Prévia do material em texto
AULA 2 PROCESSO TRIBUTÁRIO – PROCEDIMENTOS E DEFESAS NAS ESFERAS JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS Prof. Arthur Augusto Garcia 2 TEMA 1 – FASES DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO Da mesma forma que o processo civil, trabalhista e criminal, o processo administrativo tributário também possui suas fases definidas, e são estas que aprenderemos agora. 1.1 Impugnação A impugnação, também chamada de reclamação ou defesa, é apresentada por escrito no prazo de 30 dias, iniciando essa contagem da data da intimação do auto de infração ou da notificação do lançamento. O início da fase litigiosa do procedimento administrativo é fixado no momento em que se faz a defesa, pois é nela que o contribuinte impugnará o ato emanado pela autoridade fazendária, ou seja, do ato de infração ou notificação de lançamento. Legalmente falando, o Decreto n. 70.235/1972 estabelece em seu art. 16 que: Art. 16. A impugnação mencionará: I - a autoridade julgadora a quem é dirigida; II - a qualificação do impugnante; III - os motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões e provas que possuir; IV - as diligências, ou perícias que o impugnante pretenda sejam efetuadas, expostos os motivos que as justifiquem, com a formulação dos quesitos referentes aos exames desejados, assim como, no caso de perícia, o nome, o endereço e a qualificação profissional do seu perito. V - se a matéria impugnada foi submetida à apreciação judicial, devendo ser juntada cópia da petição. (Brasil, 1972) Já no que tange ao ônus da impugnação, se a matéria não estiver contida expressamente na defesa, será considerada preclusa e não impugnada, ou seja, a Administração Pública poderá realizar a cobrança, independentemente das outras matérias impugnadas, o que ocorrerá em autos apartados. Nesse sentido, temos o art. 21, parágrafo 1º do Decreto n. 70.235/1972, o qual aduz que: Artigo 23 [...] Parágrafo 1º No caso de impugnação parcial, não cumprida a exigência relativa à parte não litigiosa do crédito, o órgão preparador, antes da remessa dos autos a julgamento, providenciará a formação de autos apartados para a imediata cobrança da parte não contestada, consignando essa circunstância no processo original. 3 Uma vez realizada a defesa da matéria, ao crédito tributário será atribuído o efeito processual suspensivo, ou seja, gerará a suspensão do crédito tributário que impede o ajuizamento de eventual execução fiscal, até que o julgamento definitivo seja concluído. No corpo da defesa, muitas vezes, poderá haver a indicação de prova que a fundamente, sendo que esta deverá ser anexada juntamente com a petição de defesa, sob pena de preclusão, excetuados os casos de demonstração clara de impossibilidade de apresentação, o que acarreta a apresentação da prova em momento oportuno; quando a prova se refere a fato ou a direito superveniente; ou destinar-se a contrapor razões ou fatos posteriores ao trazidos no processo. Importante que nas três hipóteses acima a juntada dos documentos probatórios pode ocorrer a qualquer momento, desde que o interessado formule um requerimento à autoridade julgadora. Saiba mais Acesse o link para verificar o Modelo de Impugnação aceito pela RFB: <http://receita.economia.gov.br/formularios/processos/modelos-de-impugnacao- e-manifestacao-de-inconformidade/modelo-de-impugnacao-pessoa-fisica/view>. Acesso em: 30 dez. 2019. 1.2 Julgamento É determinada pela autoridade julgadora de primeira instância, seja de ofício ou a requerimento do impugnante, a realização das diligências ou perícias necessárias para o julgamento do processo tributário (Almeida, 2017), sendo que a autoridade julgadora pode proceder com o indeferimento de diligências que, fundadamente, considere inúteis ou impraticáveis. Recairá sobre a pessoa do Auditor Fiscal a designação para proceder com os exames relativos a diligências ou perícias (Almeida, 2017). Desta forma, quando ocorrer o encerramento da instrução, a lide será levada a julgamento, sendo que os delegados da Receita Federal do Brasil não mais possuem essa atribuição no que tange aos processos de primeira instância administrativa. Atualmente esse julgamento é feito nas Delegacias da Receita Federal do Brasil – DJR. Esses órgãos possuem uma deliberação interna e de