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1 2 METABOLISMO DO EXERCÍCIO E EMAGRECIMENTO Marcelo Conrado Dudu Haluch 3 Sobre os autores Marcelo Conrado de Freitas é formado em Educação Física, possui mestrado em Fisioterapia (UNESP) e doutorado em Ciências da Motricidade (UNESP). Professor da graduação e cursos de pós-graduação da UNIGUAÇU. Coordenador pedagógico dos cursos de Pós- Graduação da UNIGUAÇU. Dudu Haluch é nutricionista, bacharel em física, mestre em física pela USP. Autor dos livros Hormônios no Fisiculturismo (2017), Nutrição no Fisiculturismo (2018) e Emagrecimento e Metabolismo (2021). Grande experiência preparando atletas de fisiculturismo. Professor de diversos cursos de pós-graduação, lecionando disciplinas relacionadas à nutrição esportiva, fisiculturismo, obesidade, bioquímica e fisiologia. Coordenador de cursos de pós-graduação da UNIGUAÇU. 4 Sumário 1. BIOENERGÉTICA DO EXERCÍCIO FÍSICO ....................................... 6 1.1 Como acontece a produção de energia durante o exercício? .......................... 7 1.2 Metabolismo anaeróbio alático ..................................................................... 10 1.3 Metabolismo anaeróbio lático ....................................................................... 13 1.4 Exercício físico e glicogenólise ....................................................................... 19 1.5 Exercício físico e lipólise ................................................................................. 20 1.6 Metabolismo aeróbio ..................................................................................... 22 1.7 Exercício físico, AMPK e bioenergética .......................................................... 25 1.8 Exercício físico, Interleucina-6 e bioenergética .............................................. 27 2. VARIÁVEIS DO TREINAMENTO E METABOLISMO ...................... 32 2.1 Exercício intenso vs moderado: Qual a diferença no metabolismo? ............. 33 2.2 Por que em alta intensidade o uso de glicogênio muscular é maior? ........... 36 2.3 Volume no aeróbio, gasto energético e glicogênio muscular ........................ 37 2.4 Por que aumentar a intensidade do aeróbio ocorre redução na oxidação de gorduras? ............................................................................................................. 39 2.5 Influência da pausa longa vs curta sobre o metabolismo ............................. 41 2.6 Influência da pausa ativa vs passiva sobre o metabolismo ........................... 43 3. EXERCÍCIO FÍSICO E EMAGRECIMENTO ..................................... 47 3.1 Déficit calórico e emagrecimento .................................................................. 48 3.2 Componentes do gasto energético diário total ............................................. 49 3.3 Exercício, emagrecimento e compensação energética .................................. 50 3.4 Aumento do metabolismo com o exercício (EPOC) ........................................ 52 3.5 Musculação, massa muscular e emagrecimento........................................... 53 3.6 Flexibilidade metabólica e emagrecimento ................................................... 56 3.7 Hipertrofia em déficit calórico ....................................................................... 57 3.8 Aeróbio em jejum (AEJ) .................................................................................. 59 4. TREINAMENTO RESISTIDO E EMAGRECIMENTO........................ 64 4.1 Treinamento resistido e metabolismo das proteínas musculares ................. 65 4.2 Treinamento resistido e adaptações moleculares ......................................... 69 4.3 Treinamento resistido vs aeróbio no emagrecimento ................................... 71 4.4 Variáveis do treinamento resistido e gasto calórico ..................................... 72 5 5. TREINAMENTO AERÓBIO E EMAGRECIMENTO ......................... 76 5.1 HIIT vs aeróbio contínuo moderado na perda de gordura ............................ 77 5.2 Aeróbio atrapalha a hipertrofia? ................................................................... 78 5.3 Protocolos de treinamento intervalado de alta intensidade ......................... 79 5.4 Progressão do treinamento aeróbio no emagrecimento .............................. 81 5.5 Adaptações do treinamento aeróbio: Biogênese mitocondrial ..................... 82 5.6 Adaptações do treinamento aeróbio: Angiogênese ...................................... 86 5.7 Adaptações do treinamento aeróbio: Capacidade de tamponamento ......... 88 6 CAPÍTULO 1 BIOENERGÉTICA DO EXERCÍCIO FÍSICO 7 1.1 COMO ACONTECE A PRODUÇÃO DE ENERGIA DURANTE O EXERCÍCIO? A bioenergética é uma área que estuda a transferência de energia que acontece nas células. Basicamente os alimentos que consumidos e os estoques de glicogênio e triglicerídeos fornecem substratos energéticos (glicose, ácidos graxos e aminoácidos) para sintetizar moléculas de Adenosina Trifosfato (ATP). Mas, qual a importância do ATP no nosso organismo? Bom, o ATP é nossa moeda energética, ou seja, a molécula de ATP é utilizada nas diversas funções que necessitam de energia no nosso organismo. Precisamos de ATP para ter a contração muscular, transporte de substâncias entre o meio intra e meio extracelulares, secreção hormonal, transmissão de estímulos neurais, digestão e muitas outras funções. Em outras palavras, usamos o ATP constantemente como forma de energia para o organismo funcionar. Dentre as diversas funções que o organismo usa ATP para ter energia, a contração muscular é uma delas. Para ocorrer à contração muscular durante o exercício é necessário ter a interação entre os filamentos de actina e miosina (encurtamento do sarcômero), pois quando isso acontece ocorre a produção da força e o movimento acontece. Porém, essa interação de filamentos contráteis precisa de energia, e de onde vem essa energia? A energia para haver a contração muscular vem da quebra de ATP, vou explicar melhor. Durante o exercício o ATP é hidrolisado (quebrado) em adenosina difosfato (ADP) e, posteriormente, o ADP pode ser quebrado em adenosina monofosfato (AMP), ou seja, toda vez que o ATP é quebrado em ADP ocorre à liberação de energia para unir os filamentos de actina com miosina e a contração muscular acontece, como demonstrado na figura 1. Figura 1 – Reação de hidrólise do ATP para formar ADP e liberação de energia para a contração muscular. 8 Legenda: Durante o exercício a quebra de ATP em ADP aumenta, liberando energia para unir os filamentos de actina e miosina e com isso gera a produção de força muscular para o movimento acontecer. A questão é que o conteúdo de ATP no músculo é limitado. Por exemplo, a quantidade de ATP muscular em repouso gira em torno de 20,2 mmol/kg, sendo suficiente para poucos segundos de exercício, principalmente quando a intensidade é alta (Li et al, 2003). Por isso, é preciso que as células musculares estejam sintetizando constantemente moléculas de ATP para garantir energia suficiente para a contração muscular e consequentemente movimento. A pergunta que fica é: “Como a célula muscular produz o ATP?” Existem três formas que as células musculares produzem o ATP, tais como: 1) metabolismo anaeróbio alático, metabolismo anaeróbio lático e metabolismo aeróbio. Os três metabolismos estão funcionando constantemente, sendo que cada metabolismo tem a sua especificidade e dependendo da condição e intensidade de exercício ocorre predominância de um metabolismo sobre o outro (SUNDBERG et al, 2019), no qual esses detalhes serão abordados nos próximos tópicos. Se você deseja entender melhor sobre metabolismo energético é preciso compreenderque o ATP é o produto final, sendo que o metabolismo aeróbio e anaeróbio é a forma que a célula faz o ATP. Mas, para tudo isso acontecer é necessário substrato energético, ou seja, a célula precisa de matéria prima para fazer o ATP. Esses substratos energéticos são: glicose, ácidos graxos, fosfocreatina e aminoácidos. Não vamos entrar em detalhes ainda do 9 metabolismo energético, por enquanto vamos concentrar em entender o metabolismo energético de uma forma geral, e após isso estaremos aprofundando em cada metabolismo, fazendo a relação com a prática do treinamento e emagrecimento. Vamos começar abordando o funcionamento geral do metabolismo anaeróbio alático. O termo “anaeróbio” significa uma via metabólica que produz ATP sem utilizar oxigênio. Já o termo “alático” significa que esse metabolismo produz ATP sem a produção de lactato, no qual esse metabolismo também é chamado de ATP-CP ou creatina fosfato. O substrato energético para esse metabolismo é a fosfocreatina, que fica armazenada no citoplasma da célula muscular. O metabolismo anaeróbio alático é muito usado em exercício de alta intensidade com pausas mais longas entre os estímulos (HARGREAVES et al, 2020). O metabolismo anaeróbio lático também está localizado no citoplasma da célula muscular, são 10 reações químicas (glicólise) que tem como função produzir ATP através do uso da glicose que está no sangue ou o glicogênio muscular. O termo “lático” significa que esse metabolismo produz o lactato (produto final da glicólise) e quanto mais usamos esse metabolismo, maior é a produção de lactato. De um ponto de vista prático, exercício com estímulo de alta intensidade combinado com pausas curtas entre séries aumenta a demanda do metabolismo anaeróbio lático e consequentemente a produção de lactato