mo- tricidade de relação”. Atualmente, o psicomotricista pode atuar com bebês, crianças, adultos e idosos, porém sempre tendo em mente que, para cada público, há um alvo de desenvolvimento a ser acertado. Desse modo, o psi- comotricista aposta em um trabalho pedagógico que englobe os aspectos emocionais, cognitivos e motores, a fim de identificar e/ou minimizar as suas deficiências e dificuldades, de modo a estimular o desenvolvimento integral do sujeito. Nessa empreitada, o psicomotricista deverá identificar as limitações e potencialidades do indivíduo que está sendo atendido no que tange aos elementos psicomotores. O Quadro 1, a seguir, apresenta os elementos psicomotores aos quais o psicomotricista deverá estar atento e seus conceitos. Psicomotricidade aplicada à educação infantil2 Quadro 1. Elementos psicomotores Elementos psicomotores Conceito Autor Coordenação motora ampla Primeira condição a ser desenvolvida no espaço infantil. É o trabalho que aperfeiçoa os movimentos dos membros superiores e inferiores. Almeida (2007) Coordenação motora fina A coordenação visomotora e a motricidade fina se iniciam no primeiro ano e terminam ao final da educação infantil. A coordenação motora fina ocorre a partir da reação conjunta do olho e da mão dominante. É a capacidade de realizar movimentos coordenados utilizando pequenos grupos musculares das extremidades. Le Boulch (1986) Lateralidade É a dominância lateral de um lado em relação ao outro. Durante uma atividade de deslocamento, a criação adquire a noção de qual lado do corpo está sendo trabalhado. Meur e Staes (1984) Equilíbrio Habilidade da criança de manter o controle do corpo utilizando ambos os lados ao mesmo tempo, apenas um lado ou ambos de modo alternado. Hurtado (1991) Estruturação espacial Quando se tem noção de como se deve agir e movimentar-se em um determinado lugar, adaptando-se às limitações do espaço. Meur e Staes (1984) Orientação temporal Capacidade de situar-se em função da sucessão dos acontecimentos: antes, após e durante os intervalos. Meur e Staes (1984) Ritmo É a capacidade da criança de perceber um fenômeno que ocorre com uma determinada duração, ordem e alternância. A percepção ocorre de forma individual e espontânea. Boato (1996) Esquema corporal É o conhecimento que a criança adquire do próprio corpo e de suas partes. Por meio desse conhecimento, a criança consegue manipular e utilizar o corpo para o relacionamento com o meio ambiente. Le Boulch (1983) Fonte: Adaptado de Aquino et al. (2012). Psicomotricidade aplicada à educação infantil 3 Mas, afinal, você já parou para pensar em quem é o psicomotricista? Qual é o seu campo profissional? E a sua área de intervenção? Qual é a importância de sua prática pedagógica na educação infantil? Pois bem, é preciso reconhecer, primei- ramente, que a psicomotricidade, como campo profissional e área de intervenção, tem passado por estruturais transformações nos últimos anos. Há vários anos, essa área de intervenção tem sido cooptada por diferentes perfis de profissionais da saúde, educação e até mesmo do lazer. Muito disso está centrado no fato de que somente recentemente a psicomotricidade foi reconhecida como campo pro- fissional, o que exigiu do sujeito que usa de suas teorias e técnicas uma formação inicial na área ou, ao menos, uma especialização comprovada (BRASIL, 2019). Atualmente, o psicomotricista precisa ter em mãos o título de Graduação em Psicomotricidade ou, de acordo com a Lei nº 13.794, de 3 de janeiro de 2019, ter concluído especialização na área (BRASIL, 2019). Desse modo, a psicomotricidade abarca diferentes perfis de profissionais, e, por conse- guinte, um amplo leque de intervenção profissional. É possível encontrar psicomotricistas que são médicos, professores, gestores, fonoaudiólogos ou até mesmo psicopedagogos de formação inicial. Na prática, a teoria e as técnicas psicomotoras