natureza colegiada no âmbito da Receita Federal, ou seja, são organizados em turmas de julgamento que têm cinco membros cada. Estes membros são nomeados como integrantes http://receita.economia.gov.br/formularios/processos/modelos-de-impugnacao-e-manifestacao-de-inconformidade/modelo-de-impugnacao-pessoa-fisica/view http://receita.economia.gov.br/formularios/processos/modelos-de-impugnacao-e-manifestacao-de-inconformidade/modelo-de-impugnacao-pessoa-fisica/view 4 da DRJ e possuem mandato de dois anos, admitindo-se a sua recondução. As DRJ são assessoradas pelas Divisões de Julgamento que estão presentes em todo o Brasil, de acordo com suas regiões fiscais. Dentro das DRJ há uma prioridade de julgamento. Assim, aqueles processos que possuem indícios de crime contra a ordem tributária e os de elevado valor têm prioridade no julgamento. Como em todo processo, as decisões da DRJ podem ser improcedentes, procedentes ou parcialmente procedentes, e devem estar devidamente fundamentadas e contendo um relatório, fundamentação e dispositivo. Nas decisões da DRJ deverá haver, também, a informação do prazo para eventual recurso, que é destinado ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, instância superior. Importante mencionar que não cabem embargos de declaração nas decisões proferidas pela DRJ. E, no que tange a erros de escrita ou de cálculos, mediante requerimento do impugnante ou de ofício pelo colegiado, poderão ser retificados a qualquer tempo. Saiba mais Acesse “Doutrina – edição comemorativa 25 anos”. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Dout25anos/article/view/ 1106/1040>. Acesso em: 30 dez. 2019. TEMA 2 – OS MEIOS DE PROVA DO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO CONTENCIOSO Processualmente dizendo, a prova pode significar o ônus de demonstrar a ocorrência de um fato, sendo o instrumento que é utilizado por qualquer das partes envolvidas na lide para realizar essa demonstração. Importante mencionar que é admissível em qualquer juízo a prova, desde que esta não seja adquirida de modo ilícito. Assim, os meios dos quais a prova é constituída devem nascer no campo da licitude, no qual tudo o que não está proibido é permitido (Machado, 2017). Desse modo, as provas no processo tributário constituem um importante instituto e podem ser utilizadas dos mais variados meios, meios estes que veremos neste conteúdo. https://ww2.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Dout25anos/article/view/1106/1040 https://ww2.stj.jus.br/publicacaoinstitucional/index.php/Dout25anos/article/view/1106/1040 5 2.1 Prova documental Para entendermos o conceito de prova documental analisaremos primeiramente o conceito de Pontes de Miranda, que estabelece que “documento, como meio de prova, é toda coisa em que se expressa por meio de sinais, o pensamento. Esse é o sentido restrito e técnico, que supõe o conteúdo intelectual como elemento definidor do documento” (Miranda, 2001). Assim, trataremos como documento as escrituras, certidões, livros comerciais, fotografias, recortes de jornal, até mesmo bilhetes escritos à mão etc. Atualmente são considerados também como documentos os arquivos e registros eletrônicos. Além disso, a perícia contábil (exame de documentos), um dos meios de prova mais utilizados no âmbito do processo tributário, é a prova documental. Ela deve acompanhar, como vimos anteriormente, a fundamentação do ato administrativo, e tem como objetivo demonstrara existência de fatos nos quais se baseia esse ato, conforme demonstrado no Decreto n. 70.235/1972, especificamente nos arts. 9º e 16, parágrafo 4º. A prova documental é exigida pela legislação federal e é necessariamente apresentada em conjunto com a impugnação (defesa) quando invocada pelo impugnante, excetuada nas hipóteses vistas anteriormente, em que a prova pode ser juntada posteriormente. Já em relação à autenticidade do documento, há algumas considerações a serem realizadas, e a primeira delas é em relação aos documentos particulares trazidos ao processo administrativo tributário pelo impugnante. Estes são produzidos pelo próprio contribuinte ou por terceiros. Existem posicionamentos de que esses documentos possuem mais valor probatório que os documentos feitos por autoridades administrativas, todavia, trata-se de um posicionamento mínimo por parte da doutrina tributária. A doutrina majoritária tem entendido que não há razões para a hierarquia entre esses dois tipos de documentos, por exemplo, um livro fiscal ou contábil, que são documentos confeccionados pelo contribuinte ou para ele, não têm menor valor probatório que uma certidão emitida por um órgão público. Outra consideração a ser feita a respeito da autenticidade dos documentos está ligada aos chamados “documentos eletrônicos”, que atualmente têm sido utilizados em larga escala em virtude das mudanças tecnológicas que têm ocorrido não só na sociedade como também no poder judiciário e órgãos públicos. 