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RESUMO ABDOME AGUDO (PARTE 1)

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1 Nicole Malheiros – Medicina 2023.1 
RESUMO – PROBLEMA 01/FECHAMENTO 01 
- ABDOME AGUDO (PARTE 1) – 
OBJETIVOS: 
1- CONCEITUAR DOR ABDOMINAL; 
2- ESTUDAR ANATOMIA QUE ENGLOBA INERVAÇÃO E VASCULARIZAÇÃO GERAL DO ABDOME; 
3- FAZER RELAÇÃO ENTRE ANATOMIA TOPOGRÁFICA DO ABDOME ANTERIOR E A LOCALIZAÇÃO DA DOR 
COM ORIGEM EMBRIOLÓGICO DOS POSSÍVEIS ÓRGÃOS ENVOLVIDOS; 
4- COMPREENDER AS PRINCIPAIS INFORMAÇÕES A SEREM COLETADAS NO QUADRO DE ABDOME AGUDO (O 
QUE MELHORA, O QUE PIORA, LOCAL, TEMPO, SINAIS SEMIOLÓGICOS…); 
5- ENTENDER O EXAME FÍSICO GERAL DETALHANDO AS SUAS ETAPAS E DESCREVER OS SINAIS 
SEMIOLÓGICOS MAIS IMPORTANTES: BLUMBERG, MURPHY, CULLEN, GREY-TURNER, PSOAS, OBTURADOR, 
GIORDANO); 
6- DESCREVER OS EXAMES LABORATORIAIS E DE IMAGEM NO ABDÔMEN AGUDO, PRINCIPALMENTE OS 
PACIENTES ATÍPICOS (EX: GRÁVIDA, IMUNOCOMPROMETIDO, PACIENTE CRÍTICO E OBESIDADE MÓRBIDA); 
7- COMPREENDER A CONDUTA GERAL DO ABDOME AGUDO. 
1- CONCEITUAR DOR ABDOMINAL 
A dor abdominal, é uma queixa frequente entre os pacientes nos consultórios e departamentos de emergência, pode ser benigna 
e autolimitada ou apresentar sintoma de doença grave que ameaça a vida. A dor abdominal crônica que está presente há meses 
ou anos, na ausência de outras doenças orgânicas, é quase sempre funcional e não necessita de avaliação de urgência. A expressão 
abdome agudo refere-se habitualmente ao sinal e sintoma de dor e hipersensibilidade na região abdominal, uma manifestação 
clínica que, em geral, requer tratamento cirúrgico de emergência. 
FISIOPATOLOGIA: A estimulação das vísceras abdominais ocas é mediada pelas fibras aferentes esplâncnicas dentro da parede 
muscular, peritônio visceral e mesentério, sensíveis à distensão e contração. Os nervos aferentes viscerais são frouxamente 
organizados, inervam vários órgãos e entram na medula espinal em vários níveis. Assim, a dor visceral é vaga e opaca, além de 
difusa. Os pacientes que tentam localizar a dor frequentemente movem toda a mão sobre o abdome inferior, superior e 
intermediário. A maioria da dor visceral é constante, mas a dor intermitente e cólicas resulta das contrações peristálticas causada 
pela obstrução parcial ou completa do intestino delgado, ureter e tubas uterinas. Ao contrário da inervação visceral, o peritônio 
parietal é inervado unilateralmente por uma rede densa de fibras nervosas que acompanham a distribuição somática espinal T6 
a L1. As fibras dolorosas do peritônio parietal são estimuladas pelo alongamento ou distensão da cavidade abdominal ou 
retroperitônio. A irritação direta decorrente de infecção, pus ou secreções (p. ex., causada por uma víscera perfurada) ou 
inflamação causada por contato entre o peritônio parietal e órgão adjacente inflamado (apendicite). A dor parietal é aguda, bem 
caracterizada e mostrada pelo paciente em localidade específica do abdome, geralmente apontando com o dedo. As vísceras 
gastrointestinais (fígado, sistema biliar, pâncreas e trato GI) surgem durante a embriologia de estruturas da linha mediana que 
possuem inervação bilateral. Assim, a dor visceral GI é tipicamente localizada na linha mediana abdominal. 