aumenta (HARGREAVES et al, 2020). Já o metabolismo aeróbio acontece dentro das mitocôndrias, sendo que os ácidos graxos (gordura) e a glicose são os substratos energéticos para fazer o ATP. O termo “aeróbio” significa que é um metabolismo que produz ATP através do consumo de oxigênio. Quando estamos em repouso ou em exercício leve/moderado a demanda energética é baixa, então usaremos mais o metabolismo aeróbio e menos o metabolismo anaeróbio (SUNDBERG et al, 2019). Para ficar mais claro para vocês o funcionamento geral do metabolismo energético, observem a figura 2, é um resumo das vias metabólicas para a ressíntese de ATP no músculo esquelético de acordo com a localização na célula e substrato energético. Percebam que os três metabolismos compartilham da mesma função, fazer ATP. 10 Figura 2 – Resumo das vias metabólicas para a ressíntese de ATP. Legenda: As vias anaeróbias (alática e lática) acontecem no citoplasma da célula muscular. O metabolismo anaeróbio alático utiliza fosfocrestina para fazer o ATP, sendo que o metabolismo anaeróbio lático utiliza glicose plasmática e glicogênio para fazer o ATP. O metabolismo aeróbio acontece nas mitocôndrias, no qual usa ácidos graxos e glicose para fazer ATP através do consumo de oxigênio. Os três metabolismos têm o mesmo objetivo, no qual é fazer moléculas de ATP. 1.2 METABOLISMO ANAERÓBIO ALÁTICO O metabolismo anaeróbio alático utiliza a fosfocreatina como substrato energético para fazer o ATP. A fosfocreatina é encontrada em altas concentrações no músculo esquelético e cardíaco, onde atua como uma fonte de energia rápida para a formação de ATP (MCMAHON et al, 2002). Em estímulos intensos, como por exemplo, uma série de treinamento resistido ou um sprint máximo de corrida, o estoque de fosfocreatina reduz de maneira progressiva, diminuindo drasticamente em torno de 15 a 20 segundos. É importante destacar que somente quando o esforço é de alta intensidade que a 11 fosfocreatina é usada em maior velocidade, sendo em um esforço de baixa ou moderada intensidade o uso de fosfocreatina para fazer ATP é muito baixo. Vamos observar a figura 3, no qual mostra a concentração de fosfocreatina durante um exercício de alta intensidade. Vejam que após 15 segundos de estímulo a concentração de fosfocreatina no músculo diminui bastante. Figura 3 – Concentração de fosfocreatina (PCr) durante contração muscular intensa Legenda: A figura mostra que, após 15-20 segundos de exercício intenso ocorre redução dos estoques de PCr muscular. Após a execução de uma série no treinamento resistido, provavelmente há uma grande redução nos estoques de PCr, no qual a duração da pausa determinará se a restauração de PCr será completa ou incompleta. Agora observem a figura 4 e vejam que durante o trabalho muscular intenso a fosfocreatina é utilizada para sintetizar ATP. Percebam que esse processo é rápido, havendo apenas uma única reação. Por isso, quando o esforço é intenso a prioridade acaba sendo usar fosfocreatina, pois mais rápido será o fornecimento de ATP. Porém, quando a fosfocreatina diminui no músculo, a fadiga aumenta, pois com menos fosfocreatina a velocidade em fazer ATP é menor, reduzindo a capacidade do músculo em produzir força. Por isso que é impossível sustentar um esforço máximo por muito tempo, ou seja, 12 durante as repetições na musculação ou uma corrida máxima a força vai diminuindo em grande parte devido à queda de fosfocreatina muscular. Agora vamos compreender a importância da pausa entre séries para restaurar o estoque de fosfocreatina. Durante a pausa entre os estímulos intensos o processo é inverso, ou seja, o ATP proveniente principalmente das mitocôndrias (metabolismo aeróbio) é usado para restaurar a fosfocreatina. Interessante observar que a enzima creatina quinase trabalha quebrando a fosfocreatina para gerar ATP e ao mesmo tempo durante a pausa usa o ATP para refazer a fosfocreatina, como demonstrado na figura 4. Mas quanto tempo de pausa é necessário para recuperar completamente o conteúdo de fosfocreatina no músculo? Bom, para recuperar 100% o conteúdo de fosfocreatina muscular é necessária uma pausa longa, em torno de 3 a 8 minutos. Por isso que o desempenho é maior ao usar pausas longas na musculação ou corrida intervalada de alta intensidade, pois com mais fosfocreatina no músculo, maior a produção de ATP e consequentemente força. Caso a pausa for curta entre séries (menos que 3 minutos) ocorre uma restauração incompleta da fosfocreatina, reduzindo o desempenho e aumentando a dependência do metabolismo anaeróbio lático (ZAJĄC et al, 2015). Então, quando a pausa entre séries é curta, maior é o uso da glicólise e consequentemente a produção do lactato aumenta. Figura 4 – Reação química da fosfocreatina para gerar ATP Legenda: Durante o estímulo de exercício intenso o estoque de fosfocreatina é utilizado para formar ATP. Esse processo acontece quando a enzima creatina quinase 13 quebra a fosfocreatina em creatina para produzir ATP. Por outro lado, durante a pausa o estoque de fosfocreatina pode ser recuperado, havendo a necessidade de uma pausa de 3 a 8 minutos para recuperar 100% o estoque de fosfocreatina. Percebam que durante a pausa a via é invertida, no qual o ATP proveniente das mitocôndrias é usado para ressintetizar a fosfocreatina, sendo que a enzima creatina quinase também faz essa reação. 1.3 METABOLISMO ANAERÓBIO LÁTICO Em exercício de alta intensidade com mais de 10 segundos de duração (esforço máximo ou próximo ao máximo) combinado com pausas curtas entre séries (<2-3 minutos) ocorre um aumento da dependência do metabolismo anaeróbio lático, pois nesse tipo de exercício o estoque de fosfocreatina não é recuperado totalmente, necessitando ainda mais da glicólise como forma de fazer o ATP. A produção de lactato aumenta bastante nesse tipo de treinamento (intenso combinado com pausa curta), pois o lactato é o produto final da glicólise, então, quanto maior o uso desse metabolismo, maior a produção de lactato. Entretanto,muitas pessoas confundem lactato ou ácido lático com fadiga, pois quando o exercício é intenso e tem muita fadiga a concentração de lactato no sangue é alta. Mas entendam que o lactato está elevado no sangue justamente porque a glicólise está sendo muito utilizada, e a causa da fadiga é multifatorial e não é proveniente do lactato. Primeiro vamos falar um pouco sobre fadiga, pois esse conteúdo vai ajudar muito a entender melhor a glicólise e o motivo que a produção de lactato aumenta em esforço intenso com pausas curtas. Como mencionado no início do capítulo, durante o exercício aumenta a quebra de ATP em ADP, pois essa quebra libera energia ao músculo. Mas, além de gerar energia, toda vez que o ATP é quebrado ocorre à liberação de íons de hidrogênio (H+). Isso significa que quanto mais ATP é quebrado, mais H+ é produzido. Percebam na figura 5 que a quebra do ATP em ADP libera energia para a contração muscular, mas ao mesmo tempo libera o H+. Figura 5 – Quebra de ATP e liberação de H+ 14 Legenda: A quebra do ATP em ADP aumenta durante o exercício, pois por meio dessa reação libera energia ao músculo, mas também produz íons de hidrogênio (H+). Quanto maior a quebra de ATP, maior a produção de H+. Portanto, durante o estímulo intenso (repetições, corrida e bike) o H+ é acumulado na célula muscular, mas, durante as pausas, o que acontece com o H+? Nesse período, os íons H+ são removidos da célula muscular (Figura 2). Isso significa que se o estímulo for intenso e a pausa for curta (< 2min) menos H+ é removido da célula muscular, gerando um acúmulo (JUEL et al, 2004). Figura 6 – Produção e remoção de íons de hidrogênio (H+) no treino Legenda: Durante as repetições, a quebra constante de ATP em ADP e AMP promove um acúmulo de H+ na célula muscular. No entanto, durante as pausas o H+ pode ser removido pelo sistema tampão como, por exemplo, carnosina muscular, bicarbonato plasmático e ressíntese de PCr. 15 Mas qual a consequência desse acúmulo de H+ durante o estímulo intenso com pausa curta? O acúmulo de íons H+ gera acidose muscular, em outras palavras, diminui o pH da célula muscular, sendo que a acidose é um dos causadores da fadiga muscular. O pH da célula deve ser mantido constante em 7,4, pois esse pH é ideal para o bom funcionamento das enzimas. Porém, quando o pH diminui, ou seja, abaixo de 7,4 (exercício intenso e pausa curta) ocorre redução na atividade das enzimas da glicólise, diminuindo a capacidade em produzir ATP. Ao mesmo tempo a acidose diminui a eficiência da interação entre os filamentos de actina e miosina (FINSTERER et al, 2012). Portanto, já mencionamos aqui dois motivos que o treino intenso com pausa curta gera bastante fadiga, sendo o primeiro devido a restauração incompleta da fosfocreatina e o segundo fator por meio da acidose (acúmulo de H+). Agora que já entendemos que no treino intenso de pausa curta (< 2min) ocorre acidose e fadiga, vamos entrar em mais detalhes sobre a glicólise. A glicólise é o processo de degradação da glicose, onde essa molécula é utilizada para produzir energia (ATP) nas células. Existem basicamente dois tipos de glicólise: glicólise aeróbia, que ocorre apenas com a presença de oxigênio e em células com mitocôndrias; glicólise anaeróbia, que ocorre sem a presença de oxigênio e em células sem mitocôndrias (eritrócitos, medula adrenal). Na glicólise, glicose é degradada até um composto chamado piruvato em uma série de 10 reações. Uma molécula de glicose forma 2 moléculas de piruvato, 2 ATP e duas moléculas de NADH (carregador de elétrons) a partir do NAD+ (nicotinamida adenina dinucleotídeo). A tabela 1 resume as principais diferenças entre a glicólise aeróbia e anaeróbia. Tabela 1. Características dos tipos de glicólise: Aeróbia e Anaeróbia Glicólise Característica Rendimento de ATP Tecidos Produtos finais Aeróbia Presença de O2 32 ATP Todos, exceto hemácias e células sem mitocôndrias. CO2 e H2O Anaeróbia Ausência de O2 2 ou 3 ATP Hemácias, medula adrenal, músculo em exercício intenso. Lactato e H2O 16 Basicamente o piruvato terá dois destinos: 1) ser convertido em lactato através da enzima lactato desidrogenase (LDH), caracterizando o metabolismo anaeróbio lático; e 2) ser convertido em acetil-coa e entrar na mitocôndria para fazer ATP pelo metabolismo aeróbio, conforme demonstrado na figura 7. Figura 7 – Resumo da glicólise anaeróbia e aeróbia Legenda: Ao entrar na célula muscular, a glicose passa pelas 10 reações até chegar na forma de piruvato (glicólise), sendo que após isso o piruvato pode ter dois destinos: ser convertido em lactato (anaeróbio lático) ou ser convertido em acetil-coa nas mitocôndrias (aeróbio). Talvez você esteja se perguntando: “O que determina se o piruvato vai ser direcionado mais para lactato ou para acetil-coa?”