6 Essa consideração é importante, pois as informações existentes nesse tipo de documento podem ser alteradas sem o menor problema. É por essa razão que devem ser aplicados registros e métodos de segurança que permitam ao contribuinte permanecer com cópia desses documentos, uma vez levados pelo fiscal para análise, pois se houver alguma alteração ilícita o contribuinte tem como realizar prova deste ato, garantindo a autenticidade desses documentos eletrônicos. Um outro aspecto que precisa ser discutido refere-se à juntada de documentos fotocopiados aos autos do processo, visto que em determinadas situações algumas autoridades dão mais valor probatório aos documentos autenticados, o que não é obrigatório, pois acreditam esses que o aval do oficial do cartório dá credibilidade ao documento, o que não é verdade, pois a autenticação cartorária é feita por semelhança, ou seja, o cartório autentica que o documento copiado é igual ao documento original, o que não assegura necessariamente que a informação contida nesse documento seja verdadeira. Dessa forma, é importante analisar esse aspecto com certa razoabilidade, então os julgadores têm adotado o entendimento de que o documento fotocopiado será aceito, exceto nos casos em que houver a contestação da veracidade daquele documento. Esse entendimento é pautado no princípio da presunção da boa-fé e na presunção de inocência. 2.2 Realização de perícia e diligências Os fatos do processo administrativo tributário podem ser esclarecidos por exames na escrita contábil e/ou fiscal do sujeito passivo ou de terceiros. Ainda, pode vir a ser necessário que especialistas na área do conhecimento na qual a prova se funda venham a se manifestar a respeito, como por exemplo, contadores, engenheiros, médicos etc. É em virtude dessa necessidade que podem ser realizadas as perícias e diligências. A perícia é realizada por profissional de conhecimento especial, direcionado ao objeto da prova. No processo tributário é muito comum a realização de exames periciais por profissional de Ciências Contábeis. Caso o impugnante deseje produzir prova pericial, esta deve ser requerida no momento da impugnação, conforme Decreto n. 70.235/1972, indicando inclusive os quesitos que deseja que sejam respondidos pelo perito. 7 Quando há menção a provas periciais na legislação, juntamente há também a possibilidade de realização de diligências. Estas significam, de forma ampla, toda e qualquer providência de caráter investigativo que é determinada pelo julgador, ou seja, abrangida aqui a prova pericial. Já em sentido estrito há uma sutil diferenciação, à luz do Decreto n. 70.235/1972, de diligência e perícia, consistindo a primeira em um exame técnico especializado e a segunda, uma mera verificação in loco da ocorrência de determinado fato, verificação esta que dispensa conhecimento específico, como por exemplo, constatar se o estabelecimento indicado em um documento realmente funciona no endereço indicado (Machado, 2017). Corroborando a distinção trazida anteriormente, temos Carvalho, que esclarece que: A diligência, como a perícia, tem por escopo deixar evidente um fato, ou circunstância, necessário muitas vezes, ao acerto da decisão; mas, enquanto a primeira expressa uma providência que pode ser de pronto atendimento, a segunda indica muitas vezes uma tarefa penosa e complexa, a demandar maior tempo para a sua realização. No âmbito do processo administrativo, a perícia é realizada por um servidor público, quando há necessidade de conhecimentos específicos distintos do contábil, são realizados por profissionais vinculados a outros órgãos públicos. Por fim, ao impugnante é concedida, em virtude do