■ Dor aguda: poucos dias de duração, geralmente com piora progressiva; 
■ Dor crônica: dor que permanece inalterada por meses a anos; 
■ Dor subaguda: dor que não pode ser classificada com facilidade em nenhuma das outras categorias. Requer considerações no 
diagnóstico diferencial tanto de causas agudas como crônicas. Pacientes graves e instáveis devem sempre ser manejados como 
quadro agudo. Também deve-se lembrar que o paciente com dor abdominal crônica pode apresentar exacerbações agudas ou 
uma causa nova não relacionada à dor. 
 
 
 
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2- ESTUDAR ANATOMIA QUE ENGLOBA INERVAÇÃO E VASCULARIZAÇÃO GERAL DO ABDOME 
As funções primárias do trato gastrintestinal (TGI) são o processamento eficiente dos nutrientes ingeridos e a eliminação de 
resíduos não aproveitados. Tal processo inicia-se na boca e termina no canal anal e ânus. Há também estruturas anexas – pâncreas, 
fígado e vias biliares – que auxiliam no processo de digestão de forma direta (produção e secreção enzimática) ou indireta 
(produção hormonal). 
FARINGE: A faringe é o ponto de interseção entre o aparelho digestivo e o respiratório. Participa do segundo estágio da deglutição, 
por meio de contrações involuntárias de suas paredes, levando à propulsão alimentar e impedindo que o bolo passe para a 
cavidade nasal e traqueia. 
ESÔFAGO: É um órgão tubular de aproximadamente 23 a 25 cm que desce através do pescoço e mediastino posterior, atravessa 
o diafragma e, logo após curto trajeto abdominal (cerca de 1 cm), continua com o estômago. Apresenta duas regiões de alta 
pressão, mesmo em repouso, que são o esfíncter esofágico superior (EES) e o esfíncter esofágico inferior (EEI). 
ESTÔMAGO: Porção dilatada do tubo digestivo, em forma de J, 
interposta entre o esôfago e o duodeno. Possui duas curvaturas: a 
pequena e a grande. Divide-se em 4 regiões anatômicas: cárdia 
(região de limites imprecisos, adjacentes à junção esofágica); fundo 
(situada cranialmente ao plano horizontal que passa pela cárdia); 
corpo (situada entre o fundo e o antro) e o antro (estende-se desde 
o limite com o corpo até a junção do piloro com o duodeno). 
A irrigação arterial provém primordialmente do tronco celíaco. A 
artéria gástrica esquerda origina-se do tronco celíaco e irriga a 
porção superior direita do estômago. A artéria gástrica direita 
origina-se da artéria hepática, dirige-se ao longo da pequena 
curvatura e irriga a porção inferior direita do estômago. O fundo é 
suprido pelas artérias gástricas curtas que se originam da artéria 
esplênica. A grande curvatura tem sua porção superior irrigada pela 
artéria gastroepiplóica esquerda, que se origina da artéria esplênica, 
e a porção inferior recebe sangue pela artéria gastroepiplóica direita, 
que se origina da artéria hepática. As veias gástricas direita e esquerda drenam a pequena curvatura diretamente à porta, as veias 
gástricas curtas drenam o fundo gástrico e a veia gastroepiplóica esquerda drena a parte superior da grande curvatura, 
desembocando na veia esplênica. A veia gastroepiplóica direita drena a parte 
inferior da grande curvatura para a veia mesentérica superior. A drenagem 
linfática é paralela ao suprimento arterial. 
O estômago armazena os alimentos que chegam à sua luz, promove a 
fragmentação dos componentes sólidos e os transfere para o duodeno, sob um 
fluxo quase contínuo. A secreção gástrica contribui para a fragmentação das 
partículas ingeridas e elimina, em grande parte, as bactérias ingeridas com os 
alimentos. 
PANCREAS: É uma glândula alongada, de formato triangular, anexa ao duodeno 
e localizada entre este e o baço. Divide-se em cabeça, colo, corpo e cauda. A 
irrigação do pâncreas é feita pelas artérias pancreatoduodenais superiores e 
inferiores (suprem a cabeça do pâncreas e parte do duodeno) e por ramos da 
artéria esplênica (suprem o corpo e a cauda). A drenagem venosa é paralela ao 
suprimento arterial, assim como a drenagem linfática. A inervação se dá pelo 
sistema simpático (que interpreta os estímulos aferentes dolorosos) e 
parassimpático (que regula a secreção e o fluxo sanguíneo do órgão). 