. Essa é uma longa história, vou explicar aqui, mas primeiro é preciso entender o motivo que na glicólise formam-se duas moléculas de NADH. Como mencionado, na glicólise, as duas moléculas de NAD pegam dois íons H+, formando duas moléculas de NADH, sendo que esse processo é muito importante para formar o lactato. Portanto, vamos entender isso melhor. Para piruvato ser convertido em lactato precisa da enzima LDH e também da transferência de um íon H+ proveniente de NADH. Então, duas moléculas de 17 NADH da glicólise fornecem dois íons H+ para ocorrer à formação de duas moléculas de lactato, conforme demonstrado na figura 8. Percebam que usamos os íons H+ para formar o lactato, Figura 8 - Reação de formação de lactato a partir do piruvato. Legenda: A conversão de glicose em piruvato (glicólise) gera 2 ATP e duas moléculas de NADH (NAD pega H+ e se torna NADH). O NADH (2) fornece íons H+ (2) para a enzima lactato desidrogenase converter piruvato (2) em lactato (2). Agora vamos responder a seguinte pergunta “Por que a produção de lactato é maior quando o exercício é intenso combinado com pausa curta (<2min)?” Podemos explicar isso por dois fatores. Primeiro, nesse tipo de treino a fosfocreatina é restaurada parcialmente, aumentando a dependência do metabolismo anaeróbio lático. Em outras palavras, nesse treino usamos mais a glicólise, então o lactato será muito produzido, pois é o produto final da glicólise. Segundo, quando o estímulo é intenso e as pausas são curtas ocorre acidose (acúmulo de H+), sendo que o lactato é produzido justamente para ajudar a remover H+, pois conforme detalhado anteriormente, para produzir o lactato precisa de íons H+. 18 Agora que já entendemos que a formação do lactato ajuda a remover íons H+, vamos compreender os destinos do lactato após a produção. O lactato também pode ser usado como substrato energético, ajudando a produzir energia ao músculo durante o exercício. Após a produção, o lactato precisa ser transportado do músculo para a corrente sanguínea. Para isso, o lactato precisa passar por uma proteína transportadora chamada de transportador de monocarboxilato (MCT). O interessante é que para o lactato passar pelo MCT é necessário H+, ou seja, o transporte de lactato do músculo para o sangue utiliza H+, ajudando a controlar o pH. Do sangue, o lactato pode ir até o fígado para ser convertido em glicose através da gliconeogênese. Interessante é que em exercício de alta intensidade ocorre aumento da glicemia, pois o lactato que está elevado no sangue acaba sendo usado para produzir glicose no fígado (FERRAZ et al, 2008). Então, o lactato ajuda a manter a glicemia durante o exercício, e parte dessa glicose entra no músculo para fazer ATP, conforme mostrado na figura 9. Percebam a importância que o lactato tem durante o exercício de alta intensidade, sendo uma molécula importante paracontrolar o pH e ao mesmo tempo para produzir glicose no fígado. Um fato interessante é que a prática de exercício, principalmente de alta intensidade pode aumentar a expressão de MCT no músculo esquelético (mais detalhes no capítulo 5). Essa adaptação melhora a capacidade de tamponar íons H+, sendo um dos motivos que o exercício intenso melhora o desempenho anaeróbio (capacidade de resistir a estímulos intensos). Figura 9 - Remoção do lactato e sua função como substrato energético para o exercício 19 Legenda: Após a produção, o lactato é transportado do músculo para o sangue por meio do Transportador Monocarboxilato (MCT). Esse transporte necessita de íons H+, então a remoção de lactato no músculo ajuda a controlar o pH. Do sangue, o lactato pode ir até o fígado e ser convertido em glicose pela gliconeogênese. A glicose pode voltar ao músculo e ser usada para fazer ATP (glicólise) 1.4 EXERCÍCIO FÍSICO E GLICOGENÓLISE No fígado e no músculo a adrenalina promove a quebra do glicogênio em glicose, processo chamado de glicogenólise. Esse processo é importante durante o exercício físico e condições de estresse já que a quebra do glicogênio hepático gera glicose para o sangue e a quebra do glicogênio muscular fornece glicose para o músculo. Basicamente a adrenalina age estimulando a produção de glicose para o sangue e músculo para suprir a demanda energética durante o treino ou estresse. O mecanismo que a adrenalina estimula a glicogenólise está associado ao fato da adrenalina se ligar ao receptor beta adrenérgico na membrana plasmática da célula hepática e muscular, sendo que esta ligação promove a ativação da enzima glicogênio fosforilase, responsável em promover a quebra de glicogênio em glicose (glicogenólise) (MOLINA, 2014). O exercício físico é um grande estímulo para produzir adrenalina, pois o esforço físico aumenta a ativação do sistema nervoso autônomo simpático. A produção de adrenalina durante o exercício é essencial para gerar substratos energéticos para suprir a demanda do exercício, pois a adrenalina aumenta a 20 lipólise e a glicogenolise (WATT et al, 2001), fornecendo ao sangue ácidos graxos, glicerol e glicose. Esses substratos energéticos são direcionados para o músculo ativo, sendo usados nas células musculares para formar ATP (energia). Ao mesmo tempo a adrenalina aumenta a quebra do glicogênio muscular, gerando localmente glicose para o músculo, conforme detalhado anteriormente. A intensidade e o volume do exercício podem impactar na quantidade de adrenalina produzida. Durante o exercício intenso, como o HIIT e a musculação ocorre uma grande ativação simpática, sendo maior do que no exercício leve ou moderado (KATAYAMA et al, 2019). Isso explica o fato do exercício de alta intensidade utilizar em maior velocidade o glicogênio muscular. Tabela 2. Principais características dos estoques de glicogênio hepático e muscular Tecido Quantidade armazenada Hormônios que realizam a glicogenólise Principal característica Fígado 70 – 100 g Glucagon, adrenalina Fornece glicose para todos os tecidos. Músculo Esquelético 300 – 700 g Adrenalina Fornece glicose apenas para o músculo. 1.5 EXERCÍCIO FÍSICO E LIPÓLISE Dentro dos adipócitos existe um estoque de gordura chamado de triacilglicerol, uma molécula constituída por três ácidos graxos e um glicerol. Durante o exercício, o triacilglicerol é quebrado (lipólise) e ácidos graxos são mobilizados do tecido adiposo para ir até o músculo e fornecer energia para o exercício na forma de ATP. Além disso, por meio da lipólise ocorre o fornecimento de glicerol, um substrato importante para a formação de glicose no fígado pela gliconeogênese. O processo de lipólise significa quebra de gordura, no qual é controlado por hormônios, como a adrenalina. 21 A adrenalina é um hormônio derivado de um aminoácido, sendo sintetizadas a partir do aminoácido tirosina. A adrenalina é produzida pela glândula suprarrenal, sendo que o aumento na atividade do sistema nervoso autônomo simpático é o principal estímulo para produzir a adrenalina. Isso significa que condições que aumentam a atividade simpática, como exercício físico, estresse, condições de perigo a produção de adrenalina aumenta. Este hormônio gera diversos efeitos no organismo, havendo ação no sistema cardiovascular, respiratório, músculo, tecido adiposo, fígado e sistema gastrointestinal. A adrenalina estimula a lipólise no tecido adiposo, pois sua finalidade é aumentar a quantidade de ácidos graxos e glicerol no sangue que serão utilizados em outros tecidos para gerar energia durante as condições de exercício físico, estresse e perigo. Durante essas condições citadas a atividade simpática aumenta, estimulando a liberação de adrenalina na glândula suprarrenal. Em seguida, a adrenalina cai na corrente sanguínea e vai até o tecido adiposo estimular a lipólise. Vamos compreender agora como a adrenalina age nos adipócitos para estimular a lipólise. A adrenalina se liga no receptor chamado de beta- adrenérgico, no qual essa ligação gera uma ativação de uma proteína localizada na membrana plasmática chamada de adenilato ciclase. A ativação da adenilato ciclase promove a conversão intracelular do ATP em AMP cíclico, sendo que o aumento de AMP cíclico ativa a proteína quinase A (PKA). A PKA tem como função ativar a lipase hormônio sensível (LHS), considerada uma enzima chave para ativar a lipólise. São três enzimas que controlam a lipólise, primeiro a lipase de triglicerídeos (ATGL) converte o triacilglicerol em diacilglicerol e libera um ácido graxo. Em seguida enzima LHS que foi ativada pela PKA via adrenalina atua convertendo diacilglicerol em monoacilglicerol e libera mais um ácido graxo. Por fim a enzima lipase de monoacilglicerol (LMG) separa o monoacilglicerol e um ácido graxo e um glicerol (FRÜHBECK et al. 2014). Percebam que três ácidos graxos foram gerados, assim como um glicerol. A figura 10 demonstra o mecanismo que a adrenalina estimula a lipólise no tecido adiposo. Figura 10. Mecanismo de ação da adrenalina para estimular a lipólise no tecido adiposo. 