princípio do contraditório, a possibilidade de realizar manifestações a respeito das conclusões periciais. Tal manifestação é concedida em virtude da possibilidade de verificação de erros ou solicitação de esclarecimento, interpretações sobre as conclusões dos peritos. A não concessão dessa possibilidade pode ser considerada cerceamento ao seu direito de defesa, invalidando o processo. Saiba mais “IRPJ – Processo Administrativo Fiscal – Nulidade da Decisão de Primeiro Grau – Cerceamento do Direito de Defesa – Ocorrência – É nula a decisão de primeiro grau que não abre, ao sujeito passivo, a oportunidade de se manifestar sobre o resultado de diligência realizada, notadamente quando dessa providência fatos ou argumentos novos são trazidos não só para a mantença, como também para agravar a exigência tributária. Preliminar acatada. Por unanimidade de votos, acolher a preliminar de nulidade de primeiro grau. [...]” (Ac. n. 101-93.804 da 1ª C. do 1º CC – Rel. Sebastião Rodrigues Cabral – DOU I de 16.7.2002, p. 34 – Repertório IOB de Jurisprudência n. 32/2002, p. 2). 8 2.3 Prova testemunhal Chama-se prova testemunhal quando são chamadas a comparecer ao processo pessoas que não fazem parte da lide. Tem como objetivo expor fatos a respeito do objeto da ação. No processo administrativo tributário é pouco utilizada a prova testemunhal. Contudo, elas são empregadas nas seguintes hipóteses, elencadas por Segundo (2017): a) o impugnante comparece à repartição fiscal para cumprir determinada exigência no último dia do prazo que lhe foi fixado (apresentar defesa, manifestar-se sobre a perícia, interpor recurso etc.), e encontra a repartição vazia, de modo anômalo, antes do término do expediente normal. Indagando a respeito do servidor responsável pelo protocolo de petições, é informado pelo porteiro que o mesmo “teve de sair mais cedo”. Nesse caso, o testemunho do porteiro – e do servidor que “teve de sair mais cedo” – são essenciais para demonstrar a tempestividade do ato praticado no dia seguinte; b) uma fiscalização estadual apreende livros contábeis de determinado contribuinte, mas, de modo ilegal, não lhe fornece qualquer “termo de apreensão”. Em momento posterior, o mesmo contribuinte é fiscalizado pela Receita Federal, que lhe exige os mesmos livros. Testemunhas poderão atestar que os tais livros existem, estão escriturados, e não foram apresentados porque se encontram em poder do Fisco Estadual, que pode inclusive ser requisitado a apresentá-los, devolvê-los ao contribuinte, ou pelo menos confirmar a apreensão; c) fiscais de uma fronteira interestadual apreendem todo o carregamento de um determinadocaminhão, e condicionam a liberação ao pagamento de quantias de ICMS que entendem devidas. Não obstante isso, não fornecem nenhum documento que comprove a apreensão. Qualquer providência por parte do contribuinte, seja para liberar as mercadorias, seja para questionar a exigência do imposto, quer no âmbito administrativo, quer no âmbito judicial, depende do testemunho do motorista, e de outras pessoas envolvidas, de que houve a apreensão abusiva. Assim, em todos os casos elencados nos quais a documentação não seja suficiente ou até mesmo inexista, a comprovação das alegações realizadas na impugnação é confirmada através das testemunhas, que devem ser intimadas pela autoridade julgadora. 9 2.4 Prova emprestada Tal instituto também existe no processo judicial. Assim, uma prova produzida em um processo administrativo tributário pode ser utilizada (emprestada) para utilização em outro processo administrativo. É importante, porém entender que somente a prova pode ser emprestada e não a decisão proferida com base nessas provas, o que desrespeitaria os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Saiba mais “IRPJ – Omissão de Receitas – Empresa que Paga o Imposto com Base em Lucro Presumido – Prova Emprestada. Não pode prosperar presunção de omissão de receita baseada, unicamente, em prova emprestada do fisco estadual que não é conclusiva quanto a saídas de mercadorias não escrituradas, máxime quando a fiscalização procedeu ao lançamento mediante simples menção ao auto lavrado na área estadual; o que se toma emprestado é a prova e não o auto de infração estadual.” (Proc. n. 10.665/000.825/87-16, 3ª Câmara do 1º CC, DOU 3.4.1989, p. 4.940.) TEMA 