Os componentes inorgânicos têm como função a neutralização ácida, além do carreamento de enzimas digestivas para o lúmen 
intestinal. A secretina é o principal mediador da secreção inorgânica. A produção da secretina é feita pelas células S do duodeno, 
em resposta a um pH baixo. As principais enzimas produzidas e suas funções são: 
 
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1) Amilase: semelhante à amilase salivar, promove a digestão de amido e glicogênio em maltose, maltotriose e alfadextrinas. Não 
digere celulose. 
2) Lipase: hidrolisam triglicerídeos em ácidos graxos e monoglicerídeo. 
3) Proteases: incluem tripsina, quimiotripsina, elastasee carboxipeptidades. Juntamente com a ação da pepsina, formam 
oligopeptídios e aminoácidos. A secreção enzimática é estimulada pela colecistocinina (CCK). 
O controle da secreção pancreática acontece em 3 fases: 
• cefálica: a visão, o cheiro e o gosto do alimento estimulam a inervação vagal, ocorrendo liberação de acetilcolina e 
secreção enzimática (20% do total); 
• gástrica: a secreção de gastrina na mucosa antral estimula a secreção pancreática (10% do total); 
• intestinal: a presença de ácidos, peptídeos e ácidos graxos na luz intestinal estimula a produção de secretina e 
colecistocinina, com consequente liberação de componentes inorgânicos e orgânicos, respectivamente. 
FÍGADO: Em condições normais, ocupa o quadrante superior direito, do 
5ºespaço intercostal até a margem costal direita. Pesa cerca de 1,5 kg no adulto. 
Divide-se em lobos direito e esquerdo, separados pelo ligamento falciforme. 
A bile é uma secreção para a digestão alimentar adequada, além de ser uma via 
única de excreção de solutos não excretados pelos rins. Inicialmente, os 
hepatócitos secretam bilirrubina, ácidos biliares, colesterol, pigmentos biliares 
e fosfolipídios para o interior dos canalículos biliares, onde são secretadas água 
e bicarbonato pelos colangiócitos. Noven ta por cento dos ácidos biliares são 
reabsorvidos, en quanto somente 10% são excretados nas fezes. 
Metabolismo da bilirrubina: A bilirrubina é formada principalmente pela 
degradação da hemoglobina proveniente da destruição eritrocitária, no sistema 
retículo-endotelial. Por ser insolúvel em água, deve ser transportada ligada à 
albumina até o fígado. No hepatócito, a bilirrubina é solubilizada pela 
conjugação com ácido glicurônico, pela ação da enzima UDP-
glicuroniltransferase, e depois é excretada. No íleo terminal e no cólon, pela 
ação das betaglicuronidases, é novamente desconjugada, sendo transformada 
em urobilinogênio pela flora intestinal e excretada pelas fezes, em sua maioria. 
O restante é reabsorvido pela circulação portal e reexcretada pelo fígado. Uma 
pequena fração não é captada pelo fígado, e sim excretada na urina. 
VIAS BILIARES: As vias biliares são divididas em 2 porções: intra e extra-
hepática. Este canal comum une-se com o ducto cís tico proveniente da 
vesícula biliar para formar o colédoco, com comprimento médio de 7 cm. A 
junção do colédoco com o ducto pancreático origina a ampola de Vater. 
A vesícula biliar localiza-se sob o lobo direito do fígado, mede cerca de 8 a 9 cm 
de comprimento e possui um volume que varia de 30 a 50 mL. É vascularizada 
pela artéria cística originada da artéria hepática direita. 
3- FAZER RELAÇÃO ENTRE ANATOMIA TOPOGRÁFICA DO ABDOME ANTERIOR E A LOCALIZAÇÃO DA DOR COM 
ORIGEM EMBRIOLÓGICO DOS POSSÍVEIS ÓRGÃOS ENVOLVIDOS; 
NEURORRECEPTORES: A percepção da dor (nocicepção) geralmente se inicia nos neurorreceptores de dor (nociceptores), que 
podem responder a vários tipos de estímulos, como distensão, espasmo ou isquemia. Existem dois tipos de fibras nervosas 
envolvidas na transmissão de estímulos dolorosos: 
■ fibras A-delta (somatossensoriais): fibras mielinizadas. Conduzem rapidamente o estímulo, produzindo uma dor súbita e bem 
localizada; são encontradas predominantemente na pele e nos músculos. 