podem marcar presença em diferentes setores da sociedade, da saúde (p. ex., Unidades Básicas de Saúde, hospitais, clínicas, etc.) à educação (p. ex., escolas, creches, etc.), porém sempre direcionadas ao desenvolvimento integral do aluno e/ou paciente. Em geral, de acordo com a atual regulamentação da área (BRASIL, 2019), compete ao psicomotricista as seguintes incumbências: � atuar nas áreas de educação, reeducação e terapia psicomotora, uti- lizando recursos para a prevenção e o desenvolvimento psicomotor; � ministrar disciplinas específicas dos cursos de Graduação e Pós- -Graduação em Psicomotricidade; � atuar em treinamento institucional e em atividades de ensino e pesquisa; � participar de planejamento, elaboração, programação, implementação, direção, coordenação, análise, organização, avaliação de atividades clínicas e parecer psicomotor em clínicas de reabilitação ou em serviços de assistência escolar; � prestar auditoria, consultoria e assessoria no campo da psicomotricidade; � gerenciar projetos de desenvolvimento de produtos e serviços rela- cionados com a psicomotricidade;� elaborar informes e pareceres técnico-científicos, estudos, tra- balhos e pesquisas mercadológicas ou experimentais relativos à psicomotricidade. Psicomotricidade aplicada à educação infantil4 Uma vez ciente desse cenário, qual é a importância da prática pedagógica do psicomotricista na educação infantil? Confira a seguir. Psicomotricidade e educação infantil: o que isso tem a ver? É na educação infantil que as habilidades cognitivas e de apren- dizagem são solidificadas. Nesse contexto, a psicomotricidade é o alicerce para a aprendizagem na infância. Para saber mais sobre esse assunto, assista ao vídeo “Psicomotricidade na Educação Infantil”, da psicomotricista Luciana Brites, disponível no canal NeuroSaber, no YouTube. Contudo, reconhecer a importância da psicomotricidade nesse setor edu- cacional perpassa identificar quem é o profissional que fará uso de suas teorias e técnicas. Na educação infantil, tem-se majoritariamente a atuação de pedagogos (COSTA et al., 2019). Em menor proporção, as instituições de ensino infantil contratam professores especialistas para determinadas disciplinas, como, por exemplo, educação física escolar (COSTA et al., 2019). Contudo, a figura do psicomotricista nem sempre tem seu espaço reservado nas escolas de ensino infantil. Em tese, o ideal seria que houvesse espaço e tempo nas escolas especificamente para o atendimento das necessidades das crianças por intermédio da psicomotricidade. Se, por vezes, o ideal parece utopia, em algumas instituições de ensino, a abordagem psicomotora é tratada em outras disciplinas, caso da educação física escolar (AQUINO et al., 2012). Não há dúvidas de que ainda existe um abismo no setor educacional brasi- leiro com relação à importância de determinadas práticas pedagógicas e sua valorização no espaço escolar. A importância da psicomotricidade, nesta que é a primeira etapa da Educação Básica (BRASIL, 2017), centra-se na possibilidade de identificar precocemente as deficiências e limitações das crianças desde a mais tenra idade, tendo pela frente tempo hábil para amenizá-las ou até mesmo revertê-las. Soma-se a isso o fato de que o psicomotricista não enfatizará apenas um recorte da realidade, mas sim optará por um trabalho dinâmico que englobe os aspectos emocionais, cognitivos e motores das crianças. Em geral, todas as crianças podem se beneficiar da prática profissional ou, ao menos, das teorias e técnicas da psicomotricidade no ensino infantil. O psicomotri- cista não precisa sempre estar voltado a um trabalho pedagógico individualizado, pois é na dinâmica da sala de aula que o educador poderá exercer a beleza de sua profissão, ao integrar os deficientes, identificar as limitações e potencialidades da turma, bem como oportunizar a todos, sem exceção, o acesso a