3 – DAS DECISÕES DE PRIMEIRO GRAU DO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO E SEUS RECURSOS 3.1 Decisões de primeiro grau Os órgãos julgadores de primeira instância do processo administrativo tributário possuem uma autonomia bastante reduzida. Na prática, têm o hábito de limitar sua atuação apenas a homologar o ato impugnado. Existem poucas hipóteses em que o julgador de primeira instância considere procedente, mesmo que em parte, a impugnação apresentada. Essas, via de regra, versam sobre aspectos práticos que podem ser demonstrados com os documentos juntados na defesa, como por exemplo, um tributo já pago pelo contribuinte, porém que continua em aberto. Assim, apenas com o comprovante de pagamento se faz prova da liquidação do débito. Já nas ações que versam sobre problemas mais complexos, em que há perícias a serem feitas, ou quando há discussão de direito, os argumentos do impugnante são afastados em função de mera repetição dos termos já 10 empregados na fundamentação do ato da impugnação (Segundo, 2017). Frisa-se que isso ocorre, em regra. Tais meios de agir são justificados pela imparcialidade orgânica dos órgãos julgadores de primeira instância, uma vez que não possuem especialidades funcionais, pois são julgadores e não fiscais. Assim, o órgão julgador de primeira instância, na maior parte deles, é composto de decisões monocráticas (tomadas por uma pessoa). Todavia, no âmbito federal o órgão monocrático foi substituído por Delegacias de Julgamento, que são órgãos de deliberação colegiada da RFB, ou seja, as decisões são tomadas por turmas julgadoras que são compostas por servidores da Administração Fazendária. As turmas julgadoras, ao proferirem uma decisão, assim como no âmbito judicial, devem decidir de forma fundamentada a procedência ou improcedência, indicando manifestação sobre todas as razões aludidas pelo impugnante. 3.2 Recurso voluntário e recurso de ofício Conforme o princípio constitucional do devido processo legal (Art. 5º, LIV, CF/88), uma vez proferida uma decisão de primeiro grau é possível recorrer à segunda instância para reanálise das alegações. Havendo uma decisão de primeiro grau em que haja prejuízos à Fazenda Pública, é possível a interposição do recurso de ofício, que é feito pela própria autoridade julgadora. Assim, trata-se de um reexame de ofício da questão e não propriamente de um recurso. Legalmente falando, o recurso de ofício está previsto, no âmbito federal, no art. 34 do Decreto n. 70.235/1972. Já quando há na decisão prejuízos ao impugnante, este pode submeter, através do recurso voluntário, a decisão ao reexame em uma instância superior, desde que tempestivamente, ou seja, no prazo estipulado na própria decisão de primeira instância. Importante mencionar neste momento do nosso estudo que, de acordo com o princípio da verdade material, que estabelece que a administração pública deve buscar a verdade material da forma mais completa possível, não é possível a recusa de juntada de documentos no recurso voluntário. 11 3.3 Tempestividade, depósito recursal e competência para exame Após a decisão de primeira instância, é possível a interposição de recurso direcionado para a segunda instância. Então, no âmbito federal, a admissibilidade do recurso é feita pelo órgão de segunda instância, ou seja, é ele que vai analisar os requisitos de admissibilidade. Assim decidiu o TRF-5: Administrativo. Recurso dirigido ao Conselho de Contribuintes. Cabe ao órgão superior examinar o mérito do recurso administrativo, relativo à tempestividade, e não conhecera da impugnação. Remessa improvida. Dessa forma, somente o órgão de segunda instância pode deixar de conhecer o recurso por considerá-lo intempestivo, exame que não pode lhe ser subtraído por outras autoridades administrativas (Segundo, 2017). Já no que tange ao depósito recurso, conforme Súmula Vinculante 21 do STF, a exigência deste, como requisito de admissibilidade recursal, é inconstitucional. Corroborando tal entendimento, o STJ, através da Súmula 373, aduz que “é ilegítima a exigência de depósito prévio para admissibilidade de recurso administrativo”. Por fim, em relação à tempestividade, o prazo para a interposição de recurso é estipulado na própria decisão objeto do recurso. TEMA 4 – DAS DECISÕES DE SEGUNDA