 
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■ fibras C (viscerais): fibras não-mielinizadas. Conduzem o estímulo de forma mais lenta e produzem uma dor vaga ou em 
queimação, mal localizada; estão presentes no músculo, mesentério, vísceras abdominais e peritônio. A maioria dos nociceptores 
presentes nas vísceras abdominais são fibras do tipo C, menos sensíveis e em menor quantidade que os presentes em órgãos 
sensitivos como a pele. 
Os receptores sensoriais viscerais podem ser divididos em: 
■ Mecanorreceptores: localizados na parede das vísceras ocas (estômago, 
intestino), na superfície de órgãos sólidos (fígado, baço) e no mesentério. São 
sensíveis à distensão (p. ex., como na obstrução intestinal) e torção (p. ex., volvo de 
sigmóide), mas não são responsivos ao corte ou esmagamento (compressão); 
■ Quimiorreceptores: respondem a estímulos químicos e neurotransmissores. 
Inflamação, isquemia, lesão mecânica e necrose tecidual levam à liberação de 
substâncias (bradicinina, substância P, histamina, prostaglandinas, interleucinas, 
serotonina, etc.) que ativam os nociceptores e têm efeitos diretos e indiretos na 
circulação e nos tecidos adjacentes à área envolvida. 
TIPOS DE DOR ABDOMINAL: pode ser dividida em três tipos: visceral, somática ou referida. 
• Dor visceral: resulta do estímulo de nociceptores viscerais (fibras C), presentes na parede dos órgãos intra-abdominais 
(vísceras ocas, cápsula de órgãos sólidos). Os receptores são estimulados por estiramento, distensão ou contração 
excessiva da musculatura lisa. Levam à dor vaga e mal localizada. O local da dor corresponde, aproximadamente, ao 
dermátomo inervado pelo órgão comprometido. A depender do órgão acometido, pode ser descrita no epigástrio – 
região periumbilical ou hipogástrio, como cólica ou queimação. Sintomas secundários ao estímulo autonômico podem 
estar presentes, como náuseas, vômitos, sudorese e palidez. 
• Dor somática (somatoparietal): fibras nervosas mielinizadas (fibras A), resulta da irritação do peritônio parietal. Existe 
uma melhor correlação entre o local da dor e o segmento abdominal envolvidos. A dor costuma ser de forte intensidade 
à palpação e pode se apresentar positiva à descompressão brusca. Pode ser agravada pelo movimento ou tosse. 
Geralmente é mais intensa e bem localizada do que a dor visceral. 
• Dor referida: ocorre quando o órgão comprometido é diferente da área em que se percebe a dor. Resulta da convergência 
de neurônios aferentes viscerais e neurônios aferentes somáticos de diferentes regiões anatômicas para neurônios 
medulares de 2a ordem no mesmo segmento. Pode ser percebida na pele ou em tecidos mais profundos e, com 
frequência, é bem localizada. 
4- COMPREENDER AS PRINCIPAIS INFORMAÇÕES A SEREM COLETADAS NO QUADRO DE ABDOME AGUDO 
ACHADOS CLÍNICOS 
• HISTÓRIA CLÍNICA: Durante a anamnese, é fundamental uma história clínica detalhada, incluindo informações sobre 
localização, tempo de aparecimento, intensidade e características da dor. Isso permite, na maioria das vezes, que a etiologia 
seja definida. 
• LOCALIZAÇÃO: Frequentemente, os pacientes têm dificuldade de descrever de forma precisa a localização da dor pelas 
questões neuro anatômicas já descritas (p. ex., inervação predominante por fibras tipo C). A maioria dos órgãos abdominais, 
embriologicamente, deriva de estruturas da linha média e mantem a inervação bilateral. A dor, em razão da lesão destes, é 
pouco lateralizada, sendo referida na linha média. A dor secundária a órgãos que assumem posições mais laterais (rins, 
ovários, ureteres e vesícula), em geral, é descrita no local correspondente ao órgão envolvido. 