um ensino sistematizado de qualidade direcionado ao seu desenvolvimento integral. Psicomotricidade aplicada à educação infantil 5 A psicomotricidade em diferentes estágios de desenvolvimento infantil O trabalho psicomotor vem ganhando cada vez mais destaque no ensino infantil. Via de regra, tal relevância está centrada no fato de que o trabalho pedagógico pode prevenir ou até mesmo amenizar problemas atrelados à aprendizagem. Tendo-se em vista que o desenvolvimento da criança ocorre de maneira gradativa ao longo de seu crescimento, concomitantemente à sua capacidade de se adaptar diante das suas necessidades básicas (AQUINO et al., 2012), cabe ao psicomotricista observar justamente os estágios de desenvolvimento infantil e adequar a tal demanda o trabalho pedagógico, tendo como base a psicomotricidade. Diante desse cenário, neste capítulo, serão apresentados os estágios de desenvolvimento infantil de acordo com a teoria de Henri Wallon, a qual o psicomotricista poderá levar em consideração ao sistematizar o ensino, a fim de otimizar a sua intervenção. Diferentemente de outros pensadores da educação, em suas proposições, Wallon questionou a visão linear do desenvolvimento infantil, bem como a abordagem psicométrica adotada. Para ele, o educador, ao mensurar, quantificar e avaliar a inteligência infantil por meio de testes, nem sempre alcançará um resultado fidedigno à reali- dade, pois esses instrumentos são limitados (FREITAS; ALMEIDA; TALAMONI, 2020). Nesse sentido, Wallon acredita que o desenvolvimento humano é um processo marcado por avanços, recuos e contradições (FREITAS; ALMEIDA; TALAMONI, 2020). Em linhas gerais, para Wallon, o desenvolvimento infantil está centrado na afetividade, isto é, a capacidade que os seres humanos têm de ser afetados pelo mundo externo e interno. É justamente a partir desse pressuposto que o autor estruturou a teoria acerca dos estágios de desenvolvimento da criança. O Quadro 2, a seguir, apresenta alguns aspectos da epistemologia de Wallon no que tange aos estágios de desenvolvimento infantil. Quadro 2. Estágios de desenvolvimento infantil de acordo com Henri Wallon Estágio Faixa etária Campos funcionais 1. Impulsivo Emocional 0 a 3 meses 3 meses a 1 ano A criança é regida pela afetividade e usa de movimentos reflexos, choro, grito e expressão de sílabas para relacionar-se com o mundo. (Continua) Psicomotricidade aplicada à educação infantil6 Estágio Faixa etária Campos funcionais 2. Sensório-motor projetivo 12 a 18 meses 3 anos Inicialmente, no estágio sensório- motor, a criança permanece em uma fase de subordinação. Em seguida, quando ela aprende a segurar objetos e a se deslocar, ocorre a fase de exploração do mundo por meio dos sentidos e das habilidades motoras. Contudo, por volta dos 3 anos de idade, a criança atinge o estágio projetivo, que, conforme designa o próprio nome, tem predomínio de relações exteriores e cognitivas da criança com o meio. 3. Personalismo Crise de oposição Idade da graça Imitação 3 aos 6 anos 3 aos 4 anos 4 aos 5 anos 5 aos 6 anos Predomínio da afetividade, com concomitante formação da personalidade e autoconsciência. Nessa fase, é comum ocorrer a negação dos adultos por parte da criança, que busca autonomia. 4. Categorial 6 a 11 anos Predomínio da inteligência e da exterioridade, em que a criança segue avançando do pensamento abstrato para o pensamento simbólico, fato que favorece a memória, a atenção e o desenvolvimento do raciocínio. 