INSTÂNCIA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO E SEUS RECURSOS 4.1 Julgamento de segundo grau No Brasil a maioria dos tribunais administrativos tributários é composta por órgãos constituídos de forma colegiada representantes da Fazenda Pública e dos contribuintes. Assim, no âmbito federal, o julgamento de segunda instância é realizado por uma das turmas que compõem o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério Público, órgão este que foi criado após a unificação da Secretaria da Receita Federal com a Secretaria da Receita Previdenciária. Portanto, além das questões tributárias, são julgadas nesse colégio as questões previdenciárias. 12 É nesses órgãos colegiados que ocorre o julgamento do ato impugnado com um controle de legalidade. Esse julgamento, conforme Xavier (1997), representa um segundo estágio de imparcialidade orgânica, pois há ruptura [...] de dependência orgânica do órgão de revisão, que deixa de pertencer à mesma organização hierárquica (Secretaria da Receita Federal, no caso dos tributos federais) para ser atribuído a um corpo autônomo, ainda que sob a égide do mesmo órgão do Poder Executivo – o Ministério da Fazenda. Acresce que o Conselho de Contribuintes é integrado, em igual número, não apenas por funcionários do Poder Executivo, mas por particulares indicados pelo setor privado, constituindo um ‘órgão paritário’. Assim, no âmbito federal o Conselho é dividido em seções, que ainda se dividem em turmas. Sendo então recebido o recurso (ofício ou voluntário), haverá a sua distribuição a um relator que estipulará a data do julgamento, inserindo-o na pauta do dia. No âmbito do processo administrativo fiscal, o instrumento de exercício de defesa é a sustentação oral, pois é através dela que a parte pode interferirna tomada de decisão do órgão colegiado que irá decidir aquela questão. Corroborando esse entendimento, Campos (1998) aduz que: A sustentação oral do recurso se reveste de grande importância, porquanto a viva exposição de detalhes do processo, assim como o esclarecimento verbal de particularidades, enseja, de pronto, a todos os juízes, um melhor conhecimento dos mesmos, que só o juiz-relator até então sabia. Por fim, no âmbito federal, quando há a interposição de recurso de ofício, não há a intimação do sujeito passivo, como ocorre no processo judicial, para a apresentação de contrarrazões. 4.2 Recursos excepcionais (especiais) Em sua maioria os processos tributários se encerram após a análise do órgão colegiado de segundo grau. Todavia, a legislação federal traz previsão da possibilidade de interposição de recursos a instância chamadas de “instâncias especiais”. Esse recurso é cabível tanto pelo sujeito passivo quanto pela Fazenda Pública, quando houver divergência entre turmas ou câmaras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, conforme regulamentação dada pela Lei n. 11.941/2009. Pode-se fazer uma analogia aos embargos de declaração do processo judicial. Assim, no âmbito do processo administrativo fiscal federal, a CSFR possui 13 a função uniformizadora, restringindo-se os julgamentos a matéria da divergência, desde que pré-questionada, não havendo o efeito devolutivo total que há no recurso voluntário dirigido ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Segundo, 2017). Dessa forma, esse recurso especial “não tem, por escopo, a proteção de direito individual do sujeito passivo; sua finalidade principal é garantir a correta compreensão da aplicação da legislação federal no contencioso administrativo” (López, 2002). Para López, a Câmara Superior de Recursos Fiscais [...] não deve exercer papel de terceira instância de revisão, deve apenas apreciar o recurso especial com relação à divergência arguida já que nem toda a matéria decidida na instância a quo lhe é devolvida pela interposição do recurso especial. Decerto, a existência de interpretações divergentes do direito positivo entre as diversas Câmaras do Conselho de Contribuinte prejudica a efetividade e a uniformização da jurisprudência administrativa. A instância especial, portanto, protege a coerência do sistema, eliminando controvérsias e afastando julgamentos contraditórios em situações fáticas e jurídicas idênticas. Por fim, é possível verificar que para que esse recurso seja interposto é necessário haver apenas divergência entre as Câmaras do Conselho, e não há necessidade de haver não unanimidade na decisão recorrida. É nesse sentido que a Lei n. 9.784/1999, em seu art. 37, impõe à parte recorrente a apresentação da decisão, em inteiro teor. TEMA 5 – PROCESSO ADMINISTRATIVO NÃO CONTENCIOSO É chamado de processo administrativo não contencioso, pois a iniciativa parte do contribuinte e não há um litígio configurado entre o fisco e ele. Assim, este processo pode iniciar com a consulta e a denúncia espontânea. 