• TEMPO DE EVOLUÇÃO: 
➔ dor de início súbito: o paciente consegue determinar, com precisão, o momento do surgimento da dor. Geralmente está 
associada a um evento catastrófico, como ruptura de aneurisma abdominal, perfuração de úlcera péptica, entre outras 
causas; 
➔ dor rapidamente progressiva: evolui com piora em algumas horas. Observada em casos de pancreatite, isquemia 
mesentérica, cólica renal; 
➔ dor de evolução gradual ou insidiosa: evolui de forma mais lenta, às vezes, sem determinação precisa do início da dor. 
 
 
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• INTENSIDADE: relacionada à magnitude do estímulo doloroso, podendo ser leve, moderada ou grave. Entretanto, é um dado 
subjetivo. A graduação da dor em escalas (p. ex., 1 a 10) tem baixo valor inicial, mas é útil no acompanhamento do paciente 
ao longo do tempo. 
• PROGRESSÃO: 
➔ autolimitada: ocorre melhora progressiva da dor (p. ex., gastroenterite); 
➔ intermitente: apresenta-se com períodos de melhora e piora (padrãocrescente-decrescente da cólica renal e cólica biliar); 
➔ constante: pode ter caráter estável (dificilmente tendo causa cirúrgica) ou progressivo (apendicite, salpingite, 
diverticulite). Caracterização da dor A dor abdominal pode ser descrita pelo paciente de várias formas. Algumas delas 
podem auxiliar no diagnóstico diferencial: 
➔ dor tipo peso: pode estar relacionada a retardo no esvaziamento gástrico, à distensão de vísceras ocas ou da cápsula de 
órgãos sólidos; 
➔ dor tipo cólica: apresenta padrão crescente-decrescente, em geral pela luta peristáltica contra obstáculo luminal mecânico 
(cólica biliar, cólica renal); 
➔ dor tipo queimação ou pontada: pode se apresentar na dor visceral de diferentes órgãos; 
➔ dor contínua: comprometimento da serosa peritoneal por processo inflamatório (peritonite), neoplásico ou distensão da 
cápsula de órgãos sólidos. 
• FATORES DE MELHORA E PIORA: 
➔ Posição: 
■ piora da dor com pequenos movimentos: sugere peritonite (paciente tende a ficar parado); 
■ movimentação constante na tentativa de aliviar a dor e de encontrar uma posição confortável: dor de origem visceral 
(p. ex., cólica real ou obstrução intestinal); 
■ dor que melhora com a flexão anterior do tronco (posição genupeitoral ou “em prece maometana”) e que piora na 
posição supina: sugere processo retroperitoneal (p. ex., pancreatite, tumor de pâncreas); 
■ dor que alivia, com o paciente deitado, com a flexão da perna direita sobre o quadril: irritação do músculo psoas 
(abscesso secundário a doença de Crohn); 
■ piora da dor com inspiração profunda ou tosse: irritação diafragmática (abscesso subfrênico ou hepático). 
➔ Hábito intestinal: dor aliviada pela evacuação; sugere origem colônica. 
➔ Alimentos: podem exacerbar a dor (úlcera gástrica, isquemia mesentérica crônica, cólica biliar, obstrução intestinal) ou 
aliviar (úlcera duodenal não-complicada). 
➔ Medicações: dor aliviada pelo uso de antiácidos (p. ex., doença ulcerosa péptica ou esofagite). 
• SINTOMAS ASSOCIADOS 
➔ sintomas constitucionais: febre, calafrios, perda 
ponderal, mialgia, artralgia; 
➔ sintomas gastrintestinais: anorexia, náuseas, 
vômitos, diarreia, obstipação, icterícia, flatos; 
➔ outros: disúria, queixas menstruais e genitais nas 
mulheres. História médica pregressa, familiar e 
hábitos de vida na anamnese, é fundamental avaliar: 
➔ causas de dor abdominal recorrente (cólica biliar, 
pseudo-obstrução intestinal, doença inflamatória 
pélvica); 
➔ doenças sistêmicas que podem ter como sintoma dor 
abdominal (lúpus, cetoacidose diabética, porfiria, 
anemia falciforme, esclerodermia); 
➔ medicações utilizadas; 
➔ etilismo, tabagismo, abuso de substâncias ilegais, história epidemiológica e ocupacional; 
➔ contato com pessoas ou animais doentes; 
 
 
 
 
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5- ENTENDER O EXAME FÍSICO GERAL DETALHANDO AS SUAS ETAPAS E DESCREVER OS SINAIS 
SEMIOLÓGICOS MAIS IMPORTANTES 
 
 
6 – EXAMES LABORATORIAIS E DE IMAGEM 
AVALIAÇÃO LABORATORIAL: Os exames laboratoriais devem refletir as suspeitas diagnósticas elaboradas a partir da história 
clínica e do exame físico. 