22 Legenda: A adrenalina se liga no receptor chamado de beta-adrenérgico, no qual essa ligação gera uma ativação de uma proteína localizada na membrana plasmática chamada de adenilato ciclase. A ativação da adenilato ciclase promove a conversão intracelular do ATP em AMP cíclico, sendo que o aumento de AMP cíclico ativa a proteína quinase A (PKA). A PKA tem como função ativar a lipase hormônio sensível (LHS), considerada uma enzima chave para ativar a lipólise. São três enzimas que controlam a lipólise, primeiro a lipase de triglicerídeos (ATGL) converte o triglicerídeo (TG) em diacilglicerol (DG) e libera um ácido graxo. Em seguida enzima LHS que foi ativada pela PKA via adrenalina atua convertendo DG em monoacilglicerol (MG) e libera mais um ácido graxo. Por fim a enzima lipase de monoacilglicerol (LMG) separa o MG e um ácido graxo e um glicerol. Percebam que três ácidos graxos foram gerados, assim como um glicerol. 1.6 METABOLISMO AERÓBIO O metabolismo aeróbio utiliza a glicose e os ácidos graxos de maneira predominante para fazer ATP nas mitocôndrias, sendo que os aminoácidos também são utilizados como substratos energéticos, porém em menor proporção. Vamos começar pela glicose. Na glicólise aeróbia o piruvato é convertido em Acetil-Coa pela enzima piruvato desidrogenase (PDH). Lembrando que o Acetil-Coa é o intermediário comum do metabolismo de carboidratos, gorduras e proteínas. Após isso, ocorre o ciclo de Krebs que fornece NADH e FADH2 para a cadeia transportadora de elétrons formarem o 23 ATP através do consumo de oxigênio. A figura 11 resume o metabolismo aeróbio, mostrando como as gorduras, carboidratos e proteínas sintetizamAcetil-Coa para a formação de ATP no metabolismo aeróbio. Figura 11 – Macronutrientes e metabolismo aeróbio Legenda: Observem que os macronutrientes (gorduras, carboidratos e proteínas) fornecem Acetil-Coa para o ciclo de Krebs. O triacilglicerol fornece ácidos graxos, os carboidratos glicose e as proteínas aminoácidos. A função do ciclo de Krebs é usar esses substratos energéticos para criar moléculas de NADH e FADH2 para a cadeia transportadora de elétrons sintetizar ATP através do consumo de oxigênio. O ciclo de Krebs é um conjunto de reações químicas que acontece na mitocôndria das células e tem início quando o Acetil-Coa se combina com o oxaloacetato, um composto de 4 carbonos que pode ser proveniente do catabolismo de carboidratos ou aminoácidos. O ciclo de Krebs é apenas uma das etapas da produção de ATP (energia). No entanto, a maior parte da produção de ATP ocorre em uma etapa posterior, a “fosforilação oxidativa”. Apesar da oxidação do acetil-Coa no ciclo de Krebs produzir apenas 1 ATP, ela também produz as coenzimas reduzidas NADH e FADH2, que transportam elétrons provenientes das reações químicas que ocorrem no ciclo de Krebs. Esses elétrons são transportados até o oxigênio por enzimas localizadas na membrana interna da mitocôndria (cadeia transportadora de elétrons). O 24 fluxo de elétrons através da cadeia transportadora de elétrons faz com que eles percam parte de sua energia, sendo parte dessa energia usada para a síntese de ATP a partir de ADP e fosfato inorgânico (Pi), processo denominado de fosforilação oxidativa. A oxidação de glicose pela glicólise aeróbia produz um total de 32 ATP por molécula de glicose. Essa via é a principal responsável pelo fornecimento de energia pelos carboidratos. Agora vamos compreender como as gorduras são usadas no metabolismo aeróbio. Conforme detalhado no tópico anterior, após a lipólise no tecido adiposo os ácidos graxos (gorduras) vão para o sangue, no qual são transportados por uma proteína chamada de albumina e posteriormente podem chegar ao músculo esquelético. Mas para entrar no músculo esquelético, os ácidos graxos precisam passar por um transportador denominado FATP (proteína transportadora de ácidos graxos). Ao entrar no músculo, o ácido graxo que está no citoplasma da célula se torna uma molécula de Acil-Coa, sendo esse processo é gerado pela enzima AcilCoa Sintase. Basicamente o Acil-Coa é uma gordura associada a uma molécula de Coenzima A. Agora, o Acil-Coa precisa entrar na mitocôndria, sendo que para isso acontecer é necessária a ação do sistema carnitina. Então, vamos detalhar esse processo. Primeiramente ocorre o desligamento entre Acil e Coenzima A, pois o grupo Acil se junta com a carnitina livre localizada na membrana externa da mitocôndria, formando o Acilcarnitina. Após isso, o acilcarnitina entra no interior da mitocôndria por meio de um transportador denominado Carnitina Palmitoil Transferase 1 (CPT1). Ao entrar na mitocôndria, ocorre o desligamento do Acil com a carnitina, sendo que o grupo Acil se junta novamente com a Coenzima A, voltando a ser Acil-Coa. Pronto, agora a gordura entrou na mitocôndria e seu primeiro destino dentro dessa organela é a beta oxidação, um conjunto de reações químicas que tem o objetivo formar Acetil-Coa para o ciclo de Krebs. Bom, os próximos passos vocês já conhecem, no qual detalhamos anteriormente. O ciclo de Krebs gera NADH e FADH2 para a cadeira transportadora fazer o ATP através do consumo de oxigênio. A figura 12 mostra resumidamente as etapas para a oxidação das gorduras nas mitocôndrias. Figura 12 – Etapas para a oxidação de gorduras nas mitocôndrias 25 Legenda: O ácido graxo entra na célula muscular através do transportador FATP. Após isso o ácido graxo ganha uma Coenzima A, tornando Acil-Coa. Para Acil-Coa entrar na mitocôndria é preciso passar pelo sistema carnitina. Primeiro, o Acil se junta com a carnitina livre, formando Acilcarnitina. O Acilcarnitina entra na mitocôndria através do transportador CPT1, sendo que dentro da mitocôndria o Acilcarnitina volta a ser Acil-Coa. O Acil-Coa entra na beta oxidação para fornecer Acetil-Coa para o ciclo de Krebs formar moléculas de NADH e FADH2. Após isso, essas moléculas vão para a cadeia transportadora de elétrons e através do consumo de oxigênio sintetizam o ATP e ao mesmo tempo produz CO2. 1.7 EXERCÍCIO FÍSICO, AMPK E BIOENEGÉTICA Durante o exercício a quebra de ATP aumenta, pois essa quebra é necessária para suprir a demanda energética imposta pela contração muscular no exercício. O ATP (adenosina com três fosfatos) pode ser quebrado em ADP (adenosina com dois fosfatos), e posteriormente o ADP é quebrado em AMP (adenosina com um fosfato). Basicamente durante o exercício temos um acúmulo de AMP e uma redução de ATP, caracterizando um baixo estado energético da célula. Interessante que ao diminuir o estado energético da célula (mais AMP do que ATP) ocorre algumas mudanças bioquímicas na célula que favorece a formação de ATP. Em outras palavras, a célula acelera a formação de ATP 26 quando o estado energético está baixo. Para isso acontecer é necessário ativar uma proteína intracelular chamada de Proteína Quinase Ativada por AMP (AMPK), pois essa proteína tem a função de elevar a síntese de ATP durante o exercício (FRIEDRICHSEN et al, 2013). Vamos entender a ação da AMPK de uma maneira mais detalhada. Existe três principais motivos que fazem a AMPK ser ativada durante o exercício. O primeiro motivo é que as moléculas de AMP conseguem ativar diretamente a AMPK, ou seja, esse processo acontece mais quando estamos fazendo exercício, pois nessa condição existe um acúmulo de AMP. O segundo motivo é devido à liberação de cálcio que acontece durante a contração muscular. Quando estamos praticando exercício o cálcio é liberado do retículo sarcoplasmático para junto com ATP promover a interação entre os filamentos de actina e miosina. Isso significa que ao fazer exercício a liberação de cálcio aumenta, sendo que o cálcio ativa a Calmodulina, uma proteína que também promove a ativação da AMPK. O terceiro fator que faz o exercício estimular a AMPK é através da redução do glicogênio muscular, sendo que os estudos têm demonstrado que realizar o exercício com o glicogênio mais baixo potencializa a ativação de AMPK (COUGHLAN, 2014). Já compreendemos como ocorre a ativação de AMPK durante o exercício, agora vamos detalhar as funções que essa proteína gera no metabolismo energético, sendo a sua principal função durante o exercício é acelerar a formação de ATP (energia) no músculo. A AMPK aumenta o transporte de glicose no sangue para o músculo sem precisar da ação da insulina. Para a glicose entrar na célula muscular é necessário que o Transportador de Glicose-4 (GLUT4) esteja na membrana plasmática, pois somente assim a glicose consegue atravessar bicamada lipídica da membrana celular. A AMPK transloca o GLUT4 do citoplasma da célula para a membrana plasmática, promovendo a entrada de glicose no interior da célula. Isso significa que durante o exercício