5. Adolescência A partir dos 11 anos Fase da vida de caráter afetivo atrelada às mudanças físicas, hormonais e psicológicas decorrentes da maturação biológica. Fonte: Adaptado de Freitas, Almeida e Talamoni (2020). Um aspecto importante a ser destacado no que tange aos estágios de desenvolvimento infantil propostos por Wallon é que a idade não é o indicador principal (FREITAS; ALMEIDA; TALAMONI, 2020). Adentrar uma nova faixa etária não necessariamente implicaria afirmar que a criança aprendeu todos os pressupostos da fase anterior, ou até mesmo que não sabe nada acerca dos novos elementos a serem incorporados na fase seguinte. Portanto, deve-se ter essas categorias apenas como um norte, prestando-se especial atenção (Continuação) Psicomotricidade aplicada à educação infantil 7 às características dos campos funcionais. Afinal, o objetivo não é meramente passar de fase, mas sim oportunizar, por intermédio de um ensino diretivo e sistematizado, a aprendizagem das crianças desde a mais tenra idade. Agora que você já identificou quais são os estágios de desenvolvimento de acordo com a teoria de Henri Wallon, é preciso ter em mente que: [...] para Wallon o desenvolvimento não se encerra no estágio da adolescência, mas permanece em processo ao longo de toda a vida do indivíduo. Afetividade e cognição estarão, dialeticamente, sempre em movimento, alternando-se nas dife- rentes aprendizagens que o indivíduo incorporará ao longo de sua vida (FREITAS; ALMEIDA; TALAMONI, 2020, p. 272). Quem foi Henri Wallon? Médico, filósofo e psicólogo que viveu entre os séculos XIX e XX e se dedicou ao estudo da criança, direcionando osseus esforços para entender a origem dos processos psicológicos. Para Wallon, é por intermédio da interação entre as capacidades cognitivas, afetivas e motoras que ocorrerá o desenvolvi- mento integral da criança. Para saber mais a respeito do pensamento pedagógico de Wallon, assista ao vídeo “Afetividade e Inteligência – Teoria Psicogenética”, disponível no canal Didatics, no YouTube. Qual são os pressupostos teóricos dos estágios de desenvolvimento propostos por Wallon? Para Wallon, ao longo do seu processo de crescimento e desenvolvimento, a criança busca construir a sua própria identidade, e isso se dá por intermé- dio de avanços, regressos e até mesmo rupturas. O que Wallon enfatiza é a predominância da afetividade nos diversos estágios de desenvolvimento, em um contínuo movimento de internalização (introspecção) e externalização (extroversão), rumando em direção à autonomia. Para saber mais acerca dos estágios de desenvolvimento infantil elaborados por Henri Wallon, assista ao vídeo “Desenvolvimento infantil – Teoria Psicogenética”, disponível no canal Didatics, no YouTube. Como Henri Wallon é reconhecido atualmente? Wallon é tido por uns como o psicólogo da emoção. Já outros acreditam que ele foi principalmente o psicólogo da criança. Outros, ainda, acreditam que ele foi o idealizador do projeto da reforma do ensino francês. De fato, ele foi tudo isso, mas foi principalmente um psicólogo que dedicou os seus esforços a estudar o desenvolvimento infantil. Para saber mais acerca da produção acadêmica e do pensamento de Wallon, assista ao vídeo “Pensadores na educação: Wallon”, disponível no canal Instituto Claro, no YouTube. Psicomotricidade aplicada à educação infantil8 Desse modo, no ensino infantil, o educador tem pela frente uma salutar missão. Por um lado, ele tem de orquestrar a sua prática docente de modo a corresponder ao que dispõem os documentos norteadores da educação nacional, como, por exemplo, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRA- SIL, 2017). Por outro lado, ciente dos estágios de desenvolvimento infantil, o educador precisa atrelar a problematização dos objetivos de aprendizagem dispostos nos diferentes Campos de Experiências da BNCC para a educação infantil às técnicas psicomotoras, a fim de não enfatizar apenas um aspecto do desenvolvimento, seja ele afetivo, cognitivo ou motor. Assim, ele deve aliar a sinergia entre esses aspectos do desenvolvimento à prática pedagógica, de modo a oportunizar o aprendizado das crianças. A importância da psicomotricidade na educação infantil Atualmente, a educação infantil tem sido moldada para tratar a criança como o centro do processo de