• Hemograma completo com diferencial e urina I: devem ser solicitados para a maioria dos pacientes; 
• Ureia, creatinina, eletrólitos, gasometria arterial e glicose: avaliação do estado volêmico, metabólico, acidobásico e 
função renal. Não são necessários em todos os pacientes; 
• enzimas hepáticas e amilase: pacientes com dor em abdome superior; 
• teste de gravidez: toda mulher em idade reprodutiva com dor em abdome inferior; 
• outros testes: baseados nas suspeitas diagnósticas. 
OS EXAMES DE IMAGEM: 
1) RADIOGRAFIAS PLANAS DO ABDOME: devem incluir uma em posição supina e outra em posição ortostática. É um exame 
de baixa sensibilidade (30%), especificidade (87,8%) e acurácia (56%) no diagnóstico, quando comparado com a TC de 
abdome sem contraste. Sua maior utilidade é na detecção de corpos estranhos intra-abdominais (sensibilidade de 90%) e 
de obstrução intestinal (sensibilidade de 49%), sendo de pouca utilidade no diagnóstico definitivo de causas comuns de 
dor abdominal como apendicite, pancreatite, diverticulite e pielonefrite. Entretanto, são exames de baixo custo e 
geralmente disponíveis, sendo solicitados na maioria dos casos. Objetivo: avaliar presença de nível líquido, padrão 
anormal de gases, calcificações. 
2) RADIOGRAFIA DE TÓRAX: avaliar presença de pneumoperitônio e excluir causas intratorácicas de dor abdominal. 
3) ULTRASSONOGRAFIA (USG): avaliação rápida e de baixo custo de árvore biliar, fígado, pâncreas, baço, rins, vias urinárias 
e órgãos pélvicos. Exame inicial de escolha para o diagnóstico de várias patologias abdominais: aneurisma de aorta 
 
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abdominal (paciente instável), cólica biliar, colecistite, gravidez ectópica, abscesso tubo-ovariano, litíase renal. A USG 
transvaginal e transretal são úteis na identificação de anormalidades pélvicas. A USG com Doppler permite avaliação de 
lesões vasculares, como aneurismas de aorta ou visceral, trombose venosa e anomalias. 
4) TOMOGRAFIA DE ABDOME: é o exame mais versátil para avaliação da dor abdominal. Permite a identificação de 
pneumoperitônio, padrões anormais das alças intestinais e calcificações. Também pode revelar lesões inflamatórias 
(apendicite, diverticulite, pancreatite), neoplásicas, vasculares (aneurisma, trombose portal), traumáticas (lesão 
hepática, esplênica, renal) e hemorragias intra-abdominais e retroperitoneais. Deve ser considerada uma alternativa à 
radiografia como modalidade inicial na avaliação desses pacientes em centros que disponibilizem esse tipo de exame. 
5) OUTROS EXAMES DE IMAGEM (ANGIORRESSONÂNCIA, COLANGIORRESSONÂNCIA): podem auxiliar no esclarecimento 
do quadro. Entretanto, são de alto custo e não estão disponíveis em grande parte dos serviços. 
Outros métodos diagnósticos podem ocasionalmente ser necessários na avaliação do paciente com dor abdominal: 
• LAVAGEM PERITONEAL: útil na identificação de hemoperitônio após traumas perfurantes ou com armas de fogo e na 
detecção de material fecalóide ou purulento após perfuração ou isquemia visceral; 
• LAPAROSCOPIA DIAGNÓSTICA: útil nos casos em que o diagnóstico é duvidoso e a condição clínica do paciente requer 
intervenção. A acurácia diagnóstica em pacientes com dor abdominal aguda não-traumática é de 93 a 98%; 
• LAPAROTOMIA EXPLORADORA: reservada para quadros de “catástrofe” intra-abdominal com diagnóstico evidente pela 
história e exame físicos ou naqueles sem diagnóstico, nos quais o atraso na intervenção pode ser fatal. 