ocorre um aumento na entrada de glicose ao músculo, sendo esse processo importante para fornecer substrato energético para a glicólise e consequentemente para a formação de ATP durante o exercício (O'NEILL, 2013). Além de captar glicose ao músculo, a AMPK também estimula a entrada de ácidos graxos no músculo e aumenta a oxidação de gorduras nas 27 mitocôndrias. A AMPK transloca do citoplasma a membrana plasmática um transportador de ácidos graxos chamado de FAT/CD36, que ao chegar na superfície da célula permite a entrada de mais ácidos graxos no interior da célula muscular. Outro efeito da AMPK é aumentar a atividade do CPT1, elevando a entrada de ácidos graxos para dentro da mitocôndria. Basicamente a AMPK aumentao transporte de gordura para o músculo e ao mesmo tempo estimula a oxidação da gordura para formar mais ATP. A figura 13 resume os mecanismos que o exercício ativa a AMPK e as funções dessa proteína no metabolismo energético (O'NEILL, 2013). Percebam que a função da AMPK é acelerar a formação de ATP durante o exercício, sendo que essa proteína estimula vias que fornecem ATP, conforme detalhado anteriormente, e ao mesmo tempo inibe vias que consomem ATP no músculo, como a síntese de proteínas musculares e a lipogênese. Figura 13 – Mecanismos de ativação da AMPK e suas funções no metabolismo energético durante o exercício Legenda: Durante o exercício ocorre acúmulo de AMP, ativação da proteína calmodulina e redução do glicogênio muscular. Esses fatores ativam a proteína AMPK 28 que vai acelerar a formação de ATP durante o exercício por três fatores: 1) AMPK transloca GLUT4 para a membrana plasmática, elevando o transporte de glicose para o interior da célula muscular; 2) AMPK transloca o FAT/CD36 para a membrana celular, aumentando a entrada de ácidos graxos para o músculo; e 3) AMPK aumenta a atividade do CPT1, permitindo uma entrada maior de ácidos graxos no interior da mitocôndria, elevando a oxidação de gorduras. 1.8 EXERCÍCIO FÍSICO, INTERLEUCINA-6 E BIOENERGÉTICA O músculo esquelético não exerce apenas função de movimento, mas também é considerado um órgão endócrino por produzir algumas proteínas ou miocinas durante o exercício físico. Uma dessas miocinas é a Interleucina-6 (IL-6), uma proteína de caráter pró-inflamatória. Por ser uma proteína inflamatória, talvez você esteja pensando que aumentar a produção dela seja algo “ruim”. No entanto, vamos entender que o aumento da IL-6 e consequentemente a inflamação tem uma grande importância para potencializar o fornecimento de energia ao músculo durante o exercício (PEDERSEN et al, 2004). Durante o exercício o músculo produz a IL-6, sendo que essa produção parece ser dependente do tipo de exercício realizado. Os estudos tem demonstrado que a IL-6 é mais produzida quando ocorre redução do glicogênio muscular ou quando o exercício depende mais do metabolismo anaeróbio lático, ou seja, exercício intenso com pausas curtas (SCOTT et al, 2011; IHALAINEN et a, 2014). Mas, lembrando que o glicogênio muscular também pode reduzir no exercício moderado prolongado, sendo que existe um aumento na produção de IL-6 após a prática de exercícios de endurance, caracterizados por serem de longa duração (FEBBRAIO et al, 2002). Basicamente a produção de IL-6 é dependente do volume (tempo ou distância) e intensidade do exercício aeróbio (CULLEN et al, 2016). Já a musculação com maior dependência do metabolismo anaeróbio lático, ou seja, pausa curta (< 2 min) e altas repetições pode gerar maior produção de IL-6 em comparação a musculação com carga alta e pausa longa. Enfim, quando há redução de glicogênio ou quando o exercício aumenta a demanda do metabolismo anaeróbio lático, a produção de IL-6 é ainda maior. 29 Um ponto importante é entender que o aumento da IL-6 é momentâneo, é uma inflamação aguda. Durante o exercício físico a produção de IL-6 aumenta, sendo que após 30 minutos do treino temos o pico de IL-6 no sangue, no qual após esse período a concentração de IL-6 reterna aos valores de repouso. Basicamente toda vez que há uma sessão de treinamento ocorre uma curva na produção de IL-6, ao treinar a produção de IL-6 aumenta e após um período a IL-6 diminui. De maneira resumida a função da IL-6 sobre o metabolismo durante o exercício é acelerar a produção de energia (ATP) para o músculo. Vamos compreender isso melhor. A IL-6 pode agir de maneira local (músculo), aumenta à ativação da AMPK e a translocação do GLUT4 para membrana plasmática, promovendo o transporte de glicose do sangue para o músculo. Ao mesmo tempo, por ativar AMPK a IL-6 aumenta a oxidação de gorduras na mitocôndria. Em outras palavras, a IL-6 aumenta a geração de energia no músculo por elevar a oxidação de glicose e gorduras (PEDERSEN et al, 2004). Além do efeito local, a IL-6 pode cair na corrente sanguínea e agir de maneira sistêmica em outros órgãos, como o tecido adiposo e fígado. A IL-6 pode ir até o tecido adiposo e estimular o processo de lipólise. Lembrando que aumentar a lipólise significa mobilizar ácidos graxos do tecido adiposo para serem usados como fonte energética no músculo e produzir ATP nas mitocôndrias. Já o glicerol é direcionado para o fígado para ser convertido em glicose através da gliconeogênese. Interessante que a IL-6 além de fornecer glicerol estimula no fígado a gliconeogênese, aumentando a produção hepática de glicose (PEDERSEN et al, 2004). Percebam que existe uma interação entre o processo inflamatório gerado durante o exercício físico e metabolismo energético, a inflamação (IL-6) acelera o fornecimento de substratos energéticos para o músculo, chamamos esse fenômeno de imunometabolismo. REFERÊNCIAS COUGHLAN, Kimberly A. et al. AMPK activation: a therapeutic target for type 2 diabetes?. Diabetes, metabolic syndrome and obesity: targets and therapy, v. 7, p. 241, 2014. 30 CULLEN, Tom et al. Interleukin-6 and associated cytokine responses to an acute bout of high-intensity interval exercise: the effect of exercise intensity and volume. Applied physiology, nutrition, and metabolism, v. 41, n. 8, p. 803-808, 2016. FEBBRAIO, Mark A.; PEDERSEN, Bente Klarlund. Muscle‐derived interleukin‐6: mechanisms for activation and possible biological roles. The FASEB journal, v. 16, n. 11, p. 1335-1347, 2002. FERRAZ, G. C. et al. Blood lactate threshold reflects glucose responses in horses submitted to incremental exercise test. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v. 60, n. 1, p. 256-259, 2008. FINSTERER, Josef. Biomarkers of peripheral muscle fatigue during exercise. BMC musculoskeletal disorders, v. 13, n. 1, p. 1-13, 2012. FRIEDRICHSEN, Martin et al. Exercise-induced AMPK activity in skeletal muscle: role in glucose uptake and insulin sensitivity. 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ATP concentrations and muscle tension increase linearly with muscle contraction. Journal of Applied Physiology, v. 95, n. 2, p. 577-583, 2003. MCMAHON, Shaun; JENKINS, David. Factors affecting the rate of phosphocreatine resynthesis following intense exercise. Sports Medicine, v. 32, n. 12, p. 761-784, 2002. MOLINA, Patricia E. Fisiologia Endócrina-5. McGraw Hill Brasil, 2021. O'NEILL, Hayley M. AMPK and exercise: glucose uptake and insulin sensitivity. Diabetes & metabolism journal, v. 37, n. 1, p. 1, 2013. 31 PEDERSEN, Bente Klarlund et al. The metabolic role of IL-6 produced during exercise: is IL-6 an exercise factor?. Proceedings of the Nutrition Society, v. 63, n. 2, p. 263-267, 2004. SCOTT, JONATHAN PAUL et al. Effect of exercise intensity on the cytokine response to an acute bout of running. Medicine and science in sportsand exercise, v. 43, n. 12, p. 2297-2306, 2011 SUNDBERG, Christopher W.; FITTS, Robert H. Bioenergetic basis of skeletal muscle fatigue. 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Primeiramente é importante compreender que o metabolismo aeróbio e anaeróbio está funcionando constantemente de maneira sincronizada, sendo que em nenhum momento teremos um metabolismo funcionando exclusivamente. Por exemplo, durante um estímulo de alta intensidade (corrida máxima) aumentamos o uso do metabolismo anaeróbio, pois esse metabolismo produz ATP de maneira mais rápida, mas o metabolismo aeróbio também está sendo utilizado durante o esforço, porém em menor proporção. Já no exercício moderado a demanda energética é menor, então usamos mais o metabolismo aeróbio e menos o metabolismo anaeróbio. Vejam que a predominância do metabolismo energético é influenciada pela intensidade, mas a duração da pausa e o volume também podem interferir. Portanto, o objetivo desse capítulo é fornecer o conhecimento necessário para entender a relação entre as variáveis do treinamento (intensidade, volume e pausa) sobre o metabolismo energético. Vamos começar pela intensidade. É possível aumentar a intensidade na corrida incrementando a velocidade ou a inclinação. Já na bike podemos aumentar a intensidade por aumentar a carga ou a cadência na pedalada. Podemos classificar a intensidade do aeróbio como leve, moderada e intensa, sendo que é possível utilizar a percepção subjetiva de esforço (PSE), a frequência cardíaca e o consumo de oxigênio para determinar a intensidade do esforço ou até mesmo utilizar um teste incremental e prescrever a intensidade baseado no teste. Primeiramente, vamos entender como o metabolismo energético se comporta durante o exercício leve e moderado. Nessa intensidade o metabolismo aeróbio tem uma participação