ensino-aprendizagem. Mediante essa moderna empreitada, é preciso reconhecer que nem sempre a infância foi tratada sob esse prisma. Por vezes, as crianças foram tidas como adultos em miniatura, ou até mesmo foram desvalorizadas em suas expressões próprias do mundo infantil, quando, na verdade, esses pequenos ávidos por aprender estão em contínua descoberta de si e do entorno que os cerca. Em contrapartida, hoje, o professor que está alocado no ensino infantil é tido apenas como um facilitador da aprendizagem. Não seria essa uma visão reducionista demais do seu valoroso papel de cuidar e educar as crianças? Diante desse contexto de prática profissional, nesta seção, será apresentada a importância da psicomotricidade para o desenvolvimento integral das crianças, bem como a preciosa oportunidade que o profissional de educação física tem em mãos para sistematizar o ensino por intermédio da teoria e das técnicas psicomotoras. Inicialmente, faz-se necessário refletir acerca do papel da psicomotrici- dade no desenvolvimento integral das crianças desde a mais tenra idade. Uma vez ciente de que diferentes grupamentos etários estão presentes na educação infantil (Figura 1), o educador precisa direcionar a sua prática pedagógica às necessidades e etapas do desenvolvimento do aluno. O tão falado desenvolvimento integral da criança seria, portanto, a demons- tração da difícil equação entre propostas de ensino e realidade escolar, Psicomotricidade aplicada à educação infantil 9 entre teorias e técnicas pedagógicas. Na prática, trata-se de trabalhar a criança como um todo, sem privilegiar as partes, na busca pela sinergia no aprendizado. Figura 1. Grupamentos etários das crianças no ensino infantil. Fonte: Adaptada da BNCC (BRASIL, 2017). Eis aí o papel singular da psicomotricidade, ciência aplicada que aglutina não somente os aspectos emocionais e cognitivos, mas também leva em consideração a contribuição dos aspectos motores na dinâmica do processo de ensino-aprendizagem (AQUINO et al., 2012). Nesse sentido, para o educa- dor no ensino infantil, a atividade psicomotora é uma ferramenta que pode ser acoplada à engrenagem de ensino, a fim de polir a pedra preciosa da aprendizagem. Contudo, para que a boa semente das técnicas psicomotoras possa crescer e dar frutos, é preciso que o psicomotricista cerque a sua área de intervenção de criatividade e ludicidade. Nesse sentido, o lúdico é a chave entre o mundo real e o imaginário para a criança, e essa abordagem não somente desperta a criança para a aula, como também favorece a sua espontaneidade e participação (CIPRIANO; MOREIRA, 2016). Diante desse cenário, qual é a importância da psicomotricidade para a educação física escolar no ensino infantil? De acordo com Aquino et al. (2012, p. 256): [...] a psicomotricidade e a educação física estão intimamente interligadas, uma vez que são duas metodologias que visam a trabalhar com o corpo em movimento proporcionando à criança o desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo social, por meio das atividades motoras. Por meio do movimento, a criança desenvolve a cognição, já que as experiências corporais modificam o intelecto, a vida afetiva e as ações motoras do indivíduo. Assim, é no mínimo questionável quando nos deparamos com práticas educativas no ensino infantil que impõem a restrição do movimento hu- mano sob a prerrogativa de facilitar o aprendizado (AQUINO et al., 2012). Práticas de outrora sublinhavam a necessidade de se manter imóvel e em Psicomotricidade aplicada à educação infantil10 silêncio por um longo período, mas será, de fato, que esse é o caminho para o sucesso da aprendizagem escolar? Há quem diga que: “A exigência de contenção motora está baseada na ideia de que o movimento impede a concentração e a atenção da criança, prejudicando a aprendizagem [...]” (AQUINO et al., 2012, p. 247). É claro que uma total algazarra