PACIENTE ATÍPICOS 
GESTANTES: Deve-se dar ênfase especial à possibilidade de doenças 
ginecológicas e/ou cirúrgicas quando ocorrer uma dor abdominal aguda 
durante a gravidez devido à morbidade caso elas não sejam prontamente 
diagnosticadas. 
A laparoscopia tem mostrado grande benefício no diagnóstico e tratamento, 
sua segurança foi considerada igual ou superior a uma abordagem cirúrgica 
aberta em todos os trimestres da gravidez. A lentidão no tratamento 
cirúrgico provou ser muito mais mórbido do que a cirurgia em si. Na maioria 
das vezes, os sintomas são atribuídos à gravidez subjacente, incluindo dor 
abdominal, náuseas, vômitos e anorexia. A gravidez também pode alterar as 
manifestações de algumas doenças e faz que o exame físico seja mais difícil, 
em decorrência do útero aumentado na pelve. 
Resultados de estudos laboratoriais, como contagem de glóbulos brancos, 
também sofrem alteração na gravidez, tornando mais difícil o reconhecimento da doença. Por fim, os médicos naturalmente 
tendem a ser mais conservadores quando tratam pacientes grávidas. A cirurgia não foi associada ao aumento de natimortos e 
anomalias congênitas. A cirurgia abdominal foi associada ao aumento da incidência de parto pré-termo no segundo e no terceiro 
trimestre de gravidez.Apendicite é a doença não obstétrica de tratamento cirúrgico mais comum, ocorrendo em uma em cada 1.500 gestações. Seus 
sintomas consistem em dor abdominal à direita, náuseas e anorexia. A febre é incomum, a menos que o apêndice esteja perfurado 
com sepse abdominal. Os estudos laboratoriais também podem ser enganosos. 
O ultrassom tem sido confiável como a primeira ferramenta de imagem em muitos centros. Foi estabelecido que a TC helicoidal 
é uma ferramenta valiosa para a avaliação da paciente não grávida e ela é promissora como estudo de segunda linha na 
gravidez. Comparada com a TC tradicional, a TC helicoidal pode fornecer um estudo muito mais rápido e seguro, com exposições 
de radiação para o feto de aproximadamente 300 mrad. A RM também tem um papel importante no diagnóstico. A RM não só é 
capaz de demonstrar o apêndice normal, mas também consegue reconhecer um apêndice aumentado, líquido periapendicular e 
inflamação. 
A segunda e a terceira doença cirúrgica mais comum observada na gravidez são os distúrbios do trato biliar e a obstrução 
intestinal. Sintomas de dor, náuseas e anorexia são os mesmos em pacientes não grávidas. O ultrassom é o exame diagnóstico 
preferencial. 
 
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A pancreatite biliar e a colecistite aguda devem ser tratadas com mais cuidado. A pancreatite biliar tem sido associada a taxas de 
perda fetal muito elevada (60%). Se uma mulher não responde rapidamente ao tratamento conservador com hidratação, jejum, 
analgesia e uso de antibióticos, deve-se reavaliar a necessidade de cirurgia. As morbidades materna e fetal são mais afetadas 
pela demora do tratamento definitivo. 
PACIENTES PEDIÁTRICOS As estratégias diagnósticas são as mesmas que para os adultos. A apendicite está entre as causas 
primárias nessa faixa etária. As apresentações e os achados no exame físico são semelhantes aos do adulto. O principal desafio 
na realização do diagnóstico correto consiste na obtenção de uma história precisa. As escolhas dos testes diagnósticos bem 
como dos tratamentos podem ser influenciadas pela idade do paciente. Finalmente, existe experiência progressiva no tratamento 
da apendicite precoce de forma não cirúrgica com antibióticos. Um estudo prospectivo não randomizado recente de 77 crianças 
com apendicite concluiu que as taxas de sucesso imediato e em 30 dias para o tratamento não operatório foi de 93% e 90%. 
PACIENTES CRÍTICOS Muitas das doenças subjacentes e tratamentos realizados na unidade de tratamento intensivo 
predispõem a doença abdominal aguda e a falta de identificação das mesmas está diretamente associada a um pior prognóstico. 