maior, sendo que o metabolismo anaeróbio lático e alático são menos solicitados, pois a demanda energética é menor, não necessitando do fornecimento rápido de energia. Observem na figura 14 que ao realizar o exercício leve/moderado, ou seja, a 40% ou 55% da 34 carga máxima na bike utiliza menos glicogênio muscular (substrato do anaeróbio lático) e mais gorduras (substrato do aeróbio) em comparação ao exercício mais intenso (75% da carga máxima). Isso significa que usamos menos o metabolismo anaeróbio lático em esforço leve/moderado, sendo o metabolismo aeróbio a principal via para a produção de ATP nesse tipo de exercício. Agora vamos analisar o metabolismo energético em exercício de alta intensidade. Vejam a figura 14 e observem que ao realizar o exercício mais intenso (75% da carga máxima na bike) utiliza mais o glicogênio muscular e ocorre redução no uso de gordura. Esses resultados indicam que ao fazer o exercício intenso é necessário usar o metabolismo que faz energia em maior velocidade, ou seja, o metabolismo anaeróbio lático e alático. No início do estímulo a fosfocreatina acaba sendo usada de maneira predominante (até 10- 15 segundos), mas após esse período, o metabolismo anaeróbio lático é mais solicitado, explicando o fato do glicogênio muscular ser mais usado quando o exercício é mais intenso, conforme mostrado na figura 14. Figura 14. Influência da intensidade sobre a seleção de substratos energéticos 35 Legenda: Durante o repouso o gasto energético é menor em comparação ao exercício, sendo que nessa condição os ácidos graxos e glicose no plasma são utilizados para produzir energia no metabolismo aeróbio. Durante o exercício moderado (40 e 55% da carga máxima) a utilização de gordura é maior (ácidos graxos no plasma e triglicerídeos musculares) em comparação ao exercício de maior intensidade (75% da carga máxima). Porém, no exercício de maior intensidade a utilização de glicogênio muscular é maior, assim como o gasto calórico. Agora vamos analisar a figura 15, vejam que a taxa de oxidação de gorduras é máxima quando o aeróbio é feito na intensidade moderada que corresponde a 65% do VO2máx ou 65 a 70% da frequência cardíaca máxima. Nessa intensidade ocorre o fenômeno chamado de FATMAX, ou seja, maior taxa de oxidação de gorduras (JEUKENDRUP et al, 2001). Percebam que ao aumentar a intensidade (acima de 65% do VO2máx) ocorre redução na taxa de oxidação de gordura. O que isso indica? Que em alta intensidade é preciso usar substratos que fazem energia de maneira mais rápida, como o glicogênio muscular. Então, ao incrementar a intensidade usamos mais glicogênio muscular e menos gorduras durante o esforço. Figura 15 – Taxa de oxidação de gorduras com o incremento da intensidade no exercício. Legenda: A taxa de oxidação de gorduras é maior quando a intensidade do exercício é baixa/moderada, sendo que na intensidade de 65% do VO2max (corresponde em torno de 60 a 70% da frequência cardíaca máxima) ocorre a maior taxa de oxidação de gorduras, fenômeno chamado de zona FATMAX. Ao aumentar a intensidade do 36 exercício ocorre redução na taxa de oxidação de gorduras, pois nesse esforço é necessário usar o metabolismo anaeróbio lático, no qual produz energia em maior velocidade do que o metabolismo aeróbio. Agora vamos pensar em gasto calórico. Olhem novamente na figura 15 e observem que ao incrementar a intensidade o gasto energético aumenta. Em outras palavras, por mais que a oxidação de gorduras diminui em esforço intenso, o gasto calórico se eleva justamente porque nesse momento o glicogênio muscular é mais utilizado. Por esse motivo não podemos dizer que o exercício moderado é melhor para emagrecer porque “queima mais gorduras”, e também não podemos dizer que o aeróbio intenso (HIIT) será melhor para emagrecer. Iremos entender aqui que ambos os tipos de aeróbio (moderado contínuo e HIIT) podem ser usados em programas de emagrecimento. Do ponto de vista prático, o gasto calórico é maior em um aeróbio intenso (HIIT) feito no mesmo tempo que um aeróbio moderado contínuo. Então, se compararmos um HIIT de 30 minutos com um aeróbio moderado contínuo também de 30 minutos, o HIIT promoverá um gasto energético maior. Porém, se o aeróbio moderado é feito em mais tempo que o HIIT, o gasto calórico pode ser similar. Portanto, para o aeróbio moderado contínuo gerar o mesmo gasto calórico que o HIIT precisa ser feito em mais tempo. Interessante que existem estudos de metanálise mostrando que a perda de gordura é semelhante entre o HIIT e aeróbio moderado contínuo equiparado por gasto energético (WEWEGE et al, 2017; KEATING et al, 2017). Claro que o volume foi maior no aeróbio moderado continuo para ter o mesmo gasto calórico que o HIIT. Por isso não podemos dizer que HIIT é melhor para emagrecer, assim como não podemos dizer que aeróbio moderado será melhor para emagrecer, sendo que os dois tipos de treinamento podem ser usados quando o objetivo for perda de gordura corporal. 2.2 POR QUE EM ALTA INTENSIDADE O USO DE GLICOGÊNIO MUSCULAR É MAIOR? A utilização do glicogênio muscular é maior quando o exercício é de altaintensidade (IMPEY et al, 2018). Isso faz sentido, pois nesse tipo de esforço precisamos produzir energia de maneira mais rápida, sendo que quebra do 37 glicogênio fornece substrato energético para a glicólise, a segunda via energética que produz ATP de maneira mais rápida (a primeira é pela fosfocreatina). Vamos compreender o principal mecanismo que explica o aumento na velocidade da quebra de glicogênio muscular em exercício de alta intensidade. Quando estamos realizando um esforço intenso ocorre uma maior ativação do sistema nervoso autônomo simpático, no qual essa maior ativação causa uma produção elevada de adrenalina pela glândula adrenal. Isso significa que a ativação simpática e produção de adrenalina são maiores em exercício intenso comparado ao exercício moderado. A adrenalina é um hormônio que estimula o processo de glicogenólise (quebra do glicogênio) no músculo, pois a adrenalina liga no seu receptor na membrana plasmática da célula muscular e ativa a enzima glicogênio fosforilase, responsável em promover a glicogenólise. Portanto, em exercício de alta intensidade usamos o glicogênio muscular em maior velocidade justamente devido a maior ativação simpática e produção de adrenalina. 2.3 VOLUME NO AERÓBIO, GASTO ENERGÉTICO E GLICOGÊNIO MUSCULAR O volume no aeróbio significa o tempo ou distância percorrida. O volume é uma variável que também gera influência sobre o gasto energético. Por exemplo, uma corrida moderada de 45 minutos causa um gasto calórico maior em comparação a uma corrida de 30 minutos na mesma intensidade. Realizar 10 séries no HIIT (1 min de estímulo e 1 min de pausa) gera um gasto calórico superior a ao mesmo modelo de HIIT feito em 5 séries. Portanto, é importante compreender que a manipulação do volume é uma das formas de elevar o gasto calórico do treinamento. Observem a figura 16 que mostra a relação entre volume do aeróbio e gasto energético. Percebam ao incrementar o volume ocorre aumento do gasto energético. Por isso, o aumento gradual do volume no aeróbio é uma das maneiras que podemos progredir o gasto energético em objetivo de emagrecimento. Figura 16 – Influência do volume sobre o gasto energético do exercício 38 Legenda: O volume (tempo) é uma variável que também gera impacto sobre o gasto energético. Para a mesma intensidade, treino aeróbico com menos volume terá um menor gasto energético do que treino aeróbico com maior volume. Ou seja, ao incrementar o volume ocorre aumento do gasto energético. Com relação ao volume do aeróbio e a contribuição dos substratos energéticos, é importante compreender que o glicogênio muscular diminui progressivamente durante o exercício, e quanto maior o volume, maior a depleção do glicogênio muscular (HEARRIS et al, 2018). Vamos usar um exemplo para entender melhor. No início de uma prova de endurance (maratona) o estoque de glicogênio muscular está elevado, porém o glicogênio vai reduzindo de maneira progressiva, sendo que ao final da prova o conteúdo de glicogênio muscular estará baixo. Entendam que houve uma redução drástica no glicogênio muscular justamente devido ao alto volume. Vamos analisar a figura 17 que demonstra diversos estudos que avaliaram o efeito do exercício em diferentes protocolos sobre o conteúdo de glicogênio muscular (IMPEY et al, 2018). Percebam que o exercício de maior intensidade (120-150% do VO2máx) faz o glicogênio diminuir de maneira mais rápida, sendo que isso acontece justamente devido ao fato do fluxo glicolítico ser maior (metabolismo anaeróbio lático) nesse tipo de exercício. No entanto, quando o exercício é feito em intensidade moderada a queda do glicogênio 39 acontece de maneira mais lenta e dependente do tempo (volume). Percebam que o exercício mais longo (2 a 4 horas) ocorre uma redução significativa do glicogênio muscular. Vejam na figura o estudo de Coyle e colaboradores (1986) que verificaram uma queda progressiva do conteúdo de glicogênio muscular de acordo com o tempo. Houve uma redução do glicogênio muscular após 120 minutos de exercício moderado (71% do VO2máx), porém a queda de glicogênio muscular foi maior após 180 minutos de exercício. Figura 17 – Influência da intensidade e volume do exercício sobre a depleção do glicogênio muscular Legenda: O glicogênio muscular diminui em maior velocidade quando o exercício é de alta intensidade (120 a 150% do VO2máx), conforme mostrado na figura. Porém, em exercício de intensidade moderada o glicogênio muscular diminui em menor velocidade e de maneira progressiva. Quando maior o volume, maior a redução do glicogênio muscular. 