5.1 Consulta administrativa Aqui trataremos a respeito do processo administrativo voluntário, que possui caráter preventivo, uma vez que o contribuinte questiona oficialmente o Fisco, seja ele municipal, estadual ou federal, a respeito de uma solução adequada para uma situação jurídica tributária na qual se encontra. Dessa forma, em síntese, a consulta, de forma objetiva, tem como foco tirar uma dúvida sobre como aplicar ou não a legislação tributária. 14 Legalmente falando, o processo de consulta é regulamentado pelo Decreto n. 7.574/2011, entre os arts. 46 e 48, e também pela Lei n. 9.430/1996, entre os arts. 48 e 50. Saiba mais Confira os Modelos de Consulta no link a seguir – IN RFB 1434/2016: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&i dAto=48914>. Acesso em: 30 dez. 2019. 5.2 Denúncia espontânea Quando o contribuinte realiza a comunicação do cometimento de uma infração anteriormente ao início de qualquer procedimento fiscal por parte do órgão responsável, o Código Tributário Nacional – CTN elenca as hipóteses de exclusão de responsabilidade e as de atenuação de penalidades, considerando a boa-fé do contribuinte. A isso damos o nome de denúncia espontânea. Sobre esse instituto, cabe observar o contido no art. 138 do CT, o qual dispõe: Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração. (Brasil, 1966) Destarte, se percebe que o artigo traz a excludente de responsabilidade no momento da efetivação da denúncia espontânea da infração, e, se for o caso, esta será oferecida juntamente com o pagamento do tributo em si, acompanhado dos juros de mora e/ou depósito da importância apontada pela autoridade administrativa. Outra informação importante fornecida pelo artigo em comento está contida no parágrafo único, que impõe um limite temporal para o oferecimento da denúncia espontânea, ou seja, ela só pode ser realizada até o momento do início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização que esteja relacionado à infração objeto da denúncia. http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=48914 http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=48914 15 REFERÊNCIAS ANDREUCCI, R. A.; MESSA, A. F. Exame da OAB unificado: 1ª fase. São Paulo: Saraiva, 2011. BONFIM, E. M. Processo civil 1. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. BRASIL. Código de Processo Civil. Vade Mécum. 10. ed. São Paulo, 2011. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Vade Mecum. 10. ed. São Paulo, 2011. CAIS, C. P. O processo tributário. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. CARNEIRO, C. Processo tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. CASTARDO, H. F. Institutos de processo administrativo fiscal. Campinas: Apta Edições, 2012. CASTRO, A. B. Procedimento administrativo tributário. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. CHEMIN, B. F. Manual de trabalhos acadêmicos: planejamento, elaboração e apresentação. 2. ed. Lajeado: Univates, 2012. HARADA, K. Direito financeiro e tributário. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1998. MACHADO, H. B. Curso de direito tributário. 33. edição. São Paulo: Malheiros, 2012. MACHADO, H. B. Mandado de segurança em matéria tributária. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2013. p. 264. MARINS, J. Direito processual tributário brasileiro (administrativo e judicial). São Paulo: Dialética, 2003, p. 200. MELO, J. E. S. Processo tributário administrativo: federal, estadual e municipal. São Paulo: Quartier Latin, 2006. NUNES, C. S. Curso completo de direito processual tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. PAULSEN, L. Curso de direito tributário. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. SEGUNDO, H. B. M. Processo tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2012.