Em geral são de difícil avaliação quando comparados com os não graves, em virtude do comprometimento nutricional ou 
imunológico, da analgesia com narcóticos e do uso de antibióticos. Muitos desses pacientes têm alteração no nível de consciência 
ou estão entubados e não podem fornecer informações detalhadas aos médicos assistentes. Quando ocorre uma complicação 
abdominal aguda no paciente sob tratamento intensivo, ela tem um efeito dramático no desfecho. Os intensivistas precisam 
manter muita suspeição sobre o desenvolvimento de doença intra-abdominal e informar de imediato aos cirurgiões para 
maximizar o potencial de recuperação. Os cirurgiões devem então trabalhar para excluir a possibilidade de doença abdominal 
usando todos os métodos descritos neste capítulo, bem como o ultrassom à beira do leito, paracentese ou minilaparoscopia, 
de modo que a intervenção cirúrgica precoce possa ser realizada de maneira apropriada. 
PACIENTES IMUNOCOMPROMETIDOS : A variabilidade é altamente relacionada com o grau de imunossupressão. 
Comprometimento leve a moderado é visto em pacientes idosos, indivíduos desnutridos, diabéticos, transplantados na terapia de 
manutenção, pacientes com câncer, pacientes com insuficiência renal e pacientes com HIV com contagens de CD4 superiores a 
200/mm3. Os sintomas nesses pacientes podem apresentar-se de uma forma atípica. Esses pacientes podem não ser capazes de 
desenvolver uma resposta inflamatória completa e, portanto, podem experimentar menos dor abdominal, atraso do 
aparecimento de febre e leucocitose discreta. Pacientes com imunossupressão grave normalmente incluem transplantados que 
receberam altas doses de terapia para evitar a rejeição nos últimos 2 meses, pacientes com câncer em quimioterapia, 
especialmente aqueles com neutropenia, e pacientes com HIV com contagens CD4 inferiores a 200/mm3. Esses pacientes cursam, 
em geral, com pouca dor ou nenhuma dor, sem febre e com sintomas sistêmicos vagos, seguidos por uma queda no estado 
geral irreversível. Imunocomprometidos podem não apresentar muitos desses achados por causa de sua incapacidade de gerar 
uma resposta inflamatória normal. A avaliação cirúrgica precoce diminui a mortalidade destes pacientes. 
Além disso, esses pacientes podem sofrer infecções atípicas, incluindo tuberculose peritoneal, infecções fúngicas, aspergilose e 
micoses endêmicas, e uma variedade de infecções virais, incluindo citomegalovírus e Epstein-Barr. Todos os pacientes 
imunodeprimidos graves necessitam de avaliação imediata e completa para queixas abdominais persistentes. TC de alta 
resolução pode ser altamente benéfica nesses pacientes, mas deve ser mantido um espaço para a laparoscopia ou a laparotomia 
para aqueles com resultados de exames inespecíficos e sintomas persistentes que continuam sem explicação. 
PACIENTES OBESOS MÓRBIDOS: A obesidade mórbida cria numerosos desafios ao diagnóstico preciso na vigência de 
abdome agudo. Muitos autores descreveram alterações nos sinais e sintomas de peritonite na obesidade mórbida. Achados de 
peritonite franca frequentemente são tardios e nefastos, levando à sepse, falência de múltiplos órgãos e morte. Os achados dos 
exames complementares podem ser de difícil interpretação. Dor abdominal grave não é comum, e achados menos específicos, 
como taquicardia, taquipneia, derrame pleural, ou febre podem ser a primeira observação. A avaliação da distensão ou massa 
intra-abdominal também é muito difícil, por causa do tamanho e da espessura da parede abdominal. O exame abdominal por 
imagem também é dificultado pela obesidade. As radiografias simples do abdome podem exigir múltiplas imagens para que todo 
o abdome possa ser visto, e a nitidez fica reduzida. Pode ser impossível a realização do exame por TC e RM na medida em que a 
circunferência ou o peso do paciente exceda o tamanho de abertura do aparelho ou o limite de peso da maca mecanizada. Nestes 
quadros, um alto índice de suspeição e um baixo limiar para a exploração cirúrgica deve ser mantido. A laparoscopia é uma 
ferramenta valiosa nesses pacientes.

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