2.4 POR QUE AUMENTAR A INTENSIDADE DO AERÓBIO OCORRE REDUÇÃO NA OXIDAÇÃO DE GORDURAS? 40 Quando estamos realizando um exercício de alta intensidade o fluxo glicolítico aumenta. Isso significa que nesse tipo de esforço usamos mais a glicólise, e claro o glicogênio muscular acaba sendo o principal substrato energético, principalmente quando as pausas forem curtas (< 2min) entre os estímulos. Vimos anteriormente que em exercício intenso a taxa de oxidação de gorduras diminui, no qual esse efeito se faz necessário, pois nesse momento precisamos produzir energia em maior velocidade, e claro, não é através das gorduras. Interessante destacar que em treinos intervalados de alta intensidade (HIIT) a oxidação de gorduras diminui durante o esforço intenso (maior uso de glicogênio), porém durante os períodos de pausa entre os estímulos a oxidação de gorduras aumenta. Então, não podemos dizer que no HIIT não há oxidação de gorduras. Então vamos compreender o principal mecanismo que explica a redução da oxidação de gorduras durante o estímulo de alta intensidade. Nesse tipo de exercício ocorrerá um aumento do fluxo glicolítico, ou seja, a glicólise será muito utilizada, gerando um acúmulo de piruvato. O piruvato se torna lactato, mas também pode ser convertido em Acetil-Coa na mitocôndria (aeróbio). Portanto, quando usamos muito a glicólise, além de acumular piruvato, também ocorre acúmulo de Acetil-Coa nas mitocôndrias. Vamos entender agora que esse acúmulo de Acetil-Coa promove uma inibição na entrada de ácidos graxos no interior das mitocôndrias. Ao aumentar os níveis de Acetil-Coa, o grupo Acetil se junta com a carnitina livre, tornando Acetilcarnitina. Percebam que o Acetil “rouba” a carnitina, e sem carnitina livre o ácido graxo não consegue entrar na mitocôndria. Isso significa que ao fazer um esforço intenso a oxidação de gorduras diminui exatamente devido ao aumento do fluxo glicolítico que promove a formação de Acetilcarnitina, reduzindo a disponibilidade de carnitina livre (PURDOM et a, 2018). A figura 18 demonstra resumidamente o mecanismo que em estímulo de alta intensidade ocorre redução na oxidação de gorduras nas mitocôndrias. Figura 18 – Mecanismo que ocorre redução na oxidação de gorduras durante o estímulo de alta intensidade 41 Legenda: Durante o exercício de alta intensidade ocorre um aumento do fluxo glicolítico (maior uso da glicólise), gerando o acúmulo de piruvato no citoplasma e Acetil-Coa na mitocôndria. Esse acúmulo faz o grupo Acetil se juntar com a carnitina livre, formando Acetilcarnitina. Essa formação diminui a disponibilidade de carnitina, sendo que isso diminui a entrada de Acil-Coa na mitocôndria e consequentemente ocorre queda na oxidação de gorduras. 2.5 INFLUÊNCIA DA PAUSA LONGA VS PAUSA CURTA SOBRE O METABOLISMO Quando estamos fazendo um exercício de alta intensidade ocorre fadiga, sendo que não é possível sustentar esse esforço por muito tempo ou de maneira contínua. Por isso, o exercício de alta intensidade deve ser intervalado, ou seja, os estímulos intensos são intercalados por pausas. Isso acontece na musculação e na corrida ou bike de alta intensidade (HIIT).Vimos no capítulo anterior que após uma série de estímulo intenso (musculação ou sprint de corrida/bike) o conteúdo de fosfocreatina muscular diminui drasticamente, mas durante o intervalo de descanso a fosfocreatina é restaurada, havendo a necessidade de 3 a 8 minutos para restaurar 100% o conteúdo de fosfocreatina muscular. Quando o estoque de fosfocreatina está baixo, a capacidade do músculo em produzir força diminui devido à queda na 42 velocidade de produção do ATP, explicando a redução do desempenho quando pausas curtas entre séries são utilizadas (menor que 2 minutos). Agora vamos pensar o seguinte “e se a pausa entre séries for curta, o que acontece?” Nessa condição, após a realização de uma série de estímulo intenso, possivelmente os estoques de fosfocreatina estão baixos e caso a pausa for incompleta (menor que 3 minutos), a fosfocreatina é ressintetizada parcialmente e, dessa forma, as próximas séries terá mais fadiga e a glicólise anaeróbia será mais utilizada, gerando cada vez mais produção do lactato (substrato final da glicólise anaeróbia). Por isso, os estudos mostraram que ao realizar a musculação com pausas curtas ocorre um aumento superior na concentração de lactato no sangue em comparação a musculação com pausas longas (RAHIMI et al, 2010; DE ALMEIDA et al, 2019), mostrando que a recuperação incompleta da fosfocreatina faz a glicólise anaeróbia ser mais utilizada. Por outro lado, caso a pausa entre séries for longa, entre 3 a 5 minutos, a restauração da fosfocreatina pode ser completa, diminuindo a produção de lactato, pois se há fosfocreatina suficiente, menor é a dependência do metabolismo anaeróbio lático (BAKER et al., 2010). Isso significa que realizar a pausa longa entre séries gera uma dependência maior do metabolismo anaearóbio alático e o desempenho acaba sendo maior. Por esse motivo, quando realizamos pausas longas após uma série de musculação ou em um sprint máximo na bike ou corrida, o desempenho é melhor na próxima série. A figura 19 resume a importância da duração da pausa sobre a predominância do metabolismo energético. Portanto, a duração da pausa pode determinar se o treino terá predominância do metabolismo anaeróbio alático (restauração completa de fosfocreatina nas pausas) ou anaeróbio lático (restauração incompleta de PCr nas pausas e maior dependência da glicólise). Figura 19 – Influência da duração da pausa sobre a predominância no metabolismo energético 43 Legenda: Após a realização de uma série, possivelmente os estoques de fosfocreatina (PCr) estão baixos e, caso a pausa for curta (menor que 2 minutos), a PCr é ressintetizada parcialmente e, dessa forma, as próximas séries a glicólise anaeróbia será mais utilizada, gerando cada vez mais produção do lactato (substrato final da glicólise anaeróbia). Mas, caso a pausa entre séries for longa, entre 3 a 5 minutos, a restauração da PCr pode ser completa, tornando uma dependência do sistema anaeróbio alático maior nesse treino e uma produção menor de lactato. Percebam que a duração da pausa após estímulos intensos pode impactar diretamente se vai usar mais o metabolismo anaeróbio lático ou alático. Vamos dar um exemplo através da ciência. Um estudo mediu a concentração de fosfocreatina intramuscular no vasto lateral e o lactato no sangue antes e depois de várias séries de musculação para membros inferiores. Foram 10 repetições até a falha concêntrica com 2 minutos de pausa em fisiculturistas treinados. Vejam que nesse protocolo a pausa é insuficiente para restaurar 100% a fosfocreatina no músuclo. O resultado mostrou que a fosfocreatina intramuscular diminuiu de 21,3 mmol/kg para 10,9 mmol/kg (51% de redução). Associado a isso, o estudo verificou um grande aumento sanguíneo de lactato (17.3 mmol), mostrando uma maior dependência do metabolismo anaeróbio lático (TESCH et al, 1986). 2.6 INFLUÊNCIA DA PAUSA ATIVA VS PASSIVA SOBRE O METABOLISMO 44 Primeiramente quero explicar o conceito de pausa ativa e passiva, para depois falarmos sobre as diferenças fisiológicas. A pausa ativa é aquela que o indivíduo realiza uma atividade de baixa intensidade entre os estímulos. A execução de uma caminhada entre corridas intensas é um exemplo de pausa ativa, assim como uma pedalada leve entre estímulos intensos na bike. Já a pausa passiva significa que o indivíduo fica totalmente parado entre os estímulos. Mas será que existe alguma diferença fisiológica entre a pausa ativa e passiva? Sim, existe, então vamos entender melhor. Durante a pausa o consumo de oxigênio nas mitocôndrias diminui em comparação ao estímulo, assim como o gasto calórico. No entanto, com a realização da pausa ativa essa queda de consumo de oxigênio e gasto calórico é menor. Basicamente o treinamento com pausa ativa promove um consumo de oxigênio total superior que a pausa passiva e consequentemente a pausa ativa gera um maior gasto calórico (DUPONT et al, 2004). A pausa ativa fica muito interessante de aplicar quando o objetivo é ter um maior gasto calórico na sessão (emagrecimento) e melhora da capacidade aeróbia em protocolos de treinamento intervalado de alta intensidade que utiliza pausas acima de 1 minuto. Já a pausa passiva tem um efeito maior em recuperar a fosfocreatina e isso pode ser muito vantajoso para o desempenho nos estímulos subsequentes, principalmente quando estamos falando de estímulos máximos. Muito interessante aplicar pausas passivas em treinos intervalados feitos com estímulos máximos na bike ou corrida e a duração da pausa é muito curta (<60 seg), sendo esse tipo de exercício denominado treinamento de sprints repetitivos. Nesse modelo de treinamento os estímulos são curtos e máximos (5 a 30 segundos) com pausas bem curtas (5 a 30 segundos), então a pausa passiva acaba sendo uma ótima opção para ter um maior desempenho (DUPONT et al, 2003). Outra aplicabilidade da pausa passiva é quando o objetivo é ganhar velocidade na corrida. Nesse tipo de treinamento os estímulos são máximos e as pausas são longas (2 a 5 minutos), sendo que a pausa passiva vai promover uma recuperação mais rápida da fosfocreatina, melhorando o desempenho de