em sala de aula denota, no mínimo, a ausência do docente; se porventura este estiver presente, possui nota zero de intencionalidade pedagógica, não é mesmo? Nesse sentido, se o movimento é um aliado do desenvolvimento dos aspectos emocionais e cognitivos, por que não o ordenar de modo a alcançar tal êxito? É por isso que o papel do educador no ensino infantil vai muito além de vigiar as crianças enquanto elas brincam (BORRE; REVERDITO, 2019). O trabalho pedagógico precisa ter bem claro o seu alvo a longo, médio e curto prazo para que seja bem-sucedido, de forma que a educação infantil não seja apenas um mero passatempo para as crianças, mas sim um investimento, cujo aprendizado poderá contribuir sobremaneira para as demais etapas da escolarização que estão por vir. Nessa perspectiva, destaca-se a relevância de os educadores que atuam no ensino infantil, desde os pedagogos até os profissionais de educação física, buscarem aprofundar os seus conhecimentos acerca da teoria e das técnicas psicomotoras por meio da formação continuada. De acordo com Aquino et al. (2012), a psicomotricidade é uma valiosa ferramenta que poderá auxiliar no desenvolvimento das potencialidades e/ou diminuir as defasagens das crianças, de modo a estimular o desenvolvimento integral dos alunos. Nesse sentido, pode-se concluir que a psicomotricidade é uma ferra- menta que poderá ser aplicada no ensinoinfantil, a fim de contribuir para o desenvolvimento integral das crianças. O educador que atua com esse público poderá oportunizar o desenvolvimento dos elementos psicomotores, de modo a estimular o aprendizado não somente dos aspectos emocionais e cognitivos, mas também dos motores. Quanto à linguagem corporal, cabe destacar o papel do profissional de educação física no ensino infantil, uma vez que tanto a psicomotricidade quanto a educação física escolar convergem para o mesmo objeto de trabalho: o corpo em movimento. Sendo assim, o educador poderá valer-se da teoria e das técnicas psicomotoras nos diferentes estágios de desenvolvimento das crianças, a fim de adequar as propostas pedagógicas à realidade escolar, bem como às limitações e potencialidades dos alunos. Psicomotricidade aplicada à educação infantil 11 Referências AQUINO, M. F. S. et al. A psicomotricidade como ferramenta da educação física na educa- ção infantil. Revista Brasileira de Futsal e Futebol, São Paulo, v. 4, n. 14, p. 245–257, 2012. BORRE, L. M.; REVERDITO, R. S. Educação física na educação infantil: tempos, espaços e os direitos da criança. Revista Corpoconsciência, Cuiabá, v. 23, n. 2, p. 96–108, 2019. BRASIL. Lei nº 13.794, de 3 de janeiro de 2019. Dispõe sobre a regulamentação da atividade profissional de psicomotricista e autoriza a criação dos Conselhos Federal e Regionais de Psicomotricidade. Brasília: Presidência da República, 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13794.htm. Acesso em: 1 dez. 2020. BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 1 dez. 2020. CIPRIANO, L. S.; MOREIRA, E. A importância da ludicidade para o desenvolvimento da psicomotricidade na prática dos profissionais da educação infantil. In: PARANÁ. Secretaria da Educação. Os desafios da escola pública paranaense na perspectiva do professor PDE. Curitiba: Secretaria da Educação, 2016. (Cadernos PDE, v. 1). p. 1–16. COSTA, C. F. et al. Professor de educação física na educação infantil na perspectiva da Base Nacional Comum Curricular. Biomotriz, Cruz Alta, v. 13, n. 4, p. 18–26, 2019. FREITAS, N. A. O.; ALMEIDA, N. M. C. B.; TALAMONI, A. C. B. Educação infantil na base nacional comum curricular: pressupostos epistemológicos em Piaget, Vigotsky e Wallon. EDUCERE: Revista da Educação, Umuarama, v. 20, n. 2, p. 259–278, 2020. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Psicomotricidade aplicada à educação infantil12
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