velocidade na próxima série. Além disso, na musculação com séries 45 executadas próximo ou até a falha concêntrica, a pausa passiva acaba sendo mais interessante para melhorar o desempenho. REFERÊNCIAS BAKER, J. S.; MCCORMICK, M. C.; ROBERGS, R. A. Interaction among Skeletal Muscle Metabolic Energy Systems during Intense Exercise. J Nutr Metab, v. 2010, p. 905612, 2010. COYLE, EDWARD F. et al. Muscle glycogen utilization during prolonged strenuous exercise when fed carbohydrate. Journal of applied physiology, v. 61, n. 1, p. 165-172, 1986. DE ALMEIDA, Fernando Noronha et al. Acute effects of the new method sarcoplasma stimulating training versus traditional resistance training on total training volume, lactate and muscle thickness. Frontiers in physiology, v. 10, p. 579, 2019. DUPONT, Gregory; BLONDEL, Nicolas; BERTHOIN, Serge. Performance for short intermittent runs: active recovery vs. passive recovery. European journal of applied physiology, v. 89, n. 6, p. 548-554, 2003. DUPONT, Grégory; BERTHOIN, Serge. Time spent at a high percentage of max for short intermittent runs: active versus passive recovery. Canadian journal of applied physiology, v. 29, n. S1, p. S3-S16, 2004. IMPEY, Samuel G. et al. Fuel for the work required: a theoretical framework for carbohydrate periodization and the glycogen threshold hypothesis. Sports Medicine, v. 48, n. 5, p. 1031-1048, 2018. JEUKENDRUP, Asker; ACHTEN, Juul. Fatmax: a new concept to optimize fat oxidation during exercise?. European Journal of Sport Science, v. 1, n. 5, p. 1- 5, 2001. KEATING, S. E. et al. A systematic review and meta‐analysis of interval training versus moderate‐intensity continuous training on body adiposity.Obesity reviews, v. 18, n. 8, p. 943-964, 2017. PURDOM, Troy et al. Understanding the factors that effect maximal fat oxidation. Journal of the International Society of Sports Nutrition, v. 15, n. 1, p. 1-10, 2018. RAHIMI, Rahman et al. Effects of very short rest periods on hormonal responses to resistance exercise in men. The Journal of Strength & Conditioning Research, v. 24, n. 7, p. 1851-1859, 2010. TESCH, P. A.; COLLIANDER, E. B.; KAISER, P. Muscle metabolism during intense, heavy-resistance exercise. Eur J Appl Physiol Occup Physiol, v. 55, n. 4, p. 362-6, 1986. ISSN 0301-5548 (Print) 0301-5548. 46 WEWEGE, M. et al. The effects of high‐intensity interval training vs. moderate‐intensity continuous training on body composition in overweight and obese adults: a systematic review and meta‐analysis. Obesity Reviews, v. 18, n. 6, p. 635-646, 2017. 47 CAPÍTULO 3 EXERCÍCIO FÍSICO E EMAGRECIMENTO 48 3.1 DÉFICIT CALÓRICO E EMAGRECIMENTO O déficit calórico é uma condição essencial para ocorrer à perda de gordura. Isso significa que para reduzir a massa gorda é necessário que o indivíduo sustente um gasto calórico maior do que a ingestão calórica. O tecido adiposo é formado por adipócitos, sendo que essas células armazenam uma gordura chamada de triacilglicerol. Quando uma pessoa sustenta o superávit calórico (ingestão calórica maior que o gasto calórico) o estoque de triacilglicerol aumenta, gerando a hipertrofia dos adipócitos, ou seja, ocorre ganho de gordura corporal. Por outro lado, quando o indivíduo sustenta o déficit calórico ocorre redução dos estoques de triacilglicerol, causando atrofia dos adipócitos, conforme demonstrado na figura 20. Vamos imaginar um indivíduo que tem um gasto calórico diário de 3000 kcal e está ingerindo 2500 kcal, ou seja, esse indivíduo tem um déficit calórico de 500 kcal. Percebam que está faltando 500 kcal para atingir o gasto calórico total, no qual a gordura do tecido adiposo acaba sendo usada para fornecer essa energia que está faltando. Portanto, se o déficit calórico for sustentado por vários dias ocorre a perda de gordura. Figura 20 – Déficit calórico e atrofia dos adipócitos Legenda: Em condições de déficit calórico, ou seja, gasto calórico diário maior que a ingestão calórica ocorre atrofia dos adipócitos, pois a gordura estocada nessas células é usada para suprir a energia que está faltando. 49 3.2 COMPONENTES DO GASTO ENERGÉTICO DIÁRIO TOTAL O gasto energético diário total (GET) é divido em três componentes. Temos o gasto energético em repouso (GER) que representa em torno de 60- 70% do GET. Temos o efeito térmico dos alimentos (ETA), contribuindo em torno de 10% do GET. E por fim, existe o gasto energético em atividade física que representa em torno de 20-30% do GET. Portanto, GET = GER + ETA + GAF. O gasto energético da atividade física (GAF) é o componente mais variável do gasto energético diário (GET), mas normalmente ele é equivalente a 20-30% do GET. O GAF pode ser dividido em dois componentes, um relacionado ao gasto energético do exercício físico (GEF) e o outro relacionado ao gasto energético de atividades que não são exercício, mais conhecido como non-exercise activity thermogenesis (NEAT, termogênese de atividades que não são exercício). Temos então: GAF = GEF + NEAT O NEAT é um componente do gasto energético diário (GET) relacionado a todas as atividades do dia a dia que não são exercício físico, como caminhar, brincar, dançar, transar, ficar mexendo os pés inquieto etc. Embora o gasto energético de repouso (GER) seja normalmente o componente que mais contribui para o GET (60-70%), em muitos indivíduos o gasto energético da atividade física (GAF) pode ser um componente de maior contribuição para o GET, principalmente em atletas de alto nível que treinam várias horas por dia e possuem um elevado GEF. No entanto, para a maior parte da população, a contribuição do NEAT tende a ser mais significativa para o GAF do que o gasto do exercício físico (GEF). O NEAT pode variar até 2000 kcal entre indivíduos da população com mesmo porte físico, e dessa forma pode explicar porque alguns indivíduos são resistentes ao ganho de peso, enquanto outros ganham gordura com facilidade (maior eficiência metabólica). Indivíduos obesos parecem exibir uma tendência inata a sentar-se 2,5 horas por dia a mais do que suas contrapartes magras sedentárias (LEVINE, 2006). O NEAT também aumenta com superávit calórico e isso pode explicar por que alguns indivíduos podem ter tanta dificuldade de ganhar peso (gordura e massa muscular). O NEAT também reduz com a restrição calórica e isso explica por que alguns indivíduos obesos têm tanta dificuldade de perder peso. 50 Isso pode explicar porque estudos em ambiente controlado (com controle rigoroso da ingestão calórica) mostram grandes diferenças no ganho e perda de peso entre indivíduos que utilizam o mesmo superávit ou o mesmo déficit calórico. “Se o NEAT atua para manter um peso corporal estável dissipando energia em face de um excesso de energia, ele pode agir para manter um peso estável ao conservar energia diante de um déficit de energia. Sob tais circunstâncias, as diferenças no NEAT entre os indivíduos poderiam explicar as diferenças aparentes na eficiência metabólica” (HAINER, 2001). Se alguém reduz 500-1000 kcal na dieta e não emagrece é muito provável que essa pessoa reduziu o NEAT, ou seja, o indivíduo passou a gastar menos calorias com as atividades do dia a dia, caminhando menos, se movimentando menos. Embora a falta de adesão à dieta seja a principal explicação para a estagnação da perda de peso, em muitas situações o indivíduo para de perder peso porque reduziu o NEAT. É possível aumentar o NEAT voluntariamente, se movimentando mais durante o dia ou adotando uma ocupação profissional que eleve o gasto calórico. No entanto, o NEAT sofre forte influência genética explicando diferenças de eficiência metabólica entre indivíduos. 3.3 EXERCÍCIO, EMAGRECIMENTO E COMPENSAÇÃO ENERGÉTICA O exercício físico costuma mostrar pouco resultado na perda de peso/gordura, segundo a grande maioria dos estudos. Não apenas o exercício aeróbico, mas a musculação também contribui pouco para a perda de gordura. Na média, os efeitos do exercício no emagrecimento são pouco expressivos. No entanto, existe uma grande variabilidade de respostas entre os indivíduos. Algumas pessoas podem perder muito peso combinando exercício com dieta, enquanto outras podem até ganhar peso/gordura quando começam a praticar atividade física. As diretrizes do ACSM (American College of Sports Medicine) recomendam um mínimo de 150 minutos de atividade de moderada intensidade por semana ou 75 minutos de atividade física rigorosa por semana, mas essas recomendações parecem ser pouco efetivas para a perda de peso e para a 51 manutenção da perda de peso. Indivíduos que são bem sucedidos no processo de emagrecimento costumam relatar níveis de atividade física superiores a 300 minutos por semana, ou seja, aproximadamente 60 minutos por dia. Embora o exercício físico tenha um efeito modesto na perda de peso, o aumento da atividade física parece ser uma estratégia muito eficiente para evitar reganho de peso e ajudar na manutenção da perda de peso. Apesar do exercício diário contribuir com um aumento do gasto energético de 300 a 600 kcal/dia (~ 1 hora de exercício), a perda de peso e gordura não parece acompanhar o efeito cumulativo desse gasto. Existem duas explicações possíveis para isso: 1) A primeira é que o gasto energético gerado pelo exercício acaba sendo compensado por um aumento da ingestão calórica. Isso mostra que se exercitar mais e comer menos para emagrecer é uma ideia superficial e ingênua, pois considera o gasto energético
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